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RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
VENDA DE BENS DE CONSUMO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
PRESUNÇÃO DE CULPA
Sumário
I - Reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação a decisão de facto e mantendo-se vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados. II - No âmbito da Venda de Bens de Consumo, assiste ao consumidor o direito a ser indemnizado dos danos sofridos de natureza patrimonial e não patrimonial, por aplicação do regime previsto no art. 12º da Lei de Defesa do Consumidor (Lei 24/96 de 31 de Julho). III - O profissional apenas é responsável pelo prejuízo que tenha causado ao consumidor, na sequência de uma falta culposa ao cumprimento da obrigação, sendo que em sede de responsabilidade contratual a culpa presume-se (art. 799º CC).
Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)
I. Relatório
Na presente ação declarativa que segue a forma de processo comum em que figuram como:
- AUTORA: AA, no estado civil de casada, número de identificação fiscal ..., residente na Rua ..., ..., Anadia; e
- RÉ: A..., Lda., número de pessoa coletiva ..., com sede na Rua ..., ..., ...;
- INTERVENIENTE ACESSÓRIA: B..., S.A., número de pessoa coletiva ....
veio a autora pedir a condenação da ré:
- na substituição do motor do veículo identificado no artigo 3.º da petição inicial ou, em alternativa, no pagamento da sua reparação, no valor total de 7.399,95€;
- no pagamento do montante de 10.869,76€ pela privação do uso do veículo, despesas de reboque e danos morais;
- no pagamento do diário de 50,00€, ou o que vier a ser considerado, pela privação do uso do veículo.
Alegou para o efeito e em síntese, que a ré dedica-se, entre outras coisas, à comercialização de veículos automóveis e no âmbito do objeto social daquela, a ré vendeu à autora, a 14 de Julho de 2017, um veículo automóvel, tendo o gerente da ré assegurado à A. que aquele havia sido submetido a uma rigorosa inspeção, e que se encontrava em perfeitas condições de funcionamento.
Mais alegou que se trata de um automóvel de marca Audi, modelo ..., matrícula ..-BL-.., adquirido pela A. à Ré pelo preço de 22.500€, liquidado da seguinte forma:
- entrega de um veículo automóvel da marca Volkswagen, tendo as partes fixado o seu valor em 6.000€;
- 1.500€ em dinheiro;
- 15.000€ mediante empréstimo bancário.
Não obstante o negócio ter ficado em concluído a 26 de Junho de 2017, a viatura só foi entregue a 22 de Julho de 2017 em virtude de problemas, alegadamente no turbo.
Logo nesse dia- durante a viagem- o automóvel apresentou novos problemas: a luz do óleo acendia e apagava e o GPS não estava a funcionar.
A A. entrou, de imediato, em contacto com a ré, na pessoa do seu gerente, BB, que lhe disse que havia verificado os níveis do óleo e que isso podia acontecer por ter óleo a menos, ou a mais, situação normal, segundo ele. Relativamente ao GPS, ficou de agendar um dia para analisar a situação, o que nunca aconteceu.
De Julho a Novembro a luz do óleo continuou a acender e a apagar forçando, por isso, a A. a, diariamente, verificar os níveis para assegurar que não haveria consequências mais graves.
No dia 23 de Novembro a A. apercebeu-se de um barulho anormal que a levou a chamar um reboque.
A A. através de seu marido, entrou em contacto com o gerente da ré, solicitando-lhe que a viatura fosse deixada nas suas instalações, para análise e reparação, ao que o último respondeu que não, dado que a A. tinha assinado um documento em que prescindia da garantia e que, além disso, da própria fatura constava a indicação de que o veículo havia sido vendido no estado em que se encontrava.
Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante, aproximadamente, um mês a ser reparada, tendo a A. informado a ré da situação daquele – automóvel –através de email enviado pelo seu advogado, face à quantidade de problemas que foram, aí, detetados e por esse motivo, a oficina procedeu, apenas, à reparação dos problemas mais prementes, deixando os outros para reparação ulterior pois, a não ser assim, o custo seria (ainda) mais avultado.
A 11 de Dezembro, a ré, na pessoa do seu gerente, enviou- via email- à A., o documento onde esta, alegadamente, renunciava à garantia, sendo certo que a A. nunca assinou qualquer original desse documento e, ainda que o tivesse feito, sempre o mesmo padeceria de nulidade.
No dia 18 de Dezembro de 2017 a viatura foi entregue à A., tendo esta sido alertada, pelo mecânico que procedeu à reparação, para a existência de ruído nas “tuches”, nas correntes, bem como para o facto de a luz do óleo acender e piscar. O mecânico referiu que a resolução de todos os problemas do veículo acarretaria “custos extraordinariamente elevados”- de facto, só a substituição do motor por um usado ascenderia a 5.399,95€ (Doc. 5), acrescida do custo da mão-de-obra, no valor de, aproximadamente, 2.000€.
No dia 27 de Março de 2018 o carro foi, novamente, rebocado para a referida oficina, o mesmo sucedendo a 16 de Maio de 2018 e ainda, no dia 27 de Maio de 2018, data em que o veículo parou na auto-estrada entre Coimbra e a Figueira da Foz, e em que teve de ser a A. a suportar os custos, em virtude de a assistência em viagem já não cobrir o respetivo serviço, ponderando o número de vezes do recurso ao mesmo,
Alegou, ainda, que desde então a viatura encontra-se parada, não obstante a Ré ter sido avisada da sua imobilização e dos problemas que o mesmo acusava, quer verbalmente, quer por escrito, não tendo encetado qualquer diligência no sentido da reparação do veículo, razão pela qual o mesmo permanece imobilizado, causando danos à A..
A autora viu-se forçada durante todo esse período, a pedir uma viatura emprestada por diversas ocasiões e a beneficiar de “boleias” de amigos e familiares, dado que a sua atividade profissional- gerente de uma empresa- não lhe permite ficar sem transporte.
A A. trabalha em ... e em Coimbra mas reside em Anadia, tendo de deslocar-se, várias vezes por dia, entre essas localidades, encontrando-se sem transporte próprio, facto que está a prejudicar a sua atividade profissional, porque está impedida de visitar clientes, o que se traduziu num decréscimo das vendas. Tem de ficar, algumas vezes, com a viatura da empresa, ficando, assim, o comercial impedido de a utilizar, bem como as restantes pessoas que aí trabalham.
No que concerne a sua vida pessoal, a situação retratada teve profundo impacto na vida da A., impedindo-a, nomeadamente, de fazer as compras para o agregado familiar, levar os filhos para a escola e atividades conexas, exercer a sua atividade profissional e deslocar-se normalmente, como sempre fez, sair aos fins de semana- o que era usual e necessário para a saúde mental de todos; ir de férias pois, por serem uma família numerosa- seis pessoas- a viatura adquirida à ré era a única que respondia às necessidades da família; visitar o filho, que se encontra a estudar em Lisboa; vê-se, muitas vezes, obrigada a aguardar que algum familiar ou amigo a vá levar e ou buscar ao seu local de trabalho.
Mais alega que esta situação traduziu-se num profundo desgaste físico e mental, que se manifestou em sintomas físicos, como tonturas, dores de cabeça constantes, cansaço profundo, para além dos óbvios incómodos e do próprio facto de não poder utilizar o veículo sempre que lhe aprouvesse, estando, assim, impedida de o usar desde 27 de Maio de 2018.
Considera, ainda, que a ré agiu com culpa porquanto conhecia - por não poder desconhecer - os problemas de que a viatura padecia e, mesmo assim, vendeu-a à A., alegando estar aquela em perfeitas condições e refere ter ficado com uma viatura com problemas- a da A.- sem deles ter reclamado, tendo-se negado- face à reclamação da A.- a proceder à reparação da viatura.
O automóvel encontra-se dentro do período de garantia de dois anos, sendo a ré responsável pela reparação ou a custear a reparação no valor total de 7.399,95€ (motor e mão-de-obra) peticionado, e ainda, a indemnização pelos prejuízos sofridos a título de privação do uso da viatura desde 27 de maio de 2018 - 6.000,00€ - reparações e reboques – 1.869,76€- danos morais – 3.000,00€.
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Citada a ré contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Por exceção, suscita a caducidade do direito de ação e impugna os factos alegados na petição.
Alega para o efeito que a viatura automóvel de marca Audi, modelo ..., do ano de 2006 e com a matrícula ..-BL-.. (adiante abreviadamente designada por "Audi ...") foi vendida pela ré à Autora no dia 14 de Julho de 2017, pelo preço € 22.500,00.
Em data que não é possível precisar mas que se situará em meados de Junho de 2017, a A apresentou-se no armazém e estaleiro onde a Ré desenvolve a sua atividade manifestando que queria ver um Audi ... cuja venda a Ré havia anunciado num site da especialidade.
Tendo o gerente da Ré informado que essa viatura tinha acabado de ser comercializada e perante o interesse da Autora, o gerente da Ré informou que havia comprado num leilão um outro Audi ... mas que ainda nem sequer o vira. Solicitou a autora que no regresso de Lisboa passasse em Anadia para observar e experimentar esse Audi ....
Cerca de uma semana depois, o gerente da Ré foi levantar o "Audi ..." a Lisboa e verificou então que, apesar da sua condução não se detetar qualquer anormalidade, o painel de controle trazia acesa uma luz amarela sinalizadora da existência de problema no motor.
Em conformidade com o que acordara com a Autora, parou em Anadia e mostrou-lhe o "Audi ...", informando então a A. de que o preço de venda era de € 22.500,00, dando-lhe conhecimento da existência da supra referida luz amarela sinalizadora da existência de problema no motor. Mais informou a A. de que, caso pretendesse ficar com a viatura, iria submete-la um teste de diagnóstico para se aferir qual o problema que poderia existir e que as eventuais anomalias seriam reparadas.
Depois de verificar e experimentar o "Audi ...", a A. manifestou interesse em o adquirir, afirmando que primeiramente tinha de solicitar um empréstimo para pagamento do respetivo preço. Alguns dias antes da concretização do negócio, a A contactou o gerente da R e informou que lhe fora aprovado um empréstimo no montante de € 15.000 e que podia avançar com a compra do "Audi ...”.
No dia 11/07/2017 o gerente da R fez submeter o "Audi ..."" a um teste de diagnóstico eletrónico o qual detetou a necessidade de substituição de três velas incandescentes e também a existência de um problema no circuito de controle de sobrealimentação do turbo. Foi então efetuada a reparação dessas anomalias, tendo designadamente sido instalado um novo turbo completo (corpo + acessórios), tendo aproveitado para mudar o óleo do motor e substituir os filtros do óleo, do combustível, do ar e do habitáculo.
No dia 14/07/2017, o "Audi ..." foi submetido a um novo teste de diagnóstico cujo resultado não detetou a existência de qualquer anomalia.
No dia 14/07/2017, a A. apresentou-se no armazém da Ré, deixando aí o Volkswagen ..., e seguindo, na companhia do gerente da Ré, para a oficina onde se encontrava o "Audi ...". A Autora saiu então da oficina ao volante do mesmo e andou a experimentá-lo o resto da tarde desse dia.
Seguidamente a Autora e o marido foram jantar com gerente da Ré e depois regressaram à Anadia com o "Audi ...".
Mais alegou que nem nesse dia, nem posteriormente, a Autora reclamou junto do gerente da Ré a existência de qualquer problema no "Audi ...". Só em finais de Novembro de 2017 é que o gerente da R. recebeu uma chamada telefónica da A, e no decurso da qual a Autora, não reportando nenhuma concreta avaria e/ou deficiência, destratou o gerente da R exigindo uma viatura nova.
Na sequência desta chamada, o gerente da Ré enviou à A. o mail junto com a PI como doc nº 4. Com exceção dessa chamada, o gerente da Ré não recebeu qualquer outra chamada da A., nem esta voltou a aparecer a nas instalações da Ré, nem nunca reportou os problemas que tinha com a viatura.
Mais alegou que entre 14 de julho de 2027 e 27 de maio de 2018 o veículo andou 27.855 kms. Considera que dos documentos juntos pela autora não resulta que no veículo existisse uma avaria que remontasse a 14 de julho de 2017. Considera que face ao quadro descrito pela autora em vez de se abster de circular com o veículo, continuou a utilizar de forma intensiva, agravando dessa forma os problemas que a mesma pudesse apresentar e contribuindo então, de forma decisiva, para sua alegada imobilização a partir de Maio de 2018.
Considera, ainda, que detetado em 22 de Julho de 2017 os problemas que alegadamente afetavam o "Audi ..." e que continuaram a manifestar-se de Julho a Novembro de 2017, não tendo denunciado à R esses problemas nos dois meses posteriores à data em que deles teve conhecimento, o eventual direito da A. a exigir a sua reparação caducou (cfr. artº 5º-A nº 2 do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 84/2008 de 21 de Maio).
Termina por pedir a intervenção provocada "B..., SA", NIPC ... e com instalações na Rua ... ..., a quem comprou a viatura automóvel de marca Audi, modelo ..., com a matrícula ..-BL-..., para acautelar o exercício de um eventual direito de regresso.
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Proferiu-se despacho que determinou a notificação da autora para se pronunciar sobre o pedido de intervenção.
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A Autora veio apresentar resposta à matéria das exceções, impugnando alguns dos factos alegados pela ré, por não corresponderem à verdade, bem como, veio opor-se à requerida intervenção de terceiros.
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Proferiu-se despacho que admitiu a intervenção acessória provocada da chamada “B..., S.A.”, nos termos do artigo 321° e seguintes do CPC e determinou a sua citação.
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A Interveniente veio deduzir oposição, alegando em síntese que participou no leilão como leiloeira e mera intermediária, tendo sempre atuado por conta e mandato do seu cliente/vendedor, não lhe sendo imputáveis os danos que a autora reclama.
Impugna os danos alegados, cujo montante peticionado considera exagerado.
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Dispensou-se a audiência prévia e proferiu-se despacho saneador que relegou para final a apreciação da exceção de caducidade.
Procedeu-se à indicação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova.
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Realizou-se o julgamento com observância do legal formalismo.
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No decurso do julgamento, por se ter suscitado, oficiosamente, a questão da legitimidade da autora para ação, sem se mostrar acompanhada do marido, determinou-se a junção da certidão de assento de casamento.
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A Autora veio requerer a intervenção principal provocada do marido da autora.
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Proferiu-se o seguinte despacho:
“Ilegitimidade processual/incidente de intervenção principal.
No decurso do julgamento, identificada que foi a testemunha CC, apurou-se
tratar-se do marido da autora.
À data não foi possível à testemunha especificar qual o regime de bens do casamento, ficando por esclarecer a data certa do casamento.
Além do mais, suscitou-se a questão o bem ser comum e, portanto, de a testemunha poder estar impedida de depor nessa qualidade por poder assumir a qualidade de parte.
Nesse contexto, levantou-se a questão da (i)legitimidade ativa.
A autora, por requerimento com a referência 12048872, exerceu o contraditório quanto à questão em apreço, junto assento de nascimento e deduziu incidente de intervenção provocada.
Notificadas para contraditório, as partes nada disseram.
Posto isto, de acordo com o assento de casamento n.º ... do ano de 2017, CC e AA casaram no dia 03/06/2016, sem convenção antenupcial.
Os autos versam sobre os defeitos de uma viatura adquirida pela autora no dia 14/07/2017 e os pedidos formulados nos autos os de condenação da ré a substituir o motor da viatura ou a pagar a reparação do motor e no pagamento de uma indemnização pela privação do uso do veículo, danos patrimoniais e morais.
Desta feita, temos que a autora e a testemunha estão casados no regime da comunhão de adquiridos – artigo 1717.º do C.C. -, pelo que o veículo é um bem comum – artigo 1724.º, alínea b) do C.C.
