PRINCÍPIO DA IMEDIAÇÃO
PRINCÍPIO DA ORALIDADE
PROIBIÇÃO DA "REFORMATIO IN PEJUS"
CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA
Sumário

I - Importa atentar que para o apuramento de factos, a atribuição de credibilidade feita pela primeira instância a uma pessoa e não a outra, desde que não vá contra as regras da lógica e da experiência comum, não pode ser postergada pelo tribunal superior que não gozou da imediação e da oralidade própria da audiência de julgamento; fazê-lo, seria violar o princípio da livre apreciação da prova plasmado no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
II – No caso em apreço, ao longo de todo o processo, nomeadamente na audiência de julgamento, foi possível perceber que o arguido não quis atingir a dignidade da ofendida, ou que tenha afetado a saúde física e psíquica da mesma; como se veio a apurar, tratou-se de um difícil fim de relação para ambos e o ressurgimento do conflito surge já no âmbito relacionado com o direito de visitas do filho comum; por isso, nenhuma censura merece a decisão recorrida no que concerne à matéria de direito que conduziu à absolvição do arguido pela prática do crime de violência doméstica, pois os factos apurados são insuficientes para o preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do crime de violência doméstica.
III - O recorrente Ministério Público conformou-se com a decisão do Tribunal a quo no sentido do arquivamento dos crimes de difamação e injúrias relativamente às expressões e juízos de valor proferidas após outubro de 2019 e não colocou subsidiariamente a questão da responsabilidade criminal do arguido para o caso de não provimento da sua posição quanto ao crime de violência doméstica; nessa medida e em abono do princípio da proibição da “ reformatio in pejus “, com tradução no artigo 409.º n.º 1, do Código de Processo Penal, como um princípio geral de direito de processo penal, enquanto direito de defesa, consagrado no art.º 32.º, n.º 1, da Constituição, em nome do direito a um processo justo, não pode esta instância ressuscitar crimes cujo arquivamento não foi questionado.
IV - Posto que os pormenores da altercação não sejam muitos, não se provando sequer que a origem de tal desentendimento se ficou a dever a qualquer comportamento da ofendida, nem se afirmando, concomitantemente, um qualquer papel mais ativo da mesma numa eventual confrontação física recíproca que pudesse ter existido, não deve ser afastada aquela exigência acrescida de respeito pressuposta na qualificativa do artigo 132.º, al. b) (agressão a companheira com a qual o arguido residia em situação análoga à dos cônjuges), do Código Penal; cometeu, pois, o arguido o crime de ofensa á integridade física qualificada na pessoa da sua ex-companheira, previsto no artigo 145.º, n º 1, a), e n.º 2, com referência ao artigo 132.º, n. º 2, b), do Código Penal.

Texto Integral

Processo nº 511/20.1PAVLG.P2

Relator: Paulo Costa.
Adjuntos: Paula Natércia Rocha
Pedro Afonso Lucas




Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto


I. RELATÓRIO
1. No Processo Comum (Singular) nº 511/20.1PAVLG (do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Criminal de Valongo), em que é arguido AA foi proferida sentença, onde se decidiu nos seguintes termos (transcrição, na parte relevante):
“a) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alíneas b) e c) e n.º 2, alínea a) do Código Penal.
b) Convolar o despacho de pronúncia deduzido contra o arguido AA e considerar a factualidade provada suscetível de integrar a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º do Código Penal, de um crime de difamação, previsto e punido pelo artigo 180.º do Código Penal e de um crime de injúria, previsto e punido pelo artigo 181.º do Código Penal.
c) Julgar extinto o procedimento criminal por falta de legitimidade do Ministério Público para a prossecução da ação penal, relativamente aos crimes indicados em b).

*
Sem custas.”


2. Inconformado com o assim decidido, interpôs recurso o Ministério Público finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição):
1ª Decidiu-se, na douta sentença recorrida, absolver o arguido AA do crime de violência doméstica, p. e p. pelo art° 152°, nº 1, alínea b) e c) e n.º 2 a) do Código Penal, crime, esse, que lhe era imputado na acusação pública deduzida nos autos pelo Ministério Público.
2ª Funda-se o presente recurso, não só na discordância perante o sentido absolutório da mencionada sentença, no tocante ao crime de violência doméstica, p. e p. pelo art° 152° do Código Penal, imputado ao arguido, sem sequer considerar uma convolação no crime de ofensa à integridade fica qualificada, p. e p., pelo artigo 145°, n.º 2 do Código Penal, como na constatação de que, na sentença recorrida, foram dados como não provados factos que deveriam ter sido dados como provados a esse propósito.
3ª Concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (cfr. artigo 412º, n.º 3, alínea a), do Código de Processo Penal), por terem sido dados como não provados:
A) Desde o início, o arguido manteve relação conflituosa e desgastante para a pessoa da vítima.
B) O arguido dava constantemente início a discussões sem motivo relevante e por causa da limpeza da casa e nelas insultava a vítima: “sua badalhoca”, “puta”, e algumas vezes a colocou fora de casa, impedindo-a de permanecer na sua própria residência.
C) Impedia-a de estar com amigos, principalmente do sexo oposto.
D) Noutras ocasiões, o arguido chegou a quebrar objetos.
E) Em maio de 2019, na hora de almoço, no interior da habitação comum e no decurso de mais uma discussão iniciada pelo arguido, o mesmo agrediu-a (colocando-lhe a mão no pescoço e empurrando-a), sendo que vítima estava com o filho ao colo.
F) A partir de setembro de 2019, o arguido recrudesceu os episódios de confronto verbal agressivo em que insultava e ofendia a vítima.
G) Em 17 de outubro de 2019, na habitação comum, o arguido, em frente ao filho (bebé) de ambos e deu empurrões à vítima (projetando-a contra o sofá e as paredes da sala).
H) Desde a altura da separação até outubro de 2020, o arguido deslocava-se diariamente para a porta da residência da vítima sita na Rua ..., ..., ..., ..., o que se traduziu numa postura de controlo a pretexto de ver o filho.
J) Que o arguido começou a perseguir a vítima, indo ao seu local de trabalho e chegando a falar com colegas de trabalho.
K) Que o arguido disse (à educadora do filho de ambos) que a vítima é uma badalhoca.
M) O arguido observou uma conduta de agressividade física e psíquica, controladora, persecutória e conseguiu perturbar o sossego e tranquilidade da vítima, fragilizá-la na sua liberdade pessoal, assim como atemorizá-la, apesar de a ofendida ser sua ex-companheira, mãe de filho menor.
N) O arguido sabia que afetava a ofendida na sua saúde física e psíquica e atuou querendo atemorizá-la e atingi-la na sua dignidade enquanto ser humano, o que logrou.
4ª Concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (cfr. artigo 412º, n.º 3 alínea b), do Código de Processo Penal):
Declarações em audiência de discussão e julgamento do arguido, da ofendida BB, da testemunha CC (cf. gravação em suporte digital através de sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal Judicial da Comarca de Valongo).
5ª Resulta inequivocamente das declarações do próprio arguido, da ofendida e do depoimento da testemunha CC, conjugados com a demais prova produzida, nomeadamente relatório pericial que o arguido praticou os factos integradores do crime de violência doméstica aqui em apreço, ou, se se entender não estar subjacente na conduta do arguido uma intensidade, uma gravidade intrínseca que justifique a sua autonomização relativamente aos ilícitos que as condutas individualmente consideradas integram, dois crimes de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 145º, n.º 2 do Código Penal.
6ª Ora, tendo em conta tais declarações/depoimentos, não se entende que o arguido tenha sido absolvido do crime de violência doméstica em análise, sem mais.
7ª A ofendida relatou de forma objetiva, embora compreensivelmente emocionada, a forma como tudo se passou, confirmando a factualidade descrita na acusação e as suas declarações foram confirmadas pelo depoimento da testemunha CC, na medida do que lhe era a esta exigido saber.
Testemunha/Vítima: Nós já não nos falávamos, o ambiente já estava mau desde Setembro (…) lembro-me sim de ter o meu filho com oito ou nove meses assistir a gritos, a discussões a bater porta e coisas; eu a tentar pegar nele (filho) e ele (arguido) não me deixava aproximar do me filho empurrou-me varias vezes contra o sofá empurrou-me várias vezes contra a parede que eram paredes em pedra dai eu ter ficado com alguns arranhões, algumas marcas eu tentei fugir e ele colocou o carro dele na porta da garagem para me bloquear a saída, não me deixou sair (…)
Magistrada do Ministério Público: Recorda-se de qual foi o motivo da discussão?
Testemunha/Vítima: Não me recordo provavelmente limpezas ou algo do género, porque 99% das nossas discussões eram acerca disso.
(Minuto 06:36 a 06:42)
Testemunha/Vítima: Ser empurrada constantemente, uma das vezes para cima do sofá e outras tantas contra a parede.
Mma Juíza: Em algum momento quando a senhora está a ser empurrada contra o sofá e as paredes tem alguma reação em relação? Desfere-lhe algum pontapé nas costas?
Testemunha/Vítima: Nas costas não quanto muto e frente para o tentar empurrar. Numa tentativa de me tentar defender.
Eu recordo-me, voltando atrás ao 1º episódio, que eu referi ao bocado de violência mais física, o meu filho tinha 4 meses (…) do AA tinha por habito quando estava chateado ou assim, bater nas coisas ou atirar com as coisas dar muros na parede, partir coisas e ele na altura atirou com uma coisa que era grelhador, que era da minha avó, que já tinha falecido e então disse-lhe “bate com os cornos”.
(minuto 11:50 a 12:40)
Testemunha/Vítima: Lembro-me de nessa altura ele me estar a empurrar pelo pescoço (com a mão aberta) para cima da ilha da cozinha, com o meu filho de 4 meses ao colo. Ele estava a tentar chegar à criança.
Mma Juíza: Durante o tempo que viveram juntos referiu que quando queria saía com as suas amigas. Alguma vez o Sr. AA a proibiu de estar com as suas amigas, alguma vez se sentiu coartada na sua liberdade de sair, de ter redes sociais, de ter amizades?
De ter redes sociais, sim. Eu cheguei a apagar um facebook porque de facto lá está tinha muitos membros do sexo masculino e que ele não permitia.
Mas apagou por ordem do AA?
Testemunha/Vítima: Não foi ordem, foi para evitar chatices!
Mma Juíza: Esses ciúmes não eram de parte a parte tendo em conta que a senhora admitiu que chegou a ver o telemóvel do AA e o computador
Testemunha/Vítima: Se ele não demonstrasse ser tão desconfiado e tanta coisa (…) comecei a desconfiar
Mma Juíza: Nunca se sentiu constrangida de esconder com quem estava a falar ou de justificar com quem ia sair
Testemunha/Vítima: Simplesmente não podia falar porque (…) já sabia que meu deus se ele quisesse descobrir ele descobria e se ele descobrisse que eu falei com quem quer que fosse caía o Carmo e a Trindade
Mma Juíza: Mas falava com quem queria?
Testemunha/Vítima: Acabava eu própria reprimir-me. Não é por ordem dele. Ele não dizia assim- não podes falar - não dizia diretamente. Isso, obviamente, quando acontecia de eu adicionar alguém que fosse homem ele perguntava fica chateado, tu és isso és aquilo (…) chegou a chamar-me puta.
(minuto 46: 30 a 48:52).
Testemunha/Vítima Ele sempre me diminuiu! – (minutos 49:43).
Sempre tive muito baixa autoestima, quando conheceu o AA eu era muito novinha, tinha acabado de sair da faculdade, eu não tive uma estrutura familiar ideal, nem semelhante à do AA (…) e, portanto, eu sempre tive ali ao nível da auto estima uma falha, e VI no AA alguém bem-parecido, alguém sociável, alguém com uma vida estável Advogada Arguido: Apaixonou-se?
Testemunha/Vítima: Perdidamente!
(Minuto 50:48 a 51:46)
Testemunha/Vítima: Ele tinha a faca e o queijo na mão. Ele aproveitava essa minha fragilidade para jogar comigo psicologicamente ele punha-me fora de casa porque ele sabia que era a casa dele e que eu não tinha para onde ir. E andava eu de malas e bagagens ora hoje bate à porta de um ora amanha bate à porta de outro, porque já tenho de vergonha ora amanha bate à porta d e outro ele aproveitava-se muito disto dessa minha fragilidade e mesmo esta minha situação familiar a minha história de vida aproveitava-se muito disto para me picar para me rebaixar ele fazia mesmo sentir que me foi buscar ao lixo e que me salvou e eu só tinha…
Testemunha/Vítima: Nas discussões disse-me presencial, nas discussões disse tu não vales nada se não fosse eu tu ainda estavas lá nem os teus pais te quiseram… (minuto 53:10 a 54: 10).
8ª O bem jurídico do crime de violência doméstica é a proteção da pessoa individual e da sua dignidade humana, isto é, a saúde, devendo este ser entendido como um bem jurídico complexo que abrange a saúde física, psíquica e mental, e que pode ser afetado por toda a multiplicidade de comportamentos que impeçam, dificultem ou afetem a dignidade pessoal do cônjuge.
9ª O tipo objetivo de ilícito do crime de violência doméstica pressupõe que, no caso concreto, exista uma relação familiar ou de grande proximidade.
10ª As situações integradoras deste ilícito criminal podem assumir várias formas: maus-tratos físicos e maus-tratos psíquicos. As aludidas condutas integradoras do ilícito criminal serão todas aquelas que sejam incompatíveis com a dignidade e a liberdade de quem é sujeito passivo.
11ª Os maus tratos psíquicos são, entre outros, os insultos, críticas e comentários destrutivos, achincalhantes ou vexatórios, a sujeição a situações de humilhação, as ameaças, as privações da liberdade, já que constituem danos suficientemente graves para ofender a saúde psíquica e emocional da vítima, incompatível com a dignidade da pessoa humana, representando um aviltamento e humilhação da vítima que não são suficientemente protegidos pelo tipo de crime de injúria e de ameaça -Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 25/01/2023.
12ª Nenhuma dúvida nos resta, salvo o muito respeito devido por opinião diversa, que a douta sentença recorrida efetuou uma incorreta apreciação da prova e violou, como se vê do que precede, o disposto no art° 127° do Código de Processo Penal.
13ª Impõe-se, assim, no nosso modesto entendimento, alterar a matéria de facto constante da douta sentença recorrida, devendo constar dos factos provados (no essencial) os factos que, na dita sentença em análise, foram dados como provados.
14º Não obstante a Mma Juíza ter convolado o crime de violência doméstica por que vinha acusado o arguido num crime de ofensa, difamação e injúria face à ausência de queixa da ofendida absolveu-o por ser legalmente inadmissível o procedimento criminal.
15ª Discordamos veementemente desta posição, afigurando-se-nos que a sentença recorrida enferma, deste modo, do vício insanável a que alude o artigo 410º, n. º2 b) do Código de Processo Penal: contradição insanável entre a fundamentação de fato (matéria de facto dada como provada) e a decisão.
16ª Na verdade a Mma Juíza apesar de elencar como provados factos que por si só são integradores do crime de violência doméstica decide absolver o arguido da prática do aludido ilícito.
17ª Ficando, no nosso modo de ver, comprovados todos os supra referidos elementos típicos, impõe-se a condenação do arguido pela prática, em autoria material, do crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.º 1 alínea b) e c), n.º 2 a) do Código Penal ou, se se entender que a conduta do arguido não apresenta uma gravidade intrínseca que permita o enquadramento na figura dos maus-tratos físicos ou psíquicos que a violência doméstica pressupõe, a condenação pela prática do crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 145º, n.º 2 do Código Penal.
18ª Ao decidir da forma constante da douta sentença ora em causa, o Mmo Juiz violou, no nosso modesto entendimento, o preceituado nos artigos 127º, 410º e 412º do Código de Processo Penal e 152°, n.º 1 alínea b) e c), n.º 2, 145º todos do Código Penal.
19ª Por todo o exposto deverá ser proferido douto acórdão pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto condenando o arguido em conformidade com a alteração da decisão da matéria de facto supra exposta, revogando-se a sentença que absolveu o arguido da prática do crime de violência doméstica ou, se tal não for possível, determinar o reenvio dos autos para novo julgamento (cfr. art. 426º, n.º 1 do Código de Processo Penal).
20ª Este o entendimento que perfilhamos.
V.as Exas, porém, farão a costumada JUSTIÇA.”

