Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
APOIO JUDICIÁRIO
JUNÇÃO DE DOCUMENTO COMPROVATIVO
NOMEAÇÃO DE PATRONO
Sumário
I – Na redacção do art. 24º, nº 4, da Lei n.º 34/2004, de 29/07, a letra da lei é unívoca e isenta de dúvidas, no sentido de que é com a junção do documento comprovativo da apresentação do requerimento de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono que se interrompe o prazo em curso. II – Não é defensável que o tribunal tenha de indagar, em todos os casos em que o réu se queda inerte, se o mesmo, por acaso, pediu apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, pressupondo a falha da parte daquele em juntar o respectivo comprovativo. III – Para além de impraticável, um tal entendimento conflituaria com o princípio da auto-responsabilidade das partes, que, apesar da mitigação decorrente das várias alterações legislativas ao processo civil, se mantém válido e operante. IV – Não tendo o réu contestado, nem constituído mandatário, não há lugar à sua notificação para, querendo, alegar por escrito.
Texto Integral
Processo nº 11137/22.5T8PRT.P1
(Comarca do Porto – Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 6)
Relatora: Isabel Rebelo Ferreira
1º Adjunto: Carlos Portela
2ª Adjunta: Isoleta Almeida Costa
*
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I – “A..., S.A.” intentou, no Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, acção declarativa, com processo comum, contra AA, pedindo a condenação deste a desocupar o imóvel identificado nos autos, entregando-o livre de pessoas e bens, e a pagar-lhe o valor de € 5.000,00, a título de indemnização pelo atraso na restituição do mesmo, acrescido de juros de mora desde a citação.
Citado o R., o mesmo não apresentou contestação, não constituiu mandatário, nem interveio por qualquer outra forma no processo.
Em 13/10/2022 foi proferido o seguinte despacho:
«Apesar de regularmente citado, o Réu não apresentou contestação, nem juntou procuração ao processo.
Assim, ao abrigo do disposto no art. 567º, n.º 1 do CPC, considero confessados os factos alegado[s] pelo Autor.
Cumpra o disposto no n.º 2 do art. 567º do CPC.».
Notificada para o efeito, a mandatária da A. apresentou alegações escritas, após o que foi proferida sentença, em 20/10/2022, na qual se decidiu julgar a acção procedente e, em consequência:
- condenar o R. (a referência a “Autor” constitui manifesto lapso de escrita) a desocupar o imóvel identificado no art. 1º da petição inicial, entregando-o à A. livre de pessoas e de bens;
- condenar o R. no pagamento à A. da quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), a título de indemnização pelo atraso na restituição do imóvel, valor a que acrescem juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Desta decisão veio o R. interpor recurso, tendo, na sequência da respectiva motivação, apresentado as seguintes conclusões, que se transcrevem:
«I- Por sentença de 20-10-2022, o tribunal a quo condenou o Réu a desocupar o imóvel dos autos e a pagar à Autora da quantia de €5.000,00 (cinco mil euros), fixando à acção o valor de €56.464,45, para o efeito considerou que apesar de regularmente citado, o Réu não apresentou contestação, pelo que se consideravam confessados os factos articulados pela Autora.
II- Em primeiro lugar, violou o douto tribunal o artigo 566º CPC.
III- O referido artigo impõe que quando exista falta de contestação do réu, o tribunal verifique se as formalidades legais, essenciais e acidentais foram cumpridas, nomeadamente se o réu foi citado com a cominação plena.
IV- A citação dos presentes autos não tem expressa a cominação de que a falta de resposta implicaria a confissão dos factos.
V- Por conseguinte, segundo a interpretação e aplicação correta daquele normativo deveria ter sido repetida a citação com a cominação expressa e clara das consequências da falta de contestação.
VI- Sem tal cominação na citação não pode, salvo melhor entendimento, considerar-se sem mais confessados os factos, pelo que violou o douto tribunal o artigo referido.
VII- Ao ter sido proferida sentença existe uma verdadeira nulidade, pois a omissão influi na decisão da causa, devendo ser a sentença anulada e repetida a citação.
VIII- Em segundo lugar, com a sentença do tribunal a quo foram violados os artigos 4º, 6º e 40º CPC.