Seja pelo disposto no artigo 1678.º, n.º 2, alínea e) ou no n.º 3 do C.C., a autora assume-se como a administradora do veículo, podendo naturalmente levar a cabo atos de administração ordinária. Neste conceito se insere o ato de reparação da viatura e, portanto, a demanda judicial para reparação ou indemnização correspondente.
Ao invés do que se pode ter suposto inicialmente, cremos que não estamos perante um ato de disposição que exija a intervenção de ambos os membros do casal. Não se incluiu tão pouco no disposto no artigo 1682.º do C.C.
Simplificando, também não se verificam os pressupostos dos artigos 33.º e 34.º do C.P.C. Pelo exposto, julga-se improcedente, por não provada, a exceção dilatória de ilegitimidade processual ativa e julga-se improcedente a intervenção principal provocada. Sem custas, atenta a simplicidade da questão em apreço. Notifique”.
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Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:
“Pelo exposto, decide julgar-se:
• Totalmente improcedente, por não provada, a exceção da caducidade;
• Parcialmente procedente a presente ação declarativa comum, por provada nessa medida, e consequentemente condenar apenas a ré “A..., Lda.” a:
o Substituir o motor do veículo com a matrícula ..-BL-..;
o Pagar à autora AA a quantia de 35,00€ (trinta e cinco euros) por cada dia de privação de uso do mencionado veículo, desde o dia 27/05/2018;
o Pagar à autora AA a indemnização de 3.000,00€ (três mil euros), a título de danos não patrimoniais. Custas pelas partes, na proporção do decaimento e vencimento da ação (artigos 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, assim como artigo 6.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais)”.
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A Ré A..., Lda veio interpor recurso da sentença.
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Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões: A) Na sua contestação a Apelante alegou que os danos que foram detetados no motor da viatura "Audi ...", e que levaram à sua imobilização em Maio de 2018, foram causados, ou no mínimo agravados, por uma conduta negligente ou culposa da Apelada, que não obstante os vários alertas e avisos que foi tendo no sentido de que a viatura devia deixar de circular, continuou a com ela circular de forma intensiva. B) Ora, esta questão foi colocada à apreciação do Tribunal a quo e, a ser analisada, poderia ilibar a Apelante da responsabilidade pela reparação das anomalias que foram detetadas pelos senhores peritos na viatura; C) Acontece que , porém a Sentença recorrida omite a sua apreciação, enfermando, por isso, de nulidade por omissão de pronúncia estabelecida na alínea d) do n.º 1 do art. 668 do CPC, que aqui expressamente se invoca e cuja declaração de requer; D) O depoimento testemunhal prestado pelo marido da A., CC, e igualmente proprietário da viatura em causa dos presentes autos, não poderá deixar de ser visto e valorado como um verdadeiro depoimento de parte que é; E) As suas declarações testemunhais, na medida em que estamos perante declarações de uma parte diretamente interessada no ganho da causa, devem ser consideradas insuficientes para a boa decisão da causa e apenas devem ser valoradas como princípio de prova, somente aptas a auxiliar a prova de um facto quando corroboradas por outros elementos probatórios; F) A Apelante entende que a matéria de facto que consta dos pontos 3), 4), 5), 6), 9), 10), 17), 27) 28) e 29) dos Factos Provados, bem como dos pontos XV. e XVI. dos Factos Não Provados resulta de errada apreciação da prova produzida, não traduzindo uma ponderada e prudente valoração da prova pericial, dos depoimentos das testemunha e dos documentos juntos aos autos, assim como entende que para a boa decisão da causa deve ser alargado o leque dos factos incluídos a matéria de facto que foi dada como provada na douta Sentença recorrida; Assim, G) Na medida em que resulta evidente da prova produzida que quer a concretização da venda quer a entrega do "Audi ..." ocorreram em 14/07/2022, o ponto 3) deve ser eliminado do elenco dos factos provados. H) Não existindo nos autos qualquer elemento de prova que sustente a alegação da A. de que "O gerente da ré assegurou à autora que aquele veículo havia sido submetido a uma rigorosa inspeção e que se encontrava em perfeitas condições de funcionamento" deve a factualidade constante do ponto 4) ser retirada do elenco dos factos provados; I) Tendo a matéria de facto dada como provada nos pontos 5) e 6) resultado provada apenas com base no testemunho do marido da autora, CC e não se encontrando tal depoimento corroborado por qualquer outro meio de prova, não se deve ter como provada a factualidade constante desses pontos 5) e 6); J) Tendo parte da factualidade constante do ponto 9) dos factos provados como único suporte probatório o depoimento prestado pelo marido da autora, deve a respetiva redação ser alterada e passar a ser a seguinte: 9) Nesse dia 23 de Novembro a autora, através de seu marido, entrou em contacto com o gerente da ré, reclamando do funcionamento da viatura; K) Na redação do ponto 10) da matéria de facto provada a expressão "a ser reparada" deve ser substituída por " a aguardar reparação " e deve ser expurgada a expressão "face aos problemas que foram aí detetados de avaria no motor; L) Não estando demonstrado que tenha existido qualquer comunicação à R. feita pela A., por si, pelo seu marido ou pelo seu advogado, após 24 de Novembro de 2017, deve ser alterada a redação desse ponto 17) dos factos provados passando a mesma a ter a seguinte redação: 17) A viatura encontra-se parada desde 27 de maio de 2018, M) Salvo melhor opinião, o que se encontra dado como provado nos pontos 27) e 28) dos factos provados incorpora afirmações genéricas e conclusivas que integram uma valoração de factos pelo que, atento o disposto n.º 4 do art.º 607.º do CPC, devem tais pontos da matéria de facto ser eliminados; N) Deve ser alterada a redação do ponto 29) dos factos provados passando o mesmo a ter a seguinte redação: 29) A ré refere expressamente também ter ficado com uma viatura com problemas sem deles ter reclamado; O) A apelada entende em face da prova produzida nos autos a matéria constante dos pontos XV., XVI., dos factos não provados devem ser dados como provados dados como provados., pelo que deverá ser alterada a redação dos pontos 36) e 37) dos factos provados, passando os mesmos a ter a seguinte redação: 36) A ré procedeu à instalação de um novo turbo completo (corpo + acessórios), à substituição das velas incandescentes, mudou o óleo do motor e substituiu os filtros do óleo, do combustível, do ar e do habitáculo; 37) Após o que, no dia 14/07/2017, o "Audi ..." foi submetido a um novo teste de diagnóstico que não detetou a existência de qualquer anomalia P) Assim, deve aditado ao elenco dos factos provados, um ponto 8-A) com a seguinte redação: 8-A) Barulho provocado por uma correia que desfiou e batia no compartimento do motor; Q) Nos termos do artigo 497º do Código de Processo Civil, estão impedidos de depor como testemunhas os que podem depor como partes. R) Formalmente o marido da A. não assumiu a posição de parte no processo, todavia à razões para a R. crer que não o terá feito intencionalmente com o objeto de poder prestar depoimento como testemunha e dessa forma poder contribuir para o ganho de causa da A.; S) Permitir que, como é o caso dos autos, alguém que tem interesse direto no ganho da causa possa ter a faculdade de não assumir a veste de parte no processo e vir a ser apresentado em juízo como testemunha (diretamente interessada no desfecho da causa) constituiria uma verdadeira fraude à lei, ou seja ao disposto no artº. 496º que impede que possam depor como testemunhas os que podem depor como partes. T) Afigura-se pois à R. que o depoimento, como testemunha, do marido da A. deve ser declarado inválido por violação do disposto no artigo 497º do CPC. U) Da factualidade constante dos pontos 5, 7, 8 9, e 10 dos factos provados resulta que, logo em Julho de 2017 a R. detetou que a luz do óleo acendia e apagava, e que de Julho a Novembro desse ano a luz do óleo continuou a acender e a apagar. V) E que só em 23 de novembro, verbalmente por intermédio do seu marido, e no dia 24 desse mês, por escrito por intermédio do seu advogado, é que a A. entrou em contato com a R. reportando a existência de problemas na "Audi ..."; W) Ou seja, só mais de 120 dias depois de ter tido conhecimento da existência dessa desconformidade na "Audi ..." (luz do óleo que acendia e apagava) é que A. a denunciou à R. X) Sendo pois evidente, que foi largamente ultrapassado o prazo que, nos termos do art. 5º-A nº 2 do Decreto-Lei nº 67/2003, a A. dispunha para, a contar da data em que detetou a referida irregularidade, a denunciar à R., devendo por isso ser julgada procedente a exceção de caducidade arguida pela R.. Y) No entender da R., no caso dos presentes autos resulta evidente da prova produzida que os danos existentes no motor da viatura "Audi ..." e que constam do relatório pericial, a saber: cambota danificada, capas das bielas partidas, viela partida e presa no bloco do motor; almofadas da corrente de distribuição partidas, turbo com folgas, não resultam de qualquer desconformidade que essa viatura tivesse na data em que lhe foi entregue, sendo antes imputáveis à A, por falta de diligência e de cuidado na utilização da mesma. Z) O motor do "Audi ..." só ficou no estado retratado no relatório dos senhores peritos, porque a A. tendo conhecimento, desde Julho de 2017, que no tabelier da viatura acendia a luz vermelha do óleo, situação que era recorrente e se manteve pelo menos até Novembro de 2017, ainda assim não se inibiu de com ele circular intensivamente percorrendo com ele, nessas condições, cerca de 28.000 kms. AA) Quando era legitimo supor que A. aproveita-se essa ida à oficina da viatura em 23 de Novembro de 2017 para se inteirar do que é que poderia estar a causar o acendimento da luz do óleo - o que qualquer pessoa minimamente prudente faria - a A. limitou-se mandar substituir a correia danificada e a fazer uma revisão geral à viatura, não tendo sequer reportado ao mecânico em causa, no caso a testemunha DD, a situação do acendimento da luz do óleo; BB) E, quando a viatura lhe foi entregue, e não obstante o mecânico em causa ter alertado a A. para um ruido anormal no motor, a R. voltou a utilizar a viatura normalmente como se não existissem evidentes sinais de que algo não estaria bem; CC) A A. continuou circular normalmente com a viatura por mais 5 meses ignorando os sinais de alerta que a viatura lhe dava, até que 27 de maio de 2018 e de forma previsível, partiu o motor do "Audi ...". DD) Daí que, os danos que o motor do "Audi ..." presentemente apresenta são fruto da conduta negligente da A., danos que poderiam ter sido evitados, bastando que para o efeito a A. tivesse feito que o comum dos mortais faria perante os repetidos acendimentos da luz vermelha do óleo, ou seja ter levado a viatura a uma oficina e submete-la um teste de diagnóstico que se detetasse a causa desses acendimentos. EE) E mesmo que uma vez detetado qual o problema e como o resolver, a A. entendesse não dever suportar a sua reparação, por achar que deveria ser a R. a o fazer, ainda assim deveria abster-se de circular com a viatura para evitar que o respetivo motor viesse a ter o desfecho que veio a ter. FF) Os danos no motor do "Audi ..." foram originados pelo uso incorreto e negligente que a A. deu a essa viatura no período de Julho de 2017 a Maio de 2018 e não devido a uma qualquer putativa desconformidade que a viatura enfermasse quando lhe foi entregue pela R., pelo que apenas a A. deve ser responsável pela reparação desses danos; GG) A título de ressarcimento do dano proveniente da privação do uso do veículo "Audi ..." a sentença recorrida entender condenar a R. a pagar à A a quantia de 35,00 € por cada dia de privação de uso do mencionado veículo, desde o dia 27/05/2018; HH) Fazendo apelo a critérios de equidade, razoabilidade, proporção e adequação às circunstâncias concretas e na esteira da maioria da jurisprudência deve tal valor fixado em montante não superior a € 10,00 diários, o qual é proporcionado e não ultrapassa os limites da justiça equitativa. II) Deve-se considerar que, no que respeita ao danos não patrimoniais peticionados pela A., apenas resulta provado que ela sofreu meras contrariedades e incómodos que não justificam a atribuição de indemnização a título de danos não patrimoniais; JJ) É orientação já consolidada na jurisprudência aquela segundo a qual as meras contrariedades e incómodos não justificam, por falta da necessária gravidade, a atribuição de indemnização a título de danos não patrimoniais; KK) No caso em apreço, e salvo melhor opinião, as contrariedades, os incómodos, a desilusão e receios que a apelada possa ter sentido não assumem tal gravidade que justifique que lhe seja atribuída uma indemnização. LL) Ao decidir de forma diferente a sentença recorrida violou o disposto no art. 496º, nº 1 do C. Civil. MM) Mas, caso V. Exas assim não o entendam, afigura-se desproporcionado e não razoável fixar em € 3.000 o montante da indemnização por danos não patrimoniais que lhe será devido. NN) Pelo que dentro de parâmetros de razoabilidade, adequação e justa proporção deve o montante a pagar à Apelante a título de indemnização pelos danos não patrimoniais ser reduzido para um montante não superior a € 1.000.
Termina por pedir que se julgue procedente o recurso e, em consequência, a revogação da sentença recorrida.
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A Autora veio apresentar resposta ao recurso, concluindo no sentido de não merecer censura a sentença recorrida.
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Sobre a nulidade suscitada na apelação proferiu-se o seguinte despacho:
“Em sede de saneamento dos autos, foram fixados os temas da prova que se enunciam: 1) Aferir da data de conclusão do contrato firmado entre autora e a ré A... e da data de entrega da viatura; 2) Aferir do concreto estado da viatura na data em que a mesma foi entregue pela ré A... à autora; 3) Aferir da data de percepção pela autora de problemas de funcionamento da viatura e; 4) …da data da comunicação à ré A... da existência desses problemas; 5) Aferir da natureza e características dos problemas de funcionamento da viatura; 6) Saber da imputada renúncia à garantia de bom funcionamento da viatura por parte da autora; e 7) Da ausência de reparação pela ré A... dos problemas comunicados pela autora.
Na sentença proferida são elencados como provados e não provados os factos que se consideraram “com relevo para a decisão final”. Afastaram-se, portanto, as alegações e referências que não assumiam relevo para prolação da sentença, assim como as conclusões e matéria de direito.
A apreciação da prova é feita no contexto mencionado e globalmente, sem prejuízo de uma apreciação mais detalhada em relação a este ou aquele aspeto, não se vislumbrando, salvo melhor opinião, qualquer omissão de pronúncia. Pelo exposto, indefere-se a arguida nulidade de omissão de pronúncia, sustentando-se a sentença proferida”.
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O recurso foi admitido como recurso de apelação.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Fundamentação 1. Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 639º do CPC.
As questões a decidir:
- nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 d) CPC;
- nulidade processual por se admitir a depor como testemunha o marido da autora e intempestividade do recurso, quanto a tal questão;
- reapreciação da decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova e omissão de factos relevantes para a decisão do mérito;
- caducidade do direito da autora;
- da imputação da responsabilidade à autora, pelo defeito no veículo;
- se a indemnização arbitrada a título de privação de uso e danos não patrimoniais se mostra justa a adequada para ressarcir e compensar os danos sofridos.