O arguido respondeu ao recurso do Ministério Público, pugnando no sentido da sua improcedência e manutenção da decisão recorrida, com a formulação da seguinte conclusão (transcrição):
Em suma,
Citando a sentença: «(...) pese embora o interesse na causa, não se pode falar numa regra ou máxima da experiência que, abstratamente, afirme a falta de credibilidade dos depoimentos dos ofendidos, o que aliás não tem sido o entendimento da nossa doutrina e jurisprudência, pois que, não é pelo facto de ninguém ter presenciado os factos e de termos duas versões diametralmente opostas a propósito dos mesmos, que faz com que o arguido deva ser absolvido com base no princípio “in dubio pro reo”, até porque, um entendimento neste sentido, poderia levantar questões sensíveis ao nível de política criminal, particularmente nos crimes ocorridos fora da presença de terceiros”.
O mesmo pode ser aplicado a contrario. O facto do crime de violência doméstica, no caso, estar associado a um secretismo desmedido devido a falta de testemunhas e versões opostas entre ofendida e arguido, não comprova que se possa valorizar a versão da ofendida em prol da versão do arguido. Igualmente se levantaria questões sensíveis ao nível da política criminal.
Este argumento foi demonstrado, inclusive, pelo arguido em sede de instrução:
“Considera-se duvidoso e, até, alarmante que o Ministério Público considere que se desvalorizou a palavra da ofendida, BB. Nesta senda e se considerarmos o argumento a contrario, estar-se-ia a desvalorizar a palavra do arguido face às restantes provas”.
E, ainda, “Ora considerando que não há razão para emprestar maior credibilidade às declarações da ofendida (pois é parte interessada no desfecho favorável dos presentes autos) relativamente às do arguido (que naturalmente tem interesse contrário), e na ausência de mais prova indiciária consistente, sólida e persuasiva, qual deverá ser o resultado do juízo de prognose que é pedido ao juiz de instrução em sede de instrução?”
Só se pode dar seguimento a um despacho de não pronúncia e, consequentemente, a uma sentença absolutória.
Em verdade, se formos a responder à questão colocada pelo Ministério Público - “... a questão que se coloca e a de saber se, face às provas obtidas reunidas até ao presente momento, dos autos resultam indícios suficientes da prática pelo denunciado de um eventual crime de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º1, alínea b) e c) e n.º2 a) do Código Penal” - a resposta será negativa; não resultam indícios suficientes.
Fazendo-se jus à linha de raciocínio do Ministério Público não obstante, respeitando o processo penal, a lei e o Estado de Direito Português; mas acima de tudo, A JUSTIÇA o que, no caso em concreto, o Ministério Público não acompanha ao interpor recurso ao qual se responde.”

Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que o recurso do Ministério deverá obter provimento.
No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, respondeu arguido, mantendo, no essencial, a posição que anteriormente haviam evidenciado nas respostas aos recursos.
Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Poderes cognitivos do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso:
Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada (artigo 412º, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal[1]), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410.º, n.º 2, do mesmo diploma, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R. I – A Série, de 28/12/1995).
No caso vertente, vistas as conclusões dos recursos, as questões a apreciar são as seguintes:
A) Decorrentes do recurso do Ministério Público:
- Impugnação da matéria fáctica devendo dar-se como provados factos dados como não provados em als. a) a g), l) e n);
- Saber se a decisão recorrida padece do vício da contradição entre a fundamentação e a decisão;
- Enquadramento jurídico dos factos.

