MAUS TRATOS A ANIMAIS DE COMPANHIA
INCONSTITUCIONALIDADE
Sumário

O crime de maus tratos a animais de companhia, previsto no artigo 387.º do Código Penal é materialmente inconstitucional, por violação dos artigos 27.º e 18.º, § 2.º e 29.º, § 1.º, da Constituição:
a) Por não encontrar na ordem axiológica jurídico-constitucional uma imposição ou necessidade de tutela (penal) do bem-estar animal, em termos que possa justificar a restrição de direitos fundamentais que decorre da sua delimitação típica;
b) E por a descrição típica do ilícito apresentar um nível de indeterminação dos seus elementos objetivos, incompatível com o princípio da legalidade penal, expresso pelo brocardo latino nullum crimen, nulla poena, sine lege stricta, a que se reporta o § 1.º do artigo 29.º da Constituição.

Texto Integral

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I – RELATÓRIO

a. No Juízo de Competência Genérica de …, do Tribunal Judicial da Comarca de … procedeu-se a julgamento em processo comum perante tribunal singular de AA, nascido a … de 1985, com os demais sinais dos autos, a quem fora imputada a prática, como autor, de um crime de maus tratos a animal de companhia, previsto no artigo 387.º, § 1.º, 2.º e 5.º, al. b) do Código Penal (CP), com referência ao artigo 388.º-A do mesmo código.

O arguido apresentou contestação e arrolou testemunhas.

A final o tribunal proferiu sentença, na qual condenou o arguido pela prática, como autor, de:

- um crime de maus tratos a animal de companhia, previsto no artigo 387.º, § 1.º, 2.º e 5.º. al. b) e artigo 388.º-A, § 1.º, al. a) CP, na pena de 150 dias de multa, à razão diária de 5,50€; e na pena acessória de privação do direito de detenção de animais de companhia pelo período de 1 ano.

b. Inconformado, veio o arguido interpor recurso, rematando as pertinentes motivações com as seguintes conclusões (transcrição): «1 – O presente recurso tem por objeto toda a matéria de direito da douta sentença recorrida a qual condenou o arguido pela prática em autoria e na forma consumada, de um crime de maus tratos a animais de companhia, previsto e punido pelos arts. 387.º e 388.º do Código Penal.

2 – Ao condenar, como condenou o arguido nos termos da douta sentença, violou o Tribunal a quo o quadro jurídico constitucional vigente.

3 – A decisão está assim ferida de inconstitucionalidade por violação expressa e grosseira dos arts. 18.º, 27.º e 62.º da Constituição da República Portuguesa.

4 - Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser proferido douto acórdão que determine a absolvição do arguido do crime que lhe foi imputado e consequentemente a revogação da pena a que foi condenado.»

c. O recurso foi recebido, a ele tendo respondido o Ministério Público junto do Tribunal de 1.ª instância, defendendo que: «(…)

3 – Dispõe o artigo 40.º, n.º 1 do Código Penal que, a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

4 – Por seu turno, dispõe o artigo 18.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa que a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

5 – De acordo com estas normas, a tutela de bens jurídicos pelo direito penal tem de assentar na ordem constitucional dos direitos e deveres ali consagrados.

6 – Os animais de companhia não são sujeitos de direitos, mas são seres vivos dotados de sensibilidade, com estatuto jurídico próprio, a quem os seus donos devem assegurar o bem-estar e são merecedores de tutela jurídica mais concreta daquela que é reconhecida à fauna em geral (cfr. art.º 278.º Código Penal e art.º 66.º da CRP) e, como tal, a punição do maltrato a animais encontra respaldo em direitos e interesses constitucionalmente protegidos.

7 – Nos termos do disposto no artigo 29.º Declaração Universal dos Direitos do Homem, necessário se torna procurar a génese da tutela penal dos direitos dos animais que, não sendo sujeitos de direitos, não deixa de se impor como imperativo civilizacional, decorrente da perceção de que os direitos humanos se afirmam também através da aceitação de deveres para com os demais titulares de direitos, ou seja, para com a sociedade em geral.

8 – Assim, entende-se que o bem jurídico encontra-se tutelado pela norma, centrado nos deveres que sobre o comum dos cidadãos recaem, e não diretamente na vida, integridade física ou bem-estar dos animais de companhia.

9 – Nestes termos, inexiste qualquer inconstitucionalidade material do artigo 387.º do Código Penal.»

d. Neste Tribunal Superior o Ministério Público pronunciou-se nesse mesmo sentido, pugnando pela manutenção do julgado.

e. No exercício do contraditório o recorrente nada acrescentou.

Cumprindo apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

A. O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 412.º, § 1.º CPP) (1). Em conformidade com esta orientação normativa, a motivação do recurso deverá especificar os fundamentos do mesmo e formular as respetivas conclusões, deduzidas por artigos, nas quais o recorrente resume as razões do seu pedido, de forma a permitir que o tribunal superior apreenda das razões da sua discordância em relação à decisão recorrida.

É nesse contexto que constatamos estar suscitada apenas uma questão de direito: i) a inconstitucionalidade do tipo de ilícito previsto no artigo 387.º CP, por vulneração dos artigos 18.º, 27.º e 62.º da Constituição.

