CONTRATO DE ARRENDAMENTO
OBRAS DE CONSERVAÇÃO ORDINÁRIA
OBRAS DE CONSERVAÇÃO EXTRAORDINÁRIA
DETERIORAÇÃO
CLÁUSULA CONTRATUAL
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
INTERPRETAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO
TEORIA DA IMPRESSÃO DO DESTINATÁRIO
SENHORIO
ARRENDATÁRIO
Sumário


Na vigência do contrato de arrendamento a obrigação contratual de realizar obras de conservação do locado pelo inquilino é exigível pelo senhorio.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório

1. AA e BB intentaram a presente ação contra o Município da Póvoa de Varzim pedindo a condenação do Réu a efectuar as obras de conservação e reparação do edifício identificadas nos artigos 22º a 31º.

Alegaram que são proprietários do prédio sito na Rua ..., nº 1, União de Freguesias da ..., ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de ... sob o nº 8.025 do Livro B-21 e que o seu antepassado CC o deu de arrendamento ao Réu em 19 de Dezembro de 1950, mediante a renda de € 155, pelo prazo de 10 anos, renovável pelo período de 3 anos, destinado à instalação e funcionamento dos serviços camarários, prevendo que as reparações de todo o edifício ficavam por conta do Réu, que as faria sempre que necessário à conservação e ao seu bom aspeto.

Acrescentaram que o prédio é do ano de 1897, desde há 20 anos não existem obras de conservação e, tendo realizado um levantamento, o marido verificou infiltrações, paredes e tectos interiores estragados, paredes degradadas e empoladas, telhas partidas, pavimentos desgastados e apodrecidos, janelas estragadas e mal calafetadas, rede elétrica e de telecomunicação salientes, com a canalização e mobiliário sanitário a necessitar de reparação e substituição, discriminando as obras necessárias.

2. O réu contestou e negou que lhe incumba a execução das obras em causa, contrapondo que, à data da celebração do contrato, vigorava norma imperativa que estabelecia ser o senhorio obrigado às obras de conservação e que a cláusula citada pelos autores não abrange obras de beneficiação ou reabilitação nem as deteriorações decorrentes do desgaste do tempo. Referiu, ainda, que o contrato em causa foi declarado nulo e de nenhum efeito por decisão de 19 de dezembro de 1950.

3. Os autores exerceram o contraditório argumentando que, por deliberação de 14 de fevereiro de 1951, o prédio em causa foi requisitado, prevendo-se o pagamento de uma renda mensal ao proprietário e que ficavam a cargo do réu as reparações e quaisquer obras; em 11 de março de 1982 foi realizada uma alteração ao contrato inicial, de 1950, mencionando-o e declarando-o em vigor quanto a tudo o que não ficava expresso; invocaram, ainda, o abuso do direito, afirmando que o contrato vigorou por 70 anos sem que o réu colocasse em causa a validade da cláusula.

4. Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador que se pronunciou pela validade e regularidade dos pressupostos processuais.

Foi identificado o objeto do litígio.

5. Foi fixada a matéria de facto considerada assente por documento e enunciados os temas da prova, sem reclamação.

6. Realizou-se prova pericial e procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença, decidindo-se:

“Em face do exposto, o Tribunal julgando provada e procedente a acção intentada pelos Autores AA e mulher BB, condena o Réu Município da Póvoa de Varzim a realizar as obras descritas nos pontos 23) a 28) da fundamentação de facto por forma a debelar as patologias discriminadas em 10) a 22)”.

9. Inconformado com a sentença, o réu veio apelar.

10. O Tribunal conheceu da apelação e decidiu:

Pelo exposto, acorda-se na 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente a presente apelação e, em conformidade, revoga-se a decisão recorrida, tendo por consequência a absolvição do recorrente do pedido formulado pelos recorridos. Custas pelos apelados.”

11. O acórdão teve um voto de vencido, onde se consignou:

“Discordo da interpretação que fez vencimento das cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento celebrado em 19 de dezembro de 1950 e repristinadas por efeito do contrato celebrado em 11 de março de 1982, cuja validade foi admitida ou, pelo menos, por ocorrer a preclusão da invocação da sua invalidade com fundamento no instituto do abuso do direito. Na nossa perspetiva, a cláusula quinta do primitivo contrato de arrendamento transfere para o locatário a obrigação de fazer “as reparações de conservação” enquanto, por força da cláusula sétima, as restantes obras e só estas ficam sujeitas a prévio consentimento do senhorio.

Se o alcance da cláusula quinta fosse o que se defende no acórdão de que se discorda, não se percebe por que razão o locatário assumiria a obrigação de fazer “as reparações de conservação de todo o edifício” e que “as fará sempre que necessárias à conservação e bom aspecto do mesmo”, sem fazer depender o nascimento desta obrigação da exclusiva vontade do locatário ou da cessação do contrato de arrendamento, como se sustenta no acórdão de que se dissente.

A nosso ver, o nascimento da obrigação de realização de obras de conservação aferir-se-á de modo objetivo, de acordo com um critério de necessidade, devendo a concretização desta necessidade aproximar-se do conceito das benfeitorias necessárias (artigo 216º, primeira parte do nº 3, do Código Civil).

A cláusula que respeita às obras de conservação não visa apenas assegurar o gozo do locado ao arrendatário, visando também a defesa da integridade do locado, tutelando o interesse do locador na conservação do bem arrendado ao longo do tempo por que vai perdurando o arrendamento. E porque assim é, como se refere no artigo 23º da petição inicial, a renda era apenas atualizada de acordo com os coeficientes legais e, provavelmente, atenta a obrigação do locatário realizar as obras de conservação do arrendado, o valor inicial da renda terá sido fixado em montante inferior ao que seria se não existisse essa obrigação.

Anote-se que, legalmente, todo e qualquer dono de bem imóvel, quer esteja ou não no seu gozo, está obrigado à realização periódica de certas obras, (veja-se o artigo 9º do Regulamento das Edificações Urbanas), razão pela qual o senhorio, mesmo na pendência do arrendamento, tem interesse no cumprimento da cláusula quinta pelo arrendatário, sob pena de poder ser responsabilizado por tal omissão (veja-se o artigo 492º do Código Civil), além de se sujeitar à determinação de realização de obras pelo Município, no caso o locatário (artigo 10º do Regulamento das Edificações Urbanas).

Por isso, na nossa perspetiva, os senhorios, por força da aludida cláusula quinta, têm o direito de exigir do arrendatário a realização coerciva das obras de conservação e bem assim das necessárias à manutenção do bom aspeto do mesmo, pelo que confirmaria a decisão recorrida.

12. Do acórdão proferido veio a ser interposto recurso de revista pelos Autores, admitido por acórdão da conferência, que apreciou – negando – a existência da nulidade que vinha arguida.