IX- Face ao valor da ação existe patrocínio obrigatório nos presentes autos, o que processualmente representa um verdadeiro pressuposto processual relativo à parte.
X- O douto tribunal nada fez para suprir a referida falta de pressuposto processual, ainda que a lei determine que o possa fazer oficiosamente e ainda que a lei determine que o tribunal deva assegurar igualdade das partes incluindo nos meios de defesa.
XI- Assim, a interpretação e aplicação correta daqueles três normativos impunha que o tribunal a quo antes de proceder ao cumprimento do artigo 567º CPC e considerasse os factos confessados, oficiasse a Segurança Social para que informasse os autos se existiria algum pedido de apoio judiciário formulado pelo réu.
XII- Tal oficio iria permitir que o douto tribunal suspendesse os prazos do processo pois seria comprovado por essa via que já tinha entrado tal pedido junto daquela edilidade.
XIII- Pois resulta dos autos que o réu efetivamente pediu apoio judiciário a 13/07/2022, na modalidade de nomeação de patrono oficioso, e, portanto, pediu apoio judiciário ainda dentro do prazo de contestação.
XIV- Segundo acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo 2511/19.5T8CBR-A.C1. deve ser feita interpretação ab-rogante valorativa do artigo 24º, nº 5 da Lei 34/2004.
XV- Pois que, o que é pretendido pela interrupção do prazo previsto naquele artigo é a garantia do direito de defesa de quem recorre ao apoio judiciário, garantia com maiores exigências quando se trata de proteção jurídica na modalidade de nomeação de patrono oficioso.
XVI- Ao considerarmos que no artigo 24º, nº 5 da Lei 34/2004 está consagrado um verdadeiro ónus sobre a parte de juntar aos autos o comprovativo do pedido está-se a gerar consequências absolutamente desproporcionais.
XVII- Conforme consta do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo 2511/19.5T8CBR-A.C1. “Ora, devendo ser a interrupção do prazo que, a todo o custo, se deve preservar para coerente e eficazmente se assegurar o direito à defesa e por meio dela à Justiça, não faz sentido que se venha a excluí-la, apenas porque a parte, nuns casos por negligência ou displicência, noutros –que poderão ser muitos – por «menor instrução ou discernimento» [2], não fez juntar atempadamente aos autos o comprovativo do pedido de nomeação de patrono.”
XVIII- Ainda mais quando consta no processo que o réu por intermédio do seu filho tentou juntar aos autos em tempo oportuno o pedido de apoio judiciário (ainda durante o mês de julho), só que o fez para um endereço de email que não existe.
XIX- E aqui voltamos inevitavelmente à questão de querer retirar um efeito de quem se apresenta vulnerável do ponto de vista técnico e de quem procurou na própria citação um endereço de email válido para o efeito e não o encontrou, veja-se que na citação não consta qualquer endereço de email.
XX- Desta forma, com a sentença gerou-se uma completa desigualdade entre as partes manifesta em todo o decurso do processo, em arrepio aos ditames do artigo 4º CPC.
XXI- Para além de considerar como confessados os factos, o tribunal recorrido apenas cumpriu parte do artigo 567º, nº 2, notificando unicamente a Autora para alegar e apesar de estarem previstas as alegações por escrito também do advogado do réu, e do patrocínio ser obrigatório no presente processo, nada foi feito nesse sentido.
XXII- Por conseguinte, os artigos 4º, 6º e 40º do CPC e a Lei 34/2004 impunham que o tribunal a quo tivesse oficiado a segurança social para informar os autos sobre um possível pedido de apoio judiciário.
XXIII- Ao ter sido proferida sentença sem tal oficio existe uma verdadeira nulidade, pois mais uma vez tal omissão influi na decisão da causa, devendo a sentença ser anulada e dado prazo para réu contestar.
Nestes termos e nos melhores de direito deve a douta sentença ser completamente anulada, repetindo-se a citação do Réu e dando-lhe novo prazo para contestar.».
