ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
TRÂNSITO EM JULGADO
CERTIDÃO
DOCUMENTO AUTÊNTICO
Sumário


I - O trânsito em julgado de Acórdão da Relação só ocorre depois de esgotados todos os meios de reação legalmente previstos ou o decurso do respetivo prazo, designadamente, a interposição de recurso nos termos gerais ou excecionais, mesmo que não admissível, a reclamação do despacho de não admissão do recurso, o pedido de reforma ou a arguição de nulidades.
II - Tendo a parte interposto recurso de revista do acórdão da Relação, tendo sido proferido despacho de não admissão desse recurso, não tendo aquela reagido a tal despacho, aquele acórdão só se tornou definitivo com a definitividade, da decisão de não admissão do recurso de revista, a qual só ocorreu no décimo dia posterior ao dia em que se considera notificada a decisão de não admissão, por nesse prazo poder ser apresentada reclamação para o STJ.
III - A certidão emitida por um Oficial de Justiça, tendo por objecto elementos documentais extraídos de um processo, constitui um documento autêntico e faz prova plena quanto a tais elementos na medida em que se trata de um documento emitido por um oficial público, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído e os factos são atestados com base na percepção da mesma.
IV – Mas já não faz prova plena na parte em que certifica a data do trânsito em julgado de determinada decisão, na medida em que tal “certificação” traduz um juízo pessoal do Oficial de Justiça, que inclusive envolve considerações de natureza jurídica.

Texto Integral


ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

1. Relatório

Nos autos de embargos de executado, que AA deduziu por apenso à execução que BB intentou contra o mesmo, a 14/01/2022 foi proferida decisão com o seguinte teor:
“Pelo exposto, decido:
5.1.- Julgar procedente o pedido de condenação do embargante como litigante de má-fé e, em consequência, condena-se o embargante no pagamento de um uma multa que se fixa em quinze mil euros; no pagamento das despesas processuais da embargada/exequente; e no pagamento dos honorários do ilustre mandatário da exequente, diretamente a este, a liquidar no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da presente sentença.
5.2.- Custas do incidente pelo embargante.”

O embargante interpôs recurso da referida decisão, tendo esta Relação, por Acórdão da 3ª Secção, de 06/10/2022 decidido:
“Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em:
A. Julgar parcialmente procedente a apelação principal, deduzida pelo Embargante, reduzindo o valor da multa devida pela conduta em que foi condenado, para 3000 (três mil) euros, mantendo no restante a decisão;
B. Julgar improcedente o recurso subordinado da Embargada.”

O referido Acórdão foi notificado às partes a 07/10/2022.

A 07/11/2022 o embargante interpôs recurso de revista normal para o Supremo Tribunal de Justiça.

Por despacho de 09/12/2022 o recurso de revista não foi admitido,

Tal despacho foi notificado na mesma data.

Nada mais foi requerido pelo embargante/recorrente.

A 15/01/2023 a embargada BB juntou aos autos nota de liquidação de honorários.

A 26/01/2023 o embargante pronunciou-se invocando, no que releva à economia do recurso, a “extinção, por caducidade, do direito a honorários em virtude da sua liquidação ser extemporânea”, dizendo, em síntese, que o Acórdão desta RG, proferido nos autos a 06/10/2022, foi notificado a 07/10/2022 e, por não admitir recurso ordinário, transitou em julgado a 20/10/2022, o prazo para liquidação dos honorários extinguiu-se no dia 31/10/2022 por caducidade, a embargada só apresentou a  liquidação dos honorários a 15/01/2023 é extemporânea.

A embargada respondeu invocando, em síntese, que a interposição de recurso ordinário dentro do prazo de recurso, bem ou mal formulado, continua a interrupção do prazo do trânsito em julgado da sentença da primeira instância até decisão que recaia sobre o requerimento de recurso, seja pelo seu julgamento de mérito, seja pela sua não admissão, o embargante interpôs recurso ordinário de revista no dia 7/11/2022, a decisão de não admissão de tal recurso foi proferida no dia 9/12/2022, a qual foi notificada a dia 14/12/2022, a liquidação dos honorários foi junta no dia 15/01/2023, por isso, foi correta e tempestiva a liquidação efetuada.

