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CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO
OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO
PRAZO DE RENOVAÇÃO
Sumário
I - A oposição à renovação é um direito potestativo que depende apenas da vontade de quem emite a declaração, sem precisar de invocar qualquer justificação e só opera para futuro. Como única condicionante, impõe-se-lhe apenas que respeite o período de aviso consignado na lei ou no contrato. II - Dispondo a nova redacção do artigo 1096.º, do Código Civil, introduzida pela Lei 13/2019 de 12.2, sobre o conteúdo da relação jurídica do arrendamento, e abstraindo a mesma do facto que lhe deu origem, é de concluir que a situação se enquadra na 2.ª parte do artigo 12.º do Código Civil, sendo a nova redacção aplicável às relações já constituídas e que subsistam à data da sua entrada em vigor. III - A expressão “salvo estipulação em contrário”, contida no nº 1 do artigo 1096º do Código Civil, deve ser interpretada como reportando-se apenas à possibilidade de as partes afastarem a renovação automática do contrato, e já não a de poderem contratar períodos diferentes de renovação. Assim, não havendo oposição válida e eficaz, os contratos de arrendamento para habitação renovam-se por mínimos de 3 anos, ou por período superior, caso o período de duração do contrato seja superior a 3 anos. IV - Assim, o artigo 1096.º, n.º 1, do Código Civil, na nova redacção introduzida pela Lei 13/2019, de 12.2, fixa um prazo de renovação mínimo de três anos, de natureza imperativa não podendo as partes convencionar um prazo de renovação inferior.”
Texto Integral
Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP.328/23.1YLPRT.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
1. Relatório
A..., S.A., com sede na Avenida ... Lisboa instaurou procedimento especial de despejo contra AA, residente na Rua ... ..., invocando opor-se à renovação do contrato de arrendamento.
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Citada, a requerida deduziu oposição, sustentando que não se verificam os pressupostos de oposição à renovação na data pretendida pela senhoria.
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Notificada para exercer o respectivo contraditório, a senhoria defendeu o acerto da sua posição.
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Por decisão proferida a 06 de Julho de 2023 julgou-se procedente a oposição apresentada e improcedente o procedimento especial de despejo.
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Não se conformando com a decisão proferida, veio a recorrente “A..., S.A.”, interpor recurso de apelação, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
I. Celebraram as partes um contrato de arrendamento para habitação permanente, com prazo de duração inicial de 5 (cinco) anos, com início em 01 de Janeiro de 2014, renovável por iguais e sucessivos prazos de 1 (um) ano, salvo denúncia das partes.
II. Sendo o arrendamento celebrado por prazo certo, automaticamente renovável pelos períodos contratualmente estabelecidos de um ano.
III. Em momento algum, mormente no ato de celebração do contrato, existiu qualquer oposição da requerida aos termos do contrato, tendo ficado estabelecidas todas as cláusulas contratuais, nomeadamente o prazo de renovação.
IV. Ficaram ainda estipulados contratualmente, de acordo com a lei, os prazos de denúncia, bem como de revogação do contrato.
V. O contrato esteve vigente oito anos, estando, portanto, ultrapassado o período mínimo de vigência dos contratos de arrendamento urbanos destinados à habitação passíveis de renovação, consagrado no n° 3 do artigo 1097° do Código Civil, pelo que a correta interpretação do regime legal vigente impõe considerar que a oposição à renovação do contrato por mais um ano produziu efetivamente efeitos.
VI. O que está em discussão é saber se o disposto no artigo 1096.º do Código Civil tem carácter imperativo ou supletivo e, em consequência, qual o prazo da Renovação em curso: é de 5 anos, de três anos ou de 1 ano.
VII. Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 24.05.2022, processo 7855/20.0T8LRS.L1-7, in www.dgsi.pt., a redação da norma não é, por si, suficiente para tomar posição nessa questão, «porquanto, na sua parte inicial, ressalva a estipulação em contrário, sem que possa afirmar-se que o faz apenas por referência ao primeiro segmento, ou seja, para estipular apenas a faculdade de as partes afastarem a renovação automática, ou se também abrange o segundo segmento da norma, possibilitando que estas convencionem períodos de renovação de duração inferior ao limite mínimo de três anos aí previsto.
