Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÕES SOCIAIS
PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO
CONTRADITÓRIO
ABUSO DE DIREITO
Sumário
I – Não tendo os Habilitados suscitado nenhuma nulidade no tribunal recorrido no decurso do processo, e não o tendo sequer feito no prazo de 10 dias a contar da notificação da sentença final, a consequência necessária é a de considerar precludido o direito de invocação de tais nulidades processuais em sede de recurso de apelação, por falta de arguição atempada. II – Tendo a sociedade Ré apresentado reconvenção contra os Autor e Interveniente/gerentes pedindo, pela primeira vez, que estes sejam condenados no reembolso de valores que considera indevidamente retirados à sociedade e tendo os factos alegadamente praticados por estes sido praticados até 11 de Maio de 2008, o direito desta sociedade a ser indemnizada pelos gerentes já estava prescrito desde 11 de Maio de 2013, por aplicação do disposto no art.º 174.º do Código das Sociedades Comerciais. III – A versão actual do CP Civil continua a consagrar o princípio do dispositivo, de onde decorre que às partes cabe alegar os factos essenciais que constituam a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas. Exceptuados estes, o juiz da causa, oficiosamente ou a requerimento das partes, pode considerar na sentença final os factos complementares e os factos concretizadores resultantes da instrução da causa, nos termos previstos no art.º 5º, nº 2, alínea b), do CP Civil. IV – Em sede de recurso de apelação, perante um conjunto de factos não alegados e em relação aos quais os Réus não manifestaram até ao final da audiência de julgamento requerimento no sentido de os ver aditados à matéria de facto dos autos, os mesmos apenas deverão ser aditados por esta Relação se tiverem resultado da instrução da causa com uma consistência relevante, atendendo à obrigatoriedade de, procedendo desta forma, se ter de dar o contraditório à contra-parte, eventualmente com produção de novas provas. V – Estando assente que o Autor foi destituído da gerência da sociedade Ré com fundamento na prática de factos de apropriação indevida de dinheiros da sociedade, levantamentos indevidos de dinheiros societários para pagamento de supostos créditos e instauração de procedimentos disciplinares e aplicação de sanções disciplinares a trabalhadores sem qualquer fundamento e gerador de prejuízos para a sociedade, a procedência dos pedidos por este formulados contra a mesma sociedade de pagamento de remunerações várias e de indemnização a título de danos morais ofenderia os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico dos direitos, à luz do instituto do abuso de direito.
Texto Integral
Processo n.º 409/15.5T8AMT.P3
Comarca: [Juízo de Comércio de Amarante (J2); Comarca do Porto Este]
Relatora: Lina Castro Baptista
Adjunta: Alexandra Pelayo
Adjunto: Fernando Vilares Ferreira
SUMÁRIO
………………………
………………………
………………………
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I – RELATÓRIO
AA, residente na Rua ..., ..., intentou contra “A..., LDA.”, sociedade com sede na Rua ..., ... e ..., Marco de Canaveses; BB, residente na Rua ..., ..., ..., Marco de Canaveses; CC, residente na Rua ..., ..., ... e ..., Marco de Canaveses, e DD, residente na Rua ..., ..., ... e ..., Marco de Canaveses, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, pedindo que:
a) Seja declarada nula e de nenhum efeito a deliberação de 20 de Agosto de 2003 que o destituiu da gerência da 1.ª Ré. A não se entender assim, e sem prescindir, que seja declarada revogada a deliberação de 20 de Agosto de 2003 que o destituiu da gerência da 1.ª Ré e, sempre, em consequência
b) Se ordene o cancelamento do registo da deliberação social tomada na assembleia geral extraordinária da requerida realizada no dia 20 de Agosto de 2003, pelas onze horas, na sede social da requerida na conservatória do registo comercial com a suspensão imediata dos seus efeitos retroagindo à data do respectivo averbamento.
c) Os 1.º, 2.º e 4.º Réus sejam condenados solidariamente a pagar-lhe a quantia de EUR 30.000,00 (trinta mil euros) pelos danos não patrimoniais.
d) A 1.ª Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de EUR 125.015,90 (cento e vinte e cinco mil, quinze euros e noventa cêntimos), proveniente da sua remuneração mensal como gerente, no montante de EUR 1.571, 21 (mil quinhentos e setenta e um euros e vinte e um cêntimos), 14 meses por ano, desde Dezembro de 200, após a execução da deliberação de destituição declarada nula pela sentença proferida daquela sentença, que teve lugar em 17 de Setembro de 2012;
e) A 1.ª Ré seja condenada a pagar-lhe os juros de mora sobre as remunerações mensais em dívida à taxa legal de 4 % que contados desde o dia 01 do mês seguinte àquele a que respeitam perfaz a 03/03/2015 a quantia de EUR 26.167,65;
f) A 1.ª Ré seja condenada a pagar os juros de mora vincendos à taxa de 4 % contados sobre EUR 125.015,90 desde 04/03/2015 até efectivo e integral pagamento;
g) Os 2.º e 3.º Réus sejam condenados, solidariamente com a 1.ª Ré, a pagar-lhe a quantia global de EUR 151.173,55 (cento e cinquenta e um mil, cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos), acrescida dos juros legais de mora vincendos contados desde 04/03/2014 até efectivo e integral pagamento, constante nos pedidos das alíneas d), e) e f).
Alega, em síntese, ser sócio da 1.ª Ré e serem os demais Réus sócios da mesma sociedade.
Expõe que, por sentença proferida no Processo n.º 1114/06.9TBMCN, foi decidida a anulação da deliberação tomada na Assembleia Geral desta sociedade de 22/06/06, que o destituiu de gerente com justa causa.
Mais expõe que na Assembleia Geral da mesma sociedade de 17/10/12 se decidiu a “suspensão e destituição judicial das funções de gerente de EE e de AA”. Acrescenta ter instaurado providência cautelar e posterior acção principal para suspensão destas deliberações.
Afirma que, entretanto, os sócios-gerentes 2.º e 4.º Réus fizeram ressuscitar uma deliberação da sua destituição de gerente da sociedade tomada na assembleia geral de 20/08/03, tendo-a levado a registo comercial, no dia 26/10/12.
Defende que esta destituição é nula por violação do seu direito especial de gerência e ainda inexistente porque na Providência Cautelar de suspensão de deliberações sociais com o n.º 1135/03.3TBMCN ele e a 1.ª Ré acordaram pôr fim aos autos através de transacção judicial, nos termos constantes de fls. 101 e ss.
Mais alega que, na sequência da sua destituição de gerente da 1.ª Ré ocorrida em 2006, esteve, por imposição da Ré, ausente da empresa até ao trânsito em julgado da sentença que declarou nula tal destituição, em 17/09/12. Bem como que, tendo, entretanto, sido registada a acima referida destituição de gerente na sequência da Assembleia Geral de 2003, foi proibido pelos sócios maioritários 2.º e 4.º Réus de entrar nas instalações da empresa, situação que se mantém até hoje.
Invoca que esta situação lhe causa vexame, humilhação, indignação e noites sem conseguir repousar.
Reclama dos 1.º, 2.º e 4.º Réus uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de EUR 30.000,00.
Por outro lado, diz que, desde Dezembro de 2006 até à presente data, deixou de receber a remuneração mensal que recebia como gerente, no valor de EUR 1.571,21 durante 14 meses/ano, num valor global de EUR 125.015,90.
Alega ainda que os 2.º e 3.º Réus, tendo aprovado a última deliberação tomada que decidiu a destituição de funções do sócio EE e a sua própria, são responsáveis solidariamente com a 1.ª Ré pelos prejuízos por si sofridos.
Os Réus vieram contestar excepcionando a preclusão do direito de impugnação das deliberações tomadas na assembleia geral de 20/08/03, defendendo que a mesma permanece válida.
Expõem que a transacção judicial alcançada no Processo n.º 1135/03.3TBMCN se restringe, apenas e só, ao acordo para cessão de quotas, nada se dispondo quanto à destituição do Autor.
Acrescentam que a deliberação tomada em assembleia geral de 08/10/04 de rejeitar a proposta de se dar sem efeito a deliberação sub judice não foi objecto de qualquer acção de declaração de nulidade ou de anulação.
Impugnam toda a factualidade relativa à retribuição como gerente e aos danos alegados.
Dizem que o Autor, desde a deliberação de 22/06/06 não desempenha quaisquer funções para a sociedade 1.ª Ré e que esta apenas continuou a pagar-lhe a remuneração de gerente pelo facto de este ter interposto e registado na Conservatório do Registo Comercial uma providência cautelar para a suspensão da sua destituição.
Aduzem a existência de uma causa prejudicial que justifica a suspensão desta acção.
Em sede de reconvenção reiteram que o Autor e o seu irmão EE se apropriaram de dinheiros societários para custearam as acções judiciais que foram propondo contra a sociedade 1.ª Ré e os outros sócios, tendo ainda levado a cabo um conjunto de transferências bancárias de conta bancária da sociedade a seu favor.
Invocam igualmente que estes instauraram processos disciplinares a todos os empregados, desmotivaram tais trabalhadores e os levaram a recorrer à greve.
Defendem que o Autor e o seu irmão EE devem ser condenados pelos prejuízos causados à 1.ª Ré com o seu comportamento grave e culposo, desleal e perturbador do funcionamento da sociedade, com repercussões no seu bom nome e imagem perante clientes e fornecedores, bem como no relacionamento com os seus trabalhadores, necessários à produtividade da empresa. Liquidam esses danos em montante nunca inferior a EUR 40.000,00.
Concluem pedindo que a presente acção seja julgada improcedente, por não provada, com a sua absolvição de todos os pedidos, com as devidas consequências legais. Sem prejuízo, pedem que os presentes autos sejam sobrestados até prolação de decisão definitiva, transitada em julgado, das questões prejudiciais consistentes no Processo n.º 1678/12.8TBMCN.
Caso assim não se entenda, pedem que a reconvenção seja julgada procedente, por provada, e, em consequência, o Autor e o seu irmão EE condenados no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, no montante que se venha a apurar, acrescidos de juros vencidos e vincendos à taxa legal, sendo ainda solidariamente condenados a indemnizar a 1.ª Ré pelos prejuízos causados com a sua conduta, em montante nunca inferior a EUR 40.000,00.
Requerem a intervenção principal do identificado irmão do Autor EE, vindo este incidente a ser oportunamente deferido.
O Autor veio apresentar Réplica, excepcionando a prescrição dos factos relativos a apropriações de dinheiros societários e impugnando a generalidade da matéria de facto da reconvenção
Remata pedindo que a reconvenção seja julgada improcedente e não provada, condenando-se como se pede na Petição Inicial.
O Interveniente EE veio apresentar articulado próprio, excepcionando a prescrição dos factos relativos a apropriações de dinheiros societários e impugnando a generalidade da matéria de facto da reconvenção
Conclui pedindo que a reconvenção deduzida pelos Réus seja julgada totalmente improcedente e não provada.
Entretanto, decretou-se a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão a proferir na acção n.º 1678/12.8TBMCN, pendente igualmente no Juízo de Comércio de Amarante.
Proferiu-se despacho saneador, definiu-se o objecto do litígio e fixaram-se os Temas da Prova.
Em face do falecimento do Interveniente EE foi decidida a habilitação dos seus herdeiros FF, GG e HH, por decisão de 09/12/21.
Estes habilitados foram, com data de 10/12/21, notificados da sentença nos seguintes termos: “Assunto: Sentença Fica V. Ex.ª notificado, na qualidade de Habilitado, relativamente ao processo supra identificado, da sentença de que se junta cópia.”
Os habilitados não foram notificados da obrigatoriedade de constituição de mandatário judicial.
Em 19/01/22, foi agendada Audiência Prévia para o dia 01 de Fevereiro de 2022. Posteriormente, por motivo de doença, esta Audiência foi adiada para o dia 15 de Fevereiro de 2022.
Os Habilitados indicados não foram notificados de nenhuma destas datas agendadas para a realização da Audiência Prévia.
Realizou-se audiência prévia, em 15/02/22, apenas com a presença do Autor, do seu Ilustre mandatário e do Ilustre mandatário dos Réus, no âmbito da qual se discutiram as excepções deduzidas nos autos e o âmbito dos Temas da Prova. Ainda no âmbito desta Audiência Prévia agendou-se a audiência de julgamento para o dia 29/03/22.
Sequencialmente foi proferido despacho, em que se fixou, de forma definitiva, o objecto do litígio e os Temas da Prova.
Os requerimentos apresentados pelo Autor e pelos Réus após a realização da Audiência Prévia e os despachos que sobre aqueles recaíram não foram notificados aos habilitados.
Com data de 23/03/22, os Habilitados foram notificados da data designada para o início da audiência de julgamento.