A A. apresentou contra-alegações, defendendo que deve ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II - Considerando que o objecto do recurso, sem prejuízo de eventuais questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas suas conclusões (cfr. arts. 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do C.P.C.), são as seguintes as questões a tratar:
a) apreciar da nulidade da citação do R.;
b) averiguar se o tribunal incumpriu a obrigação de verificar a regularidade da citação;
c) apurar da omissão de notificação do advogado do R. para alegar.
**
Comecemos pela primeira questão, sendo os seguintes os factos a considerar, resultantes da análise do presente processo:
1. O R., ora recorrente, foi citado por carta registada, com aviso de recepção, enviada para a morada indicada na petição inicial, em Julho de 2022;
2. O aviso de recepção foi assinado pelo próprio R.;
3. Na carta enviada para citação do R. consta, além do mais, que:
- “Se quiser defender-se, responda a esta carta
Se não responder dentro do prazo, o tribunal pode achar que concorda e que foi por isso que não respondeu. A lei chama a isso a confissão dos factos.”;
- “É obrigatório ter um/uma advogado/a para se defender
Para contestar o que é dito no pedido contra si, vai precisar de um/uma advogado/a. Se não tiver meios económicos para pagar, consulte nesta carta a secção “Precisa de apoio judiciário?”.”;
- “O pedido de apoio judiciário pode interromper o prazo
Se pedir um/uma advogado/a à Segurança Social e nos informar disso, o prazo para responder a esta carta é interrompido. Note que o prazo só se interrompe se nos informar de que pediu o apoio. Não basta pedi-lo.”;
4. E consta ainda, destacado, num quadrado do lado esquerdo da primeira página da referida carta:
“Tem 30 dias para responder
Se não responder dentro do prazo, o tribunal pode decidir dar razão a quem iniciou o processo contra si.”;
5. No canto esquerdo do cabeçalho da mesma carta consta a indicação do Juízo onde foi instaurada a acção, a sua respectiva morada e que “Para mais informações, ligue 252600450, nos dias úteis, das 09h00 às 12h30 e das 13h30 às 16h00”;
6. Decorrido o prazo da contestação, sem qualquer comunicação do R. ao processo, foi proferido o despacho de 13/10/2022 referido no antecedente relatório;
7. A sentença proferida foi notificada ao R. por carta enviada em 31/10/2022;
8. No dia 21/11/2022, foi apresentado no processo um requerimento a “enviar em anexo o Recibo de entrega da Proteção Jurídica para juntar ao processo n11137/22.5T8PRT esperar pelo novo parecer da Segurança Social”, tendo em anexo um recibo de entrega de documentos na Segurança Social, com data de 17/11/2022, dando conta da entrega de um documento de “exposição do requerente, notificação do tribunal processo nº 11137/22.5T8PRT”;
9. Notificado o R. para juntar a cópia do documento comprovativo de que apresentou junto dos serviços da Segurança Social o requerimento de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono para intervir neste processo, no dia 22/11/2022 foi apresentado no processo um requerimento a informar que o R. havia requerido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, juntando-se cópia (aparentemente incompleta) de um recibo dos Serviços da Segurança Social respeitante à apresentação naqueles serviços, em nome do R., no dia 13/07/2022, de um pedido de apoio jurídico, sem que desse recibo constasse qualquer carimbo de recebimento da Segurança Social nem qual a acção a que se destinava o pedido;
10. Perante tal requerimento, e não constando do histórico do processo a junção de qualquer comprovativo da apresentação de pedido de apoio judiciário por parte do R., foi ordenado à secção de processos que averiguasse a possibilidade de um tal requerimento ter sido dirigido ao processo e, por lapso, não ter sido ao mesmo associado;
11. A Secção de Processos informou que não foi apresentado qualquer requerimento em nome do R. que não tivesse sido junto aos autos;
12. Feitas averiguações junto da Segurança Social, apurou-se que foi efectivamente apresentado, no dia 13/07/2022, em nome do R., requerimento de apoio judiciário nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento da compensação de patrono, para contestar a presente acção;