B. Os termos da causa

O tribunal recorrido considerou provado o seguinte quadro factológico:

«1. No dia 21.03.2022, em hora não concretamente apurada, na …, em …, o arguido AA, aproximou-se do canídeo de raça indefinida, que ali se encontrava.

2. De súbito e sem que nada o justificasse, o arguido, desferiu três tiros de caçadeira no mencionado canídeo.

3. Como consequência direta e necessária da conduta do arguido, o canídeo faleceu no local.

4. Após, o arguido transportou o cadáver do canídeo para dentro do seu veículo automóvel para se desfazer do mesmo.

5. O arguido ao atuar da forma descrita, agiu com o propósito concretizado de molestar fisicamente aquele canídeo e de lhe provocar a morte, com recurso a uma arma, sem qualquer motivo que o justificasse, bem sabendo que se tratava de um animal de companhia.

6. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas, supra descritas, eram proibidas e punidas por lei penal.

Mais se provou que:

7. O arguido tem cerca de 20 cães a seu cargo.

8. O arguido encontra-se desempregado, a auferir subsídio de desemprego no montante de aproximadamente 400€.

9. O arguido vive com a esposa e dois filhos, de …e … anos de idade, em casa própria.

10. O arguido suporta um crédito bancário o montante de 200€ por mês.

11. O arguido tem o 12º ano de escolaridade.

12. O arguido não tem antecedentes criminais.»

C. Da inconstitucionalidade material da norma incriminatória prevista nos artigos 387.º do Código Penal

Sob a epígrafe «morte e maus tratos de animal de companhia» dispõe o artigo 387.º CP, que:

1 - Quem, sem motivo legítimo, matar animal de companhia é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou com pena de multa de 60 a 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

2 - Se a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, o limite máximo da pena referida no número anterior é agravado em um terço.

3 - Quem, sem motivo legítimo, infligir dor, sofrimento ou quaisquer outros maus tratos físicos a um animal de companhia é punido com pena de prisão de 6 meses a 1 ano ou com pena de multa de 60 a 120 dias.

4 - Se dos factos previstos no número anterior resultar a morte do animal, a privação de importante órgão ou membro ou a afetação grave e permanente da sua capacidade de locomoção, ou se o crime for praticado em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou com pena de multa de 60 a 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

5 - É suscetível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a que se referem os n.os 2 e 4, entre outras, a circunstância de:

a) O crime ser de especial crueldade, designadamente por empregar tortura ou ato de crueldade que aumente o sofrimento do animal;

b) Utilizar armas, instrumentos, objetos ou quaisquer meios e métodos insidiosos ou particularmente perigosos;

c) Ser determinado pela avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou por qualquer motivo torpe ou fútil.»

Constando o conceito de animal de companhia no artigo 389.º do mesmo código, o qual tem o seguinte teor:

«1 - Para efeitos do disposto neste título, entende-se por animal de companhia qualquer animal detido ou destinado a ser detido por seres humanos, designadamente no seu lar, para seu entretenimento e companhia.

2 - O disposto no número anterior não se aplica a factos relacionados com a utilização de animais para fins de exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial, assim como não se aplica a factos relacionados com a utilização de animais para fins de espetáculo comercial ou outros fins legalmente previstos.

3 - São igualmente considerados animais de companhia, para efeitos do disposto no presente título, aqueles sujeitos a registo no Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC) mesmo que se encontrem em estado de abandono ou errância.»

A sentença recorrida afirma nos factos provados que o arguido abateu intencionalmente um canídeo, que era um animal de companhia. E com isso considerou verificado ilícito, previsto no artigo 387.º, § 1.º, 2.º e 5.º, al. b) com referência ao artigo 388.º-A, § 1.º, al. a) e 389.º, todos do CP, consequentemente, condenando o arguido numa pena.

A incriminação em referência afigura-se-nos inconstitucional, essencialmente por duas ordens de razões, as quais vêm constituindo o essencial das objeções que a jurisprudência do Tribunal Constitucional vem assinalando às referidas normas penais.

Primeira

Não encontramos na ordem axiológica jurídico-constitucional uma imposição ou uma necessidade de tutela (penal) do bem-estar animal, à luz do princípio da proporcionalidade em sentido amplo (2), em termos que possam justificar a restrição de direitos fundamentais que lhe vem impregnada, conforme resulta no § 2.º do artigo 18.º da Constituição contém resulta.

Apesar de a Constituição atribuir ao legislador parlamentar larga margem de conformação das ações ou omissões criminalmente relevantes, esse poder de definir novos crimes é um poder constitucionalmente vinculado, não prescindido do referencial axiológico-constitucional.

Os bens jurídicos elegíveis pelo legislador penal hão de encontrar-se refletidos num «valor jurídico-constitucionalmente reconhecido» (3), isto é, possuir dignidade constitucional e ser comprovada a necessidade de tutela à luz do princípio da proporcionalidade em sentido amplo. Porquanto, numa conceção liberal do Estado, associado ao princípio do contrato social, o Estado só constrange direitos e liberdade lá onde seja indispensável para a manutenção da paz na comunidade.