13. Nas conclusões da revista constam as seguintes conclusões (transcrição):

I. O Tribunal da Relação do Porto no douto Acórdão pronunciou-se sobre questão nunca suscitada pelas partes.

II. Existe excesso de pronúncia gerador da nulidade nos termos da alínea c) do n.º do n.º1 artigo 674.º do CPC e alínea d), segunda parte, do n.º1 do artigo 615.º do CPC.

III. Os AA peticionaram na acção a condenação do Réu a efetuar as obras de conservação e reparação do edifício identificadas nos artigos 22º a 31º, tendo como fundamento as cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento celebrado entre as partes.

IV. O Réu quer na sua contestação, quer em sede de recurso, contestou apenas a validade das destas cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento em conformidade como regime que entendia que era aplicável, alegando a sua nulidade.

V. O Réu dá como assente o sentido das cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento, a sua literalidade: a realização de obras no imóvel durante a pendência do contrato impendiam sobre o arrendatário.

VI. Os fundamentos do recurso do Réu assentam apenas na impugnação da decisão relativa à matéria de facto e na nulidade das cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento, não submetendo em sede de recurso quaisquer outras questões.

VII. A questão da interpretação das cláusulas do contrato de arrendamento, o seu sentido, apreciada pelo Tribunal da Relação do Porto, nunca foi suscitada pelas partes, pelo que estava vedado ao Tribunal da Relação do Porto a sua apreciação em sede de recurso.

VIII. Existiu também um erro de interpretação e de aplicação do direito pelo Tribunal da Relação do Porto, por violação do princípio da liberdade contratual plasmado no artigo 405.º do C.Civ, nos termos da alínea a) do n.º 1 do n.º do n.º1 artigo 674.º do CPC, com o sentido atribuído às referidas cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento.

IX. As partes, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, aquando da celebração do contrato de arrendamento, acordaram, como era a sua vontade, de transferir para o arrendatário, o Réu, a obrigação de fazer “as reparações de conservação: “As reparações de conservação de todo o edifício ficam por conta da Câmara, que as fará sempre que necessárias à conservação e bom aspecto do mesmo” - cláusula quinta.

X. A posição do Tribunal da Relação do Porto não valorizou a confluência da vontade das partes aquando acordaram inserir no contrato de arrendamento tais cláusulas quinta e sétima.

XI. As cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento consubstanciam a vontade de sub-rogar o arrendatário no dever que incumbia ao senhorio na realização das obras no edifício.

XII. A vontade das partes e o sentido atribuído às cláusulas do contrato de arrendamento encontra-se plasmado no facto do Réu ter efectuado ao longo dos anos algumas obras de conservação do edifício.

XIII. O Réu nunca colocou em causa o sentido das cláusulas do contrato de arrendamento ou a interpretação das mesmas, apenas a sua validade perante o regime legal.

XIV. O momento da realização das obras assenta em critérios objectivos e não depende da vontade do arrendatário.

XV. O momento de realização das obras de conservação do edifício pelo Réu decorria sempre da necessidade de conservação do imóvel, pelo que não teria qualquer fundamento as diferir para o final do contrato de arrendamento.

XVI. A cláusula quinta do contrato de arrendamento é clara e não carece de qualquer interpretação senão aquela que é explicita e decorre da vontade das partes: as obras de conservação do edifício teriam de ser efectuadas pelo Réu durante a pendência do contrato e sempre que fossem necessárias para evitar a sua degradação.

XVII. Resulta das cláusulas primeira e segunda do contrato de arrendamento que o contrato foi, desde o início da sua vigência, configurado como de longa duração.

XVIII. Se o arrendatário realizasse tais obras de conservação no imóvel só no final do contrato, colocaria em causa a própria integridade do imóvel e gozo do mesmo por este.

XIX. O erro de interpretação do Tribunal da Relação do Porto é também visível quando este Tribunal confunde o sentido vertido na cláusula quinta com o sentido vertido na cláusula sétima do contrato de arrendamento.

XX. A cláusula sétima do contrato de arrendamento é clara, ou seja, as restantes obras, isto é, aquelas que não as de conservação referidas na clausula quinta do contrato de arrendamento, também são da responsabilidade do arrendatário, o Réu, mas estas e só estas, carecem de consentimento do senhorio.

XXI. É incongruente a posição do Tribunal da Relação do Porto defender a validadas das cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento (validade das normas que sustentamos) à luz das normas do NRAU (1074.º), e cuja interpretação e sentido que decorre quer das cláusulas e quer das normas do NRAU é de que o arrendatário, no caso o Réu, está obrigado à realização das obras de conservação do edifício sempre que necessárias e durante a vigência do contrato, por as partes assim o acordaram, e simultaneamente, sustentar que o sentido das cláusulas acordadas pelas partes no contrato de arrendamento era apenas de desobrigar o senhorio de realização das obras, e nunca podendo ser exigidas ao arrendatário durante a pendência do contrato.

XXII. Se as cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento tivessem o sentido que o Tribunal da Relação do Porto pretende atribuir, não haveria motivo para as partes terem aposto tais cláusulas que transferem a obrigação de realização das obras para o arrendatário, o Réu.

XXIII. O Tribunal da Relação ao defender tal sentido das cláusulas do contrato de arrendamento, divergente da vontade das partes, vontade esta das partes que é manifestada pelas mesmas através dos factos constantes do processo, e que é convergente com as próprias normas do NRAU que preveem que essa possa ser a vontade das partes, põe em causa as próprias normas do NRAU, esvaziando todo o seu sentido e conteúdo, ao questionar a exigibilidade dessas obras ao arrendatário durante a pendência do contrato.

XXIV. Dentro dos limites da lei aplicável, o conteúdo do contrato de arrendamento, apontava e aponta, indubitavelmente para a realização pelo Réu de obras no edifício e durante a vigência do contrato de arrendamento.

XXV. A materialidade apurada não propicia o entendimento sufragado Tribunal da Relação, não tendo assim fundamentos para revogar a douta sentença, tendo, com a posição vertida no douto acórdão, incorrido na violação de lei substantiva por erro de interpretação e erro de aplicação do direito, nos termos da alínea a) do n.º 1 do n.º do n.º1 artigo 674.º do CPC.

XXVI. Nesta conformidade e com o douto suprimento de V.Ex.as., deve o douto acórdão ser revogado, mantendo-se a decisão vertida na sentença, que condenou o Réu, e dando assim provimento ao recurso como é de inteira justiça.!

14. Houve contra-alegações, onde se conclui (transcrição):

“I – Os Autores, ora Recorrentes, interpuseram recurso do douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido nos presentes autos, por se não conformarem com a decidida revogação da douta Sentença de 30/10/2022 e a absolvição do Réu, ora Recorrido, do pedido formulado pelos Autores.

II – Alegam, antes de mais, os ora Recorrentes que o douto Acórdão recorrido “pronunciou-se sobre questão nunca suscitada pelas partes, e como tal existe excesso de pronúncia gerador da nulidade, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 674º do CPC e alínea d), segunda parte, do n.º 1 do artigo 615º do CPC”.

