AÇÃO PROPOSTA CONTRA CONDÓMINO
LEGITIMIDADE PASSIVA
EXCEÇÃO DILATÓRIA INSUPRÍVEL
IMPERMEABILIZAÇÃO DE TERRAÇO
Sumário


1- Para aferir do pressuposto processual de (i)legitimidade passiva impõe-se atender, em regra, à relação jurídica material controvertida delineada subjetiva (quanto aos sujeitos) e objetivamente (quanto ao pedido e à causa de pedir) na petição inicial e verificar se o nela réu é a pessoa que, de acordo com a facticidade alegada nesse articulado base da ação e em função da lei substantiva abstratamente aplicável a essa relação jurídica (independentemente do autor vir ou não a fazer prova dessa facticidade, que alegou), deve deter a qualidade jurídica de réu por ser a pessoa cuja esfera jurídica será diretamente atingida negativamente (sofrendo prejuízo) pela pretensão de tutela judiciária formulada pelo autor (pedido) caso esta venha a ser reconhecida pelo tribunal.
2- Instaurando o autor uma ação contra um condómino pedindo a condenação deste a realizar as obras necessárias à impermeabilização de um terraço e a suportar o custo dessas obras, bem como a indemnizá-lo pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência das infiltrações ocorridas na fração de que é proprietário, advenientes da falta de estanquicidade desse terraço, alegando que esse terraço se encontra afeto ao uso exclusivo da fração de que é proprietário o condómino por si demandado (réu) e, bem assim que esse terraço, além de servir de varanda/terraço a essa fração, em simultâneo, serve de cobertura à própria fração propriedade do autor, apesar do autor alegar que esse terraço é parte integrante da fração propriedade do condomínio que demanda e de alegar conclusivamente que a falta de estanquicidade desse terraço se deve ao “mau uso do terraço” por parte do condomínio réu posto que não cuidou em assegurar a manutenção e a conservação desse terraço, por forma a mantê-lo estanque, o certo é que a varanda/terraço em referência nos autos, atenta a facticidade alegada pelo autor, é bem imperativamente comum (art. 1421º, n.º 1, al. b) do CC).
3- Por isso, as obras necessárias à conservação e à fruição daquele terraço, de modo a manter a sua estanquicidade e, assim, garantir as funções por ele desempenhadas de cobertura e de proteção ao edifício constituído em propriedade horizontal são da responsabilidade do condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos (não aos condóminos individualmente considerados), representado pelo administrador.
3- Daí que a legitimidade passiva para a presente ação caiba ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do conjunto dos condóminos (e não aos condóminos considerados autonomamente), representado pelo administrador.
4- Sempre que o terraço de cobertura de edifício constituído em propriedade horizontal se encontre afeto ao uso exclusivo de uma ou várias frações, dada a dupla função por ele exercida, de varanda/terraço da fração ou frações a cujo uso exclusivo se encontra afeto, e de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal e, nessa medida, satisfazendo o interesse geral de todos os condóminos, impõe-se distinguir entre: a) obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto terraço, em que a execução dessas obras e o custo das mesmas são da exclusiva responsabilidade do condómino ou condóminos que têm o uso exclusivo desse terraço; e b) obras destinadas a reparar as deficiências estruturais do terraço ou a manutenção dos materiais que asseguram a sua função de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal, mormente, a sua estanquicidade, as quais são da responsabilidade do condomínio (estrutura orgânica representativo do conjunto dos condóminos), representado pelo administrador, cabendo aos condóminos, em princípio, suportar o custos dessas obras, de acordo com a regra geral supletiva da proporcionalidade, contemplada no n.º 1 do art. 1424º do CC, sem prejuízo de se vir a provar que a necessidade de executar essas obras se deveu ao facto do condómino ou condóminos que têm o uso exclusivo desse terraço terem feito um “uso anormal” daquele verem a sua responsabilizado pelo pagamento dessas despesas agravada, nos termos do n.º 3 do art. 1424º do CC, e de ao condomínio assistir o direito de regresso pelas quantias despendidas na reparação do terraço contra os terceiros, que ilícita e culposamente, por ação ou omissão, provocaram naquele terraço os estragos que reclamaram a sua reparação de modo a repor a sua função de cobertura e de proteção do edifício.
5- O condomínio constitui-se ex lege e automaticamente, com a constituição da propriedade horizontal, mal ocorra um negócio translativo da propriedade sobre uma fração, passando a existir mais do que um condómino.
6- Se a assembleia de condóminos não nomear administrador e se este não for nomeado judicialmente, mal ocorra aquele primeiro negócio translativo da propriedade sobre uma fração e passe, portanto, a existir mais do que um condómino (o instituidor da propriedade horizontal e o transmissário da fração), fica automaticamente, por imposição legal, constituído o condomínio e investido nas funções de administrador provisório o condómino cuja fração ou frações represente a maior percentagem de capital investido, salvo se outro condómino tiver manifestado vontade de exercer o cargo e tiver comunicado essa vontade aos restantes condóminos (art. 1435º-A, n.º 1 do CC).

Texto Integral


Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:

 I- RELATÓRIO

AA e mulher, BB, residentes na Rua ..., ..., ..., instauraram a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC, representada por DD, EE e FF, residentes na Rua ..., ..., ..., pedindo a condenação desta a:

a- realizar as obras necessárias à impermeabilização do logradouro da sua fração (e a suportar os custos com as mesmas), de forma a impedir que a água que aí caia (sejam das chuvas ou outras) se infiltre na fração dos Autores;
b- indemnizar os Autores da quantia de 5.002,56 euros, concernente aos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em virtude da atuação da Ré, acrescida de juros de mora, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Para tanto alegaram, em síntese, serem proprietários da fração designada pela letra ..., correspondente a cave, bem como da fração designada pela letra ..., correspondente ao ... andar destinado a habitação, ambas sitas no prédio constituído em regime de propriedade horizontal localizado no Bairro ..., ..., Rua ..., ..., freguesia e concelho ..., onde a herança indivisa Ré tem uma fração designada pela letra ..., correspondente ao rés-do-chão amplo, com uma loja ampla destinada a comércio e logradouro em frente.
Apesar de se encontrar constituído em propriedade horizontal o edifício não tem condomínio constituído.
O logradouro da fração ... é protegido por um muro e o chão deste é constituído em parte por cimento e a restante parte por pastilha (pequenos mosaicos).
O chão do logradouro apresenta diversas fissuras, buracos e deficiências.
O estado intensamente degradado do terraço impede o correto escoamento de águas do mesmo, o que resulta numa acumulação de água, que acaba por se infiltrar na fração ..., que se situa imediatamente por baixo desse terraço.
As rachadelas, fissuras e deficiências na vedação da saída da água do terraço, com a consequente perda de impermeabilização, contribui para fazer vazar a água para a fração ....
Desde há algum tempo, os Autores detetaram infiltrações de água no teto da fração ..., o que se agravou no decurso do ano de 2021, e determina que, quando chove, a água entra pelas paredes da fração, gerando verdadeiras poças de água no chão desta, o que já provocou a queda, em diversos locais, de tinta e reboco das paredes da fração; noutro locais, a tinta encontra-se empolada e levantada e as paredes e tetos da fração apresentam-se amarelados, cheios de humidade e com diversas fissuras.
A quantidade de água que se infiltra na fração é tal que está a desgastar e a corroer o próprio piso da fração, que é em cimento, e impede os Autores nada possam ter nesta e, bem assim, de a utilizar para, como habitualmente faziam, realizarem convívios com família e amigos, causando-lhe danos não patrimoniais.
Esse terraço/logradouro faz parte da cobertura do edifício.
Os Autores falaram com o falecido CC, marido e pai dos Réus, para resolver o problema, o que ele recusou, afirmando que a resolução do mesmo competia a todos os proprietários das frações do edifício.
As infiltrações de água pelo terraço é devido à não realização de obras por parte do falecido CC e pelos agora Réus que impedissem o normal desgaste provocado pelo uso do terraço enquanto tal.
Foi a atuação negligente e descuidada dos Réus, que nada fizerem para assegurar a manutenção do seu terraço, mormente arranjando e substituindo os mosaicos partidos, bem como tapando as fissuras que foram surgindo, que contribuiu para o estado completamente degrado do logradouro/terraço e, consequentemente, das infiltrações.
A Ré contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.
Suscitou a exceção perentória da prescrição dos direitos indemnizatórios e reparatórios que os Autores vêm exercer nos autos, alegando que os mesmos já têm conhecimento da situação que descrevem na petição inicial desde o ano de 2016, no decurso do qual falaram com o falecido CC da existência de infiltrações de água na sua fração e da existência dos danos que agora alegam, exigindo dele a reparação do logradouro da fração ... e a eliminação de tais danos provocados alegadamente por essas infiltrações, o que não foi então aceite pelo entretanto falecido CC. 
Suscitou a exceção dilatória de ilegitimidade passiva sustentando que o logradouro a que se reportam os Autores serve de acesso ao interior da fração ... e, como alegam, também serve de cobertura parcial da fração ... e assenta nas paredes mestras dessa fração. As infiltrações de água que provocam os alegados danos na fração dos Autores também provêm do espaço situado a poente do referido logradouro, o qual serve de corredor de acesso exclusivo às frações ... e ..., propriedade dos Autores e de GG, respetivamente. Essa entrada, com dois vãos de escadas a partir da rua pública, assenta exclusivamente nas paredes mestras da fração ..., pelo que a Ré não tem interesse em contradizer, dado que esse interesse pertence ao condomínio.
Impugnou parte da facticidade alegada pelos Autores.
Concluiu pedindo que, por via da procedência das invocadas exceções de prescrição e ilegitimidade, fosse absolvida do pedido e da instância, respetivamente, e que, em todo o caso, se julgasse a ação improcedente por não provada e se absolvesse a mesma do pedido.
 Ordenou-se a notificação dos Autores para se defenderem, querendo, no prazo de dez dias, quanto à matéria de exceção suscitada pela Ré na contestação.
Os Autores responderam, impugnando parte da facticidade alegada pela Ré para suportar a exceção de prescrição que invocaram e alegando que tanto as infiltrações como os danos por si narrados no articulado inicial são factos continuados, que se mantêm até ao presente, concluindo pela improcedência dessa exceção perentória.
Quanto a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, reafirmaram que o terraço onde as infiltrações existem pertence à Ré, sendo parte integrante da fração desta (fração ...) e que o facto desse terraço se encontrar assente sobre a cobertura do edifício em nada retira àquele espaço a qualidade de parte integrante da fração da Ré, pelo que é sobre esta que recai a obrigação de executar obras destinadas à sua reparação e impermeabilização.
Acresce que, caso se considerasse que não é dissociável a dupla função do logradouro, como terraço e como logradouro, ainda assim a responsabilidade pelas obras recai sobre a Ré, nos termos do n.º 3, do art. 1424º do CC, impondo-se, por isso, que seja julgada improcedente a invocada exceção.
Independentemente disso, caso se julgue que a Ré é parte ilegítima face à não presença dos restantes condóminos do prédio constituído em propriedade horizontal, que não tem condomínio constituído, não se impunha julgar procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, mas sim convidar os Autores para procederem ao chamamento dos restantes condóminos do edifício não demandados.
Por despacho proferido em 12/02/2023, ordenou-se a notificação das partes para, em observância do contraditório, se pronunciarem, querendo, face ao entendimento sufragado pelo tribunal a quo em função do qual, devendo o pressuposto processual de legitimidade das partes aferir-se pela relação jurídica material controvertida delineada pelos Autores na petição inicial, tomando em consideração a jurisprudência fixada no acórdão do STJ., de 02/06/2021, Proc. 2208/18.2T8PRT, nos termos da qual, “invocando a demandante infiltrações decorrentes das partes comuns do edifício constituído em regime de propriedade horizontal que integra a sua fração, as quais lhe determinam danos, pedindo não só a condenação na realização das obras de restauro e impermeabilização das partes comuns do edifício, mas também a condenação pelos prejuízos sofridos na fração de que é proprietário, distinguimos estar em causa a responsabilidade legal do Condomínio decorrente do regime da propriedade horizontal a par da responsabilidade extracontratual do Condomínio, nos termos dos arts. 1305º, 483º, 562º e 566º do Código Civil, donde, será o Condomínio, enquanto figura orgânica que representa o conjunto de condóminos, que tem interesse em contradizer, manifestado pelo prejuízo que da procedência da ação lhe pode advir, assumindo a legitimidade passiva, e não os condóminos, considerados autonomamente” e, bem assim, ponderando na circunstância dos Autores alegarem que parte do logradouro em causa nos autos será cobertura da fração da Ré herança indivisa, entender que a legitimidade passiva para a presente ação cabe ao condomínio, ocorrendo, em consequência, a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, que é insuprível.
Na sequência da notificação do despacho acabado de referir, nenhuma das partes se pronunciou.
Em 17/03/2023, dispensou-se a realização de audiência prévia, fixou-se o valor da ação em 5.002,56 euros e proferiu-se despacho saneador em que se conheceu da exceção dilatória de ilegitimidade passiva, que se julgou procedente e, em consequência, absolveu-se a Ré herança ilíquida e indivisa da instância, constando essa decisão da seguinte parte dispositiva:
“Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se julgar a verificada a ilegitimidade passiva da RÉ HERANÇA ILÍQUIDA E INDIVISA POR ÓBITO DE CC, ora representada pelos seus herdeiros DD, EE e FF e, em consequência, absolvo a mesma da instância.
Custas a cargo dos Autores”.