A intervenção do legislador penal proibindo ou impondo condutas, sem ter em vista a tutela de um bem jurídico, constituirá sempre uma reação desnecessária, inadequada ou excessiva, sendo por isso arbitrária e abusiva. Não será já Justiça. (4) Neste sentido já considerou o Tribunal Constitucional (5) que «as sanções penais, «por serem aquelas que em geral maiores sacrifícios impõem aos direitos fundamentais» (Acórdão n.º 99/02, ponto 5) só serão constitucionalmente legítimas se através delas se protegerem bens jurídicos que se mostrem dignos de tutela penal.

Efetivamente, as normas penais têm por escopo a proteção dos bens jurídicos essenciais ao fluir pacífico da vida em sociedade. Visam a tutela de «todas as condições e finalidades necessárias ao livre desenvolvimento do indivíduo, à realização dos seus direitos fundamentais e ao funcionamento de um sistema estatal construído em torno dessa finalidade.» (6)

Este princípio do bem jurídico é um «princípio jurídico-constitucional material implícito» (7), constituindo o padrão crítico da legitimação da intervenção do legislador ordinário na criminalização dos comportamentos.

O seu conceito surge na dogmática penal no séc. XIX, com Johann Michael Franz Birnbaum (8), em decorrência da teoria do contrato social. (9)

Encontrando no harm principle da tradição anglo-americana o seu equivalente funcional. Contudo na dogmática penal de matriz europeia continental (sistema da civil law) não logra uma definição consensual.

Han-Heirich Jescheck y Thomas Weigend (10) definem-no como «um valor abstrato de ordem social, juridicamente protegido, cuja defesa interessa à comunidade e cuja titularidade tanto pode ser individual como comunitária.» A doutrina mais moderna, referem estes mesmos autores, releva, com razão, que os bens jurídicos não devem compreender-se como se de bens materiais se tratasse, porque se reportam às relações das pessoas com os interesses mais elevados da vida comunitária. (11)

Bernd Schünemann (12), na mesma linha, refere tratar-se de um conceito tipológico de elevado nível de abstração, em que o respetivo núcleo se constituirá, por um lado, pelos direitos inatos do ser humano, e, por outro, pela essentialia do Estado de Direito; sendo limitado pelo contratipo que é caracterizado pela imposição de certas formas de vida, por via do direito penal, de que a história regista significativos exemplos (v.g. a repugnante execução de pessoas que se recusaram a acreditar num dado dogma).

Claus Roxin (13) alude a «realidades ou fins úteis para o desenvolvimento individual e para o livre desenvolvimento da sua personalidade, como parte de um sistema orientado para esse objetivo ou para o funcionamento do próprio sistema». Ou também, que os bens jurídicos são uma combinação de valores fundamentais por referência à axiologia constitucional; que são como entes que visam o bom funcionamento da sociedade e as suas valorações éticas, sociais e culturais.

Entre nós Jorge de Figueiredo Dias (14) define-o como «a expressão de um interesse, da pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objeto ou bem em si mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhecido como valioso». Ou «concretizações dos valores constitucionais expressa ou implicitamente ligados aos direitos e deveres fundamentais e à ordenação social, política e económica.» (15) E José de Faria Costa define o bem jurídico como o «pedaço da realidade com densidade axiológica olhado como relação comunicacional a que a ordem jurídico-penal atribui dignidade penal». (16)

É, pois, imprescindível uma certa congruência entre o bem jurídico eleito pelo legislador penal e a ordem axiológica jurídico-constitucional. A qual não se nos afigura incompatível com o entendimento de que os bens jurídicos possam ser «hermenêuticamente discerníveis e isoláveis a partir das suas normas (17), encaradas estas como partes do todo em que se exprime a ordenação unitária da vida política e social de uma determinada comunidade estadual.» (18)

Entendemos, contudo, que a conformação descritiva e inserção sistemática do ilícito típico que vem colocado em crise neste recurso, não evidencia, com a clareza que já vimos necessária, o bem jurídico que se visa proteger! E com isso, inapelavelmente, vulnera-se o direito fundamental à liberdade (artigo 27.º, com referência ao § 2.º do artigo 18.º da Constituição).