13. O R. informou, por intermédio do seu filho, que remeteu em 14/07/2022 o comprovativo da apresentação do pedido de apoio judiciário, juntando cópia de uma menagem de correio electrónico dessa data remetida para o endereço de email: judicial@tribunais.org.pt., tendo como anexo a cópia do recibo aludida no ponto 9;
14. Conforme informação colhida junto dos serviços de apoio informático do IGFEJ, “Não existe qualquer correio electrónico judicial@tribunais.org.pt (…)”;
15. Do expediente enviado pela Segurança Social junto em 07/02/2023 e em 10/02/2023 resulta que:
- por carta registada datada de 20/09/2022 foi comunicado ao R. que se considerava ter o mesmo apenas direito à modalidade de pagamento faseado e que era intenção dos serviços indeferir o seu pedido (nas modalidades requeridas), sendo notificado para declarar por escrito, no prazo de 10 dias úteis, se aceitava as modalidades de pagamento faseado, sob pena de nada dizendo, ou não aceitando, o seu pedido ser considerado indeferido;
- em 17/11/2022 o R. apresentou requerimento onde solicita o pagamento faseado de “representante legal” e a dispensa da taxa de justiça e demais encargos, sendo este o documento a cuja entrega respeita o recibo aludido no ponto 8;
- por carta registada datada de 16/12/2022 foi comunicado ao R. que, por nada ter dito no prazo legal, o seu pedido foi considerado indeferido;
- por decisão de 09/02/2023 foi “revogado” o “indeferimento por falta de resposta”, por se ter constatado que “o requerente aceitou o pagamento faseado”, e foi concedido o benefício do apoio judiciário nas modalidades de pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento faseado da compensação de patrono, devendo o R. pagar a prestação mensal de € 60,00;
16. Nesse mesmo dia, na sequência da comunicação da decisão à O.A., foi nomeado patrono ao R., o qual pediu escusa, que foi concedida, sendo nomeada uma nova patrona em 28/02/2023.
Invoca o recorrente a nulidade da citação por não ter a expressa a cominação de que a falta de resposta implicaria a confissão dos factos.
Ora, como é bom de ver pela simples análise da carta enviada para citação do R., constante do histórico dos autos em 01/07/2022, e referida no ponto 3 dos factos elencados, não corresponde à verdade que nela falte a cominação em causa.
Como se fez constar do ponto 3 dos factos elencados, aí consta expressamente, inclusivamente com expressões salientadas a negrito, que se o R. se quiser defender tem de responder “a esta carta” e que “se não responder dentro do prazo, o tribunal pode achar que concorda e que foi por isso que não respondeu. A lei chama a isso a confissão dos factos.”.
Para além de se salientar a mesma informação, de forma destacada, num quadrado do lado esquerdo da primeira página da referida carta, onde se diz, com letra de tamanho maior e a negrito, que “Tem 30 dias para responder. Se não responder dentro do prazo, o tribunal pode decidir dar razão a quem iniciou o processo contra si.” – cfr. ponto 4 dos factos elencados.
Donde, sem necessidade de mais considerações é de concluir que o recurso não merece provimento nesta parte, pois que a cominação cuja falta se invocava, consta efectivamente da citação efectuada ao R., ora recorrente.
*
Passemos à segunda questão.
Invoca ainda o recorrente que o tribunal, antes de dar cumprimento ao disposto no art. 567º do C.P.C., deveria ter oficiado à Segurança Social, para que informasse se existiria algum pedido de apoio judiciário formulado pelo R. e ter suprido a “falta de pressuposto processual” decorrente de o R. não estar representado por advogado, sendo a acção de patrocínio obrigatório.
Quanto à questão da constituição obrigatória de advogado, nas causas que o art. 40º do C.P.C. identifica, tal significa que as partes não podem pleitear por si nessas acções, mas têm que o fazer por intermédio de advogado, ou seja os articulados, os recursos e os requerimentos em que se levantem questões de direito não podem ser subscritos pelas partes, mas apenas por advogados, e a intervenção nas diligências, designadamente na audiência de julgamento, tem de ser levada a cabo também por advogado.
Portanto, no caso da parte passiva, querendo a mesma intervir no processo, tem de o fazer representada por advogado, não pode fazê-lo por si só.
Mas isso não significa que tenha de ter um advogado a representá-la se não quer intervir no processo, se se constitui em situação de revelia absoluta.