Na Acta de Audiência de Julgamento de 29/03/22, consta como presentes “Autor: AA; Mandatário do Autor: Dr. II (acompanhado por advogada estagiária – Dra. JJ, cédula profissional nº ...); Mandatário dos Chamados: Dr. II (substabelecimento Dr. KK) Réus: - BB; - DD; Mandatária dos Réus: Dra. LL (acompanhada por advogada estagiária - Dra. MM).”
Consta da mesma Acta que “Pelo Ilustre Mandatário do Autor foi requerida a junção aos autos de substabelecimento com reserva emitido pelo Ilustre Mandatário dos Chamados a seu favor, juntando cópia de tal substabelecimento e comprometeu-se a remeter via citius do citado documento.”
Na segunda e terceira sessão de audiência de julgamento, realizadas nos dias 07/04/22 e 26/04/22, consta das respectivas Actas como presentes “Mandatário do Autor e os Chamados (com substabelecimento junto aos autos): Dr. II; Mandatária dos Réus: Dra. LL (…).”
Com data de 01/06/22, foi proferido despacho com o seguinte teor: “Após a devida análise da prova produzida, o Tribunal pondera lançar mão do instituto do abuso de direito, plasmado no art.º 334.º do Código Civil, no que se reporta aos pedidos formulados pelo autor sob as alíneas c) e d). Assim sendo, e porque estamos perante matéria de excepção (peremptória), ao abrigo do art.º 3/3 do CPC, concede-se o contraditório às partes para se pronunciarem sobre o acima exposto, querendo. Prazo: 10 dias.”
Este despacho foi notificado aos Ilustres mandatários constituídos nos autos e aos habilitados.
O Ilustre mandatário do Autor não veio juntar aos autos o Substabelecimento a que se faz referência na primeira sessão de audiência de julgamento.
Proferiu-se sentença, com data de 06/07/22, com a seguinte parte decisória: “Pelo exposto, o Tribunal decide: A) Declarar revogada a deliberação de 20 de Agosto de 2003 que destituiu o A. da gerência da 1.ª R e, em face disso, julgar prejudicado o pedido de nulidade da citada deliberação; B) Julgar improcedente o demais peticionado pelo A., dele absolvendo os réus; C) Julgar procedente o pedido formulado pela reconvinte e condenar o autor e o chamado a pagar à sociedade ré a quantia que vier a apurar-se em sede de incidente de liquidação no que se reporta ao reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade; D) Julgar improcedente o demais peticionado pela reconvinte.”
Esta sentença foi notificada aos habilitados.
Inconformado com esta decisão, o Autor veio interpor recurso de apelação pedindo que se reconheça a nulidade invocada com todas as demais consequências, sendo a sentença em crise revogada e condenados os Réus como se pede na Petição Inicial, sendo improcedente a reconvenção deduzida, rematando com as seguintes
CONCLUSÕES:
A. Da nulidade da sentença: Em reconvenção a ré peticiona do reconvindo quantia que refere dizer respeito ao período compreendido entre 2002 e 2007
B. O Recorrente invoca o artigo 174 do C.S.C. para demonstrar que tal pedido se encontra prescrito porquanto entre o último levantamento ocorrido em 2007 e a data da sua citação para a presente reconvenção passaram pelo menos 7 anos e meio
C. No processo nº 1678/12.8 TBMCN que correu termos pelo juiz 3 do Tribunal do Comércio de Amarante a Recorrida peticiona exclusivamente a destituição dos gerentes AA e EE e nada mais.
D. O Acórdão da Relação, nesse processo decidiu pela improcedência por não provada, da excepção de prescrição do direito invocada
E. A Mª juiz “a quo” entende que a autoridade de caso julgado permite a recuperação dessa decisão para estes autos e aplica-a
F. Nestes autos o pedido é manifestamente diferente do pedido formulado naqueles
G. A noção da autoridade caso julgado não exige a coexistência da tríplice identidade prevista no artigo 498 do CPC.
H. Mas tem que ter em conta a prejudicialidade entre os objectos processuais das acções em ponderação.
I. O artigo 609 CPC, refere que a sentença não pode condenar em objecto diverso do que se pedir.
J. O artigo 615 do CPC, refere que é nula a sentença quando o juiz conhece de questões de que não podia tomar conhecimento e ainda quando o juiz condene em objecto diverso do pedido.
K. No âmbito do processo 1678/12.8T8MCN, que correu termo no juiz 3 de comércio de Amarante a propósito da ”DA CORRECÇÃO/AMPLIAÇÃO DO PEDIDO requerido por A..., Lda.”O Mº juiz do processo pronunciou-se deste modo: ”decide-se rejeitar os seguintes pedidos: e) Ser o Réu EE condenado no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa legal, nos termos acima melhor constantes deste articulado; f) Ser o Réu AA condenado no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa legal, nos termos acima melhor constantes deste articulado e ta decisão transitou em julgado
L. O Mº juiz “ a quo” nestes autos não está a exercer a autoridade de caso julgado, mas sim a reconhecer um direito que não foi exercido naquela acção beneficiando esta em manifesto prejuízo do recorrente, consubstanciando a este propósito a sentença em causa a nulidade prevista do n.º1 609 e n.º 1 alíneas d) e e) do artigo 615 do CPC, pois conhece para alem do pedido
M. O facto de a Relação ter entendido que não havia prescrição para efeitos de destituição de gerente, não permite alargar tal entendimento para um pedido que nessa acção não foi formulado e pelo contrário quando tentado em ampliação foi indeferido, tendo tal douto despacho transitado em julgado há muito. E tal entendimento viola o artigo 621 do C.P.C.
N. Da Matéria de facto: Concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados: Na sua petição inicial o Autor alega referindo-se aos sócios gerentes BB e DD: Artigo 86º p.i.. Que agiram em comunhão de esforços, com o objectivo afastar da gerência da empresa os sócios AA e EE, de forma a poderem dirigir livremente os negócios da 1ª R, garantido para si (2ºR e 3ªR) e para os seus familiares, vantagens especiais e ilegítimas; Artigo 87º p.i.. Obtidas à custa do prejuízo dos sócios AA e EE, que, deixando de ser gerentes, nunca mais receberam qualquer importância da sociedade, pois, durante os seis anos de ausência forçada da gerência da empresa, esta não distribuiu quaisquer lucros aos sócios, requerendo que a 1ª Ré junte aos autos as actas referentes à votação das contas e às deliberações sobre a aplicação dos resultados do exercício dos anos de 2006 a 2014. E junta Acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 22 – no âmbito do processo nº 34/13.5TELSB onde são arguidos e já condenados em 1ª instância por crime de fraude fiscal qualificada os aqui recorridos BB (irmão do recorrente), DD (sobrinho do recorrente e filho do outro recorrido) e A... Lda., aqui recorrida, com recurso pendente no Tribunal da Relação mas com data para a conferência já marcada para 27 de Setembro de 2022, junto a estes autos a fls… por requerimento apresentado a 15.03.2022 que o Tribunal de 1ª instancia ignorou uma vez que o não refere em nenhum ponto da sua sentença E o Tribunal não colocou este acórdão na matéria provada.
O. Concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão sobre estes pontos da matéria de facto diversa da recorrida. Pontos da matéria de facto:15: “Na sequência da destituição da gerência, ocorrida em 2006, o A. esteve ausente da empresa até ao trânsito em julgado da Sentença que declarou nula tal destituição em 17-09-2012”; “16: O seu afastamento foi uma imposição da R e não uma vontade própria. “; “17: Após 26/10/2012, data do registo da deliberação tomada em 2003, o A. foi proibido, pelos sócios BB e DD, de entrar nas instalações da empresa, só lhe permitindo permanecer nas instalações da R, e na sala respectiva, para participar nas assembleias-gerais quando convocado. “; “18: Em 02 de Outubro de 2013, o A. pediu informações ao sócio BB. “; “19: A missiva referida no número anterior não obteve resposta.”; “20: Em Maio de 2014, e mediante condições rigorosas de fiscalização, foi permitida ao Autor a análise de parte dos elementos.”; “22: Desde Setembro de 2006, a Ré não paga ao Autor a remuneração mensal que auferia como gerente, no valor mensal de €1.571,21 (mil quinhentos e setenta e um euros e vinte e um cêntimo), 14 meses por ano.“; “24: Entre Setembro de 2006 e Setembro de 2012, a Ré não distribuiu quaisquer lucros aos sócios “; “25: Em 30/9/2009 foi deliberado aumentar o salário de gerente de BB de €1.571,21 para €2.500,00 por mês.”; 2: Em assembleia geral da sociedade Ré, realizada em 20 de Agosto de 2003, foi deliberado destituir o A. da sua gerência.; 3: O A. impugnou judicialmente a referida deliberação através de providência cautelar que correu termos sob o proc.1135/03.3TBMCN do 1º Juízo do tribunal Judicial de Marco de Canaveses.; 4: No âmbito da providência cautelar mencionada, as partes aí intervenientes, o aqui A. AA e a aqui R A... Lda., puseram fim aos autos nos termos da transacção aí homologada, em acordo datado de 27 de Abril de 2004.; 5: O A. não intentou a respectiva acção principal.; 6: Consta da ata número cinquenta e sete, referente a uma Assembleia Geral extraordinária da sociedade ré, realizada em 8 de Outubro de 2004, como ponto único “deliberar sobre dar sem efeito a decisão tomada na assembleia-geral de vinte de Agosto de dois mil e três que destitui da gerência o Sr. AA e, em consequência, confirmar o mesmo como gerente da sociedade A... limitada com efeitos desde a data da referida deliberação.”; 7: Consta da ata mencionada no número anterior a seguinte declaração de voto “A presente assembleia-geral extraordinária, convocada pelo sócio EE, é um acto perfeitamente inútil. Com efeito, a questão da destituição da gerência do sócio Sr. AA, deliberada em Assembleia geral de vinte de Agosto de dois mil e três, é uma questão que não se coloca neste momento, uma vez que, de facto e de direito, tal sócio nunca deixou de exercer as funções de gerente, já que interpôs providência cautelar de suspensão de tal deliberação, que correu termos no primeiro juízo do tribunal de Marco de Canaveses, sob o nº 1135/03.3TBMCN. Como é do conhecimento de todos os presentes, tal providência terminou com uma transacção judicial que pôs termo à causa, já homologada por sentença transitada em julgado, donde resulta que a referida deliberação nunca chegou a ter efeito. Face ao exposto, e apenas por uma questão de cautela, os sócios CC e BB votaram contra o ponto único da ordem de trabalhos.”; Acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Criminal de Lisboa -Juiz 22 – no âmbito do processo nº 34/13.5TELSB onde são arguidos e já condenados em 1ª instância por crime de fraude fiscal qualificada os aqui recorridos BB (irmão do recorrente), DD (sobrinho do recorrente e filho do outro recorrido) e A... Lda., aqui recorrida, com recurso pendente no Tribunal da Relação, mas com data para a conferência já marcada para 27 de Setembro de 2022, junto a estes autos a fls… por requerimento apresentado a 15.03.2022. Este documento não foi impugnado, unicamente foi referido que o acórdão em causa não havia ainda transitado em julgado.
P. Conjugado com os pontos da matéria de facto supra referidos onde se realça: Que o Autor esteve ausente da empresa de 2006 ate 17.09.2012 e voltou a estar ausente da empresa após 26.10.2012; Que tal afastamento foi uma imposição da Ré: Que os recorridos DD e BB eram quem mandava na empresa: Que a empresa apenas permitiu ao Autor a consulta parcial dos para permitir as informações pretendidas e mediante condições rigorosas de fiscalização; Que o Recorrente foi afastado a segunda vez da empresa em 26.10.2012 após o registo da deliberação tomada em 2003 que os recorridos bem sabiam ter sido revogada como se refere na douta sentença em crise. E, aqui sim agindo em abuso de direito na modalidade de” venire contra factum proprium: Teremos de concluir que:
Q. Decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões supra referidas: Deve dar-se como provada, transitando para a matéria de facto provada o teor do Acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 22 – no âmbito do processo nº 34/13.5TELSB onde são arguidos e já condenados em 1ª instância por crime de fraude fiscal qualificada os aqui recorridos BB (irmão do recorrente), DD (sobrinho do recorrente e filho do outro recorrido) e A... Lda., aqui recorrida, com recurso pendente no Tribunal da Relação. Matéria alegada no ponto 86 da P.I, sugerindo-se a seguinte redacção: A - Os recorridos BB (irmão do recorrente e pai do outro recorrido) e DD (Sobrinho do recorrente e filho do outro recorrido) agiram em comunhão de esforços, com o objectivo afastar da gerência da empresa o sócio AA de forma a poderem dirigir livremente os negócios da recorrida A...,Lda., garantindo para si e para os seus familiares, vantagens especiais e ilegítimas, Matéria alegada no ponto 87 da P.I. B - Obtidas à custa do prejuízo dos sócios AA e EE, entretanto falecido, que, deixando de ser gerentes, nunca mais receberam qualquer importância da sociedade, pois, durante os seis anos de ausência forçada da gerência da empresa, esta não distribuiu quaisquer lucros aos sócios.
