INCUMPRIMENTO DA REGULAÇÃO DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS
ALIMENTOS A FILHO MENOR
DESPESAS DE EDUCAÇÃO
ACTIVIDADES EXTRACURRICULARES
Sumário


I. À medida que a sociedade actual se sofistica, com o correlativo aumento de exigência e competitividade, a educação passou a incluir tendencialmente (se não necessariamente) a aprendizagem de línguas estrangeiras (com correcção e fluência), de prática desportiva (factor de reconhecida aquisição de competências de interação social e de trabalho em equipa), de educação artística (em qualquer uma das suas plúrimas vertentes) e de diferenciadas competências tecnológicas (sobretudo informáticas).

II. Não obstante o esforço notável que foi realizado no nosso país nos últimos sessenta anos, no sentido da elevação e generalização do ensino público obrigatório, muitas destas necessidades educacionais ainda hoje são supridas pelas denominadas actividades extracurriculares.

III. Os alimentos devidos a filho menor, na vertente da sua educação, não se limitam ao custo da frequência do ensino obrigatório oficial (com a consideração exclusiva das despesas exigidas ou originadas pelo mesmo, nos seus local e horário próprios), abrangendo ainda as despesas com a realização de actividades extracurriculares (que, não obstante se encontrem fora do curriculum do ensino oficial obrigatório, não deixam de consubstanciarem actividades relativas à educação de quem delas beneficia).

IV. As despesas de educação cuja comparticipação seja autonomamente prevista reportam-se a despesas que ocorrem, não de forma permanente (durante todo o ano civil), mas sim periódica ou sazonalmente (isto é, no início de cada ano lectivo); e, por isso, no silêncio dos progenitores, não se contêm na prestação de alimentos mensal fixa (destinada a ocorrer às despesas que, mensalmente, se renovam), mas sim nas demais despesas de educação, de realização única (v.g. viagem de estudo) ou periódica (v.g. aquisição de material escolar, incluindo livros e manuais, no início de cada ano lectivo).

V. O progenitor que se pretenda desonerar do pagamento de prestação de alimentos que lhe foi imposta, ainda que provisoriamente, tem de alegar a impossibilidade, mesmo que não definitiva, de os prestar (total ou parcialmente) e a respectiva superveniência; e salvo circunstâncias excepcionais (de carácter imperioso e de curtíssima duração), a essencialidade de que se reveste a prestação de alimentos a filho menor impõe o seu efectivo cumprimento até que seja alterada em sede própria, não se admitindo que o seja unilateralmente pelo respectivo devedor.

Texto Integral


Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.ª Adjunta - Maria Gorete Morais;
2.º Adjunto - Fernando Manuel Barroso Cabanelas.

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ACÓRDÃO

I - RELATÓRIO

1.1. Decisão impugnada
1.1.1. AA, residente na Rua ..., em ..., ..., propôs incidente de incumprimento de responsabilidades parentais, relativo a BB, nascido a .../.../2008, contra CC (aqui Recorrente), residente na Rua ..., lugar do ..., em ..., ..., pedindo que

· o Requerido (CC) fosse condenado a pagar a quantia de € 2.333,68, devida a BB, a título de pensões de alimentos mensais vencidas;

· o Requerido (CC) fosse condenado a pagar uma indemnização a favor de BB, bem como uma multa, de montantes que se viessem a entender justos e equitativos.

Alegou para o efeito, em síntese, que, sendo BB filho dela própria, com quem reside, e do Requerido (CC), foi homologado acordo relativo à regulação das responsabilidades parentais a ele pertinentes, em .../.../2015, por ocasião do divórcio dos respectivos pais; e aí ficou o Requerido (CC) obrigado a pagar uma pensão de alimentos mensal de € 320,00, bem como metade dos encargos relativos à saúde e educação do filho.
Mais alegou que, no dia 03 de Novembro de 2020, no âmbito de um incidente de alteração das responsabilidades parentais (Apenso A), foi homologado acordo, reduzindo a pensão de alimentos mensal para € 260,00, e cometendo ao Requerido (CC) a obrigação de pagar metade das «despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas» e das «despesas de educação».
Alegou ainda que, em 25 de Janeiro de 2022, no âmbito de um incidente de incumprimento de responsabilidades parentais (Apenso B), foi homologado acordo, ficando o Requerido (CC) obrigado a liquidar em prestações mensais (de € 50,00 cada uma) a quantia até então em dívida, fixada em € 5.000,00, e consignando-se que as «despesas de saúde e de educação acima dos € 50,00 devem merecer o acordo de ambos os progenitores, sendo certo que o BB irá continuar com o ATL e com o acompanhamento em ortodontia».
Por fim, a Requerente (AA) alegou encontrarem-se em dívida despesas médicas e medicamentosas de € 784,56, despesas de educação de € 1.318,84, a totalidade da dívida relativa à pensão de alimentos mensal, fixada em 25 de Janeiro de 2022 em € 5.000,00, e parte (de € 130,28) da pensão de alimentos mensal vencida em Janeiro de 2023; e ser o incumprimento do Requerido (CC) grave e reiterado, mostrando completo desinteresse e despreocupação com o filho e causando-lhe a ela própria enorme instabilidade financeira, assim se justificando a sua condenação na indemnização e na multa pedidas.

1.1.2. Regularmente notificado [1], o Requerido (CC) apresentou alegações, pedindo que o incidente de incumprimento da regulação de responsabilidades parentais fosse julgado totalmente improcedente.
Alegou para o efeito, em síntese: quanto a despesas médicas e medicamentosas, ou não se encontrariam devidamente comprovadas, ou, excedendo o valor de € 50,00, não teriam sido previamente autorizadas por si; quanto a despesas de educação, e para além do igualmente referido a propósito das anteriores, ou não se enquadrariam nesta definição, ou reportar-se-iam a actividades extracurriculares, a cujo pagamento não se encontraria adstrito; quanto a despesas de vestuário, já se encontrariam incluídas no pagamento da pensão de alimentos mensal fixa, não tendo ainda dado o seu prévio acordo àquelas que excedessem o valor de € 50,00; quanto à amortização mensal da quantia global em dívida em Janeiro de 2022, teria sempre cumprido escrupulosamente com esse pagamento; e ser a pensão de alimentos mensal fixa de € 275,83, e não de € 280,28, nada devendo igualmente por conta da mesma, por em muitos meses ter entregue à Requerente (AA) valores superiores aos devidos.
Mais alegou que, em função dos seus actuais encargos (que discriminou), fruto nomeadamente do seu actual relacionamento e do nascimento de uma outra filha, não poderia suportar uma pensão de alimentos superior a € 100,00 mensais.
Por fim, alegou ter mantido com o filho uma relação de bastante proximidade e cumplicidade, que mudou drasticamente por culpa exclusiva da Requerente (AA), que agiu intencionalmente nesse sentido, o que lhe causaria enorme desgosto e tristeza.
 
1.1.3. A Requerente (AA) apresentou resposta, reiterando o seu pedido inicial.
Alegou para o efeito, em síntese, que, tendo-se o Requerido (CC) limitado a impugnar parte das facturas por si apresentadas, sem demonstrar o seu pagamento, não poderiam os autos deixar de proceder; e aceitar a confissão de dívida dele próprio, quanto às demais.
Mais alegou ter o Requerido (CC) aceitado que, não obstante ser exigível o seu prévio acordo quanto a despesas de saúde e de educação superiores a € 50,00, se manteria a frequência do filho do ATL e o seu tratamento de ortodontia; e deixar permanentemente sem resposta as suas tentativas de obter aquele seu prévio acordo, para as demais despesas que o exigiriam, reportando-se todas elas a questões da vida corrente do filho comum
Alegou ainda que o vestuário cuja comparticipação no preço de aquisição reclamou foi destinado exclusivamente a actividades escolares do filho.
Por fim, alegou ser o montante actual da pensão de alimentos mensal fixa de € 288,68.

1.1.4. Em sede de conferência de pais [2], o Requerido (CC) discriminou expressamente as facturas apresentadas nos autos que não aceitava pagar [3], reiterando para o efeito os argumentos já antes aduzidos.
As partes prescindiram ainda das respectivas alegações e de audiência de julgamento.

1.1.5. O Ministério Público foi ouvido, promovendo se julgasse parcialmente procedente o incidente de incumprimento de responsabilidades parentais.
Alegou para o efeito, em síntese, não poder ser aqui cobrada a quantia relativa às prestações de alimentos em dívida até 22 de Janeiro de 2022, tendo de o ser no respectivo apenso, ou através de execução instaurada para o efeito.
Mais alegou encontrar-se em dívida: parte da pensão de alimentos mensal fixada, devidamente actualizada, sendo hoje de € 297,34; as despesas de saúde e de educação, ainda que superiores a € 50,00 e que não obtiveram o prévio acordo do Requerido (CC), cuja realização foi anterior à conferência de pais que o tornou necessário; as despesas médicas e medicamentosas reclamadas, que efctivamente diriam respeito a BB; as despesas reclamadas a título de actividades extracurriculares, por integrarem a respectiva educação; as despesas com a aquisição de livros e material escolar, que, pelo seu carácter não permanente mas apenas periódico, não integrariam a pensão de alimentos mensal, mas sim as demais despesas com educação; e despesa com visita de estudo ao estrangeiro, que foi previamente autorizada pelo Requerido (CC).
Por fim, alegou encontrarem-se apenas excluídas da obrigação de alimentos do Requerido (CC) despesas reclamadas mas já incluídas na pensão de alimentos mensal por ele devida, bem como despesas com educação superiores a € 50,00, que não obtiveram o seu prévio acordo, quando o mesmo já era exigível (discriminando umas e outras).

1.1.6. Foi proferida sentença [4], julgando parcialmente verificado o incumprimento do Requerido (CC) e fixando o montante da sua dívida em € 2.075,46, lendo-se nomeadamente na mesma:
«(…)
Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se:
julgar parcialmente verificado o incumprimento, por parte do requerido, CC, da obrigação de prestar alimentos ao menor supra identificado, BB, fixando-se o montante em dívida, na presente data, em € 2.075,46 (dois mil e setenta e cinco euros e quarenta e seis cêntimos), a título de capital, acrescido dos juros de mora, à taxa legal, calculados sobre cada uma das prestações, desde a data do respetivo vencimento e até à data em que ocorrer o efetivo e integral pagamento.
Custas a cargo da requerente e do requerido na proporção do decaimento, fixando em 3 Ucs a taxa de justiça.
Registe e notifique.
*
Solicite-se ao ISS que informe o nome e sede da entidade patronal do requerido, o montante do seu vencimento, a data do último desconto para a Segurança Social ou se, ao invés, recebe subsídio de desemprego, rendimento social de inserção ou qualquer outra pensão ou subsídio e respetivo montante;
Prazo 20 dias
Solicite-se, ainda, ao OPC competente que, averigue e informe a atual situação económica do requerido, nomeadamente se possui bens ou rendimentos suscetíveis de execução e ainda sobre a existência de familiares, designadamente pais (identificação completa), com salários, bens ou rendimentos suscetíveis de satisfazer as quantias de alimentos em dívida com vista a equacionar a possibilidade de propositura de ação de alimentos prevista no art.º 2009.º do Código Civil.
Prazo 20 dias.
Decorridos os prazos se tais informações não forem juntas, abra conclusão.
(…)»
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1.2. Recurso
1.2.1. Fundamentos

Inconformado com esta decisão, o Requerido (CC) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse provido e se revogasse a decisão recorrida.
 
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis, com excepção da concreta grafia utilizada e de manifestos e involuntários erros e/ou gralhas de redacção):

1) A Requerente, em representação do seu filho, menor, BB, intentou incidente de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais, contra o aqui Requerido, CC, alegando falta de pagamento das despesas atinentes à educação e saúde do menor.

2) A sentença foi proferida a 20 de Junho de 2023, condenando o Progenitor a pagar o seguinte:
- € 147,34 (correspondente à diferença entre a pensão de alimentos liquidada em janeiro de 2023 e a que era devida);
- € 784,56 (a título de despesas de saúde);
- € 1.143,56 (a título de despesas de educação),
num total de € 2.075,46.

3) O objeto do recurso é a condenação do Requerido apenas quanto a despesas de saúde (consulta ortodontia e aparelho dentário) e despesas de educação, uma vez que a prova produzida impunha decisão diversa, absolvendo o requerido totalmente do pedido.

4) O Tribunal a quo, na presente sentença, designadamente, no que se refere às despesas de saúde, condena o Requerido a pagar a quantia de € 784,56, sem nunca especificar ou referir como chegou ao valor de € 784,56, ou mencionar, por que é que as despesas são devidas, ou a que se referem, inclusive, na sentença não faz referência às despesas que constam nos documentos n.ºs ... e ...1, referentes a uma consulta em ortodontia e ao aparelho fixo, respetivamente.

5) Ora, uma vez que a sentença, nesta parte carece de total falta de fundamentação, nos termos do art.º 615/2 do CPC, é nula, nulidade que expressamente se alega.

6) No que toca às despesas de saúde, ficou acordado, no âmbito da regulação das responsabilidades parentais, que o Progenitor seria obrigado a pagar metade dos encargos com a saúde – 21-07-2015. No âmbito do apenso A - alteração das responsabilidades parentais - datada de 3.11.2020, por homologação de transação, acordaram as partes que: «as despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas(...) serão comparticipadas em partes iguais por ambos os progenitores». No âmbito do apenso B, já em 25-01-2022, as partes acordaram, e a transação foi devidamente homologada, que as despesas de saúde acima de 50 euros deviam merecer o acordo de ambos os progenitores.

7) Ora, no âmbito do presente apenso de incumprimento, a Progenitora requereu o pagamento de metade de diversas despesas de saúde e relativamente às despesas de saúde, juntas sob os documentos n.ºs ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ...0 e ...2, que perfazem um total de € 159,10, o Requerido aceita estas despesas, reconhecendo-se devedor das mesmas, pelo que quanto a estas não visará o presente recurso, incumbindo-lhe o pagamento de € 79,50.

8) No entanto, na eventualidade da condenação no valor de € 784,56 se referir às consulta em ortodontia, a Progenitora não obteve qualquer consentimento ou sequer informou o Progenitor desta consulta, ou sequer informou se poderia usar o cheque dentista, usar o sistema nacional de saúde ou a ADSE de que a mesma beneficia.

9) Relativamente ao aparelho dentário, que consta no documento n.º ...1, tal fatura é de € 1350,00€

10) Ficou evidente da conferência de 25 de janeiro de 2022 que todas as despesas que ultrapassem os 50 euros devem ser previamente comunicadas e obter a anuência do Requerido, o que não sucedeu.

11) Na mesma, as partes acordaram que o Menor continuava com acompanhamento em ortodontia, sucede que o Requerido não deu a sua anuência, no que toca ao pagamento dessas despesas, carecendo estas da sua prévia autorização.