VIII. Sobre esta matéria, ainda que a propósito dos contratos de arrendamento urbano para fins não habitacionais (embora a lei remeta para as normas do arrendamento para habitação com prazo certo), refere Jéssica Rodrigues Ferreira, in Análise das principais alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, aos regimes da denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento urbano para fins não habitacionais, pp. 82-95 [Revista Eletrónica de Direito, fevereiro 2020, página 82, in https://ciie.up.pt/client/files/0000000001/5-artigo - Jéssica-ferreira 1584.pdf]:
“Parece-nos que o legislador pretendeu que as partes fossem livres não apenas de afastar a renovação automática do contrato, mas também que fossem livres de, pretendendo que o contrato se renovasse automaticamente no seu termo, regular os termos em que essa mesma renovação ocorrerá, podendo estipular prazos diferentes - e menores - dos supletivamente fixados pela lei, e não, conforme poderia também interpretar-se da letra do preceito em análise – cuja redação pouco precisa gera estas dúvidas – um pacote de “pegar ou largar”, em que as partes estariam adstritas a optar entre contratos não renováveis ou, optando por um contrato automaticamente renovável no seu termo, com períodos sucessivos de renovação de duração obrigatoriamente igual à duração do contrato ou de cinco anos se esta for inferior, pois ainda que a ratio subjacente a esta alteração legislativa tenha sido reforçar a estabilidade dos contratos, se o legislador deixou ao critério das partes o mais - optar por renovar ou não o contrato - também se deve entender que lhes permite o menos - optando por renovar o contrato, regular os termos dessa renovação.
IX. Este argumento é reforçado pela remissão operada no n.º 1 para o regime de oposição à renovação previsto para o arrendamento habitacional, regulado nos art.ºs. 1097.º e 1098.º, onde se continuam a prever prazos de oposição à renovação específicos para os casos de duração inicial do contrato ou das suas renovações inferiores a cinco anos (al. b) e c) do n.º 1 do art. 1097.º e al. b) e c) do n.º 1 do art. 1098.º).
X. No sentido de que o prazo da renovação admite estipulação em contrário, ISABEL ROCHA, PAULO ESTIMA, Novo Regime do Arrendamento Urbano – Notas práticas e Jurisprudência, 5.ª edição, Porto, Porto Editora, 2019, p. 286 e JORGE PINTO FURTADO, Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano, Coimbra, Almedina, 2019, p. 579 (para o arrendamento habitacional), onde se lê, a jeito de conclusão, que se pode “validamente estabelecer, ao celebrar-se um contrato, que este terá, necessariamente, uma duração de três anos, prorrogando-se, no seu termo, por sucessivas renovações de dois, ou de um ano, quatro ou cinco, como enfim se pretender” e pp. 686-687 (para o arrendamento não habitacional), onde se pode ler que o contrato se pode renovar por “períodos sucessivos e iguais, entre si, de um, dois, três, quatro ou, em suma, os mais anos que se pretendam”.”
XI. Assim, ainda que reconhecendo que as normas imperativas previstas na Lei n.º 13/2019 se aplicam também aos contratos celebrados em data anterior à sua entrada em vigor, a autora afasta essa aplicação quanto às normas supletivas, onde integra a nova duração supletiva do prazo de renovação:
“Parece-nos que, regra geral, as normas imperativas previstas na Lei 13/2019 se aplicam não apenas aos contratos futuros, mas também aos contratos celebrados em data anterior à entrada em vigor da lei, nos termos da regra geral sobre aplicação da lei no tempo prevista no n.º 2 do art. 12.º, na medida em que tais normas contendem com o conteúdo de relações jurídicas abstraindo dos factos que lhes deram origem.
XII. Não nos parece, porém, que as disposições supletivas da nova lei, como por exemplo a nova duração supletiva dos contratos de arrendamento para fins habitacionais e a renovação dos contratos por períodos sucessivos de igual duração ou de cinco anos se esta for inferior, se apliquem aos contratos celebrados antes de fevereiro de 2019, aos quais se continuarão a aplicar as normas supletivas vigentes aquando da sua celebração, solução esta que era, aliás, a consagrada no art. 59.º da Lei 6/2006 e a que decorre do próprio n.º 2 do art. 12.º, pois embora se trate da regulação do conteúdo da relação jurídica, estas normas não se abstraem dos factos que lhe deram origem.