III – A nulidade por excesso de pronúncia, com indiscutida previsão no artigo 615º, n.º 1, alínea d), 2.ª parte, do Código de Processo Civil, advém da não observância do comando da 2.ª parte do n.º 2 do artigo 608º do Código de Processo Civil, segundo o qual o juiz “não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.

IV – Nos termos expressamente previstos no n.º 3 do artigo 5º do Código de Processo Civil, “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito”.

V – No caso, as questões tratadas no douto Acórdão recorrido foram, efectivamente, as suscitadas, tendo o litígio sido tão-só decidido mediante uma interpretação diferente da propugnada, ou seja, mediante um enquadramento jurídico diverso, considerada a factualidade essencial alegada e adquirida nos autos (distinta solução jurídica do caso), tudo no uso do poder-dever estabelecido no referido n.º 3 do artigo 5º do Código de Processo Civil.

VI – Sem prejuízo do vindo de referir, importará, por outro lado, notar que, conforme expressamente afirmado no douto Acórdão recorrido, a procedência do recurso, com a revogação da decisão apelada, assentou na conclusão de que “os recorridos não têm legitimidade substantiva, não têm o direito, de exigir a realização de obras ao recorrente”.

VII – A ilegitimidade material ou substantiva é uma excepção peremptória inominada (artigo 576º, n.os 1 e 3, do Código de Processo Civil), de conhecimento oficioso, como inequivocamente resulta do disposto no artigo 579º do Código de Processo Civil.

VIII – Sendo a excepção em causa de conhecimento oficioso, conforme referido, o respectivo conhecimento nunca consubstanciará violação do estabelecido na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 608º do Código de Processo Civil, não tendo, pois, ocorrido o invocado excesso de pronúncia, improcedendo a arguida nulidade imputada ao douto Acórdão recorrido.

IX – Defendem, por outro lado, os ora Recorrentes que “a posição sufragada no douto Acórdão consubstancia não só um erro de interpretação como também de aplicação de direito, por violação do princípio da liberdade contratual plasmado no artigo 405.º do C.Civ”.

X – À semelhança do que se encontra expressamente previsto para a reparação das deteriorações lícitas realizadas pelo arrendatário (artigo 1073º, n.º 2, do Código Civil) e quanto aos efeitos da cessação do contrato no que tange às “reparações que incumbam ao arrendatário” (artigo 1081º, n.º 1, do Código Civil), e atento o disposto nos artigos 1043º, n.º 1, e 1044º do Código Civil, impor-se-á concluir que apenas no momento da restituição/entrega do local poderá ser aquilatado o cumprimento/incumprimento pelo arrendatário de quaisquer obrigações de execução de obras no arrendado.

XI – A interpretação efectuada na douta decisão recorrida, apresenta-se, pois, como a mais consentânea com o quadro jurídico geral do contrato de arrendamento e dos deveres das partes, pelo que bem andou o Venerando Tribunal da Relação do Porto, ao decidir como decidiu.

XII – Em suma, o douto Acórdão recorrido não padece de qualquer dos vícios que lhe vêm assacados, devendo ser integralmente mantido.”

Colhidos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.

II. Fundamentação

De facto

15. Factos provados – como apurados pelas instâncias e com alterações introduzidas pelo Tribunal da Relação (a negrito):

1 - Existe um prédio composto de casa de habitação com quatro pisos, sito na rua ..., n.º 1, ..., descrito na Conservatória de Registo Predial de ... sob o n.º 8.025 do Livro n.º 21, atualmente na ficha n.º 2360/19960827-... e inscrito na matriz sob o artigo 2279.

2 - A aquisição do prédio identificado em 1) encontra-se registada a favor dos Autores pela Ap. 41 de 27 de agosto de 1996, por legado de DD, casado com EE no regime de separação.

3 - Por escritura pública lavrada a 19 de dezembro de 1950, nos Paços do Concelho e Secretaria da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, perante o Notário Privativo, compareceram CC e FF, este na qualidade de ... substituto da Câmara Municipal, em exercício no impedimento do próprio, o primeiro, na qualidade de primeiro outorgante, declarou possuir o prédio identificado em 1), com instalação elétrica e respetivo contador e quadro de distribuição, três campainhas elétricas, encanamento de esgotos e canalizações de água quente e fria, dois depósitos de água com duas torneiras, contador de água, nove torneiras de metal, quatro lavatórios de louça, sete bacias fixas de louça de retrete e respetivos autoclismos, armários e bancos de cozinha, arrecadações ou arrumações envidraçadas na cozinha, copa e bancas da mesma copa, tanque de cimento, pia de pedra para lavar e barraco de madeira no quintal para arrecadação.

4 - O segundo declarou que “em nome da Câmara Municipal ajustou e contratou com o primeiro outorgante dar este de arrendamento o referido seu prédio, com os pertences e móveis mencionados nos termos e seguintes condições:

1.ª o prazo de arrendamento é de dez anos, a começar em 1 de janeiro de 1951 e a terminar em 31 de dezembro de 1960;

2.ª o contrato considerar-se-á tacitamente renovado por períodos de três anos, se qualquer das partes contratantes não o denunciar com a antecedência de pelo menos seis meses do termo do prazo inicial ou de qualquer das suas prorrogações, em carta registada com aviso de receção;

3.ª a renda anual é de Esc. 36.000$00, paga na Tesouraria da Câmara em prestações mensais de Esc. 3.000$00 no final do mês a que disser respeito;

4.ª o prédio é destinado exclusivamente à instalação e funcionamento de repartições públicas da Câmara e do Estado, não lhe podendo ser dada aplicação diversa;

5.ª as reparações da conservação de todo o edifício ficam por conta da Câmara que as fará sempre que necessárias à conservação e bom aspeto do mesmo;

6.ª a Câmara compromete-se a entregar no fim do arrendamento, ao senhorio, em bom estado de conservação, o referido prédio e pertences mencionados;

7.ª todas e quaisquer obras que, além das reparações aludidas, for preciso executar no edifício, serão da conta da Câmara e com prévio consentimento por escrito do senhorio.

5 - O primeiro outorgante declarou que eram as condições tratadas.

6 - Ficou a constar da ata da reunião da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim de 27 de dezembro de 1950 que o ... da Câmara, DD, declarou nulo e de nenhum efeito o contrato identificado em 3) a 5) e revogar o deliberado sobre esse assunto em reunião do dia anterior, invocando o artigo 78.º do Código Administrativo e decidiu submeter à ratificação da Câmara Municipal na sua próxima reunião, ponderando que o prédio escolhido para acomodar os serviços de água, luz e saneamento municipalizados por deliberação de 6 de setembro do mesmo ano, lhe pertencia e nada se estipulava quanto à perda de mandato pelo Presidente no caso de vir a adquirir situação de interesse direto ou indireto em contratos com o município, por ser órgão de administração municipal distinto do concelho e da Câmara e de a sua investidura ser precedida de nomeação do governo mas por, após a celebração da escritura, ter atentado no artigo 352.º mandado observar pelo artigo 70.º do Código Administrativo, constatando que os membros dos corpos administrativos, ainda que se encontrassem de licença, não podia tomar parte ou interesse nos contratos por estes celebrados, sob pena de nulidade do contrato e perda do mandato, o que viera a estabelecer dúvidas sobre a prevalência sobre dessa disposição sobre outras.