12) Apesar da sentença ser complemente omissa e por isso nula - também não poderia o Tribunal a quo fazer um raciocínio conclusivo, pelo que não poderia o Progenitor ter sido condenado ao pagamento de tal despesa, pois não deu o seu assentimento para tal.

13) Por outro lado, no que toca às despesas de educação alegadas pela Requerente, o Requerido reconhece e aceita-se devedor das que constam nos documentos n.ºs ...5, ...7, ...8, ...9, ...0, ...1, ...2, ...3, ...5, ...6, ...5, ...6, ...7 e ...3, quantias estas que perfazem um total de € 410,19, estando o Requerido adstrito ao pagamento de € 205,10.

14) Encontram-se juntas sob os documentos n.ºs ...7 a ...3, ...2 e ...8, faturas alusivas a uma formação de inglês, que o Menor frequenta, ao qual o Recorrente desconhecia, não tendo este dado o seu consentimento, sendo esta é uma despesa extracurricular à qual o Requerido não está obrigado ao seu pagamento. Para além do mais, as despesas, atinentes aos documentos n.ºs ...7, ...0, ...1 e ...3 excedem o montante de € 50,00, carecendo estas da prévia autorização do Requerido.

15) A Requerente, a este propósito, junta ainda sob o documento n.º ...4 uma fatura relativa a um curso intensivo de inglês, no montante de € 220,00. Ora, não parece razoável que a Requerente inscreva o filho num curso que comporta custos elevados, dos quais o Requerido não consegue suportar, sem antes solicitar ao Progenitor qual o seu parecer, ou justificar a necessidade do mesmo.

16) Mais se acrescenta que, contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, rejeita-se que a formação de inglês e o curso intensivo, se configurem como despesas de educação.

17) Estas devem ser entendidas como despesas extracurriculares, uma vez que não se entende como obrigatório ou imprescindível, para a formação académica do Menor, que este frequente este tipo de formações. Para além do mais, a formação de inglês é realizada fora do local e horário escolar, o que não se coaduna com uma despesa de educação.

18) Por outro lado, e também seguindo a mesma linha de raciocínio, a Requerente junta sob o documentos n.ºs ...6, ...4, ...5, ...1, ...5 e ...9, despesas atinente à formação musical do Menor e encargos que dela advém.

19) Sucede que o Tribunal a quo considera, uma vez mais, que esta despesa reveste um caráter de despesa de educação - mais uma vez um raciocínio conclusivo e sem fundamentação factual.

20) Ao passo que esta deve ser também considerada uma despesa extracurricular por, uma vez mais, ser realizada fora do local e horário escolar e não estar intimamente relacionada com o dia-a-dia do Menor, no estabelecimento escolar.

21) Além do mais, no que tange às despesas extracurriculares, a decisão homologatória nada menciona a este respeito.

22) Desta forma, relativamente às despesas extracurriculares, designadamente a formação de inglês, o curso intensivo de inglês e a formação musical, resta-nos concluir que, uma vez que estas não devem ser consideradas despesas de educação, e que a decisão homologatória é omissa, no que concerne às despesas extracurriculares do Menor, não sendo estas despesas de caráter imperativo, e não se encontrando expressamente previstas no acordo, estas deveriam ter tido a anuência do Requerido, não sendo desta forma devidas.

23) O Requerido, nas suas alegações impugnou as faturas que constam dos documentos n.ºs ...8, ...0, ...3 e ...4, uma vez que se reportam a vestuário, sucede que também a transação homologada por sentença no âmbito da regulação e seus apensos é omissa relativamente ao vestuário.

24) Ora, as despesas com o vestuário encontram-se previstas no conceito de prestação de alimentos, que o Requerido paga mensalmente, pelo que o mesmo nunca poderia ter sido condenado a pagar tais quantias.

25) A sentença recorrida condena ainda o Recorrente a comparticipar em 50 % das despesas com a visita de estudo a ..., documento n.º ...4.

26) Para tal condenação fundamenta-se num e-mail, datado de 11-11-2022, em que a Mãe do Menor informa o Requerido da existência de uma reunião, na escola do Menor, em que a mesma teria como principal objetivo prestar esclarecimento e informações, no que concerne à visita de estudo a realizar. Mais informou, que o montante previsto da viagem seria de aproximadamente de € 600,00. E ainda num email datado de 21-11-2022, enviado pelo Requerido, informando que não iria conseguir estar presente na reunião e que no mês seguinte iria transferir mais dinheiro. A Requerente, na data de 27-11-2022, volta a enviar novo e-mail ao Requerido, onde envia o comprovativo de pagamento da primeira prestação da visita de estudo.

27) Ora, desta simples troca de e-mails não pode o Tribunal, chegar à conclusão que o Requerido deu a sua anuência, e iria comparticipar, no pagamento da visita de estudo do Menor.

28) Desta forma, uma vez mais, o Tribunal fundamenta a sua decisão com base em e-mails trocados pelos Progenitores, adotando um raciocínio conclusivo.

29) Pelo que o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que, de facto, as despesas, juntas sob os documentos n.ºs ..., ...1, ...6, ...4, ...7 a ...5, ...0, ...3, ...4, ...1, ...2, ...4, ...5, ...8, ...9 não são devidas, ora por não terem sido previamente comunicadas ao Requerido, ora por estarem incluídas na pensão de alimentos, ou por se considerarem despesas extracurriculares, ou sequer por não terem obtido a concordância do mesmo.

30) Ao decidir contrariamente à matéria de facto alegada e provada, a sentença violou por erro na apreciação da prova o disposto no artigo 662.º n.º 1 do CPC. Houve, pois, erro notório na apreciação da prova a legitimar a modificação da decisão sobre a matéria de facto, nos termos do disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil.

31) Nestes termos, e em face do exposto, sempre deverá ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogar-se a decisão recorrida e substituída por outra, que julgue em relação ao objeto do recurso tais pedidos totalmente improcedentes.
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1.2.2. Contra-alegações
Quer a Requerente (AA), quer o Ministério Público, contra-alegaram, pedindo qualquer deles que se negasse provimento ao recurso.
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II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR

2.1. Objecto do recurso - EM GERAL
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC, aqui aplicável ex vi do art.º 33.º, n.º 1, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível [5]), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art.º 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC) [6].
Com efeito, entende-se «que, exercendo os recursos a função de impugnação das decisões judiciais», não só faz sentido que o recorrente exponha «ao tribunal superior as razões da sua impugnação, a fim de que o» mesmo «aprecie se tais razões procedem ou não», como, podendo «dar-se o caso de a alegação ser extensa, prolixa ou confusa», deverá no fim, «a título de conclusões», indicar «resumidamente os fundamentos da impugnação», fazendo-o pela «enunciação abreviada dos fundamentos do recurso» (Professor Aberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, Limitada, pág. 359, com bold apócrifo) [7].
Contudo, acresce ainda a este objectivo (de síntese das razões que estão subjacentes à interposição do recurso) um outro, não menos importante, de definição do seu objecto. Com efeito, lê-se a propósito no art.º 635.º, n.º 4, do CPC, que nas «conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso»; e, por isso, se defende que as «conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objecto do recurso» (António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág.118) [8].
Logo, pretende-se que o recorrente indique de forma resumida, através de proposições sintéticas, os fundamentos de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão, para que seja possível delimitar o objecto do recurso de forma clara, inteligível, concludente e rigorosa [9]. Compreende-se, por isso, que se afirme que, para «o bom julgamento do recurso não é suficiente que a alegação tenha conclusões. Estas deverão ser precisas, claras e concisas de modo a habilitar o tribunal ad quem a conhecer quais as questões postas e quais os fundamentos invocados» (Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes, Dos Recursos, Quid Juris, pág. 179, com bold apócrifo) [10].
Assim, e independentemente do que o recorrente tenha antes expendido (em sede de corpo de alegações de recurso), e quando nomeadamente se impugne a matéria de facto julgada, terão as conclusões que conter a indicação precisa de quais os concretos pontos de facto cuja alteração se pretende (ónus principal) já que só assim «verdadeiramente [se] permite circunscrever o objecto do recurso no que concerne à matéria de facto» (Ac. do STJ, de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1).
Está-se aqui perante uma das concretizações do princípio da auto-responsabilidade das partes.
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Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida) [11], uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação/reponderação e consequente alteração e/ou revogação, e não a um novo reexame da causa).
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2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar

2.2.1. Identificação das questões
Mercê do exposto, e do recurso interposto pelo Requerido (CC), duas questões foram submetidas à apreciação deste Tribunal ad quem:

1.ª - É a decisão recorrida nula, por não especificar os fundamentos que a justificam (subsumindo-se desse modo ao disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC) ?

2.ª - Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação da lei, já que não se mostram reunidos os fundamentos que permitem concluir pelo incumprimento do Requerido (CC) quanto ao pagamento de prestações de alimentos devidas ao filho BB ?
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2.2.2. Questões excluídas do objecto do recurso
Lê-se, no art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC (aqui aplicável ex vi do art.º 33.º, n.º 1, do RGPTC), que, quando «seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição» os «a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas».
Logo, deve o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso [12], para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, e de indicar para cada um deles a prova que justificaria uma decisão diferente, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada.
Esta exigência, «vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente», devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor [13] enquanto «decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes», «impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo» (António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 129, com bold apócrifo).

Somando-se, porém, a este ónus de impugnação, encontra-se o já referido ónus de conclusão, previsto no art.º 639.º, n.º 1, do CPC (de novo aplicável ex vi do art.º 33.º, n.º 1, do RGPTC), onde, recorda-se, se lê que o «recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão».
Sendo o mesmo incumprido (nomeadamente, quando nas respectivas conclusões seja omissa a indicação dos «concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados»), não é admissível despacho de aperfeiçoamento [14], tendo o recorrente limitado  desse modo o seu objecto [15]; e deverá o recurso efectivamente interposto (limitado à matéria de direito) ser apreciado em conformidade (nomeadamente, quanto à tempestividade da respectiva apresentação) [16].
Compreende-se que assim seja, já que, nesta segunda situação, a impugnação da matéria de facto - bem ou mal feita - faz parte do objecto do recurso [17]; e «o prazo de interposição do recurso é pela lei fixado em função do modo como o recorrente concebe o respectivo objecto» (Ac. da RG, de 07.04.2016, José Amaral, Processo n.º 4247/10.3TJVNF.G1).
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Concretizando, veio o Requerido (CC) defender - no corpo das suas alegações e no artigo 30.º das respectivas conclusões - que, ao «decidir contrariamente à matéria de facto alegada e provada, a sentença violou por erro na apreciação da prova o disposto no artigo 662º n.º 1 do CPC», existindo «erro notório na apreciação da prova a legitimar a modificação da decisão sobre a matéria de facto, nos termos do disposto no artigo 662º do Código de Processo Civil».
Contudo, e salvo o devido respeito por opinião contrária, a sua eventual intenção de recorrer sobre a matéria de facto julgada pelo Tribunal a quo não foi formalizada pela forma exigida por lei, isto é, com o cumprimento dos ónus que lhe estavam cometidos para o efeito.

Precisando, e quanto ao cumprimento do ónus de impugnação do art.º 640.º, n.º 1, do CPC, o Requerido (CC) não indicou quais os factos elencados na sentença recorrida que, afinal, impugnava, relativamente a quais deles era a prova documental e pessoal produzida nos autos insuficiente para os demonstrar, e que decisão deveria, em seu entender, ser proferida sobre eles, por indicação da concreta redacção proposta para os mesmos.
Precisando novamente, e agora quanto ao cumprimento do subsequente ónus de conclusão, o Requerido (CC) não indicou expressamente nas conclusões do seu recurso quais os factos provados que impugnava, limitando-se a concluir subjectivamente ter havido um «erro notório na apreciação da prova a legitimar a modificação da decisão sobre a matéria de facto».
Estas omissões implicam a rejeição de um eventual e pretendido recurso com esse objecto.
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Mostra-se, por isso, definitivamente assente a matéria de facto que foi apurada pelo Tribunal a quo.
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2.2.3. Ordem do conhecimento das questões incluídas no objecto do recurso
Lê-se no art.º 663.º, n.º 2, do CPC, que o «acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º».
Mais se lê, no art.º 608.º, n.º 2, do CPC, que o «juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».

Ora, tendo sido invocada pelo Requerido (CC) a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal a quo (vício que, a verificar-se, obsta à sua validade), deverá a mesma ser conhecida de imediato, e de forma prévia à restante questão objecto aqui de sindicância, já que, sendo reconhecida, poderá impedir o conhecimento da demais [18].
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III - QUESTÃO PRÉVIA

3.1. Nulidades da decisão judicial versus Erro de julgamento
As decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem ser viciadas por duas distintas causas (qualquer uma delas obstando à eficácia ou à validade das ditas decisões): por se ter errado no julgamento dos factos e do direito, sendo então a respectiva consequência a sua revogação; e, como actos jurisdicionais que são, por se ter violado as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou as que balizam o conteúdo e os limites do poder à sombra do qual são decretadas, sendo então passíveis de nulidade, nos termos do art.º 615.º, do CPC [19].
Precisando, «os vícios da decisão da matéria de facto não constituem, em caso algum, causa de nulidade da sentença», já que «a decisão da matéria de facto está sujeita a um regime diferenciado de valores negativos - a deficiência, a obscuridade ou contradição dessa decisão ou a falta da sua motivação [20] - a que corresponde um modo diferente de controlo e de impugnação: qualquer destes vícios não é causa de nulidade da sentença, antes é susceptível de dar lugar à actuação pela Relação dos seus poderes de rescisão ou de cassação da decisão da matéria de facto da 1ª instância (artº 662º, nº 2, c) e d) do nCPC)» (Ac. da RC, de 20.01.2015, Henrique Antunes, Processo n.º 2996/12.0TBFIG.C1, com bold apócrifo) [21].
Outros há, porém, que, concordando em princípio com esta posição, não deixam de admitir que poderão existir vícios da decisão de facto idóneos a justificar, de per se, a nulidade da própria sentença, enfatizando o facto desta, desde o CPC de 2013 (e ao contrário do que sucedia com o anterior, de 1961) conter agora simultaneamente a decisão de facto e a decisão de direito [22].
Ora, não obstante se estar perante realidades bem distintas, é «frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou e que a racionalidade não consegue explicar [23], desviando-se do verdadeiro objecto do recurso que deve ser centrado nos aspectos de ordem substancial. Com não menos frequência a arguição de nulidades da sentença acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades».
Sem prejuízo do exposto, e «ainda que nem sempre se consiga descortinar que interesses presidem à estratégia comum de introduzir as alegações de recurso com um rol de pretensas “nulidades” da sentença, sem qualquer consistência, quando tal ocorra (…), cumpre ao juiz pronunciar-se sobre tais questões (…)» (António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, págs. 132 e 133).
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3.2. Nulidades da sentença - Omissão de fundamentação

3.2.1.1. Dever de fundamentação
Enunciando as regras próprias de elaboração da sentença, lê-se no art.º 607.º, n.º 2 e n.º 3, do CPC, que a «sentença começa por identificar as partes e o objecto do litígio, e enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre conhecer», seguindo-se «os fundamentos de facto», onde o juiz deve «discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as regras jurídicas, concluindo pela decisão final».
Mais se lê, no n.º 4, do mesmo art.º 607.º citado, que, na «fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção»; e «tomando ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados a presunções impostas pela lei ou por regras da experiência».
Por fim, lê-se no n.º 5, do mesmo art.º 607.º, que o «juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto», não abrangendo porém aquela livre apreciação «os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão da partes».