Irresignados com o decidido, os Autores interpuseram o presente recurso, no qual formulam as seguintes conclusões:
1. O recurso agora intentado resulta da não concordância, por parte dos Autores/Recorrentes, com a sentença proferida, em sede de despacho saneador, que julgou verificada a ilegitimidade passiva da Ré, Herança Ilíquida e Indivisa por óbito de CC e, em consequência decidiu absolver aquela da instância, desacordo que deriva da deficiente interpretação e aplicação das normas legais.
2. Ora, na ação em apreço, os Autores, peticionaram:
a) Que os Réus, DD, EE e FF, em representação da Herança Ilíquida e Indivisa por morte de CC, sejam condenados a realizarem as obras necessárias à impermeabilização do logradouro da sua fração (e suportarem os custos com as mesmas), de forma a impedir que a água que aí caia (sejam das chuvas ou outras) se infiltre na fração dos Autores; b) Serem ainda os Réus condenados ao pagamento aos Autores da quantia de 5002,56€ concernente aos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em virtude da atuação dos Réus; c) Serem, por fim, os Réus, condenados nos juros vencidos e vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento.
3. Os Recorrentes, para suportarem os pedidos acima referidos, alegaram que são proprietários das frações ... e ... do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua ..., ... e que os Réus são proprietários da fração ... do mesmo prédio, sendo que do logradouro de uso exclusivo da fração ..., que também serve de cobertura parcial da fração ..., se encontra degradado e, por conseguinte, permite a infiltração de águas para a fração ... ora pertencente aos Autores, o que lhes tem vindo a causar prejuízos e danos e que pertence àqueles a obrigação de realização de obras no logradouro em causa, pelo que deverão ser condenados na realização de tais obras e a suportar as despesas que os Autores terão para reparar o seu imóvel, bem como os danos patrimoniais e morais sofridos.
4. Os Réus/Recorridos contestaram, defendendo-se por exceção e impugnação.
5. Entretanto, a Exma. Sra. Juíza “a quo”, em sede de saneador, entendeu que, no caso concreto estamos perante uma situação de ilegitimidade singular e não uma preterição de litisconsórcio necessário, sendo aquela insuprível, o que determinou a absolvição dos Réus da instância.
6. Para a decisão tomada, a Exma. Sra. Juíza da 1.ª instância, invoca que:
“A legitimidade é um dos pressupostos processuais relativos às partes, cuja verificação é necessária para a apreciação do mérito da causa. Ora, dispõe o artigo 30.º, n.º 1, do Código de Processo Civil que “o réu é parte legítima quanto tem interesse direto em contradizer”, sendo que, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, “o interesse em contradizer [exprime-se] pelo prejuízo que dessa procedência advenha”. Por outras palavras, a legitimidade consiste numa posição concreta da parte perante a ação e não uma qualidade pessoal.
Tem vindo a ser entendido de forma maioritária, e conforme resulta da redação dada ao preceito em questão com a reforma de 1995/96, que para se aferir da legitimidade das partes deve ser tida em conta a relação controvertida tal como é configurada pelo autor, na falta de indicação da lei em contrário (cf. artigo 30.º, n.º 3 do Código de Processo Civil)”.
Feito este breve enquadramento legal, e voltando a nossa atenção para o caso em apreço, constata-se que as partes estão de acordo quanto à circunstância de tal logradouro ser cobertura parcial da fração ora pertencente aos Autores.
Por sua vez, e conforme se aduz no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de, 02.06.2021 (proferido no processo n.º 22208/18.2T8PRT.S1, disponível em www.dgsi.pt), a cujo entendimento aderimos in totum: “Invocando a demandante infiltrações, decorrentes das partes comuns do edifício constituído em regime de propriedade horizontal que integra a sua fração, as quais lhe determinaram danos, pedindo não só a condenação na realização das obras de restauro e impermeabilização das partes comuns do edifício, mas também a condenação pelos prejuízos sofridos na fração de que é proprietária, distinguimos estar em causa a responsabilidade legal do Condomínio decorrente do regime da propriedade horizontal a par da responsabilidade extracontratual do Condomínio, nos termos dos artºs. 1305º, 483º, 562º e 566º do Código Civil, donde, será o Condomínio, enquanto figura orgânica que representa o universo de condóminos, que tem interesse em contradizer, manifestado pelo prejuízo que da procedência da ação lhe pode advir, assumindo a legitimidade passiva, e não os condóminos, considerados autonomamente.” (sublinhado nosso).
Assim, no caso em apreço, e na medida em que parte do logradouro em causa (e da qual os Autores alegam que provêm as referidas infiltrações – cf. artigos 11.º e 12.º da petição inicial) será cobertura da fração dos Autores e, nessa medida, e segundo entendimento deste Tribunal, tal constituirá parte comum, assistirá ao condomínio a legitimidade passiva no caso em apreço, pois apenas o mesmo terá interesse em contradizer o ora alegado pelos Autores na parte correspondente.
E note-se que a constituição do condomínio “resulta direta e necessariamente da própria constituição da propriedade horizontal, razão pela qual com a constituição desta nasce aquele, não sendo exigível qualquer ato formal para que se tenha o condomínio por constituído” (cf. sumário do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13.03.2008, proferido no processo n.º 0831321, disponível em www.dgsi.pt).
Na verdade, e não tendo a assembleia de condóminos eleito o respetivo administrador, note-se que tais funções serão sempre desempenhadas provisoriamente a título provisório, pelo condómino cuja fração ou frações representem a maior percentagem do capital investido, salvo se outro condómino houver manifestado vontade de exercer o cargo e houver comunicado tal propósito aos demais condóminos - cf. artigo 1435.º-A do Código Civil (no caso até pertence aos Autores a representação de tal permilagem pelo que, atendendo aos interesses em conflito no caso em apreço, tais funções poderiam, quiçá, ser desempenhadas pelo proprietário da fração ...).
Na verdade, e como se refere no aludido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, “Se, substantivamente, só o condomínio tem o poder de realizar obras nas partes comuns – e não um condómino ou conjunto parcelar de condóminos, isoladamente –, só este pode ser condenado a realizá-las, quando forem devidas.
Veja-se que a condenação dos (restantes) condóminos à realização de obras – isto é, a condenação de cada um deles – obriga cada um a tal prestação – o que é um absurdo.
No limite, perante a inércia dos demais, e para evitar uma ação executiva por incumprimento da ordem do tribunal, um deles poder-se-ia ver forçado a executar as obras sozinho. É precisamente para esta ordem de questões que a lei atribui personalidade judiciária ao condomínio, repercutindo-se decisão na esfera jurídica dos condóminos, na proporção da sua permilagem – incluindo da contraparte, se também for condómino.”.
Face ao exposto, constata-se que estamos perante uma ilegitimidade singular e não perante uma preterição de litisconsórcio, sendo aquela insuprível e, por conseguinte, tal implicará a absolvição da Ré da instância, ficando prejudicado o conhecimento do demais alegado pelos Autores e Ré2.
7. Assim, o presente recurso destina-se a reverter a decisão tomada em 1.ª instância, que, julgando procedente uma ilegitimidade singular (não propositura da ação contra o Condomínio), determinou a absolvição da instância da Ré, Herança Ilíquida e Indivisa por óbito de CC.
8. Assim, os Réus consideram que a Exma. Sra. Juíza a quo incorre logo num erro, pois, na decisão que proferiu, considerou que o logradouro será cobertura da fração dos Autores, o que, “segundo entendimento deste Tribunal, tal constituirá parte comum, assistirá ao condomínio a legitimidade passiva”.
9. Ora, para além de tal questão (parte comum) estar controvertida, como resulta do alegado da petição inicial dos Recorrentes, não é a cobertura que está em causa na presente ação, mas, como se invocou e confirma, é a falta de condições do logradouro/terraço do imóvel dos Réus/Recorridos, parte integrante da sua fração, bem como o que resulta dessa falta de condições: a infiltração de água para a cobertura onde assenta tal logradouro e, desta, para a fração dos Autores/Recorrentes.
10. O que os Autores/Recorrentes pretendem é a efetivação pelos Réus/Recorridos de obras de impermeabilização do logradouro daqueles, de forma a evitar a entrada, na sua fração, de águas pluviais e outras, não estando em causa partes comuns, mas parte da fração que pertence aos Réus, sendo irrelevante o disposto nos artigos. 1424.º e 1427.º e, bem assim, qualquer hipotética situação de colisão de direitos.
11. Para corroborar tal posição os recorrentes citaram, e recitam, o decidido pelo Tribunal da Relação do Porto, vide acórdão de 07/01/2019, em que, perante uma situação idêntica, se decidiu que “Pelas obras de reparação da sua varanda, de molde a que esta não causa danos às partes comuns, mormente à cobertura, ou à fração de outros condóminos, é apenas responsável o condómino que é titular da fração de que faz parte a dita varanda.”
12. Assim, como o logradouro/terraço pertence aos Réus/Recorridos (sendo de sua utilização exclusiva), é parte integrante da sua fração, e o facto de a mesma estar assente sobre a cobertura em nada retira àquele espaço a qualidade de parte integrante da fração dos Réus, pelo que compete aos mesmos, e não ao condomínio ou qualquer outro condómino, que não os Réus/Recorridos, a realização de obras destinadas à sua reparação e impermeabilização e também o pagamento aos Recorrentes dos prejuízos (morais e patrimoniais) por si sofridos.
13. Mas mesmo que se considere que não pode ser dissociável a dupla função do logradouro ou seja como terraço mas também como cobertura, ainda assim a responsabilidade pelas obras (e despesas associadas) com o logradouro pertencerão sempre aos Recorridos, face ao disposto no n.º 3 do artº 1424º do Código Civil, que faz recair sobre o condómino que deles tem o direito de uso exclusivo (como é o caso dos Réus), toda a responsabilidade pela conservação e reparação dos mesmos.
14. Mais, ainda no que concerne a esta matéria, haverá que distinguir entre obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto tal e as obras destinadas a reparar as deficiências estruturais dos terraços ou mesmo a manutenção dos materiais que asseguram a função dos terraços enquanto cobertura.
15. E se enquanto às primeiras a responsabilidade pela sua realização e despesas associadas deve ser imputada aos condóminos que têm do terraço o uso exclusivo, atento o disposto no nº 3 do artº 1424º do CC, em relação às segundas a sua responsabilidade poderá recair sobre todos os condóminos na proporção do valor da sua fração, nos termos previsto no nº 1 do artº 1424ºdo Código Civil.
16. No caso concreto foi a atuação negligente e descuidada dos Réus/Recorridos, que nada fizeram para assegurar a manutenção do seu terraço (mormente arranjando e substituindo os mosaicos partidos, bem como tapando as fissuras que foram surgindo), que contribuiu para a situação que hoje existe, ou seja o estado completamente degradado do logradouro/terraço dos Réus/Recorridos.
17. Ou seja incumbia aos Recorridos e, reitera-se, não ao condomínio ou outro condómino, proceder à vigilância e assegurar a manutenção do seu espaço, por forma a evitar a ocorrência de quaisquer danos, não o fazendo terão de, para além de coercivamente impelidos a realizarem as obras necessárias para a reparação em apreço, suportar os danos causados aos Recorrentes.
18. Pelo que, face ao acima exposto, inexiste qualquer ilegitimidade do lado passivo, seja singular, seja preterição de litisconsórcio, pelo que deverá ser proferida decisão que revogue a sentença proferida em 1.ª instância, considerando as partes existentes como legítimas, devendo o processo continuar para definição do objeto do litigio e enunciação dos temas da prova e posterior realização de audiência de julgamento.
19. Caso não se concorde com tal posição, ainda assim, nunca poderá existir uma ilegitimidade singular, sendo que, quando muito, haverá preterição de litisconsórcio necessário, sempre suprível, face à não demanda/presença, no processo em apreço, dos proprietários/condóminos da fração ..., únicos proprietários de frações no prédio em apreço, para além dos Autores/Recorrentes e Réus/Recorridos.
20. Assim, entende a Exma. Sra. Juíza que, na situação em apreço, a ação deveria ter sido proposta contra o condomínio do edifício, na pessoa do seu administrador, onde se situam as frações em causa e não contra os proprietários das mesmas.
21. Acontece que, como se referiu explicitamente na petição inicial, vide artigo 7 de tal peça processual, inexiste condomínio constituído no prédio em causa (facto que os Réus não impugnaram, pelo contrário, admitiram).
22. Ora se o condomínio em causa inexiste, seja de facto, seja direito, como poderiam os Autores propor a ação contra tal entidade, sujeitando-se à rejeição de tal petição, ou pelo menos, a não obter qualquer efeito útil de qualquer putativa decisão, pois a ação em apreço não seria contestada, não podendo exigir qualquer tipo de responsabilidade a entidade que, pura e simplesmente, não existe.
23. Por fim, na hipótese, meramente hipotética, de se considerar que, face às especificidades da presente situação (inexistência de condomínio constituído) a ação teria de ser proposta contra todos os condóminos existentes, pois caso tal não acontecesse, os Réus/Recorridos seriam parte ilegítima, face à não presença, no processo em apreço, dos proprietários/condóminos da fração ... (reitera-se, única fração que não está representada nos presentes autos), nunca tal determinaria, desde logo, a absolvição dos Réus da instância, pelo contrário, deveria ser concedida a possibilidade dos Autores/Recorrentes procederem ao chamamento dos condóminos/proprietários em apreço, tal qual previsto nos artigos 6.º n.º 2 e 278.º n.º 3 do Código de Processo Civil.
24. Na realidade, com a evolução verificada ao longo das sucessivas reformas do Código de Processo Civil, pode afirmar-se, que a insupribilidade é hoje residual, respeitando apenas àquelas exceções que, pela sua natureza ou por via do seu regime, não consentem suprimento, oficioso ou mediante convite às partes, ao abrigo do artigo 6.º, n.º 2, do CPC, tais como a ineptidão da petição inicial, o erro na forma do processo (quando não passível de adequação formal), a litispendência e o caso julgado (artigo 577.º, al. i), do CPC), a falta de personalidade judiciária de alguma das partes e a ilegitimidade de alguma das partes, quando não proveniente da falta de intervenção de terceiro litisconsorte necessário (artigos 30.º, 53.º, 261.º e 577.º, al. e), todos do CPC) - cfr. Lebre de Freiras/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, p. 623.
25. Consagra-se, assim, um dever do juiz de zelar pela sanação da falta de pressuposto processual que seja sanável.
26. Este dever não se reporta apenas aos casos previstos em disposições legais específicas, mas abrange todos os pressupostos cuja falta possa, por natureza, ser sanada, a fim de que sejam removidos todos os impedimentos da decisão de mérito.
27. Concluindo, face ao acima referido deve-se proceder à revogação da sentença recorrida, proferindo-se decisão que julgue as partes já existentes como legítimas, devendo o processo continuar para definição do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova e posterior realização de audiência de julgamento, sendo que, caso assim se não entenda, deve-se, em alternativa, proferir decisão a determinar a descida do processo ao tribunal recorrido para decisão que proceda ao convite aos Autores/Recorrentes a suscitaram a intervenção dos condóminos/proprietários do prédio em apreço (no caso concreto os proprietários da fração ..., únicos que não estão representados no presente processo), tudo face à violação das normas extraídas dos artigos 6.º, n.º 2, 30.º, 130.º e 590.º, n.º 1, alínea a), todos do Código de Processo Civil e 1424.º n.º 3 e 1427.º do Código Civil.

PORÉM VOSSAS EXCELÊNCIAS FARÃO JUSTIÇA.

 A Ré Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso e concluindo as suas contra-alegações nos termos que se seguem:
1- Na delimitação do objeto do recurso, balizado pelas respetivas conclusões, os autores sustentam:
i) A legitimidade das partes; ou, assim não se entendendo,
ii) Que sejam os autores convidados a suprirem a ilegitimidade, suscitando a intervenção do proprietário da fração ..., do prédio em que se louvam.
2- Os autores delimitam a causa de pedir quando alegam na sua petição inicial que o logradouro da fração ..., da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de CC, de onde alegadamente provém as infiltrações para a sua fração (“…) serve de terraço à fração ... e também de cobertura parcial do imóvel dos Autores…” (artigo 8.º da petição inicial).
3- Nestas circunstâncias, em conformidade com o que se extrai do artigo 1421.º, n.º 1, al. b), do Código Civil, esse logradouro é parte comum do edifício onde se integram as quatro frações dos autos.
4- De resto, para sustentarem a sua tese, os autores invocam o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/01/2019, proferido no âmbito do processo 5568/15.4T8MTS.P1, publicado in www.dgsi.pt, o qual decidiu que “Pelas obras de reparação da sua varanda, de molde a que esta não causa danos às partes comuns, mormente à cobertura, ou à fração de outros condóminos, é apenas responsável o condómino que é titular da fração de que faz parte a dita varanda”.
5- Porém, o caso decidido neste Acórdão não configura uma situação idêntica à dos autos, uma vez que, aí a varanda “assenta em parte da cobertura” e “Os danos (…) ocorrem na varanda do R. e não na cobertura (…)”.
6- In casu, como ficou expresso da alegação dos autores, o denominado logradouro não assenta na cobertura, mas serve simultaneamente “de terraço à fração ... e também de cobertura parcial do imóvel dos Autores, ou seja, a fração ....
7- Nestes termos, convencidos da bondade da decisão recorrida e da jurisprudência sufragada no Acórdão do STJ de 02/06/2021, no âmbito do processo n.º 22208/18.2T8PRT.S1, publicado in www.dgsi.pt e, por isso, mudando de opinião em relação ao que se alegou na contestação, em sede de exceção, quando se defendeu que se exigia a intervenção de todos os condóminos, entende-se agora que, atenta a forma como os autores configuram a relação controvertida, assiste ao Condomínio do prédio constituído em regime de propriedade horizontal dos autos, a legitimidade passiva para contradizer os factos por si alegados.
8- Consequentemente, estamos perante uma situação de ilegitimidade passiva singular, insuscetível de ser sanada ou suprível, não podendo ser ultrapassada por via da dedução de incidente de intervenção provocada.
9- Em face do exposto, os réus em representação da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de CC são partes ilegítimas e, consequentemente, afigura-se-nos que a jurisprudência sufragada na decisão recorrida, à qual se adere, é a que melhor se ajusta ao caso sub judice.
Termos em que, deve negar-se provimento ao presente recurso e confirmar-se a sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA.