7 - A decisão referida em 6) foi ratificada em 27 de dezembro de 1950 pela Câmara Municipal.

8 - Por escritura pública lavrada a 11 de março de 1982, nos Paços do Concelho e Secretaria da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, perante o Notário Privativo, compareceram Dr. GG, na qualidade de Presidente e em representação da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, com poderes conferidos por deliberação de 5 de janeiro daquele ano e DD, casado no regime de separação de bens com EE, declarando o primeiro “a Câmara Municipal que representa deliberou, nas reuniões de 17 de dezembro do ano findo e de 1 do mês em curso, precedendo negociações com o segundo outorgante, tomar de arrendamento a este, para utilização pelos Serviços Municipalizados da água, eletricidade e saneamento deste Município, onde, em parte, já funcionam, todo o prédio urbano de que o mesmo segundo outorgante é proprietário, situado nesta cidade da ..., no gaveto formado, pelo lado norte, pelas ruas ..., rua dos ... e rua Eng. ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2279, pelo período de um ano contado desde 1 de janeiro do corrente, renovável por iguais períodos sucessivos e mediante a renda mensal de Esc. 75.000$00, pagável nas condições que vinham vigorando em face do contrato outorgado no Notariado Privativo desta Câmara em 19 de Dezembro de 1950 (...), contrato esse que vigora quanto a todo o mais que no presente não fica expresso”.

9 - O segundo declarou que “aceita o presente contrato nas condições referidas”.

10 - Devido a telhas partidas, o imóvel apresenta infiltrações no telhado, visíveis na madeira da forra sob as telhas e nas paredes, com maior incidência na parte do edifício voltada a poente.

11 - O edifício apresenta paredes exteriores com rachas, fissuras e empolamento os quais propiciam infiltrações.

12 - Em resultado das infiltrações referidas em 10) e do estado das paredes exteriores referido em 11), os tetos do último piso, da sala poente do segundo andar e do canto da sala norte/poente situada no primeiro andar encontram-se degradados, o mesmo sucedendo com as paredes interiores do último piso e as do canto da sala norte/poente do primeiro andar.

13 - Devido ao desaparecimento da tinta de proteção, os gradeamentos exteriores apresentam ferrugem: a) ao nível do segundo andar: nas duas janelas da sala norte/nascente voltadas para nascente, e nas janelas do vão voltado a poente da sala norte/poente e do vão da sala nascente; b) ao nível do primeiro andar: nas janelas das salas nascente/norte, poente/norte, sul/poente, assim como na varanda da sala poente.

14 - As caixilharias das janelas/portadas encontram-se degradadas: a) ao nível do segundo andar: nas salas norte/poente, sul/poente e a sul; b) ao nível do primeiro andar: na varanda a norte, nas salas norte/poente, sul/poente, sul, nascente, poente bem como as dos dois vãos do bar.

15 - As caixilharias das salas sul/poente do segundo andar, das salas norte/poente e nascente do primeiro andar encontram-se calafetadas com fita-cola.

16 - As caixilharias da sala norte/poente a poente, os peitoris e ombreiras dos vãos da sala sul, todas situadas ao nível do primeiro andar, encontram-se apodrecidos.

17 - Os peitoris e ombreiras dos vãos da sala sul do primeiro andar apresentam infiltrações.

18 - Os pavimentos da sala situada entre o atendimento e o arquivo e da sala a nascente, ao nível do rés do chão, encontram-se apodrecidos devido às infiltrações.

19 – (passou a não provado)

20 - Os restantes pavimentos do prédio encontram-se desgastados pela utilização intensiva decorrente da circulação de pessoas e movimentação de cadeiras.

21 - As tomadas situadas ao fundo das escadas, nas salas norte/poente e sul/poente do primeiro andar e na sala sul do segundo andar encontram-se soltas ou em mau estado.

22 – (passou a não provado)

23 - Para debelar as infiltrações a nível do telhado é necessário proceder à substituição das telhas partidas, reparar peças estruturais, algerozes, beirados, empenas e caleiras, bem como impermeabilizar as paredes nas zonas afetadas.

24 - As paredes exteriores do prédio necessitam de lavagem e pintura, precedida esta de reparação das patologias referidas em 11) através de raspagem de tinta, picagem de rebocos soltos, colocação de reboco nas zonas picadas, regularização das superfícies e subsequente impermeabilização.

24.A - Os gradeamentos exteriores do edifício referidos em 13 necessitam de tratamento e pintura. Os gradeamentos exteriores do edifício necessitam de tratamento, designadamente, de aplicação de primário e subsequente pintura.

25 - A nível das caixilharias é necessário substituir as partes apodrecidas, soltas e deformadas pelas infiltrações e, a nível geral, realizar calafetagem e pintura.

26 - A reparação dos tetos e paredes interiores afetados pelas infiltrações passa pela substituição do material nas áreas com patologia, regularização das superfícies e pintura da divisão onde se integram.

27 - É necessário proceder à substituição das madeiras apodrecidas ao nível do pavimento, à recuperação das partes que se encontrem soltas e com juntas abertas, com posterior envernizamento/acabamento semelhante ao existente na restante divisão.

28 - É necessário rever a situação das tomadas soltas referidas em 21. e dos fios da rede elétrica com fita-cola.

31 - As obras referidas em 28) são necessárias para evitar riscos de curto circuito/choque elétrico.

16. Factos não provados– como apurados pelas instâncias:

a) o edifício identificado em 1) é de 1897;

b) as canalizações e o mobiliário sanitário precisam de reparação e substituição;

c) existem vidros danificados;

d) as paredes interiores e tetos terão de ser reparados com refechamento de fissuras e rachas;

e) a rede de água e saneamento tem de ser revista, incluindo reparação ou substituição de canalização, tubagens, acessórios e louças sanitárias.

e) existem zonas do pavimento com problemas de fixação e encaixe (19).

f) existem partes da rede elétrica e de telefones instaladas no exterior das paredes sem qualquer proteção (22).

De Direito

17. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso e devendo limitar-se a conhecer das questões e não das razões ou fundamentos que àquelas subjazam, conforme previsto no direito adjetivo civil - arts. 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1, ex vi, art.º 679.º, todos do Código de Processo Civil.