R. DO DIREITO: A consequência necessária da revogação da deliberação em causa (de 2003) é a sua inexistência e, por isso, insusceptível de sustentar qualquer registo da mesma
S. Cancelado tal registo, não é automático o registo de qualquer outra deliberação expulsiva da gerência do recorrente
T. E resulta do peticionado e da sentença prolatada o cancelamento de tal registo com todos os efeitos legais
U. Não se trata de nenhum ato inútil, muito pelo contrário o cancelamento de tal registo impõe-se.
V. Mal andou a douta sentença em crise a este propósito
W. Abuso do Direito: A pretensão do autor ao formular os pedidos das alíneas c), d) e demais assenta no ponto 10 da matéria de facto provada e que se transcreve: “Por sentença proferida na acção sumária com o número de processo 1114/06.9TBMCN, que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses, proposta por EE e por AA contra a sociedade aqui 1ªR, transitada em julgado em 17 de Setembro de 2012, foi declarada nula a deliberação proferida na Assembleia Geral de Sócios realizada em 22 de Junho de 2006, de destituição de EE e. AA de gerentes da aqui 1ªR A..., Lda.”
X. Todos os factos dados como provados e constantes dos pontos 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 42, 43, 44, 45, 46, 48, 49, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 64, 65, 66ª c), 71 e), f) e g) parcialmente, e o 72, ocorreram entre os anos de 2003 e 2006.
Y. E por isso foram ponderados e apreciados no processo que permitiu a sentença atras referida
Z. E não tiveram força capaz perante o Mº Juiz do processo para impedir a declaração de nulidade da deliberação expulsiva do recorrente por abuso de direito, não olvidando que tal sentença transitou em julgado em 17 de Setembro de 2012.
AA. Data que não permite que qualquer outra sentença posterior e sobre os mesmos factos a venha invadir sob pena de violação de caso julgado.
BB. Abuso de Direito que sendo de conhecimento oficioso aquele juiz nem sequer o ponderou como possibilidade
CC. Os factos que ocorreram posteriormente a 2006, foram-no num momento em que o Autor estava afastado coercivamente da gerência da Ré, sem qualquer remuneração.
DD. Tratou-se de uma acção directa de recuperação de rendimentos a que teria direito e lhe permitiriam sobreviver numa altura em que destituído ilegalmente da gerência da Ré ficou sem auferir quaisquer rendimentos.
EE. A sentença do processo 1114/06.9TBMCN, que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses ao decidir como decidiu e ao transitar em julgado conferiu aos autores da mesma, direitos que de modo algum lhe podem ser suprimidos pelo invocado instituto do abuso de direito.
FF. Ao reconhecer a nulidade da deliberação que expulsou o autor de gerente da aqui recorrida, conferiu-lhe todos os direitos que essa anulação da deliberação lhe concede, desde logo, manteve-lhe o direito de gerente e conferiu-lhe nos termos estatutários a respectiva remuneração de gerente durante o período desse afastamento da gerência.
GG. Neste enquadramento o invocado abuso de direito viola o caso julgado, pondo em causa com essa violação os princípios da segurança e da certeza jurídicas.
HH. Os direitos que reclama resultam exclusivamente da sentença condenatória que lhos reconhece.
II. Se é uma sentença que lhos reconhece, só em sede de recurso ou de revisão de sentença é que podem ser reanalisados e porventura retirados.
JJ. Se o tribunal entende nestes autos que há abuso de direito, o que só por mero raciocínio académico se aceita, tal instituto só pode abranger factos posteriores à entrada daquela acção em juízo e que sabemos, pela matéria de facto terá sido em Setembro de 2006, o que a douta sentença em crise não ponderou.
KK. Violou a douta sentença em crise, a este propósito o art. 334º do CC. e o 621 do C.P.C e o princípio da segurança e certeza jurídicas
LL. A sentença proferida no processo 1114/06.9TBMCN, concedeu ao autor os direitos decorrentes da nulidade da deliberação que o destitui de gerente da ré.
MM. Tais direitos são, não só os de manter a gerência da mesma sociedade até que ocorra uma nova destituição, mas ainda conferir-lhe os direitos que essa mesma gerência, retroagida à data da propositura da acção lhe conferem.
NN. Que nesses direitos se integram as remunerações devidas e não pagas durante todo o período do seu ilegal afastamento da gerência da ré é inequívoco e pacífico.
OO. Não pode o tribunal suprimir tal direito, ao recorrente negando-lhe os efeitos que a sentença prolatada transitada lhe confere.
PP. O abuso de direito não pode suprimir o próprio direito a pretexto de que o seu uso é abusivo.
QQ. Neste entendimento violou a douta sentença em crise o disposto no artigo 334 do CC
RR. As sentenças em regra operam “ex nunc”.
SS. Eles só operam “ex tunc”, ou seja, só são retroactivas quando a lei expressamente o prevê, e em situações específicas.
TT. Ao fazer operar o instituto do abuso de direito no caso presente põe-se em causa, os princípios da segurança e certeza jurídicas, porquanto concede-se a uma sentença não excepcional, num caso não excepcional, um efeito excepcional de retroactividade, que a situação específica não confere, fazendo-a operar “ex tunc”.
UU. Violou a douta sentença em crise o princípios enformadores do direito da certeza e da segurança jurídicas bem como o principio da não retroactividade das sentenças e entre o mais o artigo 334 do C.C.; 174 do C.S.C e 621 do C.P.C.
VV. Na eventualidade de se entender que não ocorre qualquer nulidade da sentença. DA PRESCRIÇÂO: Em reconvenção a ré peticiona do reconvindo quantia que refere dizer respeito ao período compreendido entre 2002 e 2007
WW. O Recorrente invoca o artigo 174 do C.S.C. para demonstrar que tal pedido se encontra prescrito porquanto entre o último levantamento ocorrido em 2007 e a data da sua citação para a presente reconvenção passaram pelo menos 7 anos e meio
XX. No processo nº 1678/12.8TBMCN que correu termos pelo juiz 3 do Tribunal do Comércio de Amarante a Recorrida peticiona exclusivamente a destituição dos gerentes AA e EE e nada mais.
YY. O Acórdão da Relação, nesse processo decidiu pela improcedência por não provada, da excepção de prescrição do direito invocada.
ZZ. A Mª juiz “a quo” entende que a autoridade de caso julgado permite a recuperação dessa decisão para estes autos e aplica-a
AAA. Nestes autos o pedido é manifestamente diferente do pedido formulado naqueles
BBB. A noção da autoridade caso julgado não exige a coexistência da tríplice identidade prevista no artigo 498 do CPC.
CCC. Mas tem que ter em conta a prejudicialidade entre os objectos processuais das acções em ponderação.
DDD. No âmbito do processo 1678/12.8T8MCN, que correu termo no juiz 3 de comércio de Amarante a propósito da” DA CORRECÇÃO/AMPLIAÇÃO DO PEDIDO requerido por A..., Lda.”O Mº juiz do processo pronunciou-se deste modo:” decide-se rejeitar os seguintes pedidos: e) Ser o Réu EE condenado no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa legal, nos termos acima melhor constantes deste articulado; f) Ser o Réu AA condenado no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa legal, nos termos acima melhor constantes deste articulado e ta decisão transitou em julgado
EEE. O Mº juiz “a quo” nestes autos não está a exercer a autoridade de caso julgado, mas sim a reconhecer um direito que não foi exercido naquela acção beneficiando esta em manifesto prejuízo do recorrente.
FFF. O facto de a Relação ter entendido que não havia prescrição para efeitos de destituição de gerente, não permite alargar tal entendimento para um pedido que nessa acção não foi formulado e pelo contrário quando tentado em ampliação foi indeferido e transitou em julgado.
GGG. E tendo transitado em julgado a douta decisão em crise a este propósito viola o princípio do caso julgado (artigo 621 do C.P.C).
Os Habilitados GG, HH e FF vieram, com data de 28/09/22, apresentar recurso da apelação da sentença final e juntar Procurações Forenses, rematando com as seguintes
CONCLUSÕES:
1. A presente acção foi proposta por AA contra a sociedade A..., Lda., BB, CC e DD, peticionando, essencialmente, o pagamento da remuneração mensal que teria recebido como gerente da Ré, no montante de 1.571,21 euros/mês, 14 meses por ano, se não tivesse sido ilegalmente afastado da gerência, desde Dezembro de 2006, após a execução da deliberação de destituição declarada nula pela sentença proferida no processo nº1114/06.9TBMCN, que correu termos pelo extinto 1º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses, até à data do trânsito em julgado daquela sentença, que teve lugar em 17 de Setembro de 2012.
2. Na sentença de que ora se recorre, a Meritíssima Juíza do tribunal a quo decidiu: (…).
3. Com o presente recurso, os ora Recorrentes, herdeiros habilitados do Interveniente Chamado EE, pretendem impugnar a decisão que julgou parcialmente procedente a reconvenção deduzida pelos Réus, transcrita a negrito na alínea c) da 2ª Conclusão das presentes alegações, que é a única parte da sentença proferida que afecta directamente a esfera jurídica do Interveniente Chamado EE. A) DA NULIDADE DA SENTENÇA E DE TODO O PROCESSADO A PARTIR DA NOTIFICAÇÃO AOS RECORRENTES DA SENTENÇA QUE OS JULGOU HABILITADOS:
4. O Interveniente EE foi chamado à presente acção pelos Réus, que requereram a sua intervenção principal provocada na Contestação/Reconvenção, que deu entrada no Tribunal em 11 de maio de 2015. Mas, EE apenas foi citado, como interveniente principal associado ao Autor, em 26 de Janeiro de 2016, na sequência do despacho judicial que ordenou a sua citação, proferido em 21/01/2016.
5. Em 4 de marco de 2016, o Interveniente Chamado EE respondeu à reconvenção deduzida pelos Réus por meio de um articulado que através do qual requereu que aquela reconvenção, deduzida pelos Réus também contra si, fosse julgada totalmente improcedente e não provada, indicando meios de prova a produzir em audiência de julgamento, nos termos do disposto no nº2 do artigo 552º do Código de Processo Civil.
6. Conforme certidão de óbito que foi junta aos autos pelos Réus em 25/11/2020, o Interveniente Chamado EE faleceu no dia 17 de Novembro de 2020, às 6 horas e 30 minutos, na freguesia ..., concelho de Amarante.
7. Em obediência ao disposto no nº1 do artigo 270º do Código de Processo Civil, junto ao processo documento que provou o Interveniente Chamado EE numa fase em que apenas se encontrava finda a fase dos articulados, suspendeu-se imediatamente a instância, consoante, aliás, foi requerido pelos próprios Réus.
8. Por outro lado, caducando o mandato com o falecimento do mandante, nos termos do disposto no nº1 do artigo 1174º do Código Civil, na data do falecimento do Interveniente Chamado EE cessaram os poderes de representação do seu advogado nesta acção, que apenas voltou a intervir em representação da interveniente acidental NN, que foi ouvida como testemunha em audiência de julgamento.
9. Promovido pelos Réus o incidente de habilitação de herdeiros, os ora Recorrentes, FF, GG e HH, foram julgados habilitados, como únicos herdeiros do Interveniente Chamado falecido, por sentença proferida em 9 de Dezembro de 2021, que os admitiu a intervir na presente acção em substituição do Interveniente EE, sentença essa que lhes foi notificada através de três cartas registadas datadas de 10/12/2021, com as Referências Citius 87322380, 87322381 e 87322382, respectivamente.
10. Em 19 de Janeiro de 2022, sem que os herdeiros habilitados e ora Recorrentes estivessem representados por advogado, a Meritíssima Juíza do tribunal a quo marcou a audiência prévia na presente acção para o dia 1 de Fevereiro de 2022 e em 31 de Janeiro de 2022, por motivo de doença, adiou aquela audiência prévia para o dia 15 de Fevereiro de 2022, mas nenhuma daquelas datas foi notificada aos Herdeiros habilitados e ora Recorrentes, pelo que estes não estiveram presentes na referida Audiência Prévia, que acabou por se realizar no dia 15 de Fevereiro de 2022.
11. O mesmo se passou com os requerimentos apresentados pelo Autor e pelos Réus após a realização da audiência prévia e com todos os despachos que sobre aqueles requerimentos recaíram, pelo que os herdeiros habilitados do Interveniente Chamado EE, ora Recorrentes, viram totalmente obliterado pelo tribunal o seu direito de intervirem e de exercerem o contraditório em todos os actos do processo após a notificação que lhes foi feita da sentença de habilitação de herdeiros.
12. Os herdeiros habilitados e ora Recorrentes também não estiveram representados na audiência de discussão e julgamento, que se realizou sem eles ao longo de três sessões, sendo certo que o Interveniente Chamado EE tinha apresentado tempestivamente no processo a Resposta à Reconvenção contra ele deduzida pelos Réus e nela requerido a produção de meios de prova.