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A 1ª Instância admitiu o recurso interposto como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, o que mereceu a adesão do relator.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos apelantes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam do conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido objeto da decisão sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido nelas apreciadas, visando obter a anulação de tais decisões quando padeçam de vício determinativo da sua nulidade, ou a sua revogação ou alteração quando padeçam de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito, nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de  natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído ou devesse recair a decisão recorrida[1].
No seguimento desta orientação, cumpre ao tribunal ad quem apreciar duas questões que se reconduzem em saber:
a- se o despacho saneador recorrido, ao nele se ter julgado procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva e, em consequência, ao ter-se absolvido a apelada (Ré herança ilíquida e indivisa) da instância, padece de erro de direito e se, por conseguinte, se impõe revogar essa decisão e julgar improcedente a mencionada exceção e ordenar o prosseguimento dos autos;
b- subsidiariamente, se se impõe anular o saneador recorrido e ordenar que a 1ª Instância convide os apelantes a suprirem essa exceção dilatória, suscitando a intervenção dos condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal que não foram por eles demandados.
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos que relevam para o conhecimento do objeto do recurso são os que constam do relatório acima exarado, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
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IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
A- Da exceção dilatória da (i)legitimidade passiva
Os apelantes instauraram a presente ação contra a apelada herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC pedindo a condenação desta a realizar as obras necessárias à impermeabilização do logradouro da fração desta e a suportar os custos com essas obras, de forma a impedir que água que aí cai, sejam da chuva ou outra, se infiltre na fração propriedade dos apelantes, bem como a pagar-lhes a quantia de 5.002,56 euros, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora desde a citação.
Como causa de pedir dessas pretensões alegaram serem proprietários da fração ..., em edifício constituído em propriedade horizontal, mas sem condomínio constituído, onde a apelada é proprietária da fração ..., a qual tem um logradouro em frente, que “pertence” a essa fração e serve de cobertura parcial à fração propriedade dos apelantes.
Esse logradouro apresenta-se intensamente degradado, impedindo o correto escoamento da água que sobre ele cai, o que resulta na acumulação desta, acabando a água por se infiltrar na fração propriedade dos apelantes, onde já causaram diversos estragos (que concretizam), e impedindo os últimos de dela poderem fruir plenamente, causando-lhes danos patrimoniais e não patrimoniais, que igualmente especificam, cuja indemnização reclamam.
Mais alegam que esse estado degradado do logradouro decorre do “normal desgaste provocado pelo uso do terraço enquanto tal” e da circunstância do de cujus e, na sequência do óbito deste, os seus sucessores, não terem realizado as obras necessárias à conservação desse logradouro, inclusivamente, quanto interpelaram o falecido para resolver o problema.
A 1ª Instância veio a julgar procedente a exceção de ilegitimidade passiva suscitada pela apelada, valendo-se da jurisprudência explanada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (doravante STJ) de 02/06/2021, Processo n.º 2208/18.2T8PRT.S1; na consideração de que o pressuposto processual de legitimidade tem de ser aferido de acordo com a relação jurídica material controvertida delineada pelos apelantes na petição; e na alegação dos apelantes, em sede de petição inicial, de que o logradouro de onde provêm as infiltrações é cobertura da fração propriedade daqueles e, por conseguinte, na perspetiva do tribunal a quo, parte imperativamente comum do edifício constituído em propriedade horizontal, pelo que, a legitimidade passiva para contradizer esta concreta relação jurídica material controvertida impende sobre o condomínio, até porque, “como se refere no aludido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, se, substantivamente, só o condomínio tem o poder de realizar obras nas partes comuns – e  não um condómino ou conjunto parcelar de condóminos, isoladamente” – só este pode ser condenado a realizá-las, quando forem devidas” e, em consequência, absolveu a apelada da instância.
O inconformismo dos apelantes quanto ao decidido prende-se com o facto de, na decisão recorrida, se ter considerado que o logradouro é cobertura da fração propriedade daqueles e, consequentemente, é parte imperativamente comum do edifício constituído em regime de propriedade horizontal, quando essa questão, na sua perspetiva, permanece em aberto, uma vez que, conforme resulta do alegado na petição inicial, “não é a cobertura que está em causa na presente ação. O que se alegou e verifica é a falta de condições do logradouro/terraço do imóvel dos Réus/recorridos, parte integrante da sua fração, bem como o que resulta dessa falta de condições: a infiltração de água para a cobertura onde assenta tal logradouro e desta para a fração dos Autores/Recorrentes. O que os Autores pretendem é a realização pelos Réus/Recorridos de obras de impermeabilização do logradouro daqueles, de forma a evitar a entrada, na sua fração, de águas pluviais e outras”, e concluem que, de acordo com a relação material controvertida que delinearam na petição inicial não estão em causa “partes comuns, mas parte da fração que pertence aos Réus”, sendo “irrelevante o disposto nos artigos 1424º e 1424º e, bem assim, qualquer hipotética situação de colisão de direitos”. Em abono deste seu ponto de vista invocam a jurisprudência do acórdão da Relação do Porto de 07/01/2019, cujo sumário consta do seguinte: “Pelas obras de reparação da sua varanda, de molde a que esta não cause danos às partes comuns, mormente à cobertura, ou à fração de outros condóminos, é apenas responsável o condomínio que é titular da fração de que faz parte a dita varanda”.
Mais sustentam que, ainda que se considerasse não ser dissociável a dupla função do logradouro como terraço e como cobertura, ainda assim, as obrigações reparatórias e indemnizatórios que reclamam da apelada teria de recair sobre a última por via do disposto no n.º 4, do art. 1424º do Código Civil (CC), porquanto, o que está em causa nos autos é a obrigação de realizar obras de manutenção do terraço enquanto terraço e o incumprimento dessa obrigação por parte da apelada, que lhe é imposta pelo identificado dispositivo legal, pelo que a legitimidade passiva para a presente ação recai sobre a última (herança ilíquida e indivisa).
Finalmente, entendem que, perante a particularidade do caso, em que o edifício constituído em propriedade horizontal, não tem condomínio constituído, caso efetivamente a presente ação tivesse de ser intentada contra o condomínio, a ação teria de ser instaurada contra todos os condóminos desse edifício, ocorrendo uma situação litisconsorcial entre eles, o que  demandava que o tribunal a quo, no uso dos seus poderes funcionais, tivesse de os convidar a suprir a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, fazendo intervir nos autos os condóminos do prédio que não foram por si demandados.
Vejamos se assiste razão aos apelantes para os erros de direito que assacam à decisão recorrida.
Todavia, antes de entrarmos nessa apreciação impõe-se elucidar uma questão prévia suscitada pelos apelantes, da qual não extraíram qualquer consequência jurídico no âmbito do presente recurso, mas que, ainda assim, importa esclarecer para evitar equívocos.
No ponto 16º das alegações os apelantes alegam “que a ação em apreço não foi proposta contra a Herança Ilíquida e Indivisa por óbito de CC, mas sim contra os seus representantes (que aceitaram tal configuração)”. Daí que, “se alguém tinha de ser absolvido da instância teriam de ser os Réus, individualmente e não a Herança”, conforme decidido no despacho saneador recorrido.
A este propósito, cumpre dizer que o equívoco em que se encontram os apelantes é por demais manifesto e indiscutível, na medida em que os mesmos instauraram a presente ação contra DD, EE e FF, “todos em representação da herança Ilíquida e Indivisa por óbito de HH”- cfr. parte introdutória da petição inicial.
Por sua vez, conforme se alcança da simples leitura da parte introdutória da contestação apresentada nos autos, os identificados DD, EE e FF, são nela expressos em intitular-se: “réus, em representação da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de CC.
Logo, contrariamente ao pretendido pelos apelantes, estes não só não demandaram DD, EE e FF a título pessoal, como os últimos não contestaram a presente ação a título pessoal, mas antes foram nela demandados e contestaram em representação da Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC, que é, assim, quem é parte na presente ação, onde assume a posição jurídico-processual de Ré e em cuja esfera jurídica, enquanto representada, se projetam os efeitos jurídicos dos atos processuais já praticados no âmbito da presente ação e dos que nela venham a ser praticados, bem como dos efeitos processuais ou substantivos da decisão neles a proferir.
Destarte, apesar de crítica assacada pelos apelantes ao despacho recorrido, a qual, como se acaba de demonstrar, é destituída de qualquer fundamento fáctico e/ou jurídico, bem andou a 1ª Instância ao considerar que quem assume a posição jurídico processual de ré nos presentes autos é a Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC (e não DD, EE e FF a título pessoal) e ao ter, em consequência da procedência da exceção de ilegitimidade passiva, absolvido essa herança da instância.
Posto isto, enfatize-se que, perante uma determinada relação jurídica material controvertida submetida pelo autor à apreciação e à decisão do tribunal e que por ele vem delineada subjetiva (quanto aos sujeitos) e objetivamente (quanto ao pedido e à causa de pedir) na petição inicial, impõe-se que o tribunal verifique, antes de mais, se estão ou não recolhidos os elementos mínimos, considerados indispensáveis pela lei adjetiva, que lhe possibilitem entrar na apreciação do mérito dessa relação jurídica, ou seja, se estão ou não preenchidos os denominados pressupostos processuais.
Com efeito, os pressupostos processuais “são precisamente os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz proferir decisão sobre o pedido formulado, concedendo ou indeferindo a providência requerida. Trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa. Não se verificando algum desses requisitos, como a legitimidade das partes, a capacidade judiciária de uma delas ou de ambas, o juiz terá, em princípio, que abster-se de apreciar a procedência ou improcedência do pedido, por falta de um pressuposto essencial para o efeito”[2].
A ausência de um pressuposto processual impõe, assim, ao juiz que profira uma decisão meramente processual, sem entrar na discussão do mérito, isto é, nos bens discutidos no processo, indeferindo liminarmente a petição inicial sempre que o processo comporte despacho liminar; não o comportando, sempre que se aperceba desse vício, ordene que, por razões de economia e celeridade processual, os autos lhe sejam feitos conclusos para despacho liminar; ou numa fase processual posterior, mas o mais tardar, em sede de despacho saneador, absolvendo o réu da instância ou, se esse for o caso e se encontrarem preenchidos os respetivos pressupostos legais, remetendo o processo para o tribunal competente (art. 576º, n.º 2 do CPC).
Atendendo ao fim visado almejar com os pressupostos processuais, compreende-se que estes tenham, em princípio, de ser aferidos por referência à relação jurídica material controvertida tal como esta vem delineada, em termos subjetivos e objetivos, pelo autor na petição inicial.
Um dos pressupostos processuais é o da legitimidade das partes, a que alude o art. 30º do CPC.
Mediante o pressuposto processual da legitimidade exige-se que, para que o juiz possa entrar na apreciação do mérito da relação jurídica material controvertida que lhe é submetida pelo autor a apreciação e a decisão, julgando a ação procedente ou improcedente, que nela figurem como autor e como réu as “partes exatas” dessa relação jurídica controvertida submetida pelo autor ao tribunal.
“Ser parte exata no processo”, ou parte legítima neste, significa que nele tem de figurar como autor a pessoa que tem o poder de dirigir a pretensão deduzida em juízo, e como réu aquele que tem o poder de dirigir a defesa contra essa pretensão. “A parte terá legitimidade como autor, se for ela quem juridicamente pode fazer valer a pretensão em face do demandado, admitindo que a pretensão exista; e terá legitimidade como réu, se for ela a pessoa que juridicamente pode opor-se à procedência da pretensão, por ser ela a pessoa cuja esfera jurídica é diretamente atingida pela providência requerida. Se assim não suceder, a decisão que o tribunal viesse a proferir sobre o mérito da ação, não poderia surtir o seu efeito útil, visto não puder vincular os verdadeiros sujeitos da relação controvertida ausentes da lide”[3].
Deste modo, exige-se que entre quem figure na ação como autor e como réu e o objeto dessa ação desenhado pelo autor na petição inicial interceda uma certa relação, de forma a que se possa afirmar que esses sujeitos são as partes certas dessa relação jurídica[4].
O pressuposto processual da legitimidade exprime-se precisamente pela relação que, segundo a lei processual civil, tem de existir entre as partes (sujeitos) que figuram no processo e o objeto desse processo (pedido e causa de pedir), sem o que não poderá o juiz entrar na apreciação do mérito da relação jurídica material controvertida que lhe é submetida pelo autor,  a fim de a dirimir naquele concreto processo, por nele não figurar como autor quem tem o poder de dirigir contra o aí réu aquele concreto pedido, atenta a respetiva causa de pedir que o suporta e que fora alegada pelo mesmo na petição inicial (ilegitimidade ativa) e/ou por não figurar como réu a pessoa a quem assiste o direito de defesa em relação a esse concreto pedido assente na específica causa de pedir alegada pelo autor na petição inicial (ilegitimidade passiva).
Dito por outras palavras, tal como no campo do direito material, há que se aferir pela titularidade dos interesses em jogo face à facticidade que se quedou como provada e não provada e a lei substantiva aplicável, se  aquele (autor) que se arroga titular do direito de onde faz derivar o pedido é efetivamente titular desse direito (ex: titular do direito de propriedade, titular de direito de crédito, etc.), e se o réu lesou efetivamente esse direito e se essa lesão permite ou não reconhecer ao autor a pretensão de tutela judiciária (pedido) que formula contra o réu, de molde a julgar procedente ou improcedente o pedido deduzido pelo autor - legitimidade substantiva -, em sede de pressuposto processual da legitimidade (exceção dilatória), há que se averiguar, se de acordo com a lei processual civil e, em regra, atenta a relação jurídica delineada pelo autor na petição inicial, figura no processo como autor e como réu as pessoas que devam deter essas qualidades jurídicas.
De acordo com os n.ºs 1 e 2 do art. 30º do CPC, o autor é parte legítima quando tenha interesse direto em demandar, o que se exprime pela utilidade derivada da procedência da ação; e o réu é parte legitima quando tenha interesse direto em contradizer, o que se exprime pelo prejuízo que da procedência da ação lhe advenha. E, nos termos do n.º 3, desse art. 30º, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.
Decorre dos comandos legais acabados de enunciar que, para que o juiz se possa pronunciar sobre o mérito da causa, terá, em sede de pressuposto processual de legitimidade, que considerar, exclusivamente e em regra (“na falta de indicação da lei em contrário”), a relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial, atentos os elementos subjetivos (sujeitos) e objetivos (pedido e causa de pedir) nela delineados e, bem assim, terá, em seguida, de recorrer ao direito substantivo para verificar se, em abstrato (isto é, independentemente da prova dos factos narrados na petição inicial constitutivos do direito de que o autor aí se arroga titular e de onde faz derivar o pedido),  em função dessa relação jurídica material controvertida que delineou nesse articulado base ou fundamentador da ação, o autor é efetivamente a pessoa a quem a lei substantiva reconhece o estatuto de parte legítima para discutir em juízo o direito a que aquele se arroga titular, atentos os factos constitutivos desse direito que alegou naquele articulado inicial (no pressuposto de os vir a provar), por ser o titular incontestado do direito em causa e, bem assim, se foi demandado como réu a pessoa que, de acordo com a mesma lei substantiva, por referência a essa mesma relação jurídica delineada na petição inicial, detém essa qualidade jurídica, por ser a pessoa que tem interesse direto em contradizer, por ser aquela cuja esfera jurídica será diretamente atingida pela pretensão do autor (pedido) caso esta venha a ser-lhe reconhecida.
Conforme se expende no acórdão do STJ. de 02/06/2021, a que a 1ª Instância se socorreu no despacho sob sindicância para fundamentar o nele decidido: “A legitimidade processual é o pressuposto adjetivo através do qual a lei seleciona os sujeitos de direito admitidos a participar em cada processo trazido a Juízo, aferida em vista de um critério substantivo – o interesse em demandar e em contradizer. O critério para apreciar da legitimidade passiva prende-se com “o interesse em contradizer” manifestado pelo prejuízo que da procedência da ação advenha para o demandado, enquanto sujeito da relação material controvertida – tal como é configurada pelo autor, que, de todo, deve ser confundido com o pressuposto processual positivo, ou seja, uma condição que deve estar preenchida para que possa ser proferida a decisão de mérito, a denominada legitimidade ad causam[5].
Enfatize-se que, nos termos do n.º 1 do art. 30º, para que o pressuposto processual da legitimidade ativa ou passiva se afirme, não basta que exista da parte de quem figura no processo como autor e como réu um qualquer interesse, ainda que jurídico, respetivamente, na procedência ou improcedência da ação, na medida em que se exige que figurem no processo como autor e como réu tenha um interesse jurídico “direto”, seja em demandar, seja em contradizer.
Não basta, assim, à afirmação do pressuposto processual de legitimidade que, em função da relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial, as partes tenham um interesse moral, científico ou afetivo em demandar ou contradizer, nem sequer que o interesse jurídico que aquelas eventualmente tenham em discutir essa relação jurídica material controvertida delineada na petição inicial seja meramente indireto, reflexo ou derivado.
Conforme ponderam Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, o promitente comprador não tem legitimidade ativa para requerer a declaração judicial de validade do contrato pelo qual o promitente vendedor adquiriu a coisa prometida vender-lhe de terceiro, embora tenha um interesse indireto na manutenção do contrato. O sublocatário, pela mesma razão, carece de legitimidade passiva para intervir como réu na ação de despejo intentada pelo senhorio contra o locatário, apesar de ser diretamente prejudicado com a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre senhorio e locador[6].
Em suma, para se aferir do pressuposto processual de legitimidade passiva e ativa, tem que se atender, por norma – “salvo disposição da lei em contrário” -, exclusivamente à relação jurídica material controvertida tal como esta vem delineada, subjetiva e objetivamente, pelo autor na petição inicial e indagar se, no pressuposto dos factos que por aquele aí vêm narrados como sendo constitutivos do direito a que se arroga titular e de onde faz derivar o pedido, de acordo com a lei substantiva aplicável em abstrato a esses factos narrados na petição, o autor é o titular do direito que pretende exercer na ação e de onde faz derivar/assentar o pedido, caso em que se concluirá pela respetiva legitimidade ativa; e, por outro lado, verificar se a pessoa por ele demandada, ou seja, contra quem formula a pretensão que pretende que o tribunal lhe reconheça (pedido) – o réu -, é perante os factos narrados (pelo autor) naquela articulado inicial, quando submetidos à lei substantiva aplicável em abstrato a esses factos, a pessoa que tem interesse direto em contradizer, por ser aquela cuja esfera jurídica será diretamente atingida negativamente em caso do pedido vir a proceder.
Anote-se e reafirma-se, uma coisa é saber se as partes são os sujeitos da pretensão formulada para efeitos do pressupostos processual da legitimidade, em que apenas se impõe, em regra, atender à relação jurídica material controvertida desenhada pelo autor em sede de petição inicial, independentemente de este vir (ou não) a provar os factos que nela alegou como constitutivos do direito a que se arroga titular e de onde faz derivar/assentar o pedido que deduz contra o réu, e outra, diversa, é apurar se a pretensão que o autor formula nos autos lhe assiste efetivamente, ou seja, se o autor é o efetivo titular do direito que pretende exercer contra o réu, se o réu violou efetivamente esse direito e, no caso positivo, se assiste efetivamente ao autor o direito ao reconhecimento por parte do tribunal das pretensões que pretende que este lhe reconheça contra a pessoa do réu, o que já nada tem a ver com o pressuposto processual de legitimidade, isto é, com a exceção dilatória de legitimidade ativa ou passiva, mas antes com o mérito da ação, isto é, com a legitimidade substantiva, por estar dependente da verificação dos requisitos de facto e de direito que condicionam o  nascimento dessa obrigação, o seu objeto e a sua perduração[7].
Significa isto que o legislador nacional, na esteira do que já era o entendimento jurisprudencial dominante, mediante a consagração do n.º 3 do art. 30º, pôs termo à discussão clássica entre Alberto dos Reis e Barbosa de Magalhães, optando pela tese deste último, ao estatuir que ao apuramento da exceção de legitimidade ativa e passiva apenas interessa, por regra, a relação jurídica material controvertida desenhada pelo autor na petição inicial, independentemente da prova dos factos que a integram[8].
Assentes nas premissas que se acabam de enunciar, compulsada a petição inicial, os apelantes pretendem que se condene a apelada, Ré herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC, a realizar as obras necessárias à impermeabilização do logradouro/terraço da fração desta e a suportar os custos com essas obras, de forma a impedir que a água que aí caia, seja da chuva ou outra, se infiltre na fração propriedade dos apelantes e, bem assim, a pagar-lhes a quantia de 5.002,56 euros, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora.
De acordo com a relação jurídica material controvertida delineada pelos apelantes na petição inicial estes são proprietários da fração designada pela letra ..., enquanto a apelada é proprietária de fração designada pela letra ..., sitas ambas num edifício constituído em propriedade horizontal. A fração ... é composta por “rés-do-chão amplo, com uma loja destinada a comércio, com 152 m2, e logradouro, com 70 m2” (cfr. art. 6º da p.i.)Esse logradouro “pertence à fração ..., serve de terraço à fração ... e também de cobertura parcial ao imóvel dos Autores”, ou seja, à fração ...  (cfr. art. 8º da p.i.) e encontra-se num estado “intensamente degradado”, apresentando “rachadelas, fissuras e deficiências na vedação da saída de água no terraço, com a consequente perda de impermeabilização”, impedindo “o correto escoamento de águas do mesmo, o que resulta numa acumulação de água que, necessariamente, acaba por infiltrar-se para a fração que se lhe encontra imediatamente abaixo, ou seja, a fração ..., fração essa pertencente aos Autores” (cfr. arts. 11º e 12º da p.i.). O “terraço/logradouro é de uso exclusivo por parte da fração identificada pela letra ..., o qual faz parte da cobertura do edifício” (cfr. art. 20º da p.i.). O “estado do logradouro dos Réus encontra-se na situação em apreço devido à não realização de obras, por parte do falecido CC e agora dos Réus, que impedissem o normal desgaste provocado pelo uso do terraço enquanto tal” (cfr. art. 22º da p.i.). “Na realidade a situação na fração dos Autores deve-se à falta de manutenção e de conservação do logradouro acima referido (onde facilmente se visualiza a pastilha partida e diversas fissuras), o que provoca a falta de drenagem e impermeabilização do espaço em causa, que permite a passagem das águas pluviais e outras para o imóvel dos Autores” (cfr. art. 24º da p.i.).
A pretensão reparatória e indemnizatória formulada pelos apelantes na petição inicial contra a apelada funda-se, assim, no instituto da responsabilidade civil extracontratual, por factos ilícitos e na culpa da apelada (herança ilíquida e indivisa), decorrente do logradouro/terraço da fração ..., sua propriedade, estar afeto ao uso exclusivo dessa fração e (segundo a alegação conclusiva dos apelantes) fazer parte integrante da mesma, servindo de cobertura parcial da fração ..., de que os apelantes são proprietários, sem que a apelada tivesse realizado obras de manutenção e de conservação desse logradouro/terraço, levando ao estado de degradação em que este se encontra e às consequentes infiltrações de água na fração ..., propriedade dos apelantes, onde causaram já estragos diversos, provocando-lhes danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja indemnização reclamam.
A relação jurídica material controvertida delineada pelos apelantes na petição inicial versa, assim, sobre duas frações autónomas integradas em edifício constituído em regime de propriedade horizontal, provindo as infiltrações de água na fração propriedade daqueles de um logradouro/terraço que integrará a fração propriedade da apelada e que se encontra afeto ao uso exclusivo dessa última fração, infiltrações essas que decorrem alegadamente da falta de realização de obras de manutenção e de conservação por parte da apelada nesse logradouro, de modo a mantê-lo impermeabilizado e estanque.
Note-se que, a propriedade horizontal é um tipo específico de direito real de gozo no qual se combina a propriedade e a compropriedade, fundindo-se tais direitos, de modo incindível, num novo tipo de direito real, que não se traduz na simples justaposição ou cumulação, inalterada, do regime de outros direitos reais admitidos por lei, designadamente, da propriedade singular ou exclusiva e da compropriedade, mas que assenta na consideração de que “enquanto existir o direito singular à fração  não pode deixar de existir o direito comum às partes comuns, as quais estão ligadas àquelas por razões funcionais, nos moldes fixados no correspondente estatuto e cuja identidade subsiste até que seja modificado por unanimidade”[9].