Não acompanhamos os esforços hermenêuticos que preconizam decorrer a tutela penal do bem-estar animal da dignidade humana, logo afirmada no artigo 1.º da Constituição. Ou do direito a um meio ambiente humano, sadio e ecologicamente equilibrado. Sendo, tanto quanto nos parece, esta a linha em que se inscreve a posição de Teresa Quintela de Brito (19 quando se refere a um «bem jurídico coletivo e complexo que tem na sua base o reconhecimento pelo homem de interesses morais diretos aos animais individualmente considerados e, consequentemente, a afirmação do interesse de todas e cada uma das pessoas na preservação da integridade física, do bem-estar e da vida dos animais, tendo em conta uma inequívoca responsabilidade do agente do crime pela preservação desses interesses dos animais por força de uma certa relação atual (passada e/ou potencial) que com eles mantém. Em causa está uma responsabilidade do humano, como indivíduo em relação com um concreto animal, e também como Homem, i.e., enquanto membro de uma espécie, cujas superiores capacidades cognitivas e de adaptação estratégica o investem numa especial responsabilidade para com os seres vivos que podem ser (e são) afetados pelas suas decisões e ações». Nessa mesma linha sustenta António Jorge Martins Torres (20), que essa tutela «representa não um fim, mas um meio ou instrumento de proteção mediata de outros bens jurídicos fundamentais, como por exemplo, o da própria dignidade humana, o da justiça e da solidariedade, todos eles previstos no artigo 1.º da nossa Constituição». A própria jurisprudência do Tribunal Constitucional dá clara nota da fragilidade de tais cogitações hermenêuticas. Veja-se p. ex., ainda que em diferente contexto, o que refere o acórdão 134/2020, no sentido de a dignidade humana não valer como fundamento exclusivo para estabelecer uma punição, ali expressando que «a ideia de que pode ver-se no princípio da dignidade da pessoa humana [a que se refere o artigo 1.º da Constituição] um bem jurídico capaz de assegurar a proporcionalidade da restrição da liberdade inerente à criminalização de uma conduta, ou de que esse princípio pode de algum outro modo autónomo suster a criminalização de uma conduta, é, porém, uma ideia que suscita sérias reservas. Desde logo, de um ponto de vista sistemático, porque ele surge consagrado na nossa Constituição enquanto princípio fundamental, e não – como noutras Constituições – enquanto direito fundamental. Depois, nos planos literal e teleológico, porque o elevado grau de abstração que o caracteriza tende a impedi-lo de desempenhar adequadamente funções prescritivas concretas.» Até porque, prossegue o Tribunal, «o próprio conceito de dignidade da pessoa humana, pese embora a sua longa história, permanece extremamente difícil de definir, em virtude do elevadíssimo grau de abstração que o caracteriza, quando estendido aos animais tornar-se-ia verdadeiramente intangível e mais dificilmente ainda poderia, portanto, constituir fonte de soluções normativas concretas para tais efeitos.» apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2016, p. 69, disponível em http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/32575/1/ulfd134671_tese.pdf citado no acórdão do TRCoimbra, de 26out2022, proc. 190/20.6T9SEI.C1, Desemb. Jorge Jacob.

Por outro lado, o direito fundamental a um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, a que se refere o artigo 66.º da Constituição, conforme o Tribunal assinalou no acórdão 867/2021, «não protege os animais enquanto tais, de um modo que permita entendê-los como “indivíduos”, mas protege-os somente na medida da sua relevância para o ambiente como um todo, entendido de forma holística. Assim como não protege uma árvore enquanto tal, por ser árvore, mas pode proteger florestas e até, porventura, árvores singulares, caso pertençam a uma espécie protegida (o que corresponde ao tipo de tutela já proporcionado pelo artigo 278.º do Código Penal, relativo aos danos contra a natureza). E assim como não protege os seres humanos enquanto indivíduos (a sua vida, a sua integridade física e moral, a sua autonomia, etc.), apesar de também eles serem parte integrante do ambiente e de a presenrvação do ambiente ser condição indispensável para a sua existência enquanto indivíduos.» Na base destas conceções parece estar a ideia de que «maltratar animais degenera num embrutecimento de modos e de espírito que favorece os maus-tratos sobre humanos»! Mas a isso objetam, aliás proficientemente, Pedro Soares de Albergaria e Pedro Mendes Lima (21), lembrando uma impressiva nota de Posner, que refere não parecer que «“os espanhóis, que assistem a touradas de morte, sejam mais violentos uns para com os outros do ques mexicanos, que assistem a touradas sem morte, ou do que os americanos que de todo não assistem a touradas.”» (22)

A propósito justamente dessa pretensa fons aquae pronunciou-se recentemente o Tribunal da Relação do Porto (23), considerando – na linha já assinalada no acórdão 134/2020 do Tribunal Constitucional - que «o princípio da dignidade da pessoa humana e o propósito de construção de uma sociedade solidária consagrado no artigo 1.º da CRP não podem servir de suporte constitucional à incriminação dos maus tratos a animais de companhia, na medida em que tal entendimento viabilizaria a criminalização de praticamente qualquer conduta que o legislador ordinário considerasse relevante sancionar, de modo a assegurar ou mesmo forçar a implementação de certas conceções morais ou políticas – mesmo as mais controversas -, potenciando a aprovação irrestrita de leis penais.

Há, também, quem não partilhe, de todo, da ideia da necessidade de estreita de congruência entre os bens jurídicos penais e a ordem constitucional. Assentando este entendimento numa sobrevalorização do princípio democrático – o princípio da maioria, como parece ser o pensamento de Jorge Reis Novais (24), expressado justamente a propósito deste temário do ilícito dos maus tratos a animais de companhia.

Afirmando, sem peias, que o legislador ordinário é livre de conformar os tipos de crime que entenda. E sublinhando que «a Constituição serve para garantir direitos fundamentais e para assegurar a separação de poderes e a organização do poder político. Não é um repositório ou um catálogo de bens jurídicos de onde se deduzam mecanicamente uma pretensa hierarquia entre valores onde uma sociedade se revê.»