2. Decisão recorrida:
Definidas as questões a tratar, vejamos, desde já, o que no acórdão recorrido consta quanto aos factos provados e não provados, bem como quanto à motivação da matéria de facto (transcrição):
Da audiência de julgamento resultaram provados, com relevância, os seguintes factos:
Constantes da acusação pública
1. O arguido foi companheiro da vítima, nascida em .../.../1989, e é educadora de infância.
2. Tal relacionamento iniciou-se em 2012 como namoro e em 2014 iniciaram vida conjunta em união de fato como companheiros.
3. Residiram na Travessa ..., ....
4. Tiveram um filho, DD, nascido em .../.../2018.
5. Estão separados desde outubro de 2019.
6. Em 17 de outubro de 2019, na habitação comum, o arguido, em frente ao filho (bebé) de ambos, deu empurrões à vítima contra a parede.
7. Em resultado dessa agressão, a vítima sofreu arranhões e pisaduras.
8. Em outubro de 2020, o arguido não aceitou que a vítima estivesse em isolamento profilático com o filho menor e que, por via disso, não o pudesse contatar presencialmente.
9. No dia 27/10/2020 o arguido enviou uma mensagem “amanhã quero ir buscar o meu filho para minha casa, caso não deixes vou direto ao tribunal para pedir guarda partilhada, acabou a brincadeira”.
10. No dia 29/10/2020, o arguido enviou uma mensagem em que dizia “se não queres problemas na tua vida nem no trabalho liga-se para conversar”.
11. No dia 12/11/2020, o arguido foi buscar o filho ao colégio na Avenida ..., ..., mas não foi autorizado pelo que enviou mensagens em que escreveu: “és uma falhada, és do mais rasca que existe; és igualzinha à tua mãe e vais ser uma infeliz toda a vida; um dia nem o teu filho te quer!”.
12. No dia 17/11/2020, o arguido disse à educadora de infância do filho que esta era má mãe, que o filho tinha medo dela, era porca, não cuidava da habitação, era uma pessoa muito mal-educada e que proferia palavrões, que a vítima tratava mal a sua avó, do que a vítima teve
conhecimento.
13. No final de novembro de 2020, o mesmo contatou a CPCJ a quem informou que o seu filho estava perigo com a mãe, assim transtornando a vítima.
14. Em novembro de 2020 enviou várias mensagens em que apelidou a vítima de falhada, que não tem escrúpulos, que é ridícula, má mãe e irresponsável.
15.O arguido sabia que afetava a ofendida na sua saúde física, honra e consideração pessoal, o que logrou.
16. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente sabendo serem as suas condutas proibidas e punidas por lei penal.
Das condições sociais e económicas do arguido
17. O arguido viveu em união de facto com a ofendida, de 2014 até outubro de 2019, em habitação propriedade daquele, com adequadas condições de habitabilidade, inserida em espaço tipo “quinta”, em zona tranquila e maioritariamente residencial da freguesia ....
18. Desde a separação, o arguido manteve a mesma residência, sendo o seu agregado composto por si e pelo filho, de 4 anos de idade, que se encontra com o pai, às terças-feiras, quintas-feiras e ao fim de semana de duas em duas semanas (responsabilidades parentais reguladas pelo Tribunal).
19. O arguido AA mantém contactos regulares com a ofendida relativamente aos assuntos relacionados com o filho.
20.Após a separação da ofendida, não estabeleceu qualquer relação de namoro ou união de facto.
21. No mesmo terreno onde se insere a habitação do arguido, reside também a progenitora deste, em casa própria.
22. A nível escolar, o arguido AA menciona completou a licenciatura em engenharia eletrotécnica no Instituto Superior de Engenharia ....
23. Quando terminou a licenciatura o arguido já se tinha iniciado no mercado laboral, como sócio-gerente da empresa denominada “A...”, funções que manteve até 2016.
24.De seguida e até à data de hoje, o arguido exerce atividade laboral como sócio-gerente da empresa denominada “B...”, oficina de mecatrónica montada na sua residência.
25. Relativamente à situação económica, o arguido aufere quantia não concretamente apurada, mas não inferior ao valor médio mensal de € 800,00 (oitocentos euros), fruto da sua atividade laboral.
26. O arguido tem como encargos fixos quantia não concretamente apurada, mas não inferior ao valor mensal médio de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros), relativos ao serviço de fornecimento de água, eletricidade e telecomunicações e, bem assim, relativo à pensão de alimentos e propina escolar do filho.
27. O arguido organiza o seu tempo de forma estruturada, em torno das suas obrigações profissionais, das responsabilidades e do convívio com o filho e na prática de atividades desportivas, nomeadamente, artes marciais, crossfit e ginásio.
Dos antecedentes criminais
28. Ao arguido são desconhecidos antecedentes criminais, constando do respetivo certificado do registo criminal (ref.ª 346335526), que os não tem.
2.2. Factos não provados
Com relevância para a boa decisão da causa, não resultaram provados os seguintes factos:
A) Desde o início, o arguido manteve relação conflituosa e desgastante para a pessoa da vítima.
B) O arguido dava constantemente início a discussões sem motivo relevante e por causa da limpeza da casa e nelas insultava a vítima: “sua badalhoca”, “puta”, “cabra” e algumas vezes a colocou fora de casa, impedindo-a de permanecer na sua própria residência.
C) Impedia-a de estar com amigos, principalmente do sexo oposto.
D) Noutras ocasiões, o arguido chegou a quebrar objetos.
E) Em maio de 2019, na hora de almoço, no interior da habitação comum e no decurso de mais uma discussão iniciada pelo arguido, o mesmo agrediu-a com vários empurrões e com
ambas as mãos apertou-lhe pescoço, sendo que vítima estava com o filho ao colo.
F) A partir de setembro de 2019, o arguido recrudesceu os episódios de confronto verbal agressivo em que insultava e ofendia a vítima.
G) Em 17 de outubro de 2019, na habitação comum, o arguido insultou a vítima de “puta” e “vaca”, em frente ao filho (bebé) de ambos e deu empurrões à vítima para o chão.
H) Desde a altura da separação até outubro de 2020, o arguido deslocava-se diariamente para a porta da residência da vítima sita na Rua ..., ..., ..., ..., o que se traduziu numa postura de perseguição e controlo a pretexto de ver o filho.
I) Que, em outubro de 2020, em virtude de o arguido não aceitar que a vítima estivesse em isolamento profilático com o filho menor e que, por via disso, não o pudesse contatar presencialmente, passou a aparcar, consecutivamente, junto da residência da vítima, onde ficava por horas a vigiar e a tirar fotografias.
J) Que o arguido começou a perseguir a vítima, indo ao seu local de trabalho e chegando a falar com colegas de trabalho.
K) Que o arguido disse às colegas e diretor que a vítima é uma badalhoca, ordinária e que ia fazer de tudo para lhe retirar a guarda do filho de ambos.
L) Que arguido pressionava a vítima querendo saber quem eram os amigos ou conversas das redes sociais.
M) O arguido observou uma conduta de agressividade física e psíquica, controladora, persecutória e conseguiu perturbar o sossego e tranquilidade da vítima, fragilizá-la na sua liberdade pessoal, assim como atemorizá-la, apesar de a ofendida ser sua ex-companheira, mãe de filho menor.
N) O arguido sabia que afetava a ofendida na sua saúde física e psíquica e atuou querendo atemorizá-la e atingi-la na sua dignidade enquanto ser humano, o que logrou.
2.3. Motivação da matéria de facto
Quanto à determinação da matéria de facto dada como provada, a convicção deste Tribunal formou-se com base na análise crítica e conjugada de toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, nomeadamente, nas declarações do arguido e nos depoimentos das testemunhas, devidamente confrontada com as regras da experiência comum e com a livre apreciação do julgador, nos termos do disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Assim, quanto aos factos descritos em 1. a 5, a convicção positiva do Tribunal assentou, desde logo, nas declarações prestadas pelo arguido e no depoimento prestado pela ofendida BB, que foram unânimes ao confirmar tais factos, assim como, se atendeu ao assento de nascimento do menor DD de fls. 11.
No que se refere ao episódio de agressões físicas, ocorrido em 17 de outubro de 2019, o Tribunal valorou o depoimento prestado pela própria ofendida BB, que pese embora a posição processual que ocupa nos presentes autos, prestou um depoimento que se afigurou sincero e credível, não oferecendo dúvidas quanto à respetiva credibilidade, relatando que, no dia em apreço, ocorreu uma discussão entre ambos, cujo motivo disse não se recordar. Acrescentou que, quando pretendia pegar no filho de ambos que estava a chorar, o arguido tentou-a impedir, empurrando-a, por várias vezes, contra a parede.
Por sua vez, o arguido, pese embora tenha confirmado a existência de tal discussão entre ambos, negou que tivesse empurrado a companheira BB contra a parede, referindo, antes, que foi esta que no decorrer da discussão o atingiu com um pontapé, enquanto este se encontrava com o filho de ambos ao colo.
Sucede que, temos a palavra da ofendida contra a palavra do arguido, uma vez que inexistem testemunhas que tivessem presenciado os factos.
Contudo, importa referir, que nada obsta que o Tribunal alicerce a sua convicção no depoimento de uma única pessoa, no caso, nas declarações da ofendida, desde que, tais declarações se afigurem isentas e credíveis, uma vez que deixou de vigorar a velha regra do “unus testis, testis nullus”, ultrapassado que está o regime da prova legal ou tarifada, substituído pelo princípio da livre apreciação da prova (artigo 127.º do Código de Processo Penal).
Na verdade, pese embora o interesse na causa, não se pode falar numa regra ou máxima da experiência que, abstratamente, afirme a falta de credibilidade dos depoimentos dos ofendidos, o que aliás não tem sido o entendimento da nossa doutrina e jurisprudência, pois que, não é pelo facto de ninguém ter presenciado os factos e de termos duas versões diametralmente opostas a propósito dos mesmos, que faz com que o arguido deva ser absolvido com base no princípio do “in dubio pro reo”, até porque, um entendimento neste sentido, poderia levantar questões sensíveis ao nível de política criminal, particularmente nos crimes ocorridos fora da presença de terceiros.
De facto, como vimos, a ofendida de forma coerente e espontânea narrou ao Tribunal as circunstâncias em que os factos ocorreram, não compaginável com o discurso de alguém que estivesse a “inventar”, até porque, a própria assumiu a hipótese de ter atingido o arguido com um pontapé para o afastar e, bem assim, de lhe ter dirigido expressões injuriosas, o que só por si, demonstra a forma genuína e sincera com que esta prestou o seu depoimento.
Com efeito, não colheu a versão dos factos apresentada pelo arguido, atentas as declarações prestadas pela ofendida que, como se disse anteriormente, afiguraram-se sinceras, espontâneas e dignas de credibilidade em contraposição com as prestadas pelo arguido, as quais se revelaram titubeantes e incoerentes face às regras da experiência comum e do normal acontecer.
Ora, se nada de anormal sucedeu, como se justifica as lesões que a ofendida sofreu? E por que razão a ofendida BB chamou a PSP (conforme resulta do auto de notícia de fls. 1 a 3 do apenso)?
Na verdade, diga-se que, para além das lesões sofridas (arranhões e pisaduras) estarem documentalmente comprovadas – vide relatório de perícia de avaliação do dano corporal de fls. 15 a 18 do apenso – as mesmas são totalmente compatíveis com as agressões descritas pela ofendida.
Do que se infere, na conjugação de toda a prova produzida, aliado às regras da experiência comum e do normal acontecer, é que o arguido encontrando-se exaltado com a discussão, com faltas de respeito de ambas as partes, pretendendo impedir a companheira de pegar no filho de ambos ao colo, acabou por agredi-la, empurrando-a contra a parede.
No que respeita aos factos descritos em 8. a 11., os mesmos resultaram provados face ao teor das mensagens enviadas pelo arguido à ofendida BB, constantes de fls. 108, 151 e 153, além de que o próprio arguido confessou tê-las enviado, referindo ter agido de “cabeça quente” e em “desespero”, uma vez que estava impedido de ver o seu filho DD, assim como, de o ir buscar ao colégio, como vinha fazendo até então, o que gerou conflitos e discussões entre ambos os progenitores.
De igual modo, o facto descrito em 12. resultou provado face à confissão do arguido, que admitiu que, na nessa altura, em que estava impedido de ver o filho, deslocou-se ao colégio deste para ter uma reunião com a sua educadora e que, no decorrer da conversa, em virtude de esta ser amiga da ofendida BB, acabou por desabafar os motivos que levaram ao desgaste da relação e à separação. O arguido admitiu as considerações e juízos de valor que teceu em relação à pessoa da sua ex-companheira e mãe do seu filho, perante a educadora de infância deste.
A par da confissão do arguido, o Tribunal valorou o depoimento prestado pela testemunha CC que, na qualidade de educadora de infância do menor DD, prestou um depoimento que se afigurou objetivo, espontâneo e sincero, confirmando que, pese embora o arguido tenha agendado a reunião para falar do filho, acabou por no desenrolar da conversa denegrir a imagem da ofendida BB (sua amiga e colega de trabalho), tendo a referida testemunha confirmado as considerações e juízos de valor tecidos pelo arguido quanto à mesma, que lhe deu a conhecer, tal como de resto resultou provado.
Relativamente aos factos descritos em 13. e 14., os mesmos resultaram igualmente provados face às declarações prestadas pelo arguido, que admitiu ter contactado a CPCJ para informar que o seu filho estava em perigo, em virtude de o mesmo chorar bastante quanto o entregava à mãe. Por outro lado, o arguido admitiu o teor das mensagens enviadas à ofendida BB, no contexto de conflito por causa das responsabilidades parentais do filho de ambos, constantes de fls. 106 a 116, 139 a 146 e 151 a 154.
Diga-se, contudo, que do teor das aludidas mensagens trocadas entre o arguido e a ofendida, resulta o desejo persistente de o arguido estar com o filho, não se detetando na globalidade das mesmas qualquer postura de perseguição ou de ameaça para com a ofendida.
Por sua vez, a factualidade provada quanto às condições da vida pessoal, social económica do arguido, assentou no teor do relatório social junto aos autos (ref.ª 34643656).
Quanto aos antecedentes criminais desconhecidos ao arguido, teve-se em consideração o teor do respetivo certificado de registo criminal junto aos autos (ref.ª 346335526).
Relativamente aos factos indicados na factualidade não provada, a convicção negativa do Tribunal resulta da ausência de prova quanto aos mesmos e da sua contradição com a factualidade provada.
Desde logo, quanto à factualidade descrita em B), a mesma resultou não provada face à ausência de prova, pois que, além do arguido ter negado tais factos, não resultou do depoimento prestado pela ofendida BB a ocorrência dos mesmos. De facto, a ofendida limitou-se a referir de forma genérica e vaga que, em algumas ocasiões, o arguido a apelidava de “badalhoca”, “puta” e “vaca”, não logrando concretizar de forma concreta e circunstanciada tais episódios. Além do mais, resulta do seu depoimento que as vezes em que referiu ter saído de casa foi por sua própria iniciativa e não porque o arguido a tenha colocado fora de casa.
Ademais, por referência aos factos descritos em C) e D) também não foi produzida qualquer prova no sentido dos mesmos, sendo que a própria ofendida BB referiu que o arguido não a impedia de sair sozinha, facto este que também resulta das declarações do arguido, que referiu, por diversas vezes, que era ele mesmo que incentivava a companheira a sair. Importa, ainda, salientar que, pese embora a ofendida tenha referido ter apagado as suas redes sociais, não porque o arguido o tivesse imposto, mas antes para “evitar chatices” porque este era ciumento, a verdade é que, esta também acabou por admitir que acedia ao telemóvel e computador do arguido sem o seu consentimento, denotando-se a existência de ciúmes de parte a parte dado o desgaste da relação.
Por outro lado, não obstante a ofendida referir que o arguido, em algumas ocasiões, no meio de discussões, partia objetos, a verdade é que, do depoimento prestado pela ofendida não resultou de forma concreta e circunstanciada as situações em que tais factos ocorreram, nem sequer que com tais atitudes por parte do arguido a ofendida tenha ficado amedrontada, referindo apenas um episódio em que o arguido atirou a torradeira com força, porque estava desarrumada, tendo esta proferido a expressão “bate com os cornos”.
No que se refere ao episódio de maio de 2019, foi a própria ofendida que no seu depoimento admitiu que o arguido não a agrediu, designadamente empurrando-a e apertando-lhe o pescoço, esclarecendo que, naquele dia, mais uma vez, no meio de uma discussão entre ambos, o arguido ao tentar tirar-lhe o filho do colo a empurrou, não tendo a intenção, segundo as suas palavras, de a agredir fisicamente.
Relativamente à factualidade descrita em G) a mesma resultou não provada, porquanto do depoimento da ofendida não resultou que este a tenha apelidado de “puta” e “vaca” e, nem sequer, que a tenha empurrado para o chão, inexistido quaisquer outras testemunhas que tenham conhecimento direto quanto à mesma.
Ademais, foi a própria ofendida que acabou por desmentir que, após o fim da relação, o arguido a tenha perseguido junto da sua habitação e no local de trabalho, referindo apenas um episódio em que a mesma se encontrava em isolamento profilático com o filho e o arguido tirou uma fotografia que retrata o filho de ambos ao colo de um vizinho. Contudo, admitiu que o arguido frequentava com regularidade a confeitaria “C...”, junto à sua habitação, e que, provavelmente, foi nessas circunstâncias, que o arguido tirou a aludida fotografia, facto este que foi corroborado pela testemunha EE, que enquanto funcionário da referida confeitaria, confirmou ao Tribunal que o arguido é um cliente assíduo daquele estabelecimento comercial há vários anos.
Por último, diga-se que, tal como já foi referido, toda a demais factualidade resultou como não provada face à total ausência de prova, sendo que as demais testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento, designadamente as testemunha de defesa arroladas pelo arguido, não demonstraram qualquer conhecimento direto quanto aos factos descritos na decisão instrutória, sendo transversal a todos os depoimentos que o relacionamento entre o arguido e a ofendida pautava-se como um relacionamento normal, evidenciando apenas a existência de problemas entre o casal após o nascimento do filho DD.
Na verdade, face a toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não resultou demonstrado que a ofendida tenha sido atingida na sua dignidade enquanto pessoa humana, assim como, o arguido tenha adotado uma conduta de agressividade física e psíquica, controladora, persecutória, perturbando o sossego e tranquilidade da vítima, fragilizando-a na sua liberdade pessoal, numa relação de subordinação, de aniquilamento, de domínio, espezinhamento e subjugação face ao arguido. Até porque, o Tribunal convenceu-se que a conflitualidade existente entre o casal, essencialmente, após o nascimento do filho de ambos, ficou a dever-se ao próprio desgaste da relação, com faltas de respeito mútuas entre ambos, tendo sido, aliás, a própria ofendida a caraterizar a relação como “tóxica” e “com falta de respeito de ambas as partes”. Ademais, a conflitualidade existente entre o arguido e a ofendida após o fim da relação, ficou a dever-se única e exclusivamente a questões relacionadas com as responsabilidades parentais do filho de ambos, denotando-se das mensagens juntas aos autos, que a própria ofendida fazia prevalecer a sua própria vontade quanto à entrega ou não do menor.”