13. Do que acima vem alegado pode concluir-se que todos os actos praticados no processo após a habilitação dos ora recorrentes como herdeiros do Interveniente Chamado falecido são nulos, nos termos do disposto no nº1 do artigo 195º do CPC, uma vez que grande parte desses actos não lhes foram notificados e esta omissão de uma formalidade que a lei prescreve é uma grave irregularidade, que lhes cerceou o direito de defesa, influindo, obviamente, no exame e na decisão da causa.
14. Acresce que se é verdade que, nos termos do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 276º e na alínea a) do nº1 do artigo 269º do CPC, a suspensão da instância cessa quando for notificada a decisão que considere habilitados os sucessores da pessoa falecida, o que neste caso ocorreu em 13 de Dezembro de 2021, na presente causa a constituição de advogado é obrigatória, por força da alínea a) do nº1 do artigo 40º do CPC, pelo que, não tendo os herdeiros habilitados constituído advogado, o juiz deveria, oficiosamente ou a requerimento da parte contrária, determinar a sua notificação para o constituir dentro de prazo certo (artigo 41º do CPC).
15. Neste processo nada disso aconteceu pois a Meritíssima Juíza a quo marcou logo a audiência prévia em 19 de Janeiro de 2022 e não procedeu à notificação dos herdeiros Habilitados e ora Recorrentes para constituírem advogado nem sequer os notificou da realização da Audiência Prévia, pelo que são nulos todos os actos que daí em diante praticados no processo, incluindo a sentença de que ora se recorre, que condenou o Interveniente Chamado, o falecido EE, a pagar à sociedade Ré a quantia que vier a apurar-se em sede de incidente de liquidação no que se reporta ao reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, julgando parcialmente procedente a reconvenção deduzida pelos Réus.
16. Na verdade, consoante estabelece n.º 3 do artigo 270.º do Código de Processo Civil, são nulos os actos praticados no processo posteriormente à data em que ocorreu o falecimento que, nos termos do n.º 1 daquele artigo, devia determinar a suspensão da instância, em relação aos quais fosse admissível o exercício do contraditório pela parte que faleceu. B) DA PRESCRIÇÃO DO DIREITO DA SOCIEDADE CONTRA OS GERENTES RELATIVAMENTE À OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR A SOCIEDADE:
17. Estabelece o artigo 174.º do Código das Sociedades Comerciais, o seguinte quanto à prescrição: (…).
18. A sentença de que ora se recorre firmou-se no que sobre este assunto da prescrição foi deliberado no âmbito do Processo n.º 1678/12.8T8MCN, que correu termos pelo Juiz 3 deste Juízo de Comércio de Amarante, entendeu que: “tendo já sido apreciada a questão da prescrição no âmbito do citado processo, formou-se caso julgado quanto à mencionada matéria, na verdade, ainda que a sua apreciação tenha tido em vista apurar da existência de fundamento para a destituição do ora Autor da gerência da Ré, certo é que sendo os factos os mesmos e o prazo prescricional o mesmo, tal questão já está decidida nos termos expostos supra. Termos em que se julga improcedente a excepção de prescrição invocada pelo Autor e Interveniente”.
19. Consoante adiante se demonstrará, não pode aceitar-se este entendimento.
20. O Processo nº1678/12.8T8MCN foi uma Acção Especial de Suspensão e Destituição de Titulares de Órgãos Sociais, intentada em 22/11/2012 em que, devido a sucessivos indeferimentos da petição inicial, recursos e correcções da mesma, inteiramente imputáveis à ali Autora e ora Ré “A..., Lda.”, os ali Réus (o aqui Autor AA e o Interveniente Chamado EE) só foram citados para a contestar em 27 de Outubro de 2016, com base numa petição inicial em que a sociedade “A..., Lda.”, formulou contra o Réu EE, aqui Interveniente Chamado, apenas o seguinte pedido: - ser o Réu EE definitivamente destituído das suas funções de Gerente, nos termos do artigo 257º do Código das Sociedades Comerciais com as devidas consequências legais.
21. O despacho saneador proferido nesta acção nº1678/12.8T8MCN, em 21 de Junho de 2017, refere o seguinte: “Quanto aos restantes factos que alegadamente constituem justa causa para a destituição dos réus como gerentes, da leitura da petição inicial o último dos factos imputados aos réus ocorreu em 28.11.2007 – cf. Art. 153º, al f) da petição inicial. Uma vez fixado o prazo e o início de contagem do prazo, vejamos agora se existiu alguma causa de interrupção de prescrição. [...] O prazo prescricional pode ser interrompido pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertença e ainda que o Tribunal seja incompetente, sendo certo que a lei equipara à citação ou notificação, para efeitos de interrupção da prescrição, qualquer outro meio judicial, pelo qual se dá conhecimento do acto, àquele contra quem o direito pode ser exercido (Art.º 323.º n.º 1 e 4 do C.C.). Ora no caso dos autos os factos agora alegados pela autora fundaram a deliberação de destituição de gerentes da autora dos ora réus, deliberação tomada em Assembleia Geral de sócios realizada em 22.6.2006. Se nada ocorresse entretanto, esta decisão tornava-se definitiva e a autora nada mais teria que fazer quanto aos factos aqui alegados. Sucede que os aqui réus instauraram uma acção de anulação desta deliberação em 2006 e cuja decisão apenas transitou em 17.09.2012 a qual decidiu anular aquela decisão a daí que aqueles factos tivessem sido novamente trazidos à discussão. […] Assim face à interrupção da prescrição nos termos acabados de expor e considerando que esta acção deu entrada em 22.11.2012 (a provarem-se os factos alegados na petição inicial) ainda não haviam decorrido os cinco anos desde a data da prática do último acto imputado aos réus como fundamento para justa causa da sua destituição nem os cinco anos desde a data do início da alegada prática concorrencial do réu EE. […] Face ao exposto, julga-se improcedente, por não provada, a excepção da prescrição do direito invocado pela autora nos termos invocados pelos réus EE e AA.”
22. Esta decisão do despacho saneador foi objecto de recurso e sobre ela veio a recair o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/12/2017, que decidiu definitivamente a questão da seguinte forma: “Assim, no caso, nos termos do artigo 174.º, n.º 1, alínea b) do CSC, o prazo prescricional de 5 anos, conta-se a partir do momento em que tiver termo a conduta dolosa ou culposa do gerente ou da sua revelação se a conduta houver sido ocultada. Atento o alegado na petição, não se está perante conduta oculta e dos factos constantes na petição resulta que a conduta do Réu recorrente, conjuntamente com o outro Réu, cessou em 28/11/2007 (cf. artigo 153º, alínea d) da petição). Por isso, quando foi intentada a acção (22/11/2012), ainda não tinha decorrido o prazo de 5 anos”.
23. Ainda que se considerasse, como o faz a sentença ora recorrida, que esta decisão do Tribunal da Relação do Porto formou caso julgado em relação à matéria da prescrição, tal decisão nunca poderia valer no presente processo, desde logo porque, para além da data de início da contagem do prazo de prescrição (28 de Novembro de 2007), a verificação de que esta não ocorreu refere-se sempre a uma outra data, que no caso daquela acção nº1678/12.8T8MCN era a data em que a mesma foi intentada (22 de Novembro de 2012), mas na presente acção, cronologicamente posterior àquela, é obviamente outra data, porque o tempo não para.
24. Mas na presente acção acontece também que a prescrição que está em causa é de um direito distinto daquela outra (são os direitos que prescrevem e não os factos), pois o direito que os Réus pretenderam exercer quando deduziram a Reconvenção contra o Autor e o Interveniente Chamado EE foi o direito da sociedade a ser indemnizada pelo gerente dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa deste, apesar de não ocultada.
25. A data a ser considerada é, pois, a data de em que os Réus, através da reconvenção deduzida, manifestaram a intenção de exercer aquele direito, ou seja, a data de apresentação em juízo da contestação/reconvenção na presente acção, que foi a data de 11 de maio de 2015.
26. Assim sendo, não pode obviamente admitir-se uma transposição directa da decisão tomada no processo nº1678/12.8T8MCN para a presente acção, considerando que aquela decisão faz caso julgado sobre a matéria da prescrição no presente processo.
27. A Meritíssima Juíza do tribunal a quo devia ter averiguado na presente acção se o direito da sociedade a ser indemnizada pelo gerente dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa deste, apesar de não ocultada, já estaria prescrito na data de 11 de maio de 2015, o que é equivalente a dizer se a obrigação do Interveniente Chamado EE indemnizar a sociedade Ré já estaria prescrita nesta data.
28. A resposta só pode ser afirmativa, porque que o prazo de prescrição de cinco anos previsto na alínea b) do nº1 do artigo 174º do CSC se iniciou em 28 de Novembro de 2007 e, por isso, terminou em 28 de Novembro de 2012.
29. Resta averiguar se ocorreu alguma causa de interrupção da prescrição deste direito entre 28 de Novembro de 2007 e 28 de Novembro de 2012.
30. Estabelece o artigo 323º do Código Civil o seguinte, quanto aos actos praticados pelo titular do direito que interrompem a prescrição: (…).
31. Refere o despacho saneador citado na sentença de que ora se recorre que os factos culposos alegadamente praticados pelo Interveniente Chamado EE, designadamente os valores indevidamente retirados por este da conta bancária da sociedade até ao dia 28 de Novembro de 2007, foram os mesmos factos que justificaram a deliberação de destituição de gerente da sociedade aqui Ré na Assembleia Geral de sócios realizada em 22/06/2006.
32. E como o aqui Autor AA e o Interveniente Chamado EE propuseram uma acção de anulação daquela deliberação social, que correu termos pelo extinto 1ºJuízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses com o número de processo 1114/06.9TBMCN, cuja sentença apenas transitou em julgado em 17 de Setembro de 2012, sustenta a Meritíssima Juíza a quo que, nos termos do disposto no citado nº1 do artigo 323º do Código Civil a prescrição se interrompeu com a propositura daquela acção, só começando a correr o novo prazo de prescrição, nos termos do disposto no artigo 327º, nº1, com o trânsito em julgado da sentença proferida naquela acção, que declarou nula aquela deliberação de destituição de gerente do Interveniente Chamado EE.
33. Não pode, de modo nenhum, acolher-se este entendimento da sentença ora recorrida, porquanto o facto em causa ocorreu em 28 de Novembro de 2007 e a acção foi proposta pelos ora Autor e Interveniente Chamado mais de um ano antes desta data (em 31/10/2006) e nos termos do artigo 323º do Código Civil, apenas os actos praticados pelo titular do direito podem ser aptos a interromper a prescrição, não tendo a acção em causa (processo nº1114/06.9TBMCN) sido proposta pelo titular do direito (a sociedade A..., LDA.), mas pelo ora Autor e Interveniente Chamado contra aquela sociedade.
34. Aquela acção, que foi julgada favoravelmente ao ora Autor e Interveniente Chamado, não diz respeito ao direito da sociedade a ser indemnizada pelo gerente dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa deste, mas apenas ao direito de destituir o gerente com base em facto doloso ou culposo por si praticado, ou seja, esta acção nunca poderá considerar-se um ato que exprime a intenção de exercer o direito em causa (o direito de pedir a indemnização), mas sim um ato que exprime a intenção de exercer um direito completamente distinto (o direito de destituir o gerente), pelo que não tem aqui aplicação o nº1 do artigo 323º do Código Civil.
35. O mesmo raciocínio valerá para a acção nº1678/12.8TBMCN, que foi também de destituição de gerentes do ora Autor e do Interveniente Chamado, com base na deliberação da Assembleia Geral da sociedade ora Ré de 17 de Outubro de 2012, e foi proposta pela sociedade ora Ré em 22 de Novembro de 2012, tendo sido o ora Interveniente Chamado citado apenas em 2 de Novembro de 2016 por factos inteiramente imputáveis à Autora daquela acção e aqui Ré.
36. Pese embora a citação para esta acção ter ocorrido já depois da data em que ocorreu a prescrição (28 de Novembro de 2012), esta acção também não constituiu ato que exprimisse a intenção da ora Ré exercer o direito da sociedade a ser indemnizada pelo Interveniente Chamado dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa deste, mas apenas intenção de exercer o direito de o destituir de gerente, pelo que também não teria a virtualidade de interromper o prazo de prescrição da obrigação de indemnizar a Ré.