Entendemos, com o devido respeito, que essa linha argumentativa se mostra algo desalinhada com uma conceção liberal e institucionalista da democracia e da organização do Estado de Direito, com seus freios e contrapesos, com clara distinção entre o que são maiorias conjunturais e pactos de vida em comum (estes incorporados na Lei Fundamental) - conforme lembra Maria João Antunes. (25)

Se bem a interpretamos, é justamente para acautelar esta espécie de «derivas» que Susana Aires de Sousa (26) alerta que «o parâmetro constitucional constitui uma adicional barreira no sentido de impedir que o direito penal se transforme numa capitulação de finalidades políticas.»

Em preclara declaração de voto do Cons. Gonçalo Almeida Ribeiro, no acórdão n.º 867/2021 do Tribunal Constitucional (27), frisa este praetor que «a lei democrática exprime a vontade da maioria conjuntural legitimada nas urnas. Os atos legislativos não traduzem a unidade política dos cidadãos; ao invés, refletem o pluralismo das suas conceções sobre a sociedade justa e o bem comum, e o imperativo de que a controvérsia política que daí resulta seja arbitrada periodicamente através dos processos eleitorais da democracia representativa. A Constituição, pelo contrário, consubstancia um pacto de vida comum entre cidadãos divididos por compromissos mundividências concorrentes, a forma através da qual a pluralidade irredutível que é a matéria da comunidade política se estrutura numa unidade estável.»

O entendimento que vimos sustentando está mais comprometido com os pactos de vida em comum do que com as maiorias conjunturais, alinhado com a opinião de uma parte significativa da doutrina e com o que vem sendo o entendimento maioritário do Tribunal Constitucional. (28)

Não encontramos na ordem axiológica jurídico-constitucional uma imposição nem verdadeiramente vislumbramos necessidade de tutela penal (no sentido de «direito penal de justiça») do bem-estar animal, à luz do princípio da proporcionalidade em sentido amplo (29), em termos que logrem justificar a restrição de direitos fundamentais que lhe está associada (artigo 27.º e § 2.º do artigo 18.º da Constituição).

Segunda

A segunda razão pela qual entendemos que o artigo 387.º CP é inconstitucional prende-se com o princípio da legalidade penal, expresso pelo brocardo latino nullum crimen, nulla poena, sine lege stricta, a que se reporta o § 1.º do artigo 29.º da Constituição. (30)

O princípio da legalidade criminal é uma exigência do Estado de Direito, mas também uma decorrência do princípio democrático e do princípio da separação de poderes, tendo desde logo assento no texto da lei fundamental (artigo 29.°, § l.º Constituição) significando, no essencial, que não pode haver crime nem pena que não resultem de uma lei prévia, escrita, estrita e certa, consagrando-se nesse preceito a máxima latina nullum crimen, nulla poene sine lege.

Preconiza que uma infração criminal tenha necessariamente de estar claramente definida na lei, estando tal condição preenchida sempre que o interessado possa saber, a partir da disposição pertinente, quais os atos ou omissões que determinam responsabilidade penal e as respetivas consequências. Isto é, a norma conformadora do tipo de ilícito penal terá de conter os seus elementos objetivos e subjetivos bem identificados, por forma a que qualquer potencial infrator conheça (possa conhecer) bem a conduta ilícita.

Demanda previsibilidade e acessibilidade, de modo a que qualquer pessoa possa conhecer e saber quais as consequências sancionatórias de uma sua ação ou omissão. E supõe que o legislador formule a lei penal de modo preciso, de molde a não ser suscetível de interpretações gravemente dispares, sobretudo quanto à natureza, âmbito e círculo material da conduta proibida.

No plano da determinabilidade, frisa Jorge de Figueiredo Dias, que: «importa que a descrição da matéria proibida e de todos os outros requisitos de que dependa em concreto uma punição seja levada até um ponto em que se tornem objetivamente determináveis os comportamentos proibidos e sancionados e, consequentemente, se torne objetivamente motivável e dirigível a conduta dos cidadãos (...) Do mesmo modo, se é inevitável que a formulação dos tipos legais não consiga renunciar à utilização de elementos normativos, de conceitos indeterminados, de cláusulas gerais e de fórmulas gerais de valor, é indispensável que a sua utilização não obste à determinabilidade objetiva das condutas proibidas e demais elementos de punibilidade requeridos, sob pena de violação irremissível, neste plano, do princípio da legalidade e sobretudo da sua teleologia garantística.»

Ora, a descrição típica do ilícito aqui em referência apresenta um nível de indeterminação que é incompatível com o princípio enunciado, seja na conformação conceptual do que seja o próprio objeto da infração («animal de companhia»), insuficientemente precisado no artigo 389.º CP, seja ainda o que deva concretamente entender-se por «qualquer animal detido ou destinado a ser detido por seres humanos». Ou em que possa consistir o «sem motivo legítimo», «infligindo dor, sofrimento ou qualquer outro tipo de maus tratos» ou ainda «quaisquer outros maus tratos físicos» (§ 3.º do artigo 387.º).

Num Estado de Direito não cabe decerto ao destinatário da lei penal suprir as deficiências do texto normativo ou as insuficiências do legislador.