A 06/03/2023 foi proferido despacho com o seguinte teor:
“O embargante foi condenado a liquidar os honorários do ilustre mandatário da embargada no prazo de “10 dias após o trânsito em julgado da sentença”.
A este prazo, o legislador acrescentou ainda um prazo para a prática do ato com multa, até ao máximo de 3 dias - cfr. artigo 139.º, n.º 5, do C.P.C..
No caso, resulta dos autos que o douto Ac. do V.T.R.G. datado de 06-10-2022 e notificado às partes no dia 07-10-2022, conforme resulta do douto despacho proferido pelo V.T.R.G. datado de 09-12-2022, não era passível de recurso de revista.
Na verdade, conforme sobressai do douto despacho proferido pelo V.T.R.G. datado de 09-12-2022, tal douto Ac. do V.T.R.G era apenas passível de reclamação, o que não aconteceu – cfr. artigo 666.º, do C.P.C..
Neste contexto, sabendo-se que a liquidação dos honorários foi apresentada no passado dia 15-01-2023, apenas nos resta concluir pela extemporaneidade da sua apresentação porquanto foi apresentada após o decurso do citado prazo perentório de 10 dias.
Assim, em face do exposto, indefere-se, por extemporânea, a liquidação dos honorários do ilustre mandatário da embargada apresentada nos autos.”

A 20/03/2023 o tribunal a quo emitiu certidão do Acórdão proferido por esta RG a 06/1/2022, com o seguinte teor:
“CERTIFICA que neste Juízo correm termos os autos acima identificados e que os atos processuais que fazem parte integrante desta certidão estão conformes aos
correspondentes dados da tramitação do processo.
Mais certifica que o acórdão proferido a 06-10-2022 transitou em julgado a 09-11-2022.
É quanto cumpre certificar em face do que foi solicitado.
... 20-03-2023.”
           
A 22/03/2023 a embargada interpôs recurso, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:
I - A decisão sob recurso é nula por omissão de pronúncia sobre questões que o tribunal a quo se devia pronunciar, designadamente sobre a data, em concreto, do trânsito em julgado da sentença para os efeitos da liquidação de honorários pelo mandatário da embargada e sobre a natureza e os efeitos do recurso de REVISTA interposto pelo embargante, nos termos supra expostos os quais para aqui se convocam para todos os efeitos legais (cf. alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º).
II - Além disso, a decisão sob recurso, para além de ser ambígua ou obscura, faz errada interpretação e aplicação da lei, e viola as disposições conjugadas dos artigos 615.º, 616.º, 619.º, 627.º, n.º 2, 628.º, 629.º, n.º 2, 666.º, 671.º, 672 e 674.º todos do CPC, nos termos supra invocados que para aqui se convocam para todos os efeitos legais.
III - Com efeito, a sentença dos autos transitou em julgado no dia 4/01/2023, com o trânsito em julgado do recurso de apelação do embargante interposto para o Tribunal da Relação de Guimarães e julgado sob o n.º 5613/19.... da 3.ª Secção Cível desse Tribunal, nos termos supra expostos os quais para aqui se convocam para todos os efeitos legais.
IV - Contrariamente à decisão aqui em causa, foi tempestiva a liquidação dos honorários devidos pelo embargante ao mandatário da embargada bem como foi tempestiva a sua junção aos autos no dia 15/01/2023, nos termos supra expostos os quais para aqui se convocam e dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
V - A certidão emitida pelo Juízo da 1.ª Instância no dia 20/03/2023 atesta uma falsidade no seguinte segmento literário:
“Mais se certifica que o acórdão proferido a 06-10-2022 transitou em julgado a
09-11-2023.”
e, por isso, deve ser declarada falsa para todos os efeitos legais, nos termos supra alegados que para aqui se convocam e dão por integralmente reproduzidos.
VI - O embargante age nos autos em estado de venire contra factum proprium interpondo um recurso de REVISTA sabendo da sua inviabilidade, como depois manifesta invocando-a a seu favor, e, após, vem negar a sua natureza e eficácia como tal, ao afiançar que a decisão em crise da 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães não é suscetível de recurso ordinário, nos termos supra invocados e para os quais se remete para todos os efeitos legais.
VII - Nestes termos e nos melhores de direito, que Vossas Excelências, Senhores Juízes Desembargadores, doutamente se dignarão suprir sempre sem prejuízo de quaisquer outras conclusões favoráveis à aqui apelante que resultem do conteúdo das alegações supra, no uso do sempre douto e prudente arbítrio do Vosso Julgamento, se Vossas Excelências declararem a nulidade, a ambiguidade ou a obscuridade da decisão proferida depois da sentença final pelo Julgador a quo por se afigurar ininteligível à apelante bem como a nulidade da certidão emitida pelo Tribunal a quo, no supra referido segmento literário ou a errada interpretação e aplicação da lei na decisão em crise conjuntamente com a aplicação de uma censura legal contra o venire contra factum proprium do embargante com todas as consequências legais, farão a tão esperada JUSTIÇA