As questões objecto do recurso são as seguintes:

1. Saber se existiu excesso de pronúncia gerador da nulidade nos termos da alínea c) do n.º do n.º1 artigo 674.º do CPC e alínea d), segunda parte, do n.º1 do artigo 615.º do CPC;

2. Saber se a decisão recorrida violou a lei - no artigo 405.º do C.Civ.

18. Questão relativa à nulidade por excesso de pronúncia

Dizem os recorrentes que o tribunal não podia conhecer da questão relativa ao sentido das cláusulas quinta e sétima do contrato de arrendamento porque apenas se havia colocado a questão da sua validade. Por esse motivo o tribunal terá incorrido em excesso de pronúncia.

O tribunal recorrido teve oportunidade de analisar, em conferência, a imputada nulidade dizendo que a mesma não ocorreu.

Aí se explicou o sentido de excesso de pronúncia e quais os limites dos poderes de conhecer de direito por parte dos tribunais, nos seguintes termos:

“…não estamos perante uma nulidade do acórdão, pois o excesso de pronúncia, ora invocado pelos autores, não ocorre. E não ocorre uma vez que, estando em causa o fundamento da ação no recurso interposto pela ré, o tribunal da Relação não pode ver afastado da interpretação das cláusulas que esse fundamento consubstanciam, interpretação essa que se traduz na aplicação de regras de Direito, relativamente às quais o tribunal não depende das alegações das partes - artigo 5.º, n.º 3 do Código de Processo Civil – CPC.”

O tribunal recorrido tem razão. A questão do sentido interpretativo das cláusulas do contrato podia – e devia – ser conhecida pelo tribunal, uma vez que a acção visava uma condenação em que a pretensão derivava da aplicação das cláusulas, que só podem ser devidamente aplicadas após se interpretar o seu sentido.

Improcede a questão da nulidade.

19. Entrando na análise da segunda questão objecto do recurso - saber se a decisão recorrida violou a lei - no artigo 405.º do C.Civ

19.1. A questão em causa pretende-se com o seguinte: saber a quem competia realizar as obras de conservação do edifício arrendado e como devem ser interpretadas as cláusulas quinta e sétima do contrato que, em ambas as instâncias, foram consideradas válidas.

Para responder a estas questões, disse o tribunal recorrido:

“Na apelação o réu sustenta que no contrato de arrendamento aqui em causa (celebrado em 11.03.1982) “ficou previsto que, quanto a tudo o que no mesmo não ficou expresso, vigoraria o estabelecido no contrato celebrado em 19.12.1950 entre o então proprietário e o recorrente e que teve por objeto o mesmo prédio” e, em razão dessa previsão foram repristinadas, entre outras as seguintes cláusulas do primeiro contrato: “as reparações da conservação de todo o edifício ficam por conta da Câmara que as fará sempre que necessárias à conservação e bom aspeto do mesmo”; “todas e quaisquer obras que, além das reparações aludidas, for preciso executar no edifício, serão da conta da Câmara e com prévio consentimento por escrito do senhorio”. Sucede – prossegue o recorrente – que “da consideração conjugada do estabelecido nos artigos 1036, 1038, 1092 e 1106 do Código Civil à data em vigor, e em especial do disposto na alínea b) do artigo 1031 do referido Código, resulta que recaía sobre o senhorio a obrigação de conservação do prédio arrendado” e, perante a “falta de previsão no sentido de que o conteúdo da obrigação em causa do senhorio podia ser alterado ou afastado por convenção das partes, não podia a responsabilidade pela execução de obras de conservação, legalmente imposta ao senhorio, ser transferida para a esfera jurídica do arrendatário, sob pena de nulidade da atinente cláusula, nos termos do disposto nos artigos 280 e 294 do Código Civil”.

Daí que, conclui o apelante, aquelas cláusulas estão feridas de nulidade, devem ter-se por não escritas e, “impondo-se concluir in casu pela inexistência de “estipulação em contrário”, é aos recorridos, senhorios do contrato de arrendamento em causa, que, conforme o disposto no referido atual artigo 1074 do CC, compete executar/pagar as obras de conservação do prédio”.

Respondendo especificamente a esta questão, os apelados (Autores) sustentam a bondade do decidido e esclarecem, em síntese:

“- À data da celebração do contrato, março de 1982, o regime em vigor não invalidava as cláusulas quinta e sétimas do contrato, que impunham a obrigação da realização das obras ao arrendatário;

- diversamente ao que acontece nos contratos de arrendamento habitacionais mais comuns, o senhorio tem uma posição contratual vulnerável perante um arrendatário que é um Município, posição que tem de ser acautelada.

- Não é aceitável, e é abusivo, que um Município, ao fim de 40 anos de vigência de um contrato, venha só agora, pôr em causa a validade das cláusulas;

- A própria Apelante admite no seu requerimento de pedido esclarecimentos ao Perito junto aos autos no dia 23 de fevereiro de 2022, que realizou algumas obras de conservação no edifício, porquanto, por constituir um abuso do direito, a invalidade, a existir (o que não se verifica) jamais poderia assim ser invocada”.

A sentença recorrida abordou a questão.