Reafirma-se, assim, em sede de sentença, a obrigação imposta pelo art.º 154.º, do CPC, e pelo art.º 205.º, n.º 1, da CRP, do juiz fundamentar as suas decisões (não o podendo fazer por «simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade», conforme n.º 2, do art.º 154.º citado).
Com efeito, visando-se com a decisão judicial resolver um conflito de interesses (art.º 3.º, n.º 1, do CPC), a paz social só será efectivamente alcançada se o juiz passar de convencido a convincente, o que apenas se consegue através da fundamentação [24].
Reconhece-se, deste modo, que é a fundamentação da decisão que assegurará ao cidadão o respectivo controlo; e, simultaneamente, permitirá ao Tribunal de recurso a sindicância do bem ou mal julgado. «A motivação constitui, portanto, a um tempo, um instrumento de ponderação e legitimação da decisão judicial e, nos casos em que seja admissível (…) de garantia do direito ao recurso» (Ac. da RC, de 29.04.2014, Henrique Antunes, Processo n.º 772/11.7TBBVNO-A.C1).
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3.2.1.2. Fundamentação de facto
Precisando, e em termos de matéria de facto, impõe-se ao juiz que, na sentença, em parte própria, discrimine os factos tidos por si como provados e como não provados (por reporte aos factos oportunamente alegados pelas partes, ou por reporte a factos instrumentais, ou concretizadores ou complementares de outros essenciais oportunamente alegados, que hajam resultado da instrução da causa, justificando-se nestas três últimas hipóteses a respectiva natureza). 
Impõe-se-lhe ainda que deixe bem claras, quer a indicação do elenco dos meios de prova que utilizou para formar a sua convicção (sobre a prova, ou não prova, dos factos objecto do processo), quer a relevância atribuída a cada um desses meios de prova (para o mesmo efeito), desse modo explicitando não só a respectiva decisão («o que» decidiu), mas também quais os motivos que a determinaram («o porquê» de ter decidido assim).
A explicitação da formação da convicção do juiz consubstancia precisamente a «análise crítica da prova» que lhe cabe fazer (art. 607.º, n.º 4, do CPC): obedecendo aos princípios de prova resultantes da lei, será em função deles e das regras da experiência que irá formar a sua convicção, sobre a matéria de facto trazida ao respectivo julgamento.
Com efeito, «livre apreciação da prova» (art.º 607.º, n.º 5, do CPC) não corresponde a «arbitrária apreciação da prova». Deste modo, o Juiz deverá objectivar e exteriorizar o modo como a sua convicção se formou, impondo-se a «identificação precisa dos meios probatórios concretos em que se alicerçou a convicção do Julgador», e ainda «a menção das razões justificativas da opção pelo Julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto» (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pág. 655).
«É assim que o juiz [de 1.ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)» (Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, pág. 325).
«Destarte, o Tribunal ao expressar a sua convicção, deve indicar os fundamentos suficientes que a determinaram, para que através das regras da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento dos factos provados e não provados, permitindo aferir das razões que motivaram o julgador a concluir num sentido ou noutro (provado, não provado, provado apenas…, provado com o esclarecimento de que…), de modo a possibilitar a reapreciação da respectiva decisão da matéria de facto pelo Tribunal de 2.ª Instância» (Ana Luísa Geraldes, «Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto», Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, Coimbra Editora, pág. 591, com bold apócrifo).
Compreende-se, por isso, que se afirme que este esforço, exigido ao Juiz de fundamentação e de análise crítica da prova produzida, «exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo Tribunal Superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao acto jurisdicional» (José Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra Editora, Setembro de 2013, pág. 281).
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3.2.1.3. Fundamentação de direito
De seguida, e do mesmo modo, o art.º 607.º, n.º 3, do CPC, impõe ao juiz que proceda à indicação dos fundamentos de direito em que alicerce a sua decisão, nomeadamente identificando as normas e os institutos jurídicos de que se socorra, bem como a interpretação deles feita, concluindo com a subsunção do caso concreto aos mesmos.
Dir-se-á mesmo que «é na segunda parte da sentença, através da determinação, interpretação e aplicação das normas aos factos apurados, que reside a verdadeira motivação (fundamentação) da sentença. A importância capital desta parte da sentença reflecte-se claramente no facto de o art. 668º (1, b) [hoje, art.º 615.º, n.º 1, l b)] incluir entre as causas de nulidade da sentença a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão» (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pág. 666).
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3.2.1.4. Omissão de fundamentação - Nulidade
Lê-se no art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, que «é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão».

Precisa-se, porém, que vem sendo pacificamente defendido, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, que só a falta absoluta da indicação dos fundamentos de facto ou de direito será geradora da nulidade em causa - nomeadamente, a falta de discriminação dos factos provados -, e não apenas a mera deficiência da dita fundamentação [25].
Com efeito, «há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade»; e, por «falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto» (José Alberto dos Réis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, Limitada, pág. 140).
A concreta «medida da fundamentação é, portanto, aquela que for necessária para permitir o controlo da racionalidade da decisão pelas partes e, em caso de recurso, pelo tribunal ad quem a que seja lícito conhecer da questão de facto» (Ac. do STJ, de 11.12.2008, citado pelo Ac. da RC, de 29.04.2014, Henrique Antunes, Processo n.º 772/11.7TBVNO-A.C1).

Reitera-se, porém, que saber se a «análise crítica da prova» foi, ou não, correctamente realizada, ou se a norma seleccionada é a aplicável, e foi correctamente interpretada, não constitui omissão de fundamentação, mas sim «erro de julgamento»: saber se a decisão (de facto ou de direito) está certa, ou não, é questão de mérito e não de nulidade da mesma [26].
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3.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)
Concretizando, veio o Requerido (CC) arguir a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal a quo, já que o mesmo não teria fundamentado o seu juízo de imputação, a ele próprio, da comparticipação (na proporção de metade) de despesas de saúde de € 784,56.
Precisou, a propósito, que, relativamente «às despesas de saúde, juntas sob o doc. nº ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ...0 e ...2, que perfazem um total de 159,1€, o Requerido aceita estas despesas, reconhecendo-se devedor das mesmas, pelo que quanto a estas não versará o presente recurso, incumbindo-lhe o pagamento de 79,55€»; mas «caso a condenação no valor de 784,56€ se refira às consulta em ortodontia, a progenitora não obteve qualquer consentimento ou sequer informou o progenitor desta consulta, ou sequer informou se poderia usar o cheque dentista, usar o sistema nacional de saúde ou a ADSE que a mesma beneficia».
Chamado a pronunciar-se na admissão do recurso de apelação interposto [27], o Tribunal a quo defendeu que, «percorrida a sentença proferida nos autos, verifica-se que elenca os factos provados e não provados, além de que apresenta a motivação do Tribunal para o julgamento de facto, terminando pela decisão em conformidade com os factos provados; sem prejuízo, naturalmente, do recorrente poder defender o (des)acerto dos fundamentos elencados».

Dir-se-á que, constando da sentença recorrida o elenco dos factos provados e dos factos não provados, bem como subsequente fundamentação de direito, se entende que a arguição de nulidade feita pelo Requerido (CC) recorrente só poderá reportar-se à alegada falta de apreciação crítica da prova pertinente às despesas de saúde (já definitivamente assentes nos autos, porque não idoneamente impugnadas).
Lê-se, a propósito, na sentença recorrida: «Os factos provados resultam evidenciados dos documentos neles mencionados, da posição do progenitor expressa na conferência realizada no dia 30.05.2023 e dos esclarecimentos prestados pela progenitora, de forma que mereceu a credibilidade do tribunal desde que sustentados pelo teor dos documentos juntos aos autos».
Precisando a «posição do progenitor expressa na conferência realizada no dia 30.05.2023» (que tinha sido expressamente convocada «com vista a clarificar com os progenitores as despesas efetivamente englobadas no acordo e, assim, consensualizar o montante da dívida de alimentos desde o ano de 2021»), resulta da mesma  que, depois «de exporem as respetivas posições, pela Ilustre Mandatária do Requerido [que igualmente se encontrava presente] foi dito que, tendo em conta os comprovativos apresentados, não aceita pagar as seguintes despesas» de «Saúde: as faturas n.ºs ... e ... por serem de estética, n.º 5 por ser para fisioterapia» (bold apócrifo).
Logo, tendo o Requerido (CC) recorrente conhecido todas as demais despesas de saúde reclamadas nos autos, foi apenas quanto a estas que recusou o seu pagamento, desse modo alterando a posição anteriormente assumida quanto às despesas de dentista/ortodontia.
Com efeito, nas suas alegações iniciais defendeu que, sendo «uma fatura de ortodontia superior a 50,00 €», tendo ficado «estipulado em ata que as despesas que ultrapassassem este valor deveriam ter o consentimento de ambos» os progenitores, e não tendo «a requerente» obtido o prévio «consentimento do requerido» à realização da dita despesa, a mesma não seria devida; e reiterou este entendimento na conferência realizada no dia 20 de Abril de 2023 (que continuou no dia 30 de Maio de 2023), onde declarou que, quanto à «despesa em ortodontia, tem o mesmo entendimento, ou seja, uma vez que é superior a € 50,00 e não concordou com a mesma, não tem que pagar».
Compreende-se, assim, que, face à alteração da posição antes assumida pelo Requerido (CC) nos autos (isto é, à sua posterior aceitação da quase generalidade das despesas de saúde reclamadas), na sentença depois proferida apenas tenham sido objecto de análise - quer em termos de juízo probatório, quer em termos de fundamentação de direito -, as despesas de saúde que não foram aceites por ele (já depois de juntos todos os documentos pertinentes ao seu universo global e decorrido o prazo legal de contraditório sobre aqueles). 
O que não se compreende  é que, tendo  o Requerido (CC), em momento anterior dos autos - confrontado com a reclamação de tais despesas e com todos os documentos que as justificariam - conhecido, analisado e compreendido o teor destes e aceite a realização daquelas, bem como o seu pagamento (à excepção de três únicas, depois deviamente apreciadas e discriminadas no facto provado enunciado sob o número 7), venha agora afirmar que a sentença é nula porque alegadamente não fundamentou a condenação que ele próprio previamente considerou justificada (o que se aproxima, se não mesmo integra, uma lide perigosamente temerária, se não mesmo de má-fé).
Uma conclusão se impõe desde já: se falta de fundamentação da sentença existisse, a mesma não seria invocável pelo Requerido (CC), já que, independentemente dela, teria demonstrado em momento prévio ter compreendido o juízo (de facto e de direto) depois nela vertido, que inclusivamente (no mesmo momento prévio) aceitou.

Dir-se-á, ainda, que, independentemente de se poder discutir a suficiência e/ou a bondade da fundamentação do Tribunal a quo para alicerçar o seu concreto juízo probatório quanto às despesas de saúde, não é verdade que o mesmo não tenha claramente exposto as razões do mesmo («Os factos provados resultam evidenciados dos documentos neles mencionados, da posição do progenitor expressa na conferência realizada no dia 30.05.2023 e dos esclarecimentos prestados pela progenitora, de forma que mereceu a credibilidade do tribunal desde que sustentados pelo teor dos documentos juntos aos autos»); e só uma falta absoluta de fundamentação cominaria de nula a decisão recorrida.
Reitera-se que, saber se a prova produzida seria insuficiente ou inidónea para fundamentar o juízo decisório do Tribunal a quo (permitindo a revogação da sua decisão, por errado julgamento efectuado), seria questão a apreciar em sede de recurso sobre a matéria de facto julgada (se o mesmo tivesse sido validamente interposto) mas não comina de nula a respectiva de sentença.

Improcede, assim, o único fundamento da arguição de nulidade que alegadamente afectaria a sentença recorrida (por falta de fundamentação).
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

4.1. Factos provados
Com interesse para a apreciação da remanescente questão enunciada, o Tribunal a quo julgou como provados os seguintes factos (aqui apenas completados, nos termos do art.º 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do art. 33.º, n.º 1, do RGPTC - nomeadamente, com base nos documentos neles já referidos):

1 - CC (aqui Requerido) e AA (aqui Requerente) são os progenitores de BB, nascido a .../.../2008.

2 - Em .../.../2015, no âmbito do divórcio por mútuo consentimento que, com o n.º 8100/2015, correu termos na Conservatória do Registo Civil ..., foi proferida decisão que homologou o Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais relativas a BB (decisão cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(…)
1. O menor fica a residir habitualmente com a mãe, sendo as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho exercidas em comum por ambos os pais.
(…)
7. A título de alimentos para o menor (BB) o Pai pagará mensalmente até ao dia 1 de cada mês a quantia de 320,00 Euros, por transferência bancária, com início em Julho de 2015, atualizando a prestação anualmente, a partir de 01 de Janeiro de 2015, de acordo com o índice de preços ao consumidor, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística, mas nunca inferior a 3%.
8. Os encargos relativos à saúde, educação, serão suportados na proporção de metade para cada um dos progenitores.
(…)»

3 - Em 03 de Novembro de 2020, no âmbito do Apenso A, foi proferida decisão homologatória da alteração da regulação das responsabilidades parentais (decisão cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), lendo-se nomeadamente na mesma:
«(…)
Reiniciada a diligência, depois de exporem as respetivas posições pelas partes foi dito que chegaram ao seguinte acordo:
1 - A título de pensão de alimentos o pai pagará à mãe-guardiã a quantia de € 260,00 mensais, até ao dia 8 de cada mês, por depósito ou transferência bancária.
2 - As despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas e as despesas de educação serão comparticipadas em partes iguais por ambos os progenitores.
(…)»

4 - Em 25 de Janeiro de 2022, no âmbito do Apenso B, foi proferida decisão homologatória da alteração da regulação das responsabilidades parentais (decisão cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), lendo-se nomeadamente na mesma:
«(…)
Reiniciada a diligência pelas 11:45 horas, a Mmª Juiz voltou a ouvir as partes que disseram ter chegado ao seguinte acordo:

ACORDAM QUE:
1 - Até dezembro de 2020 a quantia em dívida é de € 5.000,00, que o Requerido se compromete a pagar em prestações mensais, iguais e sucessivas de € 50,00 cada, sendo nos meses em que recebe o subsídio de férias e o subsídio de Natal no valor de € 100,00 cada.
2 - As despesas de saúde e de educação acima dos € 50,00 devem merecer o acordo de ambos os progenitores, sendo certo que o BB irá continuar com o ATL e com o acompanhamento em ortodontia.
3 - O progenitor que faz a despesa, e por forma a evitar a acumulação e dificuldade de pagamento, comunica ao outro no prazo de 8 dias, por e-mail, tendo este o prazo de 30 dias, após a receção de tal e-mail e do comprovativo, para proceder ao pagamento.
(…)»

5 - Desde Janeiro de 2023 que o Progenitor liquida mensalmente a quantia de € 150,00 a título de pensão de alimentos, quando esta ascende à quantia mensal de € 297,34.