O embargante contra-alegou, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:
        
1. A decisão recorrida não padece da nulidade que lhe é apontada.
2. O Tribunal recorrido, na decisão recorrida, ao julgar ser extemporêna e, portanto, ferida de caducidade, a apresentação da liquidação da indemnização em causa nos autos, no dia 15-01-2023, julgou tal questão correctamente, de acordo com a lei e com o direito.
3. Ao assim julgar, o Tribunal recorrido não violou nenhum dos artigos indicados nas conclusões da apelação, designadamente os artigos 615.º, 616.º, 619.º, 627.º, n.º 2, 628.º, 629.º, n.º 2, 666.º, 671.º, 672 e 674.º todos do CPC.

2. Questões a apreciar
O objecto do recurso, é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso, cuja apreciação ainda não se mostre precludida,

O Tribunal ad quem não poder conhecer de questões novas (isto é, questão que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” (cfr. António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª edição actualizada, Almedina, p. 139) (pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida).
 
As questões que cumpre apreciar são:
- a admissibilidade dos documentos juntos com o recurso;
- a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia e por obscuridade;
- erro de julgamento.

3. Da admissibilidade da junção de documentos
Com as suas alegações a recorrente junta 4 documentos alegando quanto a cada um deles o seguinte:
- doc. ... – “do separador respeitante ao processo da 3.ª Secção Cível do TRG sob o número 5613/19.... encontra-se registado no dia 11/01/2023 o seguinte: “Encerramento do processo Trânsito Tribunal/Serviços”,
- doc. ... – “Com vista à presente apelação, no dia 09-03-2023 o mandatário da apelante requereu certidão judicial à 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães referente à apelação tramitada sob o número 5613/19.....”
- doc. ... – “Tal certidão foi recusada “Por motivo de o processo ter baixado em 11-01-2023 à 1.ª Instância a título definitivo.”
- doc. ... – “No dia 13-03-2023 o mandatário da apelante requereu nos autos de embargos de executado – apenso A – certidão judicial do “… trânsito em julgado da apelação para o TRG sob o número 5613/19....”, pedido que, sob a referência ...62 dos autos de embargos com o n.º 5613/19...., foi satisfeito no dia 20-03-2023.”

Dispõe o artigo 651.º do CPC:
1- As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
(…)

Por sua vez o art.º 425.º do CPC dispõe:
Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
           
Desde logo e tendo em consideração as expressões do art.º 425º “só são admitidos” e do art.º 651º “apenas”, a faculdade de junção de documentos com as alegações de recurso é excepcional.

Conjugando os dois normativos verifica-se que as partes apenas podem juntar documentos com as alegações em duas situações, (i) superveniência objetiva ou subjetiva do documento; (ii) necessidade do documento surgida em face do julgamento proferido na 1.ª instância.

A superveniência do documento será objectiva se o documento tiver sido produzido em momento posterior ao encerramento da discussão da causa; será subjectiva se, justificadamente, só depois do encerramento da discussão da causa o documento chegar ao conhecimento da parte ou esta tiver acesso ao mesmo, exigindo-se, neste último caso, que tenha diligenciado atempadamente pela obtenção do mesmo.

Quanto á 2ª parte do n.º 1 do art.º 651º, é integrada pela “novidade ou imprevisibilidade da decisão, não podendo aceitar-se a junção de documentos quando ela se revele pertinente ab initio, por tais documentos se relacionarem de forma directa e ostensiva com a questão ou as questões suscitadas nos autos desde o primeiro momento” (neste sentido o Ac. do STJ de 30/04/2019, proc. 22946/11.0T2SNT-A.L1.S2, consultável in www.dgsi.pt/jstj e já antes o Ac. da RC de 18/11/2014, processo 628/13.9TBGRD.C1 consultável in www.dgsi.pt/jtrc).

E no mesmo sentido Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, in CPC Anotado, 2ª edição, pág. 813 afirmam que “ não é admissível a junção, com a alegação de recurso, de um documento potencialmente útil á causa, mas relacionado com factos que já antes da decisão a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado”, acrescentando que “a junção de documentos às alegações da apelação só poderá ter lugar se a decisão da 1ª instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento, quer quando a decisão se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação e interpretação as partes não contavam.”