Aliás, tanto assim é que, nesse caso, o réu que não constituiu mandatário só passa a ser notificado após ter praticado algum acto de intervenção no processo e, se não o fizer, só tem que ser notificado da decisão final – cfr. art. 249º, nºs 3 e 5, do C.P.C..
Não tinha, pois, o tribunal que tomar quaisquer providências quanto à constituição de advogado por parte do R., até porque não se estava perante qualquer das situações previstas no art. 41º do C.P.C., que respeitam à intervenção da parte no processo sem estar representada por advogado.
No que concerne à questão de o tribunal oficiosamente solicitar informação à Segurança Social, temos para nós que não cabe ao tribunal fazê-lo, nomeadamente se não houver nenhum indício no processo de que o R. possa ter apresentado requerimento de apoio judiciário para nomeação de patrono.
Vejamos.
Nos termos do art. 24º, nº 4, da Lei nº 34/2004, de 29/07, na redacção conferida pela Lei nº 47/2007, de 28/08, quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo (sublinhado nosso).
Trata-se de uma obrigação como tantas outras que a lei processual civil impõe às partes, sendo que o Tribunal Constitucional já por várias vezes se pronunciou pela não inconstitucionalidade desta norma, não considerando “gravoso para o requerente, em termos de lesar o seu direito de aceder à Justiça, exigir que ele documente nos autos a apresentação do requerimento de apoio judiciário nos serviços de segurança social, no prazo judicial em curso, para que este se interrompa” (cfr. por todos o Ac. do Tribunal Constitucional nº 350/2016, de 07/06/2016, publicado em www.tribunalconstitucional.pt).
Como se diz no sumário do Ac. da R.P. de 06/12/2016, publicado em www.dgsi.pt, com o nº de processo 1488/12.2TBFLG-A.P1, “não se mostra gravoso para o requerente do Apoio Judiciário, em termos de lesar o seu direito de aceder à Justiça, exigir que ele documente nos autos a apresentação do requerimento de Apoio nos serviços de segurança social, no prazo judicial em curso, para que este se interrompa, pois que se trata de uma diligência que não exige quaisquer conhecimentos jurídicos e que, portanto, a parte pode praticar por si só, com o mínimo de diligência a que, como interessado, não fica desobrigada pelo facto de se encontrar numa situação de carência económica”.
Pode-se questionar a bondade da opção do legislador e defender solução diferente em sede de alteração legislativa, porém, sendo esta a lei em vigor, é aquela que tem de ser aplicada pelos tribunais, sendo certo que na sua interpretação não se podem olvidar as regras do art. 9º do Código Civil.
Ora, no caso a letra da lei é unívoca e isenta de dúvidas, no sentido de que é com a junção do comprovativo que se interrompe o prazo em curso – e se se pode defender que havendo essa informação no processo, a mesma deve ser considerada ainda que não decorrendo da junção do comprovativo pela parte (cfr. Ac. da R.L. de 14/09/2022, com o nº de processo 300/21.6SBGRD-A.C1, publicado em www.dgsi.pt), já não se afigura defensável que o tribunal tenha de indagar, em todos os casos em que o réu se queda inerte, se o mesmo, por acaso, pediu apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, pressupondo a falha da parte daquele em juntar o respectivo comprovativo.
Para além de tal se tornar impraticável, então teria de se defender que em todos os casos de incumprimento de ónus processuais, antes de retirar as consequências desse incumprimento, o tribunal indagasse se não teria havido algum “esquecimento” da parte, sob pena de violação do princípio da igualdade das partes.
Mas, principalmente, um tal entendimento conflituaria com o princípio da auto-responsabilidade das partes, que, apesar da mitigação decorrente das várias alterações legislativas ao processo civil, se mantém válido e operante.
Conforme se diz no Ac. do S.T.J. de 12/11/2002, publicado em www.dgsi.pt, com o nº de processo 02A2876 (entendimento que se mantém actual), “é óbvio que o princípio da cooperação atenua a auto-responsabilidade das partes. Não a elimina porém, não podendo aquelas esperar do tribunal uma intervenção adjuvante ao longo e a cada momento do iter processual. Seria isto, além do mais, a porta aberta à perpetuação do processo”.