Nesta linha, estabelece o art. 1420º do CC, que cada condomínio é proprietário exclusivo da fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício (n.º 1), sendo o conjunto dos dois direitos incindível, não podendo nenhum deles ser alienado separadamente, nem sendo lícito aos condóminos renunciar à parte comum como meio de se desonerarem das despesas necessárias à sua conservação ou fruição (n.º 2).
Na propriedade horizontal concorrem, assim, necessariamente dois direitos interligados e incindíveis: o direito da propriedade plena de cada condómino sobre a fração de que é proprietário, sobre a qual exerce os poderes erga omnes de pleno e exclusivo gozo, fruição e disposição da sua fração, reconhecidos pelo art. 1305º do CC, e o direito de compropriedade sobre as partes comuns do edifício, sendo os dois direitos incindíveis,  na medida em que a compropriedade que se verifica em relação às partes comuns é uma compropriedade forçada, imposta ex lege,  no sentido de que não é possível sair da indivisão (ao contrário do que sucede na compropriedade normal)[10], pelo que, o condómino não pode vender a fração de que é proprietário exclusivo sem concomitantemente vender a sua quota parte nas partes comuns do edifício, ou vice-versa, ou renunciar ao seu direito de compropriedade sobre as partes comuns.
A propriedade horizontal cria, portanto, “um novo estatuto para o prédio. Por efeito dela, o prédio perde a qualidade originária de coisa unitária para dar lugar a uma pluralidade de coisas novas – as frações autónomas -, a que por sua vez estão indissociavelmente afetas as partes comuns. O que singulariza o regime da propriedade horizontal, o “traço de caráter” que verdadeiramente lhe confere identidade própria, é a síntese que representa entre direitos de propriedade singular sobre as frações autónomas a favor da cada um dos condóminos, de um lado, e a compropriedade que a favor de todos, em conjunto, se estabelece sobre as partes comuns, de outro lado. Do ponto de vista da posição jurídica do condómino, o direito de propriedade horizontal aglutina de forma incindível aquelas duas espécies de titularidade. Em suma, surge uma nova realidade jurídica, a que, por via de regra, não corresponde uma nova realidade material, salvo se o novo regime, quando incidente sobre prédios antigos, implicar a realização prévia de obras para o adequar ao novo figurino”[11].  
O direito de compropriedade dos condóminos sobre as partes comuns de edifício constituído em propriedade horizontal encontra-se sujeito ao regime jurídico da compropriedade enunciado nos arts. 1403º a 1413º do CC, com as especialidades próprias previstas nos arts. 1421º, 1424º, 1427º e 1430º a 1438º-A do CC.
No n.º 1 do art. 1421º do CC, a lei enuncia, de modo taxativo, as partes do edifício constituído em propriedade horizontal que são imperativamente comuns, enquanto no n.º 2 desse preceito, elenca as partes que apenas se presumem como comuns, e prevê, no seu n.º 3, que o título constitutivo pode afetar ao uso exclusivo de um condómino certas zonas das partes comuns.
Deste modo, enquanto as partes do edifício que se encontram elencadas taxativamente no n.º 1 do art. 1421º são imperativamente comuns, não admitindo, por isso, a lei que o título constitutivo ou os condóminos excluam essas partes da natureza comum que lhes é atribuída ex lege, sem prejuízo de admitir que o título constitutivo possa afetar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas zonas dessas partes imperativamente comuns (n.º 3), as partes elencadas no n.º 2 desse mesmo preceito presumem-se apenas terem natureza comum, o que significa que essa presunção pode ser ilidida, mediante prova em contrário, desde que se prove que os referidos elementos foram atribuídos pelo título constitutivo da propriedade horizontal a um ou alguns dos condóminos, ou adquiridos por estes através de atos possessórios, ou cuja natureza comum seja necessariamente afastada por esses elementos apenas poderem servir, pela sua destinação objetiva, apenas um ou alguns dos condóminos[12].
Com interesse para o caso dos autos, no que respeita às partes imperativamente comuns de prédio constituído em propriedade, estabelece o n.º 1, do art. 1421º serem (imperativamente) comuns: a) “o solo, bem como os alicerces, colunas, paredes mestras e todas as partes restantes que constituem a estrutura do prédio; b) O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fração; c) (…); d) (…)”.
Centrando-nos no conceito de “paredes mestras”, estas são as que constituem o esqueleto do edifício, desde as fundações até à cobertura, sem as quais a construção, no seu conjunto, seria impossível[13]. Por isso, não se pode confundir “paredes mestras” com paredes perimetrais ou exteriores, uma vez que as novas técnicas construtivas levaram que a estrutura e a segurança dos edifícios deixassem de assentar naquilo que tradicionalmente se denominava de paredes exteriores do edifício, para passar a assentar numa estrutura constituída fundamentalmente por vigas e colunas ou pilares de ferro e cimento, de modo que “àquilo a que tradicionalmente se chamava paredes mestras correspondem hoje as paredes que tapam verticalmente os espaços entre vigas e as colunas ou pilares”. E “paredes mestras são ainda as paredes interiores que, pertencendo à ossatura do imóvel, não podem ser livremente alteradas ou eliminadas sem risco de toda a construção”[14].
Note-se que as janelas, com os respetivos pertences (caixilhos, persianas, vidros, etc.), balcões, varandas, escadas de acesso a uma fração ou quaisquer outras aberturas que se rasguem ou apoiem nas paredes mestras são distintas destas, não podendo ser consideradas como acessórios da parede mestra onde foram rasgadas ou em que assentam, mas antes são acessórios da fração autónoma que servem e como tal pertencem ao dono da respetiva fração autónoma de que são acessório[15].
No que respeita ao telhado ou os terraços de cobertura, que a al. b), do n.º 1, art. 1421º considera serem imperativamente comuns, o telhado é a parte do edifício que o cobre, sendo normalmente composto por uma ossatura de traves cobertas de telhas, enquanto os terraços de cobertura são telhados sui generis, porque se trata de coberturas do edifício construídas em pedra, cimento ou outro material, mas sem telhado, e que são acessíveis por baixo[16].
Ainda que o terraço de cobertura, dada a sua estrutura em laje, permita a sua utilização e venha, nos termos do art. 1421º, n.º 1, al. b), parte final, a ser afeto, pelo título constitutivo da propriedade horizontal, ao uso exclusivo de uma ou várias frações, nem por isso aquele perde a sua natureza de parte imperativamente comum, conforme decorre expressamente da parte final dessa alínea b), o que se bem compreende atenta a função capital de cobertura ou de proteção do imóvel que o mesmo exerce.
Decorre do exposto que, quanto às varandas, impõe-se distinguir as que assentam na parede mestra de edifício constituído em propriedade horizontal, mas que nada têm a ver com o terraço de cobertura que cobre, total ou parcialmente, o edifício constituído em propriedade horizontal, sendo autónomas fisicamente desse terraço de cobertura, daquela outra situação em que a varanda de uma dada fração mais não é do que a totalidade ou parte do terraço de cobertura que cobre, total ou parcialmente, o edifício; na primeira situação, ainda que a varanda assente na parede mestra do edifício constituído em propriedade horizontal, não é acessório dessa parede mestra, mas antes é acessório da fração de que faz parte e, em consequência, é parte integrante dessa fração, sendo parte integrante do direito de propriedade do condomínio proprietário dessa fração; na segunda situação, ainda que a varanda se encontre afeta ao uso exclusivo de uma fração, essa varanda, porque para além da função de varanda, também exerce a função de cobertura e de proteção (total ou parcial) do edifício constituído em propriedade horizontal, é parte imperativamente comum por imposição legal, sem que seja legalmente admissível que o título constitutivo da propriedade horizontal disponha diversamente (que, nessa parte, se o fizer, será nulo) e sem que seja legalmente possível à assembleia de condóminos integrar a mesma na propriedade exclusiva da fração.
Assente nas premissas que se acabam de enunciar, imputam os apelantes erro de direito ao despacho saneador recorrido, ao nele se ter considerado que a logradouro/terraço a que aludem na petição inicial é cobertura da fração propriedade dos mesmos e se ter, consequentemente, concluído que este é parte imperativamente comum do edifício constituído em propriedade horizontal, quando, na sua perspetiva, essa questão permanece em aberto, uma vez que, conforme resulta do alegado na petição inicial, “não é a cobertura que está em causa na presente ação. O que se alegou e verifica é a falta de condições do logradouro/terraço do imóvel dos Réus/recorridos, parte integrante da sua fração, bem como o que resulta dessa falta de condições: a infiltração de água para a cobertura onde assenta tal logradouro e, desta, para a fração dos Autores/Recorrentes. O que os Autores pretendem é a realização pelos Réus/Recorridos de obras de impermeabilização do logradouro daqueles, de forma a evitar a entrada, na sua fração, de águas pluviais e outras”, e concluem que, de acordo com a relação jurídica material controvertida que delinearam na petição inicial, não estão em causa “partes comuns, mas parte da fração que pertence aos Réus”, sendo “irrelevante o disposto nos artigos 1424º e 1424º e, bem assim, qualquer hipotética situação de colisão de direitos”, mas antecipe-se desde já, sem razão.
É certo que, na petição inicial, no ponto 6º desta, os apelantes alegaram que a fração ... corresponde, “tal qual alegado supra e como decorre da descrição predial do prédio em apreço e da certidão matricial, ao rés-do-chão amplo, com 1 loja ampla destinada a comércio com 152 m2 e logradouro em frente com 70 m3”, e juntam aos autos certidão da matriz e da descrição predial onde efetivamente consta que dessa fração faz parte integrante o descrito logradouro.
Também é certo que, ao longo desse articulado inicial, por diversas vezes, os apelantes alegam que o identificado logradouro/terraço “pertence à fração ... (cfr. arts. 8º), é “propriedade da Ré/Réus”, ou, referindo-se à Ré, afirmam: “o seu terraço” (cfr. arts. 20º, 21º, 22º, 25º), ou que esse logradouro/terraço faz “parte integrante” da fração ..., propriedade da Ré (apelada).
Acontece que, as certidões prediais e matriciais, apesar de constituírem documentos autênticos (arts. ...62..., ...63..., ... e ..., ...69º do CC), não revestem idoneidade, suficiência e adequação para por si só, na ausência de qualquer outra prova produzida, designadamente, testemunhal, que ateste esses elementos, fazer prova sobre a área, composição e confrontações do prédio que nelas constam descritos e inscritos, respetivamente.
De facto, as referências atinentes às áreas, limites e confrontações dos prédios feitas constar das inscrições matriciais e das descrições registrais são elementos que são declarados pelos próprios interessados (normalmente, o proprietário desses prédios) ou pelos seus representantes junto, respetivamente, do funcionário da Repartição de Finanças e da Conservatória do Registo Predial, que se limita a consignar esses elementos nos assentos ou nos livros de notas a que dizem respeito, sem desenvolver qualquer atividade de averiguação ou investigatória que lhes permita atestar da autenticidade ou veracidade intrínseca dessas declarações e sem que, por isso, tais elementos possam beneficiar da força probatória plena de que beneficiam os documentos autênticos. É que a força probatória plena de que beneficiam os documentos autênticos, nos termos do n.º 1 do art. 371º do CC, estende-se exclusivamente aos factos nele referidos como tendo sido praticados pela autoridade ou oficial público, assim como aos factos que neles são atestados com base nas perceções dos últimos, o que não é manifestamente o caso das áreas, composições e confrontações dos prédios constantes das respetivas inscrições matriciais e descrições registrais, os quais, como antedito, são, em regra, declarados unilateralmente pelos interessados ao funcionário público, que se limita a exarar esses elementos, dando-os como bons.
Daí que esses elementos não beneficiam da força probatória plena que é própria dos documentos autênticos, mas antes ficam sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova[17]. Aliás, porque assim é, constitui entendimento pacífico na jurisprudência que a presunção iuris tantum que decorre do registo predial, nos termos do art. 7º do CRP, se limita à titularidade do direito inscrito, fazendo presumir que o direito existe e pertence ao titular inscrito, mas não abrange a área, limites ou confrontações do prédio[18].
Daí que, salvo melhor opinião, a alegação dos apelantes de que o logradouro/terraço integra a fração ..., propriedade da apelada, ou a sua alegação de que esse logradouro/terraço é propriedade dos apelantes, afirmações esses que fazem com base na descrição predial e na inscrição matricial dessa fração, não permita extrair esse juízo conclusivo e de direito que os mesmos extraem a partir do teor desses documentos.
Passando à alegação dos apelantes, enfatize-se que a narração destes, em sede de petição, de que o logradouro “pertence à fração ..., é “propriedade da Ré/Réus”, “o seu terraço” ou esse logradouro “faz parte integrante” dessa fração, não corresponde a qualquer narração de facto, mas antes de expressões puramente conclusivas e de direito, insuscetíveis de serem julgadas provadas ou não provadas.
Na verdade, conforme já expendia Alberto dos Reis, “é questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior”[19] e defendia que a atividade do juiz se circunscreve ao apuramento dos factos materiais, devendo evitar que no questionário entrem noções, fórmulas, categorias ou conceitos jurídicos, inserindo apenas, nos quesitos e na matéria de facto assente, factos materiais e concretos”[20].
E na linha de que ao elenco dos factos apurados e não apurados na sentença o juiz apenas deve levar factos materiais, aqui se incluindo as ocorrências concretas da vida real e o estado, a qualidade ou situação real das pessoas e das coisas; neles se compreendendo não só os acontecimentos do mundo exterior diretamente captáveis pelas perceções (pelos sentidos) do homem, mas também os eventos do foro interno, da vida psíquica, sensorial ou emocional do indivíduo[21], se tem pronunciado a jurisprudência maioritária nacional, inclusivamente, após a entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, de 26/06, que reviu o CPC, na sequência do que a sentença passou a incluir o julgamento da matéria de facto e da matéria de direito e que não contém  um dispositivo legal equivalente ao disposto no anterior art. 646º, n.º 4 do CPC.
Na verdade, tem-se continuado maioritariamente a considerar como não escritas as respostas do julgador sobre matéria qualificada como de direito e a equiparar às conclusões de direito, por analogia, as conclusões de facto, isto é, os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados, sem prejuízo de se equiparar a factos as expressões verbais, com um sentido técnico-jurídico determinado, que são utilizadas comummente pelas pessoas sem qualquer preparação jurídica, na sua linguagem do dia a dia, falada ou escrita, com um sentido idêntico, contanto que tais expressões não integrem o próprio objeto do processo, ou seja, que não invadam o domínio de uma questão de direito essencial, traduzindo uma resposta antecipada à questão de direito decidenda[22].
Daí que, salvo melhor opinião, perante a dita alegação genérica e conclusiva feito pelos apelantes, na petição inicial, de que o logradouro/terraço é propriedade da apelante, faz parte integrante da fração desta, etc., não faz sentido a alegação dos mesmos de que essa questão permanece controvertida, porquanto, conforme se acaba de demonstrar, essa sua alegação é puramente conclusiva e de direito, por isso, insuscetível de vir a ser julgada provada ou não provada.
Acresce dizer que, ainda que o título constitutivo da propriedade horizontal tivesse integrado o logradouro/terraço em referência nos autos na fração ... e tenha sido com base nesse título que foram lavradas a descrição predial e a inscrição matricial dessa fração juntas aos autos pelos apelantes em anexo à petição inicial, onde o mencionado logradouro/terraço figura, como referido, como fazendo parte da fração ..., nem por isso, se poderia concluir pela prova em como o logradouro/terraço em análise faça realmente parte dessa fração, sendo, portanto, parte integrante dela e, consequentemente, propriedade exclusiva da apelada, mas antes se impunha declarar a nulidade desse título constitutivo da propriedade horizontal, no segmento que assim dispôs, por violação da norma imperativa da al. b), do n.º 1 do art. 1421º do CC.
Daí que, salvo o devido respeito por entendimento contrário, a alegação dos apelantes de que a questão da propriedade da apelante sobre o logradouro/terraço, diversamente do decidido no saneador recorrido, “permanece em aberto” perante a facticidade que alegaram na petição inicial, não tenha qualquer sustentação fáctica e jurídica possível.
No ponto 8º do articulado inicial, os apelantes alegaram expressamente que o logradouro, “que pertence à fração ..., serve de terraço à fração ... e também de cobertura parcial do imóvel dos Autores” e, no ponto 20º desse mesmo articulado concretizaram que esse “terraço/logradouro é de uso exclusivo por parte da fração identificada pela letra ... (propriedade dos Réus), o qual faz parte da cobertura do edifício”, pelo que os segmentos alegatórios que acabamos de sublinhar, independentemente dos apelantes virem (ou não) a fazer prova dessa facticidade (o que já contende com o pressuposto da legitimidade substantiva – mérito -, mas não com o pressuposto processual da legitimidade), bastam para que se conclua, conforme concluiu a 1ª Instância, que esse logradouro/terraço é parte imperativamente comum do edifício constituído em propriedade horizontal, por via da norma imperativa da al. b), do n.º1, do art. 1421º do CC.
Em abono da sua tese de que a propriedade da apelada sobre o logradouro permanece em aberto, os apelantes invocam a jurisprudência do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/01/2019, Proc. 5568/15.4T8MTS.P1, cujo sumário consta do seguinte: “Pelas obras de reparação da sua varanda, de molde que esta não cause danos às partes comuns, mormente à cobertura, ou à fração de outros condóminos, é apenas responsável o condomínio que é titular da fração de que faz parte a dita varanda” e onde, em  sede de direito, se lê que, nessa ação “não é a cobertura que está em causa”, mas o que se discute é “a  falta de condições da varanda do réu, parte integrante da sua fração, bem como o que resulta dessa falta de condições: a infiltração de água para a cobertura onde assenta a varanda e, desta, para a fração dos Autores”, mas sem razão.
Com efeito, as ilações acabadas de transcrever do aresto em referência não podem deixar de ser aqui subscritas atenta a facticidade julgada provada nessa concreta ação, onde a varanda nele aludida não se confunde com a cobertura do edifício constituído em regime de propriedade horizontal, mas  antes essa varanda tem autonomia física relativamente à cobertura desse edifício, assentando a parte inferior da laje da varanda na laje que serve de cobertura ao edifício, de molde que, conforme se escreve nesse acórdão, a água que cai sobre a varanda dos aí réus escorre dessa varanda para a cobertura do edifício constituído em propriedade horizontal (laje de cobertura essa situada por baixo da laje da varanda da fração propriedade dos aí réus, que assenta/pousa na laje da cobertura) e desta laje de cobertura do edifício escorre, infiltrando-se na fração propriedade dos aí autores.
Conforme acima se deixou demonstrado, neste contexto fático, a varanda dos réus na ação sobre que se debruça o dito acórdão, porque fisicamente autónoma da laje de cobertura do edifício constituído em propriedade horizontal, ainda que se apoie na parede mestra desse edifício, não é elemento acessório dessa parede mestra, não sendo, portanto, elemento imperativamente comum, mas antes é elemento acessório da fração propriedade dos aí réus, integrando a fração de que são proprietários e, portanto, é propriedade exclusiva destes, sobre quem impende, por via disso, o dever de vigilância dessa varanda, que os obriga a manter a sua estanquicidade, sob pena de responderem pelos danos que venham ou sejam causados a terceiros, incluindo aos restantes condóminos do edifício.
Daí que se compreenda que no dito acórdão se escreva que, no caso sobre que se debruça, “não é a cobertura que está em causa”, mas o que se discute é “a falta de condições da varanda do Réu, parte integrante da sua fração”.
Acontece que a realidade fáctica sobre que se debruça esse aresto não é aquela que vem alegada, na petição inicial, em que os apelantes são expressos em narrarem que o logradouro/terraço serve de terraço à fração ... (propriedade da apelada) e também de cobertura parcial da fração ..., de que eles próprios são proprietários, embora esteja afeto ao uso exclusivo daquela primeira fração (da “B”), pelo que, reafirma-se, trata-se de bem imperativamente comum.
E sendo o logradouro/terraço objeto dos autos, em face da alegação dos apelantes, um elemento imperativamente comum, nos termos do n.º 1, do art. 1430º do CC, a administração deste compete à assembleia de condóminos e a um administrador.
Do confronto do regime jurídico do n.º 1 do art. 1430º com o do art. 1436º, ambos do CC, onde se encontram enunciadas, de modo não taxativo, as funções do administrador, em particular, na al. h) deste último preceito – “são funções do administrador, além de outras que lhe sejam atribuídas pela assembleia: executar as deliberações da assembleia” -, extrai-se que, enquanto a assembleia de condóminos é o órgão deliberativo do condomínio, o administrador é o órgão executivo da assembleia de condóminos.
Os poderes da assembleia “estão circunscritos, de forma inderrogável, às relações respeitantes ao uso, gozo e conservação das coisas e serviços comuns, estando-lhe vedado invadir a esfera da propriedade individual e exclusiva de cada condómino, sob pena de, fazendo-o, a deliberação ser ineficaz, salvo se o condómino atingido aceitar expressamente o sacrifício que (indevidamente) lhe é imposto”[23].
Acresce que os poderes da assembleia circunscrevem-se apenas a poderes de administração das partes comuns do edifício, conforme resulta inequivocamente do n.º 1, do art. 1430º do CC, o que excluiu poderes de disposição dessas partes comuns.
Por sua vez, o administrador é o órgão executivo da assembleia de condómino, a quem a lei atribui competência própria para praticar os atos que se encontram especificados, de modo não taxativo, no art. 1436º e que, por isso, não lhe podem ser retirados por deliberação da assembleia enquanto se mantiver no exercício do cargo de administrador.
Entre as funções próprias do administrador conta-se a de realizar os atos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns (al. f), do art. 1346º), o que abrange os atos meramente materiais destinados à defesa da integridade das coisas comuns, como os atos necessários à defesa dos direitos relativos aos bens comuns.
Na categoria de atos materiais destinados à defesa da integridade das coisas comuns, o administrador tem competência própria para realizar as “reparações normais nas partes comuns do edifício, necessárias à manutenção da sua segurança, salubridade e arranjo estético, e mesmo aquelas que se assumam como indispensáveis e urgentes, consoante decorre do disposto no art. 1427º”[24].
Já no que respeita aos atos conservatórios dos direitos dos condóminos aos bens comuns, o administrador goza de competência própria para desencadear os procedimentos judiciais destinados a prevenir tanto a perturbação como o esbulho das coisas comuns praticados por terceiros ou pelos próprios condóminos, como o receio da sua prática (arts. 1276º a 1286º do CC), onde cabem, por exemplo, as providências cautelares (v.g. embargo de obra nova relativa a obra realizada numa parte comum do edifício) e a interrupção de um prazo de prescrição ou de usucapião que se encontre em curso[25].
Deste modo, como o próprio nome indica – “administrador” – e resulta dos poderes próprios que lhe são atribuídos no art. 1436º, sendo o administrador o órgão executivo da assembleia de condóminos, tal como esta, o mesmo vê o seu campo de atuação limitado à administração das partes comuns do edifício, mais concretamente às relações de uso, gozo e conservação dessas partes comuns, mas, enquanto órgão executivo da assembleia, a competência pessoal do administrador é mais restrita do que o campo de atuação da assembleia de condóminos, posto que os poderes pessoais do administrador restringem-se à realização de obras normais ou correntes (de gestão corrente), necessárias à conservação e fruição das coisas comuns, aos atos conservatórios dos respetivos direitos ou à prestação dos serviços comuns. Assim, sempre que estejam em causa obras necessárias  ao uso, gozo e conservação das partes comuns que não se enquadrem dentro do conceito de obras normais, correntes, de gestão corrente, por demandarem a realização de obras extraordinárias e, portanto, a realização de despesas extraordinárias (não correntes) ou questões que entrem no domínio da propriedade ou de posse dos bens comuns, está ultrapassado o círculo dentro do qual se contêm os poderes pessoais do administrador, sendo esses atos da competência da assembleia, que poderá autorizar o administrador a praticá-los em sua representação.
Note-se que, em consonância com o que se vem dizendo, nos termos do art. 1437º o administrador tem legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer contra terceiros, na execução das funções que lhe pertencem, ou seja, das previstas no art. 1436º, e fora delas, mas neste caso, unicamente quando autorizado pela assembleia de condóminos (n.º 1). O administrador pode também ser demandado nas ações respeitantes às partes comuns, exceto tratando-se de ações relativas a questões de propriedade ou posse destes, salvo se a assembleia lhe atribuir poderes especiais para tais ações (n.ºs ... e ...).
Nestes casos, embora o condomínio não tenha personalidade nem capacidade jurídicas, a al. e), do art. 12º do CPC, estende ao condomínio excecionalmente personalidade judiciária, permitindo-lhe, que representado pelo seu representante, em regra, o administrador, demande ao seja demandado em ações que se insiram no âmbito dos poderes do administrador.
Nos casos previstos nos arts. 1437º, n.ºs 1 e 2 do CC e 12º, al. e) do CPC, em que se reconhece legitimidade ativa e passiva ao administrador para, em representação do condomínio, demandar ou ser demandado em ações que tenham por objeto as funções que lhe pertencem (as do art. 1436º do CC), ou, fora destas, quando tenham por objeto atos (não correntes) necessárias à salvaguarda do uso, gozo e conservação das partes comuns ou de atos conservatórios dos direitos dos condóminos sobre tais bens comuns, contanto que autorizado pela assembleia de condóminos, e que lhe confere, em geral legitimidade passiva para, em representação do condomínio, ser demandado em ações que tenham por objeto as partes comuns do edifício, salvo se tratar de ações relativas a questões de propriedade ou posse desses bens comuns, exceto se a assembleia lhe conferir poderes especiais para a representar nessas ações, a parte que demanda ou é demandada é o condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do conjunto dos condóminos, representada, em princípio, pelo administrador.