Vejamos
Relativamente ao doc. ... - “do separador respeitante ao processo da 3.ª Secção Cível do TRG sob o número 5613/19.... encontra-se registado no dia 11/01/2023 o seguinte: “Encerramento do processo Trânsito Tribunal/Serviços”, tendo em consideração que a decisão recorrida foi proferida a 06/03/2023, verifica-se que nada permite afirmar que o mesmo objectivamente superveniente e a recorrente não alega qualquer facto que permita concluir que o mesmo é subjectivamente superveniente.

Destarte, não se admite o referido documento.

Quanto aos documentos ..., ... e ... tendo em consideração a sua superveniência objectiva, admitem-se os mesmos.

4. Nulidade da sentença
4.1. Enquadramento jurídico
Dispõe a alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC:
1. É nula a sentença quando:
(…)
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
 (…)”

A sentença pode ser vista como trâmite ou como acto: no primeiro caso, atende-se à sentença no quadro da tramitação da causa; no segundo, considera-se o conteúdo admissível ou necessário da sentença.

As nulidades da sentença e dos acórdãos referem-se ao conteúdo destes actos, ou seja, estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podiam ter (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in O que é uma nulidade processual? in Blog do IPPC, 18-04-2018, disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?q=nulidade+processual).

A alínea c) tem dois fundamentos: a contradição e a ininteligibilidade.
Aqui apenas releva a segunda.
A ininteligibilidade verifica-se quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade, ou seja, respectivamente, quando da decisão – e é apenas á decisão/dispositivo que a norma se refere - se puder extrair mais de um sentido ou quando não se puder retirar um sentido lógico, racional e coerente

A alínea d) contempla duas situações: a) quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (omissão de pronúncia) ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (excesso de pronúncia).

Aqui apenas releva a primeira
A primeira está correlacionada com a 1ª parte do n.º 2 do art.º 608º do CPC, que dispõe: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras;…”

O normativo tem em vista as questões essenciais, ou seja, o juiz deve conhecer todos os pedidos, todas as causas de pedir e todas as excepções invocadas e as que lhe cabe conhecer oficiosamente (desde que existam elementos de facto que as suportem), sob pena da sentença ser nula por omissão de pronúncia.

As questões essenciais não se confundem com os argumentos invocados pelas partes nos seus articulados. O que a lei impõe, sob pena de nulidade, é que o juiz conheça as questões essenciais e não os argumentos invocados pelas partes (sendo abundante a jurisprudência em que esta questão é suscitada, a título meramente exemplificativo o Ac. do STJ de 21/01/2014, proc. 9897/99.4TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jst).

Nos termos do n.º 1 do art.º 608º, a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica, ou seja, tem-se em vista aquelas questões - nulidades, excepções dilatórias ainda por apreciar ou outras questões de natureza processual - que possam ter influência no desfecho do processo.

 Por outro lado, o facto de, eventualmente, o tribunal a quo não se ter pronunciado quanto a factos alegados, não constitui nulidade nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea d) do CPC.

É que as questões essenciais que a 1ª parte do n.º 2 do art.º 608º do CPC impõe que o juiz conheça, também não se confundem com “factos”.

Como refere Alberto dos Reis, in CPC Anotado, 1984, pág. 145: “Uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra conhecer de questão de facto de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão.”

E como decidido pelo Ac. do STJ de 23/07/2017, processo 7095/10.7TBMTS.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, “o não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido”: são situações que “não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC, antes se tratando de situações que se reconduzem “a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC”.

4.2. Em concreto
Na conclusão II a recorrente invoca que a decisão recorrida é “ambígua e obscura.”

E na conclusão VII pede seja declarada “a nulidade, a ambiguidade ou a obscuridade da decisão proferida depois da sentença final pelo Julgador a quo por se afigurar ininteligível à apelante…”

A obscuridade é um dos fundamentos da ininteligibilidade da sentença que, por sua vez é um dos fundamentos da nulidade da sentença – alínea c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.

Mas, a alínea c) do n.º 1 do art.º 615º ao dizer “ou ocorra alguma (…) obscuridade que torne a decisão ininteligível” é claramente expressivo e impressivo no sentido de impor à parte o ónus de concretizar, onde ou de que forma é que se manifesta a “obscuridade”.

A recorrente não o faz, limitando-se a afirmar, de forma vaga e genérica, que a decisão recorrida é ambígua e obscura.