3. Apreciando
Comecemos por Saber se a decisão recorrida padece do vício da contradição insanável entre a fundamentação e a decisão
Ao invocado vício que, aliás, é de conhecimento oficioso (tal como o vício do erro notório e o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada mencionados nas alíneas a) e b) do artigo 410º nº 2 do CPP) alude a alínea c) do nº 2 do artigo 410º Código de Processo Penal, conforme decorre do corpo do nº 2 de tal artigo, tem de resultar “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.” Saliente-se que, em qualquer das apontadas hipóteses, o vício tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para o fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cf. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e segs.), tratando-se, assim, de vícios intrínsecos da sentença que, por isso, quanto a eles, terá que ser auto-suficiente.
A “contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão”, a que se reporta a alínea b) do artigo 410.º, do CPP, aquela (contradição insanável da fundamentação) ocorrerá nas situações em que a fundamentação desenvolvida pelo julgador evidencia premissas antagónicas ou manifestamente inconciliáveis, por exemplo, quando se dão como provados dois ou mais factos que manifestamente não podem estar simultaneamente provados ou quando o mesmo facto é considerado como provado e não provado, e esta (contradição insanável entre a fundamentação e a decisão) ocorrerá nas circunstâncias em que os factos provados ou não provados colidem com a fundamentação da decisão, vício que se verifica, por exemplo, quando a decisão assenta em premissas distintas das que se tiveram como provadas.
A contradição tem de resultar do texto da sentença e tem que se revelar insolúvel, inultrapassável, implicando ou uma alteração da decisão ou o reenvio do processo para julgamento.
No caso dos autos, o circunstancialismo verificado relativo aos imputados crimes de ofensas à integridade física simples, difamação e injurias a que chegou o tribunal a quo decorrente de ter dado como provado que 1. O arguido foi companheiro da vítima, nascida em .../.../1989, e é educadora de infância.
2. Tal relacionamento iniciou-se em 2012 como namoro e em 2014 iniciaram vida conjunta em união de fato como companheiros.
3. Residiram na Travessa ..., ....
4. Tiveram um filho, DD, nascido em .../.../2018.
5. Estão separados desde outubro de 2019.
6. Em 17 de outubro de 2019, na habitação comum, o arguido, em frente ao filho (bebé) de ambos, deu empurrões à vítima contra a parede.
7. Em resultado dessa agressão, a vítima sofreu arranhões e pisaduras.
8. Em outubro de 2020, o arguido não aceitou que a vítima estivesse em isolamento profilático com o filho menor e que, por via disso, não o pudesse contatar presencialmente.
9. No dia 27/10/2020 o arguido enviou uma mensagem “amanhã quero ir buscar o meu filho para minha casa, caso não deixes vou direto ao tribunal para pedir guarda partilhada, acabou a brincadeira”.
10. No dia 29/10/2020, o arguido enviou uma mensagem em que dizia “se não queres problemas na tua vida nem no trabalho liga-se para conversar”.
11. No dia 12/11/2020, o arguido foi buscar o filho ao colégio na Avenida ..., ..., mas não foi autorizado pelo que enviou mensagens em que escreveu: “és uma falhada, és do mais rasca que existe; és igualzinha à tua mãe e vais ser uma infeliz toda a vida; um dia nem o teu filho te quer!”.
12. No dia 17/11/2020, o arguido disse à educadora de infância do filho que esta era má mãe, que o filho tinha medo dela, era porca, não cuidava da habitação, era uma pessoa muito mal-educada e que proferia palavrões, que a vítima tratava mal a sua avó, do que a vítima teve
conhecimento.
13. No final de novembro de 2020, o mesmo contatou a CPCJ a quem informou que o seu filho estava perigo com a mãe, assim transtornando a vítima.
14. Em novembro de 2020 enviou várias mensagens em que apelidou a vítima de falhada, que não tem escrúpulos, que é ridícula, má mãe e irresponsável.
15.O arguido sabia que afetava a ofendida na sua saúde física, honra e consideração pessoal, o que logrou.
16. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente sabendo serem as suas condutas proibidas e punidas por lei penal. (…)”, não se antevê em que medida existe contradição entre a fundamentação e a decisão. O recorrente entenderá que tais factos, só por si, já integrariam o crime de violência doméstica. Todavia, o tribunal fez a interpretação dos mesmos e justificou concluindo que aqueles factos integravam outros crimes que não o de violência doméstica.
Os factos dados como provados e não provados são conciliáveis entre si e a decisão tomada perante os mesmos também é possível.
Falamos do texto da sentença e do modo como foi motivada a decisão de facto e se concluiu pela não verificação do crime de violência doméstica.
Ora, o que resulta da sentença recorrida e concretamente da sua motivação e subsequente enquadramento jurídico-penal é o entendimento que a relação de união de facto entre o arguido e a ofendida, com o nascimento de um filho em comum, e posterior separação, com situações de conflito envolvendo insultos e agressão física, relacionadas com o filho em comum, não assumiu os contornos da especial censurabilidade exigida pelo tipo legal do crime de violência doméstica, devendo ser convolado para os crimes de ofensa à integridade física, difamação e injuria.
Este vício não se verifica.
O que o Ministério Público recorrente, sobretudo discorda, é do enquadramento jurídico dos factos dados por assentes e do facto do tribunal a quo não ter dado cobertura/credibilidade a um parte importante e sobretudo das declarações da vítima. Mas essa parte não se encaixa no vício da sentença/acórdão, mas, sim, no âmbito da valoração da prova feita pelo tribunal a quo para dar como provados determinados factos e não provados outros, valoração essa em relação à qual o recorrente discorda. Por outras palavras, esta questão enquadra-se, não no âmbito dos vícios da sentença, mas, sim, no âmbito da apreciação/valoração da prova, ou seja no âmbito do erro de julgamento.
Improcede, pois, o recurso do Ministério Público quanto a este aspeto.

Impugnação da matéria de facto.
Em sede de motivação do recurso, o recorrente manifesta um primeiro entendimento no sentido de que se impunha, no entender do recorrente, valoração diferente da prova testemunhal, mormente da vítima impugnando por isso a matéria de facto na generalidade dos factos da acusação considerados como não provados.
No âmbito da impugnação ampla, a apreciação da matéria de facto alarga-se à prova produzia em audiência (se documentada), mas com os limites assinalados pelo recorrente em face do ónus de especificação que lhe é imposto pelos nºs 3 e 4 do artigo 412º, nos quais é expressamente estabelecido:
3 – Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) As provas que devem ser renovadas.
4 – Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior faz-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.
São estes os passos a cumprir em caso de impugnação da decisão sobre matéria de facto. Na especificação dos factos o recorrente deverá indicar o(s) concreto(s) facto(s) que consta(m) da sentença recorrida e que considere incorretamente julgado(s). Quanto às provas, terá que especificar as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (ex: quando o recorrente se socorra da prova documental tem que concretizar o documento que demonstra o erro da decisão; quando se socorra de prova gravada tem que indicar o depoimento (ou depoimentos) em questão (por identificação da pessoa ou pessoas em causa), tem de mencionar a passagem ou passagens desse depoimento que demonstra erro em que incorreu a decisão e tem, conforme decorre no nº 4 atrás transcrito, que localizar esse excerto de depoimento no suporte que contém a gravação da prova, por referência ao tempo da gravação.
A exigência da lei ao estabelecer os requisitos da impugnação da matéria de facto fixada pelo tribunal recorrido deve-se à circunstância de o recurso sobre matéria de facto, apesar de incidir sobre a prova produzida e o seu reflexo na matéria assente, não configurar um novo julgamento. Se estivéssemos perante um novo julgamento as especificações/requisitos seriam, obviamente, destituídas de fundamento. Mas, sendo o recurso um remédio, então o que se pretende é corrigir concretos erros de julgamento respeitantes à matéria de facto. Por isso a lei impõe que os erros que o recorrente entende existirem estejam especificados e que as provas que demonstrem tais erros estejam também elas concretizadas e localizadas, tanto mais que, segundo estabelece ainda o nº 6 de tal artigo 412º, “No caso previsto no nº 4, o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.
Mas de todo o modo, sempre há que ter em atenção que numa concreta reapreciação da prova produzida em audiência de julgamento, como assinala o Ac. do STJ de 12/06/2008, no proc. nº 07P4375, Relator Juiz Conselheiro Raul Borges (e acessível pelo site www.dgsi.pt) “sofre, no entanto, quatro tipos de limitações:
- desde logo, uma limitação decorrente da necessidade de observância, por parte do recorrente, de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta delimitação precisa e concretizada dos pontos da matéria de facto controvertidos, que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso;
- já ao nível do poder cognitivo do tribunal de recurso, temos a limitação decorrente da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações e/ou, ainda, das transcrições;
- por outro lado, há limites à pretendida reponderação de facto, já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação;
- a juzante impor-se-á um último limite, que tem a ver com o facto de a reapreciação só poder determinar alteração à matéria de facto se se concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão.” (negrito e sublinhado nosso)
Acrescenta-se, em consonância com o atrás descrito, que a reapreciação da prova na 2ª instância limita-se a controlar o processo de formação da convicção expressa da 1ª instância e da aplicação do princípio da livre apreciação da prova, tomando sempre como ponto de referência a motivação/fundamentação da decisão, sendo que no recurso de impugnação da matéria de facto o tribunal ad quem não vai à procura de nova convicção – a sua – mas procura inteirar-se sobre se a convicção expressa pelo tribunal recorrido na fundamentação tem suporte adequado da prova produzida e constante da gravação da prova por si só ou conjugada com as regras da experiência e demais prova existente nos autos (pericial, documental, etc). Neste enquadramento, podendo o controlo da matéria de facto ter por base a gravação dos depoimentos prestados ou analisados em audiência de julgamento, importa ter sempre presente que não se pode, a qualquer preço, subverter ou aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída, dialeticamente, na base da imediação e da oralidade, nunca esquecendo as palavras do Prof. Figueiredo Dias (in Direito Processual Penal, 1º Vol., Coimbra Editora, págs. 233 e 234) que só os princípios da imediação e da oralidade “… permitem … avaliar o mais corretamente possível a credibilidade das declarações pelos participantes processuais”.

Neste âmbito da sua peça recursória, a recorrente lança argumentos no sentido de por em causa a convicção adquirida pelo tribunal a quo sobre determinados factos que foram dados como não provados, em contraposição com a que sobre os mesmos ela própria adquiriu em julgamento.
Todavia, ainda neste âmbito importa não esquecer a regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127º do Código Penal.
De acordo com o disposto no art. 127º a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
O art. 127º do Código Processo Penal estabelece três tipos de critérios para avaliação da prova, com características e naturezas completamente diferentes: uma avaliação da prova inteiramente objectiva quando a lei assim o determinar; outra também objectiva, quando for imposta pelas regras da experiência; finalmente, uma outra, eminentemente subjectiva, que resulte da livre convicção do julgador.
A prova resultante da livre convicção do julgador pode ser motivada e fundamentada mas, neste caso, a motivação tem de se alicerçar em critérios subjectivos, embora explicitados para serem objecto de compreensão” (Ac STJ de 18/1/2001, proc nº 3105/00-5ª, SASTJ, nº 47,88).
Tal como diz o Prof Germano Marques da Silva, no Curso de Processo Penal, Vol. II, pág. 131 “... a liberdade que aqui importa é a liberdade para a objectividade, aquela que se concede e que se assume em ordem a fazer triunfar a verdade objectiva, isto é, uma verdade que transcende a pura subjectividade e que se comunique e imponha aos outros. Isto significa, por um lado, que a exigência de objectividade é ela própria um princípio de direito, ainda no domínio da convicção probatória, e implica, por outro lado, que essa convicção só será válida se for fundamentada, já que de outro modo não poderá ser objectiva”.
Ou seja, a livre apreciação da prova realiza-se de acordo com critérios lógicos e objetivos.
Sobre a livre convicção refere o Professor Cavaleiro de Ferreira que esta «é um meio de descoberta da verdade, não uma afirmação infundada da verdade» -Cfr. "Curso de Processo Penal", Vol. II , pág.30. Por outras palavras, diz o Prof. Figueiredo Dias que a convicção do juiz é "... uma convicção pessoal - até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais -, mas em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros. (…) Um tal convicção existirá quando e só quando … o tribunal tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável" (in Direito Processual Penal, 1º Vol., Coimbra Editora, Reimpressão, 1984, páginas 203 a 205).
O princípio da livre apreciação da prova assume especial relevância na audiência de julgamento, encontrando afloramento, nomeadamente, no art. 355º do Código de Processo Penal. É aí que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na receção direta de prova.
Nas palavras do Prof. Germano Marques da Silva "... a oralidade permite que as relações entre os participantes no processo sejam mais vivas e mais directas, facilitando o contraditório e, por isso, a defesa, e contribuindo para alcançar a verdade material através de um sistema de prova objectiva, atípica, e de valoração pela intima convicção do julgador (prova moral), gerada em face do material probatório e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens". -Cfr. "Do Processo Penal Preliminar", Lisboa, 1990, pág. 68”.
O princípio da imediação diz-nos que deve existir uma relação de contacto direto, pessoal, entre o julgador e as pessoas cujas declarações irá valorar, e com as coisas e documentos que servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto. Citando ainda o Prof. Figueiredo Dias, ao referir-se aos princípios da oralidade e imediação diz o mesmo: «Por toda a parte se considera hoje a aceitação dos princípios da oralidade e da imediação como um dos progressos mais efectivos e estáveis na história do direito processual penal. Já de há muito, na realidade, que em definitivo se reconheciam os defeitos de processo penal submetido predominantemente ao principio da escrita, desde a sua falta de flexibilidade até à vasta possibilidade de erros que nele se continha, e que derivava sobretudo de com ele se tomar absolutamente impossível avaliar da credibilidade de um depoimento. (...). Só estes princípios, com efeito, permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível a credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais " (in Direito Processual Penal, 1º Vol., Coimbra Editora, Reimpressão, 1984, páginas 233 a 234).
Assim, e para respeitarmos estes princípios se a decisão do julgador, estiver fundamentada na sua livre convicção e for uma das possíveis soluções segundo as regras da experiência comum, ela não deverá ser alterada pelo tribunal de recurso. Como se diz no sumário do acórdão da Relação de Coimbra, de 6 de Março de 2002 (in C.J., ano XXVII, Tomo II, página 44) "quando a atribuição da credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear na opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum".
Por outro lado, também importa ter sempre presente que como corolário do princípio da presunção de inocência que decorre do artigo 32º nº 2 da Constituição da República Portuguesa, apresenta-se o princípio do in dubio pro reo que obriga a que, instalando-se e permanecendo a dúvida acerca de factos referentes ao objeto do processo (existência dos factos, forma de cometimento e responsabilidade pela sua prática), essa dúvida deve ser sempre desfeita em benefício do arguido relativamente ao ponto ou pontos duvidosos, podendo mesmo conduzir à absolvição (cfr. Simas Santos e Leal Henriques, Noções de Processo Penal, Rei dos Livros, págs. 50 e 51).
Como salienta Figueiredo Dias (in Direito Processual Penal, I vol., pág. 213) “Um non liquet na questão da prova – não permitindo ao juiz – que omita decisão … - tem que ser sempre valorado a favor do arguido”, sendo que “com este sentido e conteúdo que se afirma o princípio in dúbio pro reo”.
Tal princípio incute uma imposição dirigida ao juiz, no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não houver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa.
A propósito ver recente Ac. desta Relação do Porto in Processo nº 571/19.8PAPVZ.P1, relator Luís Coimbra.