6 - BB frequenta o Conservatório de Música ....

7 - As facturas que constam como documentos n.ºs ..., ... e ... (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reportam-se a cremes e gel para o tratamento do acne de BB (Akne Mycin, Ketrel e Duac), a um medicamento anti-inflamatório (Randutil) e a uma fita elástica para o alívio da dor/tensão muscular (Kinesio Tape).

8 - A factura que consta como documento n.º ...5 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reporta-se a sprays utilizados por BB para trabalhar numa maquete da escola.

9 - A factura que consta como documento n.º ...0 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reporta-se a despesas com os livros de fichas utilizados por BB, pois os manuais foram adquiridos com um voucher.

10 - As facturas que constam como documentos n.ºs ...9 e ...7 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - emitidas pela ... em 19.09.2021 e em 18.09.2022, nos valores respectivos de € 84,07 e de € 76,42 -, respeitam a despesas com material escolar utilizado por BB.

11 - As faturas que constam como documentos n.ºs ...7 a ...3, ...9 e ...2 e ...8 (cujo teor se dá por integralmente reproduzido) - datadas de 01.03.2021, 05.04.2021, 13.04.2021, 12.07.2021, 08.09.2021, 09.11.2021, 20.12.2021, 14.10.2022, 09.11.2022 e 07.12.2022, nos valores respectivos de € 70,00, de € 35,00, de € 35,00, de € 70,00, de € 65,00, de € 40,00, de € 80,00, de € 65,00, de € 40,00 e de € 40,00 - reportam-se a despesas com a formação de inglês de BB.

12 - A factura que consta como documento n.º ...4 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - datada de 29.07.2021, no valor de € 220,00 - reporta-se a um Curso Intensivo de Inglês (Universidade ...) frequentado por BB.

13 - As faturas que constam como documentos n.ºs ...5 e ...6 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reportam-se a mochilas e acessórios (cadeado para o cacifo) utilizados por BB.

14 - A Declaração que consta como documento n.º ...5 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reporta-se à quantia de € 193,63 despendida por BB, de 01.01.2021 a 31.12.2021, no Estabelecimento de Ensino por si frequentado.

15 - A factura que consta como documento nº ...1 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reporta-se a uma sebenta de formação musical.

16 - A factura que consta como documento n.º ...6 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - datada de 25.11.2022, no valor de € 51,99 - reporta-se a umas sapatilhas para a prática de desporto, adquiridas em 25 de Novembro de 2022.

17 - A factura que consta como documento n.º ...6 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reporta-se a uma touca para a natação.

18 - A factura que consta como documento n.º ...4 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reporta-se a uma visita de estudo a ... realizada por BB, após o Progenitor ter concordado com a sua realização e com o seu pagamento na proporção devida.

19 - A Progenitora remeteu ao Progenitor o email datado de 11 de Novembro de 2022 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), onde nomeadamente se lê:
«(…)
Olá, bom dia CC
Reencaminho o email da directora da turma a te convidar para estares presente na reunião do próximo dia 21 de Novembro para os pais, no Conservatório, sala ainda a definir, pelas 18h30, tendo como ordem de trabalhos:
- Informações sobre a visita de estudo do 9º ano de 2022/2023, que segundo informação do BB será visitar o local dos campos de concentração de ... - DD;
- Angariação de fundos e futuras ações 8 (a Escola pretende pelo visto quer fazer ações de angariação de forma a conseguirem 100 euros por aluno. No entanto segundo o que a professora já informou os alunos a viagem rondará os 600 euros e o restante valor terá que ser comparticipado pelos pais).
Com os melhores cumprimentos e votos de continuação de bom trabalho.
(…)»
O Progenitor remeteu à Progenitora o email datado de 21 de Novembro de 2022 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), onde nomeadamente se lê:
«(…)
Boa tarde.
Agradeço a informação para ir à escola logo mas não vou poder e peço desculpa por responder só agora.
Quanto ao dinheiro, eu este mês dou mais algum.
Cumprimentos.
(…)»

20 - A factura que consta como documento n.º ...7 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - datada de 29.08.2021, no valor de € 100,40 - reporta-se a umas sapatilhas, adquiridas em 29 de Agosto de 2021.

21 - A factura que consta como documento n.º ...8 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - datada de 23.04.2021, no valor de € 99,95 - reporta-se a umas sapatilhas para a prática de desporto, adquiridas em 23 de Abril de 2021.

22 - As facturas que constam como documentos n.ºs ...0 e ...3 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - esta última datada de 30.10.2021, no valor de € 55,40 - reportam-se à farda do coro.

23 - A factura que consta como documento n.º ...4 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) - datada de 30.10.2021, no valor de € 55,40 - reporta-se a vestuário para BB.

24 - As facturas que constam como documentos n.ºs ...1 e ...2 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) reportam-se à internet utilizada por BB.

25 - As faturas que constam dos documentos n.ºs ...6, ...4, ...5 e ...9 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) foram emitidas pelo ... e reportam-se a material e equipamento musical utilizados por BB.

26 - As despesas a que se reportam os factos provados enunciados sob os números 7 a 17, e 20 a 25 foram contraídas em benefício de BB e sem obtenção do acordo do Progenitor.
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4.2. Factos não provados
Com interesse para a apreciação da remanescente questão enunciada, o Tribunal a quo elencou como facto não provado:

1 - As sapatilhas mencionadas no facto provado enunciado sob o número 20  destinaram-se à prática de desporto.
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V - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

5.1. Obrigação parental de alimentos
5.1.1. Conteúdo  
Sendo a família «um elemento fundamental da sociedade», espaço privilegiado de «realização pessoal dos seus membros» (art.º 67.º, da CRP), e reconhecendo-se aos pais uma «insubstituível ação em relação aos filhos» (art.º 68.º, n.º 1, da CRP), compreende-se que se leia no art.º 36º, n.º 5, da CRP, que «os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos».
Precisa-se, no art.º 1877.º, do CC, que os «filhos estão sujeitos às responsabilidades parentais até à maioridade ou emancipação»; e esclarece-se, no art.º 1878.º, do CC, o que sejam estas «responsabilidades parentais», lendo-se no mesmo que «compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens».

Particularizando agora esta obrigação parental de «prover ao seu sustento», lê-se no art.º 1874.º, do CC, que pais «e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência» (n.º 1), sendo que o «dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida em comum, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida familiar» (n.º 2).
«Isto significa, em primeiro lugar, que a obrigação de alimentos a favor dos filhos deriva diretamente da relação de filiação (de tal forma que continua a ser exigível ainda que os pais estejam inibidos do exercício das responsabilidades parentais - cf. art. 1917º, C. Civil).
Em segundo lugar, que a prestação alimentícia a favor dos filhos menores se insere num conjunto mais amplo de poderes-deveres (irrenunciáveis) (7), que os progenitores exercem no interesse dos filhos, designadamente um dever geral de assistência e sustento. (8)
Em terceiro lugar, que a obrigação de alimentos - quando se trata de filhos menores - não se configura como uma obrigação de alimentos stricto sensu nem como um dever autónomo e independente das outras prestações a que os progenitores se encontram vinculados. (9)» (Ac. da RG, de 02.11.2017, António Barroca Penha, Processo n.º 1676/16.2T8VCT.G1.

Contudo, a obrigação de prover ao sustento dos filhos e de assegurar as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação cessa logo que aqueles estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargos (art.º 1879.º, do CC); ou mantem-se para além do momento em que os mesmos atinjam a maioridade ou forem emancipados, desde que não tenham ainda completado a respectiva formação profissional, e na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento, se bem que apenas pelo tempo normalmente requerido para que aquela se complete (art.º 1880.º, do CC, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de Novembro) [28].
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Precisando o que se entende por «alimentos», lê-se no art.º 2003.º, n.º 1, do CC, que se entende como tal «tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário». Logo, em tal conceito contem-se «tudo o que é indispensável à satisfação das necessidades da vida segundo a situação social do alimentado» (Vaz Serra, RLJ, Ano 102, pág. 262) [29]. O conceito de sustento ultrapassa, assim, a simples necessidade de alimentação, abrangendo a satisfação de todas as necessidades vitais de quem carece de alimentos, nomeadamente as relacionadas com a saúde, os transportes, a segurança, a educação e a instrução [30].

Precisando ainda o modo de os prestar, lê-se no art.º 2005.º, do CC, que os «alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se houver acordo ou disposição legal em contrário ou se ocorrerem motivos que justifiquem medidas de excepção» (n.º 1); mas se «aquele que for obrigado aos alimentos mostrar que os não pode prestar como pensão, mas tão somente em sua casa e companhia, assim poderão ser decretados» (n.º 2).
Logo, e em regra, os alimentos deverão ser satisfeitos mediante a entrega de uma quantia pecuniária e com periodicidade mensal, só excepcionalmente se admitindo uma solução diferente.
Contudo, e no caso de filhos menores, a «prática dos tribunais mostra que o devedor de alimentos procurar diminuir a prestação-base periódica e transferir outros pagamentos para prestações sazonais (p. ex. início do ano letivo) ou eventuais (p. ex. emergência de problemas de saúde); e procura até retirar da prestação-base outras despesas periódicas identificadas e documentadas (p. ex. mensalidades de infantário ou de atividades de tempos livres). Pode resumir-se esta prática dizendo que, com frequência, se definem duas rubricas: “alimentos” e “despesas à parte”»(Guilherme de Oliveira, Manual de Direito da Família, Almedina, Abril de 2021, pág. 322).
Tem-se ainda defendido (quer na doutrina [31], quer na jurisprudência [32]), que, devendo a prestação de alimentos ser fixada em prestações pecuniárias mensais, não se justifica qualquer redução nos períodos normais, antecipadamente acordados, em que o menor esteja com o progenitor não guardião [33].

Precisando, por fim, a possibilidade de alteração dos alimentos fixados pelo tribunal ou por acordo dos interessados, lê-se no art.º 2012.º, do CC, que se «as circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos taxados se reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas serem obrigadas a prestá-los».
Logo, quando se alterem as circunstâncias em que assentou a decisão que quantificou o montante da prestação alimentar (alteração superveniente em relação àquela data) - seja quanto às necessidades de assistência do alimentado, seja quanto às possibilidades do devedor de alimentos -, pode a mesma ser actualizada, para mais, ou para menos [34].
Este pedido de alteração de alimentos já fixados a favor de uma criança deverá ser formulado em sede de processo tutelar cível próprio, previsto ou nos art.ºs 42.º e seguintes (quando tenha resultado de uma regulação geral de responsabilidades parentais), ou nos art.ºs 45.º e seguintes (quando tenha resultado de processo cautelar civil  intentado antes com esse limitado objecto) [35], ambos  do RGPTC.
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5.1.2. Determinação do seu montante
5.1.2.1. Em geral
«O instituto jurídico dos Alimentos radica num princípio de solidariedade familiar, de exigência de ajuda, socorro e conforto que recai sobre todos os membros da família e destina-se a titular o direito à dignidade humana, constitucionalmente protegido (cfr. art. 1.º da Constituição da República Portuguesa» (Daniela Pinheiro da Silva, Alimentos a Filho Maior. Natureza, Âmbito e Extensão das Normas Previstas no Art. 989.º, N.º 3 e 4 do Código de Processo Civil, Almedina, Junho de 2019, pág. 17).
Compreende-se assim, e no que concerne à determinação do montante de alimentos, que se leia no art.º 2004.º, do CC, que «serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los» (n.º 1), uns e outras actuais, ou seja, existentes no momento da prestação de alimentos; e «atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência» (n.º 2).
Importa, pois, ter em conta todas as possibilidades e disponibilidades de quem presta e de quem recebe, atendendo o juiz, nomeadamente, «à sua idade, ao seu sexo, ao seu estado de saúde, à sua situação social, ao ter ou não filhos a sustentar, ao poder ou não trabalhar, ao ter ou não um lucro que lhe permita ganhar a vida, aos rendimentos dos seus bens e a quaisquer outros proventos» (Abel Pereira Delgado, Do Divórcio, 1971, pág. 200 a 202) [36].

Tentando concretizar os indeterminados critérios legais referidos (apud Clara Sottomayor, Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de divórcio, 2016 - 6.ª edição, Almedina, Coimbra, Abril de 2016, págs. 334 e ss.), haverá que atender:

. às possibilidades do alimentante - os rendimentos de trabalho, isto é, salários (a parte disponível do seu rendimento normal, certo, regular e actual); os rendimentos de carácter eventual, como gratificações, emolumentos e os subsídios de Natal e de férias; os rendimentos de capital; as poupanças; as rendas provenientes de imóveis arrendados; os valores dos seus bens. Em qualquer caso, o Tribunal deverá recorrer a critérios resultantes da experiência comum, nomeadamente quando, pese embora os valores apurados de rendimentos sejam de valor fixo ou certo, o alimentante apresenta um nível de vida superior. Assim, a capacidade económica dos pais, para efeitos do cumprimento da obrigação de alimentos a prestar aos filhos menores, não se avaliará apenas pelos rendimentos que declarem ao Fisco ou à Segurança Social, avaliando-se também pela sua idade, pela actividade profissional que em concreto desenvolvem e pela capacidade de gerar proventos que essa actividade permite;

. as necessidades do alimentando - o custo de vida em geral; a idade do(a)(s) filho(a)(s) (quanto mais velha é a criança mais avultados são os encargos com a sua educação, vestuário, alimentação, vida social, actividades extracurriculares); a sua saúde; a sua situação social; o nível de vida anterior à ruptura de convivência entre os pais.

. a possibilidade de o alimentando proceder à sua subsistência.
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5.1.2.2. Em particular - Alimentos devidos a filhos
Precisa-se, porém, que no âmbito da natureza especialíssima do vínculo parental, a prestação de alimentos devida pelos pais aos filhos menores ou emancipados não tem o mesmo objecto que a obrigação alimentar comum, já que se trata de um «regime especial (...) que afasta as regras gerais dos arts. 2003º e segs» (Heinrich E. Horster, citado por Abílio Neto e Herlander Martins, Código Civil Anotado, 7.ª edição, Livraria Petrony, Lisboa, 1990, pág. 1372) [37].

Com efeito, atento o especialíssimo vínculo aqui em causa e face aos restantes casos de obrigações de sustento, trata-se de uma obrigação de sustento:

· mais vasta do que a existente nos restantes casos (conforme art.º 2009.º, do CC) [38].