Sendo assim, é manifestamente improcedente a nulidade da sentença à luz da alínea c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.

Invoca a recorrente a nulidade da sentença por não se ter pronunciado sobre a data, em concreto, do trânsito em julgado da sentença para os efeitos da liquidação de honorários pelo mandatário da embargada e sobre a natureza e os efeitos do recurso de revista interposto pelo embargante.

A recorrente labora em equívoco porquanto a questão essencial, sobre a qual o tribunal de se pronunciar, era se a liquidação dos honorários tinha sido apresentada tempestivamente.
E o tribunal pronunciou-se sobre esta questão.

É certo que à luz da decisão proferida a 14/01/2022 os honorários haveriam de ser liquidados no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da sentença.

Tendo sido interposto recurso da referida decisão, o trânsito em julgado há-de reportar-se ao Acórdão que julgou o mérito de tal recurso.

E, sendo assim, para poder concluir pela tempestividade ou intempestividade da liquidação apresentada, o tribunal a quo haveria de indicar a data do trânsito em julgado.
Porém, não o fez de forma concreta.

Mas, sendo assim, a data do trânsito em julgado não constitui uma “questão”, nos termos e para os efeitos do disposto na 1ª parte do n.º 2 do art.º 608º do CPC, mas apenas e tão só um dos passos do itinerário do julgamento da tempestividade da liquidação dos honorários, pelo que a sua ausência apenas implica com a qualidade da fundamentação.

Quanto “à natureza e os efeitos do recurso de REVISTA interposto pelo embargante”, também não constitui uma questão nos termos e para os efeitos do disposto na 1ª parte do n.º 2 do art.º 608º do CPC. É apenas um argumento. E, como referido, as questões essenciais não se confundem com os argumentos invocados pelas partes nos seus articulados. Destarte, não tinha o tribunal que se pronunciar quanto a tal matéria.

Em face de tudo o exposto, improcede a nulidade por omissão de pronúncia.

5. Fundamentação de facto
As incidências fácticas relevantes para a decisão são as indicadas no antecedente relatório e que aqui se dão por reproduzidas.

6. Fundamentação de direito
Por decisão de 14/01/2022, o tribunal a quo condenou o recorrido como litigante de má fé em multa e “no pagamento das despesas processuais da embargada/exequente; e no pagamento dos honorários do ilustre mandatário da exequente, diretamente a este, a liquidar no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da presente sentença.”

Decorre deste excerto que aquando da decisão o tribunal a quo não dispunha de elementos para fixar o montante da indemnização e determinou que essa liquidação se realizasse no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da decisão.

Tendo a embargada apresentado a liquidação dos honorários, a mesma foi considerada extemporânea.

Vejamos

6.1. Enquadramento jurídico – natureza do prazo
A primeira distinção no domínio dos prazos é entre prazos substantivos e processuais.
Os prazos substantivos regulam a pratica de actos substantivos e estão previstos na lei substantiva.
O prazo processual destina-se a fixar um “período de tempo” para a prática de um acto  no processo, tendo em vista garantir a tramitação sequencial e ordenada do mesmo e a obtenção de uma decisão em prazo razoável e que se conta de acordo com as regras previstas na lei processual civil e as regras constantes do art.º 279º do CC, aplicável ex vi art.º 296º do CC.

É consabido que o prazo processual pode ser legal – fixado por lei – ou judicial – fixado pelo juiz.

O juiz só pode fixar o prazo para a prática de determinado acto, se a lei previr,  expressamente, que cabe ao juiz a fixação de prazo para a sua prática ou se se tratar de acto determinado pelo juiz, para o qual a lei não preveja prazo específico.

Os prazos podem ainda ser definidos como prazos perentórios ou dilatórios.
“O prazo perentório – também designado por “prazo aceleratório”, “prazo resolutivo”, “prazo extintivo”, “prazo preclusivo”, “prazo fatal” (…) - é aquele cujo decurso, ressalvadas as excepções previstas na lei, em que se permite a prática do ato após o termo do prazo (art.º 139º, n.º 5 e 140º), implica extinção, por caducidade, do direito de praticar o acto.” (cfr. Marco Carvalho Gonçalves, Prazos Processuais, Almedina, pág. 23-24).

Assim dispõe o art.º 139º n.º 3 do CPC que o decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato.