Afigura-se-nos, pois, clara a vulneração do princípio da legalidade criminal, expressamente previsto no artigo 29.º, § 1.º da Constituição. Sendo nessa medida inconstitucional a norma que assim se expressa. O recorrente não indica – como é seu estrito ónus (artigo 412.º, § 2.º, al. b) CPP) - e este Tribunal não vislumbra, em que dimensão se considera que a incriminação constante do artigo 387.º do Código Penal vulnera o direito fundamental/constitucional de propriedade (artigo 62.º da Constituição)! Razão pela qual nenhuma outra consideração faremos sobre tal alegação.

Assinalaremos, por fim, que o Tribunal Constitucional já se pronunciou, em diversas decisões, no sentido da inconstitucionalidade material do artigo 387.º CP, na redação introduzida pela Lei n.º 69/2014, de 29 e agosto, considerando vulnerados os artigos 27.º e 18.º, § 2.º da Constituição (nalgumas decisões); e/ou o artigo 29.º, § 1.º do mesmo diploma fundamental (noutras). (31) Em suma: porque consideramos materialmente inconstitucional o artigo 387.º CP, na redação introduzida pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto (e sua extensão remissiva contida no artigo 389.º do mesmo código, na redação dada pela lei n.º 39/2020, de 18 de agosto), por violação dos artigos 27.º e 18.º, § 2.º e 29.º, § 1.º, da Constituição, recusamos a sua aplicação e, em consequência, concluímos pela inverificação do ilícito que se imputou ao arguido, devendo por tal razão, no provimento do recurso, absolver-se o recorrente.

Não questionamos a necessidade social de proteção jurídica dos animais e da punição dos atos de crueldade sobre eles. O que nos suscita sérias reservas, desde logo de constitucionalidade, nos termos sucintamente sobreditos, é a mobilização do direito penal de justiça, para esse desiderato.(32)

III – DISPOSITIVO

Destarte e por todo o exposto decidimos:

a) Declarar materialmente inconstitucional o artigo 387.º CP, na redação introduzida pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, por violação dos artigos 27.º e 18.º, § 2.º e 29.º, § 1.º, da Constituição;

b) E por tal razão, absolver o recorrente da prática do crime de maus tratos a animais de companhia pelo qual tinha sido condenado.

c) Sem custas (artigo 413.º, § 1.º CPP a contrario).

d) Notifique-se.

Évora, 24 de outubro de 2023

J. F. Moreira das Neves (relator)

Maria Margarida Bacelar (com declaração de voto)

Jorge Antunes (com voto de vencido)

Declaração de voto:

Dada a nossa inteira concordância com a argumentação e com a conclusão extraída no acórdão, votamos com a posição que fez vencimento.

É certo que a signatária já subscreveu nesta Relação um acórdão recente no qual fez vencimento posição diametralmente oposta quanto à questão da constitucionalidade do tipo de ilícito previsto no artigo 387.º CP.

Porém, um estudo mais aprofundado da matéria e a ponderação dos argumentos e contra-argumentos a favor e contra as duas posições em confronto nesta sede, levou-me a rever a posição assumida enquanto adjunta no referido aresto.

Maria Margarida Bacelar

Voto de vencido: Não obstante a profundidade e robustez dos argumentos que fundam a posição que fez vencimento, não perfilho a tese do Acórdão e, por entender que não se verifica a inconstitucionalidade das normas que fundaram a condenação do arguido recorrente, penso que a melhor decisão seria a de negar provimento ao recurso interposto, pelas razões que seguidamente se referem.

O arguido AA foi condenado pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de morte de animal de companhia, previsto e punido pelo artigo 387.º, nrs. 1, 2 e 5, al. b), e 388º-A, nº 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 150 dias de multa, à razão diária de € 5,50 e na pena acessória de privação do direito de detenção de animais de companhia pelo período de um ano.

O recurso interposto pelo arguido limita-se a suscitar a questão da inconstitucionalidade das normas em que se baseou a sua condenação, peticionando a revogação da decisão recorrida e a sua consequente absolvição.

Dispõe o artigo 387.º, n.º 1 do Código Penal que:

“Quem, sem motivo legítimo, matar animal de companhia é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou com pena de multa de 60 a 240 dias, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.”