XIII. Na verdade, ao celebrarem o contrato, as partes nortearam os seus interesses e arquitetaram o equilíbrio das suas relações com base na lei vigente, a qual se deve, por isso, considerar “como incorporada no contrato (lex transit in contractum) por ter sido como que tacitamente acolhida nas suas disposições pela vontade das partes”.
XIV. Pelo que se entende, que a comunicação de oposição de renovação do contrato por parte da Requerente/Autora, enquanto senhoria é válida, eficaz e tempestiva tendo produzido os seus efeitos, pelo que o contrato de arrendamento cessou em 31/12/2022.
XV. Ainda que se entendesse que pela aplicação do artigo 1096º de forma imperativa, interpretação com a qual não se concorda, sempre se diria, no que respeita à aplicação da Lei no tempo que:
A compreensão desta matéria implica uma reflexão sobre a forma como se foi renovando o contrato em apreço, de acordo com o respetivo teor e com a legislação, entretanto, aplicável.
XVI. De acordo com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/01/2023, Processo n.º 7135/20.1T8LSB.L1.S1 (Pedro Lima Gonçalves), a redação do art.º 1096.º, terá aplicação?
Sim, se essa for a primeira renovação.
Não, se a primeira renovação já tiver decorrido anteriormente à entrada em vigor da lei 13/2019.
XVII. No caso concreto, o contrato iniciou-se em 01/01/2014, tendo tido a sua primeira renovação (por um ano) a 01/01/2019. Como tal, a 13/02/2019, data da entrada em vigor das alterações introduzidas pela Lei 13/2019, de 12-02, havia já operado a primeira renovação do contrato, que vigorou até 31/12/2019,
XVIII. Tendo, então, sido renovado sucessivamente a 1 de janeiro dos anos subsequentes, por períodos de um ano, até que a senhoria, ora Recorrente, se opôs à renovação, nos termos legais.
XIX. A Douta decisão recorrida não subsume corretamente os factos ao direito aplicável, devendo como tal ser substituída por outra que, julgando o contrato validamente resolvido por oposição à renovação operada pelo Senhorio, defira a ordem de despejo requerida.
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Foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
2. Factos assentes
Com relevância para o conhecimento do recurso mostram-se assentes os seguintes factos:
1. Em 01/01/2014, a Arrendamento Mais - Fundo de Investimento Fechado para Arrendamento Habitacional, com o NIPC ...45, celebrou com a requerida um contrato de arrendamento para habitação permanente, tendo por objecto a fracção autónoma designada “AP”, correspondente a habitação ....3 no piso ..., com entrada pelo número ...6 da Rua ..., em ... - domicílio convencionado no contrato - descrita na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o número ...26 e inscrita na matriz predial urbana com o artigo ...47, com prazo de duração inicial de 5 (cinco) anos, com início em 01 de Janeiro de 2014, renovável por iguais e sucessivos prazos de 1 (um) ano, salvo denúncia das partes.
2. Nos termos da cláusula Terceira do contrato “UM - O Senhorio poderá opor-se à renovação automática do contrato mediante comunicação remetida ao Arrendatário por carta registada com aviso de recepção, com a antecedência mínima de 120 dias do termo do prazo de duração inicial do contrato, ou de qualquer uma das suas eventuais renovações”.
3. Por aditamento ao contrato de 11-09-2015 foi adicionada a fracção autónoma designada “CF”, correspondente ao aparcamento n.º ... e arrumos n.º .., com acesso pelo número ..... do prédio sito na Rua ..., com a mesma descrição predial e inscrição matricial que o imóvel mencionado em 1.
4. A renda inicialmente prevista era de €395,00, sendo modificada por aditamento de 03-11-2014 para €365,00 (trezentos e sessenta e cinco euros), devendo ser paga ao primeiro dia útil do mês anterior a que a renda diga respeito.
5. Os imóveis locados foram vendidos à requerente.
6. Por meio de carta registada com aviso de recepção enviada para o domicílio convencionado, a requerente opôs-se à renovação do contrato de arrendamento, com produção de efeitos a 31-12-2022.