Depois de aturada resenha sobre a legislação que foi vigorando [(...) Na redação dada pelo DL n.º 47.344 de 25 de Novembro de 1966, no que diz respeito a obras, o Código Civil limitava-se a estipular: - no artigo 1036.º “1. se o locador estiver em mora quanto à obrigação de fazer reparações ou outras despesas, e umas ou outras, pela sua urgência, se não compadecerem com as delongas do procedimento judicial, tem o locatário a possibilidade de fazê-las extrajudicialmente, com direito ao seu reembolso; 2. quando a urgência não consinta qualquer dilação, o locatário pode fazer as reparações ou despesas, também com direito a reembolso, independentemente de mora do locador, contanto que o avise ao mesmo tempo”; -artigo 1038.º alínea e) como obrigação do locatário “tolerar as reparações urgentes, bem co- mo quaisquer obras ordenadas pela autoridade pública”; - artigo 1092.º: “é lícito ao inquilino realizar pequenas deteriorações no prédio arrendado, quando elas se tornem necessárias para assegurar o seu conforto ou comodidade; mas deve repará-las antes da restituição do prédio, salvo estipulação em contrário”; - artigo 1106.º: “quando o senhorio seja compelido administrativamente a fazer obras não destinadas à conservação do prédio nem determinadas por defeitos de construção, caso fortuito ou de força maior, tem o direito de exigir do arrendatário um aumento de renda, na base do juro de cinco por cento sobre a quantia despendida”. No que diz respeito às obrigações do locador, o artigo 1031.º previa, como atualmente, de forma sintética a entrega da coisa locada ao locatário e assegurar-lhe o gozo desta para os fins a que a coisa se destina. Depreende-se das normas citadas que a obrigação de reparação do locado impendia sobre o locador sempre que necessárias ao gozo do imóvel para a finalidade contratual. No entanto, não havia qualquer norma que impedisse a convenção das partes noutro sentido. A Lei n.º 46/85 de 20 de setembro, introduziu alterações neste domínio relativamente aos contratos de arrendamento à habitação prevendo no artigo 16.º: “1- são obras de conservação, a cargo do senhorio, as obras de reparação e limpeza geral do prédio e suas dependências e todas as intervenções que se destinem a manter ou a repor o prédio com um nível de habitabilidade idêntico ao existente à data da celebração do contrato e as impostas pela Administração, face aos regulamentos gerais ou locais aplicáveis, para lhe conferir as características habitacionais existentes ao tempo da concessão da licença de utilização, sem prejuízo do estabelecido nos artigos 1043.º e 1092.º do Código Civil; 2- constituem obras de beneficiação todas as intervenções não referidas no número anterior nem determinadas por defeitos de construção, caso fortuito ou caso de força maior”, prevendo o n.º 1 do artigo 17.º que se o senhorio fosse compelido administrativamente a fazer obras de beneficiação tinha direito a exigir do inquilino um ajustamento da renda para além do determinado pelas atualizações anuais e pela correção extraordinária da renda previstas nesse diploma. Por outro lado, o artigo 18.º previa que sempre que as obras de beneficiação fossem realizadas a pedido do inquilino ou por acordo das partes, haverá lugar ao ajustamento no artigo 17.º, mas esse regime só seria aplicável se tais pedido e acordo constassem de documento escrito, com discriminação das obras a realizar. O artigo 19.º dispunha que, a requerimento do município interessado, o Ministério do Equipamento Social podia, por despacho, suspender a aplicação do disposto nas duas referidas normas aos arrendamentos de prédios sujeitos a trabalhos de renovação urbana, nos termos da alínea c) no n.º 2 do artigo 18.º do DL n.º 98/84 de 2 de março, aplicando-se, neste caso, o que fosse especificamente determinado. Em contrapartida, o artigo 21.º estabelecia que quando o senhorio não executasse as obras de conservação ou de beneficiação no prazo fixado pela câmara municipal, esta poderia deliberar, por sua iniciativa ou a requerimento do inquilino, precedendo vistoria, ocupar o prédio, de harmonia com o Regulamento Geral das Edificações Urbanas, para o efeito de mandar proceder à sua execução imediata, sendo o seu pagamento realizado após a sua realização em prestações mensais até ao valor de 70% da renda, durante o tempo necessário ao reembolso integral das despesas efetuadas e respetivos juros ou mediante cobrança coerciva, na falta de pagamento voluntário, tendo por título executivo certidão passada pelos serviços municipais onde constasse o quantitativo global das mesmas, respondendo unicamente pela dívida, enquanto o fogo se encontrasse arrendado, a totalidade das rendas vencidas desde a data da notificação prevista no artigo 16.º e as vincendas, até ao reembolso integral, com os respetivos juros. De acordo com o n.º 5 do mesmo preceito, admitia-se que, caso a câmara municipal não iniciasse as obras no prazo de 120 dias a contar da receção do requerimento do inquilino, este poderia proceder à sua execução, devendo, para o efeito, obter previamente da câmara municipal um orçamento do respetivo custo e comunica-lo ao senhorio por carta registada com aviso de receção, orçamento esse que representaria o valor máximo da responsabilidade daquele, prevendo o n.º 7 que, na falta de pagamento, o inquilino poderia fazer-se pagar das despesas efetuadas e respetivos juros através de dedução na renda, até ao limite de 70% da mesma, durante o tempo necessário ao reembolso integral. O Regime do Arrendamento Urbano aprovado pelo DL n.º 321-B/90 de 15 de outubro, conhecido como RAU, que entrou em vigor 30 dias após a sua publicação, estatuiu, no artigo 11.º, que podem ter lugar nos prédios urbanos: a) obras de conservação ordinária que correspondem a: reparação e limpeza geral do prédio e suas dependências; obras impostas pela Administração Pública, nos termos da lei geral ou local aplicável, e que visem conferir ao prédio as características apresentadas aquando da concessão da licença de utilização; em geral, obras destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração; b) obras de conservação extraordinária: as ocasionadas por defeito de construção do prédio ou por caso fortuito ou de força maior, e, em geral, as que não sendo imputadas ações ou omissões ilícitas perpetradas pelo senhorio, ultrapassem, no ano em que se tornem necessárias, dois terços do rendi- mento líquido desse mesmo ano; c) obras de beneficiação: todas as que não estejam abrangidas nas anteriores. Os artigos 12.º e 13.º do RAU estabeleceram que as obras em causa ficavam a cargo do senhorio, no primeiro caso, sem prejuízo do disposto no artigo 1043.º do Código Civil e no artigo 4.º do diploma em referência, os quais preveem que o locatário é obrigado a manter e restituir a coisa no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato, concretamente, pequenas deteriorações consideradas lícitas quando se tornem necessárias para assegurar o seu conforto ou comodidade, ficando obrigado a repara-las antes da restituição do prédio, salvo estipulação em contrário; por sua vez, as segundas e terceiras dependiam da ordem da sua execução pela câmara municipal competente, nos termos das leis administrativas em vigor ou de acordo escrito das partes no sentido da sua realização, com discriminação das obras a efetuar. Os artigos 15.º e 16.º do RAU, por sua vez, previram para as obras extraordinárias ou de beneficiação o mesmo regime exposto quanto ao artigo 21.º da Lei no 46/85. (...)