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2.Os factos
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância: 1) A ré tem como objeto social a compra, venda e aluguer de veículos automóveis de todo o tipo e classe e de maquinaria pesada; 2) No âmbito do objeto social daquela, a ré vendeu à autora, a 14 de Julho de 2017, um veículo automóvel da marca Audi, modelo ..., com a matrícula ..-BL-.., pelo preço de 22.500,00€, liquidado da seguinte forma:
a. Entrega de um veículo automóvel da marca Volkswagen, tendo as partes fixado o seu valor em 6.000€;
b. 1.500,00€ em dinheiro;
c. 15.000€ mediante empréstimo bancário; 3) Não obstante o negócio ter ficado concluído no mês de Junho, em dia não concretamente apurado, a viatura só foi entregue a 22 de Julho, em virtude de problemas no turbo; 4) O gerente da ré assegurou à autora que aquele veículo havia sido submetido a uma rigorosa inspeção e que se encontrava em perfeitas condições de funcionamento; 5) Logo no dia 22/07/2022, durante a viagem, a luz do óleo acendia e apagava e o G.P.S. não estava a funcionar; 6) A autora entrou, de imediato, em contacto com a ré, na pessoa do seu gerente, BB, que lhe disse que havia verificado os níveis do óleo e que isso podia acontecer por ter óleo a menos, ou a mais, situação normal, segundo ele; 7) De Julho a Novembro a luz do óleo continuou a acender e a apagar forçando, por isso, a autora a, diariamente, verificar os níveis para assegurar que não haveria consequências mais graves; 8) No dia 23 de Novembro, a autora apercebeu-se de um barulho anormal que a levou a chamar um reboque; 9) A autora, através de seu marido, entrou em contacto com o gerente da ré, solicitando-lhe que a viatura fosse deixada nas suas instalações, para análise e reparação, ao que o último respondeu que não, dado que a autora tinha assinado um documento em que prescindia da garantia e que, além disso, da própria fatura constava a indicação de que o veículo havia sido vendido no estado em que se encontrava, descartando, dessa forma, a sua responsabilidade; 10) Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante aproximadamente um mês a ser reparada, tendo a autora informado a ré da situação daquele automóvel através de email enviado pelo seu advogado, face aos problemas que foram aí detetados de avaria no motor, datado de 24/11/2017, cujo teor se dá integralmente por reproduzido; 11) Por esse motivo, a oficina procedeu apenas à reparação dos problemas mais prementes; 12) A 11 de Dezembro, a ré, na pessoa do seu gerente, enviou, via email, à autora, o documento onde esta, alegadamente, renunciava à garantia; 13) No dia 18 de Dezembro de 2017, a viatura foi entregue à autora, tendo esta sido alertada, pelo mecânico que procedeu à reparação, para a existência de ruído nas “tuches”, nas correntes; 14) Aquele referiu também que a resolução de todos os problemas do veículo acarretaria custos extraordinariamente elevados, conforme por si declarado que “a viatura se encontrava em elevado estado de degradação”, propondo à autora, numa primeira fase, que “reparasse as avarias mais evidentes porque para uma reparação mais profunda teria que a desmontar quase na sua totalidade e que ao fazê-la teria que substituir todos os órgãos da viatura”; 15) No dia 27 de Março de 2018, o carro foi, novamente, rebocado para a referida oficina, o mesmo sucedendo a 16 de Maio; 16) Cenário idêntico no dia 27 de Maio, data em que o veículo parou na autoestrada entre Coimbra e a Figueira da Foz, e em que teve de ser a autora a suportar os custos, em virtude de a assistência em viagem já não cobrir o respetivo serviço, ponderando o número de vezes do recurso ao mesmo; 17) A viatura encontra-se parada desde então, não obstante a ré ter sido avisada da sua imobilização e dos problemas que o mesmo acusava, quer verbalmente, quer por escrito, não tendo encetado qualquer diligência no sentido da reparação do veículo, razão pela qual o mesmo permanece imobilizado, o que está a causar graves danos à autora; 18) Do relatório pericial junto a folhas 580 a 582, cujo teor se tem integralmente por reproduzido consta que:
“(…) 7. Que anomalias a viatura apresenta e a que nível? Após o motor ter sido retirado no interior do veículo e ter sido desmontado, constatamos que este apresenta um conjunto de anomalias a saber:
-Cambota danificada.
-Capas das bielas partidas;
-Biela partida e presa no bloco do motor;
-Almofadas da corrente de distribuição partidas.
-Turbo com folgas.
-Sub Carter partido.
-Bomba de óleo avariada.
-Estas anomalias são ao nível do motor, sendo desconhecido o estado em que se encontram os periféricos, até devido ai tempo de imobilização do veículo.
8. Estas anomalias podem ser reparadas ou implicam a substituição de componentes essenciais? No caso afirmativo quais?
As anomalias detetadas no motor provocam com que o mesmo não tenha viabilidade de reparação. Assim, é opinião do proprietário da oficina que procedeu à desmontagem do veículo, Sr. EE, que a substituição das peças daria origem a um sem número de problemas no futuro, devido ao aquecimento a que o bloco do motor esteve sujeito, com folgas a diversos níveis irreparáveis, opinião que os três peritos subscrevem.
Assim, optou-se pela substituição por um motor da Audi reconstruído com garantia da marca e da oficina instaladora.
9. Qual o seu custo?
A empresa que efetuou a desmontagem do veículo da A. (…) apresentou-nos um orçamento que prevê a substituição do motor do veículo por um motor da marca reconstruído com garantia da marca e com garantia da oficina instaladora. (…) bem como a colocação dos filtros e óleos, turbo novo bem como a bomba da água, entre outros, de forma a permitir o seu normal funcionamento.
Não está prevista qualquer substituição dos periféricos dado que os mesmos não interferiram diretamente na avaria do motor do veículo.
O Custo total do orçamento da D... é de 16.809,91€ estando já contemplado o valor do I.V.A. correspondente.
10. Quais as consequências dessa reparação não ser levada a cabo?
As consequências a reparação não ser levada a cabo prendem-se com a imobilização definitiva do veículo”; 19) A autora, viu-se esta forçada, durante todo esse período, a pedir uma viatura emprestada por diversas ocasiões e a beneficiar de “boleias” de amigos e familiares, dado que a sua atividade profissional, gerente de uma empresa, não lhe permite ficar sem transporte; 20) A autora trabalha em Coimbra mas reside em Anadia, tendo de deslocar-se, várias vezes por dia, entre essas localidades; 21) Neste momento e dado que desconhece quanto tempo mais irá a sua viatura ficar imobilizada, está sem transporte próprio; 22) Tem de ficar, algumas vezes, com a viatura da empresa; 23) Na sua vida pessoal, a situação retratada impede a autora de fazer as compras para o agregado familiar, levar os filhos para a escola e atividades conexas, exercer a sua actividade profissional e deslocar-se normalmente, como sempre fez, sair aos fins de semana, o que era usual e necessário; 24) Ir de férias pois, por serem uma família numerosa, seis pessoas, a viatura adquirida à ré era a única que respondia às necessidades da família; 25) Visitar o filho, que se encontra a estudar em Lisboa; 26) A factualidade supra explanada e o facto de não poder utilizar o veículo como sempre que lhe aprouvesse geraram desgaste físico e mental, como, dores de cabeça e cansaço; 27) O acima descrito ficou a dever-se, em exclusivo, à atuação da ré; 28) A ré conhecia, por não poder desconhecer, os problemas de que a viatura padecia e, mesmo assim, vendeu-a à autora, alegando estar aquela em perfeitas condições; 29) A ré refere expressamente também ter ficado com uma viatura com problemas sem deles ter reclamado, tendo-se negado, face à reclamação da autora, a proceder à reparação da viatura objeto da presente; 30) No email junto sob como documento 4, a ré refere que a sua “empresa era de construção civil e não um stand aberto ao público para vendas, por isso mesmo fiquei com o vosso carro cujo também me deu problemas e que não pedi satisfações do mesmo, com as mesmas condições que a senhora ficou com o jipe.”; 31) O gerente da ré foi levantar o "Audi ..." a Lisboa e verificou então que, apesar da sua condução não se detetar qualquer anormalidade, o painel de controle trazia acesa uma luz amarela; 32) E dando-lhe igualmente conhecimento da existência da supra referida luz amarela; 33) Mais informou a autora de que, caso pretendesse ficar com a viatura, iria submete-la um teste de diagnóstico para se aferir qual o problema que poderia existir e que as eventuais anomalias seriam reparadas; 34) Depois de verificar e experimentar o "Audi ...", a autora manifestou interesse em o adquirir, afirmando que primeiramente tinha de solicitar um empréstimo para pagamento do respetivo preço; 35) No dia 11/07/2017, o gerente da ré fez submeter o "Audi ..." a um teste de diagnóstico eletrónico o qual detetou a necessidade de substituição de três velas incandescentes e também a existência de um problema no circuito de controle de sobrealimentação do turbo; 36) A ré mudou o óleo do motor e substituiu os filtros do óleo, do combustível, do ar e do habitáculo; 37) Após o que, no dia 14/07/2017, o "Audi ..." foi submetido a um novo teste de diagnóstico; 38) Nesse mesmo dia 14/07/2017, a autora apresentou-se no armazém da ré deixando aí o Volkswagen ..., e seguindo, na companhia do gerente da ré, seguido para a oficina onde se encontrava o "Audi ..."; 39) A autora saiu então da oficina ao volante do mesmo e andou a experimentá-lo o resto da tarde desse dia; 40) Seguidamente a autora e o marido foram jantar com gerente da ré e depois regressaram à Anadia com o "Audi ..."; 41) A autora não voltou a aparecer nas instalações da ré; 42) Em 14/07/2017, o veículo foi vendido com 215696 quilómetros e na a fatura da "Oficina de DD" datada de 16/07/2018, junta com a petição inicial, consta que o "Audi ..." apresentava então 243551 quilómetros; 43) A interveniente principal organiza leilões de veículos e equipamentos; 44) A interveniente principal dispõe de Título de Autorização para Exercício da Atividade Leiloeira, emitido nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 155/2015, de 10 de Agosto, pela Direção Geral das Atividades Económicas; 45) No âmbito da sua atividade, a interveniente promove em leilão, a venda de viaturas, cuja propriedade é dos respetivos clientes vendedores, para que sejam vendidas ao licitador que fizer a melhor oferta; 46) Os veículos/equipamentos são colocados pelos clientes/vendedores nas instalações da interveniente principal para serem levados a leilão, sendo vendidos por conta e mandato dos clientes que aí os colocam; 47) Foi também assim neste caso; 48) Em 16 de Maio de 2017, o veículo ..-BL-.. foi colocado nas instalações da interveniente principal para ser para ser leiloado; 49) No dia do leilão, em 25 de Maio de 2017, a Chamada, na sua qualidade de empresa leiloeira, transmitiu aos participantes as informações relativas ao veículo que lhe foram prestadas pelo vendedor/cliente; 50) A participação nos leilões realizados pela Chamada é feita de acordo com as designadas "Condições Gerais de Compra e Venda de Viaturas Usadas em Leilão”, as quais são do conhecimento de todos os participantes que as aceitam aquando da sua inscrição; 51) A ré, como participante nos leilões da Chamada, conhece e aceitou as Condições Gerais aplicáveis; 52) Nos termos da cláusula 3.1.7. das referidas Condições Gerais “O vendedor deverá preencher a ficha de viatura com todas as informações nela solicitadas (…) O vendedor é o único responsável pela falsidade, incorreção ou omissão de quaisquer elementos da ficha de viatura, ou por quaisquer outras informações ou garantias prestadas.”; 53) A viatura objeto do presente processo foi leiloada no “Estado em que se encontra”; 54) Da alínea c) da Cláusula 6.2 das referidas Condições Gerais resulta que: “O comprador de uma viatura apresentada a leilão com a referência ‘no estado em que se encontra’ na respetiva ficha de viatura, assume o risco da compra da viatura nessas condições, não tendo direito a apresentar qualquer reclamação.” 55) No dia do leilão, em 25 de Maio de 2017, a referida viatura foi adquirida no leilão pela ré, tendo a interveniente principal emitido fatura à ré, pelos serviços prestados, enquanto empresa leiloeira, tendo-lhe cobrado os seguintes valores:
a. 474,78 € a título de “taxa de aquisição”;
b. 79,95 €, pela prestação do serviço de transferência de propriedade; 56) Após a realização do leilão, a Chamada entregou o veículo à ré, desconhecendo o que sucedeu com o veículo a partir dessa data;
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Com relevo para a decisão final, resultaram os seguintes factos não provados: I. No descrito em 3), exatamente no dia 26; II. Relativamente ao G.P.S., ficou de agendar um dia para analisar a situação, o que nunca aconteceu; III. Em 11), deixando os outros para reparação ulterior pois, a não ser assim, o custo seria mais elevado; IV. A autora assinou o documento a renunciar à garantia; V. No descrito em 13), bem como para o facto de a luz do óleo acender e piscar; VI. Só a substituição do motor por um usado ascenderia a 5.399,95€, acrescida do custo da mão-de-obra, no valor de, aproximadamente, 2.000,00€; VII. Está impedida de visitar clientes, o que se traduziu num decréscimo das vendas; VIII. No descrito em 20), em ...; IX. No descrito em 23), ficando, assim, o comercial impedido de a utilizar, bem como as restantes pessoas que aí trabalham; X. A autora vê-se, muitas vezes, obrigada a aguardar que algum familiar ou amigo a vá levar e ou buscar ao seu local de trabalho; XI. No descrito em 26), tonturas; XII. A autora despendeu em reboques e reparações exatamente a quantia de 1.869,76€; XIII. Ao que o gerente da ré a informou de que havia comprado num leilão um outro Audi ... mas que ainda nem sequer a vira; XIV. No descrito em 31) e 32), sinalizadora da existência de problema no motor; XV. Foi então efetuada a reparação dessas anomalias, tendo designadamente sido instalado um novo turbo completo (corpo + acessórios); XVI. No descrito em 37), cujo resultado não detetou a existência de qualquer anomalia; XVII. Sendo que nesse dia a autora não reclamou junto do gerente da ré a existência de qualquer problema no "Audi ..."; XVIII. A autora nunca reportou ao gerente da ré os episódios; XIX. Só em finais de Novembro de 2017 é que o gerente da ré recebeu uma chamada telefónica da autora; XX. Com exceção dessa chamada, a ré não recebeu qualquer outra chamada da autora; XXI. No decurso da qual a autora, não reportando nenhuma concreta avaria e ou deficiência, destratou o gerente da ré exigindo uma viatura nova.
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Consignou-se, ainda: As restantes alegações configuram conclusões e matéria de direito.
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3. O direito - Nulidade da sentença -
Nas conclusões de recurso sob as alíneas A) a C) a apelante suscita a nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 d) CPC. A omissão de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar ou o conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento constitui um dos fundamentos de nulidade da sentença, previsto art. 615º/1 d) CPC.
Resulta do regime previsto no art. 608º CPC que o juiz na sentença: deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
A respeito do conceito “questões que devesse apreciar” refere ANSELMO DE CASTRO que deve “ ser entendida em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das exceções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e ás controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado ás partes sob os aspetos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão”[2].
LEBRE DE FREITAS por sua vez tem a respeito de tal matéria uma visão algo distinta, pois considera que devendo: “ o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer ( art. 660º/2 ), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado”[3].
Para melhor precisar o seu entendimento remete para o estudo do Professor ALBERTO DOS REIS cuja passagem se transcreve:
“Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação “ não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (art. 511º/1), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 664º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas”[4].
Seguindo os ensinamentos dos ilustres Professores, atendendo ao regime processual vigente, afigura-se-nos ser esta a interpretação que melhor reflete a natureza da atividade do juiz na apreciação e decisão do mérito das questões que lhe são colocadas, pois o juiz não se encontra vinculado às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Resulta desta interpretação que a sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito.
A apelante refere que na contestação alegouque os danos que foram detetados no motor da viatura "Audi ...", e que levaram à sua imobilização em Maio de 2018, foram causados, ou no mínimo agravados, por uma conduta negligente ou culposa da apelada, que não obstante os vários alertas e avisos que foi tendo no sentido de que a viatura devia deixar de circular, continuou a com ela circular de forma intensiva.
Entende que a ser analisada tal questão, poderia ilibar a apelante da responsabilidade pela reparação das anomalias que foram detetadas pelos senhores peritos na viatura.
Cumpre, assim, apreciar se a sentença omitiu a apreciação de tal exceção.