· mais intensa [39], onde importa considerar o princípio constitucional da igualdade de direito e deveres de ambos os progenitores, quanto à manutenção e educação dos filhos (conforme art.º 36.º n.º 3, da CRP) [40], embora não se possa proceder aqui a uma partilha de responsabilidades puramente matemática [41];
· e onde se terá de dar menor relevância da possibilidade do filho de prover à subsistência própria [42].
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5.1.2.3. Em particular - Despesas de Educação
Particularizando os alimentos devidos a filho menor, nomeadamente os relativos à sua educação, entende-se cada vez mais que esta última não se limita apenas à frequência do ensino obrigatório oficial, sendo, por isso, apenas consideráveis as despesas exigidas ou originadas pela mesma (nomeadamente, no seu local próprio e no seu horário específico).
Com efeito, à medida que a sociedade actual se sofistica, com o correlativo aumento de exigência e competitividade, a educação passou a incluir tendencialmente (se não necessariamente) a aprendizagem de línguas estrangeiras (com correcção e fluência), de prática desportiva (factor de reconhecida aquisição de competências de interação social e de trabalho em equipa), de educação artística (em qualquer uma das suas plúrimas vertentes), ou de diferenciadas competências tecnológicas (sobretudo informáticas).
De resto, no próprio art.º 2003, n.º 2, do CC, se distingue entre «instrução» e «educação», quando se lê que os «alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor».
Ora, reconhece-se que, não obstante o esforço notável que foi realizado no nosso país nos últimos sessenta anos, no sentido da elevação e generalização do ensino público obrigatório [43], muitas destas necessidade educacionais ainda hoje são supridas pelas denominadas actividades extracurriculares; e que (tal como o seu nome indica), não obstante se encontrem fora do curriculum do ensino oficial obrigatório, não deixam de consubstanciarem  actividades relativas à educação de quem delas beneficia, devendo, por isso, o respectivo custo ser tido como uma despesa de educação [44].

Dir-se-á ainda que, quando já beneficiavam o filho menor na constância da vida em comum dos respectivos progenitores, e salvo caso de comprovada impossibilidade superveniente dos mesmos (nomeadamente, resultante do seu empobrecimento, fruto precisamente da ruptura da dita vida em comum), deverão continuar a ser consideradas, por forma a que a criança ou jovem mantenha tanto quanto possível o seu nível de vida anterior, excepto se já então era exorbitante e/ou acima da capacidade dos pais.
Com efeito, e nos pressupostos referidos, pretende-se que as alterações no estilo de vida da criança e/ou do jovem e no seu bem-estar sejam o mais reduzidas possíveis, defendendo-se, assim, que o conceito de «necessidade» seja «um conceito subjectivo que depende do nível de vida da família antes do divórcio» (Clara Sottomayor, Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de divórcio, 2016 - 6.ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 331 e 332) [45].
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5.2. Incumprimento de responsabilidades parentais
5.2.1. Regime legal
Lê-se no art.º 41.º, n.º 1, do RGPTC (com a epígrafe «Incumprimento»), que, se «relativamente à situação da criança, um dos pais (…) não cumprir com o que tiver sido acordado ou decidido, pode o tribunal, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou do outro progenitor, requerer, ao tribunal que no momento for territorialmente competente, as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos».
Está-se perante um processo cautelar cível que consubstancia um misto de actividade declarativa e de actividade executiva: pretende-se apurar, em primeiro lugar, se existe ou não o incumprimento (seja sobre o destino da criança, convívio, ou prestação de alimentos); e, em segundo lugar, determinar a realização das diligências coercivas necessárias para o cumprimento coercitivo do acordo ou da decisão de regulação do exercício das responsabilidades parentais [46].

Na decisão a proferir, o juiz terá, assim, de verificar: a existência, ou inexistência, de um comportamento objectivo (acção ou omissão), violador do determinado, imputado a um progenitor adulto; da sua vontade livre e consciente de o adoptar, sabendo que com ele viola uma prévia decisão judicial a que deve obediência; e da ausência de qualquer motivo que justifique ou legitime a sua acção ou omissão (e que caberá, naturalmente, ao apontado progenitor incumpridor alegar e demonstrar).
Precisa-se que, assumindo a obrigação de alimentos natureza creditícia [47], extingue-se pelo cumprimento, no caso, pelo pagamento integral da correspondente prestação debitória (art.ºs 762.º, n.º 1  e 763.º, n.º 1,  ambos do CC); e, sendo o pagamento um facto extintivo da obrigação, é sobre o devedor de alimentos que recai o respectivo ónus de prova (art.º 342.º, n.º 2, do CC) [48]. Não logrando, porém, essa prova, caber-lhe-á então ilidir a presunção de culpa no respectivo incumprimento (art.º 799.º, n.º 1, do CC) [49].
Com efeito, só o incumprimento culposo, «e não mero incumprimento desculpável, de um dos progenitores, relativamente ao acordado quanto ao exercício do poder paternal, deve ser sancionado» (Ac. da RP, de 30.01.2006, Sousa Lameira, Processo n.º 05...). Logo, exige-se um comportamento essencialmente gravoso e tendencialmente reiterado por parte do progenitor remisso, não bastando uma ou outra falta sem antecedentes nem consequências (isto é, inócua ou irrelevante em termos de afetação negativa do menor), permitindo assim um efectivo juízo de censura ao progenitor faltoso [50].
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5.3. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)
5.3.1. Despesas de saúde
Concretizando, verifica-se que foi fixada, em .../.../2015, no âmbito do divórcio entre Requerente (AA) e Requerido (CC), e por comum acordo, uma pensão de alimentos mensal de € 320,00, a pagar por este ao filho comum, então de 09 anos de idade.
Mais se verifica que a dita pensão de alimentos mensal veio depois a ser reduzida para € 260,00, de novo por comum acordo, em 03 de Novembro de 2020, mas sendo simultaneamente cometida ao Requerido (CC) a comparticipação, na proporção de metade, em todas as despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas (no Apenso A - Alteração de regulação de responsabilidades parentais).
Verifica-se ainda que, em 25 de Janeiro de 2022, a Requerente (AA) e o Requerido (CC) acordaram que as «despesas de saúde acima dos € 50,00 devem merecer o acordo de ambos os progenitores, sendo certo que o BB irá continuar (…) com o acompanhamento em ortodontia» (no Apenso B - Incumprimento de regulação de responsabilidades parentais).
Por fim, verifica-se que, em sede de recurso da sentença proferida nos autos, o Requerido (CC) insurge-se apenas quanto às despesas relativas precisamente aos tratamentos de ortodontia do filho, defendendo que «a progenitora não obteve qualquer consentimento ou sequer informou o progenitor» dos mesmos, «ou sequer informou se poderia usar o cheque dentista, usar o sistema nacional de saúde ou a ADSE que a mesma beneficia», não tendo ele próprio assentido em «pagar essas despesas», superiores a € 50,00, «sem a sua prévia autorização».

Dir-se-á, porém, que, que foi o próprio Requerido (CC) quem, na conferência de pais realizada nestes autos, não as excluiu da sua obrigação de pagamento, isto é, tendo discriminado expressamente quais as despesas de saúde reclamadas pela Requerente (AA) que não aceitava pagar, não incluiu estas nessa enumeração taxativa, aceitando antes dever esse montante [51].
Dir-se-á ainda que, tendo as partes tido o cuidado de ressalvar, no texto do acordo que entre elas gizaram e que depois foi judicialmente homologado, que as despesas de saúde superiores a € 50,00 teriam que ser previamente aprovadas pelo Requerido (CC), mas que «o BB irá continuar (…) com o acompanhamento em ortodontia», o declaratário normal a que apela o art.º 236.º, do CC, terá de considerar necessariamente que desse modo deixaram desde logo expresso que, quanto a estas, não seria necessário esse prévio  acordo.
Compreende-se que assim fosse, já que é sabido que nenhuma despesa de dentista terá um valor inferior (e, muito menos, no que diz respeito a tratamentos de ortodontia); e se a cláusula fosse apenas para afirmar que, não sendo obtido o prévio acordo do Progenitor (CC), ainda assim o BB continuaria com o tratamento de ortodontia em curso, seria inútil, já que, nesta última hipótese, sempre dependeria das possibilidades da Progenitora (AA), não podendo a mesma ficar obrigada a suportar sozinha uma obrigação que, na sua génese, caberia a ambos os pais e independentemente daquelas que fossem, em cada momento, as suas possibilidades económicas.

Logo, improcede nesta parte o recurso do Requerido (permanecendo o mesmo obrigado a pagar metade de todas as despesas de saúde reclamadas nos autos e ficando certificado o respectivo incumprimento).
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5.3.2. Despesas de educação
Concretizando novamente, e agora quanto às despesas de educação, verifica-se que, no acordo de 03 de Novembro de 2020, a Requerente (AA) e o Requerido (CC) concordaram ainda que a comparticipação de cada um, na proporção de metade, abrangeria ainda as despesas de educação (no Apenso A - Alteração de regulação de responsabilidades parentais).
Mais se verifica que, no acordo de 25 de Janeiro de 2022, acordaram igualmente que o necessário e prévio acordo para despesas superiores a € 50,00 abrangeria igualmente as despesas de educação, sem prejuízo do filho «continuar com o ATL» (no Apenso B - Incumprimento de regulação de responsabilidades parentais) [52].
Por fim, verifica-se que, em sede de recurso da sentença proferida nos autos, o Requerido (CC) insurge-se quanto ao custo de aprendizagem de inglês fora da escola oficial frequentada pelo filho (curso regular e curso intensivo), quanto à formação musical que o mesmo usufrui no Conservatório ..., quanto ao custo de uma visita de estudo a ..., e quanto ao custo de uma touca de natação e de vestuário, já que: a formação em língua estrangeira e em educação musical, consubstanciariam actividades extracurriculares, exercidas fora do estabelecimento de ensino que o filho frequenta, não se podendo qualificar, por isso, como despesas de educação (que apenas incluiriam as de realização obrigatória, ou imprescindível), sendo ainda superiores a € 50,00, sem que ele próprio as tivesse autorizado; a visita de estudo, igualmente superior a € 50,00, também não teria obtido o seu prévio acordo;  ele próprio não teria possibilidades financeiras para contribuir para as despesas de natureza extracurricular; e o custo da touca de natação e de vestuário, já estaria incluído na pensão de alimentos mensal fixa, por si paga.
 
Dir-se-á, porém, e conforme já sobejamente explicitado supra, que qualquer das despesas sindicadas pelo Requerido (CC) consubstanciam manifestas e indubitáveis despesas de educação, no caso de aprendizagem da língua estrangeira mais difundida no mundo (usada, por defeito, na generalidade das experiências de internacionalização, seja em intercâmbios de estudo, seja no mundo empresarial), de formação musical e de prática desportiva.
Dir-se-á ainda que, nada tendo sido dito pelas partes em contrário, as despesas de educação abrangem todas aquelas que cumpram este propósito, sejam realizadas no âmbito do ensino público oficial, sejam realizadas em actividades extracurriculares fora do mesmo.
Dir-se-á igualmente que, no caso dos autos, todas elas, à excepção da pertinente à viagem de estudo a ... (esta inclusivamente promovida pelo estabelecimento de ensino frequentado por BB), ou foram realizadas antes de 25 de Janeiro de 2022, ou são inferiores a € 50,00 [53], pelo que, quanto a elas, era então desnecessário o prévio acordo do Requerido (CC).
Dir-se-á também que, quanto à viagem a ..., tendo o Requerido (CC) sido previamente avisado da mesma, e do custo em que importaria, e tendo afirmado, em resposta a este específico e único assunto, «quanto ao dinheiro, eu este mês dou mais algum», o já referido declaratário normal a que apela o art.º 236.º, do CC, terá de considerar necessariamente que desse modo deixou expresso o seu acordo à realização da dita despesa.
 Compreende-se que assim seja, já que, não pretendendo deste modo significar que começava de imediato a pagar a sua metade, mas fazendo antes, e apenas, uma discricionária liberalidade, seria expectável que tivesse salvaguardado essa sua limitada intenção, até porque nessa altura já era vinculativo para a Requerente (AA) a prévia obtenção do seu acordo, que o e-mail a que respondia pretendia precisamente obter.
Mais se dirá que a incapacidade financeira do Requerido (CC) para fazer face a estas despesas extracurriculares só seria atendível se fosse superveniente em relação ao acordo que firmou com a Requerente (AA), no sentido da fixação da sua obrigação de pagamento e do montante da mesma [54]; e justificaria um pedido de alteração das respectivas responsabilidades parentais, a exercer em sede própria, e não o incumprimento que aqui lhe é assacado [55].
Por fim, dir-se-á, quanto à aquisição de touca da natação, bem como de vestuário: quer aquela primeira, quer este último, destinaram-se a permitir ou a prática desportiva, ou a formação musical, de BB, consubstanciando, por isso, despesas de educação; à semelhança do demais material escolar (incluindo livros e manuais), reportam-se a despesas que ocorrem, não de forma permanente (durante o ano civil), mas sim periódica ou sazonalmente  isto é, no início de cada ano lectivo), pelo que, no silêncio das partes, não se contêm na prestação de alimentos mensal fixa (destina a ocorrer às despesas que, mensalmente, se renovam), mas sim nas demais despesas de educação (de realização única - como a viagem de estudo - ou periódica - como o custo de aquisição de material no início de cada ano lectivo); e sendo alguma delas superiores a € 50,00, foram todas realizadas antes de 25 de janeiro de 2022 (dispensando, então, o prévio consentimento ou acordo do Requerido na sua realização).

Logo, improcede também nesta parte o recurso do Requerido (permanecendo o mesmo obrigado a pagar metade das despesas de educação que lhe foram cometidas na sentença recorrida e ficando certificado o respectivo incumprimento).
*
Deverá, assim, decidir-se em conformidade, pela improcedência total do recurso de apelação do Requerido (CC).
*
VI - DECISÃO

Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pelo Requerido (CC) e, em consequência, em

· Confirmar integralmente a sentença recorrida.
*
Custas da apelação pelo Requerido (art.º 527.º, n.º 1, do CPC).
*
Guimarães, 26 de Outubro de 2023.

O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.ª Adjunta - Maria Gorete Morais;
2.º Adjunto - Fernando Manuel Barroso Cabanelas.