Sistematicamente inserido das disposições relativas aos arrendamentos para comércio ou indústria, o artigo 120.º do RAU, na redação introduzida pelo DL n.º 257/95 de 30 de setembro, também aplicável aos contratos para o exercício de profissões liberais e para qualquer aplicação lícita, por via do preceituado nos artigos 121.º e 123.º n.º 1, estatui, no seu n.º 1, que as partes podem convencionar, por escrito, que qualquer dos tipos de obras a que se refere o artigo 11.º fique, total ou parcialmente, a cargo do arrendatário; previu, no n.º 2, que a realização de obras determinadas pelas autoridades administrativas em função do fim específico constante do contrato, quando devam ser suportadas pelo arrendatário, não carece de autorização do senhorio e, no n.º 3, que salvo cláusula em contrário, quando o arrendatário suporte o custo das obras, deve o senhorio indemnizá-lo, no termo do contrato, de acordo com as regras do enriquecimento sem causa. No entanto, o artigo 6.º do DL 257/95 estatuiu que que as suas disposições não se aplicavam aos contratos celebrados antes da sua entrada em vigor. A propósito destas norma, Pinto Furtado considerou tratar-se de um abrandamento das obrigações do senhorio acompanhando a evolução legislativa no sentido do retorno à autonomia privada. Com efeito, atualmente, o artigo 1074.º do Código Civil, introduzido pela Lei n.º 6/2006 de 27 de Fevereiro, com a redação da Lei n.º 13/2019 de 12 de Fevereiro, embora continue a estabelecer que cabe ao senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, permite estipulação em contrário, precisando, no n.º 2, que o arrendatário apenas pode executar quaisquer obras quando o contrato o faculte ou quando seja autorizado, por escrito, pelo senhorio, excetuando as situações previstas no artigo 1036.º e no artigo 22.º-A do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo DL n.º 157/2006, de 8 de agosto, reportadas a reparações e despesas urgentes ou urgentíssimas em que haja mora do senhorio, prevendo, também, a possibilidade de compensação pelas obras licitamente feitas, no final do contrato, nos termos previstos para as benfeitorias realizadas por possuidor de boa fé. O artigo 59.º da Lei n.º 6/2006 previu, no n.º 1, que, o NRAU se aplica às relações contratuais constituídas que subsistam na data da sua entrada em vigor, 120 dias após a sua publicação, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias e o no 3 que as normas supletivas contidas no NRAU só se aplicam aos contratos celebrados antes da sua entrada em vigor quando não sejam em sentido oposto ao de norma supletiva vigente aquando da celebração, caso em que é essa a norma aplicável. As normas transitórias previstas nos artigos 27.º a 58.º da Lei n.º 6/2006, aplicáveis aos contratos de arrendamento para habitação celebrados antes da entrada em vigor do RAU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro e aos contratos para fins não habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro, dizem respeito ao regime das benfeitorias, atualização das rendas e transmissão por morte. Por outro lado, as normas atinentes a obras não podem considerar-se disposições supletivas, no sentido de apenas se destinarem a definir o regime no caso de não previsão pelas partes (...)] para concluir que “À luz do regime legal em vigor à data da sua celebração não havia impedimento a tal cláusula, nem tão pouco com entrada em vigor da Lei n.º 46/85 visto que as normas analisadas apenas visavam o arrendamento habitacional; se é certo que, no âmbito do RAU, na doutrina e na jurisprudência se discutia se as partes podiam estipular no contrato que as obras de conservação do prédio ficavam a cargo do locatário, predominando a tese defensora da resposta negativa, que pugnava pela invalidade de uma tal cláusula, o NRAU prevê claramente a possibilidade de as partes disporem de forma distinta, não havendo dúvida que este último é o regime a atender para a solução do presente litígio”.

Feita a explicação do raciocínio operado pela 1ª instância e da conclusão que aí se ficou – as cláusulas relativas às obras são válidas – passou a expressar a sua própria opinião, dizendo:

“Nesta sede, acompanhamos as considerações feitas pela primeira instância e a conclusão retirada, ou seja, que as cláusulas relativas às obras, fixadas no contrato que vigora entre as partes, e ao qual são de aplicar as normas resultantes do NRAU são válidas. Acrescentamos que, como sustentam os recorrentes, a invocação da nulidade das cláusulas, decorrido todo o tempo em que vigorou o contrato, sempre seria um exercício abusivo do direito a essa invocação.”

Com esta nota – e também com o facto de o objecto do recurso não incluir a questão da validade das cláusulas em causa, o que nos levará a não reanalisar a questão – vejamos agora o que foi o entendimento do tribunal recorrido sobre o seu sentido. Disse então:

“Importa, no entanto, indagar do sentido preciso das cláusulas, cláusulas que determinam serem da responsabilidade do arrendatário a realização/pagamento das obras de conservação do locado.”

Explicou qual o sentido das cláusulas dado na sentença:

“A propósito, a sentença refere ainda que das cláusulas resulta ter sido intenção das partes “colocar a cargo do Município as obras paulatinamente necessárias à manutenção do edifício, por forma a que o mesmo se mantivesse em bom estado de conservação, mas, igualmente, com bom aspeto, cabendo-lhe uma intervenção ativa, designadamente, para realizar outras obras que extravasassem a conservação ordinária, entrando em obras de beneficiação, mas, nesse caso, exigindo-se a autorização prévia e escrita do senhorio” e acrescenta: “Sempre se dirá que não tratamos de um inquilino “comum” nem de um arrendamento “ordinário”, mas antes precisamos de ter presente a inexistência da usual vulnerabilidade do sujeito para quem o gozo temporário foi cedido e salientar o fim visado, a consistir no acolhimento de serviços camarários; ora, sendo o Município a entidade que, por excelência, tutela o ordenamento urbanístico, mormente, zelando pela implementação de mecanismos que garantam a higiene, salubridade e segurança do património edificado situado no concelho, não deixa de fazer sentido que aquelas atribuições contratuais fossem previstas naqueles moldes. Por outras palavras, sendo o Município o “especialista”, entenderam as partes que a conservação do edifício ficaria nas suas boas mãos, sendo também de ponderar que estando ali instalados serviços da autarquia, a decisão sobre o na sua prestação à comunidade”.

Mas entendeu que as cláusulas deviam ser interpretadas de outro modo, porque:

- 1º argumento – não se apurou a vontade efectiva das partes do contrato;

- 2º argumento – qual a relação que existiria entre quem realizaria as obras e quem suportaria os seus custos, na lógica das referidas cláusulas.

“Estão em causa as cláusulas 5.ª (“as reparações da conservação de todo o edifício ficam por conta da Câmara que as fará sempre que necessárias à conservação e bom aspeto do mesmo”) e 7.ª (“todas e quaisquer obras que, além das reparações aludidas, for preciso executar no edifício, serão da conta da Câmara e com prévio consentimento por escrito do senhorio”), ainda que não seja de ignorar o que se clausulou na cláusula 6.ª (“a Câmara compromete-se a entregar no fim do arrendamento, ao senhorio, em bom estado de conservação, o referido prédio e pertences mencionados”).

Em primeiro lugar, diga-se que seria de difícil compreensão aceitar que carecem de consentimento escrito do senhorio obras que o senhorio possa impor ao arrendatário (cláusula 7.ª), mas além disso, e mesmo em relação à cláusula 5.ª, o sentido da mesma não pode estar desligado do contrato em que se insere, um contrato de arrendamento.

No arrendamento, o senhorio obriga-se a proporcionar ao arrendatário, mediante retribuição, o gozo temporário de uma coisa imóvel. O senhorio tem como obrigação assegurar o gozo da coisa locada para os fins que a mesma se destina. O arrendatário, por sua vez, não pode fazer uma utilização imprudente da coisa arrendada, deve tolerar reparações urgentes ou outras ordenadas pela autoridade pública (artigos 1022, 1023, 1031, al. b) e 1038, al. e) do Código Civil – CC) e deve restituir a coisa “no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato” (artigo 1043, n.º 1 do CC). O arrendatário pode realizar pequenas deteriorações no prédio, necessárias ao seu conforto e comodidade, mas tem que, salvo estipulação em contrário, repará-las antes da restituição do prédio (artigo 1073, n.ºs 1 e 2 do CC). Quanto a obras, e salvo estipulação em contrário, o senhorio tem que executar as de conservação, ordinárias ou extraordinárias, “requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato” (artigo 1074, n.º 1 do CC). Por fim, as partes podem resolver o contrato de arrendamento, nos termos gerais, “com base em “incumprimento pela outra parte” (1083, n.º 1 do CC).