Tecidas estas considerações que devem ser tidas em conta quando é impugnada a matéria de facto sob a perspetiva da invocação de erro de julgamento – e erro de julgamento existe quando se dá como provado um facto sem que dele tivesse sido feita prova pelo que deveria ter sido considerado não provado ou quando se dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado – tal como atrás assinalámos, decorre da petição recursiva que o recorrente entende que os factos dados como não provados nos pontos a) a h) e j) a k, m) a n) devem ser dados como provados, indicando, como suscetíveis de, na sua ótica, impor decisão diversa, alguns tempos de gravação dos depoimentos do arguido, da ofendida e das testemunhas CC, FF e GG, indicando as concretas passagens que impõe versão diferente da encontrada pelo Tribunal.
Diga-se também que o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e a transcrição dos depoimentos prestados em audiência, como já antes vínhamos dizendo, não pode subverter ou aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.
O registo da prova, contra o que pode pensar quem nunca foi solicitado a apreciar com critério, isenção e seriedade a prova, está ainda algo longe de dar uma ideia segura da valia dos depoimentos.
Como exemplarmente se afirmou em acórdão proferido em 8.2.99 na 2.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do recurso de apelação do processo n.º 1/99, vindo do Tribunal de Circulo de Chaves, de que foi relator o Exmo. Desembargador, Dr. Mário Cruz, “a actividade dos juízes, como julgadores, não pode ser a de meros espectadores, receptores de depoimentos. A sua actividade judicatória há-de ter, necessariamente, um sentido crítico. Para se considerarem provados factos não basta que as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre as questões num determinado sentido, para que o juiz necessariamente aceite esse sentido ou versão. Por isso, a actividade judicatória, na valoração dos depoimentos, há-de atender a uma multiplicidade de factores, que têm a ver com as garantias de imparcialidade, as razões de ciência, a espontaneidade dos depoimentos, a verosimilhança, a seriedade, o raciocínio, as lacunas, as hesitações, a linguagem, o tom de voz, o comportamento, os tempos de resposta, as coincidências, as contradições, o acessório, as circunstâncias, o tempo decorrido, o contexto sócio-cultural, a linguagem gestual (inclusive, os olhares) e até saber interpretar as pausas e os silêncios dos depoentes, para poder perceber e aquilatar quem estará a falar a linguagem da verdade e até que ponto é que, consciente ou inconscientemente, poderá a mesma estar a ser distorcida, ainda que, muitas vezes, não intencionalmente”.
Por outro lado, diremos também que, dependendo o juízo de credibilidade da prova por declarações do carácter e probidade moral de quem as presta e não sendo tais atributos apreensíveis, em princípio, mediante exame e análise dos textos processuais ou suportes de gravação onde as mesmas se encontram documentadas, mas sim através do contacto com as pessoas, é evidente que o tribunal superior, salvo casos de exceção, deve adotar o juízo valorativo formulado pelo tribunal a quo.
De facto, tal sistema não garante a perceção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os fatores coligidos pela psicologia judiciária e de onde é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo. Existem aspetos comportamentais ou reações dos depoentes que apenas podem ser percecionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador.
Tal não significa que o tribunal ad quem não controle o processo de formação da convicção do tribunal de 1ª instância e da respetiva decisão sobre a matéria de facto, quer no que respeita à exigência fundamental de que a decisão sobre os factos resulte de prova produzida no processo, quer quanto à sua conformidade com as regras da experiência, da lógica e os conhecimentos científicos, bem como com as regras específicas e princípios vigentes em matéria probatória, nomeadamente as que dispõem sobre a validade da prova ou o especial valor de alguns meios de prova, como a confissão, a prova pericial ou a derivada de certos documentos. Afirma-se apenas que, não visando o recurso em matéria de facto um novo julgamento, que aquele apenas deve constituir um remédio para os vícios do julgamento em 1.ª instância, não pode o tribunal de recurso, sem imediação e oralidade, limitar-se a sobrepor à do tribunal a quo a sua convicção sobre a credibilidade das pessoas ouvidas em audiência.
Feito que está este enquadramento, constatamos que ao trazer à colação os depoimentos das testemunhas indicadas, depois de termos procedido à audição integral dos mesmos (e não apenas dos circunscritos tempos de gravação que o recorrente indicou em sede de conclusões e correspondentes transcrições que fez), desde já adiantando, podemos afirmar que a prova que a recorrente indica não é suscetível de impor decisão diversa da recorrida quanto aos factos que impugna. Na verdade, o que o recorrente visa, sobretudo, é impugnar a convicção firmada pelo tribunal recorrido com base na sua leitura pessoal da prova que foi produzida em julgamento.
Lendo a motivação da matéria de facto, o tribunal a quo explica, com toda a clareza e limpidez, com que bases alicerçou a sua convicção para dar como não provados tais factos e explicou os raciocínios efetuados para a decisão de facto, sendo perfeitamente compreensíveis tais raciocínios, particularmente no que diz respeito à razão pela qual não conferiu grande credibilidade a parte das declarações da ofendida e aos depoimentos das suprarreferidas testemunhas e assim, em observância do princípio do in dubio pro reo, dizemos nós, dar como não provada a matéria de facto aqui posta em causa pelo M.P.
Importa não olvidar que na generalidade das situações em que a prova dos factos decorra da prova oral, tal prova não pode ser apreciada de modo estanque ou compartimentado, mas antes pela assimilação dialética e racional dos vários depoimentos, temperada pela imediação e oralidade próprias de uma audiência de julgamento, local onde o princípio do contraditório assume a sua expressão máxima.
É certo que na normalidade do acontecer, neste género de crimes, os factos desenrolam-se dentro das quatro paredes e não à vista de todos.
Ademais, importa atentar que para o apuramento de factos, a atribuição de credibilidade feita pela primeira instância a uma pessoa e não a outra, desde que não vá contra as regras da lógica e da experiência comum, como atrás dissemos, não pode ser postergada pelo tribunal superior que não gozou da imediação e da oralidade própria da audiência de julgamento. Fazê-lo, seria violar o princípio da livre apreciação da prova plasmado no artigo 127º do CPP. E como é dito no Acórdão da Relação de Guimarães de 20-03-2006, “a função do julgador não é a de achar o máximo denominador comum entre os diversos depoimentos. Nem, tão pouco, tem o juiz que aceitar ou recusar cada um dos depoimentos na globalidade, cabendo-lhe, antes, a espinhosa missão de dilucidar, em cada um deles, o que lhe merece crédito. Como, aliás, já há muito ensinava o prof. Enrico Altavilla “o interrogatório como qualquer testemunho está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras” – Psicologia Judiciária, vol. II, 3ª ed. pág. 12.”
No uso da prerrogativa a que alude o nº 6 do art. 412º do CPP, procedeu-se à audição integral de todos os depoimentos.
E depois de se ter procedido à audição integral dos depoimentos, desde já adiantamos que da leitura da motivação da matéria de facto constante da decisão acórdão recorrido não resulta que nela o tribunal a quo tivesse exarado algo ou extrapolado de relevante para além do que foi dito por tais intervenientes.
Por isso mesmo somos desde já levados a afirmar que o que foi dito em tais depoimentos não é suscetível de impor decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido.
Mas vejamos o que diz o tribunal a quo na sua motivação.
“Quanto à determinação da matéria de facto dada como provada, a convicção deste Tribunal formou-se com base na análise crítica e conjugada de toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, nomeadamente, nas declarações do arguido e nos depoimentos das testemunhas, devidamente confrontada com as regras da experiência comum e com a livre apreciação do julgador, nos termos do disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Assim, quanto aos factos descritos em 1. a 5, a convicção positiva do Tribunal assentou, desde logo, nas declarações prestadas pelo arguido e no depoimento prestado pela ofendida BB, que foram unânimes ao confirmar tais factos, assim como, se atendeu ao assento de nascimento do menor DD de fls. 11.
No que se refere ao episódio de agressões físicas, ocorrido em 17 de outubro de 2019, o Tribunal valorou o depoimento prestado pela própria ofendida BB, que pese embora a posição processual que ocupa nos presentes autos, prestou um depoimento que se afigurou sincero e credível, não oferecendo dúvidas quanto à respetiva credibilidade, relatando que, no dia em apreço, ocorreu uma discussão entre ambos, cujo motivo disse não se recordar. Acrescentou que, quando pretendia pegar no filho de ambos que estava a chorar, o arguido tentou-a impedir, empurrando-a, por várias vezes, contra a parede.
Por sua vez, o arguido, pese embora tenha confirmado a existência de tal discussão entre ambos, negou que tivesse empurrado a companheira BB contra a parede, referindo, antes, que foi esta que no decorrer da discussão o atingiu com um pontapé, enquanto este se encontrava com o filho de ambos ao colo.
Sucede que, temos a palavra da ofendida contra a palavra do arguido, uma vez que inexistem testemunhas que tivessem presenciado os factos.
Contudo, importa referir, que nada obsta que o Tribunal alicerce a sua convicção no depoimento de uma única pessoa, no caso, nas declarações da ofendida, desde que, tais declarações se afigurem isentas e credíveis, uma vez que deixou de vigorar a velha regra do “unus testis, testis nullus”, ultrapassado que está o regime da prova legal ou tarifada, substituído pelo princípio da livre apreciação da prova (artigo 127.º do Código de Processo Penal).
Na verdade, pese embora o interesse na causa, não se pode falar numa regra ou máxima da experiência que, abstratamente, afirme a falta de credibilidade dos depoimentos dos ofendidos, o que aliás não tem sido o entendimento da nossa doutrina e jurisprudência, pois que, não é pelo facto de ninguém ter presenciado os factos e de termos duas versões diametralmente opostas a propósito dos mesmos, que faz com que o arguido deva ser absolvido com base no princípio do “in dubio pro reo”, até porque, um entendimento neste sentido, poderia levantar questões sensíveis ao nível de política criminal, particularmente nos crimes ocorridos fora da presença de terceiros.
De facto, como vimos, a ofendida de forma coerente e espontânea narrou ao Tribunal as circunstâncias em que os factos ocorreram, não compaginável com o discurso de alguém que estivesse a “inventar”, até porque, a própria assumiu a hipótese de ter atingido o arguido com um pontapé para o afastar e, bem assim, de lhe ter dirigido expressões injuriosas, o que só por si, demonstra a forma genuína e sincera com que esta prestou o seu depoimento.
Com efeito, não colheu a versão dos factos apresentada pelo arguido, atentas as declarações prestadas pela ofendida que, como se disse anteriormente, afiguraram-se sinceras, espontâneas e dignas de credibilidade em contraposição com as prestadas pelo arguido, as quais se revelaram titubeantes e incoerentes face às regras da experiência comum e do normal acontecer.
Ora, se nada de anormal sucedeu, como se justifica as lesões que a ofendida sofreu? E por que razão a ofendida BB chamou a PSP (conforme resulta do auto de notícia de fls. 1 a 3 do apenso)?
Na verdade, diga-se que, para além das lesões sofridas (arranhões e pisaduras) estarem documentalmente comprovadas – vide relatório de perícia de avaliação do dano corporal de fls. 15 a 18 do apenso – as mesmas são totalmente compatíveis com as agressões descritas pela ofendida.
Do que se infere, na conjugação de toda a prova produzida, aliado às regras da experiência comum e do normal acontecer, é que o arguido encontrando-se exaltado com a discussão, com faltas de respeito de ambas as partes, pretendendo impedir a companheira de pegar no filho de ambos ao colo, acabou por agredi-la, empurrando-a contra a parede.
No que respeita aos factos descritos em 8. a 11., os mesmos resultaram provados face ao teor das mensagens enviadas pelo arguido à ofendida BB, constantes de fls. 108, 151 e 153, além de que o próprio arguido confessou tê-las enviado, referindo ter agido de “cabeça quente” e em “desespero”, uma vez que estava impedido de ver o seu filho DD, assim como, de o ir buscar ao colégio, como vinha fazendo até então, o que gerou conflitos e discussões entre ambos os progenitores.
De igual modo, o facto descrito em 12. resultou provado face à confissão do arguido, que admitiu que, na nessa altura, em que estava impedido de ver o filho, deslocou-se ao colégio deste para ter uma reunião com a sua educadora e que, no decorrer da conversa, em virtude de esta ser amiga da ofendida BB, acabou por desabafar os motivos que levaram ao desgaste da relação e à separação. O arguido admitiu as considerações e juízos de valor que teceu em relação à pessoa da sua ex-companheira e mãe do seu filho, perante a educadora de infância deste.
A par da confissão do arguido, o Tribunal valorou o depoimento prestado pela testemunha CC que, na qualidade de educadora de infância do menor DD, prestou um depoimento que se afigurou objetivo, espontâneo e sincero, confirmando que, pese embora o arguido tenha agendado a reunião para falar do filho, acabou por no desenrolar da conversa denegrir a imagem da ofendida BB (sua amiga e colega de trabalho), tendo a referida testemunha confirmado as considerações e juízos de valor tecidos pelo arguido quanto à mesma, que lhe deu a conhecer, tal como de resto resultou provado.
Relativamente aos factos descritos em 13. e 14., os mesmos resultaram igualmente provados face às declarações prestadas pelo arguido, que admitiu ter contactado a CPCJ para informar que o seu filho estava em perigo, em virtude de o mesmo chorar bastante quanto o entregava à mãe. Por outro lado, o arguido admitiu o teor das mensagens enviadas à ofendida BB, no contexto de conflito por causa das responsabilidades parentais do filho de ambos, constantes de fls. 106 a 116, 139 a 146 e 151 a 154.
Diga-se, contudo, que do teor das aludidas mensagens trocadas entre o arguido e a ofendida, resulta o desejo persistente de o arguido estar com o filho, não se detetando na globalidade das mesmas qualquer postura de perseguição ou de ameaça para com a ofendida.
Por sua vez, a factualidade provada quanto às condições da vida pessoal, social económica do arguido, assentou no teor do relatório social junto aos autos (ref.ª 34643656).
Quanto aos antecedentes criminais desconhecidos ao arguido, teve-se em consideração o teor do respetivo certificado de registo criminal junto aos autos (ref.ª 346335526).
Relativamente aos factos indicados na factualidade não provada, a convicção negativa do Tribunal resulta da ausência de prova quanto aos mesmos e da sua contradição com a factualidade provada.
Desde logo, quanto à factualidade descrita em B), a mesma resultou não provada face à ausência de prova, pois que, além do arguido ter negado tais factos, não resultou do depoimento prestado pela ofendida BB a ocorrência dos mesmos. De facto, a ofendida limitou-se a referir de forma genérica e vaga que, em algumas ocasiões, o arguido a apelidava de “badalhoca”, “puta” e “vaca”, não logrando concretizar de forma concreta e circunstanciada tais episódios. Além do mais, resulta do seu depoimento que as vezes em que referiu ter saído de casa foi por sua própria iniciativa e não porque o arguido a tenha colocado fora de casa.
Ademais, por referência aos factos descritos em C) e D) também não foi produzida qualquer prova no sentido dos mesmos, sendo que a própria ofendida BB referiu que o arguido não a impedia de sair sozinha, facto este que também resulta das declarações do arguido, que referiu, por diversas vezes, que era ele mesmo que incentivava a companheira a sair. Importa, ainda, salientar que, pese embora a ofendida tenha referido ter apagado as suas redes sociais, não porque o arguido o tivesse imposto, mas antes para “evitar chatices” porque este era ciumento, a verdade é que, esta também acabou por admitir que acedia ao telemóvel e computador do arguido sem o seu consentimento, denotando-se a existência de ciúmes de parte a parte dado o desgaste da relação.
Por outro lado, não obstante a ofendida referir que o arguido, em algumas ocasiões, no meio de discussões, partia objetos, a verdade é que, do depoimento prestado pela ofendida não resultou de forma concreta e circunstanciada as situações em que tais factos ocorreram, nem sequer que com tais atitudes por parte do arguido a ofendida tenha ficado amedrontada, referindo apenas um episódio em que o arguido atirou a torradeira com força, porque estava desarrumada, tendo esta proferido a expressão “bate com os cornos”.
No que se refere ao episódio de maio de 2019, foi a própria ofendida que no seu depoimento admitiu que o arguido não a agrediu, designadamente empurrando-a e apertando-lhe o pescoço, esclarecendo que, naquele dia, mais uma vez, no meio de uma discussão entre ambos, o arguido ao tentar tirar-lhe o filho do colo a empurrou, não tendo a intenção, segundo as suas palavras, de a agredir fisicamente.
Relativamente à factualidade descrita em G) a mesma resultou não provada, porquanto do depoimento da ofendida não resultou que este a tenha apelidado de “puta” e “vaca” e, nem sequer, que a tenha empurrado para o chão, inexistido quaisquer outras testemunhas que tenham conhecimento direto quanto à mesma.
Ademais, foi a própria ofendida que acabou por desmentir que, após o fim da relação, o arguido a tenha perseguido junto da sua habitação e no local de trabalho, referindo apenas um episódio em que a mesma se encontrava em isolamento profilático com o filho e o arguido tirou uma fotografia que retrata o filho de ambos ao colo de um vizinho. Contudo, admitiu que o arguido frequentava com regularidade a confeitaria “C...”, junto à sua habitação, e que, provavelmente, foi nessas circunstâncias, que o arguido tirou a aludida fotografia, facto este que foi corroborado pela testemunha EE, que enquanto funcionário da referida confeitaria, confirmou ao Tribunal que o arguido é um cliente assíduo daquele estabelecimento comercial há vários anos.
Por último, diga-se que, tal como já foi referido, toda a demais factualidade resultou como não provada face à total ausência de prova, sendo que as demais testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento, designadamente as testemunha de defesa arroladas pelo arguido, não demonstraram qualquer conhecimento direto quanto aos factos descritos na decisão instrutória, sendo transversal a todos os depoimentos que o relacionamento entre o arguido e a ofendida pautava-se como um relacionamento normal, evidenciando apenas a existência de problemas entre o casal após o nascimento do filho DD.
Na verdade, face a toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não resultou demonstrado que a ofendida tenha sido atingida na sua dignidade enquanto pessoa humana, assim como, o arguido tenha adotado uma conduta de agressividade física e psíquica, controladora, persecutória, perturbando o sossego e tranquilidade da vítima, fragilizando-a na sua liberdade pessoal, numa relação de subordinação, de aniquilamento, de domínio, espezinhamento e subjugação face ao arguido. Até porque, o Tribunal convenceu-se que a conflitualidade existente entre o casal, essencialmente, após o nascimento do filho de ambos, ficou a dever-se ao próprio desgaste da relação, com faltas de respeito mútuas entre ambos, tendo sido, aliás, a própria ofendida a caraterizar a relação como “tóxica” e “com falta de respeito de ambas as partes”. Ademais, a conflitualidade existente entre o arguido e a ofendida após o fim da relação, ficou a dever-se única e exclusivamente a questões relacionadas com as responsabilidades parentais do filho de ambos, denotando-se das mensagens juntas aos autos, que a própria ofendida fazia prevalecer a sua própria vontade quanto à entrega ou não do menor.”