37. Na data em que a Ré sociedade e os restantes Réus apresentaram em tribunal a Reconvenção que deduziram na presente acção contra o Interveniente Chamado EE, 11 de Maio de 2015, pedindo pela primeira vez que este fosse condenado no reembolso dos valores que os primeiros consideravam indevidamente retirados à sociedade, tendo os factos praticados por este que justificariam o pagamento daquela indemnização sido praticados até 28 de Novembro de 2007, o direito da sociedade a ser indemnizada pelo gerente dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa deste, apesar de não ocultada, já estaria prescrito desde 28 de Novembro de 2012, o que deverá ser declarado pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto, com todos os efeitos legais. C) DO INCUMPRIMENTO DO ÓNUS DE DEDUZIR A RECONVENÇÃO CONTRA O INTERVENIENTE CHAMADO EE NA AÇÃO IDÊNTICA A ESTA QUE ELE PRÓPRIO PROPÔS CONTRA OS RÉUS:
38. Peticionaram os Réus na Reconvenção que o Autor e o seu irmão EE, ora Interveniente Chamado, fossem condenados no reembolso dos valores que os primeiros consideram indevidamente retirados à sociedade, no montante que se venha a apurar, acrescidos de juros vencidos e vincendos à taxa legal, mas ainda que o Interveniente chamado tenha interesse em contradizer o pedido reconvencional contra ele deduzido, a técnica processual utilizada pelos Réus, que deduzem reconvenção contra quem não é parte na acção, não é leal nem lícita.
39. Os Réus não deduziram reconvenção contra o aqui Interveniente Chamado na acção que ele próprio propôs contra eles, peticionando o que o Autor peticiona na presente acção: o pagamento da remuneração mensal que teria recebido como gerente da Ré, no montante de 1.571,21 euros/mês, 14 meses por ano, se não tivesse sido ilegalmente afastado da gerência, desde Dezembro de 2006, após a execução da deliberação de destituição declarada nula pela sentença proferida no processo nº1114/06.9TBMCN, que correu termos pelo extinto 1º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses, até à data do trânsito em julgado daquela sentença, que teve lugar em 17 de Setembro de 2012.
40. Naquela acção, proposta pelo aqui Interveniente Chamado e ali Autor muito antes da presente, isto é, em 16 de Janeiro de 2013, que correu termos por este mesmo Juízo de Comércio de Amarante do Tribunal Judicial da Comarca do Porto (embora tenha sido distribuído ao Juiz 1) e tomou o número de processo 81/13.7TBMCN, não vieram, em sede de contestação/reconvenção, os ora Réus pedir a condenação do ali Autor no reembolso dos valores que consideram indevidamente retirados à sociedade, pelo que não se compreende a que título se lembraram agora de o peticionar, numa acção que, sendo em tudo idêntica àquela que correu em 2013, apenas diz respeito ao seu irmão AA e por ele foi intentada como único Autor.
41. Distingue-se entre excepção de caso julgado e autoridade de caso julgado da seguinte forma: na primeira há identidade entre os objectos dos dois processos, implicando sempre a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, conforme artigos 580º e 581º do CPC; na segunda não é necessário que se verifique aquela tríplice identidade, bastando que haja uma identidade subjectiva que se traduza na decisão de uma determinada questão que não possa voltar a ser discutida, vinculando os tribunais em acções posteriores entre as mesmas partes.
42. Isto acontece assim porque, tal como refere o Acórdão do STJ de 10/10/2010 na Revista nº1999/11.7TBGMR.G1.S1, o trânsito em julgado de qualquer decisão de mérito é susceptível de produzir outros efeitos, mais difusos, mas não menos importantes, quando se trata de relevar os valores da certeza e da segurança jurídica que qualquer sistema deve buscar e proteger.
43. Surge, assim, intimamente ligada ao instituto do caso julgado, a figura da preclusão que, no que tange aos meios de defesa, decorre do princípio da concentração da defesa na contestação, consagrado no nº1 do artigo 573º do CPC, ao impor que toda a defesa deve ser deduzida na contestação.
44. Apresentada a contestação, fica a partir desse momento precludida a invocação pelo Réu, quer de outros meios de defesa, quer dos meios que ele não chegou a deduzir e até mesmo daqueles que ele poderia ter deduzido com base num direito seu.
45. Ao longo da sua reconvenção, os Réus imputam ao Interveniente Chamado, na qualidade de gerente da 1ª Ré, um conjunto de levantamentos de dinheiro da sociedade que alegam ter sido indevidos, desde 1984 até 2007, pelo que há muito tempo poderiam os Réus ter liquidado e exigido a restituição daqueles alegados levantamentos pois são eles que estão na gestão efectiva da Sociedade 1ª Ré, com exclusão do Interveniente Chamado, desde 2006, tendo acesso a todos os documentos da contabilidade da sociedade.
46. Quer isto dizer que, uma vez que os factos em que assenta a reconvenção deduzida pelos ora Réus na presente acção contra o ora Interveniente Chamado são há muito conhecidos pelos Réus e são os mesmos que foram discutidos na acção com o número de processo 81/13.7TBMCN, com a mesma causa de pedir da presente, proposta pelo aqui Interveniente Chamado na qualidade de Autor contra os mesmos Réus, o facto destes não terem deduzido naquela acção nº81/13.7TBMCN, podendo e devendo fazê-lo em cumprimento do ónus da concentração da defesa, a reconvenção apresentada no presente processo não escapa ao efeito preclusivo resultante da autoridade do caso julgado daquela acção nº81/13.7TBMCN, pelo que deveria a presente reconvenção ser julgada improcedente por inadmissibilidade legal. D) DA INEXISTÊNCIA DE CONDUTA DOLOSA OU CULPOSA DO INTERVENIENTE CHAMADO ENQUANTO GERENTE DA 1ªRÉ:
47. Nunca o Autor e o seu irmão, Interveniente Chamado e ora recorrente, praticaram factos que tenham consubstanciado violação dos seus deveres de sócios-gerentes e que justifiquem qualquer reembolso ou indemnização à sociedade Ré.
48. A verdade é que o Interveniente Chamado não se apropriou indevidamente de dinheiros da sociedade, nem sozinho nem com o seu irmão AA, pois apenas utilizaram ambos, enquanto conservaram os seus poderes de movimentação de contas bancárias da sociedade como gerentes da mesma, verbas da sociedade para suportar o custo das acções judiciais que tinham por objecto interesses da sociedade, o que é perfeitamente lícito, porquanto o nº 3 do artigo 60º do CSC estabelece que a sociedade suporta todos os encargos das acções propostas pelo órgão de fiscalização ou, na sua falta por qualquer gerente, ainda que sejam julgadas improcedentes.
49. Os pagamentos referidos na contestação foram-no aos causídicos que prestaram serviços à sociedade e no interesse dela e as acções aí referidas têm a ver com o entendimento que os gerentes da altura tinham da aprovação das contas do exercício e nessa medida por as entenderem irregulares, pediam a anulação da respectiva aprovação.
50. É falsíssima e cínica a alegação dos Réus na contestação de que o Autor e o Interveniente Chamado se locupletaram à custa do fisco e da segurança social, quando foram os Réus, que depois de assumirem sozinhos a gestão da sociedade se associaram para montar um estratagema criminoso consistente numa falsa cadeia de fornecimentos (B... – A... Lda. – C...) para utilizar as regras de tributação relacionadas com o comércio intracomunitário de forma abusiva e fraudulenta, na medida em que os bens com origem em Espanha e que se destinavam ao mercado Espanhol e Alemão, originaram uma cadeia de liquidações de IVA e pedidos de reembolso deste imposto em Portugal que constitui um esquema organizado de fraude fiscal em resultado do qual o Estado ficou lesado em pelo menos 1.904.286,65 €.
51. Prova deste comportamento doloso dos Réus e da intenção que estes sempre tiveram de afastar o Autor e o Interveniente Chamado para se locupletarem à custa da sociedade, é o Acórdão proferido em 15 de Fevereiro de 2021 pelo Juízo Central Criminal de Lisboa (Juiz 22) do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa no Processo-crime comum colectivo nº34/13.5TELSB, que aqui se dá como integrado e reproduzido para todos os efeitos legais e através do qual o tribunal colectivo deliberou julgar a acusação pública e o pedido de indemnização civil formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICIO, em representação do ESTADO PORTUGUÊS, parcialmente procedentes e em consequência: a) Condenar o arguido BB (aqui 2º Réu e Recorrido) pela prática, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos arts. 103º, nº1, al. c), e 104º, nºs 2, al. a), e 3, ambos do RGIT, na pena de 4 (quatro) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo a contar do trânsito em julgado do acórdão, mas ficando esta suspensão subordinada ao dever de aquele, no decurso do período de suspensão, entregar à Autoridade Tributária o montante global de € 48.000,00 (quarenta e oito mil euros) por conta do valor fixado a título de indemnização, devendo comprovar anualmente no processo o pagamento de €12.000,00 (doze mil euros). b) Condenar o arguido DD (3º Réu) pela prática, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos arts. 103º, nº1, al. c), e 104º, nºs 2, al. a), e 3, ambos do RGIT, na pena de 4 (quatro) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo a contar do trânsito em julgado do acórdão, mas ficando esta suspensão subordinada ao dever de aquele, no decurso do período de suspensão, entregar à Autoridade Tributária o montante global de € 48.000,00 (quarenta e oito mil euros) por conta do valor fixado a título de indemnização, devendo comprovar anualmente no processo o pagamento de €12.000,00 (doze mil euros). c) Condenar a sociedade arguida A..., LDA. (aqui 1ª Ré e Recorrida), nos termos do disposto no art. 7º, nº1, do RGIT, pela prática de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos arts. 103º, nº1, al. c), e 104º, nºs 2, al. a), e 3, ambos do RGIT, e pelos arts. 90º-A, nº1, e 90º-B, nºs 4 e 5, ambos do Código Penal, ex vi art. 3º do RGIT, na pena de 700 (setecentos) dias de multa, à taxa diária de €100,00 (cem euros), o que perfaz o montante global de €70.000,00 (setenta mil euros). d) Condenar solidariamente os arguidos/demandados BB, DD, A..., LDA., OO, B...– UNIPESSOAL, LDA., e C..., S.A., a pagarem à Fazenda Nacional o valor de €2.082.498,49 (dois milhões e oitenta e dois mil quatrocentos e noventa e oito euros e quarenta e nove cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal, vencidos desde a data da notificação dos arguidos/demandados para contestarem o pedido de indemnização civil, e vincendos, até integral pagamento [arts. 559º e 804º a 806º do Código Civil, e Portaria nº 291/2003, de 8 de Abril].
52 Estas pesadas condenações criminais do Réus e da própria sociedade aqui 1ªRé, A..., Lda., resultaram dos seguintes factos que o Acórdão acima referido julgou provados e foram praticados pelos Réus BB e DD enquanto gerentes da sociedade Ré, A..., Lda., também designada por D..., após o afastamento forçado e ilegal do aqui Autor e do Interveniente Chamado da gerência de facto daquela sociedade: “9. Os arguidos BB e DD, em representação da sociedade arguida D..., aderiram ao descrito plano (plano criminoso de organização de um circuito de facturação falsa para recebimento de reembolsos ilegais de IVA) e aceitaram que esta empresa integrasse o referido circuito de facturação. 10. Os arguidos BB e DD, em representação da sociedade arguida D..., nunca quiseram comprar nem vender o ferro que, de acordo com o plano, seria adquirido pela sociedade arguida B... às empresas espanholas E... e F..., e que seria depois encaminhado para os destinatários indicados pelo arguido OO. 13. Os arguidos OO, BB e DD combinaram entre si que a sociedade arguida D... receberia como contrapartida pela entrada da mesma no aludido circuito de facturação a diferença entre o valor que lhe seria facturado pela sociedade arguida B... e o valor que aquela iria facturar à sociedade arguida C.... 14. Ainda de acordo com o combinado, tal contrapartida a ser recebida pela sociedade arguida D... seria paga através das diferenças entre o valor das transferências bancárias da sociedade arguida C... para a conta da sociedade arguida D... e o valor das transferências bancárias desta para a conta da sociedade arguida B.... 28. O arguido BB é desde 04.09.1971 sócio e gerente da sociedade arguida D... (a aqui 1ª Ré, A..., Lda.).29. No ano de 2012, foram sempre os arguidos BB e DD que tomaram todas as decisões referentes às opções e destino da sociedade arguida D..., sendo os responsáveis pela administração e gestão dos pagamentos aos credores desta, nomeadamente pelo pagamento dos impostos devidos ao Estado Português e pelo pedido de reembolso de IVA, bem como pela gestão da contabilidade da empresa e pela emissão de facturas. 30. O arguido DD assumiu formalmente o cargo de gerente da sociedade arguida D... entre 05.11.2012 e 04.03.2015. 41. Dando execução ao descrito plano, por ordem dos arguidos BB e DD em representação da sociedade arguida D..., esta solicitou à Autoridade Tributária o reembolso do IVA liquidado pela sociedade arguida B... correspondente à mercadoria facturada pela B... à D..., e que esta transmitiu à sociedade arguida C.... 71. Os arguidos BB e DD sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei. 81. O agregado do arguido BB (aqui Réu) tinha (entre 2006 e 2012) uma situação economicamente estável, assente no salário pelo mesmo auferido como gerente da D..., no valor de €2.500,00 mensais. 82. Após 2012, num período em que a sociedade arguida D... foi menos lucrativa, o arguido BB reduziu o seu salário para €2.000,00. 83. Quando tinha 65 anos de idade, o arguido BB reformou-se, tendo passado a auferir uma reforma no valor mensal de €1.350,00, embora continue a exercer a função de gerente da sociedade arguida D... e a ser remunerado com cerca de € 800,00 mensais.”