Dito por outras palavras, é o condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos (e não os condóminos, considerados autonomamente), a quem a al. e), do art. 12º do CPC estende excecionalmente personalidade judiciária e é esse condomínio, enquanto estrutura orgânica, distinta dos condóminos considerados autónoma e individualmente, que é representada, por norma, pelo administrador[26].
É representada pelo administrador nos casos de ações que se insiram (tenham por objeto) as funções do administrador previstas no art. 1436º e quando se trate de ações em que o condomínio é demandado, salvo se respeitarem a questões de propriedade ou posse das partes comuns. E o condomínio só é representado pelo administrador nas ações que tenham por objeto atos que não se insiram nas funções do administrador prevista no art. 1436º, ou em que o condomínio seja demandado em ação em que se discuta questões relativas à propriedade ou posse dos bens comuns quando o condomínio autorize a sua representação pelo administrador.
Destarte, decorre do que se vem dizendo que, perante o regime jurídico enunciado no art. 1436º, do CC, em particular, na alínea f) deste preceito, e o previsto no art. 1437º do mesmo Código, tratando-se da realização de obras normais, correntes, de gestão normal que sejam necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal, é o administrador, enquanto representante legal do condomínio, que têm competência própria para praticar esses atos em representação do condomínio, este enquanto estrutura orgânica representativa do conjunto dos condóminos, e que, por isso, dispõe de legitimidade ativa e passiva para as ações que tenham por objeto tais atos, podendo aquele propor essas ações, em representação do condomínio, por sua iniciativa, e ser demandado em representação deste, sem que para tal necessite de autorização da assembleia de condomínios, por se tratar de ações que têm por objeto atos que são da sua competência própria, cujo exercício não está, por isso, dependente de qualquer autorização da assembleia e que esta não lhe pode retirar nem condicionar, seja para o que for.
Por sua vez, tratando-se de obras/despesas que não respeitem à gestão corrente ou normal necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício, esses atos, “por não respeitarem à gestão corrente do condomínio, caem, no âmbito da competência da assembleia por respeitarem a coisas comuns, como sejam, nomeadamente, obras inovatórias, utilizações dessas partes, defeitos de construção, etc., em suma, e por exclusão de partes, o que não está compreendido nas atribuições próprias do administrador, mas que contendem com a compropriedade. Relativamente a todas essas matérias, o exercício de ação judicial pertence à assembleia, eventualmente em consonância com o direito individual exercitável por cada condómino de per si, devendo aquela exercê-lo através de um representante por si designado, que deverá ser, por via de regra, o administrador, consoante resulta da parte final do n.º 1 deste art. 1437º, conjugado com a al. e) do art. 12º do CPC e com o art. 2º do mesmo Código, e ainda, a contrario sensu, do n.º 6 do art. 1433º do CC”[27].
Revertendo ao caso dos autos, o terraço/logradouro que está no uso exclusivo da fração ..., propriedade da apelada herança ilíquida e indivisa é, atenta a relação jurídica material controvertida delineada pelos apelantes na petição inicial, conforma acima já se analisou e demonstrou, nos termos da al. b), do n.º 1, do art. 1421º do CC, um bem imperativamente comum, por esse terraço/logradouro servir de terraço a essa fração ..., propriedade da apelada e, em simultâneo, servir de cobertura parcial da fração ..., propriedade dos apelantes, desempenhando, portanto, a função de cobertura e de proteção ao edifício constituído em propriedade horizontal.
Na presente ação os apelantes pretendem obter a condenação judicial da apelada herança ilíquida e indivisa a realizar as obras necessárias à impermeabilização desse terraço/logradouro, de modo a manter a função de estanquicidade, e a suportar os custos com a realização dessas obras, de forma a impedir que a água que aí cai, seja da chuva ou outra, se infiltre na fração de que são proprietários, bem como a pagar-lhes a quantia de 5.002,56 euros, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora desde a citação.
Alegando os apelantes que esse terraço/logradouro se encontra no uso exclusivo da fração ..., propriedade da apelada, e que as infiltrações verificadas na sua fração ocorrem por aquele terraço/logradouro se encontrar em estado intensamente degradado, apresentando rachadelas, fissuras e deficiências na vedação da saída de água do terraço, com a consequente perda de impermeabilização e pretendendo competir ao de cuius da herança apelada e agora aos seus sucessores, realizar as obras necessárias que “impedissem o normal desgaste provocado pelo uso daquele terraço enquanto tal”, o certo é que, não obstante essa alegação, em função do quadro legal suscetível de ser aplicado a essa facticidade por eles alegada, nos termos da al. f), do art. 1436º do CC, é ao administrador, em representação do condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos, que se encontram atribuídas as funções pessoais de, em representação do condomínio, realizar as obras necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício que se mostrem necessárias à manutenção da sua segurança, salubridade e arranjo estético, onde se enquadram, salvo melhor opinião, as obras de manutenção e conservação do terraço/logradouro sobre que versam os autos, por forma a manter a sua estanquicidade.
 Daí que a competência para realizar essas obras de manutenção e de conservação do terraço/logradouro a que aludem os apelantes, de modo a manter a sua estanquicidade, competiam ao condomínio, mais concretamente, ao administrador, enquanto representante daquele, por se tratar de obras de gestão corrente e, portanto, da competência própria deste, nos termos da al. e), do art. 1436º do CPC, pelo que, tal como decidido pela 1ª Instância, a legitimidade passiva para a presente ação, fundada no incumprimento dessa obrigação, em que os apelantes pretendem obter a condenação da apelada (ré herança ilíquida e indivisa) a executar essas obras e a indemnizá-los pelos danos patrimoniais e não patrimoniais já sofridos decorrente do incumprimento dessa obrigação, não caiba à apelada (Ré) herança ilíquida e indivisa, mas sim ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos, representada pelo seu administrador, conforme o determina o n.º 1, do art. 1437º do CC, o qual, reafirma-se, nem precisa de autorização da assembleia.
Acontece que os apelantes pretendem que assim não é, valendo-se do disposto no n.º 3 do art. 1424º do CC, advogando que, conforme decorre dessa disposição legal, as obras de conservação e de manutenção do logradouro/terraço impendem sobre o condómino ao uso do qual esse terraço se encontra exclusivamente afeto, ou seja, à apelada herança ilíquida e indivisa, mas, antecipe-se desde já, sem razão.
Vejamos:
Conforme decorre da epígrafe do art. 1424º do CC – “Encargos de conservação e fruição” –, esse preceito regula a distribuição interna entre os condóminos dos encargos decorrentes com obras de conservação e de fruição das partes comuns de edifício constituído em regime de propriedade horizontal, e não sobre a competência para a execução das obras necessárias à manutenção da segurança, salubridade e arranjo estético dessas partes comuns.
Com efeito, a execução das obras de conservação e fruição das partes comuns competem, por via de regra, ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos, representado, por norma, conforme antedito, pelo administrador.
O administrador não necessita de obter autorização da assembleia de condóminos para executar as obras destinadas a garantir a estanquicidade do terraço/logradouro sobre que versam os presentes autos, por se tratar de obras que são da sua competência pessoal, conforme o determina a al. f) do art. 1436º do CC.
Acresce dizer que, nos termos do art. 1424º, n.º 3º do CC, nos casos em que as partes comuns de edifício constituído em propriedade horizontal se encontrar afeto ao uso exclusivo de algum dos condóminos e essa parte comum servir concomitantemente de cobertura ao edifício constituído em propriedade horizontal, como é o caso das obras objeto dos presentes autos, conforme infra se verá, as obras de conservação e de fruição provocadas pelo uso normal do terraço enquanto terraço impende sobre o condómino que tiver o uso exclusivo desse terraço (não sobre o condomínio), mas já as obras necessárias à reparação das deficiências estruturais ou à manutenção dos materiais que asseguram a sua função daquele terraço enquanto  cobertura e proteção do edifício constituído em propriedade horizontal, ainda que a necessidade de realização dessas obras resultem de um uso anormal do terraço enquanto terraço pelo condómino ou condóminos a cujo uso exclusivo esse terraço se encontra afeto, ou se deva a ato positivo ou omissivo culposo de terceiro (v.g. perfurou a tela asfáltica de impermeabilização do terraço ao colocar nele uma antena ou ao  construir um canteiro) é ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa dos conjunto dos condóminos, representado pelo administrador, que cabe executar tais obras e suportar o custo das mesmas, tudo naturalmente, sem prejuízo, conforme infra se verá, de uma vez realizadas essas obras pelo condomínio e de suportado o custo das mesmas, assistir ao condomínio o direito de regresso sobre o terceiro que, com o seu comportamento ativo ou omissivo, deu causa a que o terraço deixasse de exercer a sua função de cobertura e de proteção do edifício, perdendo a sua função de estanquicidade, levando à necessidade do condomínio ter de executar a obra de reparação do terraço enquanto cobertura e proteção do edifício, enquanto o condómino ou condóminos que, tendo o uso exclusivo do terraço, deram “mau uso” a esse terraço e em consequência dele levaram à necessidade de terem de ser realizadas essas obras pelo condomínio sofrerá(ão) um agravamento da sua responsabilidade na comparticipação das despesas de reparação do terraço enquanto cobertura e proteção do edifício constituído em propriedade horizontal[28].
Na verdade, no n.º 1, do identificado art. 1024º, o legislador estabeleceu como regra supletiva geral – “salvo disposição em contrário”- que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor da suas frações.
Deste modo, sempre que não exista disposição legal (v. g. os n.ºs 3 a 5 do art. 1024º) ou convencional (no regulamento de condomínio) que regule a distribuição desses encargos necessários à conservação e fruição das partes comuns de edifício constituído em propriedade horizontal e ao pagamento de serviços de interesse comuns, cumpre ao condomínio, enquanto estrutura orgânica do conjunto dos condóminos, representado pelo administrador (salvo, como dito, no caso de obras extraordinária, em que o administrador necessita de autorização da assembleia para as executar) executar as mesmas e incumbe a todos os condóminos suportar o custo destas, de acordo com regra supletiva geral da proporcionalidade prevista no n.º 1, do art. 1424º.
Note-se, aliás, que essa regra supletiva geral da proporcionalidade é um desenvolvimento do art. 1420º, no qual se prevê que, por força do estatuto da propriedade horizontal, cada condómino é proprietário exclusivo da fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício, sendo o conjunto desses direitos incindível, compreendendo-se, por isso, que, enquanto comproprietários das partes comuns, impenda sobre todos os condóminos a obrigação de comparticipar nas despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e no pagamento dos serviços de interesse comum.
Acresce dizer que nas despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício a que se reporta o identificado n.º 1, do art. 1424º, “caem todas aquelas, diminutas ou vultosas, que se mostrem indispensáveis ou convenientes para que as partes comuns – sejam elas as necessariamente comuns (art. 1421º, n.º 1), sejam as presuntivamente comuns  por não terem sido incorporadas na fração de qualquer condómino (art. 1421º, n.º 2), sejam as zonas das parte comuns que o título constitutivo afetou ao uso exclusivo de qualquer condómino (art. 141º, n.º 3) – mantenham a sua funcionalidade específica, dentro dos parâmetros da qualidade construtiva inerente ao edifício. Em contraposição com o conceito de inovações, que dispõe de regulação específica constante do art. 1425º. A necessidade de tais obras pode ter origem em múltiplas causas, sendo as mais correntes o desgaste natural devido ao uso ou erosão do tempo, os vícios ou avarias que imponham a reparação ou substituição de elementos construtivos ou de equipamentos, e podem inclusivamente assumir de medidas preventivas para acautelar danos futuros”, além de que tanto pode tratar-se de obras de conservação ordinária, como extraordinária[29].
Quanto às obras necessárias à conservação e fruição das partes comuns, em função da enunciada regra supletiva geral, vigora o princípio da proporcionalidade, que faz impender sobre todos os condóminos a obrigação de pagarem tais despesas na proporção do valor das suas frações.
Trata-se de uma obrigação propter rem, que decorre da circunstância de serem proprietários da fração e comproprietários das partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal em que a respetiva fração se integra, tratando-se, por isso, de obrigação que goza das características típicas do direito real, incluindo do direito de sequela[30].
Acontece que essa norma supletiva geral da proporcionalidade sofre a exceção prevista no n.º 3, do art. 1424º, onde se estabelece que: “As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargos dos que delas se servem”.
 Trata-se de uma norma que constitui uma norma especial face à regra supletiva geral constante do seu n.º 1, ao derrogar o princípio da proporcionalidade nesta previsto, ao fazer recair as despesas de conservação e fruição das partes comuns do edifício e o pagamento de serviços de interesse comum apenas sobre o condómino ou condóminos a quem o uso exclusivo dessa parte comum do edifício se encontre afeta.
Note-se, porém, que a articulação entre a regra supletiva geral da proporcionalidade contida no n.º 1, com a regra especial contida no n.º 3, ambos do art. 1424º do CC, não tem merecido tratamento doutrinário e jurisprudencial uniforme nos casos, em como acontece nos autos, a parte comum afeta ao uso exclusivo de uma ou de várias frações serve também de cobertura ao edifício constituído em propriedade horizontal e que, portanto, exerce as funções de cobertura e de proteção do edifício.
Com efeito, de acordo com uma corrente doutrinária e jurisprudencial, sempre que a parte comum do edifício se encontre afeta ao uso exclusivo de uma ou várias frações, mas, simultaneamente, essa parte comum sirva de cobertura ao edifício constituído em propriedade horizontal, não se verifica o requisito previsto no n.º 3, do art. 1424º para a sua aplicação, na medida em que não se pode concluir que, essa parte comum, sirva “exclusivamente algum dos condóminos”, porquanto, para além de exercer a função de terraço/varanda afeto ao uso exclusivo de uma ou várias frações, a mesma também exerce a função de cobertura e de proteção do edifício e, nesse medida, prossegue interesses gerais de todos os condóminos do edifício, ao manter o edifício coberto e protegido dos elementos da natureza, nomeadamente, da água da chuva, vento, neve, mantendo-o estanque e protegido desses elementos, contribuindo para as condições de habitabilidade e de conforto de todos os condóminos e protegendo os próprios elementos estruturais do edifício constituído em regime de propriedade horizontal, os quais, de contrário, sofreriam uma deterioração mais intensa.
Por isso, é que segundo os defensores desta corrente, as despesas necessárias à conservação e fruição dessas partes comuns afetas ao uso exclusivo de uma ou várias frações de edifício constituído em propriedade horizontal, têm não só de ser executadas pelo condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos, representada pelo administrador, como o custo dessas obras, “salvo disposição em contrário”, têm de ser suportadas por todos os condóminos,  de acordo com o princípio supletivo geral da proporcionalidade contido no n.º 1, do art. 1424º do CC[31].
Já uma outra corrente doutrinária e jurisprudencial, à qual aderimos, por ser a que melhor se coaduna à ratio das normas contidas nos n.ºs 1 e 3 do art. 1424º e aos vários interesses aqui conflituantes, entende que sempre que os terraços de cobertura se encontrem afetos ao uso exclusivo de uma ou várias frações de edifício constituído em propriedade horizontal, dada a dupla função por eles desempenhada de terraço afeto ao uso exclusivo de uma ou várias frações, e de cobertura do edifício constituído em propriedade horizontal, cobrindo-o e protegendo-o dos elementos da natureza e, nessa medida, satisfazendo o interesse geral de todos os condóminos, há que se distinguir entre:
a) obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocada pelo uso do terraço enquanto terraço, em que a execução dessas obras e o custo das mesmas são da exclusiva responsabilidade do condómino ou condóminos que têm o uso exclusivo desse terraço; e
b) obras destinadas a reparar as deficiências estruturais do terraço ou mesmo a manutenção dos materiais que asseguram a sua função de cobertura, as quais são da responsabilidade do condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do conjunto dos condóminos, representado pelo administrador, cabendo aos condóminos suportar o custo das mesmas, salvo disposição em contrário, de acordo com a regra da proporcionalidade contemplada no n.º 1, do art. 1424º do CC.,  sem prejuízo de, vindo a provar-se que, neste último caso, esses materiais foram danificados ou a sua deterioração normal foi agravada pelo “mau uso” do terraço enquanto terraço pelo condómino ou condóminos a cujo uso exclusivo este se encontra afeto (enquanto terraço), ou por ato ou omissão de terceiro, nos termos do n.º 3, do art. 1424º, o condómino ou condóminos que fizeram esse “mau uso” do terraço, agravando a sua deterioração enquanto cobertura e proteção do edifício constituído e propriedade horizontal, terem uma responsabilidade agravada no pagamento dessas despesas, e do condomínio ter direito de regresso contra o terceiro responsável por esses estragos quanto às quantias que despendeu na reparação do terraço enquanto cobertura do edifício constituído em propriedade horizontal[32].
Neste sentido escreve Abílio Neto que: “Uma das situações que mais frequentemente se coloca esta questão (a da conjugação do n.º 1 do art. 1424º, com o seu n.º 3) é em relação aos terraços de cobertura quando estejam afetos ao uso exclusivo de determinadas frações: como coisa imperativamente comum, as reparações necessárias devem ser feitas pelo condomínio, a expensas de todos os condóminos, de acordo com a regra da proporcionalidade, mas como o respetivo uso é permitido a um círculo restrito de condóminos, devidamente identificados, poderá entender-se como aplicável a regra do n.º 3 do art. 1424º”, e onde concluiu: “Estamos, segundo se  crê, perante uma situação de colisão de direitos, a dirimir segundo as regras do art. 335º do CC: deve prevalecer a sua função capital da cobertura ou proteção do edifício, como elemento estrutural do prédio, e, daí, a aplicação prioritária da regra da proporcionalidade quanto ao custeio da sua reparação, sem prejuízo de os titulares do correspondente uso verem agravada a sua comparticipação, na medida em que hajam contribuído positivamente, por ato ou omissão, para o deflagrar da necessidade da reparação. Todavia, em regra, e na dúvida a solução aplicável é a primeira (proporcionalidade)[33].
Destarte, revertendo ao caso dos autos, de acordo com a relação jurídica material controvertida delineada/narrada pelos apelantes na petição inicial, o logradouro/terraço em discussão nos autos desempenha uma dupla função, a saber: a) de terraço/logradouro afeto ao uso exclusivo da fração ..., propriedade da apelada; e b) de cobertura da fração ... de que os próprios apelantes são proprietários, sendo esse terraço/logradouro, portanto, dada esta função de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal, elemento imperativamente comum, ainda que afeto ao uso exclusivo da fração da apelada herança ilíquida e indivisa enquanto terraço/logradouro.
Daí que, conforme decorre do que se vem dizendo, compete ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do conjunto dos condóminos, representada pelo administrador, a execução das obras necessárias a manter a estanquicidade do terraço e, portanto, a manter a sua função de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal.
Por isso, é que a legitimidade passiva para a presente ação, em que os apelantes pretendem que se condene a apelada a realizar as obras necessária à impermeabilização do dito logradouro/terraço e a suportar o custo das mesmas, bem como a indemnizá-los pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora, impenda sobre o condomínio, enquanto estrutura orgânica do conjunto dos condóminos, representada pelo administrador, uma vez que se trata de obras de gestão ordinária de manutenção da função de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal.
Acresce dizer que, diversamente do entendimento sufragado pelos apelantes, o que se acaba de concluir não é afastado pelo regime jurídico contido no n.º 3, do art. 1424º do CC, na medida em que, conforme antedito, este dispositivo legal reporta-se à distribuição interna entre condóminos das despesas necessárias à impermeabilização desse logradouro/terraço quando este exerce a dupla função de terraço, afeto ao uso exclusivo de uma fração de edifício constituído em propriedade horizontal e, bem assim de cobertura e de proteção a esse edifício.
O alegado “mau uso desse” terraço por parte da herança ilíquida e indivisa por eles demandada (apelada), a cujo uso exclusivo esse terraço se encontra afeto e que determinou que, de acordo com os factos narrados pelos apelantes na petição inicial, esse terraço deixasse de exercer a sua função de estanquicidade e, portanto, de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal, não afasta a obrigação do condomínio, representado pelo administrador, de ter de executar essas obras e de assumir a responsabilidade decorrente do incumprimento dessa obrigação e, salvo disposição em contrário (não alegada), não afasta a obrigação de todos os condóminos terem de comparticipar nessas despesas de reparação de acordo com a regra supletiva geral da proporcionalidade do n.º 1 do art. 1424º do CC, sem prejuízo da apelada (Ré herança ilíquida e indivisa), provado que fosse aquele alegado “mau uso” determinativo da perda de estanquicidade do terraço/logradouro enquanto cobertura e proteção do edifício constituído em propriedade horizontal, nos termos do n.º 3 daquele art. 1424º, ver agravada a sua responsabilidade por via do seu maior contributo para a necessidade de execução dessas obras.
Realce-se, aliás, que, para que fosse possível concluir pela maior responsabilidade pelo pagamento de tais despesas por parte da apelada, revela-se de todo insuficiente a alegação dos apelantes de que o “estado intensamente degradado do terraço impede o correto escoamento de águas do mesmo, o que resulta numa acumulação de água que, necessariamente, acaba por infiltrar-se para a fração que se lhe encontra imediatamente abaixo, ou seja, a fração ..., fração esta pertencente aos Autores. O terraço em questão apresenta rachadelas, fissuras e deficiências na vedação da saída de água do terraço (com a consequente perda de impermeabilização), tudo que contribui para fazer vazar a água para o imóvel dos Autores”, seguida da ilação conclusiva que narram naquele articulado base da ação de que o estado de degradação do terraço se deve “à não realização de obras, por parte do falecido CC e agora dos Réus, que impedissem o normal desgaste provocado pelo uso do terraço enquanto tal” e, bem assim, que “a situação na fração dos Autores deve-se à falta de manutenção e conservação do logradouro”.
Com efeito, sobre a apelada, enquanto proprietária da fração ... a cujo uso exclusivo esse terraço se encontra afeto, apenas impende a obrigação de realizar e suportar o custo das obras que se destinem a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto terraço, mas já não tem a obrigação de executar e suportar o custo das obras que se relacionem com deficiências estruturais  ou construtivas desse terraço enquanto cobertura do edifício ou que se relacionem com o normal desgaste dos materiais que integram essa cobertura do edifício.
 Conforme acima já enunciado, a execução dessa obra cabe ao condomínio, tratando-se, aliás, de uma atribuição pessoal do administrador daquele, que para exercer essa função não carece de autorização da assembleia.
Por sua vez, cabe a todos os condóminos suportar o encargo decorrente da execução de obras necessárias à manutenção e conservação da cobertura do edifício, nomeadamente, de modo a mantê-lo estanque, de acordo com a regra geral supletiva da proporcionalidade fixada no n.º 1 do art. 1424º do CC, sem prejuízo, reafirma-se, da apelada ver a sua responsabilidade na assunção desse encargo agravada por via de um eventual “mau uso” que fez desse terraço enquanto terraço, gerador da necessidade da reparação, por forma a repor a sua função de cobertura e de proteção ao edifício constituído em propriedade horizonta, por forma a repor a sua estanquicidade .
Daí que apresentando o terraço, conforme vem alegado pelos apelantes, em sede de petição inicial,  rachadelas, fissuras e deficiências na vedação da saída de água, as quais, portanto, colocam em crise a estanquicidade do terraço enquanto cobertura e de proteção do próprio edifício constituído em propriedade horizontal, a reparação dessas patologias impenda sobre o condomínio, reafirma-se, enquanto estrutura orgânica representativa de todos os condóminos (e não aos condóminos autonomamente), representado pelo seu administrador, cabendo a todos os condóminos suportar o respetivo custo de acordo com a identificada regra supletiva geral da proporcionalidade, em que a maior responsabilidade pela apelada pelo custo dessa reparação (nas relações internas entre condóminos), exigiria sempre que os apelantes tivessem alegado os factos concretos que, uma vez provados, permitissem concluir (ou não) que essa situação de falta de estanquicidade da cobertura do edifício constituído em propriedade horizontal se deveu  a um “ uso anormal” do terraço, enquanto terraço, por parte da apelada, afeto ao uso exclusivo da fração desta, conforme conclusivamente alegaram.