7. A comunicação chegou ao conhecimento da requerida em 08-07-2022.
2.Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar:
Das conclusões formuladas pela recorrente as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que as questões a resolver no âmbito do presente recurso centram-se na questão de saber se o artigo 1096.º do Código Civil, na actual redacção, conferida pela Lei 13/2019, de 12 de fevereiro, se aplica ou não aos contratos celebrados anteriormente e, aplicando-se, se tem carácter imperativo ou supletivo.
4. Conhecendo do mérito do recurso
O contrato de arrendamento urbano, figura contratual subjacente aos presentes autos, pode ser descrito como o contrato mediante o qual uma das partes concede à outra o gozo temporário de um prédio urbano, no todo ou em parte, mediante retribuição, aparecendo como seus elementos típicos a obrigação de proporcionar o gozo de um prédio urbano, o prazo e a retribuição.
Assim, de tal contrato nascem direitos e deveres para ambas as partes.
Nos termos do disposto no artigo 1079º, do Código Civil, o arrendamento urbano, como o aqui em causa (artigo 1064º, do Código Civil), cessa por acordo das partes, resolução, caducidade, denúncia ou outras causas previstas na lei.
Entre outras causas, o contrato de arrendamento caduca findo o prazo de duração contratual ou legalmente estipulado (artigo 1051º, alínea a) do Código Civil).
Quanto à duração do contrato de arrendamento urbano regem os artigos 1095º e ss., do Código Civil, actualmente na redacção introduzida pela Lei 13/2019, de 12-02, com início de vigência em 13-02-2019.
Vejamos, agora, se a Lei n.º 13/2019, de 12 de Fevereiro é aplicável aos contratos celebrados anteriormente à sua entrada em vigor.
Ora, no caso vertente resulta dos factos provados que:
- Em 01/01/2014, entre a Requerente e a primitiva locatária, foi celebrado um contrato de arrendamento para habitação permanente com prazo certo e com opção de compra, com prazo de duração inicial de 5 (cinco) anos, renovável por 1 (um) ano, salvo denúncia das partes.
- O sobredito contrato de arrendamento foi objecto de dois aditamentos, datados, o primeiro deles, de 03/11/2014, e versando sobre o valor da renda, que passou a ser de €365,00, e o segundo, de 11/09/2015, incidente sobre o locado propriamente dito, ao qual, com efeitos retroactivos, foi adicionada a fração autónoma “CF”, destinada a arrumos e aparcamento.
- A renda, no momento, por força das actualizações legais, é de €375,23.
- Por carta datada de 04/07/2022, remetida pela Procuradora e Representante da Requerente à Requerida, e por esta recepcionada a 08/07/2022, foi comunicada a oposição à renovação do sobredito contrato, com produção de efeitos a 31/12/2022.
Ora, do atrás exposto ressalta um dos lapsos em que a Recorrente incorre: em 01/01/2014, data do início de vigência do contrato de arrendamento, o artigo 1096.º, n.º 1 do Código Civil tinha a redacção que lhe fora conferida pela Lei 31/2012, de 14 de Agosto e não já pela Lei 6/2006.
E preceituava o seguinte o dito normativo: “Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”
Como se pode ler no Acórdão da Relação do Porto de 04/05/2023, desta Secção, de que é relatora a Senhora Juiz Desembargadora Isabel Silva, consultado no sítio da internet www.dgsi.pt, de tal redacção “(…) decorre que, a partir de 15 de agosto de 2012 (data de início de vigência desta Lei e em que o contrato tinha pouco mais de um mês), passou a só serem permitidas renovações por idênticos períodos (“por períodos de igual duração”) que, no caso, era de 5 anos. (…)
Na verdade, e como melhor se verá mais à frente, a expressão “salvo estipulação em contrário” deve ser interpretada como reportando-se apenas à possibilidade de as partes afastarem a renovação automática do contrato, e já não a de poderem contratar períodos diferentes de renovação.”
O que equivale a dizer, na senda do atrás convocado Acórdão, que à data da contratualização do arrendamento (01/01/2014), por força da lei vigente, a renovação do contrato já tinha que observar o prazo inicial, ou seja, cinco anos.