[1] O despacho que lhe foi notificado tinha o seguinte teor:
«Uma vez que está em causa o incumprimento da prestação de alimentos, por razões de celeridade e simplicidade, determino a notificação do requerido, nos termos e para os efeitos previstos no art. 41º, nº 3 do RCPTC, com a advertência de que, no mesmo prazo, deverá demonstrar nos autos o pagamento das prestações de alimentos sob pena de ser julgar provado o incumprimento do crédito reclamado (arts. 342º, nº 2 do CCivil e arts. 292º e segts e 986º, nº 1 do CPCivil».
[2] A conferência de pais foi designada pelo seguinte despacho:
«Para a realização e conferência de pais (com vista a clarificar com os progenitores as despesas efectivamente englobadas no acordo e, assim, consensualizar o montante em dívida de alimentos desde o ano de 2021) designo o próximo dia 18 de abril de 2023, pelas 14h30m.
Cumpra o disposto no art. 151º do CPCivil.
Notifique».
[3] Lê-se expressamente, e a propósito, na referida «ATA DE CONFERÊNCIA»:
«Depois de exporem as respetivas posições, pela Ilustre Mandatária do Requerido foi dito que, tendo as em conta os comprovativos apresentados, não aceita pagas as seguintes despesas», que a seguir discriminou.
[4] Em despacho prévio à prolação da sentença foi fixado o valor da acção em € 30.000,01.
[5] O Regime Geral do Processo Tutelar Cível (aqui doravante RGPTC) foi aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08 de Setembro.
Lê-se no seu art.º 33.º, n.º 1, que nos «casos omissos são de observar, com as devidas adaptações, as regras de processo civil que não contrariem os fins da jurisdição de menores».
[6] «Trata-se, aliás, de um entendimento sedimentado no nosso direito processual civil e, mesmo na ausência de lei expressa, defendido, durante a vigência do Código de Seabra, pelo Prof. Alberto dos Reis (in Código do Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 359) e, mais tarde, perante a redação do art. 690º, do CPC de 1961, pelo Cons. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III, 1972, pág. 299» (Ac. do STJ, de 08.02.2018, Maria do Rosário Morgado, Processo n.º 765/13.0TBESP.L1.S1, nota 1 - in www.dgsi.pt, como todos os demais citados sem indicação de origem).
[7] Reafirmando hoje este entendimento, Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, Almedina, págs. 172 e 173, onde se lê que, «expostas pelo recorrente, no corpo da alegação, as razões de facto e de direito da sua discordância com a decisão impugnada, deve ele, face à sua vinculação ao ónus de formular conclusões, terminar a sua minuta pela indicação resumida, através de proposições sintéticas, dos fundamentos, de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão».
[8] No mesmo sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código De Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, págs. 762, nota 3, quando afirmam que «objeto do recurso é integrado pelas respectivas conclusões», sem prejuízo das «questões de conhecimento oficioso relativamente às quais existam elementos que possam ser apreciados» (o que reafirmam a pág. 767, nota 4, e a pág. 770, nota 3, da mesma obra).
[9] Neste sentido, Ac. do STJ, de 18.06.2013, Garcia Calejo, Processo n.º 483/08.0TBLNH.L1.S1.
[10]  Não podem, por isso, valer como conclusões «arrazoados longos e confusos, em que se não discriminem com facilidade as questões postas e os fundamentos invocados» (Professor Aberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, Limitada, pág. 361).
No mesmo sentido, Ac. do STJ, de 06.12.2012, Lopes do Rego, Processo n.º 373/06.1TBARC-A.P1.S1, que inclusivamente apelida o ónus em causa como «ónus de concisão».
[11] Neste sentido, numa jurisprudência constante, Ac. da RG, de 07.10.2021, Vera Sottomayor, Processo n.º 886/19.5T8BRG.G1, onde se lê que questão nova, «apenas suscitada em sede de recurso, não pode ser conhecida por este Tribunal de 2ª instância, já que os recursos destinam-se à apreciação de questões já levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que não foram nem submetidas ao contraditório nem decididas pelo tribunal recorrido».
[12] Com efeito, e ao contrário do que sucede com o recurso relativo à decisão sobre a matéria de direito (previsto no art.º 639.º, n.º 2 e n.º 3, do CPC), no recurso relativo à matéria de facto (previsto no art.º 640.º, do CPC) não se admite despacho de aperfeiçoamento.
Aliás, o entendimento da não admissibilidade de despacho de aperfeiçoamento face ao incumprimento, ou ao cumprimento deficiente, do ónus de impugnação da matéria de facto, já era generalizadamente aceite no âmbito do similar art.º 690.º-A do anterior CPC, de 1961 (conforme Carlos Lopes do Rego, Comentário ao Código de Processo Civil, Volume I, 2.ª edição, Almedina, pág. 203).
Neste sentido:
.  na doutrina - António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 128; ou Rui Pinto, Notas Ao Código De Processo Civil, Volume II, 2.ª edição, Coimbra Editora, Novembro de 2015, pág. 142, nota 4.
. na jurisprudência - Ac. da RG, de 19.06.2014, Manuel Bargado, Processo n.º 1458/10.5TBEPS.G1; Ac. do STJ, de 27.10.2016, Ribeiro Cardoso, Processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1; Ac. da RG, de 18.12.2017, Pedro Damião e Cunha, Processo n.º 292/08.7TBVLP.G1; Ac. do STJ, 27.09.2018, Sousa Lameira, Processo n.º 2611/12.2TBSTS.L1.S1;  Ac. do STJ, de 03.10.2019, Maria Rosa Tching, Processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2); ou Ac. do STJ, de 02.02.2022, Fernando Samões, Processo n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1.
Contudo, em sentido contrário, Ac. do STJ, de 26.05.2015, Hélder Roque, Processo n.º 1426/08.7TCSNT.L1.S1, onde se lê que a cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c) do n.º 1, ao contrário do que acontece quanto à matéria do n.º 2 do art.º 640.º do CPC (a propósito da «exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso»), não funciona aqui, automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente, desde logo, a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação.
[13] A exigência de rigor, no cumprimento do ónus de impugnação, manifestou-se igualmente a propósito do art.º 685º-B, n.º 1, al. a), do anterior CPC, de 1961, conforme Ac. da RC, de 11.07.2012, Henrique Antunes, Processo n.º 781/09, onde se lê que este «especial ónus de alegação, a cargo do recorrente, deve ser cumprido com particular escrúpulo ou rigor», constituindo «simples decorrência dos princípios estruturantes da cooperação e lealdade e boa fé processuais, assegurando, em última extremidade, a seriedade do próprio recurso».
[14] Aparentemente no mesmo sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código De Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, quando a pág. 768, nota 6, reservam o despacho de aperfeiçoamento ao recurso «em matéria de direito»; e quando a pág. 720, nota 2, referem - sem qualquer crítica, ou afastamento - que, segundo «a jurisprudência largamente maioritária, não existe relativamente ao recurso da decisão da matéria de facto despacho de aperfeiçoamento». Fazem, porém, notar que esta solução, «em vez de autorizar uma aplicação excessivamente rigorista da lei, deve fazer pender para uma solução que se revele proporcionada relativamente à gravidade da falha verificada».
Na jurisprudência mais recente, veja-se o Ac. do STJ, de 03.10.2019, Maria Rosa Tching, Processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2, onde se lê que, relativamente «ao recurso da decisão da matéria de facto, está vedada ao relator a possibilidade de proferir despacho de aperfeiçoamento, na medida em que, em matéria de recursos, o artigo 652º, nº1, al. a), do Código de Processo Civil, limita essa possibilidade às “conclusões das alegações, nos termos do nº 3 do artigo 639º”».
[15] Precisa-se, a propósito, que importa distinguir a natureza, e as consequências, das diversas actuações possíveis do recorrente: uma primeira (relativa a um ónus primário), que contende com a delimitação do objecto do seu recurso, e que deixa absolutamente omissa, nas respectivas conclusões, a indicação da matéria de facto impugnada (limitando desse modo o recurso, e inexoravelmente, à sindicância da matéria de direito); e uma segunda (relativa ao ónus secundários), que contende com a análise jurídica do cumprimento do ónus de impugnação previsto no art. 640,º, do CPC, e que deixa absolutamente omissa, nas mesmas conclusões de recurso - e ao contrário do que previamente fizera no corpo das respectivas alegações -, a indicação dos concretos meios probatórios que imporiam decisão diferente, da decisão alternativa pretendida, e das exactas passagens da gravação que o fundariam.
Ora, servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, terão nelas que ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação, sob pena de rejeição do mesmo; mas basta quanto aos demais requisitos que constem de forma explícita na motivação do recurso.
Neste sentido: Ac. do STJ, de 19.02.2015, Tomé Gomes, Processo n.º 299/05.6TBMGD.P2.S1; Ac. do STJ, de 04.03.2015, Leonel Dantas, Processo n.º  2180/09.0TTLSB.L1.S2; Ac. do STJ, de 22.09.2015, Pinto de Almeida, Processo n.º 29/12.6TBFAF.G1.S1; Ac. do STJ, de 01.10.2015, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1; Ac. do STJ, de 26.11.2015, Leonel Dantas, Processo n.º 291/12.4TTLRA.C1.S; Ac. do STJ, de 03.12.2015, Melo Lima, Processo n.º 3217/12.1TTLSB.L1-S1; Ac. do STJ, de 11.02.2016, Mário Belo Morgado, Processo n.º 157/12-8TVGMR.G1.S1; Ac. do STJ, de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1; Ac. do STJ, de 21.04.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 449/10.0TTVFR.P2.S1; Ac. do STJ, de 28.04.2016, Abrantes Geraldes, Processo n.º 1006/12.2TBPRD.P1.S1; Ac. do STJ, de 31.05.2016, Garcia Calejo, Processo n.º 1572/12.2TBABT.E1.S1; Ac. do STJ, de 09.06.2016, Abrantes Geraldes, Processo n.º 6617/07.5TBCSC.L1.S1; Ac. do STJ, de 13.10.2016, Gonçalves Rocha, Processo n.º 98/12.9TTGMR.G1.S1; Ac. do STJ, de 16.05.2018, Ribeiro Cardoso, Processo n.º 2833/16.7T8VFX.L1.S1; Ac. do STJ, de 06.06.2018, Ferreira Pinto, Processo n.º 167/11.2TTTVD.L1.S1; Ac. do STJ, de 06.06.2018, Pinto Hespanhol, Processo n.º 552/13.5TTVIS.C1.S1; Ac. do STJ, 12.07.2018, Ferreira Pinto, Processo n.º 167/11.2TTTVD.L1.S1; Ac. do STJ, de 31.10.2018, Chambel Mourisco, Processo n.º 2820/15.2T8LRS.L1.S1; Ac. do STJ, de 13.11.2018, Graça Amaral, Processo n.º 3396/14; ou Ac. do STJ, de 03.10.2019, Maria Rosa Tching, Processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2.
[17] Serão, por exemplo, os casos em que o recorrente, enunciando os pontos de facto que pretende impugnar, é porém omisso quanto aos concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida (Ac. da RP, de 10.07.2013, Manuel Domingos Fernandes, Processo n.º 391/11.8TBCHV.P1), ou não cumpre os ónus secundários do n.º 2 do art. 640.º do CPC, designadamente, de exacta indicação das passagens da gravação (Ac. do STJ, de 22.10.2015, Lopes do Rego, Processo n.º 2394/11.3TBVCT.G1.S1, ou Ac. do STJ, de 26.11.2015, António Leones Dantas, Processo n.º 291/12.4TTLRA.C1.S1).
[18] Neste sentido, Ac. da RL, de 29.10.2015, Olindo Geraldes, Processo n.º 161/09.3TCSNT.L1-2.
[19] Neste sentido, Ac. do STA, de 09.07.2014, Carlos Carvalho, Processo n.º 00858/14.
[20] Entende-se por: deficiência, o não ter sido dada resposta a todos os pontos de facto controvertidos ou à totalidade de um facto controvertido; obscuridade, o haver respostas ambíguas ou pouco claras, permitindo várias interpretações; contradição, o colidirem entre si as respostas dadas a certos pontos de facto, ou colidirem essas respostas com factos antes dados como assentes, sendo entre si inconciliáveis; e falta de fundamentação, o não ter o Tribunal fundamentado, ou fundamentado devidamente, as respostas ou alguma delas (José Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, pág. 664).
[21] No mesmo sentido, de distinção das nulidades da sentença dos vícios que afectam a própria elaboração da decisão de facto (estes últimos entendidos como passíveis de serem qualificados como nulidades processuais, nos termos do art. 195.º, n.º 1 do CPC), Ac. da RL, de 29.10.2015, Olindo Geraldes, Processo n.º 161/09.3TCSNT.L1-2.
[22] Neste sentido, de eventual não distinção dos vícios que afectam a elaboração da decisão de facto das nulidades da sentença, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, Março de 2018, págs. 733 e 734, onde se lê que «atualmente a sentença contém tanto a decisão sobre a matéria de direito como a decisão sobre a matéria de facto (cf. o art. 607-4), pelo que os vícios da sentença não se autonomizam hoje dos vícios da decisão sobre a matéria de facto, diversamente do que antes sucedia (cf. os arts. 608 e 653-4 do CPC de 1961). Esta circunstância, se não justifica a aplicação, sem mais, do regime do art. 615 à parte da sentença relativa à decisão sobre a matéria de facto - desde logo porque a invocação de vários dos vícios que a esta dizem respeito é feita nos termos do art. 640 e porque a consequência desses vícios não é necessariamente a anulação do ato (cf. os n.ºs 2 e 3 do art. 662) -, obriga, pelo menos, a ponderar, caso a caso, a possibilidade dessa aplicação».
[23] «Porventura esta tendência encontrará a sua raiz num modelo processual em que o decurso do prazo para a interposição de recurso apenas se iniciava depois de serem apreciadas pelo tribunal a quo eventuais nulidades decisórias que eram autonomamente arguidas», sendo certo porém, que «há muito que foi ultrapassado esse quadro normativo» (António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, pág. 737).
[24] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex Edições Jurídicas, 1997, pág. 348.
[25] No mesmo sentido, Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Volume III, Almedina, pág. 141.
Por todos, José Lebre de Freitas, Código de Processos Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, págs. 703 e 704, e A Acção declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra Editora, Setembro de 2013, pág. 332.
Contudo, e para este autor e para Isabel Alexandre, face à solução consagrada no CPC de 2013 (de integrar na sentença tanto a decisão sobre a matéria de facto, como a fundamentação respectiva), só a falta da primeira integra a nulidade prevista no art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, e não também a falta da segunda (v.g. genérica referência a toda a prova produzida na fundamentação da decisão de facto, ou conclusivos juízos de direito), a que será aplicável o regime previsto no art.º 662.º, n.º 2, al. d) e n.º 3, als. b) e d), do CPC (conforme Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, Março de 2018, pág. 736, com indicação de jurisprudência conforme). 