B- Da exceção de ilegitimidade passiva – insupribilidade.
Pretendem os apelantes que a legitimidade passiva para a presente ação cabia, em todo o caso, a todos os condóminos, pessoal e autonomamente demandados, pelo que, ao julgar procedente a exceção dilatória da ilegitimidade passiva e ao absolver a apelada herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC, em vez de convidá-la a suprir essa exceção dilatória, a 1ª Instância incorreu em erro de direito, omitindo uma formalidade essencial, que lhe é imposta pelo art. 590º, n.ºs 1 e 2, al. a), do CPC, o que determina a nulidade da decisão recorrida e a consequente necessidade de se ordenar a baixo dos autos à 1ª Instância, para que lhe dirija convite para que supra a referida exceção dilatória, fazendo intervir nos presentes autos os condóminos por si não demandados, tanto mais que, no caso dos autos, não existe condomínio  do edifício constituído, pelo que, na sua perspetiva, a legitimidade passiva do condomínio teria de ser sempre assegurada por todos os condóminos.
Sobre a legitimidade passiva para a presente ação, já nos pronunciamos supra, cremos que abundantemente, no sentido de que a legitimidade passiva para a mesma, atenta a relação jurídica material controvertida delineada pelos apelantes na petição inicial, tal como decidido pela 1ª Instância, cabe ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos, representado pelo administrador, pelo que, ao assim, decidir, julgando procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva da apelada e ao ter absolvido esta da instância, bem andou a 1ª Instância, dado que essa exceção dilatória é insuprível, não comportando, por isso, despacho de convite ao aperfeiçoamento.
Note-se que a essa conclusão não obsta a circunstância de os apelantes alegarem, no articulado inicial, que o edifício não tem condomínio constituído.
Na verdade, como antedito, uma coisa é o condomínio e outra, diversa, é a administração deste, a qual cabe à assembleia de condóminos (órgão deliberativo) e ao administrador (órgão executivo).
Contrariamente ao que parece ser o entendimento dos apelantes, a existência de condomínio não está dependente de qualquer ato formal de constituição ou de nomeação do condomínio, mas é uma decorrência da lei, inerente à constituição da própria propriedade horizontal e à situação de pluralidade de condóminos.
Daí que, constituída a propriedade horizontal e fracionado, assim, o edifício em vários prédios autónomos (frações), com partes comuns individualizadas, uma vez transmitida a propriedade sobre uma dessas frações a um terceiro, que não o construtor do edifício constituído em propriedade horizontal, passando, por via desse negócio translativo da propriedade, a existir mais do que um condómino, em que cada um dos condóminos é proprietário exclusivo das suas frações e comproprietário das partes comuns do prédio, fica automaticamente, ex lege, nos termos do n.º 1 do art. 1430º do CC, constituído o condomínio e os órgãos representativos deste, isto é, a assembleia e o administrador[34].
É certo que, nos termos do n.º 1, do art. 1435º-A do CC, a competência para nomear o administrador pertence à assembleia de condóminos e que esta poderá não o nomear, mas nem por isso deixa de existir condomínio e administrador.
O condomínio, como referido, constitui-se automaticamente, por decorrência da lei, com a constituição da propriedade horizontal e logo que ocorra a primeira transmissão da propriedade sobre uma das frações, passando, portanto, a existir mais do que um condómino.
Caso a assembleia de condóminos não nomeie administrador e este não seja nomeado judicialmente, nos termos do n.º 1, do art. 1435º-A do CC, as correspondentes funções são obrigatoriamente desempenhadas, a título provisório, pelo condómino cuja fração ou frações representem a maior percentagem do capital investido, salvo se outro condómino tiver manifestado vontade de exercer o cargo e tiver comunicado essa vontade aos demais condóminos (art. 1435º-A, n.º 1 do CC).
Daí que a alegação dos apelantes de que, no caso dos autos, não existe condomínio constituído não tenha fundamento legal.
Aqui chegados, resulta de tudo o quanto se vem expondo, improcederem todos os fundamentos de recurso aduzidos pelos apelantes, impondo-se concluir pela improcedência da presente apelação e pela consequente confirmação do despacho saneador recorrido, que julgou procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva e, em consequência, absolveu a apelada da instância.
*
Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).