Ou no mais recente Ac. da R.G. de 23/05/2019, publicado no mesmo sítio da Internet, com o nº de processo 1345/18.9T8CHV-A.G1, “o exercício do dever de diligenciar pelo apuramento da verdade e justa composição do litígio, não comporta uma amplitude tal que o autorizem a colidir quer com o princípio da legalidade e da tipicidade que comanda toda a tramitação processual, quer com outros princípios fundamentais como o do dispositivo, da auto-responsabilidade das partes e o da preclusão, importando este que, ao longo do processo, as partes estão sujeitas, entre outros ónus, ao de praticar os atos dentro de determinados prazos perentórios” (no mesmo sentido, podem ver-se o Ac. da R.G. de 19/11/2020, com o nº de processo 26/12.1TBAFE-C.G1, e o Ac. da R.C. de 12/03/2019, com o nº de processo 141/16.2T8PBL-A.C1, ambos publicados em www.dgsi.pt).
Assim, “a inércia processual das partes (seja por inépcia ou impreparação sua em termos técnico-processuais, seja intencionalmente em função de uma certa interpretação do direito aplicável) produz consequências negativas (desvantagens ou perda de vantagens) para elas, só havendo lugar à desvalorização do princípio da sua autorresponsabilização mediante a intervenção tutelar, assistencial ou corretiva do tribunal quando a lei o preveja” (cfr. Ac. da R.L. de 20/12/2016, com o nº de processo 3422/15.9T8LSB.L1-7, publicado em www.dgsi.pt).
No caso concreto verifica-se que na carta de citação consta a advertência de que se for solicitado o apoio judiciário para nomeação de patrono o R. deve informar o tribunal e de que o prazo para contestar só se interrompe se prestar tal informação, não bastando a apresentação do pedido (cfr. ponto 3 dos factos elencados).
E que o filho do R. enviou uma comunicação de correio electrónico para entregar o comprovativo “do apoio jurídico” para um endereço inexistente, sendo que na carta de citação constava a morada do Tribunal, onde se poderia ter entregue o comprovativo em mão ou ter enviado o mesmo por correio normal, e um número de telefone para pedir informações, para onde se poderia ter telefonado para perguntar de que forma podia ser entregue o documento e qual o endereço de correio electrónico correcto.
Certo é que houve incúria na busca do endereço electrónico do Tribunal e no envio da comunicação por essa via, sem ter certeza daquele endereço, bem como na não procura de comprovação de que a mensagem havia chegado ao seu destino (sendo que, por norma, os remetentes são avisados quando as suas comunicações de correio electrónico não chegam ao destino, nomeadamente com a indicação da inexistência do endereço inserido na mensagem).
Veja-se que, em Novembro de 2022, quando foi enviado o requerimento aludido no ponto 8 dos factos elencados, agora já com a indicação do endereço correcto (eventualmente porque constava da notificação da sentença), não se fez qualquer referência ao envio do e-mail anterior para um outro endereço, nem se tentou apurar se tinha sido ou não recebido, nem, perante os sucessivos pedidos de esclarecimento do tribunal e de junção dos comprovativos, apurar o que teria sucedido – e só na sequência do despacho de 03/02/2023 é que o filho do R. informou que tinha enviado um e-mail em Julho de 2022.
Ademais, o documento junto nessa comunicação era apenas um recibo de entrega de documentos, não estava completo, não identificava o processo, nem a modalidade de apoio judiciária requerida e não tinha o carimbo da Segurança Social atestando o recebimento (tratava-se do referido nos pontos 9 e 13 dos factos elencados), pelo que nem sequer constituía o comprovativo cuja junção se pretendia.
Tal situação nem sequer é semelhante àquela a que respeita o Ac. da R.C. de 26/10/2020, com o nº de processo 2511/19.5T8CBR-A.C1, publicado em www.dgsi.pt, citado pelo recorrente nas suas alegações, posto que aí se tratava de “situações em que a pendência processual não permita às secções a vigilância permanente dos prazos, e em que o processo acaba por vir concluso já com a defesa do requerente de apoio judiciário apresentada pelo patrono que entretanto lhe foi nomeado, desde que se constate que esse apoio judiciário foi atempadamente requerido na Segurança Social”.