Na sentença, enquadrou-se a responsabilidade da ré-apelante no regime da Venda de Bens de Consumo.
Estatui o art. 2º do Dec. Lei n.º 67/2003 de 08 de abril, quanto a conformidade com o contrato: “1 - O vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda. 2 - Presume-se que os bens de consumo não são conformes com o contrato se se verificar algum dos seguintes factos: a) Não serem conformes com a descrição que deles é feita pelo vendedor ou não possuírem as qualidades do bem que o vendedor tenha apresentado ao consumidor como amostra ou modelo; b) Não serem adequados ao uso específico para o qual o consumidor os destine e do qual tenha informado o vendedor quando celebrou o contrato e que o mesmo tenha aceitado; c) Não serem adequados às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo tipo; d) Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem. 3 - Não se considera existir falta de conformidade, na aceção do presente artigo, se, no momento em que for celebrado o contrato, o consumidor tiver conhecimento dessa falta de conformidade ou não puder razoavelmente ignorá-la ou se esta decorrer dos materiais fornecidos pelo consumidor.
Com a epígrafe “Entrega do bem”, dispõe o art. 3.º: 1 - O vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue. 2 - As faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respetivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade”.
O art. 2º, no seu n.º 2, veio consagrar um sistema de presunções ilidíveis de falta conformidade dos bens, destinadas a precisar o que é devido contratualmente na ausência ou insuficiência de cláusulas contratuais que fixem as características e qualidades da coisa a entregar ao consumidor.
Provado o facto que dê origem à presunção de desconformidade, terá o vendedor o ónus de provar o facto concreto, posterior à entrega, que gerou a falta de conformidade, designadamente a prova do mau uso ou do uso incorreto do bem pelo consumidor.
Para se ilibar da responsabilidade, incumbirá ao vendedor alegar e provar que a causa do mau funcionamento é posterior à entrega da coisa vendida e imputável ao comprador, designadamente por falta de diligência ou violação de deveres de cuidado.
Por outro lado, de acordo com o n.º 3º do dito artigo 2º a falta de conformidade existente não pode ser oposta ao vendedor pelo comprador se, no momento em que for celebrado o contrato, este tiver conhecimento dela ou não puder razoavelmente ignorá-la.
Considera a apelante que a sua defesa se enquadra na previsão do art. 2º/2 do citado diploma e que sobre tal matéria não se pronunciou a sentença.
Entendemos, porém, que na sentença se apreciaram as exceções suscitadas pela ré e que consistiram na alegada renúncia pela autora ao prazo de garantia, a caducidade do direito da autora e ainda, a comunicação das avarias e o seu conhecimento pela ré e foi nesta sede que se apreciou da diligência da autora, concluindo-se que a ré não ilidiu a presunção do art. 2º/2 do citado diploma.
É certo que a ré alegou que entre 14 de julho de 2027 e 27 de maio de 2018 o veículo andou 27.855 kms e que dos documentos juntos pela autora não resulta que no veículo existisse uma avaria que remontasse a 14 de julho de 2017, bem como, face ao quadro descrito pela autora em vez de se abster de circular com o veículo, continuou a utilizar de forma intensiva, agravando dessa forma os problemas que a mesma pudesse apresentar e contribuindo então, de forma decisiva, para sua alegada definitiva imobilização Maio de 2018.
Esta via de argumentação assenta em conclusões que não factos, para além de não se ter provado em toda a extensão os factos alegados e por isso, não justificaria a sua apreciação, porque nos termos do art. 607º/4 o juiz assenta os fundamentos da decisão na “matéria de facto adquirida”. Acresce que o juiz não está vinculado às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 5º CPC) e no caso concreto foram apreciadas as questões suscitadas na defesa da ré.
Questão diferente consiste em saber se foi feita uma correta aplicação do direito aos factos, questão que se prende com o julgamento do mérito da causa e não com questões formais de regularidade da sentença.
Conclui-se, assim, que a sentença não padece do vício apontado e os fundamentos alegados não preenchem a invocada nulidade.
Improcedem as conclusões de recurso, sob as alíneas A) a C), revelando-se a sentença válida e regular.
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- Nulidade processual -
Nas alíneas Q) a T) das conclusões de recurso considera a apelante que o depoimento do marido da ré como testemunha deve ser declarado inválido por violação do disposto no art. 497º CPC.
Resulta da análise dos autos que CC foi indicado como testemunha pela autora e assim depôs na sessão de julgamento do dia 07 de outubro de 2021 e 15 de março de 2022 (cfr. atas inseridas a página 494 e 358 do processo eletrónico sistema Citius), depois de se identificar como marido da autora, sem se ter suscitado qualquer controvérsia, quanto à sua capacidade para depor como testemunha.
Oficiosamente, suscitou o juiz a questão da legitimidade ativa da autora, por estar desacompanhada do marido, questão que foi decidida por despacho (inserido a páginas 437 do processo eletrónico sistema Citius) e que transitou em julgado, como se dá nota no relatório.
Está em causa apurar se podia ser admitido a depor como testemunha o marido da autora, por ter interesse na causa e poder assumir a veste de parte no processo.
A prática de um ato que a lei não permite configura uma nulidade processual.
As nulidades processuais “[…] são quaisquer desvios do formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidade mais ou menos extensa de aspetos processuais”[5].
Atento o disposto nos art. 195º e seg. CPC, as nulidades processuais podem consistir na prática de um ato proibido, omissão de um ato prescrito na lei ou realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido.
Porém, como referia o Professor ALBERTO DOS REIS há nulidades principais e nulidades secundárias, que presentemente a lei qualifica como “irregularidades”, sendo o seu regime diverso quanto à invocação e quanto aos efeitos[6].
As nulidades principais estão previstas, taxativamente, nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC e por sua vez as irregularidades estão incluídas na previsão geral do art. 195º CPC e cujo regime de arguição está sujeito ao disposto no art. 199º CPC.
O depoimento como testemunha de alguém que deveria depor como parte não constitui uma nulidade principal, pois não consta do elenco das nulidades previstas nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC.
Representa, pois, a prática de um ato que a lei não admita, que cai na previsão do art. 195º CPC e por isso, configura uma irregularidade que só determina a nulidade do processado subsequente se influir no exame e decisão da causa, estando o seu conhecimento dependente da arguição, nos termos previsto no art. 199º CPC.
A lei não fornece uma definição do que se deve entender por “irregularidade que possa influir no exame e decisão da causa”.
No sentido de interpretar o conceito ALBERTO DOS REIS tecia as seguintes considerações:“[o]s actos de processo têem uma finalidade inegável: assegurar a justa decisão da causa; e como a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida, segue-se que o fim geral que se tem em vista com a regulação e organização dos actos de processo está satisfeito se as diligências, actos e formalidades que se praticaram garantem a instrução, a discussão e o julgamento regular do pleito; pelo contrário, o referido fim mostrar-se-á prejudicado se se praticaram ou omitiram actos ou deixaram de observar-se formalidades que comprometem o conhecimento regular da causa e portanto a instrução, a discussão ou o julgamento dela”[7].
Daqui decorre que uma irregularidade pode influir no exame e decisão da causa, se comprometer o conhecimento da causa, a instrução, discussão e julgamento.
Tal omissão tinha de ser arguida logo que conhecida, e no prazo previsto no art. 149º/1 CPC, ou seja, na sessão de julgamento em que a testemunha se identificou como marido da autora. Não sendo suscitada considera-se sanada.
O recurso de apelação não constitui o meio processual próprio para conhecer das infrações às regras do processo quando a parte interessada não arguiu a nulidade perante o tribunal onde aquela alegadamente ocorreu, conforme resulta do regime previsto nos art. 196º a 199º CPC.
Improcedem, nesta parte, as conclusões de recurso sob as alíneas Q) a T).
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- Reapreciação da decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova, e omissão de pronúncia sobre factos relevantes para a apreciação do mérito da causa -
Nas conclusões de recurso, sob as alíneas D) a P), a apelante veio requerer a reapreciação da decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova, bem como, a ampliação da decisão de facto.
Passando à apreciação da ampliação da decisão de facto.
Considera a apelante, sob a alínea P), que deve ser aditado um facto ao enunciado dos factos provados, com a seguinte redação:
- 8-A Barulho provocado por uma correia que desfiou e batia no compartimento do motor.
Alega, na motivação do recurso, que o facto em causa decorre do depoimento da testemunha CC e DD.
Nos termos do art. 666º/2 c) CPC, mostrando-se indispensável ampliar a matéria de facto, deve o tribunal da Relação alterar a decisão da matéria de facto, se a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Não sendo possível fazer uso de tal faculdade, deve o tribunal anular a decisão.
A ampliação da matéria de facto mostra-se indispensável, quando se tenham omitido dos temas da prova factos alegados pelas partes que se revelam essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo juiz do tribunal “a quo”[8].
Os factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na ação ou na exceção.
Os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte.
Ambos integram a categoria de factos principais porque são necessários à procedência da ação ou exceção, por contraposição aos factos instrumentais, probatórios ou acessórios que são aqueles que indiciam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos[9].
Em conformidade com o critério legal, a ampliação da matéria de facto tem de ser indispensável, o que significa que cumpre atender às várias soluções plausíveis de direito, o enquadramento jurídico em face do objeto do recurso e ainda, com a possível intervenção e interpretação do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art. 682º/3 CPC.
No caso concreto, a apelante visa incluir nos factos provados matéria que não foi oportunamente alegada nos articulados, o que desde logo impede a ampliação, pois na decisão o juiz apenas pode considerar os factos alegados pelas partes (art. 5º CPC). Ainda que se considerasse um facto complementar, uma vez que a apelante não fez uso em sede de julgamento da faculdade concedida pelo art. 5º/2/b) CPC, não pode pretender agora aproveitar-se de tal facto. Acresce que a apelante não extai qualquer efeito útil da consideração de tal facto tendo presente o objeto da causa.
Conclui-se, que não ocorre omissão de pronúncia sobre factos relevantes para a apreciação do mérito, motivo pelo qual não se justifica a pretendida ampliação da decisão de facto.
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Cumpre reapreciar os factos, cuja decisão vem impugnada.
O art. 640º CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:
“1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na despectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. […]”
O presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova[10].
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar - delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso através da indicação da prova e quando tal implique a reapreciação da prova gravada a transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
A apelante impugna a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto a reapreciar – pontos 3, 4, 5, 6, 9, 10, 17, 27, 28, 29 dos factos provados e pontos XV e XVI dos factos julgados não provados -, bem como, indica a prova e ainda, a decisão alternativa que deve ser proferida.
Consideram-se, assim, preenchidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto.
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Nos termos do art. 662º/1 CPC a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto:
“[…]se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
A respeito da gravação da prova e sua reapreciação cumpre considerar, como refere ABRANTES GERALDES, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, “tem autonomia decisória”. Isto significa que deve fazer uma apreciação crítica das provas que motivaram a nova decisão especificando, tal como o tribunal de 1ª instância, os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador[11].
Nessa apreciação, cumpre ainda, ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais[12].
Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art. 396º CC e art. 607º/5, 1ª parte CPC.
Como bem ensinou ALBERTO DOS REIS: “[…] prova […] livre, quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei”[13].
Daí impor-se ao julgador o dever de fundamentação das respostas à matéria de facto – factos provados e factos não provados (art. 607º/4 CPC).
Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão.
É através dos fundamentos constantes do despacho em que se respondeu à matéria de facto que este Tribunal vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância[14].
Por outro lado, porque se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados[15].
Ponderando estes aspetos cumpre reapreciar a prova - documental, prova testemunhal e pericial -, face aos argumentos apresentados pela apelante, tendo presente o segmento da sentença que se pronunciou sobre a fundamentação da matéria de facto.
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- Pontos 3, 4, 5, 6, 9 dos factos provados -
A matéria dos pontos 3, 4, 5, 6, 9 dos factos provados reproduz o alegado pela autora nos art. 5º a 8º e 12º a 15º da petição, considerando-se provados os seguintes factos:
- 3) Não obstante o negócio ter ficado concluído no mês de Junho, em dia não concretamente apurado, a viatura só foi entregue a 22 de Julho, em virtude de problemas no turbo;
- 4) O gerente da ré assegurou à autora que aquele veículo havia sido submetido a uma rigorosa inspeção e que se encontrava em perfeitas condições de funcionamento;
- 5) Logo no dia 22/07/2022, durante a viagem, a luz do óleo acendia e apagava e o G.P.S. não estava a funcionar;
- 6) A autora entrou, de imediato, em contacto com a ré, na pessoa do seu gerente, BB, que lhe disse que havia verificado os níveis do óleo e que isso podia acontecer por ter óleo a menos, ou a mais, situação normal, segundo ele; - 9) A autora, através de seu marido, entrou em contacto com o gerente da ré, solicitando-lhe que a viatura fosse deixada nas suas instalações, para análise e reparação, ao que o último respondeu que não, dado que a autora tinha assinado um documento em que prescindia da garantia e que, além disso, da própria fatura constava a indicação de que o veículo havia sido vendido no estado em que se encontrava, descartando, dessa forma, a sua responsabilidade.
Em sede de fundamentação de facto teceram-se as seguintes considerações:
“A Convicção do Tribunal assentou na análise crítica e conjugada da prova produzida em julgamento e da prova documental junta aos autos, ponderando as regras da experiência comum. Os factos provados em 1) e 2) estão assentes por acordo. Acrescem os documentos 1 e 10 juntos com a petição inicial, o segundo que evidencia o objecto social da ré, apenas se transcrevendo a parte que releva a para os presentes autos.
A prova dos factos descritos de 3) a 9) e 30) assenta no testemunho de CC que, apesar de ser marido da autora e de poder ter um interesse direto na causa, apresentou um testemunho escorreito, sincero, verosímil e, portanto, verdadeiro. Tal revela-se na forma como se exprimiu, assim como na valoração dos testemunhos de DD, FF e GG, como se referirá adiante. No particular destes factos, tiveram-se em linha de conta os documentos 2, 3 e 4 juntos com a petição inicial”.
A apelante sugere a eliminação dos pontos 3, 4, 5, 6 e a alteração da decisão do ponto 9, no sentido de se julgar provado apenas: “Nesse dia 23 de novembro de 2017 a autora, através de seu marido, entrou em contacto com o gerente da ré, reclamando do funcionamento da viatura”.
Sustenta a alteração no acordo das partes expresso nos articulados e no depoimento das testemunhas HH e II.
Nas conclusões de recurso, sob as alíneas D) e E), a apelante começa por questionar o valor probatório do depoimento da testemunha CC, cujo depoimento, foi considerado para fundamentar os pontos 3 a 9 dos factos provados e objeto de impugnação.
Considera que sendo a testemunha marido da autora e integrando-se o veículo no património comum do casal, o seu depoimento não poderá deixar de ser valorado como depoimento de parte e por isso, as declarações prestadas apenas podem relevar se sustentadas noutros elementos de prova.
Da conjugação do art. 396º CC, com o art. 607/5º CPC, resulta que o depoimento testemunhal é livremente apreciado pelo tribunal e em confronto com os demais elementos de prova.
A livre apreciação da prova baseia-se na prudente convicção do tribunal sobre a prova produzida, ou seja, em regras da ciência e do raciocínio e em máximas de experiência. Estas podem conduzir à prova direta do facto controvertido ou à ilação desse facto através da prova de um facto indiciário: neste último caso, a prova fundamenta-se numa presunção natural ou judicial ( art. 351º CC )[16].
O simples facto de existir entre a testemunha indicada e a Autora uma relação familiar não desvaloriza o seu depoimento, nem pode, só por si, servir para questionar a credibilidade do depoimento da testemunha, pois a própria lei admite a depor como testemunha o respetivo cônjuge, face ao que dispõe o art. 497º/1/ c) CPC.