Não se nos afigura que esta norma legal seja inconstitucional. Não desconhecemos que o Tribunal Constitucional já se pronunciou em vários acórdãos e decisões sumárias, afirmando a inconstitucionalidade (cfr., a título exemplificativo, os acórdãos n.º 867/2021, n.º 781/2022, nº 843/2022 e 217/2023). Da mesma forma que não se desconhece que todos os acórdãos acima mencionados têm declarações de voto de vários Senhores Juízes Conselheiros. Primeiramente, no que concerne ao bem jurídico, entendemos que o bem jurídico protegido por este tipo legal de crime é complexo, sendo que se considera que “não reside na vida, integridade física ou bem-estar dos animais de companhia. Recai sim num imperativo civilizacional, decorrente da percepção de que os direitos humanos se afirmam através da aceitação de deveres para com os demais titulares de direitos, ou seja, para com a sociedade em geral.” – Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 26-10-2022, processo n.º 190/20.6T9SEI.C1, relator: Jorge Jacob, disponível in www.dgsi.pt. Refere-se, igualmente, neste acórdão que “o tipo legal de crime de maus tratos a animais de companhia não padece de inconstitucionalidade material.”. Destarte, “e se o art.º 18.º n.º 2 da CRP consagra os princípios da necessidade e da proporcionalidade do direito penal, positivando a regra de que o direito penal - direito fragmentário e de ultima ratio – deve ter uma função e protecção de bens jurídicos («a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos»), há que procurar concretizar esse bem jurídico no que respeita ao tipo em causa. E aqui acompanhamos a posição expressa por Teresa Quintela de Brito (em Crimes Contra Animais: os novos Projectos-Lei de Alteração do Código Penal, Anatomia do Crime, nº 4, Jul-Dez 2016, p. 104), no sentido de que o bem jurídico é, ainda assim, descortinável. E acompanhamo-la também no que respeita à identificação desse bem jurídico. Após desenvolvida exposição sobre os variados diálogos doutrinários em confronto, a autora afirma que o bem jurídico protegido pelo tipo aplicado não reside na integridade física e na vida do animal de companhia. É sim um «bem colectivo e complexo que tem na sua base o reconhecimento pelo homem de interesses morais directos aos animais individualmente considerados e, consequentemente, a afirmação do interesse de todos e cada uma das pessoas na preservação da integridade física, do bem estar e da vida dos animais, tendo em conta uma inequívoca responsabilidade do agente do crime pela preservação desses interesses dos animais por força de uma certa relação actual (passada e/ou potencial) que com eles mantém. Em causa está uma responsabilidade do humano, como indivíduo em relação com um concreto animal, e também como Homem, i.e., enquanto membro de uma espécie, cujas superiores capacidades cognitivas e de adaptação estratégica o investem numa especial responsabilidade para com os seres vivos que podem ser (e são) afectados pelas suas decisões e acções».

Assim sendo, e identificado o bem jurídico cuja ausência, segundo o recorrente, seria o fundamento de inconstitucionalidade, conclui-se pela conformidade constitucional do tipo de crime da condenação.” O referido Acórdão da Relação de Coimbra encontrou conforto na posição que já antes fora assumida no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 18-06-2019 - Relatora: Ana Barata Brito, processo n.º 90/16.4GFSTB.E1.E, disponível in www.dgsi.pt. Perfilhamos este entendimento quanto ao bem jurídico protegido, concluindo pela ausência de inconstitucionalidade quanto a este aspeto. Para além disso, e no que respeita concretamente à norma do artigo 387.º, n.º 1, do Código Penal, que está em causa nos presentes autos, entende-se que, apesar de o conceito de motivo legítimo ser algo lato, não deve, por essa circunstância, a norma ser considerada inconstitucional. Tanto mais que tantos outros crimes previstos no Código Penal, e cuja constitucionalidade não é posta em causa, dependem da legitimidade ou não das condutas, dos interesses, e mesmo dos motivos dos agentes (a título de exemplo, os crimes de difamação, de desobediência e de recusa de cooperação; este último com particular relevância uma vez que utiliza a expressão motivo legítimo). Por outro lado, reconhece-se, igualmente, que o conceito de animal de companhia é também algo abrangente (cfr. artigo 389.º do Código Penal). Porém, o facto de os conceitos serem latos e abrangentes, não torna as normas incriminadoras em questão inconstitucionais, tanto mais que, como se tentou ilustrar, encontramos outros crimes no Código Penal com a mesma “abrangência”. Por todas estas razões, divergimos da decisão que fez vencimento.

Jorge Antunes

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1 Em conformidade com o entendimento fixado pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28dez1995.

2 Faria Costa, apud, Maria João Antunes, Constituição, Lei Penal e Controlo da Constitucionalidade, 2021 (7.ª edição - reimpressão), Almedina, pp. 57.

3 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte geral, Tomo I, 2019, Gestlegal, pp.136.

4 Neste sentido Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, tomo I, 3.ª ed., 2019 Gestlegal, p. 140.

5 Acórdão n.º 843/2022, de 20dez2022, Cons. Maria Benedita Urbano.

6 Claus Roxin, O conceito de bem jurídico como padrão crítico da norma penal porto à prova. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 23, n.º 1, 2013, pp. 12.

7 Jorge de Figueiredo Dias, O Direito Penal do Bem Jurídico como Princípio Jurídico-Constitucional, XXV Anos de Jurisprudência Constitucional Portuguesa. Colóquios Comemorativos do XXV aniversário do Tribunal Constitucional», pp. 33; e também em «O Direito Penal do Bem Jurídico como princípio jurídico-constitucional implícito», Revista de Legislação e Jurisprudência 145.º Ano, 2015/2016, n.º 3994-3999.

8 Manuel da Costa Andrade, Consentimento e Acordo em Direito Penal, Reimp., Coimbra:

Coimbra Editora, 2004, p. 37.

9 Cf. Han-Heirich Jescheck y Thomas Weigend, Tratado de Derecho penal, Parte General, 5.ª ed., 2002, Comares Editorial, pp. 274.