Em regra, os prazos estabelecidos por lei ou fixados pelo juiz para a prática de atos processuais são perentórios (Marco Carvalho Gonçalves, ob. cit. pág. 23)

O prazo dilatório é aquele que adia para certo momento a possibilidade de prática de um ato ou o inicio da contagem de um outro prazo (cfr. por ex. o art.º 245º do CPC).

6.2. Em concreto
Tendo presente o exposto, impõe-se concluir que o prazo de 10 dias fixado pelo despacho de 14/01/2022 é um prazo processual, pois fixa um “período de tempo” para a prática de um acto – liquidação -  no processo.

E é um prazo judicial pois a lei não estabelece um prazo para a parte liquidar a indemnização na sequência da condenação da contraparte como litigante de má-fé.

Finalmente não pode deixar de ser considerado um prazo perentório, pois não só essa é regra em processo civil, como não adia para certo momento a possibilidade de prática do ato, nem o inicio da contagem de um outro prazo.

Neste contexto, a não junção aos autos da liquidação dos honorários no prazo de 10 dias, a contar do trânsito em julgado, determina a extinção do direito de praticar o acto.

No recurso, a recorrente não coloca em causa esta conclusão.

Resta saber como se apura o trânsito em julgado.

6.3. Enquadramento jurídico - trânsito em julgado
Uma decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação – art.º 628º, do CPC.

Em primeiro lugar a lei estabelece como pressuposto do trânsito em julgado que a decisão não seja susceptível de recurso ordinário.

O art.º 627º n.º 2 do CPC dispõe que os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão.

No caso de acórdão da Relação, se o mesmo é susceptível de recurso de revista, o trânsito em julgado depende do esgotamento do prazo para tal – 30 dias ou, nos casos previstos no art.º 677º, 15 dias.

Se  o mesmo não é susceptível de recurso de revista - porque não estão verificados os pressupostos gerais de recorribilidade – valor da causa e sucumbência – ou, por determinação legal, a decisão não admite recurso em mais de um grau – o trânsito em julgado ocorre com o esgotamento do prazo para a arguição de nulidades ou dedução do incidente de reforma – art.ºs 615º e 616º, aplicáveis aos Acórdãos da Relação ex vi art.º 666º, todos do CPC – prazo esse que é de 10 dias a contar da notificação do Acórdão (seguimos de perto Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7ª edição, pág. 36-37).

Mas, relativamente a esta segunda situação, importa ter em consideração que, como adverte o mesmo autor, in ob cit., pág. 39:
“Podem ocorrer vicissitudes suscetíveis de determinar tanto a antecipação como o diferimento da data do trânsito em julgado.
(…)
Quanto à dilação do trânsito em julgado, (…) há efeitos que forçosamente se produzem mesmo quando o recurso é rejeitado, tendo em conta a necessidade de aguardar a definitividade do despacho de não admissão, sujeito a reclamação para o tribunal superior, nos termos do artigo 643º.
O mesmo ocorre nos casos em que é deduzida alguma reclamação que seja indeferida, enquanto não se estabilizar definitivamente a decisão em causa.”

Também Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in CPC Anotado, Volume 3º, pág. 20,  referem:
“A decisão de não admissão de recurso ordinário pode ainda ser impugnada através da reclamação prevista no art.º 643º, se o recorrente com ela não se conformar, caso contrário transitando em julgado a decisão de que se pretendia recorrer. Sendo interposta a reclamação prevista no art.º 643º, a inadmissibilidade do recurso ordinário só se verifica depois de ser confirmado o despacho de não admissão pelo relator ou, eventualmente pela conferência (abstrai-se da eventual interposição de recurso de constitucionalidade do acórdão proferido pela conferência no tribunal superior, quando tal seja admissível).”

Ou seja: ainda que à luz da lei, o Acórdão não seja susceptível de recurso de revista, o apuramento do trânsito em julgado, não prescinde da análise das concretas vicissitudes, sob pena de se desconsiderar a realidade e se cair numa ficção e, nomeadamente, não prescinde de verificar se foi interposto tal recurso, se o mesmo não foi admitido, se houve reclamação dessa decisão, se da decisão do Relator foi pedida a conferência, pois se tal suceder, o Acórdão só se torna definitivo, quando se tornar definitiva a última decisão.