Além de que, o que aí se defende quanto às demais situações, de o tribunal oficiar primeiro à Segurança Social a saber da possível pendência de pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono (no que nos parece ser uma opinião única, pois não encontramos publicado qualquer outro acórdão no mesmo sentido), respeita aos casos em que existe “dúvida a respeito de uma pendente nomeação de patrono que atempadamente tenha interrompido o prazo para a sua apresentação”.
Ora, no caso dos autos, não havia nenhum elemento no processo que pudesse suscitar a dúvida sobre a eventual existência desse pedido.
Como quer que seja, porque um tal entendimento, seguido genericamente, contende com o princípio da auto-responsabilidade das partes, esvaziando-o de sentido nestas situações, não concordamos com o mesmo, na esteira do que já dissemos supra, mas antes com aquele, que é quase unânime na jurisprudência publicada, de que “compete ao requerente do apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, por ser a parte interessada na interrupção do prazo que estava a correr, juntar aos autos do processo para o qual requereu aquele benefício comprovativo do respetivo pedido de proteção jurídica” (cfr. Ac. da R.L. de 24/09/2019, com o nº de processo 8309/16.5T8LRS-B.L1-7, podendo ainda ver-se, por todos, o recente Ac. da R.L. de 30/03/2023, com o nº de processo 8822/22.5T8SNT.L1-2, ambos publicados em www.dgsi.pt).
Não houve, pois, incumprimento da parte do tribunal da obrigação de verificar a regularidade da citação, a qual não comporta nem a obrigação de providenciar por advogado ao réu que se encontre em situação de revelia, nem de solicitar à Segurança Social informação sobre uma eventual apresentação de pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono.
Donde, também nesta parte não merece provimento o recurso do R..
*
Resta apreciar a terceira questão.
Nos termos do art. 567º, nº 2, do C.P.C., após se verificar a situação de revelia do réu e se considerarem confessados os factos articulados pelo autor, é concedido o prazo de 10 dias, primeiro ao mandatário do autor e depois ao mandatário do réu, para alegarem por escrito, com exame do suporte físico do processo, se necessário, e em seguida é proferida sentença, julgando-se a causa conforme for de direito.
Esta referência ao mandatário do réu respeita aos casos em que o réu, não obstante não ter contestado, juntou procuração a mandatário judicial no prazo da contestação (cfr. nº 1 do mesmo artigo), tendo, pois, advogado constituído nos autos.
Obviamente que se o réu não estiver representado por advogado no processo não há lugar à sua notificação, porque não há mandatário e porque esta específica notificação não se destina à própria parte (como já se disse anteriormente, o réu revel só tem de ser notificado da decisão final).
Na verdade, “como tais alegações de direito têm de ser redigidas e subscritas pelos advogados das partes (art.º 40.º, n.º 2), o réu não contestante só pode produzir alegações se tiver constituído mandatário. Se assim não acontecer, apenas o autor pode alegar” (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, 3ª ed., Almedina, pág. 681; no mesmo sentido, o Ac. da R.L. de 30/03/2023 já aludido).
Portanto, como o réu não tinha advogado a representá-lo à data em que foi proferido o despacho previsto no art. 567º do C.P.C., apenas havia que notificar a mandatária da A., o que foi feito, não tendo sido preterida qualquer formalidade.
Assim, também nesta parte não merece acolhimento a pretensão do recorrente.
*
Em face do resultado do tratamento das questões analisadas, é de concluir pela não obtenção de provimento do recurso interposto pelo réu e pela consequente confirmação da decisão recorrida.
***
III - Por tudo o exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
**
Custas da apelação pelo recorrente (art. 527º, nºs 1 e 2, do C.P.C.), sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
*
Notifique.
**
Sumário (da exclusiva responsabilidade da relatora - art. 663º, nº 7, do C.P.C.):
………………………………….
………………………………….
…………………………………..
*
*
Porto, 12/10/2023
Isabel Ferreira
Carlos Portela
Isoleta de Almeida Costa