Vertido o que se vem dizendo para o contrato controvertido, temos, pois, que o termo do contrato celebrado em 01/01/2014, pelo prazo de 5 anos, ocorreu em 31/12/2018, e que a sua primeira renovação se deu em 01/01/2019.
Sendo que esta renovação, a primeira, seria, por adesão à jurisprudência acima escalpelizada, ancorada na Lei 31/2012, já de 5 anos, e daqui redundaria de imediato que o mesmo apenas culminaria em 31/12/2023.
Todavia, ainda que assim se não entendesse, e antes se considerasse que o prazo de renovação seria de 1 ano, por força do contratualizado, certo é que, por força da Lei 13/2019, de 12 de fevereiro, com entrada em vigor em 13/02/2019, o prazo de renovação deixou de ser o de um ano, contratualmente previsto, para passar a ser o de prazo imperativo prescrito no n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil, que passou a estipular: “Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”.
Significou tal alteração legislativa que, em 01/01/2019, o contrato se renovou por cinco anos (período sucessivo de igual duração) e que persistirá em vigor até 31/12/2023.
E assim é porque, contrariamente ao pugnado pela Recorrente, a Lei 13/2019, de 12 de fevereiro, aplica-se, não apenas aos contratos futuros, mas (e também) aos contratos em curso, como decorre da regra geral do artigo 12.º, n.º 2 (2.ª parte) do Código Civil, por se tratarem de contratos de execução duradoura – cf., neste sentido, Maria Olinda Garcia, “Alterações em matéria de Arrendamento Urbano introduzidas pela Lei 12/2019 e pela Lei 13/2019”, in Julgar Online, março de 2019, p. 11 e também Acórdão da Relação de Guimarães, de 08/04/2021, em que é Relatora a Senhora Juiz Desembargadora Rosália Cunha.
Destarte, forçoso será concluir que o contrato controvertido se submete ao prescrito na Lei 13/2019, de 12 de Fevereiro.
E concluída esta primeira premissa, positivamente, impõe-se escalpelizar a segunda, anteriormente cogitada, sobre a natureza imperativa ou facultativa do prazo de renovação previsto no artigo 1096.º, n.º 1 do Código Civil, desde já se adiantando a conclusão da imperatividade do disposto no referido preceito.
Com efeito, na redacção actual, conferida pela Lei 13/2019, de 12 de fevereiro, estatui o artigo 1096.º, n.º 1 do Código Civil que: “Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos, se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”
Socorrendo-nos dos ensinamentos da Conselheira Maria Olinda Garcia, citados pela recorrida, quanto à interpretação deste artigo “Quanto à renovação do contrato, a nova redacção do artigo 1096.º suscita alguma dificuldade interpretativa, nomeadamente quanto à possibilidade de “estipulação em contrário” aí prevista. Por um lado, pode questionar-se se tal convenção poderá excluir a possibilidade de renovação do contrato ou apenas estabelecer um diferente prazo de renovação.
Parece-nos que (na sequência do que já se verificava anteriormente) as partes poderão convencionar que o contrato não se renova no final do prazo inicial (ou aquela tem de ser, pelo menos, de um ano). O contrato caducará, assim, verificado esse termo.
Mais delicada é a questão de saber se as partes podem estipular um prazo de renovação inferior a 3 anos (hipótese em que o prazo legal de 3 anos teria natureza supletiva).
Atendendo ao segmento literal que diz que o contrato se renova “por períodos sucessivos de igual duração”, pareceria poder concluir-se que, se o período inicial pode ser de 1 ano ou de 2 anos, as partes também teriam liberdade para convencionar igual prazo de renovação. Todavia ao estabelecer o prazo de 3 anos para a renovação, caso o prazo de renovação seja inferior, parece ser de concluir que o legislador estabeleceu imperativamente um prazo mínimo de renovação. (…)”
Quer com tal dizer-se que, com a nova redacção deste artigo, as partes:
a) têm liberdade para fixar a não renovação do contrato - o que é permitido pela oração “Salvo estipulação em contrário”
Mas,
b) Caso prevejam a sua renovação, e agora de forma imperativa, esta terá de ser igual ao período do contrato ou de 3 anos, caso este seja inferior.