53. Não tanto pelo alegado como pelo doutamente suprido deverão V.Exas., Venerandos Senhores Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto, julgar procedente o presente recurso e, em consequência: a) Declarar nula a sentença recorrida nos termos e com os fundamentos apresentados na parte A) das presentes alegações, anulando todos os actos praticados no processo após a notificação da sentença de habilitação aos herdeiros do Interveniente Chamado falecido, EE, e ora Recorrentes; b) Ou, caso assim não entendam V.Exas., o que apenas por hipótese de raciocínio se concebe, revogar aquela sentença na parte em que julgou procedente a reconvenção deduzida pelos Réus contra o Interveniente Chamado falecido, EE, pelos fundamentos de facto e de direito constantes nas partes B), C) e D) das presentes Alegações, substituindo-a por Acórdão desse tribunal que, julgando totalmente improcedente aquela reconvenção, dela absolva o Interveniente Chamado falecido, EE, ora representado no processo pelos seus herdeiros habilitados e ora Recorrentes.
Os Réus “A..., Lda.”, BB, CC e DD vieram também interpor recurso de apelação da sentença dos autos, terminando com as seguintes
CONCLUSÕES:
a. A sentença recorrida padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto, em face da falta do exame crítico de uma multiplicidade de provas produzidas, o que imporá, nesta medida, o seu suprimento.
b. O presente recurso tem por objecto o despacho proferido pelo Tribunal a quo a 28.02.2022, por via do qual foi julgada improcedente a reclamação apresentada pelos Recorrentes quanto ao despacho que elencou os temas da prova, por erradamente entender que a prova da demonstração do concreto prejuízo patrimonial e não patrimonial que a Recorrente Sociedade sofreu em virtude da conduta dos Recorridos é desnecessária em virtude da autoridade do caso julgado.
c. O presente recurso tem, igualmente, por objecto a douta sentença proferida no âmbito dos presentes autos, a qual salvo o devido respeito, não representa a melhor decisão possível da óptica dos ora Recorrentes, tendo os mesmos sido objectivamente afectados pelo teor da mesma, incidindo o presente recurso sobre o erro de julgamento de que padece a mesma, em sede da matéria de facto e de Direito.
d. A sentença proferida contém, pois, uma solução interpretativa que viola a Lei adjectiva e substantiva, consubstanciando o juízo decisório uma violação do disposto nos artigos 565.º e 566.º, n.º 3, 805.º, n.º 3, 806.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil, bem como artigo 609.º, n.º 2, do Código do Processo Civil. Da nulidade da sentença recorrida:
A. A sentença recorrida padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto, nos termos do disposto no artigo 615.º n.º 1, alínea b), do CPC, em face da falta do exame crítico das provas previsto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC.
B. A presente nulidade não se prende com o mérito da decisão a quo, mas antes com um vício estrutural da sentença, no que se reporta à falta de exame crítico de uma parte da prova documental produzida pelos Recorrentes, especificamente aquela junta aos autos por via do requerimento de 13.11.2020, de ref.ª 6701192.
C. A este propósito, dispõe a sentença recorrida (p. 31), no que se reporta ao exame crítico da prova documental e da sua valoração, que “Atendeu-se, ainda, à documentação junta pelos réus aos autos em 13/11/2020, nomeadamente […]”, concluindo que “A demais documentações junta no requerimento entrado em juízo em 13/11/2020, não foi atendida, porquanto nada de novo trazia aos autos em face da autoridade do caso julgado aplicada aos factos a que se reportavam”.
D. Ora, como se sublinhou em sede do requerimento apresentado a 13.11.2020, de ref.ª 6700919, a junção dos documentos em referência reportou-se como essencial, na medida em que, como o próprio Tribunal a quo aludiu no seu despacho de 02.11.2020, a decisão proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN, deixou intocada a discussão do relevo jurídico que os factos provados no referido processo apresentam.
E. Aliás, tanto o Tribunal a quo reconhece a relevância da junção da referida prova documental, com referência à factualidade provada no processo n.º 1678/12.8TBMCN, que ele próprio atende a alguns dos documentos juntos pelos Recorrentes, que citámos, não obstante a alegada “autoridade do caso julgado”.
F. Dito isto, a sentença a quo padece de dois vícios estruturalmente insustentáveis, à luz do exame crítico da prova que lhe vem imposto pelo artigo 607.º, n.º 4, do CPC e da respectiva fundamentação de facto: (i) Não especifica quais dos concretos documentos juntos pelos Recorrentes por via do seu requerimento de 13.11.2020 atendeu (ou não) na formação da sua convicção e na subsequente decisão final, em face da utilização do advérbio de modo “nomeadamente”; (ii) Não concretiza, de forma cognoscível, o porquê de não atender à demais documentação junta por via do referido requerimento, especificando a sua (ir)relevância para a decisão da causa, ignorando os Recorrentes, em absoluto, quais dos documentos juntos foram (ou não) desconsiderados, em face da anterior utilização do advérbio “nomeadamente”.
G. Tais vícios têm o condão de impossibilitar – pelo menos cabalmente – a compreensão, pelos Réus, do alcance do exame crítico por parte do Tribunal e da respectiva valoração da prova produzida, para que lhe seja possível sindicar o mesmo.
H. Os Réus têm o direito, pois, de compreender o itinerário cognoscível e valorativo percorrido pelo Tribunal na apreciação da prova produzida.
I. Tal, porém, não aconteceu: os Recorrentes não depreendem da sentença recorrida quais os documentos que foram atendidos na formação da convicção do julgador, quais não foram atendidos, e quais se encontram prejudicados pela autoridade do caso julgado aplicada aos factos que tais documentos se reportavam (que também não vêm especificados) – em concreto, não o conseguem fazer quanto aos documentos n.ºs 142 a 148, juntos aos autos através do requerimento apresentado a 13.11.2020, de ref.ª 6701192, os quais não foram objecto de discussão, prova e julgamento no âmbito do processo n.º 1678/12.8TBMCN, razão pela qual não lhes é aplicável a autoridade do caso julgado a que a sentença recorrida alude.
J. Não houve um cabal exame crítico da prova documental produzida, no que se reporta à prova documental junta aos autos a 13.11.2020.
K. Não se trata de censurar a apreciação da prova por parte do Tribunal a quo, mas tão-só censurar o vício estrutural inerente à fundamentação de facto da sentença, no que se reporta à falta de exame crítico da prova documental produzida.
L. Em suma, em face da nulidade de que padece a sentença recorrida, impõe-se a sua anulação, devendo os autos baixar à 1.ª instância, a fim de que aí seja criticamente apreciada a prova documental produzida pelos Recorrentes, junta aos autos por via dos requerimentos apresentados a 13.11.2020, em particular a anexada ao requerimento de ref.ª 6701192, com vista ao suprimento de tal nulidade e, se for caso disso, fixando-se a matéria de facto em conformidade e proferindo-se nova sentença. Da impugnação do despacho proferido a 28.02.2022, de ref.ª 87980238
M. O despacho sob censura decidiu sobre a reclamação apresentada pelos Recorrentes quanto ao despacho que enunciou os temas da prova, sendo impugnável a final, nos termos do artigo 596.º, n.º 3, do CPC.
N. Por despacho proferido a 02.11.2020, de ref.ª 83605068, foram fixados pelo Tribunal a quo os temas da prova.
O. Por serem do entendimento de que os temas da prova não englobavam toda a factualidade, os Recorrentes dele apresentaram reclamação, em sede da audiência prévia realizada a 15.02.2022, com vista ao aditamento dos seguintes temas da prova: 1) se os motivos fundamento da destituição se verificavam já no período relativamente ao qual o Autor AA peticiona a remuneração de gerente na presente acção; 2) o prejuízo patrimonial que foi provocado pelos Reconvindos na sociedade Ré; 3) os valores que os Reconvindos devem reembolsar à sociedade Ré quer a titulo de danos patrimoniais que danos não patrimoniais que estão peticionados; 4) os valores auferidos por AA a título de reforma, baixa médica ou pensão de invalidez ou através do seguro de acidentes de trabalho.”
P. O referido despacho sob recurso decidiu pela procedência parcial da reclamação apresentada, aditando apenas o último dos temas da prova propostos, não admitindo o aditamento dos temas ora identificados sob os n.ºs 2) e 3).
Q. Entendeu o Tribunal a quo que “Não serão aditados, por não carecerem de prova nestes autos em face da figura da autoridade do caso julgado, a que já se aludiu em sede de despacho saneador. Com efeito, analisando a sentença proferida no J3 deste Tribunal temos por julgada a matéria de facto relacionada com as demais questões suscitadas, nomeadamente, estão já fixados os factos relacionados com a destituição, sendo que, no que se reporta aos danos sofridos, estes também estão definidos. Tal significa que apenas resta fixar a compensação adequada, o que ocorrerá em sede de sentença e quando se subsumir aquela factualidade ao direito aplicável”.
R. A referida decisão padece de erro de julgamento, quer porque: (i) não obstante a maior parte dos prejuízos tenham sido objecto de discussão e julgamento no processo n.º 1678/12.8TBMCN, outros houve que apenas foram descobertos posteriormente e que, por esse motivo, não foram ali apreciados, objecto de prova e julgados; e (ii) a decisão proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN deixou intocada a discussão do relevo jurídico que tais factos apresentam.
S. O despacho proferido pelo Tribunal a quo a 02.11.2020, de ref.ª 83605068, corrobora, precisamente, os elencados motivos que sustentam o erro de julgamento de tal despacho.
T. Por outras palavras, o Tribunal a quo reconhece a utilidade da presente lide, ainda que vinculada à autoridade de caso julgado decorrente da acção 1678/12.8TBMCN (cf. factos provados sob os n.ºs 69) a 72)), mas, ao mesmo tempo, entende não ser de subsumir aos temas da prova o concreto prejuízo patrimonial que foi provocado pelos Reconvindos na Sociedade Ré nem a prova dos valores que os Reconvindos devem reembolsar à sociedade Ré, danos esses, em parte, não computados na referida acção.
U. Tal não se percebe, igualmente, quando o objecto do litígio compreende, “iii.- saber se a Ré suportou danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da actuação do Autor e do Interveniente Principal, o que co-envolverá a questão de saber se está prescrito o direito correspondente da Ré e, na negativa, qual a medida de tal crédito”.
V. Ora, a delimitação dos danos provocados pelas condutas ilícitas dos Recorridos –provada que está a prática dos factos ilícitos, seja no âmbito da presente acção, seja por força da autoridade de caso julgado que vincula a factualidade dada como provada na presente acção – constitui matéria probatória inerente a factos essenciais das pretensões dos Recorrentes – cf. o alegado nos artigos 301.º a 311.º da contestação, bem assim o pedido deduzido no âmbito da reconvenção apresentada.
W. Mais: não obstante a autoridade de caso julgado decorrente da sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN e mesmo tendo em consideração que a maior parte dos prejuízos foram objecto de discussão e julgamento em tal processo, houve uma multiplicidade de prejuízos apenas descobertos posteriormente e, como tal, não apreciados em sede do referido processo.
X. Falamos, pois, dos prejuízos decorrentes das retiradas indevidas de dinheiros da sociedade pelos Recorridos, documentalmente demonstrados por via dos documentos n.ºs 142 a 148, juntos aos autos através do requerimento apresentado a 13.11.2020, de ref.ª 6701192.
Y. Tendo o ressarcimento de tais prejuízos sido peticionado em sede da reconvenção deduzida – mediante o pedido formulado, no sentido de que fossem os Reconvindos condenados a restituir, no valor que se viesse a apurar, os montantes indevidamente retirados da sociedade Recorrente –, tal factualidade deve constar dos temas da prova.
Z. Deste modo, forçoso será a anulação do despacho impugnado e o deferimento da reclamação apresentada pelos Recorrentes, admitindo o aditamento aos temas da prova enunciados dos seguintes: “- o prejuízo patrimonial que foi provocado pelos Reconvindos na sociedade Ré”; e “-os valores que os Reconvindos devem reembolsar à sociedade Ré quer a titulo de danos patrimoniais que danos não patrimoniais que estão peticionados”. Dos erros de julgamento: matéria de facto que deveria ter sido julgada como provada:
AA. Além dos factos dados como provados (sob os n.ºs 1) a 72)), resultam dos autos elementos de prova que impunham que Tribunal a quo tivesse levado factualidade adicional aos referidos, a qual vem revestida da maior importância para a concretização das condutas danosas praticadas pelos Recorridos e enquanto base factual para o julgamento do futuro incidente de liquidação de sentença.