Acresce que resulta da ata de julgamento a advertência à testemunha que pelo facto de ser marido da autora podia recusar-se a depor, o que não ocorreu, sendo por isso ajuramentado como testemunha (art. 497º/2, 513º CPC).
O interesse da testemunha na discussão da causa, como refere a apelante, também não é só por si determinante, para retirar credibilidade ao depoimento.
A testemunha é um terceiro em face da relação jurídica processual, ainda que não perante a relação jurídica material ou os interesses que no processo se discutem[17].
Daqui se conclui, que o interesse na causa, só por si, não desvaloriza o depoimento da testemunha, nem impede a sua audição nessa qualidade. O interesse da testemunha na causa releva como um dos fatores a ter em conta na apreciação do seu depoimento.
Acresce que, contrariamente ao afirmado pela apelante, na fundamentação da decisão de facto não se atendeu apenas ao depoimento da testemunha CC, pois ponderou-se o depoimento das testemunhas: DD, FF e GG e os documentos 2, 3 e 4 juntos com a petição inicial e o relatório pericial.
Resta apurar se se verifica o apontado erro na apreciação da prova.
Sugere a apelante que se elimine o ponto 3 do elenco dos factos provados.
Está em causa apurar a data em que foi concluído o negócio e se procedeu à entrega do veículo à Autora.
Argumenta a apelante que a data da entrega do veículo está admitida por acordo nos articulados e a mesma corresponde ao dia 14 de julho de 2017 (nos artºs 22ª a 24ª da contestação e veio a ser admitida pela A. nos artºs 27º a 32º da sua resposta à contestação de 20/12/2018).
Efetivamente, apesar da autora na petição inicial alegar que o veículo lhe foi entregue em 22 de julho de 2017, vem na réplica, face à posição assumida pela ré na contestação, a admitir que a entrega ocorreu na mesma data em que entregou o VW ... à Ré[18], o que também resulta dos factos provados sob os pontos 37 a 40.
Estando admitido, por acordo nos articulados, a data em que foi entregue o veículo, não carece o mesmo de prova (art.574º/2, 410º, 607º/5 CPC).
Deve alterar-se a decisão passando a constar o dia 14 de julho de 2017, como data de entrega do veículo.
A restante prova produzida não permite comprovar que tenha ocorrido uma dilação na entrega por se encontrar na oficina para reparação do turbo.
A testemunha II afirmou que o veículo esteve na oficina para proceder a uma intervenção no turbo, mas daqui não decorre que tal circunstância motivou um atraso na entrega do veículo, até porque a testemunha nada referiu sobre tal matéria.
Resta, por fim, referir que as testemunhas CC e HH vieram depor no sentido de considerar que os termos do contrato ficaram definidos em junho de 2017, o que é corroborado pelos documentos juntos com a petição e que respeitam à proposta de crédito para aquisição do veículo com data de 20 de junho de 2017.
Resta, pois, dar como assente que apesar do acordado em junho de 2017 quanto aos termos do contrato a entrega ocorre em 14 de julho de 2017.
Altera-se a decisão do ponto 3, que passa a ter a seguinte redação:
- Os termos do acordo de compra e venda ficaram estabelecidos em junho de 2017 e a entrega do veículo ocorreu em 14 de julho de 2017.
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Considera a apelante que na fundamentação do ponto 4, se tomou em consideração na sentença o depoimento da testemunha CC, mas o seu depoimento não permite comprovar tal facto, porque nada referiu nesse sentido. A testemunha limitou-se a referir: “quando fez o teste drive ao “Audi ...” houve um problema na carrinha (acendeu uma luz amarela) que cortava a velocidade e que o gerente da R. lhe disse que iria resolver, que iria trocar a peça (turbo)”.
Apreciado o depoimento confirma-se o excerto transcrito. Porém, a testemunha também referiu que “o sr. BB lhe disse que fez uma revisão à carrinha”.
A testemunha HH, filho do sócio gerente da ré referiu também que mandou fazer uma limpeza ao veículo, ainda em Lisboa (“deu indicações ao JJ”) e mandou depois fazer uma revisão de filtros, óleos e anilhas, para além de substituir o turbo na oficina de II.
É forçoso concluir que as intervenções tinham como objetivo garantir o bom funcionamento do veículo e que era do conhecimento da ré que o mesmo apresentava anomalias, motivo pelo qual não se justifica alterar a decisão.
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Em relação aos pontos 5 e 6 defende que não estando o depoimento da testemunha CC corroborado por qualquer outra prova não se pode julgar provada tal matéria.
Do depoimento da testemunha CC resulta comprovado o alegado, com exceção da data, que não é 22 de julho, mas 14 de julho de 2017. Aliás, a testemunha esclareceu que entre a data da entrega e novembro de 2017 fez duas reclamações, por telefone, junto da ré, porque uma luz vermelha acendia no painel do veículo e recebeu sempre a mesma resposta do sr. BB – “verifique o nível do óleo”.
O depoimento foi comprovado por prova testemunhal e pericial, como já se referiu. As testemunhas FF e GG, apesar de não assistirem às reclamações tomaram conhecimento dos problemas com o funcionamento do veículo e referiram que desde que o veículo foi adquirido as queixas quanto ao mau funcionamento eram constantes. A perícia ao veículo vem comprovar a extensão das deficiências tornando plausível que o veículo emitisse sinais de alerta.
Desta forma, mantêm-se a decisão de facto, quanto aos pontos 5 e 6.
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Em relação ao ponto 9 dos factos provados o depoimento da testemunha CC, HH e DD, juntamente com o documento junto com a petição (doc. nº 4, inserido a páginas 1809-1810 do processo eletrónico sistema Citius) apenas permite confirmar a decisão.
Como referiu a testemunha CC, em novembro de 2017 perante nova avaria do veículo e transporte em reboque, contatou o sr. BB para recolher o veículo e proceder à reparação, o que foi recusado por este e determinou a entrada do veículo na oficina que pertence à testemunha DD, o que foi confirmado por esta testemunha. Posteriormente, perante as insistência da autora e do seu advogado, o sócio gerente da ré recusou a reparação do veículo invocando a renúncia, por parte da autora, ao período de garantia, como decorre do documento nº4, junto com a petição.
A testemunha HH confirmou que a autora telefonou em diferentes ocasiões, sendo que numa delas solicitava um automóvel novo, mas sem dar qualquer explicação para tal pretensão.
Decorre do depoimento que a autora telefonou ao sócio gerente da ré e reclamou. Quanto à alegada pretensão da autora (“veículo novo”), não foi produzida prova que corroborasse tal pretensão.
A conversa telefónica referenciada no ponto 9 dos factos provados está comprovada com o depoimento da testemunha CC, o qual se mostra credível, perante todo o enquadramento em que a mesma decorreu, antes e após, tal conversa, pois a ré manteve sempre uma postura de recusa em assumir a reparação.
Mantém-se a decisão do ponto 9 dos factos provados.
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- Pontos 10 e 17 dos factos provados -
Os pontos 10 e 17 dos factos provados reproduzem a matéria dos art. 16º e 28º a 31º da petição, considerando-se provado:
- 10) Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante aproximadamente um mês a ser reparada, tendo a autora informado a ré da situação daquele automóvel através de email enviado pelo seu advogado, face aos problemas que foram aí detetados de avaria no motor, datado de 24/11/2017, cujo teor se dá integralmente por reproduzido;
- 17) A viatura encontra-se parada desde então, não obstante a ré ter sido avisada da sua imobilização e dos problemas que o mesmo acusava, quer verbalmente, quer por escrito, não tendo encetado qualquer diligência no sentido da reparação do veículo, razão pela qual o mesmo permanece imobilizado, o que está a causar graves danos à autora.
Na fundamentação da decisão ponderou-se:
“O testemunho de DD mostrou-se isento e credível, enquadrável igualmente nas conclusões do relatório pericial – folhas 580 a 582 -, motivo pelo qual é valorado positivamente. Além de sustentar o testemunho de CC, este testemunho demonstra os factos descritos de 10) a 17). Valoram-se os documentos 3 e 3A juntos com a petição inicial, o primeiro da autoria da testemunha, bem como o mencionado relatório pericial. Dúvidas não restam que a ré recebeu o email (documento 3A), também porque ao mesmo respondeu com email a que se reporta o facto 30)”.
Em relação ao ponto 10 sugere a apelante que a expressão "a ser reparada" deve ser substituída por "a aguardar reparação" e deve ser retirada a expressão "face aos problemas que foram aí detetados de avaria no motor".
Sustenta a alteração no depoimento da testemunha CC e DD, esta testemunha, porque indica causa distinta para se proceder à reparação.
Do depoimento da testemunha CC decorre que o veículo deu entrada na oficina em 23 de novembro de 2017 e ali se manteve até meados de dezembro de 2017, para se averiguar a causa da avaria e aguardar a ordem de reparação. A testemunha referiu que perante a recusa da ré em proceder à reparação da viatura contatou um advogado que promoveu diligências junto da ré, sem qualquer sucesso e ficou a aguardar as instruções do seu advogado para poder dar ordem de reparação.
A testemunha DD confirmou que o veículo entrou para a sua oficina no final de novembro de 2017 e verificou que tinha um problema no “tensor da correia”, que foi substituído. Após reparação constatou que o veículo apresentava “um barulho no motor e chamou a atenção que era necessário uma reparação no motor”. Referiu, ainda, que se o “automóvel estava em garantia não podia desmontar o motor”. “Alertou para o barulho que seria dentro do motor”. O veículo uma vez reparado saiu pelos próprios meios da oficina.
Constata-se, pois, que a testemunha não detetou um concreto problema no motor, mas apontou para a possível existência, o que aliás se veio a confirmar com a realização da perícia.
O ponto 10 reproduz, em parte, o teor do documento, sem o transcrever, o que causa o equívoco na redação, sendo certo que a comunicação eletrónica foi realizada e recebida pela ré, com o teor que consta da mesma.
O documento 3- A – inserido a página 1828 do processo eletrónico – a que se faz referência no ponto 10, constitui uma comunicação eletrónica com data de 24 de novembro enviada pelo advogado da autora para a ré, com o seguinte teor:
Justifica-se, assim, retificar a redação do ponto 10, no qual para além de se corrigir a expressão “um mês a ser reparada”, se transcreve o teor da comunicação eletrónica e que passa a ter a seguinte redação:
- Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante aproximadamente um mês até ser reparado, tendo a autora informado a ré da situação daquele automóvel através de email enviado pelo seu advogado datado de 24/11/2017, com o seguinte teor:
Em relação ao ponto 17 considera a apelante que nos autos “não existe qualquer suporte probatório desta factualidade”.
Considera, ainda, que a expressão "o que está a causar graves danos à autora" contida nesse ponto 17 dos factos provados, é uma mera afirmação genérica e conclusiva que integra uma valoração de factos e que, como tal, atento o disposto n.º 4 do art.º 607.º do CPC, deve ser eliminada.
Sugere a alteração da redação no sentido de se julgar provado:
17) A viatura encontra-se parada desde 27 de maio de 2018.
Entende-se que a alteração sugerida não se justifica, face à fundamentação da decisão e a prova produzida que a confirma, sendo evidente pela postura desde logo que a ré assumiu nos autos, que recusa proceder à reparação.
Contudo, justifica-se eliminar a expressão "o que está a causar graves danos à autora", atento o caráter conclusivo da mesma (art. 607º/4 CPC).
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- Pontos 27, 28, 29 dos factos provados -
A matéria consigna nos pontos 27, 28, 29 responde à matéria dos art. 47º a 49º da petição, julgando-se provado:
- 27) O acima descrito ficou a dever-se, em exclusivo, à atuação da ré;
- 28) A ré conhecia, por não poder desconhecer, os problemas de que a viatura padecia e, mesmo assim, vendeu-a à autora, alegando estar aquela em perfeitas condições;
- 29) A ré refere expressamente também ter ficado com uma viatura com problemas sem deles ter reclamado, tendo-se negado, face à reclamação da autora, a proceder à reparação da viatura objeto da presente.
Na fundamentação da decisão ponderou-se:
“O facto 18) decorre do relatório pericial junto a folhas 580 a 582, tendo-se em linha de conta o que relataram KK, LL e MM, Peritos nomeados no processo.
Os factos descritos de 19) a 26) têm por referência o que vem de se expor e os testemunhos de FF e GG, igualmente isentos e verosímeis.
Nesta sequência, chega-se à conclusão e prova dos factos 27) a 29).
Acresce que a ré admite na contestação ter enviado à autora o email junto como documento 4 (petição inicial). Além disso, nunca juntou ao processo o original da alegada renúncia à garantia, inviabilizando a perícia à letra. Essa atuação injustificada afeta a credibilidade da ré em juízo, já posta em causa pela prova que se valora positivamente. Assim, só pode ter-se como não provada alegada renúncia à garantia por parte da autora”.
Considera a apelante que a matéria dos pontos 26 e 27, por se revelar conclusiva, deve ser eliminada do enunciado dos factos provados, nos termos do art. 607º/4 CPC.
O art. 607º/4 CPC dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
No âmbito do anterior regime do Código de Processo Civil, o art. 646º/4 CPC, previa, ainda, que têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes.
Esta norma não transitou para o atual diploma, o que não significa que na elaboração da sentença o juiz deva atender às conclusões ou meras afirmações de direito.
Ao juiz apenas é atribuída competência para a livre apreciação da prova dos factos da causa e para se pronunciar sobre factos que só possam ser provados por documento ou estejam plenamente provados por documento, admissão ou confissão.
Compete ao juiz determinar, interpretar e aplicar a norma jurídica (art. 607º/3) e pronunciar-se sobre a prova dos factos admitidos, confessados ou documentalmente provados (art. 607º/4).
A doutrina, por analogia, dava às conclusões de facto o mesmo tratamento das conclusões de direito, considerando não escritos “os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados e exprimindo, designadamente, as relações de compatibilidade que entre eles se estabelecem, de acordo com as regras da experiência”[19].
O Professor ANTUNES VARELA considerava que deve ser dado o mesmo tratamento “às respostas do coletivo, que, incidindo embora sobre questões de facto, constituam em si mesmas verdadeiras proposições de direito”[20].
Confirmando-se que, em concreto, determinada expressão é de qualificar como pura matéria de direito, deve continuar a considerar-se não escrita porque o julgamento incide sobre factos concretos.
À face do atual regime este princípio apresenta alguma flexibilidade quando se trata de meras conclusões, na medida em que a lei passou a prever que a instrução incide sobre os temas de prova, por contraposição aos pontos de facto da base instrutória (art. 410º CPC), o que impõe que se atenuem os efeitos de um “excessivo rigorismo formal”[21].
ABRANTES GERALDES, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça propõe, assim, que: “[…] devem ser admitidas com mais naturalidade asserções que, não correspondendo, no contexto da concreta ação, a puras “questões de direito”, sejam algo mais do que puras “questões de facto” no sentido tradicional”[22].
A situação concreta enquadra-se nesta interpretação em que se pretende que a matéria a apreciar se mostre o mais fiel e próxima possível da realidade.
Constituem temas de prova apurar:
e) Aferir da natureza e características dos problemas de funcionamento da
viatura;
f) Saber da imputada renúncia à garantia de bom funcionamento da viatura por parte da autora;
g) Da ausência de reparação pela ré A... dos problemas comunicados
pela autora;
h) Da necessidade de recurso a outra oficina, em 23 de Novembro de 2017, para proceder à reparação dos problemas de funcionamento da viatura mais prementes,
i) …o que, de igual modo, se verificou em 27 de Março, 16 Maio e 27 de Maio, todos do ano de 2018, com inerentes custos a serem suportados pela autora;
j) Saber se a viatura se encontra parada deste 27 de Maio de 2018, circunstância que foi comunicada à ré A...;
k) Aferir do concreto período de garantia aplicável e/ou convencionado no contrato firmado;
l) Aferir da necessidade de proceder à substituição do motor da viatura, o que importará um custo aproximado de €7.399,95 (incluindo peças e mão-de-obra);
Neste contexto, a matéria de facto alegada pela autora revela-se pertinente para o desfecho da ação, ainda que não determinante e apesar de conter considerações genéricas, enquadra-se nos temas de prova, por estar em causa apreciar da atitude da ré, enquanto vendedora em todo o processo de venda do veículo (antes e depois) e conhecimento que revelou do seu estado de conservação.