Aliás, neste sentido decidiu o STJ, no Ac. de 22/02/2017, processo 659/12.6TTMTS.P2-A.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj que:
“Efetivamente, não é o facto puro e simples da sentença ou acórdão não admitirem recurso à face da lei, que acarreta o trânsito em julgado na data da respetiva prolação, como entendeu a 1ª instância e defende a recorrente. O trânsito só ocorre depois de esgotados todos os meios de reação legalmente previstos ou o decurso do respetivo prazo, seja a interposição de recurso nos termos gerais ou excecionais, seja a reclamação do despacho de não admissão do recurso, seja o pedido de reforma ou a arguição de nulidades.
(…)
No caso em apreço, tendo sido interposto recurso do acórdão confirmativo da sentença, que não foi admitido, contra o que a recorrente reagiu apresentando a respetiva reclamação, como legalmente estatuído (art. 643º, nº 1 do CPC), o trânsito apenas ocorreu no dia …, ou seja, no décimo dia posterior à notificação do indeferimento da reclamação …, dado que não foi requerida a intervenção da conferência (art. 643º, nº 4 e 652º, nº 3 do CPC).”

6.4. Em concreto
Nos autos de embargos de executado, que AA deduziu por apenso à execução que BB intentou contra o mesmo, a 14/01/2022 foi proferida decisão que julgou procedente o pedido de condenação do embargante como litigante de má-fé e condenou-o no pagamento de uma multa, despesas processuais da embargante “e no pagamento dos honorários do ilustre mandatário da exequente, diretamente a este, a liquidar no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da presente sentença.”

O embargante interpôs recurso da referida decisão, tendo esta Relação, por Acórdão da 3ª Secção, de 06/10/2022 decidido:
“Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em:
A. Julgar parcialmente procedente a apelação principal, deduzida pelo Embargante, reduzindo o valor da multa devida pela conduta em que foi condenado, para 3000 (três mil) euros, mantendo no restante a decisão;
B. Julgar improcedente o recurso subordinado da Embargada.”

Tendo sido interposto recurso da decisão de 14/01/2022, o trânsito em julgado relevante há-de reportar-se ao Acórdão que julgou o mérito de tal recurso.

O referido Acórdão foi notificado às partes a 07/10/2022.

A 07/11/2022 o embargante interpôs recurso de revista normal para o Supremo Tribunal de Justiça.

Por despacho de 09/12/2022 o recurso de revista não foi admitido,

Tal despacho foi notificado na mesma data, considerando-se a embargada notificada a 12/12/2022.

O embargante tinha o prazo de 10 dias para reclamar para o STJ, o qual, contado a partir do dia 13, terminava a 04/01/2023, dada a interposição das férias judiciais de natal, momento em que se suspende a contagem dos prazos (art.º 138º, n.º 1 do CPC).

O embargante não deduziu reclamação.

Assim sendo, o Acórdão da RG de 06/10/2022 só se tornou definitivo com a definitividade, a 04/01/2023, da decisão de não admissão do recurso de revista.

Destarte, o Acórdão da RG de 06/10/2022 transitou em julgado a 04/01/2023.

Destarte, carece de qualquer fundamento a alegação do recorrente de que o referido Acórdão transitou em julgado a 31/10/2022.

Neste ponto importa ter em consideração que já depois de ter sido proferida a decisão, a 20/03/2023 o tribunal a quo emitiu certidão onde consta “que o acórdão proferido a 06-10-2022 transitou em julgado a 09-11-2022.”
           
A recorrente pretende se declare a falsidade da referida certidão.

Há que distinguir: a) a falsidade material – ocorre alteração da materialidade gráfica do documento, por contrafacção (formação do documento por um sujeito diverso do autor aparente) ou por alteração do documento após a sua formação; b) a falsidade ideológica – atesta-se no documento a prática de um facto ou uma realidade que não foi praticado ou não se verificou; há falta de correspondência entre o que se dá como ocorrido e o que realmente ocorreu.

A falsidade material pode ser oposta a todo o tipo de documentos.
A falsidade ideológica, só pode ser oposta a documentos autênticos, como claramente resulta do disposto no n.º 1 do art.º 372º do CC, o qual dispõe que a força probatória dos documentos autênticos só pode ser ilidida com base na sua falsidade, estando ainda consignada no n.º 2 do mesmo normativo a definição de falsidade ideológica.

A questão que então se coloca é a de saber se a referida certidão é um documento autêntico.

O art.º 363º n.º 2 do CC dispõe que são documentos autênticos os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública; todos os outros documentos são particulares.

E o art.º 369º n.º 1 dispõe que o documento só é autêntico quando a autoridade ou oficial público que o exara for competente, em razão da matéria e do lugar, e não estiver legalmente impedido de o lavrar.