BB. Na verdade, os Recorrentes, vendo-se forçados ao recurso a um incidente de liquidação – sem prejuízo da possibilidade de condenação líquida que infra referimos – apenas poderão discutir a medida da liquidação por via da concretização do objecto da condenação, não podendo abordar, pois, a prática (ou não) de determinados factos, por tal se circunscrever ao caso julgado que a presente acção formará.
CC. Adicionalmente, será mister, em face dos factos essenciais alegados pelos Recorrentes e atento o objecto do litígio, constar dos factos provados, em face da prova produzida, os prejuízos provocados pelas condutas ilícitas dos Recorridos que não foram objecto de discussão e julgamento no âmbito da acção n.º 1678/12.8TBMCN, não obstante a respectiva autoridade de caso julgado que vincula a presente acção, pois os factos e a prova produzida nestes autos não se restringem aos factos e prova produzidos naquele processo; ao invés, tendo sido alegados e provados outros factos além dos que foram objecto de discussão e julgamento no dito processo e que, por isso, não ficam abrangidos pela autoridade do caso julgado, deverão aqueles ser objecto de julgamento e prova na presente acção.
DD. Em sede de reconvenção, a Recorrente Sociedade alegou que os Recorridos procederam a levantamentos indevidos de dinheiros do fundo social, sendo que, além dos concretos prejuízos objecto de discussão e julgamento no âmbito do processo n.º 1678/12.8TBMCN – que a sentença recorrida aqui deu como provados por força da autoridade do caso julgado –, os Recorrentes lograram demonstrar a existência de outros que deveriam, da mesma forma, ter sido julgados provados na sentença recorrida, já não por força da autoridade do caso julgamento, mas porque foi feita demonstração cabal da sua existência.
EE. Por uma questão de facilidade de exposição e em cumprimento do disposto no artigo 640.º do CPC, indicar-se-ão os factos que se entende que deveriam ter sido julgados como provados, bem como os excertos dos depoimentos e os demais meios de prova que fazem prova dos mesmos, seguindo a numeração original.
FF. 73) A 28 de Novembro de 2007, foi ordenada à agência do Banco 1..., S.A. sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência bancária no valor de € 12.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º ... da titularidade da Ré Sociedade, e com destino à conta bancária ..., a favor do Autor AA, com o descritivo “Regulariz ordenados”, realizada no próprio dia.
GG. Esta factualidade decorre do documento n.º 142, junto aos autos a 13.11.2020, via requerimento de ref.ª 6701192, que é um extracto do Banco 1..., S.A., cuja falta de genuinidade não foi demonstrada pelos Recorridos e que demonstra uma transferência bancária realizada a favor do Recorrido AA.
HH. O Banco 1..., S.A. recebeu, a 26.11.2007, um pedido para proceder à transferência de € 10.000,00 a favor do Recorrido AA, mediante pedido dirigido àquele Banco, tal como decorre na menção “conforme carta de cliente de 26/11/2007”, como pode ler-se no canto direito inferior do documento n.º 142.
II. O modus operandi subjacente ao comportamento dos Recorridos na realização da referida transferência vai de encontro ao modus operandi subjacente às transferências indevidas que a sentença recorrida julgou provadas por força da autoridade do caso julgamento do processo n.º 1678/12.8TBMCN (cfr., a título de exemplo, ponto 66 dos factos provados).
JJ. Tal modus operandi, verificou-se em três transferências adicionais, em que os Recorridos, aproveitando-se da sua qualidade de gerentes, ordenaram a realização de transferências de contas bancárias tituladas pela Recorrente Sociedade para as suas contas pessoais, locupletando-se de tais valores a título de pretensas “regularizações de ordenados”.
KK. Tais transferências foram corroboradas pela prova testemunhal produzida, incluindo a autoria da ordem de transferência, imputada aos Recorridos
LL. Neste sentido, depôs PP, testemunha comum às partes, empregado de escritório e funcionário da Recorrente sociedade há cerca de 30 anos [presente no intervalo de 00:55:31 a 00:55:56 e 01:11:45 a 01:17:28].
MM. Neste sentido, depôs ainda QQ, testemunha comum às partes, empregado de escritório e funcionário da Recorrente sociedade [presente no intervalo de 00:43:09 a 00:58:15].
NN. No mesmo sentido corroborante dos movimentos efectuados depuseram igualmente os Recorrentes BB e DD, em sede das suas declarações e depoimentos de parte [presentes nos intervalos, respectivamente, de 00:00:50 a 00:01:56 e 00:34:58 a 00:38:39].
OO. É, pois, inequívoca a demonstração da realização da operação supra, em prejuízo da Recorrente sociedade, pelo que se impõe o seu aditamento à matéria de facto dada como provada, porquanto tal factualidade é essencial à quantificação do prejuízo causado pela conduta ilícita dos Recorridos.
PP. 74) A 04 de Março de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia.
QQ. Tal factualidade decorre do teor do documento n.º 143, que representa uma ordem de transferência dada ao Banco 1..., S.A. em nome da Recorrente Sociedade, no seu então papel timbrado, subscrita pelos Recorridos, com vista à apropriação de € 10.000,00, por conta de uma alegada regularização de ordenados.
RR. Por outro lado, conforme decorre do documento n.º 144 – um comprovativo de transferência em papel timbrado do Banco 1..., S.A. – tal transferência solicitada pelos Recorridos foi efectivamente consumada pelo Banco 1..., que em 04.03.2008 deu seguimento ao pedido formulado, remetendo a ordem para a “carta do cliente de 28/02/2008”, como pode ler-se no canto direito inferior do documento n.º 144.
SS. Ambos os documentos foram juntos aos autos a 13.11.2020, via requerimento de ref.ª 6701192.
TT. Ora, tal transferência representou o empobrecimento da Recorrente Sociedade em € 10.000,00 e o correspondente enriquecimento do Recorrido, AA, o qual figurou como beneficiário e titular da conta a creditar no referido valor.
UU. A falta de genuinidade de tais documentos não foi demonstrada pelos Recorridos, sendo que a autoria das assinaturas presentes na ordem de transferência, bem como o modus operandi dos Recorridos, foi confirmado pelas testemunhas QQ e PP, conforme os seus depoimentos prestados em audiência de julgamento, que acima aludimos [presentes, respectivamente, nos intervalos 00:43:09 a 00:58:15 e 00:55:31 a 00:55:56 e 01:11:45 a 01:17:28], por via dos quais confirmaram o teor dos documentos n.º 143 e 144.
VV. No mesmo sentido corroborante dos movimentos efectuados depuseram igualmente os Recorrentes BB e DD, em sede das suas declarações e depoimentos de parte [presentes nos intervalos, respectivamente, de 00:00:50 a 00:01:56 e 00:34:58 a 00:38:39], por via das quais confirmaram a autoria das assinaturas dos Recorridos e o procedimento habitual para a realização por via de transferência bancária
WW. É, pois, inequívoca a demonstração da realização da operação supra, em prejuízo da Recorrente sociedade, pelo que se impõe o seu aditamento à matéria de facto dada como provada, porquanto tal factualidade é essencial à quantificação do prejuízo causado pela conduta ilícita dos Recorridos.
XX. 75) A 29 de maio de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência de um balcão da Banco 2..., S.A., uma transferência interbancária no valor de € 6.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino à conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados e outros”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia.
YY. Tal factualidade decorre do teor do documento n.º 145, que representa uma ordem de transferência dada à Banco 2..., S.A. em nome da Recorrente Sociedade, no seu então papel timbrado, subscrita pelos Recorridos, com vista à apropriação de € 6.000,00, por conta de uma alegada “regularização de ordenados e outros”.
ZZ. Decorre igualmente do documento n.º 146 – um comprovativo de transferência em papel timbrado da Banco 2..., S.A. – tal transferência solicitada pelos Recorridos foi efectivamente consumada pelo referido Banco que, em 29.05.2008, deu seguimento ao pedido formulado.
AAA. Ambos os documentos foram juntos aos autos a 13.11.2020, via requerimento de ref.ª 6701192.
BBB. Tal transferência, em bom rigor, representou o empobrecimento da Recorrente Sociedade em € 6.000,00 e o correspondente enriquecimento do Recorrido, AA, o qual figurou como beneficiário e titular da conta a creditar no referido valor, como claramente decorre do referido documento n.º 146: “Creditou-se a conta PT ..., pertencente a AA”.
CCC. A falta de genuinidade de tais documentos, novamente, não foi demonstrada pelos Recorridos, sendo que a autoria das assinaturas presentes na ordem de transferência, bem como o modus operandi dos Recorridos, foi confirmado pelas testemunhas QQ e PP, conforme decorre dos seus depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, que supra transcrevemos, [presentes, respectivamente, nos intervalos 00:43:09 a 00:58:15 e 00:55:31 a 00:55:56 e 01:11:45 a 01:17:28].
DDD. No mesmo sentido corroborante dos movimentos efectuados depuseram igualmente os Recorrentes BB e DD, em sede das suas declarações e depoimentos de parte [presentes nos intervalos, respectivamente, de 00:00:50 a 00:01:56 e 00:34:58 a 00:38:39], por via das quais confirmaram a autoria das assinaturas dos Recorridos e o procedimento habitual para a realização por via de transferência bancária.
EEE. É, pois, inequívoca a demonstração da realização da operação supra, em prejuízo da Recorrente sociedade, pelo que se impõe o seu aditamento à matéria de facto dada como provada, porquanto tal factualidade é essencial à quantificação do prejuízo causado pela conduta ilícita dos Recorridos.
FFF. 76) A 28 de Fevereiro de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Interveniente Principal EE, com o descritivo “Regularização de Ordenados e Despesas da Empresa”, tendo tal transferência sido realizada a 04 de Março de 2008.
GGG. Por fim mas não menos relevante, tal factualidade decorre, frontalmente, do teor do documento n.º 147, que representa uma ordem de transferência dada ao Banco 1..., S.A. em nome da Recorrente Sociedade, no seu então papel timbrado, subscrita pelos Recorridos, com vista à apropriação de € 10.000,00, por conta de uma alegada “regularização de ordenados e despesas da empresa”.
HHH. Por outro lado, conforme decorre do documento n.º 148 – um comprovativo de transferência em papel timbrado do Banco 1..., S.A. – tal transferência solicitada pelos Recorridos, a 28.02.2008, foi efectivamente consumada pelo referido Banco, que em 04.03.2008, deu seguimento ao pedido formulado, “conforme carta de cliente de 28/2/2008”, conforme se pode ler no canto inferior direito do referido documento.
III. Ambos os documentos foram juntos aos autos a 13.11.2020, via requerimento de ref.ª 6701192.
JJJ. Tal transferência representou o empobrecimento da Recorrente Sociedade em € 10.000,00 e o correspondente enriquecimento do Interveniente Principal, EE, o qual figurou como beneficiário e titular da conta a creditar no referido valor, como claramente decorre do referido documento n.º 148.
KKK. A falta de genuinidade de tais documentos, novamente, não foi demonstrada pelos Recorridos, sendo que a autoria das assinaturas presentes na ordem de transferência, bem como o modus operandi dos Recorridos, foi confirmado pelas testemunhas QQ e PP, conforme decorre dos seus depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, que supra transcrevemos, [presentes, respectivamente, nos intervalos 00:43:09 a 00:58:15 e 00:55:31 a 00:55:56 e 01:11:45 a 01:17:28].
LLL. No mesmo sentido corroborante dos movimentos efectuados depuseram igualmente os Recorrentes BB e DD, em sede das suas declarações e depoimentos de parte [presentes nos intervalos, respectivamente, de 00:00:50 a 00:01:56 e 00:34:58 a 00:38:39], por via das quais confirmaram a autoria das assinaturas dos Recorridos e o procedimento habitual para a realização por via de transferência bancária.
MMM. É, pois, inequívoca a demonstração da realização da operação supra, em prejuízo da Recorrente sociedade, pelo que se impõe o seu aditamento à matéria de facto dada como provada, porquanto tal factualidade é essencial à quantificação do prejuízo causado pela conduta ilícita dos Recorridos.
NNN. Em suma, deverão ser aditados à matéria de facto dada como provada os pontos supra enunciados, sob os n.ºs 73), 74), 75) e 76), em face da prova produzida e da sua relevância para o cabal apuramento dos prejuízos causados pela conduta ilícita dos Recorridos.
OOO. O Tribunal a quo, ao não apreciar e ao não ter em consideração todas as provas produzidas, em particular os documentos juntos pelos Recorrentes sob os n.ºs 142 a 148, que levariam ao juízo sobre a matéria de facto que explanámos – e que daria lugar ao aditamento dos factos provados sob os n.ºs 73), 74), 75) e 76), violou o disposto no artigo 413.º do CPC, impondo-se, pois, o aditamento da referida factualidade em cumprimento do referido comando legal.