[26] Neste sentido, Ac. do STJ, de 08.03.2001, Ferreira Ramos, Processo n.º 00A3277.
[27] Lê-se, a propósito, no art.º 617.º, n.º 1, do CPC, que se «a questão da nulidade da sentença ou da sua reforma for suscitada no âmbito do recurso dela interposto, compete ao juiz apreciá-la no próprio despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso, não cabendo recurso da decisão de indeferimento».
[28] Veio mais recentemente o legislador, pela Lei nº 122/2015, de 1 de Setembro, alterar a redacção do art.º 1905.º, do CC, acrescentando-lhe um novo n.º 2, onde se lê: «Para efeitos do art. 1880.º, entende-se que se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, a pensão fixada em seu benefício durante a menoridade, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido ou ainda, se em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência».
Fala-se, então, de uma «segunda adolescência»: ao «completarem 18 anos, os filhos adquirem plena capacidade de exercício, mas normalmente não têm recursos económicos para ter uma vida autónoma nem a formação necessária para os angariar. Por isso, continuam a viver com os pais e a ser sustentados por estes, iniciando» o dito período da «segunda adolescência» (Jorge Duarte Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo, Almedina, 2016, pág. 299, nota 496).
Estão, assim, em causa alimentos educacionais (na feliz expressão de J. P. Remédio Marques, Algumas Notas sobre Alimentos (Devidos a menores), 2.ª edição, Coimbra Editora, págs.135 a 137), de natureza excepcional e carácter temporário (até que a formação se complete); e cujos «critérios de atribuição assentam na normalidade e razoabilidade, aferidas nomeadamente em função de condições subjectivas do filho maior, e objectivas deste e dos seus pais.
[29] No mesmo sentido, Ac. da RL, de 18.06.1669, JR, 15.º, pág. 583, que reporta a palavra sustento «não apenas à alimentação, mas também a tudo o que é preciso para viver, sem excluir as despesas inerentes a tratamentos clínicos e medicamentos».
[30] Atenta a sua particular natureza e finalidade, compreende-se que o direito a alimentos goze de uma fortíssima protecção legal, sendo nomeadamente: irrenunciável (art.º 2008.º, n.º 1, do CC); indisponível, isto é, insusceptível de renúncia ou cedência (art.º 2008.º, n.º 1, do CC); imprescritível (art.º 298.º, n.º 1, do CC); incompensável, isto é, não compensável com eventual crédito de devedor (art.º 2008.º, n.º 2, do CC); impenhorável (art.º 2008.º, n.º 2, do C.C.); e intuito personae, isto é, insusceptível de transmissão (art.º 2013.º, n.º 1, al. a), do CC).
Beneficia ainda de tutela civil (v.g. art.ºs 41.º e 48.º, ambos do RGPTC) e penal (art.º 250.º, do CP).  
[31] Neste sentido, Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Caso de Divórcio, 2016 - 6.ª edição, Almedina, Abril de 2016, pág. 354 e 355.
[32] Neste sentido: Ac. da RL, de 22.03.2007, Vaz Gomes, Processo n.º 293/07-2; e Ac. da RC, de 05.05.2009, Távora Vitor, Processo n.º 530/07.3TBCVL-A.C1. 
[33] Pondera-se, a propósito da não admissão desta redução de facto da pensão de alimentos previamente fixada, que a imposição da lei na fixação de uma prestação de alimentos mensal e contínua evita o aumento estratégico do direito de visita, como forma de se conseguir uma diminuição da obrigação de alimentos.
Pondera-se, ainda, que a significativa diminuição de despesas que o progenitor guardião terá nesses períodos será quase e só com a alimentação do filho, mantendo-se todas as outras, ou não sendo reduzidas de forma substancial, nomeadamente por serem contínuas e não se esgotarem num determinado período de tempo (nomeadamente, despesas com uma habitação suficientemente ampla para comportar de forma permanente o filho, com as respectivas educação e actividades extracurriculares, com o seu vestuário e calçado). Ora, será o progenitor guardião, que convive diariamente com a criança, quem melhor conhecerá as suas incondicionais necessidades, que terá de satisfazer mesmo que o filho não esteja, por alguns dias, na sua companhia.
Por fim, pondera-se que existe um grande número de despesas dos filhos suportadas pelo progenitor guardião de forma exclusiva, simplesmente por o ter à sua guarda, sendo-lhe as mesmas imediatamente perceptíveis e não raro de imperiosa imediata satisfação; e outras que  não são contabilizadas em termos aritméticos puros, traduzindo-se em tempo, disponibilidade e dedicação, com prejuízo para outros aspectos da sua vida pessoal e/ou profissional, que devem ser compensados/equilibrados com o pagamento da pensão mensal, por o progenitor não guardião ficar de outro modo injustificadamente beneficiado.
[34] Precisa-se, porém, que a jurisprudência tende a ser muito exigente quanto à possibilidade de alteração de pensão de alimentos antes fixada a favor de filho menor radicada  na assumpção de novas obrigações por parte do obrigado, nomeadamente resultantes da constituição de nova família com novas parentalidades, não só por ser de pressupor que o outro membro da nova família comparticipará para a satisfação das necessidades da dita nova família de que faz parte, como ainda por não dever o obrigado a alimentos assumir novas obrigações pondo em risco a satisfação das prévias, nomeadamente quando esteja em causa uma anterior obrigação de alimentos, tão vinculativa como qualquer outra, sendo, porém, o seu cumprimento pontual mais exigível e prioritário do que o das demais obrigações.
Neste sentido: Ac. da RL, de 24.05.2007, Farinha Alves, Processo n.º 1628/2007-2; ou Ac. da RP, de 21.10.2008, M. Pinto dos Santos, Processo n.º 0823712.
[35] Exclui-se, assim, que a alteração das responsabilidades parentais possa ocorrer em processo tutelar cível que tenha antes o respectivo incumprimento por objecto (por se estar face a procedimentos diversos, com distinta natureza e finalidade).
Neste sentido, na doutrina: Rute Teixeira Pedro, Código Civil Anotado (coordenação de Ana Prata), Volume II, 2.ª edição, Janeiro de 2022, pág. 936; ou Tomé d’Almeida Ramião, Regime Geral do Processo Tutelar Cível Anotado e Comentado, 3.ª edição, Quid Juris, Junho de 2018, pág. 192.
Na jurisprudência:
. Ac. da RG, de 28.01.2021, Eva Almeida, Processo n.º 668/13.8TBCHV-B.G1, onde se lê que «não é no âmbito deste incidente [incidente de incumprimento previsto no art.º 41º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível] que o requerido, aqui recorrente, pode requerer a alteração da prestação alimentícia».
. Ac. da RC, de 08.07.2021, Vítor Amaral, Processo n.º 1545/18.1T8FIG-J.C1, onde se lê o «processo de incumprimento de regulação do exercício de responsabilidades parentais (…) não é o adequado a realizar alterações quanto às obrigações decorrentes do regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais que se encontre em vigor, o que deverá ser efetuado em específico processo de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais».
. Ac. da RP, de 07.02.2022, Jorge Seabra, Processo n.º 2174/14.4T8PRT-C.P1, onde se lê que em «incidente de incumprimento de acordo de regulação das responsabilidades parentais quanto à prestação de alimentos não é possível ao tribunal alterar o valor de tal prestação antes aceite e homologada por sentença transitada em julgado», só sendo viável essa alteração «em sede de incidente autónomo de alteração da regulação das responsabilidades parentais e nos termos do artigo 41º, do RGPTC».
[36] Defendendo a mesma natureza eclética de factores: Francisco Pereira Coelho, Curso de Direito da Família, 1969, pág. 300; e Vaz Serra, RLJ, Ano 96, pág. 538.
[37] No mesmo sentido, e apontando ainda diversos traços diferenciadores deste particular dever de alimentos (nomeadamente, ao nível da sua tutela e exequibilidade próprias), Maria Amália Pereira dos Santos, «O Dever (Judicial) de Fixação de Alimentos a Menores», Julgar on line, 2014, págs. 8-13 (in https://julgar.pt/wp-content/uploads/2014/09/O-dever-judicial-de-fixacao-de-alimentos-a-menores.pdf).
[38] Relativamente ao carácter mais vasto da obrigação de sustento quanto a filhos, dir-se-á que «a medida dos alimentos não se afere estritamente aqui por aquilo que é "indispensável" à satisfação das necessidades básicas e educativas» dos mesmos, «mas pelo que é necessário à promoção adequada do desenvolvimento físico, intelectual e moral» destes, «de acordo, porém, com as possibilidades dos pais», conforme aliás resulta do art.º 1885.º do CC (Rui M. L. Epifânio e António H. L. Farinha, Organização Tutelar de Menores. Contributo para uma visão interdisciplinar do Direito de Menores e Família, 2.ª edição actualizada, Livraria Almedina, Coimbra, 1992, pág. 407).
No mesmo sentido, Rute Teixeira Pedro, Código Civil Anotado (coordenação de Ana Prata), Volume II, 2.ª edição, Almedina, Janeiro de 2022, pág. 919, onde se lê que, neste caso, «o objecto da prestação debitória é mais amplo do que o que resulta do nº 1, em geral, para as prestações de alimentos, devendo contabilizar-se, para além das despesas abrangidas pelo nº 1, aquelas que respeitem à instrução e educação da criança ou do jovem alimentando (art. 1885º do CC) e todas as que concernem ao que é devido à luz do cumprimento dos deveres integrados nas responsabilidades parentais (art. 1878º do CC)».
Na jurisprudência, Ac. da RG, de 14.01.2021, Alcides Rodrigues, Processo n.º 802/17.9T8VCT.G1, onde se lê que os «alimentos decorrentes do exercício das responsabilidades parentais têm um conteúdo particular, destinando-se a suprir as carências do alimentando, compreendendo tudo o que é indispensável ao seu sustento, vestuário, habitação, segurança e saúde [conteúdo genérico da obrigação alimentar], e bem assim como à instrução e educação do alimentando menor [conteúdo específico da obrigação alimentar], face ao preceituado pelos arts. 2003°, n.°s 1 e 2, 1878º, 1879° e 1880°, do CC (19)». Logo, o «objeto da prestação alimentar no caso de o credor ser ainda menor é mais amplo do que a que resulta do n.º 1 do art. 2003º do CC, em geral, para as prestações de alimentos, pois abrange também as despesas respeitantes à instrução e educação (art. 1885º), assim como as que decorrem do cumprimento dos deveres integrados nas responsabilidades parentais (art. 1878º)»
[39] Relativamente ao carácter mais intenso da obrigação de sustento quanto a filhos, dir-se-á que «o conteúdo da obrigação de alimentos a prestar pelos pais não se restringe à prestação mínima e residual de dar aos filhos um pouco do que lhes sobra» (Ac. da RP, de 14.06.2010, Guerra Banha, Processo n.º 148/09.6TBPFR.P1, com bold apócrifo). Afirma-se aqui inequivocamente que «a natureza da obrigação, enquanto responsabilidade parental, impõe que se considere que as necessidades dos filhos sobrelevam as dificuldades económicas dos pais. Trata-se de uma responsabilidade que impõe ao progenitor assegurar as necessidades do filho de forma prioritária relativamente às suas, designadamente relativamente àquelas que não sejam inerentes ao estritamente necessário para uma digna existência humana» (Ac. da RP, de 28.09.2010, Ramos Lopes, Processo n.º 3234/08.6TBVCD.P1, com bold apócrifo).
Compreende-se, por isso, que se afirme que «o dever de proteção do filho (…) é de tal intensidade que nem os escassos recursos dos progenitores podem desonerá-los do seu cumprimento», pelo que «o dever de assistência e sustento obrigue os pais a compartilhar com o filho os seus rendimentos até ao limite da sua própria subsistência» (Ac. da RG, de 02.11.2017, António Barroca Penha, Processo n.º 1676/16.2T8VCT.G1).
No mesmo sentido, Rute Teixeira Pedro, Código Civil Anotado (coordenação de Ana Prata), Volume II, 2.ª edição, Almedina, Janeiro de 2022, p. 921, sindicando a relevância das despesas dos progenitores relacionadas com actos de consumo, uma vez que obrigação de alimentos em relação a filhos menores, «reveste prioridade (também em consonância com o disposto no nº 2 do art. 2016-A do CC)».
[40] Este princípio (da titularidade das responsabilidades parentais, como o respectivo exercício, caber, em princípio, a ambos os progenitores, em condições de plena igualdade) é reafirmado no CC, no art.º 1901.º (para a constância do matrimónio), no art.º 1911.º (para a constância de relação análoga à dos cônjuges), e no art.º 1912.º (para as demais situações, isto é, quando os progenitores não vivem naqueles termos).
[41] Relativamente à consideração do princípio constitucional da igualdade de deveres de ambos os progenitores quanto à obrigação de manutenção dos filhos, dir-se-á que não se pretende que cada um deles assegure necessariamente metade das despesas dos filhos, mas sim que cada um deles assegure, na medida das suas possibilidades ou recursos, o que for necessário ao sustento, habitação e vestuário (alimentos naturais), bem como à instrução e educação dos filhos (alimentos civis), por forma a alcançar-se uma justa composição de quotas-partes contributivas
No mesmo sentido, de aplicação de um critério de proporcionalidade, e na doutrina: Moitinho de Almeida, citado por Rui M. L. Epifânio e António H. L. Farinha, op. cit., pág.  387 (onde se lê que «a obrigação de prestar alimentos que a lei impõe aos parentes, é uma obrigação conjunta e não uma obrigação indivisível e solidária, porque o devedor só responde na medida das suas possibilidades»); ou Daniela Pinheiro da Silva, Alimentos a Filho Maior. Natureza, Âmbito e Extensão das Normas Previstas no Art. 989.º, N.º 3 e 4 do Código de Processo Civil, Almedina, Junho de 2019, pág. 94.
Na jurisprudência, Ac. do STJ, de 19.05.2011, Sérgio Poças, Processo n.º 648/08.5TBEPS.G1.S1, onde se lê que que, se «ambos os progenitores devem participar nas despesas relativas ao sustento (em sentido amplo) e à educação do menor, de modo algum tal participação tem de ser, necessariamente, em montantes iguais», já que os «progenitores participam igualmente - tendo em atenção as necessidades do menor - quando participam de acordo com as suas reais possibilidades».
[42] Relativamente à menor consideração da possibilidade do filho de prover à subsistência própria, dir-se-á que o n.º 2, do art.º 2004.º, do CC (na «fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência») terá «pouca relevância prática actualmente», uma vez que representa «um resquício do carácter institucional da família típico das sociedades agrárias anteriores à revolução industrial».