Acresce que é a própria ré que na contestação admite que o veículo manifestava anomalias, ainda antes de ser adquirido pela autora.
Conclui-se, assim, não se justificar a pretendida alteração da decisão.
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Quanto ao ponto 29 a apelante insurge-se contra o facto de se julgar provado: “tendo-se negado, face à reclamação da autora, a proceder à reparação da viatura objeto da presente”, porque a fundamentação da decisão assenta apenas no depoimento da testemunha CC.
Sugere que se julgue provado tão só:
29) A ré refere expressamente também ter ficado com uma viatura com problemas sem deles ter reclamado;
A apelante não aponta qualquer erro na apreciação da prova e a relação familiar e interesse da testemunha no desfecho da causa não retira, só por si, credibilidade ao depoimento. Acresce que na fundamentação foi a consideração em conjunto de outros elementos de prova que permitiu julgar provada a matéria em causa e a apelante não questiona o relevo probatório de tais depoimentos.
Conclui-se que não merece censura a decisão, que se mantém.
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- Pontos XV, XVI dos factos julgados não provados -
Nos pontos XV e XVI está em causa matéria alegada pela ré na contestação, que se julgou não provada, com o seguinte teor: XV. Foi então efetuada a reparação dessas anomalias, tendo designadamente sido instalado um novo turbo completo (corpo + acessórios); XVI. No descrito em 37), cujo resultado não detetou a existência de qualquer anomalia.
Na fundamentação da decisão considerou-se, como se passa a transcrever:
“Os factos não provados não obtiveram prova certa, sendo igualmente afastados pela factualidade dada como provada. Reitera-se a falta de credibilidade da ré em juízo, atento o seu posicionamento quanto à não junção os autos do original da renúncia à garantia. Mais se refere que a mesma, dedicando-se à compra e venda de veículos, dirige-se à autora como não tem responsabilidade também por se dedicar à construção e ter recebido um carro com problemas.
Tal não é compatível com os ditames da boa-fé, indicando as regras da experiência comum que em situações como a semelhante a ré apresenta um comportamento comprometido, sendo a sua versão afastada, por não provada.
Nada mais assume relevo para a decisão final”.
A apelante pretende que se julgue provada tal matéria, sustentando a alteração no depoimento das testemunhas II e HH e nos documentos juntos com a contestação como doc. nº 1, 2, 3, 4, 5.
A testemunha HH referiu que procederam à substituição do turbo e ainda, mudaram o óleo e o filtro. Compraram todas as peças e artigos para executar tal trabalho e entregaram ao mecânico. As faturas com data de 13 de julho de 2017 e 14 de julho de 2017 respeitantes à compra de tais artigos constam do processo, inseridas a páginas 1687, 1688, 1689 do processo eletrónico sistema Citius.
A testemunha II referiu que procedeu à colocação do turbo, mudou o óleo e fez o teste eletrónico. Contudo, a fatura respeitante ao serviço executado não consta do processo, o que desde logo desvaloriza o depoimento da testemunha.
Por outro lado, os alegados testes a que foi submetido o veículo em 11 de julho e 14 de julho de 2017 (documentos inseridos a páginas 1682 e 1690 sistema Citius) tal como referido pela testemunha DD respeitam ao funcionamento da parte eletrónica do veículo. Não apresentam resultados sobre o sistema mecânico do veículo e o problema do veículo situando-se no motor constituía um problema mecânico.
Com efeito, analisados os documentos resulta que os testes respeitam ao funcionamento da parte elétrica e eletrónica do veículo, nada se indica sobre o funcionamento mecânico do veículo.
Por outro lado, como se veio a apurar com o resultado da perícia – relatório inserido a páginas 565 do processo eletrónico - o veículo apresentava deficiências ao nível do motor, sendo essa a causa para deixar de circular.
Desta forma, os resultados obtidos nos citados testes em nada relevam, sendo certo que mesmo no segundo teste se anota anomalia no circuito eletrónico da porta.
Conclui-se que a prova indicada pela apelante não justifica a alteração da decisão, porque os depoimentos das testemunhas se apresentaram muito desvalorizados no confronto com os documentos que a apelante indicou e resultado da prova pericial.
Mantém-se a decisão que julgou não provada a matéria dos pontos XV e XVI.
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Em síntese, procedem, em parte as conclusões de recurso, sob as alíneas D) a P) e nessa conformidade, altera-se a decisão de facto em relação aos seguintes pontos:
- ponto 3: - Os termos do acordo de compra e venda ficaram estabelecidos em junho de 2017 e a entrega do veículo ocorreu em 14 de julho de 2017.
- ponto 5: - Logo no dia 14 de julho de 2017, durante a viagem, a luz do óleo acendia e apagava e o GPS não estava a funcionar.
- ponto 10: - Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante aproximadamente um mês até ser reparado, tendo a autora informado a ré da situação daquele automóvel através de email enviado pelo seu advogado datado de 24/11/2017, com o seguinte teor:
- ponto 17: A viatura encontra-se parada desde então, não obstante a ré ter sido avisada da sua imobilização e dos problemas que o mesmo acusava, quer verbalmente, quer por escrito, não tendo encetado qualquer diligência no sentido da reparação do veículo, razão pela qual o mesmo permanece imobilizado.
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Na análise das restantes questões, cumpre ter presente os factos provados e não provados, com as alterações introduzidas em itálico, por efeito da reapreciação da decisão de facto e que são os seguintes: 1) A ré tem como objeto social a compra, venda e aluguer de veículos automóveis de todo o tipo e classe e de maquinaria pesada; 2) No âmbito do objeto social daquela, a ré vendeu à autora, a 14 de Julho de 2017, um veículo automóvel da marca Audi, modelo ..., com a matrícula ..-BL-.., pelo preço de 22.500,00€, liquidado da seguinte forma:
a. Entrega de um veículo automóvel da marca Volkswagen, tendo as partes fixado o seu valor em 6.000€;
b. 1.500,00€ em dinheiro;
c. 15.000€ mediante empréstimo bancário; 3) - Os termos do acordo de compra e venda ficaram estabelecidos em junho de 2017 e a entrega do veículo ocorreu em 14 de julho de 2017. 4) O gerente da ré assegurou à autora que aquele veículo havia sido submetido a uma rigorosa inspeção e que se encontrava em perfeitas condições de funcionamento; 5) Logo no dia 14 de julho de 2017, durante a viagem, a luz do óleo acendia e apagava e o G.P.S. não estava a funcionar; 6) A autora entrou, de imediato, em contacto com a ré, na pessoa do seu gerente, BB, que lhe disse que havia verificado os níveis do óleo e que isso podia acontecer por ter óleo a menos, ou a mais, situação normal, segundo ele; 7) De Julho a Novembro a luz do óleo continuou a acender e a apagar forçando, por isso, a autora a, diariamente, verificar os níveis para assegurar que não haveria consequências mais graves; 8) No dia 23 de Novembro, a autora apercebeu-se de um barulho anormal que a levou a chamar um reboque; 9) A autora, através de seu marido, entrou em contacto com o gerente da ré, solicitando-lhe que a viatura fosse deixada nas suas instalações, para análise e reparação, ao que o último respondeu que não, dado que a autora tinha assinado um documento em que prescindia da garantia e que, além disso, da própria fatura constava a indicação de que o veículo havia sido vendido no estado em que se encontrava, descartando, dessa forma, a sua responsabilidade; 10) Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante aproximadamente um mês até ser reparado, tendo a autora informado a ré da situação daquele automóvel através de email enviado pelo seu advogado datado de 24/11/2017, com o seguinte teor:
11) Por esse motivo, a oficina procedeu apenas à reparação dos problemas mais prementes; 12) A 11 de Dezembro, a ré, na pessoa do seu gerente, enviou, via email, à autora, o documento onde esta, alegadamente, renunciava à garantia; 13) No dia 18 de Dezembro de 2017, a viatura foi entregue à autora, tendo esta sido alertada, pelo mecânico que procedeu à reparação, para a existência de ruído nas “tuches”, nas correntes; 14) Aquele referiu também que a resolução de todos os problemas do veículo acarretaria custos extraordinariamente elevados, conforme por si declarado que “a viatura se encontrava em elevado estado de degradação”, propondo à autora, numa primeira fase, que “reparasse as avarias mais evidentes porque para uma reparação mais profunda teria que a desmontar quase na sua totalidade e que ao fazê-la teria que substituir todos os órgãos da viatura”; 15) No dia 27 de Março de 2018, o carro foi, novamente, rebocado para a referida oficina, o mesmo sucedendo a 16 de Maio; 16) Cenário idêntico no dia 27 de Maio, data em que o veículo parou na auto-estrada entre Coimbra e a Figueira da Foz, e em que teve de ser a autora a suportar os custos, em virtude de a assistência em viagem já não cobrir o respectivo serviço, ponderando o número de vezes do recurso ao mesmo; 17) A viatura encontra-se parada desde então, não obstante a ré ter sido avisada da sua imobilização e dos problemas que o mesmo acusava, quer verbalmente, quer por escrito, não tendo encetado qualquer diligência no sentido da reparação do veículo, razão pela qual o mesmo permanece imobilizado. 18) Do relatório pericial junto a folhas 580 a 582, cujo teor se tem integralmente por reproduzido consta que:
“(…) 7. Que anomalias a viatura apresenta e a que nível? Após o motor ter sido retirado no interior do veículo e ter sido desmontado, constatamos que este apresenta um conjunto de anomalias a saber:
-Cambota danificada.
-Capas das bielas partidas;
-Biela partida e presa no bloco do motor;
-Almofadas da corrente de distribuição partidas.
-Turbo com folgas.
-Sub Carter partido.
-Bomba de óleo avariada.
-Estas anomalias são ao nível do motor, sendo desconhecido o estado em que se encontram os periféricos, até devido ai tempo de imobilização do veículo.
8. Estas anomalias podem ser reparadas ou implicam a substituição de componentes essenciais? No caso afirmativo quais?
As anomalias detetadas no motor provocam com que o mesmo não tenha viabilidade de reparação. Assim, é opinião do proprietário da oficina que procedeu à desmontagem do veículo, Sr. EE, que a substituição das peças daria origem a um sem número de problemas no futuro, devido ao aquecimento a que o bloco do motor esteve sujeito, com folgas a diversos níveis irreparáveis, opinião que os três peritos subscrevem.
Assim, optou-se pela substituição por um motor da Audi reconstruído com garantia da marca e da oficina instaladora.
9. Qual o seu custo?
A empresa que efetuou a desmontagem do veículo da A. (…) apresentou-nos um orçamento que prevê a substituição do motor do veículo por um motor da marca reconstruído com garantia da marca e com garantia da oficina instaladora. (…) bem como a colocação dos filtros e óleos, turbo novo bem como a bomba da água, entre outros, de forma a permitir o seu normal funcionamento.
Não está prevista qualquer substituição dos periféricos dado que os mesmos não interferiram diretamente na avaria do motor do veículo.
O Custo total do orçamento da D... é de 16.809,91€ estando já contemplado o valor do I.V.A. correspondente.