Feitas as referências anteriores e no seu enquadramento, renova-se a questão que deixámos: a cláusula que determina a realização/pagamento das obras de conservação do locado dispensa o senhorio do seu pagamento/realização ou impõe ao arrendatário a realização das obras que o senhorio entenda necessárias?

Na primeira hipótese mantém-se o gozo do locado, mas a expensas do arrendatário; na segunda hipótese protege-se, ou protege-se também, o direito de propriedade do senhorio e a integridade do bem arrendado. Não se olvide, no entanto, que o arrendamento é sempre temporário, que o gozo é, naturalmente, o do arrendatário e que este, terminado o contrato, tem de entregar o imóvel no estado em que o recebeu, sem prejuízo das deteriorações decorrentes do prudente uso/gozo.

Se o arrendatário, como resulta da lei, tem que entregar o locado no (bom) estado em que se encontrava, aquando do início do arrendamento, pode o senhorio exigir-lhe obras antes desse momento de entrega, e independentemente do momento, ou seja, na pendência do contrato de arrendamento?

Confessamos nunca termos visto uma pretensão semelhante à que os recorridos formulam com a presente ação, mas admitimos que já tenha ocorrido. De todo o modo, esse facto dá nota da singularidade do caso presente: exigir obras ao arrendatário na pendência do contrato de arrendamento e sem que este, o arrendamento, esteja em causa.

Dir-se-á que o recorrente se comprometeu à realização das obras, através das cláusulas que já considerámos válidas. Assim é, mas o que tentamos apurar é o correto sentido da obrigação assumida, pois esse sentido não pode deixar de ser compreendido.”

E veio a concluir:

“E, em conclusão, entendemos que, na pendência do contrato de arrendamento, o senhorio não pode impor ao arrendatário a realização de obras ou, dito de outro modo, o que resulta das cláusulas aqui em questão é que o senhorio não tem de fazer/pagar as obras de conservação, mas não as pode impor, sob pena de redefinir um direito de gozo alheio ou de, apenas, salvaguardar a integridade e valor da sua propriedade, propriedade cujo gozo cedeu temporariamente e como contrapartida do recebimento de uma renda.

A nossa conclusão, sempre ressalvando melhor opinião, é que os recorridos não têm legitimidade substantiva, não têm o direito, de exigir a realização de obras ao recorrente.”

19.2. Como já se disse, o aresto teve um voto de vencido.

Aí se procurou chamar a atenção para a razoabilidade da justificação de os AA. pretenderem que os RR: façam obras de conservação do local arrendado quando o contrato de arrendamento ainda se mantém em vigor.

Chamou-se à atenção para o interesse e legitimidade do proprietário em ver cumprida a cláusula contratual na pendência da vigência do contrato, com estas explicações que selecionamos:

“… Na nossa perspetiva, a cláusula quinta do primitivo contrato de arrendamento transfere para o locatário a obrigação de fazer “as reparações de conservação” enquanto, por força da cláusula sétima, as restantes obras e só estas ficam sujeitas a prévio consentimento do senhorio.”

(….)

A nosso ver, o nascimento da obrigação de realização de obras de conservação aferir-se-á de modo objetivo, de acordo com um critério de necessidade, devendo a concretização desta necessidade aproximar-se do conceito das benfeitorias necessárias (artigo 216º, primeira parte do nº 3, do Código Civil).

A cláusula que respeita às obras de conservação não visa apenas assegurar o gozo do locado ao arrendatário, visando também a defesa da integridade do locado, tutelando o interesse do locador na conservação do bem arrendado ao longo do tempo por que vai perdurando o arrendamento. E porque assim é, como se refere no artigo 23º da petição inicial, a renda era apenas atualizada de acordo com os coeficientes legais e, provavelmente, atenta a obrigação do locatário realizar as obras de conservação do arrendado, o valor inicial da renda terá sido fixado em montante inferior ao que seria se não existisse essa obrigação.

Anote-se que, legalmente, todo e qualquer dono de bem imóvel, quer esteja ou não no seu gozo, está obrigado à realização periódica de certas obras, (veja-se o artigo 9º do Regulamento das Edificações Urbanas), razão pela qual o senhorio, mesmo na pendência do arrendamento, tem interesse no cumprimento da cláusula quinta pelo arrendatário, sob pena de poder ser responsabilizado por tal omissão (veja-se o artigo 492º do Código Civil), além de se sujeitar à determinação de realização de obras pelo Município, no caso o locatário (artigo 10º do Regulamento das Edificações Urbanas).

Por isso, na nossa perspetiva, os senhorios, por força da aludida cláusula quinta, têm o direito de exigir do arrendatário a realização coerciva das obras de conservação e bem assim das necessárias à manutenção do bom aspeto do mesmo, pelo que confirmaria a decisão recorrida.”

19.3. Que dizer?

O que depreendemos do sentido das cláusulas analisadas está mais conforme com o voto de vencido do que com a interpretação do tribunal recorrido.

Não se apurando a vontade efectiva das partes, é de aplicar o regime de interpretação das declarações negociais – art.º 236.º do CC – procurando o sentido que um declaratário normal daria a estas cláusulas.

E aqui não temos dúvidas que um declaratário normal consideraria que as obras de conservação não relevam só no termo do contrato, mas também na sua vigência. E tanto mais é assim que se não fosse estabelecido que tais obras são da responsabilidade do inquilino, seria ele próprio a exigir do senhorio a conservação do locado por meio de obras de conservação a realizar na pendência do contrato, como sucede na maioria dos casos em que os imóveis precisam de obras deste tipo.

Assim, a cláusula quinta comporta aplicação na vigência do arrendamento.

Na vigência do contrato é absolutamente razoável que as partes acordem em manter o imóvel em bom estado de conservação e que essa conservação seja feita pelo inquilino, como estabelecido. Há interesse do senhorio na boa conservação do seu bem durante a vigência do contrato, até pelos motivos indicados no voto de vencido – não está excluída a responsabilidade do senhorio na adequada manutenção do imóvel.

Estando provado que o imóvel carecia de obras de conservação, de acordo com o critério de equiparar essa conservação às benfeitorias necessárias [“critério de necessidade, devendo a concretização desta necessidade aproximar-se do conceito das benfeitorias necessárias (artigo 216º, primeira parte do nº 3, do Código Civil)”, conforme voto de vencido] e estando estipulado que as mesmas devem ser realizadas pelo arrendatário, deve ser julgada procedente a acção, nos termos constantes da sentença.

Procede assim a questão suscitada.

III. Decisão

Pelos fundamentos indicados, é concedida a revista e repristinada a sentença.

Custas pelo recorrido, vencidos na questão substantiva, em 75% e pelos recorrentes em 25%, que foram vencidos na questão da nulidade.

Lisboa, 16 de Novembro de 2023

Relatora: Fátima Gomes

1º Adjunto: Dr Ferreira Lopes

2º Adjunto: Dr Nuno Ataíde das Neves