Com efeito, a «maior parte das crianças não tem bens próprios nem trabalha, devido aos requisitos legais do contrato de trabalho, à escolaridade obrigatória e ao melhor nível de vida das famílias. Mesmo nos casos em que efectivamente trabalhem ou tenham bens, essas nomas não podem ser interpretadas à letra, o que levaria a pensar que, independentemente das condições económicas dos pais, estes ficaram desobrigados totalmente de prestar alimentos ao/às/filhos/as, que pelos seu rendimento de capital ou de trabalho pudessem satisfazer as suas necessidades», com evidente postergação daquelas que são as suas constitucionalmente reconhecidas responsabilidades (Clara Sottomayor, Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de divórcio, 2106 - 6.ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 340-341).
Assim, o património dos pais e dos filhos não estará em pé de plena igualdade na afectação às necessidades destes últimos, impondo-se uma maior exigência na interpretação e aplicação da lei.
Acresce que, na «atual conjuntura do mercado de trabalho, a competitividade reclama normalmente um esforço e empenho por parte dos jovens que dificilmente se compagina com a manutenção de um emprego destinado a sustentar os estudos académicos. Os pais devem, pois, dentro dos limites das suas possibilidades económicas, proporcionar aos filhos uma formação profissional que lhes permita responder às exigências acrescidas do mercado de trabalho e à oferta limitada de emprego» (Daniela Pinheiro da Silva, Alimentos a Filho Maior. Natureza, Âmbito e Extensão das Normas Previstas no Art. 989.º, N.º 3 e 4 do Código de Processo Civil, Almedina, Junho de 2019, pág. 20).
[43] A taxa de analfabetismo em Portugal desceu progressivamente, sendo de 33,1% em 1960, de 18,6% em 1981, de 9,0% em 2001, de 5,2% em 2011, e de 0% em 2022 (apud «Cinco décadas de Democracia», Pordata, in https://www.pordata.pt/tema/portugal/educacao-17); e o ensino oficial obrigatório foi sucessivamente elevado, sendo de 4 anos a partir de 1960 (Decreto-Lei n.º  42.994, de Maio de 1960), de 6 anos a partir de 1964 (Decreto-Lei n.º 45.810, de Julho de 1964), de 9 anos a partir de 1986 (Lei n.º 46/86,  de 14 de Outubro) e de 12 anos a partir de 2009 (pela Lei n.º 85/2009, de 27 de Agosto).
[44] No mesmo sentido:
. na doutrina - mas de forma ainda mais vasta quanto ao universo de despesas a considerar, Clara Sottomayor, Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de divórcio, 2016 - 6.ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 330 e 331, onde nomeadamente se lê que, «para além dos vectores fundamentais de sustento, habitação, vestuário, saúde e educação», há, contudo, «um conjunto cada vez mais variado de despesas que devem ser contabilizadas porque fazem, hoje, parte do trem normal de vida das pessoas e da sua vida social corrente: despesas com diversão, designadamente idas ao cinema, ao teatro ou concertos, aquisição de brinquedos, livros ou revistas; despesas com aquisição de computador para a realização de trabalhos escolares; despesas com a vida social, por exemplo, prendas para aniversário de colegas e passeios escolares; despesas de repouso, como o gozo de férias ou  passeios e despesas com actividades extra-curriculares, tais como aprendizagem de línguas estrangeiras, desporto, dança, musica, etc.».
. na jurisprudência - Ac. da RG, de 14.01.2021, Alcides Rodrigues, Processo n.º 802/17.9T8VCT.G1, onde se lê que, na «determinação das necessidades (atuais) do jovem ter-se-á de atender ao seu padrão de vida, ao custo de vida em geral (custo médio e normal de subsistência), à idade do menor (quanto mais velha é a criança mais avultados são os encargos com a sua educação, vestuário, alimentação, vida social, actividades extracurriculares etc.), à ambiência familiar, social, cultural e económica a que está habituado e que seja justificável pelas possibilidades de quem está obrigado a prestar os alimentos».
[45] No mesmo sentido, de consideração do critério de manutenção do nível de vida da criança ou jovem:
. na doutrina – J. P. Remédio Marques, Algumas Notas sobre Alimentos (Devidos a menores), 2.ª edição, Coimbra Editora, págs. 170-173; Jorge Duarte Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo, Gestlegal, 7.ª edição, Setembro de 2020, pág. 275, onde se lê que, no «cumprimento do dever de sustento, os pais estão obrigados a proporcionar aos filhos um nível de vida idêntico ao seu»; ou Guilherme de Oliveira, Manual de Direito da Família, Almedina, Abril e 2021, pág. 317, onde se lê a «medida da obrigação pode ultrapassar o mínimo “indispensável” a que se refere o art. 2003.º, sempre que as necessidades do filho e as possibilidades dos pais superarem esse limite mínimo (art. 2004.º)», pelo que, de «acordo com esta regra, a medida dos alimentos situa-se, normalmente, entre o intervalo grande que vai do mínimo “indispensável” até ao padrão de vida em que o filho vivia».
. na jurisprudência - Ac. da RL, de 22.03.2007, Vaz Gomes, Processo n.º 293/07-2; Ac. da RL, de 07.04.2011, Henrique Antunes, Processo n.º 9079/10.6TBCSC.L1-2; Ac. da RC, de 05.11.2013, Carvalho Martins, Processo n.º 1339/11.5TBTMR.A.C1; Ac. da RL, de 09.12.2015, Teresa Albuquerque, Processo n.º 74/15.0T8SXL-D.L1-2; Ac. da RG, de 13.07.2021, Raquel Baptista Tavares, Processo n.º 3625/20.4T8VCT.G1; Ac. da RG, de 14.01.2021, Alcides Rodrigues, Processo n.º 802/17.9T8VCT.G1; Ac. da RL, de 10.02.2022, Paulo Fernandes da Silva, Processo n.º 2209/18.1T8LSB.L1-2; ou Ac. da RL, de 13.04.2023, Adeodato Brotas, Processo n.º 3755/18.2T8BRR-B.L1-6.
Contudo, em sentido contrário: Diogo Leite de Campos e Mónica Martinez de Campos, Lições de Direito da Família, 5.ª edição, Almedina, Outubro de 2020, pág. 370, onde se lê que, quanto «ao direito  a alimentos que assiste aos filhos menores, a medida deste está sujeita às possibilidades de quem o presta e às necessidades de quem o exige», pelo que, se «os filhos viverem com um dos ex-cônjuges, terão direito a exigir do outro só o necessário para suprir às suas despesas de educação, alimentação, vestuário, etc., não podendo ser tomado como referência o nível de vida que tinham antes do divórcio».
[46] Neste sentido, Márcio Rafael Marques Rodrigues, quando afirma «que este incidente, atendendo à prática processual, é um composto entre a acção executiva e a declarativa, pois para além de ter de se verificar se houve um verdadeiro incumprimento, é possível utilizar determinados expedientes legais de forma a garantir o cumprimento coercivo» do que tenha sido incumprido, in  https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/28481/1/Da%20obrigacao%20de%20alimentos%20a%20intervencao%20do%20FGADM).
[47] Neste sentido, J. P. Remédio Marques, Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores), Coimbra Editora, 2000, pág. 282.
[48] Neste sentido, Ac. da RE, de 24.02.2022, Tomé de Carvalho, Processo n.º 152/07.9TBSTR-C.E1, onde se lê que incumbe «ao devedor, enquanto facto extintivo do direito de crédito da criança, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 342.º do Código Civil, provar que realizou o pagamento da prestação alimentar».
[49] Neste sentido: 
. Ac. da RC, de 13.05.2008, Jorge Arcanjo, Processo n.º 372/04.8TAAND.C1, onde se lê que, dado «que a obrigação de alimentos assume natureza creditícia, uma vez provado o incumprimento presume-se a culpa do devedor de alimentos, nos termos do art.º 799º, nº 1, do C. Civ., pelo que é o devedor quem terá de demonstrar que o não pagamento não procedeu de culpa sua».
. Ac. da RC, de 18.02.2020, Carlos Moreira, Processo n.º 1513/19.6T8CBR-B.C1, onde se lê que, em sede de incumprimento de regulação de responsabilidades parentais, compete «ao incumpridor provar causa de justificação do mesmo, vg. que agiu sem culpa».
. Ac. da RP, de 23.09.2021, Joaquim Correia Gomes, Processo n.º 2948/20.7T8MTS-B.P1, onde se lê que, quando «está apenas em causa a prestação de alimentos, que corresponde a uma obrigação de natureza creditícia, e havendo uma presunção legal de incumprimento culposa quando a mesma não é realizada (artigo 799.º do Código Civil), incumbe ao progenitor devedor provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua».
[50] No mesmo sentido, da exigência do carácter culposo do incumprimento: Ac. da RP, de 03.10.2006, Henrique Araújo, Processo n.º 0622382; Ac. da RP, de 10.01.2012, Cecília Agante, Processo n.º 336/09.5TBVPA-B.P1; Ac. da RP, de 26.03.2019, Anabela Tenreiro, Processo n.º 3207/17.8T8VNG-A.P1; Ac. da RC, de 18.02.2020, Carlos Moreira, Processo n.º 1513/19.6T8CBR-B.C1; ou Ac. da RC, de 08.07.2021, Vítor Amaral, Processo n.º 1545/18.1T8FIG-J.C1.
[51] Resulta nomeadamente do registo áudio da conferência de pais ocorrida em 30 de Maio de 2023 (das 10h:48m às 11h:08m, registadas no sistema digital Habilus Media Studio), onde estavam presentes o Requerido e a sua Ilustre Mandatária (EE), após um pedido de esclarecimento formulado pelo Ministério Público, com vista a apurar quais as despesas que eram, e as que não eram, aceites por aquele:
[09m:14s a 09m:45s] – Ministério Público – «Eu sugeria que o pai dissesse que facturas aí não paga (…) prescindia-se desta fase de alegações e julgamento, o pai esclarecia de tudo o que está reclamado o que é que mantém que não paga e depois a questão era decidida de direito».
[10m:08s a 10m:12s] –Mandatária do Requerido – «É assim, eu já tenho aqui preparado quais são as facturas que o pai aceita e quais as que não aceita».
[10m:13s a 10m:14s] –Juiz de Direito – «Então diga quais é que não aceita, é mais fácil».
[10m:15s a 10m:26s] – Mandatária do Requerido – «É assim, o pai não aceita por exemplo nas despesas de saúde, ele não aceita aqui a factura n.º 3 e a factura n.º 4 porque é de acne».
[10m:59s a 10m:26s] – Mandatária do Requerido – «Depois aqui a factura n.º 5».
[11m:22s a 11m:25s] – Mandatária do Requerido – «As de saúde já estão, todas as outras o pai aceita pagar»
Compreende-se, por isso, que no texto da dita acta ficasse, então, a constar: «Depois de exporem as respetivas posições, pela Ilustre Mandatária do Requerido foi dito que, tendo as em conta os comprovativos apresentados, não aceita pagar as seguintes despesas de: - Saúde: as faturas n.º ... e ... por serem de estética, n.º 5 por ser para fisioterapia».
[52] Tem a jurisprudência entendido que, no silêncio das partes, a frequência de actividades extracurriculares não depende do acordo de ambos os progenitores, devendo, em circunstâncias normais, ser considerada acto da vida corrente (e, por isso, de prática unilateral pelo progenitor guardião), conforme:
. Ac. da RL, de 02.05.2017, Pedro Brigton, Processo  n.º 897/12.1T2AMD-F - onde se lê que devem «considerar-se “actos da vida corrente”, entre outros: as decisões relativas à disciplina, ao tipo de alimentação, dieta, actividades e ocupação de tempos livres; as decisões quanto aos contactos sociais; o acto de levar e ir buscar o filho regularmente à escola, acompanhar nos trabalhos escolares; as decisões quanto à higiene diária, ao vestuário e ao calçado; a imposição de regras; as decisões sobre idas ao cinema, ao teatro, a espectáculos ou saídas à noite; as consultas médicas de rotina».
. Ac. da RG, de 11.05.2022, Margarida Almeida Fernandes, Processo n.º 491/16.8T8BCL-E.G1 - onde lê que a «decisão de frequência pelos menores de um centro de estudo privado onde fazem um estudo acompanhado com vista a melhorar o seu rendimento escolar, indispensável face aos problemas de aprendizagem que apresentam, constitui um “acto da vida corrente” da progenitora que tem a sua guarda e não exige o prévio e expresso assentimento do requerido».
. Ac. da RC, de 28.02.2023, Paulo Correia, Processo n.º 3056/22.1T8VIS-B.C1 - onde e lê que a «frequência, em termos extracurriculares, de curso de aprendizagem/aperfeiçoamento da língua inglesa, constitui um ato da vida corrente, não estando dependente de uma decisão conjunta dos progenitores, e, como tal, pode ser determinada unilateralmente pelo progenitor que tenha o menor ao seu cuidado no período respetivo».
[53] Apenas a factura n.º...9, de 14 de Outubro de 2022, no valor de € 65,00, pertinente a uma formação em inglês, preenche ambos os critérios (isto é, reporta-se a uma despesa realizada após 25 de Janeiro de 2022 e tem um valor superior a € 50,00).
Contudo, não foi a mesma impugnada pelo Requerido no seu recurso, conforme: «Encontram-se juntas sob os documentos n.ºs ...33, ...2 e ...8, faturas alusivas a uma formação de inglês, que o menor frequenta, do qual o Recorrente, desconhecia, não tendo esta o seu consentimento»; e pelo «que, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que, de facto, as despesas, juntas sob o doc. n.ºsº ..., ...1, ...6, ...4, ...7 a ...5, ...0, ...3, ...4, ...1, ...2, ...4, ...5, ...8, ...9, não são devidas, ora por não terem sido previamente comunicadas ao requerido, ora por estarem incluídas na pensão de alimentos ou por se considerarem despesas extracurriculares, ou sequer por não terem obtido a concordância do mesmo».
[54] Neste sentido, da necessidade de alegação e prova da superveniência da alteração das prévias condições económicas do obrigado a alimentos ponderadas, Ac. da RG, de 21.03.2019, Sandra Melo, Processo n.º 800/18.5T8BCL-D.G1), onde se lê que o «progenitor que se pretenda desonerar do pagamento da prestação de alimentos que lhe foi imposta, ainda que provisoriamente, tem que invocar e demonstrar, de forma suficientemente esclarecedora a impossibilidade, mesmo que não definitiva, de os prestar, e a sua superveniência. Esta será uma exceção ao direito de alimentos já fixado (artigo 342º nº 2 do Código Civil), sendo certo, como se viu, que só em situações limite pode ser deferida tal suspensão, pela sua gravidade para o desenvolvimento dos menores».
[55] No sentido de que, salvo circunstâncias excepcionais - de carácter imperioso e de curtíssima duração -, a essencialidade de que se reveste a prestação de alimentos a filho menor impõe o seu efectivo cumprimento até que seja alterada em sede própria (art.ºs 2012.º e 2013.º, ambos do CC, e art.º 42.º, do RGPTC), não devendo admitir-se que o seja unilateralmente pelo respectivo devedor:
. Ac. da RE, de 10.05.2018, Tomé Ramião, Processo n.º 77/09.3TBALR-B.E1 - onde se lê que os «termos da regulação do exercício das responsabilidades parentais têm de ser cumprido, nos precisos termos acordados e homologado, nomeadamente no que respeita ao pagamento do montante da prestação de alimentos fixada, enquanto não for judicialmente alterada».
. Ac. da RC, de 08.07.2021, Vítor Amaral, Processo n.º 1545/18.1T8FIG-J.C1 - onde se lê que, no «campo obrigacional, em matéria de regulação do exercício de responsabilidade parentais, não pode alterar-se o regime alimentício unilateralmente, e segundo as conveniências de algum dos interessados, muito menos de molde a deixar à margem a pessoa que se considera ser a obrigada a pagar».