Relativamente ao ponto “A) Desde o início, o arguido manteve relação conflituosa e desgastante para a pessoa da vítima”.
Ficou demonstrado, em sede de julgamento, que o arguido e a ofendida mantiveram uma relação desde 2012 até outubro de 2019 tendo, inclusive, vivido em união de facto como companheiros e tido, posteriormente, um filho - DD - a 19 de dezembro de 2018.
Esta relação, a par das discussões normais entre casais, não foi desde o início conflituosa e desgastante para ambas as partes. O casal era comunicativo e inserido socialmente - como se demonstrou em prova testemunhal - convivendo, regularmente, com os amigos e familiares. Por outras palavras, demonstravam ser um casal bem-parecido, apaixonado um pelo outro e de presença assídua nas demais circunstâncias, tanto a título individual, como em conjunto.
E quando havia discussões resulta das próprias declarações da ofendida que ela também não se inibia de responder no mesmo tom, referindo inclusive que tendo sido educada pela sua avó materna a responder chamando nomes, também respondia assim.
Admitiu a toxidade da relação de ambas as partes, os ciúmes mútuos e o controlo mútuo no que tange às redes sociais, referindo que nunca recebeu ordens para não comunicar com terceiros homens. Reprimiu-se nesse comportamento para evitar tensões entre o casal, já que não seria do agrado do arguido. Contudo, isto não significa uma imposição do arguido mas um comportamento que é, por vezes, normal nos relacionamentos no sentido de evitar que o outro se sinta magoado ou desrespeitado, evitando mau ambiente.
Alguma prova mencionou que foi, a partir do nascimento do menor, que a situação se alterou.
Em sede de prova testemunhal, vide HH, foi ressalvado que a ofendida queria ser mãe até aos 30 anos. Acontecimento que logrou conseguir. Porém, desde o nascimento do menor, reparou-se numa diferença no comportamento da ofendida, presumindo que esta estivesse a sofrer de depressão pós-parto. Aliás, as testemunhas de acusação GG (mãe do arguido), HH (irmã do arguido) – que conviviam e conheciam muito bem a ofendida - demonstraram, em depoimento, que sentiam a ofendida mais cansada, fechada, reativa, revoltada e mal disposta.
Assim, iniciaram as discórdias e os desentendimentos tendo a ofendida referido, no seu depoimento, que a toxicidade da relação provinha das duas partes.
Surpreendentemente, afirmou que se não fosse o nascimento do filho DD, provavelmente, ainda estariam juntos.
● “B) O arguido dava constantemente início a discussões sem motivo relevante e por causa da limpeza da casa e nelas insultava a vítima: “sua badalhoca”, “puta”, “cabra” e algumas vezes a colocou fora de casa, impedindo-a de permanecer na sua própria residência”.
A ofendida, durante o julgamento, referiu que, em algumas ocasiões de discussão, o arguido a apelidava de “badalhoca”, “puta” e “vaca”, mas não conseguiu concretizar, de forma concreta, e circunstanciada em episódios relativamente aos termos puta e vaca. Expressões negadas pelo arguido, pelo que aquela não obteve credibilidade por parte do tribunal.
Acresce que a própria ofendida admitiu insultar igualmente o arguido tendo sido circunstanciado o termo “filha da puta ”, pelo qual pediu desculpa depois á mãe do arguido de nome GG.
Uma ressalva apenas para a expressão “badalhoca” reportada à limpeza da casa mencionada pela testemunha CC na reunião que teve como arguido no colégio do filho, pelo que a expressão “ porca” deve ser substituída pela expressão “badalhoca” no ponto 12 dos factos dados por provados.
Segundo a mesma, as discussões eram, 99% das vezes, sobre limpeza da casa, mas tal não implica necessariamente humilhação ou coisificação da pessoa visada.
O arguido AA, efetivamente, demonstrava-se preocupado com a higiene de casa, partilhando tal inquietude com a ofendida, talvez até de uma forma obsessiva, mas nunca numa postura de controle, nem de autoridade sobre a mesma, tanto mais que também resultou da prova que era questão que não incomodaria a ofendida, sugerindo que contratasse empregadas, tendo o arguido referido que a mesma não alterou a sua postura, o que revela ausência de ascendência do arguido ou de temor a este.
Mais se ressalva que, contrariamente ao que a ofendida disse em sede de julgamento, o arguido contratou uma empregada que a ajudasse nas lides domésticas. O que contraria a afirmação da ofendida segundo a qual o arguido terá afirmado: “se eu tenho uma mulher não preciso de empregada”.
A este respeito o depoimento da Senhora GG - testemunha de acusação e mãe do arguido - que vive mesmo ao lado do Senhor AA e que chegou a conhecer a empregada contratada. O que denota que o arguido não via a ofendida como uma mera empregada da casa. Aliás a ofendida menciona existência de repartição de tarefas.
Também não fará sentido dar ênfase às saídas de casa, uma vez que - e citando o tribunal - “(...) resulta do depoimento que as vezes em que referiu (a ofendida) ter saído de casa foi por sua própria iniciativa e não porque o arguido a tenha colocado fora de casa”, o que se confirma ouvido o conjunto probatório.
Verificando a cronologia, aquando do término da relação em out. de 20219 o arguido AA permitiu à ofendida que ainda permanecesse na sua habitação, aproximadamente, um mês até encontrar uma nova residência. Acontecimento que a ofendida verificou e confirmou e que depois da sua saída e pelo período de cerca de um ano, o relacionamento entre ambos foi pacífico sem qual qualquer tipo de desordens, só passando a existir conflitos a propósito do regime de convívio com o filho de ambos, altura em que a ofendida apresenta queixa, sendo que manifestou expresso desejo de desistir da primeira queixa.
Em sede de audiência de discussão e julgamento, em instâncias da ofendida foi referido que, numa das vezes em que saiu de casa, quem a acolheu foi a irmã do arguido - HH.
Uma vez ouvida, foi possível apurar que a ofendida nunca “fugiu” para casa da Senhora HH, nem tão pouco vestiu roupas cor-de-rosa ao menor DD. Na ausência de uma sustentação consistente, o tribunal só podia ter decidido a este respeito como decidiu.
● “C) Impedia-a de estar com amigos, principalmente do sexo oposto”.
● D) Noutras ocasiões, o arguido chegou a quebrar objetos.
● “L) Que o arguido pressionava a vítima querendo saber quem eram os amigos ou conversas das redes sociais”.
Resulta da exposição do tribunal, o seguinte: “por referência aos factos descritos em C) e D) também não foi produzida qualquer prova no sentido dos mesmos, sendo que a própria ofendida referiu que o arguido não a impedia de sair sozinha, facto este que também resulta das declarações do arguido, que referiu, por diversas vezes, que era ele mesmo que incentivava a companheira a sair. Importa, ainda, salientar que conforme se referiu acima, pese embora a ofendida tinha referido ter apagado as suas redes sociais, não porque o arguido o tivesse imposto, mas antes para «evitar chatices» porque este era ciumento, a verdade é que, esta também acabou por admitir que acedia ao telemóvel e computador do arguido sem o seu consentimento, denotando-se a existência de ciúmes de parte a parte dado o desgaste da relação. Por outro lado, não obstante a ofendida referir que o arguido em algumas ocasiões, no meio de discussões, partia objetos, a verdade é que do depoimento prestado pela ofendida não resultou de forma concreta e circunstancial as situações em que tais factos ocorreram, a não ser numa situação, nem sequer que com tais atitudes por parte do arguido a ofendida tenha ficado amedrontada, referindo apenas um episódio em que o arguido atirou a torradeira com força, porque estava desarrumada, tendo esta proferido a expressão «bate com os cornos»”.
Assim sendo, ficou demonstrado pela própria ofendida que o arguido não limitava a sua vida social; pelo contrário, incentiva-a a ter o seu próprio espaço e vida pessoal. Mais se ressalva, quanto às redes sociais e ciúmes associados – pelo depoimento da ofendida - que a mesma vasculhava o seu telemóvel e computador; pelo contrário, o arguido negou que fizesse o mesmo.
Acrescenta-se que em instâncias da testemunha HH que via, regularmente, as publicações da sua “considerada” cunhada. Logo, não se vislumbra que a ofendida teria medo de qualquer reação por parte do arguido AA, face às suas publicações e liberdade que tinha para as fazer.
Do seu depoimento decorre igualmente que não obstante o arguido ter arremessado um objeto para o chão, provando-se apenas uma situação porque devidamente contextualizada, não resulta que o fizesse contra ela e que tal atitude a afetasse de sobremaneira, como se viu pela resposta que a mesma deu à situação «bate com os cornos».
Por esta razão o facto não provado em D deve passar a provado com a seguinte redação. “O arguido durante uma discussão com a ofendida arremessou uma torradeira para o chão, tendo esta proferido a expressão «bate com os cornos»”.
● “E) Em maio de 2019, na hora do almoço, no interior da habitação comum e no decurso de mais uma discussão iniciada pelo arguido, o mesmo agrediu-a com vários empurrões e com ambas as mãos apertou-lhe o pescoço, sendo que a vítima estava com o filho ao colo.
● F) A partir de setembro de 2019, o arguido recrudesceu os episódios de confronto verbal agressivo em que insultava e ofendia a vítima.
● G) Em 17 de outubro de 2019, na habitação comum, o arguido insultou a vítima de “puta” e “vaca”, em frente ao filho (bebé) de ambos e deu empurrões à vítima para o chão”.
No decurso da audiência de discussão e julgamento, a ofendida reportou-se ao episódio de maio de 2019, admitindo que o arguido não a agrediu. Disse, especificamente, que o arguido ao tentar-lhe tirar-lhe o filho do colo a “empurrou”, mas salientou que a intenção não era empurrar ou, mesmo, magoar.
Mais admitiu que o agarrar o pescoço não foi bem assim. Exprimiu que a empurrou junto ao pescoço, não o apertando e que não foi para atingi-la, mas para pegar no filho.
A própria ofendida não sentiu tal comportamento como agressivo para consigo e como invasão do seu espaço.
Conforme já referido anteriormente, o arguido não apelidou a ofendida de “puta” e de “vaca” no concreto incidente de out. 2019 Relativamente a este ponto, a ofendida não se demonstrou credível e não soube concretizar em que circunstâncias tal ocorreram. A própria não depôs nesse sentido.
O arguido AA negou tais injúrias, reafirmando que tais palavras não fazem parte da sua maneira de estar na vida.
Relativamente à alegação de que “o arguido aproveitou-se da ascendência que exercia pela ofendida, diminuindo-a na sua intelectualidade, convencendo-a de que nada valia e de que ele era o seu porto de abrigo e que sem ele não seria ninguém – ninguém gostava dela”.
A prova produzida concatenada no seu conjunto não permite este tipo de conclusões.
Primeiro porque a própria ofendida admitiu ter vindo de um meio disfuncional e ter a sua própria auto estima já diminuída a quando do início do relacionamento com o arguido. Depois porque se depôs no sentido de que a ofendida era uma pessoa forte pelo passado que teve quando viveu com a sua avó e por aquilo que depois alcançou.
Depois pela postura que teve nas discussões com o arguido que não era puramente passiva e subjugada, não apresentando uma postura temorosa, admitindo que o desrespeito era mútuo.
E ainda de facto a ofendida admitiu que o arguido foi o seu porto de abrigo por quem se apaixonou.
● “H) Desde a altura da separação até outubro de 2020, o arguido deslocava-se diariamente para a porta da residência da vítima sita na Rua ..., ..., ..., ..., o que se traduziu numa postura de perseguição e controlo a pretexto de ver o filho.
A ofendida, em sede de audiência de julgamento, desmentiu que o arguido a tenha perseguido junto da sua habitação e local de trabalho.
Apenas referiu o episódio em que a mesma se encontrava em isolamento profilático com o filho, e o arguido confrontou-a, pois estava a deslocar-se ao café C... e viu o filho fora da habitação, tendo-se desentendido por esses motivos.
Contudo, o arguido nesse episódio não foi propositadamente “ver” a casa da ofendida mas sim ao café, sendo que o frequenta há muitos anos por estar perto da vida social.
Conforme relatado pela testemunha EE, o arguido é cliente assíduo daquele estabelecimento há muitos anos, o que foi admitido pela própria ofendida, referindo que nunca o arguido a perseguiu e que têm conhecimento da presença do arguido no estabelecimento C... porque enquanto casal também a frequentavam.
A própria ofendida desmentiu o anteriormente dito quanto à perseguição e quanto a outras questões já supramencionadas, entendendo-se claramente o porquê destes factos constarem de factos não provados.
● “J) Que o arguido começou a perseguir a vítima, indo ao seu local de trabalho e chegando a falar com colegas de trabalho.
● K) Que o arguido disse às colegas e diretor que a vítima é uma badalhoca, ordinária e que ia fazer de tudo para lhe retirar a guarda do filho de ambos”.
O arguido, impedido de ver o filho, deslocou-se ao colégio, para ter uma reunião com a educadora de educação, mostrando-se desesperado com a situação, como a própria ofendida admitiu.
O arguido não foi perseguir a ofendida, o arguido foi tentar saber do filho, estar com ele.
O arguido em conversa com a educadora de infância acabou por desabafar e falar da ofendida, mãe do menor, o que não nega.
Contudo, não foi intenção do arguido prejudicar a ofendida no local de trabalho nem denegri-la, mas que, com o decorrer da conversa (a educadora de infância é amiga da ofendida e estava minimamente ao corrente dos acontecimentos) acabou por proferir alguns juízos de valor.
Donde resulta como concluiu o tribunal a quo que a questão do arguido nunca foi a ofendida e o fim da relação de ambos, mas sim o filho, estar com ele.
Aliás do conteúdo das mensagens trocadas a propósito do convívio do filho, não obstante alguns excessos de linguagem da parte do arguido e uso de algumas expressões desadequadas, resulta que a ofendida não demonstrou temor ou agastamento, chegando inclusive a demonstrar gargalhadas.
Aliás, a mesma frisou o quanto o pai e o filho se davam bem, o quanto o arguido era bom pai e o quanto atualmente se dão bem, portanto o Tribunal agiu corretamente ao julgar o caso em apreço, acompanhado pelo princípio da livre apreciação, da convicção produzida, da prova feita.
● “M) O arguido observou uma conduta de agressividade física e psíquica, controladora, persecutória e conseguiu perturbar o sossego e tranquilidade da vítima, fragiliza-la na sua liberdade pessoal, assim como atemorizá-la, apesar de a ofendida ser sua ex- companheira, mãe de filho menor.
● N) O arguido sabia que afetava a ofendida na sua saúde física e psíquica e atuou querendo atemorizá-la e atingi-la na sua dignidade enquanto ser humano, o que logrou”.
Ao longo de todo o processo, nomeadamente na audiência de julgamento, foi possível perceber que o arguido não quis atingir a dignidade da ofendida, ou que tenha afetado a saúde física e psíquica da mesma. Como se veio apurar, tratou-se de um difícil fim de relação para ambos e o ressurgimento do conflito surge já no âmbito de um conflito relacionado com o direito de visitas do filho comum, sendo que o discurso do arguido já neste contexto não visou a ofendida enquanto mulher mas sobretudo enquanto mãe na forma como estava a condicionar o seu convívio como o filho.
Posto isto, à parte algumas correções, o que o recorrente pretendia era que o tribunal valorasse a prova como ele a valorou; ou, por outras palavras, que o tribunal substituísse a convicção que teve, pela sua (do recorrente). E uma discordância acerca da valoração da prova, só por si não é suscetível de impor decisão diversa sobre estes sindicados factos que foram dados como não provados.
Para além disso, importa referir que perante a ausência de prova consistentemente positiva daqueles sindicados factos, o tribunal a quo deu observância do princípio do in dubio pro reo que tem como seu corolário o princípio da presunção de inocência plasmado no artigo 32º nº 2 da Constituição da República Portuguesa.
Em suma: é de manter inalterada a matéria de facto tal como havia sido fixada pelo tribunal a quo quanto aos factos dados como não provados exceto no ponto K dali eliminando a palavra “badalhoca” e introduzindo tal expressão no ponto 12 dos factos provados em substituição do termo “porca” e eliminado o ponto D dos factos não provados passando a ponto 14.A. com a seguinte redação “O arguido durante uma discussão com a ofendida arremessou uma torradeira para o chão, tendo esta proferido a expressão «bate com os cornos”.
Quanto ao demais não vemos qualquer desapoio lógico ou probatório significativamente relevante nas conclusões aportadas pelo Tribunal.