In casu, sendo o contrato de 5 anos, é este o prazo da renovação a considerar, que não outro.
No mesmo sentido interpretativo ora sufragado (e acolhendo igualmente a subsunção dos contratos de arrendamento em execução à Lei 13/2019, de 12 de fevereiro), vejam-se os seguintes Acórdãos, todos consultados no sítio www.dgsi.pt. citados pela recorrida e por nós analisados:
• Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 08/04/2021, em que é Relatora a Senhora Juiz Desembargadora Rosália Cunha:
“ (…) VI - Dispondo a nova redacção do artigo 1096.º, do CC, introduzida pela Lei 13/2019 de 12.2, sobre o conteúdo da relação jurídica do arrendamento, e abstraindo a mesma
do facto que lhe deu origem, é de concluir que a situação se enquadra na 2.ª parte do artigo 12.º do CC, sendo a nova redacção aplicável às relações já constituídas e que subsistam à data da sua entrada em vigor.
VII - O art.º 1096.º, n.º 1, do CC, na nova redacção introduzida pela Lei 13/2019, de 12.2, fixa um prazo de renovação mínimo de três anos, de natureza imperativa não podendo
as partes convencionar um prazo de renovação inferior. “.
• Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11/02/2021, em que é Relatora a Senhora Juiz Desembargadora Raques Baptista Tavares:
“I - No artigo 1.º da Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro enuncia-se que a mesma vem estabelecer medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios e a reforçar a segurança e estabilidade do arrendamento urbano.
II - Nos arrendamentos para habitação permanente, a liberdade dos contratantes para modelarem o conteúdo do contrato sofreu significativas alterações com as alterações introduzidas pela Lei 13/2019, quer quanto à exigência de um prazo mínimo de um ano (cfr. art.º 1095 n.º 2 onde está em causa uma norma imperativa que não admite convenção em contrário) mas também quanto à sua renovação pois, ainda que as partes possam convencionar a exclusão da possibilidade de qualquer renovação, só terão liberdade para convencionar prazo de renovação igual ou superior a três anos, impondo o legislador um prazo mínimo, também imperativo, de três anos.
III - Os contratos de arrendamento com prazo para habitação permanente renovam-se automaticamente, por períodos sucessivos de igual duração ou, se esta for inferior, de três anos, em conformidade com o estipulado no número 1 do artigo 1096.º do CC.”
• Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 25/01/2023, em que é Relatora a Senhora Juiz Desembargadora Maria Adelaide Domingos:
“O artigo 1096.º, n.º 1 do Código Civil, com a redacção dada pela Lei 13/2019, de 12/02, aplica-se aos contratos de arrendamento para habitação, sucessivamente renováveis, vigentes à data da sua entrada em vigor (13/02/2019), fixando um prazo mínimo de três anos para renovação do contrato de arrendamento.”
• Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 04/05/2023, em que é Relatora a Senhora Juiz Desembargadora Isabel Silva:
“I - A expressão “salvo estipulação em contrário”. Contida no n.º 1 do art.º 1096.º do CC, deve ser interpretada como reportando-se apenas à possibilidade de as partes afastarem a renovação automática do contrato, e já não a de poderem contratar períodos diferentes de renovação. Assim, não havendo oposição válida e eficaz, os contratos de arrendamento para habitação renovam-se por mínimos de 3 anos, ou por período superior, caso o período de duração do contrato seja superior a 3 anos. (…)”
Do que vem dito imediatamente ressalta a concordância com o decidido pelo tribunal a quo: o contrato mantém-se em vigor, ao abrigo da sua primeira renovação, até (pelo menos) 31/12/2023, não sendo eficaz a oposição à renovação efectuada pela senhoria para a data em que a fez.
Pelo exposto, atentas as razões e fundamentos atrás mencionados, forçoso é concluir pela improcedência do recurso.
Impõe-se, por isso, a improcedência da apelação.
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Sumariando em jeito de síntese conclusiva:
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5. Decisão
Nos termos supra expostos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida.
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Custas a cargo da apelante.
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Notifique.
Porto, 12 de Outubro de 2023
Os Juízes Desembargadores
Paulo Dias da Silva
Isabel Peixoto Pereira
Ana Luísa Loureiro
(a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinatura electrónica e por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)