O n.º 1 do art.º 370º do CC dispõe que presume-se que o documento provém da autoridade ou oficial público a quem é atribuído, quando estiver subscrito pelo autor com assinatura reconhecida por notário ou com o selo do respectivo serviço.

Mas passando do plano formal, para o plano do valor probatório, o n.º 1 do art.º 371º do CC dispõe que os documentos autênticos [só] fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador.

Em concreto

A certidão em causa, tendo por objecto elementos documentais dele extraídos, constitui um documento autêntico e faz prova plena quanto a tais elementos na medida em que se trata de um documento emitido por um oficial público, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído e os factos são atestados com base na percepção da mesma.

Mas isso já não sucede quanto à menção “que o acórdão proferido a 06-10-2022 transitou em julgado a 09-11-2022”, porquanto a mesma traduz um juízo pessoal da Sra. Oficial de Justiça, que inclusive envolve considerações de natureza jurídica.

Neste sentido afirmou-se no Ac. da RP de 05/02/2015, processo 3724/12.6TBVFR.P2, consultável in www.dgsi.pt/jtrp:
“Uma decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação – artº 628º, do CPC.
Na operação que conduz a tal consideração – conclusão ou juízo – confluem factos objectivos do processo (data da notificação às partes e verificação de que, no período de tempo julgado relevante nenhum recurso foi interposto e nenhuma reclamação foi deduzida) e aplicação de normas legais (desde logo, as relativas à data em que juridicamente se presume feita a dita notificação e, depois, as que determinam se e em que prazo ou até quando o recurso ordinário podia e devia ter sido deduzido ou a reclamação apresentada).
Aqueles (factos) percepcionáveis e extraíveis directamente do processo e reportáveis ou narráveis na certidão pelo documentador dele depositário público, têm a força probatória dos originais, a qual, porém, pode ser invalidada ou modificada por confronto com aquele (original), designadamente pela pessoa contra quem for apresentada – artºs 383º, nº 1, e 385º, nºs 1 e 2, do Código Civil.
Estas (normas), na medida em que implicam a sua escolha, interpretação e aplicação e, por isso, tarefa de índole jurídica para que lhe falta legitimidade e competência funcional (ainda que, ressalve-se, disponha de plena capacidade e saber), escapam ao acto de certificação e, por isso, àquela força probatória, podendo naturalmente a operação ser questionada em termos normais no plano do erro de direito (já não no do factual ou da prova).”

Destarte, na parte em que se refere à data do trânsito em julgado do Acórdão desta RG de 06/10/2022, a certidão em referência não constitui um documento autêntico, pelo que não tem cabimento, quanto a ela, a invocação da falsidade.

Além disso, saber em que data transitou em julgado uma dada decisão, constitui matéria de direito, para cuja apreciação releva saber em que data foi notificada às partes e se houve, ou não, reclamação ou foi interposto recurso e que, portanto, cabe ao tribunal apreciar de acordo com os factos e as normas legais aplicáveis, não estando vinculado ao que for certificado pela secretaria.

Prosseguindo

Considerando que o Acórdão desta RG de 06/10/2022 transitou em julgado a 04/01/2023 e contando desde 10 dias a partir da referida data, temos que o prazo para a embargada apresentar liquidação dos honorários terminava no dia 14/01/2023.
Mas sendo um sábado, o termo do prazo transferiu-se para o 1º dia útil seguinte – 16/01/2023 (cfr. 138º, n.º 2 do CPC).

Sucede que a 15/01/2023 a embargada BB juntou aos autos nota de liquidação de honorários.

Sendo assim, a apresentação da referida nota de liquidação é tempestiva, pelo que a decisão recorrida não se pode manter, devendo ser revogada e os autos prosseguir com o conhecimento do mérito da liquidação, o que determina a procedência do recurso.
As custas do recurso ficam a cargo do recorrido, por que, não só suscitou em 1ª instância a questão da intempestividade da liquidação, contra-alegou nesse mesmo sentido, tendo, assim, ficado vencido – art.º 527º n.º 1 e 2 do CPC.

7. Decisão
Termos em que acordam os Juízes que compõem a 1ª Secção da Relação de Guimarães em julgar o recurso procedente e, em consequência, revogar a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir com o conhecimento do mérito da liquidação.

Custas da apelação pelo recorrido – art.º 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC

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Notifique-se
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Guimarães, 12/10/2023
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
           
Relator: José Carlos Duarte
Adjuntos: Maria Gorete Morais
Gonçalo Oliveira Magalhães