10. Quais as consequências dessa reparação não ser levada a cabo?
As consequências a reparação não ser levada a cabo prendem-se com a imobilização definitiva do veículo”; 19) A autora, viu-se esta forçada, durante todo esse período, a pedir uma viatura emprestada por diversas ocasiões e a beneficiar de “boleias” de amigos e familiares, dado que a sua atividade profissional, gerente de uma empresa, não lhe permite ficar sem transporte; 20) A autora trabalha em Coimbra mas reside em Anadia, tendo de deslocar-se, várias vezes por dia, entre essas localidades; 21) Neste momento e dado que desconhece quanto tempo mais irá a sua viatura ficar imobilizada, está sem transporte próprio; 22) Tem de ficar, algumas vezes, com a viatura da empresa; 23) Na sua vida pessoal, a situação retratada impede a autora de fazer as compras para o agregado familiar, levar os filhos para a escola e atividades conexas, exercer a sua atividade profissional e deslocar-se normalmente, como sempre fez, sair aos fins de semana, o que era usual e necessário; 24) Ir de férias pois, por serem uma família numerosa, seis pessoas, a viatura adquirida à ré era a única que respondia às necessidades da família; 25) Visitar o filho, que se encontra a estudar em Lisboa; 26) A factualidade supra explanada e o facto de não poder utilizar o veículo como sempre que lhe aprouvesse geraram desgaste físico e mental, como, dores de cabeça e cansaço; 27) O acima descrito ficou a dever-se, em exclusivo, à atuação da ré; 28) A ré conhecia, por não poder desconhecer, os problemas de que a viatura padecia e, mesmo assim, vendeu-a à autora, alegando estar aquela em perfeitas condições; 29) A ré refere expressamente também ter ficado com uma viatura com problemas sem deles ter reclamado, tendo-se negado, face à reclamação da autora, a proceder à reparação da viatura objeto da presente; 30) No email junto sob como documento 4, a ré refere que a sua “empresa era de construção civil e não um stand aberto ao público para vendas, por isso mesmo fiquei com o vosso carro cujo também me deu problemas e que não pedi satisfações do mesmo, com as mesmas condições que a senhora ficou com o jipe.”; 31) O gerente da ré foi levantar o "Audi ..." a Lisboa e verificou então que, apesar da sua condução não se detetar qualquer anormalidade, o painel de controle trazia acesa uma luz amarela; 32) E dando-lhe igualmente conhecimento da existência da supra referida luz amarela; 33) Mais informou a autora de que, caso pretendesse ficar com a viatura, iria submete-la um teste de diagnóstico para se aferir qual o problema que poderia existir e que as eventuais anomalias seriam reparadas; 34) Depois de verificar e experimentar o "Audi ...", a autora manifestou interesse em o adquirir, afirmando que primeiramente tinha de solicitar um empréstimo para pagamento do respetivo preço; 35) No dia 11/07/2017, o gerente da ré fez submeter o "Audi ..." a um teste de diagnóstico eletrónico o qual detetou a necessidade de substituição de três velas incandescentes e também a existência de um problema no circuito de controle de sobrealimentação do turbo; 36) A ré mudou o óleo do motor e substituiu os filtros do óleo, do combustível, do ar e do habitáculo; 37) Após o que, no dia 14/07/2017, o "Audi ..." foi submetido a um novo teste de diagnóstico; 38) Nesse mesmo dia 14/07/2017, a autora apresentou-se no armazém da ré deixando aí o Volkswagen ..., e seguindo, na companhia do gerente da ré, seguido para a oficina onde se encontrava o "Audi ..."; 39) A autora saiu então da oficina ao volante do mesmo e andou a experimentá-lo o resto da tarde desse dia; 40) Seguidamente a autora e o marido foram jantar com gerente da ré e depois regressaram à Anadia com o "Audi ..."; 41) A autora não voltou a aparecer nas instalações da ré; 42) Em 14/07/2017, o veículo foi vendido com 215696 quilómetros e na a fatura da "Oficina de DD" datada de 16/07/2018, junta com a petição inicial, consta que o "Audi ..." apresentava então 243551 quilómetros; 43) A interveniente principal organiza leilões de veículos e equipamentos; 44) A interveniente principal dispõe de Título de Autorização para Exercício da Atividade Leiloeira, emitido nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 155/2015, de 10 de Agosto, pela Direção Geral das Atividades Económicas; 45) No âmbito da sua atividade, a interveniente promove em leilão, a venda de viaturas, cuja propriedade é dos respetivos clientes vendedores, para que sejam vendidas ao licitador que fizer a melhor oferta; 46) Os veículos/equipamentos são colocados pelos clientes/vendedores nas instalações da interveniente principal para serem levados a leilão, sendo vendidos por conta e mandato dos clientes que aí os colocam; 47) Foi também assim neste caso; 48) Em 16 de Maio de 2017, o veículo ..-BL-.. foi colocado nas instalações da interveniente principal para ser para ser leiloado; 49) No dia do leilão, em 25 de Maio de 2017, a Chamada, na sua qualidade de empresa leiloeira, transmitiu aos participantes as informações relativas ao veículo que lhe foram prestadas pelo vendedor/cliente; 50) A participação nos leilões realizados pela Chamada é feita de acordo com as designadas "Condições Gerais de Compra e Venda de Viaturas Usadas em Leilão”, as quais são do conhecimento de todos os participantes que as aceitam aquando da sua inscrição; 51) A ré, como participante nos leilões da Chamada, conhece e aceitou as Condições Gerais aplicáveis; 52) Nos termos da cláusula 3.1.7. das referidas Condições Gerais “O vendedor deverá preencher a ficha de viatura com todas as informações nela solicitadas (…) O vendedor é o único responsável pela falsidade, incorreção ou omissão de quaisquer elementos da ficha de viatura, ou por quaisquer outras informações ou garantias prestadas.”; 53) A viatura objeto do presente processo foi leiloada no “Estado em que se encontra”; 54) Da alínea c) da Cláusula 6.2 das referidas Condições Gerais resulta que: “O comprador de uma viatura apresentada a leilão com a referência ‘no estado em que se encontra’ na respetiva ficha de viatura, assume o risco da compra da viatura nessas condições, não tendo direito a apresentar qualquer reclamação.” 55) No dia do leilão, em 25 de Maio de 2017, a referida viatura foi adquirida no leilão pela ré, tendo a interveniente principal emitido fatura à ré, pelos serviços prestados, enquanto empresa leiloeira, tendo-lhe cobrado os seguintes valores:
a. 474,78 € a título de “taxa de aquisição”;
b. 79,95 €, pela prestação do serviço de transferência de propriedade; 56) Após a realização do leilão, a Chamada entregou o veículo à ré, desconhecendo o que sucedeu com o veículo a partir dessa data;
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Com relevo para a decisão final, resultaram os seguintes factos não provados: I. No descrito em 3), exatamente no dia 26; II. Relativamente ao G.P.S., ficou de agendar um dia para analisar a situação, o que nunca aconteceu; III. Em 11), deixando os outros para reparação ulterior pois, a não ser assim, o custo seria mais elevado; IV. A autora assinou o documento a renunciar à garantia; V. No descrito em 13), bem como para o facto de a luz do óleo acender e piscar; VI. Só a substituição do motor por um usado ascenderia a 5.399,95€, acrescida do custo da mão-de-obra, no valor de, aproximadamente, 2.000,00€; VII. Está impedida de visitar clientes, o que se traduziu num decréscimo das vendas; VIII. No descrito em 20), em ...; IX. No descrito em 23), ficando, assim, o comercial impedido de a utilizar, bem como as restantes pessoas que aí trabalham; X. A autora vê-se, muitas vezes, obrigada a aguardar que algum familiar ou amigo a vá levar e ou buscar ao seu local de trabalho; XI. No descrito em 26), tonturas; XII. A autora despendeu em reboques e reparações exatamente a quantia de 1.869,76€; XIII. Ao que o gerente da ré a informou de que havia comprado num leilão um outro Audi ... mas que ainda nem sequer a vira; XIV. No descrito em 31) e 32), sinalizadora da existência de problema no motor; XV. Foi então efetuada a reparação dessas anomalias, tendo designadamente sido instalado um novo turbo completo (corpo + acessórios); XVI. No descrito em 37), cujo resultado não detetou a existência de qualquer anomalia; XVII. Sendo que nesse dia a autora não reclamou junto do gerente da ré a existência de qualquer problema no "Audi ..."; XVIII. A autora nunca reportou ao gerente da ré os episódios; XIX. Só em finais de Novembro de 2017 é que o gerente da ré recebeu uma chamada telefónica da autora; XX. Com exceção dessa chamada, a ré não recebeu qualquer outra chamada da autora; XXI. No decurso da qual a autora, não reportando nenhuma concreta avaria e ou deficiência, destratou o gerente da ré exigindo uma viatura nova.
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- Caducidade do direito -
Nas conclusões de recurso, sob as alíneas U) a X), insurge-se a apelante contra o segmento da decisão que julgou improcedente a exceção de caducidade, mas no pressuposto da alteração da decisão de facto.
Mantendo-se inalterada a decisão de facto, nada cumpre reapreciar, já que não se questiona a aplicação do direito aos factos.
Improcedem as conclusões de recurso sob as alíneas U) a X).
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- Da imputação da responsabilidade à autora, pelo defeito no veículo -
Nas alíneas Y) a FF) das conclusões de recurso, a apelante insurge-se contra a decisão que julgou procedente a ação, imputando à ré a responsabilidade pela reparação do veículo. Assenta a sua argumentação em meras conclusões e factos que não foram alegados na contestação e como tal não se mostram apurados, defendendo que os defeitos que o veículo apresenta são da responsabilidade da autora por falta de diligência no uso e manutenção do veículo.
O recurso consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer[23]. O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida.
O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância[24]. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência[25] repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova.
O tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida.
Podemos concluir que os recursos destinam-se em regra a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, apenas se excetuando: o caso da verificação de nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia (artigo 615º, nº 1, alínea d), do CPC); a existência de questão de conhecimento oficioso; a alteração do pedido, em segunda instância, por acordo das partes (artigo 272º do CPC); e a mera qualificação jurídica diversa da factualidade articulada.
Verifica-se que os factos e novos argumentos que a apelante vem introduzir nas conclusões do recurso não podem ser considerados, pois constituem factos novos, já que em sede de contestação não foram alegados.
Se os novos factos e os novos fundamentos de sustentação da defesa resultaram da discussão da causa, recaía sobre as partes ao abrigo do art. 5º/3 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo”, a sua consideração em sede de decisão, o que também não ocorreu.
Conclui-se, assim, nos termos do art. 627º CPC que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos novos que os apelantes vêm alegar e bem assim, os novos fundamentos de sustentação da sua defesa, pois os mesmos não foram considerados na decisão objeto de recurso e não são de conhecimento oficioso, sendo certo que ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal“a quo“ ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada). Tal como o juiz da 1ª instância, em sede de recurso, o tribunal “ad quem” está limitado pelo pedido e seus fundamentos e pela defesa tal como configurados na ação, motivo pelo qual está impedido de conhecer do objeto do recurso nesta parte.
Improcedem, assim, as conclusões de recurso sob as alíneas Y) a FF).
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- Da indemnização a título de privação de uso e danos não patrimoniais -
Na sentença, face à pretensão deduzida pela autora, reconheceu-se o direito a ser indemnizada pelos danos sofridos com a privação do uso do veículo, fixando-se a indemnização em 35,00€ diários pela privação desde 27 de maio de 2018 e bem assim, atribuiu-se como compensação pelos danos não patrimoniais sofridos a quantia de € 3000,00.
Nas alíneas GG) a NN) das conclusões de recurso, a apelante insurge-se contra os valores arbitrados e entende, que nem é devida a indemnização a título de danos não patrimoniais.
Começando por apreciar do valor atribuído a título de indemnização pela privação de uso.
Nas alíneas GG) a HH) das conclusões de recurso, considera a apelante que segundo um juízo de equidade o valor adequado e proporcional não deve ser fixado em montante superior € 10,00 por dia.
A apelante não se insurge contra o segmento da decisão que reconheceu a existência do dano - privação de uso -, impugnando tão só o valor arbitrado para indemnizar tal dano.
No cálculo da indemnização cumpre ter presente o critério estabelecido nos art. 562º a 566º CC.
A indemnização em dinheiro tem carácter subsidiário, conforme decorre do disposto no art. 562º CC, motivo pelo qual apenas tem lugar nas situações previstas no art. 566º CC.
O fim precípuo da lei nesta matéria é o de prover à direta remoção do dano real à custa do responsável, visto ser esse o meio mais eficaz de garantir o interesse capital da integridade das pessoas, dos bens ou dos direitos sobre estes.
Recai sobre o lesado o ónus da prova dos danos, como decorre do art. 342º/1 CC, conjugado com o art. 487º /1 CC.
Por outro lado, é ao lesante e não ao lesado que a lei impõe a obrigação de reparar ou mandar reparar os danos produzidos a este[26].
A reconstituição natural, considera-se meio impróprio ou inadequado, quando for excessivamente onerosa para o devedor, isto é, quando houver manifesta desproporção entre o interesse do lesado, que importa recompor e o custo que a reparação natural envolve para o responsável[27].
A desproporção entre o interesse do lesado, que importa recompor, e o custo que a reparação natural envolve para o responsável, deve aferir-se através de elementos objetivos a permitir precisar que a mesma é idêntica para qualquer devedor.
Nestas circunstâncias recai sobre o devedor o ónus de alegar e provar a “excessiva onerosidade”, convertendo a obrigação de restituição natural em obrigação pecuniária (art. 342º/2 CC).
Depois de alguma controvérsia jurisprudencial, consolidou-se o entendimento segundo o qual a privação do uso de veículo constitui, só por si, um dano patrimonial indemnizável, por traduzir uma lesão no património, de que faz parte o direito de utilização das coisas que o integram.
O simples uso constitui uma vantagem suscetível de avaliação pecuniária, pelo que a sua privação constitui naturalmente um dano.
Uma vez que a privação do uso do bem durante um determinado período origina a perda das utilidades que o mesmo era suscetível de proporcionar e se tal perda não pode ser reparada mediante a forma natural de restituição, impõe-se que o responsável compense o lesado na medida equivalente.
Contudo, apesar de se considerar um dano patrimonial, na jurisprudência destacam-se duas posições a respeito da avaliação do prejuízo:
- a indemnização pressupõe a prova concreta dos prejuízos sofridos com a privação do veículo[28];
- noutro sentido, defende-se que a mera privação do uso do veículo constitui só por si um dano[29].
Ainda dentro desta última perspetiva, alguns arestos[30] vêm referindo que se deve distinguir entre privação de uso e privação da possibilidade de uso, só se justificando a indemnização na primeira situação, o que implica a demonstração, pelo lesado, não de todos os concretos danos emergentes da privação do uso do veículo, mas a prova de que se tivesse a disponibilidade do mesmo, dele retiraria as utilidades que normalmente aquele tipo de bem proporciona ao seu proprietário, refletindo-se negativamente na sua esfera patrimonial a impossibilidade de delas usufruir por via da privação a que foi sujeito.
A realidade social que subjaz às normas vigentes e que sempre deverá estar presente quando se trata de proceder à sua aplicação revela que, em regra, o proprietário de um veículo (em geral qualquer proprietário) faz do mesmo uma utilização normal, mais ou menos produtiva, mas que raramente lhe é indiferente a situação que emerge da sua privação decorrente da prática de um ato ilícito imputado a terceiro. É desta normalidade que o juiz deve recorrer quando se trata de dirimir litígios.
ABRANTES GERALDES, no seu estudo “Indemnização do Dano da Privação do Uso” refere a este respeito: “[…] a privação do uso de um veículo, desacompanhada da sua substituição por um outro ou do pagamento de uma quantia bastante para alcançar o mesmo efeito, reflete o corte definitivo e irrecuperável de uma “fatia” dos poderes inerentes ao proprietário.
Nestas circunstâncias, não custa compreender e admitir que a simples privação do uso seja causa adequada de uma modificação negativa na relação entre o lesado e o seu património que possa e deva servir de base à determinação da indemnização. Mesmo que se considere que a situação não atinge a gravidade suscetível de merecer a sua inclusão na categoria de danos morais, nos termos do art. 496º/1, é incontornável a perceção de que, entre a situação que se verifica na pendência da privação e a que existiria se não houvesse o sinistro, se verifica um desequilíbrio que, na falta de outra alternativa, deve ser compensado através da única forma possível: atribuição de uma quantia adequada”[31].
Conclui-se, do exposto, que a privação do uso e fruição do veículo constitui um dano ressarcível, cuja indemnização varia em função da concreta e real vantagem do gozo da coisa.
Na falta de elementos de facto que permitam avaliar o prejuízo sofrido deve o julgador orientar-se por critérios de equidade – art. 566º/3 CC - e mesmo, relegar para liquidação a fixação da indemnização, nos termos do art. 564º/2 CC e art. 609º CPC.
Seguindo um juízo de equidade cumpre atender às circunstâncias concretas do caso e ao princípio da igualdade, onde os critérios seguidos na jurisprudência podem fornecer um valor de orientação.
Consideramos, assim, que se da simples privação do uso de um veículo decorrer a perda de utilidades que o mesmo era suscetível de proporcionar e se essa perda não foi reparada mediante a forma natural de reconstituição, com atribuição de um veículo de substituição, impõe-se que o lesado seja recompensado em medida equivalente, que deverá constituir, em princípio, o valor de um veículo de substituição[32].
Para a determinação do valor do dano, como se observa no Ac. Rel. Porto 28 de maio de 2020, Proc. 289/19.1T8MCN.P1 www.dgsi.pt: “[...] ou se apura a concreta existência de despesas feitas pelo lesado em consequência dessa privação, ou se recorre à equidade caso não se apurem quaisquer gastos, mas sim que o lesado utilizava o veículo nas suas deslocações habituais (para fins profissionais, familiares, lazer) sem que lhe tivesse sido atribuído veículo de substituição.
Na primeira situação, o lesado terá direito à reparação integral dos gastos/custos que teve por via da dita privação. Já na segunda hipótese, a medida da indemnização terá que ser encontrada em função da impossibilidade do lesado utilizar o veículo nas suas deslocações diárias, profissionais, familiares, de lazer, havendo que encontrar em termos quantitativos um valor que se mostre adequado a indemnizá-lo pela falta de um veículo próprio que satisfaça as suas necessidades básicas”.
Não se provaram danos emergentes ou lucros cessantes associados à privação do uso do veículo, pelo que, apenas por recurso a critérios de equidade se pode fixar a indemnização, critério que foi usado pelo juiz do tribunal “a quo”[33].
Não se apurou o valor de aluguer de um veículo com idênticas características ao veículo em causa nos autos, o que serviria como referencial.
Ponderando o período de tempo entre a data em que o veículo deixou de circular, atento o uso que a autora pretendia fazer do mesmo – 23, 24 e 25 -, o facto de dispor de veículo da empresa que usa para as suas deslocações e que ainda se socorreu de boleias de amigos e familiares mostra-se adequado atribuir o valor de € 15,00 por dia, porque a privação de veículo para as deslocações diárias não foi total e por se situar nos valores médios utilizados em diferentes acórdãos deste Tribunal da Relação, onde se pondera, em média o valor de € 10,00, por dia[34].
O que está em causa e releva para este efeito é o valor económico das utilidades e comodidades que um veículo como aquele conferia ao respetivo dono e utilizados na finalidade a que o destinara, se pudesse continuar a utilizá-lo nas condições previstas em termos de normalidade[35]. Se como se provou pode usar o veículo da empresa, sem envolver custos acrescidos para a autora, justifica-se reduzir para cerca de metade o valor arbitrado, por se considerar que pelo menos para efeitos de se deslocar para o trabalho a privação do uso do veículo não representou um encargo adicional e atenuou o incómodo causado pela privação deste veículo.