2ª Questão:
Quanto a esta questão - de saber o arguido deve ser condenado pelos crimes de que vinha acusado, desde já avançamos, a mesma terá que improceder, por três ordens de razões:
a) Por um lado, verificamos que a suscitação desta questão tinha por base o êxito da pretendida alteração da matéria de facto, alteração essa que, como supraexposto, não veio a ter acolhimento por este tribunal ad quem exceto nos pontos supra referenciados;
b) Por outro lado, adianta-se ainda que, face à inalterabilidade da matéria de facto e áquilo que se alterou e perante os factos provados, nenhuma censura merece também a decisão recorrida no que concerne à matéria de direito que conduziu à absolvição do arguido pela prática do crime de violência doméstica, pois os factos apurados são insuficientes para o preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do crime de violência doméstica tal como bem foi abordado/analisado na sentença recorrida.
Como bem refere a decisão a quo “Na verdade, face a toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não resultou demonstrado que a ofendida tenha sido atingida na sua dignidade enquanto pessoa humana, assim como, o arguido tenha adotado uma conduta de agressividade física e psíquica, controladora, persecutória, perturbando o sossego e tranquilidade da vítima, fragilizando-a na sua liberdade pessoal, numa relação de subordinação, de aniquilamento, de domínio, espezinhamento e subjugação face ao arguido. Até porque, o Tribunal convenceu-se que a conflitualidade existente entre o casal, essencialmente, após o nascimento do filho de ambos, ficou a dever-se ao próprio desgaste da relação, com faltas de respeito mútuas entre ambos, tendo sido, aliás, a própria ofendida a caraterizar a relação como “tóxica” e “com falta de respeito de ambas as partes”. Ademais, a conflitualidade existente entre o arguido e a ofendida após o fim da relação, ficou a dever-se única e exclusivamente a questões relacionadas com as responsabilidades parentais do filho de ambos, denotando-se das mensagens juntas aos autos, que a própria ofendida fazia prevalecer a sua própria vontade quanto à entrega ou não do menor.”
Subsequentemente a análise que o tribunal a quo faz sobre a autonomização dos crimes de ofensas à integridade física simples e injurias e difamação não nos suscitam questões porque efetivamente provou-se apenas um crime de ofensas à integridade física.
Tendo presente que a arguida havia a quando do primeiro inquérito manifestado desejo de não querer prosseguir com o procedimento criminal desistindo do mesmo ver fls. 32 do 1º vol, não se coloca sequer a questão de discutir a manutenção do procedimento criminal na ausência de queixa de crime semipúblico ou dependente de acusação particular.
Assim todas as ofensas, injúrias ou difamações proferidas até dezembro de 2019, reportadas aos autos mostram-se definitivamente sanadas e sem possibilidade de perseguição criminal por vontade expressa da ofendida.
Relativamente às expressões usadas pelo arguido e dadas como provadas em 9. a 14. As mesmas não estão abrangidas pela queixa apresentada pela ofendida no dia 22.11.20, na qual expressamente desejou procedimento criminal, ver fls. 25 vº e reportam-se a factos ocorridos dentro dos seis meses anteriores (out e nov. de 2020), sendo que a ofendida só não terá apresentado acusação particular porque o M.P. fixada a sua legitimidade por entender estar perante um crime de natureza pública não a convidou a tal.
Neste pressuposto, entendemos, embora existam outras posições jurisprudenciais em sentido contrário, que em abono do princípio da lealdade processual, não poderia arquivar-se o processo com o argumento de que não fez acusação particular. Conduzido todo o processo como de natureza pública e fixada que foi a legitimidade do M.P, não poderia deixar de se ter considerado as expressões em questão para apuramento criminal.
Contudo, o recorrente M.P conformou-se com a decisão do tribunal a quo no sentido do arquivamento e não colocou subsidiariamente a questão da responsabilidade criminal do arguido também por difamação e injúrias relativamente às expressões e juízos de valor proferidas após outubro de 2019, para o caso de não provimento da sua posição quanto ao crime de violência doméstica. Nessa medida e em abono do princípio do processo penal da proibição da “ reformatio in pejus “, com tradução no art.º 409.º n.º 1 do CPP, como um princípio geral de direito de processo penal, enquanto direito de defesa, consagrado no art.º 32.º n.º 1 da CRP em nome do direito a um processo justo, não pode esta instância ressuscitar crimes cujo seu arquivamento não foi questionado. Os parâmetros decisórios pelo tribunal de recurso ficam intraprocessualmente condicionados por este instrumento de defesa.
O princípio da proibição remonta ao séc. XVIII, repousando na teoria dos direitos adquiridos no sentido de que o arguido adquire após a primeira sentença condenatória o direito a não ser sujeito a uma sentença mais grave do que a proferida em antecedente julgamento, relacionando, alguns autores, a proibição com origem num “ Avis “ do Conselho de Estado francês, reportado a 1806, funcionando a proibição como um verdadeiro limite ao conteúdo da decisão do tribunal de recurso e aos seus poderes de cognição.
Vejamos agora se o arguido devia ter sido condenado pelo crime de ofensa à integridade física qualificada como é sugerido a título subsidiário pelo recorrente M.P.
No que concerne ao crime de ofensa à integridade física dúvidas não existem que a factualidade vertida nos pontos 6., 7., 15 e 16, integra os elementos objetivos e subjetivos do crime previsto no art. 143.º, n.º1, do Cód. Penal.
O crime de ofensa à integridade física é um crime material e de dano, cujo resultado consiste na lesão do corpo ou da saúde de outrem. Por ofensas no corpo deve entender-se, como faz Paula Ribeiro de Faria, in Comentário Conimbricense ao Código Penal vol. I, pág. 205, citando Eser, “todo o mau trato através do qual o agente é prejudicado no seu bem-estar físico de uma forma não insignificante”.
Salienta-se neste âmbito que o crime em causa, abrange textualmente qualquer ofensa no corpo ou na saúde, independentemente desta provocar lesão corporal. Tal entendimento encontra-se fixado no Ac. do STJ de 18 de Dezembro de 1991, in DR, serie I-A de 8 de Fevereiro de 1992: onde se pode ler “integra o crime do art.º 143.º do Código Penal a agressão voluntária e consciente, cometida à bofetada sobre uma pessoa, ainda que esta não sofra, por via disso, lesão, dor ou incapacidade para o trabalho.”
No que diz respeito à sua qualificação decorrente da combinação do art. 145.º, n.º1, al. a), com o art. 132.º, al. b), do mesmo Diploma, ou seja, a que decorre da circunstância do crime ter sido praticado contra pessoa com quem o agente manteve uma relação análoga à dos cônjuges.
Na base daquele art. 145.º, está “um tipo de culpa agravada de ofensa à integridade física por força da cláusula geral da especial censurabilidade, concretizado de acordo com um elenco de circunstâncias não automático e não taxativo” (Paulo Albuquerque, obra citada, pág.ª 445).
A propósito da qualificativa em presença, afirma o mesmo Autor:
“Os laços familiares básicos com a vítima devem constituir para o agente factores inibitórios acrescidos, cujo vencimento supõe uma especial censurabilidade. A Lei n.º 59/2007 veio alargar ainda mais esta tutela penal, prescindindo mesmo da existência de laços familiares básicos entre a vítima e o agente, ao incluir o homicídio de ex-cônjuge, de pessoa com quem o agente "tenha mantido" relação análoga à dos cônjuges e mesmo de progenitor de descendente comum em 1.° grau. Desde modo, incluem-se sob a tutela penal as relações familiares pretéritas e as relações parentais não familiares. É certo que as relações familiares, presentes e pretéritas, e as relações parentais são também aquelas que permitem uma maior desinibição, mas essa desinibição não pode constituir um factor de tolerância da violência, fundando o legislador precisamente nessas relações um juízo de censura penal agravado (também assim, MARGARIDA SILVA PEREIRA, 2008: 102, mas contra FERNANDA PALMA, 1996: 143, e TERESA SERRA, 1998: 152.”
O citado art.º 145.º do Código Penal prevê a qualificação do crime de ofensa à integridade física, se as ofensas forem produzidas em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente. E de acordo com o seu n.º 2, “são susceptíveis de revelar a especial censurabilidade ou perversidade do agente, entre outras, a circunstâncias previstas no n.º 2 do art.º 132.”
Assim, ocorre ofensa à integridade física qualificada, sempre que do facto resulta uma especial censurabilidade ou perversidade que possa ser imputada ao arguido por força da ocorrência de qualquer dos exemplos padrão enumerados no n.º 2 do art.º 132.º, ou, tendo estes uma natureza exemplificativa, sem deixarem de ser elementos constitutivos de um tipo de culpa, ou qualquer outra circunstância substancialmente análoga.
Com esta formulação dual pretende assinalar-se a interação recíproca que intercede entre o chamado critério generalizador e os exemplos padrão. É que não é pelo facto de se verificar em concreto uma qualquer das circunstâncias referidas nos exemplos-padrão ou noutras substancialmente análogas que fica preenchido o tipo, deduzindo-se daquelas a especial censurabilidade ou perversidade. Como inversamente, não será um maior desvalor da atitude do agente ou da personalidade documentada no facto que dará origem ao preenchimento do tipo de culpa agravado, sendo necessário que essa atitude ou aspetos da personalidade mais desvalioso se concretizem em qualquer dos exemplos padrão.
Não basta a realização típica dos elementos constitutivos do tipo agravado consagrado nas várias alíneas do n.º 2, sendo sempre, em última análise, necessário demonstrar que dela resultou uma especial censurabilidade ou perversidade do agente (a que alude o n.º 2 do art.º145.º).
Este tipo agravado é, segundo a doutrina que tem sido acolhida maioritariamente e a nível jurisprudencial, um tipo qualificado de culpa. Trata-se de punir mais severamente, no quadro de uma moldura penal agravada em relação ao crime na sua forma mais simples (o tipo matricial) condutas que, em razão da verificação de certas circunstâncias com uma estrutura essencialmente típicas, traduzam vertentes do facto ou da conduta do agente particularmente desvaliosas em razão da sua personalidade de ou da forma como ele imprime à sua atuação uma marca que acentua o desvalor do facto, em relação ao desvalor inerente a qualquer tipo de ofensa.
Quer dizer que o agente deve e tem de poder ser merecedor de um especial juízo de culpa ou de censura ético-jurídica em razão desse especial desvalor que a prática do facto revestiu.
Ver a propósito Ac RL de 19.05.15 in wwwdgsi. pt.
Posto que os pormenores da altercação não sejam muitos, não se provando sequer que a origem de tal desentendimento se ficou a dever a qualquer comportamento daquela última, nem se afirmando, concomitantemente, um qualquer papel mais ativo da mesma numa eventual confrontação física recíproca que pudesse ter existido, não vemos razões para afastar aquela exigência acrescida de respeito pressuposta na qualificativa em causa.
Cometeu, pois, o arguido o crime de ofensa á integridade física qualificada na pessoa da sua ex companheira, previsto no art. 145º, n º 1 al.a) e 2 com referência ao art. 132º, n º 2, al.b) do Código Penal.
Temos ainda presente que este novo enquadramento jurídico dos factos nada de novo vem acrescentar aos autos. Os factos são os mesmos amplamente discutidos pelas partes e a sua convolação para crime menos grave é evidente, na medida em que o arguido estava acusado de crime de violência doméstica do art. 152º, n º 1, al. b) e c) e n º 2, al. a) do Código Penal a que corresponde em abstrato pena de 2 a 5 anos de prisão, sendo que a pena do crime de ofensa à integridade física qualificada prevista no art. 145º, n º 1, al. a) e 2 é de prisão até 4 anos.
O crime tem natureza pública e não é possível a desistência, mantendo-se a legitimidade do M.P.
Da Pena.
Consigna o art.º 40º, nº1 do C.P. que a aplicação das penas tem por fim a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
“A protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos outros cidadãos, incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos, por parte dos cidadãos” – Ac. do STJ de 2000/11/30.
Na medida concreta da pena, segundo o art.º 71.º do C.P., há que atender-se à culpa do agente ainda que tendo em conta as exigências de prevenção,
Sendo que para graduar concretamente a pena ter-se-á que atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, conforme resulta do nº 2 do art.º 71º do C.P.
Refere a este propósito o Ac. do STJ, de 2006/04/06 “a medida da pena será, portanto encontrada em função da culpa do agente, que impõe uma retribuição justa, ponderando as exigências decorrentes do fim preventivo especial, ligadas à reinserção social do delinquente, às exigências decorrentes do fim preventivo geral, ligadas á contenção da criminalidade e à defesa da sociedade e levando ainda em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor e contra o agente.
Os critérios que a lei fornece para tanto são os previstos nos artigos 40º e 70º do Código Penal: a pena não pode ultrapassar a medida da culpa, entendida esta no sentido material, compreendendo tanto a vontade culpável como o seu objeto, que é o facto ilícito, e na sua concretização há que ter em conta a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
Tendo em conta estes critérios, a fim de determinar a medida da pena há que ter atender não só às circunstâncias que fazem parte do tipo (na sua intensidade), como à imagem global do facto e todas as circunstâncias que neste contexto mais amplo, mas sempre com conexão com o facto, deponham contra ou a favor do agente (art. 71º do Código Penal). Deste modo, obter-se-á um limite máximo constituído pela culpa e uma submoldura, que em caso algum ultrapassará este, condicionada por considerações de prevenção geral positiva, dentro do qual funcionarão considerações de prevenção especial (artigo 40º e 71º do Código Penal).
Tendo presente dolo direto e intenso do arguido com sucessivos empurrões e atuação à frente do seu filho, que a gravidade da sua conduta é de ilicitude mediana tendo em conta que produziu arranhões e pisaduras sem outras consequências, o facto de ter praticado os factos contra a sua ex-companheira, mãe do seu filho e que, por isso, lhe deveria merecer um respeito acrescido, a ausência de antecedentes criminais e o contexto do então casal desavindo em fase de separação, consideramos adequada a pena de 5 meses de prisão.
Tendo presente o disposto no art. 45º do Código penal, e uma vez que a pena de prisão não é superior a um ano e inexiste necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes tendo presente que não mais ocorreram incidentes, o ex casal mantém-se separado e o arguido apresenta-se totalmente inserido na sociedade e com relações normalizadas com a ofendida, como decorre dos pontos 17 a 27 dos factos provados, substitui-se aquela pena de prisão por 125 dias de multa, art.47º do Código Penal à taxa diária €6,00, tendo presente a situação económica do arguido, pontos 24 a 26 dos factos provados, perfazendo a quantia de €750,00, medida que se considera justa e adequada à conduta desvaliosa do arguido.
Nesta decorrência, procede em parte o recurso.