10 Tratado de Derecho penal, Parte General, 5.ª ed., 2002, Comares Editorial, p. 275.

11 Op. e loc. cit.

12 Bernd Schünemann, Direito Penal, Racionalidade e Dogmática, 2018, Marcial Pons, São Paulo, pp. 74/75.

13 Claus Roxin, Strafrecht AT 1, 3.ª Ed., 1997, § 2.º, nm. 9, cit, por Knut Amelung, El concepto «bien jurídico» en la teoria de la protección penal de bienes jurídicos. La Teoria del Bien Jurídico - ?Fundamento de Legitimación del derecho penal o juego de aborios dogmático?, Roland Hefendehl (ed), Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales, S. A., 2007; Claus Roxin, El concepto de bien jurídico como instrumento de crítica legislativa sometido a examen, Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminología (RECPC) 15-01 (2013): http://criminet.ugr.es/recpc

14 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, tomo I, 3.ª Ed., 2019, Gestlegal, p. 130.

15 Autor e ob. cit. p. 137.

16 José de Faria Costa, Noções Fundamentais de Direito Penal (Fragmenta iuris poenalis), Coimbra Editora, 4.ª ed., 2015, p. 5.

17 Cf. Augusto Silva Dias, «Delicta in Se» e «Delicta Mere Prohibita», 2008, Coimbra Editora, pp. 650 e ss.)

18 Declaração de voto da Cons. Joana Fernandes Costa, acórdão TC 867/2021, da 3.ª Secção, de 10nov2021.

19 Teresa Quintela de Brito, Crimes Contra Animais: os novos Projetos-Lei de Alteração do Código Penal, Anatomia do Crime, n.º 4 (2016), p. 102; também em: Os crimes de maus tratos e de abandono de animais de companhia: Direito Penal Simbólico?, Revista CEDOUA n.º 2, 2016.

20 António Jorge Martins Torres, A (in)dignidade jurídica do animal no ordenamento português, Dissertação de Mestrado Profissionalizante na Área de Ciências Jurídico-Forenses

21 Pedro Soares de Albergaria e Pedro Mendes Lima, Sete vidas: a difícil determinação do bem jurídico protegido nos crimes de maus-tratos e abandono de animais, Julgar, n.º 28, 2016, pp. 125 ss.

22 Richard Posner, Animal rights”, The Yale Law Journal, 110, 2000, p. 535, em recenção crítica a um livro de S. M. Wise, dá conta dessa elementaridade: “Equation is a reflexive relation. If chimpanzees equal human infants, human infants equal chimpanzees, p. 537, n. 20 – citado por Pedro Soares de Albergaria e Pedro Mendes Lima, loc. cit.

23 Acórdão TRPorto, de 17/5/2023, proc. 614/21.5PIPRT.P1, Desemb. Jorge Langweg.

24 No diário Público, do dia 23nov2021; e no Diário de Notícias, de 24jan2023.

25 Maria João Antunes, Constituição, Lei Penal e Controlo da Constitucionalidade, 2021 (7.ª ed. - reimpressão), Almedina, p. 86 (mas também p. 85, 92 e 94).

26 Susana Aires de Sousa, Argos e o direito penal (uma leitura “dos crimes contra animais de companhia” à luz dos princípios da dignidade e da necessidade), revista Julgar, n.º 32 (2017), p. 154.

27 Acórdão do Tribunal Constitucional de 10 de novembro de 2021(ali se referindo que tal opinião já fora lavrada noutra declaração de voto, no proc. 464/2019 do mesmo Tribunal).

28 Veja-se, por todos, Maria João Antunes, ob. cit. pp. 51 ss.

29 Faria Costa, apud, Maria João Antunes, Constituição, Lei Penal e Controlo da Constitucionalidade, 2021 (7.ª edição - reimpressão), Almedina, p. 57.

30 No acórdão do Tribunal Constitucional n. 843/22, de 20dez2022, Cons. Maria Benedita Urbano, precisa-se, num muito completo e claro excurso a dimensão jurídico-dogmática deste princípio constitucional que inere ao Estado de Direito, para cujas considerações se remete.

31 Cf. acórdão 867/2021, da 3.ª Secção, de 10nov2021, do qual foi relator o Cons. Lino Rodrigues Ribeiro (considerando estarem violados os artigos 27.º e 18.º, § 2.º, da Constituição); na Decisão Sumária, n.º 344/2022, também da 3.ª Secção, proferida a 5mai2022, da qual foi relator o Cons. Afonso Patrão (considerando igualmente vulnerados os artigos 27.º e 18.º, § 2.º, da Constituição); no acórdão 9843/2022, de 20dez2022, em que foi relatora a Cons. Maria Benedita Urbano (considerou-se vulnerado o artigo 29.º, § 1.º da Constituição); e no acórdão 9/2023, de 7fev2023, proc. da pena da Cons. Maria Benedita Urbano (novamente vulnerado o artigo 29.º, § 1.º da Constituição).

32 Neste exato sentido se pronuncia também Susana Aires de Sousa, Argos e o Direito Penal (uma leitura “dos crimes contra animais de companhia” à luz dos princípios da dignidade e da necessidade), revista Julgar, n.º 32 (2017), p. 160.