Conclui-se, assim, que assiste à autora o direito a ser indemnizada pelo prejuízo sofrido, com a privação do uso do veículo, enquanto dano de natureza patrimonial, no montante de € 15,00 (quinze euros), por dia, desde 27 de maio de 2018 até integral pagamento da indemnização.
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Passando a reapreciar a decisão quanto à atribuição da indemnização a título de danos não patrimoniais.
Nas alíneas II) a NN) das conclusões de recurso, considera a apelante que resulta provado que a Autora sofreu meras contrariedades e incómodos que não justificam a atribuição da indemnização, mas a reconhecer-se o direito, o valor arbitrado deve ser reduzido para o montante de € 1.000,00.
A questão a decidir consiste em apurar se na fixação da indemnização, segundo um juízo de equidade se observou o critério legal, sendo o dano indemnizável.
Cumpre ter presente que a responsabilidade da ré foi apreciada à luz do regime da Venda de Bens de Consumo – DL 67/2003 de 08 de abril.
O consumidor tem direito a ser indemnizado pelos danos causados pela entrega de um bem desconforme com o contrato, cumulativamente com os direitos que venha a exercer contra o vendedor (reparação, substituição, redução do preço, resolução).
Esta possibilidade não se encontra expressamente consagrada no DL 67/2003 de 08 de abril, mas resulta dos princípios gerais do cumprimentos e incumprimento dos contratos e em particular do art. 12º/1/4 da Lei de Defesa do Consumidor - Lei 24/96 de 31 de Julho[36].
De acordo com o art. 12º/1 do citado diploma “o consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais, resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos”.
Contudo, porque estamos na esfera da responsabilidade contratual, o profissional apenas é responsável pelo prejuízo causado ao consumidor, na sequência de uma falta culposa ao cumprimento da obrigação.
Porém, na responsabilidade contratual a culpa presume-se ( art. 799º CC), o que significa que o consumidor tem de provar apenas a desconformidade, o dano e o nexo de causalidade.
Assiste, assim, à autora o direito a reclamar a indemnização a título de danos não patrimoniais pela venda do veículo com defeito, situando-se a questão no domínio do direito do consumo.
Tendo presente o art. 496º/1CC, verificamos que tão só, são indemnizáveis, a título de danos morais, os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito e a indemnização, neste âmbito, visa compensar o dano sofrido, pois pela sua natureza o dano não é suscetível de restituição natural.
A avaliação desta gravidade tem que ser feita segundo um padrão objetivo e em função da tutela do direito[37]. É orientação já consolidada na jurisprudência aquela segundo a qual os meros transtornos, incómodos, desgostos, preocupações ou contrariedades, não justificam, por falta da necessária e suficiente gravidade objetiva, a atribuição de uma indemnização, a título de danos não patrimoniais[38].
Contudo, como também tem sido entendido na jurisprudência, dano grave não terá que ser considerado apenas aquele que é “exorbitante ou excecional”, mas também aquele que “sai da mediania, que ultrapassa as fronteiras da banalidade. Trata-se de um dano considerável que, no seu mínimo espelha a intensidade duma dor, duma angústia, dum desgosto, dum sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se torna inexigível em termos de resignação[39].
Em conformidade com o nº4 do art. 496º CC o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º do CC e de acordo com um critério objetivo.
Na decisão segundo a equidade terá de se considerar essencialmente as particularidades que o caso concreto apresenta, configurando-se a consideração dos elementos e realidades a ter em conta sobretudo como questão metodológica[40].
Por outro lado, tem a jurisprudência defendido que na quantificação do dano, os montantes não poderão ser tão escassos que sejam objetivamente irrelevantes, nem tão elevados que ultrapassem as disponibilidades razoáveis do obrigado ou possam significar objetivamente um enriquecimento injustificado[41].
No recurso à equidade devem observar-se as exigências do princípio da igualdade, “o que implica a procura de uma uniformização de critérios, não incompatível, naturalmente, com a devida atenção às circunstâncias do caso”[42].
Deve atender-se, assim, nos termos do art. 496º/4 CC, conjugado com o art. 494º CC, ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica, do lesado e do titular de indemnização e às demais circunstâncias do caso. Nestas, podem incluir-se a desvalorização da moeda, bem como os padrões de indemnização geralmente adotados pela jurisprudência[43].
No caso concreto, contrariamente ao afirmado pela apelante, a autora não sofreu meras contrariedades e incómodos.
O conflito criado com a aquisição do veículo e defeitos que apresenta, que foram reclamados junto do vendedor desde a primeira hora, sem conseguir obter uma resposta do vendedor que invocava a renúncia por parte da autora ao direito à reparação (o que não se provou), geraram na autora desgaste físico e mental, com dores de cabeça e cansaço. Estamos perante uma situação anormal, que causou incómodos sérios que exigiram a instauração da presente ação. Acresce que o vendedor não ilidiu a presunção de culpa, como era seu ónus (cfr. pontos 27 e 28 dos factos provados).
A Autora viu-se assim afetada no seu bem estar e saúde, bens jurídicos que merecem a tutela do direito e cuja lesão, pela sua gravidade, justifica a atribuição de uma indemnização para compensar os danos sofridos.
Não merece censura a decisão que ponderou tais danos e arbitrou a indemnização segundo um juízo de equidade.
O valor arbitrado na sentença será excessivo, ponderando situações idênticas e valores arbitrados na jurisprudência[44], mas o valor sugerido pela apelante será diminuto para compensar o dano sofrido, ponderando o facto de a situação se prolongar desde 2018, a natureza dos bens jurídicos atingidos, a situação económica da ré e o facto de ser da sua responsabilidade a situação criada, como tal considera-se adequado para compensar o dano sofrido fixar a indemnização em € 2000,00.
Improcedem, em parte, as conclusões de recurso sob as alíneas GG) a NN).
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Nos termos do art. 527º CPC as custas são suportadas, em ambas as instâncias pela apelante (ré) e apelada (autora) na proporção do decaimento, que se fixa em 4/5 e 1/5, respetivamente.
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III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar em parte procedente a apelação e nessa conformidade:
- julgar parcialmente procedente a impugnação da decisão de facto, introduzindo na decisão as seguintes alterações:
- ponto 3: - Os termos do acordo de compra e venda ficaram estabelecidos em junho de 2017 e a entrega do veículo ocorreu em 14 de julho de 2017.
- ponto 5: - Logo no dia 14 de julho de 2017, durante a viagem, a luz do óleo acendia e apagava e o GPS não estava a funcionar.
- ponto 10: - Em virtude da factualidade descrita, o automóvel foi, então, rebocado para a oficina Auto C..., onde permaneceu durante aproximadamente um mês até ser reparado, tendo a autora informado a ré da situação daquele automóvel através de email enviado pelo seu advogado datado de 24/11/2017, com o seguinte teor:
- ponto 17: A viatura encontra-se parada desde então, não obstante a ré ter sido avisada da sua imobilização e dos problemas que o mesmo acusava, quer verbalmente, quer por escrito, não tendo encetado qualquer diligência no sentido da reparação do veículo, razão pela qual o mesmo permanece imobilizado.
- revogar, em parte, a sentença e condenar a ré no pagamento da indemnização pela privação de uso no pagamento de uma indemnização correspondente a € 15,00 (quinze euros) por dia, a partir de 27 de maio de 2018 até integral pagamento da indemnização e no pagamento da indemnização de € 2000,00 (dois mil euros), a título de danos morais, confirmando no mais a decisão.
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Custas em ambas as instâncias pela apelante e apelada na proporção do decaimento, que se fixa em 4/5 e 1/5, respetivamente.
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Porto, 09 de outubro de 2023
(processei e revi – art. 131º/6 CPC)
Assinado de forma digital por
Ana Paula Amorim
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
________________________ [1] Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico de 1990. [2] ANSELMO DE CASTRO Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Coimbra, Almedina, 1982, pag. 142. [3] JOSÉ LEBRE DE FREITAS, A. MONTALVÃO MACHADO E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, Vol.II, 2ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, pag. 704. [4] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, Coimbra Editora Lim, 1984, pag. 143. No mesmo sentido pode ainda ler-se o ANTUNES VARELA et alManual de Processo Civil, 2ª edição, revista e atualizada, Coimbra Editora, Limitada, Coimbra, 1985, pag.688. [5] MANUEL A. DOMINGUES DE ANDRADE Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, Limitada, 1993, pag. 156 [6] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, pag. 357 [7] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, ob. cit., pag. 486 [8] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, pag. 240 [9] MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, Lisboa, Lex, 1997, pag. 77. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, ob. cit., pag. 78. JOSÉ LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, vol I, Coimbra, Coimbra Editora, 1999, pag. 467-468. [10] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, Julho 2013, pag. 126. [11] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, ob. cit., pag. 225. [12] ABRANTES GERALDES Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, Coimbra, Almedina, janeiro 2000, 3ª ed. revista e ampliada pag.272. [13] ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, vol IV, Coimbra, Coimbra Editora, pag. 569. [14] Ac. Rel. Guimarães 20.04.2005 - www.dgsi.pt. [15] Ac. Rel. Porto de 19 de setembro de 2000, CJ XXV, 4, 186; Ac. Rel. Porto 12 de dezembro de 2002, Proc. 0230722, www.dgsi.pt [16] MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, ob. cit., pag. 347 [17] JOSÉ LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 3ª edição, Almedina, Coimbra, julho 2017, pag. 356 [18] “27º No dia 14 de julho de 2017 a autora deslocou-se ao armazém da ré, onde deixou o seu Volkswagen ..., e seguiu, efetivamente, com o gerente da ré, 28º desconhecendo, contudo, por que motivo a viatura que havia adquirido necessitava de ir a uma oficina, não lhe tendo sido dada qualquer explicação a esse respeito. 29º A viatura foi entregue à A. às 20 horas, sem que esta a tivesse experimentado, e sem que lhe tivessem sido entregues uma das chaves”. [19] JOSÉ LEBRE DE FREITAS E A. MONTALVÃO MACHADO, RUI PINTO Código de Processo Civil – Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, pag. 606. [20] ANTUNES VARELA, J.M.BEZERRA, SAMPAIO NORA, Manual de Processo Civil, 2ª edição Revista e Atualizada de acordo com o DL 242/85, S/L, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pag. 648. [21] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos em Processo Civil, 7ª edição, atualizada, Almedina, Coimbra, 2022, pag. 354 [22] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos em Processo Civil, ob. cit., pag. 354 [23] CASTRO MENDES Direito Processual Civil – Recursos, ed. AAFDL, 1980, pag. 5. [24] CASTRO MENDES, Direito Processual Civil – Recursos, ob. cit., pag. 24-25 e ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil, vol V, pag. 382, 383. [25] Cfr. os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 Ac. Rel. Porto 20.10.2005, Proc. 0534077 Ac. Rel. Lisboa de 14 de maio de 2009, Proc. 795/05.1TBALM.L1-6; Ac. STJ 15.09.2010, Proc. 322/05.4TAEVR.E1.S1 (http://www.dgsi.pt) [26] Na jurisprudência, entre outros, podem consultar-se: Ac. Rel. Coimbra 08.07.86, CJ XI, IV, 66; Ac. Rel. Porto, 08.01.92 CJ XVII, I, 240 e Ac. Rel. Coimbra 10.12.98, CJ XXIII, V, 40. [27]PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª Edição, Reimpressão, Coimbra, Wolters Kluwer Portugal, sob a marca Coimbra Editora, 2011, pag. 582. [28] Cfr. entre outros Ac. Rel. Porto 18.12.2008, Ac. Rel. Coimbra de 08.09.2009, Ac. Rel. Coimbra 13.03.2007, Ac. STJ de 19.11.2009; Ac. STJ 21 abril de 2010, Proc. 17/07.4TBCBR.C1.S1; Ac. STJ 12.01.2012, Proc. 1875/06.5TBVNO.C1.S1, todos acessíveis em www.dgsi.pt. [29] Cfr. Ac. Rel. Porto 19.03.2009, Ac. Rel. Lisboa 28.05.2009, Ac. STJ 23 de novembro de 2011, Proc. 397-B/1998.L1.S1 e Ac. STJ 03 de março de 2013, Proc. 3036/04.9TBVLG.P1.S1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt [30] Cfr. Ac. STJ 08 de outubro de 2009, Proc. 1362/06.1 TBVCD.S 1 – www.dgsi.pt [31] ABRANTES GERALDES Temas da responsabilidade civil, vol. I, 3ª ed, Almedina, Coimbra, pag. 71 [32] Cfr. Ac. da Rel. de Guimarães de 28.04.2004, www.dgsi.pt/jtrg; Ac. Rel. Porto 15 de março de 2010, Ac. Rel. Lisboa 27 de outubro de 2015, Proc. 5119/12.2TBALM.L1.1, Ac. Rel. Lisboa 24 janeiro de 2013, Proc. 31324/09.0T2SNT.L1-2; Ac. Rel. Lisboa 07 de maio de 2015, Proc.1222/07.9YXLSB-C.L1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. [33] Escreveu-se na sentença: “Constituindo assim o uso uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária é meramente consequente a conclusão de que a sua privação constitui um dano patrimonial indemnizável. A indemnização é calculada de acordo com a equidade”. [34] Ac. Rel. Porto 08.09.2014, Proc. 224/12.8TVPRT.P1 (€ 10,00/ dia); Ac. Rel. Porto 14.05.2013, Proc. 1008/12.9TBPNF.P1 (€ 5,00/dia); Ac. Rel. Porto 12.04.2011, Proc. 273/09.3TBBGC.P1 (€ 10,00/dia); Ac. Rel. Porto 21.02.2017, Proc. 1773/13.6TBPNF.P1 (€ 10,00/dia), todos disponíveis em www.dgsi.pt. [35] Cfr. Ac. STJ 23 de novembro de 2011, Proc. 397-B/1998,L1.S1, acessível em www.dgsi.pt [36] Ac. Rel. Porto 21 de janeiro de 2014, Proc. 1177/12.8T2OVR.P1; Ac. Rel. Porto 15 de dezembro de 2016, Proc. 103/14.4T8PFR.P1 e ainda, JORGE MORAIS CARVALHO Manual de Direito do Consumo, 7ª edição, Reimpressão, Almedina, Coimbra, 2021, pag. 339 [37] JOÃO DE MATOS ANTUNES VARELA Das Obrigações em Geral, Vol. I, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 1980, pag. 500-501 [38] Cfr., entre outros. Acs. do STJ, de 12/10/73, In B.M.J., n.º 230, p. 107 e de 18/11/75, In B.M.J., n.º 251, p. 148 e da R.L., de 02/02/2006, processo nº 10931/2005-6, de 12/09/2006, processo nº 239/2006-7, de 12/12/2006, processo nº 6315/2006-7 e de 20/10/2005, processo nº 1082/2005-8, da R.P., de 16/11/2006, processo nº 0635990 e de 17/11/2005, processo nº 0534807 e da R.C., de 13/03/2007, processo nº 667/05.3TBGRD.C1, de 10/10/2006, processo nº 667/06.6YRCBR, e de 26/04/2005, processo nº 27/05, todos acessíveis em www.dgsi.pt [39] Ac. do S.T.J., de 24 de maio de 2007, processo n.º 07A1187, acessível em www.dgsi.pt [40] Ac. STJ 10 de setembro de 2009, disponível em www.dgsi.pt. [41] Ac. STJ 10 de setembro de 2009, disponível em www.dgsi.pt. [42] Ac. STJ 23.09.2008 e Ac.22.10.2009 disponíveis em www.dgsi.pt. [43] Ac. Rel. Porto de 07 de julho de 2005 - JTRP00038287 - www.dgsi.pt. [44] Ac. Rel. Coimbra 01 de março de 2016, Proc. 1684/08.7TBCBR.C1 e Ac. Rel. Évora 15 de janeiro de 2015, Proc. 268/13.2TBACN.E1, acessíveis em www.dgsi.pt