III. DISPOSITIVO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em:

1. Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, consequentemente, condenar o arguido AA pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de ofensa à integridade física qualificada previsto e punido pelo artigo 145º, n º 1, al. a) e 2 do Código Penal na pena de 05 meses de prisão substituída nos termos do art. 45º e 47º do Código Penal por 125 dias de multa à taxa diária de €6,00, perfazendo o total de €750.00.
2. Proceder à alteração da matéria fáctica nos termos supramencionados, todavia sem as consequências jurídicas reclamadas pelo recorrente.
3. Confirmar no demais a sentença recorrida.
4. Condenar o arguido em 3 (três) UC’s de taxa de justiça em face da atual condenação sem prejuízo do eventual apoio judiciário que lhe tenha sido concedido.
5. Sem custas para o recorrente Ministério Público, por delas estar isento (artigo 522º do Código de Processo Penal).
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Sumário
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Porto, 25 de outubro de 2023
(Texto elaborado pelo primeiro signatário como relator, e revisto integralmente - artigo 94º, n.º 2, do CPP – sendo que as assinaturas do presente acórdão foram apostas eletronicamente e encontram-se certificadas)
Paulo Costa
Paula Natércia Rocha
Pedro Afonso Lucas
________________
[1] Diploma a que se reportarão as demais disposições citadas sem menção de origem ou apenas com a sigla CPP.