1- Para aferir do pressuposto processual de (i)legitimidade passiva impõe-se atender, em regra, à relação jurídica material controvertida delineada subjetiva (quanto aos sujeitos) e objetivamente (quanto ao pedido e à causa de pedir) na petição inicial e verificar se o nela réu é a pessoa que, de acordo com a facticidade alegada nesse articulado base da ação e em função da lei substantiva abstratamente aplicável a essa relação jurídica (independentemente do autor vir ou não a fazer prova dessa facticidade, que alegou), deve deter a qualidade jurídica de réu por ser a pessoa cuja esfera jurídica será diretamente atingida negativamente (sofrendo prejuízo) pela pretensão de tutela judiciária formulada pelo autor (pedido) caso esta venha a ser reconhecida pelo tribunal.
2- Instaurando o autor uma ação contra um condómino pedindo a condenação deste a realizar as obras necessárias à impermeabilização de um terraço e a suportar o custo dessas obras, bem como a indemnizá-lo pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência das infiltrações ocorridas na fração de que é proprietário, advenientes da falta de estanquicidade desse terraço, alegando que esse terraço se encontra afeto ao uso exclusivo da fração de que é proprietário  o condómino por si demandado (réu) e, bem assim que esse terraço, além de servir de varanda/terraço a essa fração, em simultâneo, serve de cobertura à própria fração propriedade do autor, apesar do autor alegar que esse terraço é parte integrante da fração propriedade do condomínio que demanda e de alegar conclusivamente que a falta de estanquicidade desse terraço se deve ao “mau uso do terraço” por parte do condomínio réu posto que não cuidou em assegurar a manutenção e a conservação desse terraço, por forma a mantê-lo estanque, o certo é que a varanda/terraço em referência nos autos, atenta a facticidade alegada pelo autor, é bem imperativamente comum (art. 1421º, n.º 1, al. b) do CC).
3- Por isso, as obras necessárias à conservação e à fruição daquele terraço, de modo a manter a sua estanquicidade e, assim, garantir as funções por ele desempenhadas de cobertura e de proteção ao edifício constituído em propriedade horizontal são da responsabilidade do condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do universo dos condóminos (não aos condóminos individualmente considerados), representado pelo administrador.
3- Daí que a legitimidade passiva para a presente ação caiba ao condomínio, enquanto estrutura orgânica representativa do conjunto dos condóminos (e não aos condóminos considerados autonomamente), representado pelo administrador.
4- Sempre que o terraço de cobertura de edifício constituído em propriedade horizontal se encontre afeto ao uso exclusivo de uma ou várias frações, dada a dupla função por ele exercida, de varanda/terraço da fração ou frações a cujo uso exclusivo se encontra afeto, e de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal e, nessa medida, satisfazendo o interesse geral de todos os condóminos, impõe-se distinguir entre: a) obras que se destinam a reparar o desgaste normal provocado pelo uso do terraço enquanto terraço, em que a execução dessas obras e o custo das mesmas são da exclusiva responsabilidade do condómino ou condóminos que têm o uso exclusivo desse terraço; e b) obras destinadas a reparar as deficiências estruturais do terraço ou a manutenção dos materiais que asseguram a sua função de cobertura e de proteção do edifício constituído em propriedade horizontal, mormente, a sua estanquicidade, as quais são da responsabilidade do condomínio (estrutura orgânica representativo do conjunto dos condóminos), representado pelo administrador, cabendo aos condóminos, em princípio, suportar o custos dessas obras, de acordo com a regra geral supletiva da proporcionalidade, contemplada no n.º 1 do art. 1424º do CC, sem prejuízo de se vir a provar que a necessidade de executar essas obras se deveu ao facto do condómino ou condóminos que têm o uso exclusivo desse terraço terem feito um “uso anormal” daquele verem a sua responsabilizado pelo pagamento dessas despesas agravada, nos termos do n.º 3 do art. 1424º do CC, e de ao condomínio assistir o direito de regresso pelas quantias despendidas na reparação do terraço contra os terceiros, que ilícita e culposamente, por ação ou omissão, provocaram naquele terraço os estragos que reclamaram a sua reparação de modo a repor a sua função de cobertura e de proteção do edifício.
5- O condomínio constitui-se ex lege e automaticamente, com a constituição da propriedade horizontal, mal ocorra um negócio translativo da propriedade sobre uma fração, passando a existir mais do que um condómino.
6- Se a assembleia de condóminos não nomear administrador e se este não for nomeado judicialmente, mal ocorra aquele primeiro negócio translativo da propriedade sobre uma fração e passe, portanto, a existir mais do que um condómino (o instituidor da propriedade horizontal e o transmissário da fração), fica automaticamente, por imposição legal, constituído o condomínio e investido nas funções de administrador provisório o condómino cuja fração ou frações represente a maior percentagem de capital investido, salvo se outro condómino tiver manifestado vontade de exercer o cargo e tiver comunicado essa vontade aos restantes condóminos (art. 1435º-A, n.º 1 do CC).
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IV- Decisão

Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar a presente apelação improcedente e, em consequência, confirmam o despacho saneador recorrido, que julgou procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva e, em consequência, absolveu a apelada herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de CC da instância.
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Custas da apelação pelos apelantes (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 12 de outubro de 2023
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:

José Alberto Moreira Dias - relator
Lígia Paula Santos Venade - 1ª Adjunta
Maria Gorete Morais – 2ª Adjunta

 

[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”. Vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
[2] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., Coimbra Editora, 1985, pág. 104.
[3] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit., pág. 127.
[4] Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, pág. 74, onde postula que “A questão da legitimidade é essencialmente uma questão de posição das partes em relação à lide”.
[5] Ac. STJ., de 02/06/2021, Proc. 22208/18.2T8PRT.S1, in base de dados da DGSI, onde constam todos os acórdãos que se venham a citar sem menção em contrário.
[6] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit., pág. 135.
[7] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit., pág. 134.
[8] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 4ª ed., Almedina, pág. 93.
Paulo Pimenta, “Processo Civil Declarativo”, Almedina, 2014, págs. 69 e 70, onde se lê: “… a legitimidade consiste numa posição concreta da parte perante uma causa. Por isso, a legitimidade não é uma qualidade pessoal, antes uma qualidade posicional da parte face à ação, ao litígio que aí se discute. (…). Conforme resulta da redação que a Reforma de 1995/96 deu ao n.º 3 do art. 26º do CPC de 1961 – redação mantida agora no art. 30º -, foi adotada a teoria que faz corresponder a legitimidade das partes à titularidade da relação controvertida descrita pelo autor na petição inicial”.
[9] Abílio Neto, “Manual da Propriedade Horizontal”, 4ª ed., março de 2015, Ediforum, pág. 383.
[10] Mota Pinto, RDES, n.º 21, pág. 113.
[11] Abílio Neto, “Manual da Propriedade Horizontal”, 4ª ed, março 2015, Ediforum, pág. 35.
[12] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, 2ª ed., Coimbra Editora, 1987, pág. 419.
[13] L. P. Moitinho de Almeida, “Propriedade Horizontal”, 2ª ed., Almedina, pág. 39.
[14] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, ob. cit., pág. 421; L. P. Moitinho de Almeida, ob. cit. pág. 39, onde se lê: “Paredes-mestras são as que constituem o esqueleto do edifício, desde as fundações até à cobertura, sem as quais a construção no seu conjunto, seria impossível. Não podem por isso confundir-se com as paredes meramente divisórias que, separando os diversos compartimentos de cada fração autónoma, pertencem aos respetivos donos, nem com as paredes perimetrais ou exteriores. Paredes mestras são também as interiores sobre as quais se regula o edifício, principalmente as paredes das escadas. As paredes-mestras distinguem-se das paredes meramente divisórias que são as que separaram os diversos compartimentos de cada fração e pertencem exclusivamente ao proprietário desta. Distinguem-se também das paredes que, não servindo de suporte à construção, apenas delimitam as várias frações e devem considerar-se sujeitas, com as necessárias adaptações, às normas que no Código Civil regulam, no âmbito do direito de propriedade de imóveis, as paredes e muros de meação”.
[15] L. P. Moitinho de Almeida, ob. cit., pág. 40; Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, ob. cit., pág. 421, último parágrafo.
[16] L. P. Moitinho de Almeida, ob. cit., pág. 40; Abílio Neto, ob. cit., págs. 335 e 336: “A cobertura do edifício, seja qual for a solução arquitetónica adotada – cobertura em telha, cobertura em laje, ou a conjugação das duas, seja no mesmo plano, seja em planos distintos (coberturas intermédias) -, constitui sempre, e na sua integralidade, parte imperativamente comum do prédio submetido ao regime da propriedade horizontal, com todas as consequências daí advenientes, nomeadamente não pode integrar, no todo ou em parte, qualquer das frações autónomas, sejam ou não adjacentes na horizontal ou na vertical a fração ou frações, embora possa ser afetada ao uso exclusivo de qualquer condómino (art. 1421º, n.º 1, al. b)), seja no título constitutivo, seja mediante a sua modificação (art. 1419º)”. E adianta que, embora “a cobertura em telha constituir a melhor defesa contra as agressões climáticas, o facto de a cobertura em laje, ser plana, permitir uma utilização para diversificados fins, a sua adoção tornou-se frequente, sob diversas formas, o que acarretou, na prática, problemas diversos nomeadamente quanto ao regime condominial dos terraços de cobertura parcial ou intermédia, ou àquele cujo acesso direto só pode ter lugar através de uma dada fração. Importa reter, em primeiro lugar, que os terraços de cobertura, atenta a sua função primordial de resguardo do próprio edifício e de elemento vital de toda a construção integram as partes necessariamente comuns, e, daí, que só o uso, não o respetivo direito de propriedade, possa ser atribuído em exclusivo a quaisquer das frações. A lei é incontornavelmente clara no sentido de que a destinação do uso dos terraços de cobertura a qualquer fração, não exclui a natureza de coisa comum do apontado elemento construtivo (art. 1421º-1-b, e 3), ou seja, uma coisa é a propriedade dessa parte comum, e outra – com ela inconfundível – é a afetação, em exclusivo, do terraço. Assim, se a propriedade de toda ou de parte da cobertura, quer assuma a forma de telhado, quer a de laje, ou mista, for integrada no título constitutivo da propriedade horizontal na composição de qualquer fração, haverá lugar à redução do respetivo negócio jurídico (art. 292º do CC), por violação de norma imperativa; se essa integração vier a ser deliberada posteriormente em assembleia de condóminos, mesmo por unanimidade dos votos representativos da totalidade do capital, essa deliberação será nula, por identidade de razão”. E conclui, a fls. 337, que: “Porque o terraço é uma parte imperativamente comum do edifício, a sua afetação ao uso exclusivo de um condómino não retira ao condomínio o direito e a obrigação de proceder à sua conservação e manutenção, regra esta que deve ser atendida cum grano salis”.
Ainda, Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 422: “São ainda consideradas comuns, por constituírem igualmente parte integrante da ossatura do prédio, o telhado e os terraços de cobertura. Na hipótese de o prédio ser coberto em parte por telhado e na outra parte por terraço, quer o telhado, quer o terraço, são comuns a todos os condóminos, e não apenas àqueles cujas frações se situem na respetiva vertical. Analogamente ainda que o terraço se destine ao uso exclusivo de um dos condóminos (por estar situado no mesmo nível do último pavimento, porque o acesso se faça pelo interior desse pavimento, etc.), ele não deixa de ser forçosamente comum pela função capital (de cobertura ou proteção do imóvel) que no interesse coletivo exerce em relação a toda a construção (al. b), do n.º 1)”.
No sentido de que os terraços de cobertura de prédio constituído em propriedade horizontal são imperativamente comum, ainda que afetos ao uso exclusivo de um ou vários condóminos, na jurisprudência: Acs. RG., de 19/09/2019, Proc. 1679/16.7T8CHV.G1; de 12/09/2019, Proc. 515/17.1T8VLNG (relatado pelo aqui relator); de 04/01/2011, Proc. 2209/07.TBVCT.G1; R.P., de 10/07/2019, Proc. 25518/17.2T8PRT.P1; de 02/05/2016, Proc. 1989/08.0TVPRT.P2; de 09/11/2010, Proc. 36/08.3TBVPA.P1;  R.L., de 23/02/2021, Proc. 362/18.3T8RGR.L1-7
[17] Acs. STJ. de 11/02/2016, Proc. 6500/07.4TBBRG.G2.S3; de 06/05/2004, Proc. 04B1409; RG. de 22/01/2003, Proc. 1092/02-2; RC. de 10/01/2006, Proc. 3207/05; RE de 05/02/2004, Proc. 1202/03-3, todos in base de dados da DGSI.
[18]Acs. STJ. de 01/10/1991, Proc. 082672; de 03/07/2003, Proc. 04A570; de 27/03/2014, Proc. 555/2002.E2.S1; e de 11/04/2019, Proc. 132/13.5TBPTL.G1.S1, in base de dados da DGSI.
[19] Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. III, 4ª ed., Coimbra Editora, págs. 206 e 207.
[20] Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 212.
[21] Ac. STJ. de 09/03/2003, Proc. 03B1816.
[22] Acs. STJ. de 01/10/2019, Proc. 109/17.1T8ACB.C1.S1; de 07/05/2014, Proc. 39/12.3T4AGD.C1.S1; 11/07/2012, Proc. 3360/14.0TTLSB.L1.S1; 02/05/2007; 14/11/2006, Proc. 06A2992.
[23] Abílio Neto, ob. cit., pág. 642.
[24] Abílio Neto, ob. cit., pág. 654.
[25] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, ob. cit., pág. 452. [26] Ac. R.P. de 13/03/2008, Proc. 0831321, em que se lê que: “O condomínio, representado pelo seu administrador tem personalidade judiciária, pela aplicação da al. e) do art. 6º do CPC”, e onde, citando Sandra Passinhas se escreve: “A razão de ser assim resulta diretamente do art. 1437º, n.º 2 do CC, ao determinar que o administrador também pode ser demandado em ações respeitantes às partes comuns do edifício, encontrando esta disciplina a sua ratio na realização de uma evidente exigência de simplificação entre o condomínio e terceiros, ou alguns dos condóminos que pretende fazer valer em juízo pretensões respeitantes a bens ou interesses comuns”. E adianta-se: “Por outro lado, o administrador nunca poderá ser prejudicado pela procedência da ação, ele age como representante do condomínio e a sua atividade exprime a vontade do condomínio, do grupo e não dos condóminos. Não é mandatário mas sim um órgão executivo a quem cabe a representação orgânica, representando se necessário o condomínio. Não é este que deve estar em juízo, em sentido substancial, mas sim o administrador na sua qualidade de órgão executivo da assembleia de condóminos. Como anota Luís Carvalho Fernandes, “os poderes de representação do administrador não podem deixar de ser encarados e compreendidos à luz da falta de autonomia jurídica do condomínio. Correspondentemente, por referência à personalidade judiciária que lhe é reconhecida, do que no fundo se trata é atribui ao administrador legitimação para agir em nome do conjunto dos condóminos””.
[27] Abílio Neto, ob. cit., pág. 754.
[28] Neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, ob. cit., pág. 431: “A responsabilidade dos condóminos pelas despesas de conservação e fruição é uma responsabilidade ex lege e subsiste mesmo nos casos em que tais despesas tenham sido originadas por facto imputável apenas a um deles ou a terceiro. É evidente, no entanto, que, nestes casos, aos condóminos será lícito agir contra o autor do dano, de acordo com os princípios gerais da responsabilidade civil”:
[29] Abílio Neto, ob. cit., págs. 551 e 552.
[30] Abílio Neto, ob. cit., pág. 553; Ac. R.P., de 10/07/2019, Proc. 25518/17.2T8PRT.P1.
[31] Acs. STJ., de 19/09/2002, Proc. 02B026; RG., de 04/01/2011, Proc. 2209/07./TBVCT.G1;  de 23/10/2008, Proc. 2083/08-1; RL., de 29/06/1989, Proc. 0049 (CJ. T. 3º, pág. 159); R.P., de 09/11/2010, Proc. 36/08.3TBVPA.P1.
Na doutrina: José Rosendo Dias, “Da Propriedade Horizontal”, Almedina, pág. 142; Francisco Pardal e Manuel Batista D. Fonseca, “Da Propriedade Horizontal”, 3ª ed., Almedina, pág. 187.
[32] Acs., STJ., de 12/10/2017, Proc. 1989/09.0TVPRT.P2.S1; de 09/06/2016, Proc. 211/12.6TVLSB.L2.S1; R.P:, de 10/07/2019, Proc. 25518/17.2T8PRT.P1
[33] Abílio Neto, ob. cit. pág. 557.
Aparentemente no mesmo sentido Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado” (ob. cit.), pág. 431, ao expenderem: “A segunda regra supletiva, aplicável às partes comuns do prédio que apenas sirvam um ou alguns dos condóminos, é a que restringe a repartição dos respetivos encargos aos utentes dessas partes. Este segundo critério (da redução dos condóminos obrigados) é completado pelo primeiro, quanto à forma como se dividem os encargos entre os condóminos onerados”.
[34] Abílio Neto, ob. cit., pág. 643: “Sendo inerente à própria constituição da propriedade horizontal a existência de partes comuns do edifício, compreende-se que, a partir do momento em que haja uma pluralidade de condóminos - e essa situação, nos prédios constituídos para venda por frações, ocorre imediatamente após a venda da primeira, porquanto o construtor-instituidor da propriedade horizontal continuará proprietário de todas as demais – a lei declare obrigatória a existência de uma administração (art. 1430º, n.º 1), enquanto órgão executivo da gestão das partes comuns e encarregado dos serviços de interesse comum”.
Na mesma esteira, Ac. R.P., de 13/03/2008, Proc. 0831331: “O condomínio resulta direta e necessariamente da própria constituição da propriedade horizontal, razão pela qual com a constituição desta nasce aquele, não sendo exigível qualquer ato formal para que se tenha o condomínio por constituído”.