PPP. Acresce que, ainda relacionado com a quantificação do prejuízo da Recorrente Sociedade, olvidou-se certamente o Tribunal a quo de dar como provados factos abrangidos pela autoridade do caso julgamento do processo n.º 1678/12.8TBMCN e que, como tal, à semelhança de muitos outros que a sentença recorrida dali transpôs, também aqui deveriam ter sido julgados provados.
QQQ. 77) O Autor e o Interveniente EE procederam a levantamentos de dinheiro do caixa da Autora para pagar as suas deslocações aos mais diferentes advogados. Designadamente, o Autor AA, em conluio com o Interveniente EE, retirou do caixa, de uma só vez, a quantia de € 486,70 para pagamento das suas deslocações a advogados.
RRR. A razão de ser da alteração da decisão recorrida no sentido do aditamento do facto acima mencionado consiste na autoridade do caso julgado onde o Tribunal a quo fundou a decisão da maior parte da factualidade que julgou provada nos presentes autos – cf. ponto 19. dos factos provados na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN. • Por outro lado, deverá ser alterada a redacção do ponto 49) dos factos provados na sentença recorrida nos seguintes termos: 49) Em 19 de Maio de 2006, também o irmão EE procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos, no montante de € 7.529,02, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.
SSS. A razão de ser da alteração da decisão recorrida no sentido do aditamento do facto acima mencionado consiste na autoridade do caso julgado porque o facto 49) – tal como o precedente 48) – são uma transposição do facto 37. dado como provado na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN, sendo certo que neste último se quantificam os valores levantados quer pelo aqui Autor AA – que o Tribunal a quo bem replicou no facto 48) da sentença recorrida – quer pelo Interveniente EE, sendo que quanto a este a sentença recorrida absteve-se de concretizar o montante do levantamento no ponto 49).
TTT. 78) De tal sanção resultaram prejuízos para o funcionamento da empresa, com perdas ao nível da produção, atrasos e incumprimento de fornecimentos e também prejuízos para o bom nome da empresa, junto de clientes.
UUU. O facto 79) deverá ser aditado ao elenco dos factos provados na sentença recorrida por força da autoridade do caso julgado, porquanto os factos provados na sentença recorrida sob os n.ºs 50) a 61) foram assim julgados são a transposição dos factos provados nos pontos 38. a 47. da sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN relacionados com os procedimentos disciplinares movidos aos trabalhadores da Recorrente D..., tendo, no entanto, a sentença recorrida se olvidado de transpor para os factos provados nesta acção a factualidade dada como provada no ponto 41. da sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN.
VVV. Ora, a factualidade em causa está abrangida, como a demais, pela autoridade do caso julgado, e assume particular importância em face do pedido indemnizatório deduzido pela Recorrente Sociedade contra o Autor e Interveniente EE a título de danos morais, que a sentença recorrida julgou (mal, como veremos) improcedente.
WWW. 79) Desde Setembro de 2000, que foram instauradas no Tribunal Judicial da Comarca de Marco de Canavezes, designadamente, as acções constantes e averbadas na certidão de registo comercial: - Processo n.º 340/2002 do 1.º Juízo, tendente a ser declarado nulo e sem efeito o artigo 5.º do pacto na parte estabelece que a sócia CC é representada, nas suas funções de gerência, pelo seu marido RR (que entretanto faleceu), por virtude da entrada em vigor do Código das Sociedades Comerciais; a acção veio a ser julgada procedente nesta parte, sendo declarado inexistente, desde 1986-11- 01, o artigo 5.º do pacto social na referida parte; no entanto, os ali Réus foram absolvidos dos restantes pedidos (Insc. 9, Av. 1, AP....); - Processo n.º 273/2002 do 2.º Juízo, tendente à anulação da deliberação que aprovou as contas de 2001; a acção foi julgada improcedente – ...; - Processo n.º 637/03.6TBMCN do 2.º Juízo, tendente à anulação da deliberação que aprovou as contas de 2002, intentada pelos aqui réus e que fora julgada improcedente; - Processo n.º 1135/03.3TBMCN do 1.º Juízo e o Processo n.º 1350/03.0TBMCN do 2.º Juízo, ambos providências cautelares, intentados pelos aqui réus, terminaram por transacção em que foi acordada a cessão de quotas dos sócios BB e CC aos aqui Réus; - Posteriormente, os Réus vieram a intentar, enquanto representantes da sociedade, o Processo n.º 1057/04.0TBMCN do 1.º Juízo, para anular tal acordo; acção julgada improcedente, porquanto foi considerado que o acordo de cessão de quotas, tendo sido efectuado entre sócios, extravasa o âmbito da sociedade, pelo que foi assim a aqui autora julgada parte ilegítima. Os réus decidiram intentar esta acção para anulação do acordo de cessão de quotas, dado terem tomado conhecimento do registo da marca ...” (marca utilizada pela sociedade autora) em nome de DD. - Processo n.º 1174/05.0TBMCN do 1.º Juízo, providência cautelar intentada pelo sócio BB, contra os sócios EE e AA, tendente à anulação da deliberação social tomada por estes últimos, no sentido de destituir da gerência os sócios BB e CC; a providência cautelar foi julgada procedente, tendo os aqui requeridos ali sido condenados como litigantes de má-fé; -Processo n.º 409/15.5T8AMT, intentado (já no Juízo de Comércio de Amarante) pelo aqui réu AA contra a sociedade autora e demais sócios (com excepção de EE), ainda pendente; - Processo n.º 81/13.7TBMCN, intentado pelo aqui réu EE contra a sociedade autora e demais sócios (com excepção de AA), ainda pendente
XXX. 80) As contas da autora aprovadas em deliberação social foram postas em causa em consequência das sucessivas acções interpostas pelos réus de anulação de deliberação social de aprovação de contas.
YYY. A razão de ser da alteração da decisão recorrida no sentido do aditamento dos factos acima mencionados consiste na autoridade do caso julgado, na medida em que em sede de reconvenção foram alegados factos relacionados com as inúmeras acções judiciais que os Recorridos têm vindo a instaurar ao longo dos anos contra a sociedade, designadamente para impugnação das contas da sociedade, daí resultando danos para a sociedade Recorrente, tendo essa factualidade sido discutida e objecto de decisão no âmbito do processo n.º 1678/12.8TBMCN.
ZZZ. O Tribunal a quo, ao não ter dado como provado os factos acima mencionados sob os n.ºs 77), 78), 79) e 80) e, ainda, ao ter dado como provado o facto n.º 49) com uma redacção insuficiente, violou a autoridade do caso julgado e o disposto no artigo 619.º, do CPC. Da condenação ilíquida, em violação do disposto nos artigos 565.º do Código Civil e 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil
AAAA. A sentença recorrida, decidiu, na alínea c) do seu segmento decisório, “Julgar procedente o pedido formulado pela reconvinte e condenar o autor e o chamado a pagar à sociedade ré a quantia que vier a apurar-se em sede de incidente de liquidação no que se reporta ao reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade”.
BBBB. Naturalmente que os Recorrentes não pretendem censurar a condenação – propriamente dita – dos Recorridos, operada por via da sentença proferida, já que bem andou o Tribunal a quo nesse ponto.
CCCC. O que os Recorrentes pretendem censurar é, pois, a iliquidez absoluta da condenação, na medida em que, segundo cremos, o Tribunal já dispunha de elementos bastantes para condenar os Recorridos no pagamento da quantia que já se encontra líquida.
DDDD. Como demonstrado ficou, “[…] o autor e o interveniente praticaram factos lesivos da sociedade ré. Com efeito, entre outros, retiraram diversas quantias monetárias da ré com vista a satisfazer interesses próprios, causando-lhes, assim, prejuízos com a sua actuação”.
EEEE. No entanto, igualmente ficou demonstrado o quantitativo líquido de uma generalidade dos factos lesivos praticados pelos Recorridos, em prejuízo da Recorrente sociedade – cf. os factos provados sob os n.ºs 26), 27), 28), 29), 30), 31), 32), 33), 40), 45), 48), 49) 66), 73), 74), 75), 76) e 77).
FFFF. Na verdade, em face da prova produzida e da factualidade dada como provada (28, ao Tribunal a quo seria possível apurar o quantitativo dos danos causados pelos Recorridos, com fundamento na apropriação indevida de dinheiros da sociedade.
GGGG. Somados os quantitativos liquidados no decurso da instrução dos presentes autos perante o Tribunal a quo, é possível apurar, por ora, o montante total líquido de € 147.925,23.
HHHH. Tudo sem prescindir ou obstar, naturalmente, aos demais prejuízos a concretizar – por actualmente ilíquidos – em sede de liquidação de sentença.
IIII. A este propósito, dever-se-á atentar aos regimes previstos, substantivamente, no artigo 565.º do Código Civil e, adjectivamente, no artigo 609.º, n.º 2, do CPC, os quais visam, precisamente, garantir à parte lesada a condenação do lesante no quantitativo que se demonstre líquido desde logo e, simultaneamente, escusar as partes do recurso a um incidente de liquidação que, nessa parte, iria liquidar o que já era líquido.
JJJJ. Tais normas circunscrevem, pois, o recurso ao incidente de liquidação unicamente para concretizar ou liquidar as quantias indemnizatórias que, em sede da acção principal, não foi ao Tribunal possível liquidar.
KKKK. Por outras palavras: existindo elementos nos autos para fixar o quantitativo dos danos, o Tribunal deve liquidá-los, em cumprimento do disposto nos artigos 565.º do Código Civil e 609.º, n.º 2, do CPC.
LLLL. E tal é aplicável, quer ao caso de se ter formulado, inicialmente, pedido genérico, como ao de se ter formulado pedido específico, não se tendo, porém, chegado a coligir dados suficientes para se fixar, com segurança e precisão, o objecto ou a quantidade da condenação, como bem decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão proferido a 30.03.2017 no processo n.º 476/09.0TTVNG.P2.S2 (Rel. FERREIRA PINTO).
MMMM. Assim, temos por demonstrado o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo, que optou por não liquidar a quota-parte dos danos cujo quantitativo lhe era, desde já, possível concretizar, em patente violação do disposto no artigo 609.º, n.º 2, do CPC, bem assim do disposto no artigo 565.º do Código Civil.
NNNN. Em suma, em cumprimento do disposto nos artigos 609.º, n.º 2, do CPC, e 565.º do Código Civil, deverão V. Exas. revogar parcialmente a sentença proferida e, em consequência, proferir condenação líquida dos Recorridos, na parte em que tal é possível em face da prova produzida, no montante de € 147.925,23 (cento e quarenta e sete mil novecentos e vinte e cinco euros e vinte e três cêntimos), mantendo, quanto ao demais, a condenação ilíquida na quantia que se vier a apurar em sede de incidente de liquidação, nos termos decididos pelo Tribunal a quo. Dos danos não patrimoniais sofridos pela Ré Sociedade:
OOOO. A sentença recorrida, como decorre do seu segmento decisório sob a alínea d), julgou improcedente o pedido de condenação dos Recorridos ao pagamento de uma compensação pelos danos não patrimoniais causados na esfera da Ré Sociedade, em virtude das condutas ilícitas praticadas por aqueles.
PPPP. Em suma, o Tribunal a quo entendeu que (p. 54) “[…] ainda que se perceba que a actuação dos reconvindos tenha causado desgaste na imagem da ré, não se provaram factos que imponham a sua condenação em indemnizar a ré. Em face disso, improcede este pedido.”
QQQQ. Ora, se bem compreendemos, o Tribunal reconhece um “desgaste na imagem da Ré” em face da conduta dos Recorridos mas, em contrapartida, entende não haver prova produzida bastante para justificar a condenação destes no pagamento de uma compensação.
RRRR. Mas: se não houve prova produzida bastante, como é que o Tribunal chegou à conclusão de que houve desgaste na imagem da Recorrente Sociedade?
SSSS. Diferente de não terem sido provados factos – isto é, os danos provocados pelo comportamento dos Recorrentes –, que se nos afigura não ter sido, de todo o caso, é a questão da quantificação do montante indemnizatório com vista ao seu ressarcimento.
TTTT. Tal representa, pois, um caso de escola de uma errada interpretação, pelo Tribunal a quo, do regime previsto nos artigos 566.º, n.º 3, do Código Civil e 609.º, n.º 2, do CPC, na medida em que o Tribunal poderia – e deveria – ter recorrido à equidade, desde logo atento o disposto no artigo 496.º, n.º 4, do Código Civil.
UUUU. Ora, é evidente que decorre dos factos dados como provados um circunstancialismo factual capaz de corroborar o desgaste da imagem, da credibilidade, do bom nome e da honra da Recorrente Sociedade, em tal medida que vem até reconhecido pelo Tribunal a quo, como vimos.
VVVV. Não se trata, pois, de demonstrar qualquer dano patrimonial indirecto, enquanto dano patrimonial decorrente da violação de um interesse imaterial (29), mas antes de danos não patrimoniais sofridos pela Recorrente Sociedade.
WWWW. Posto isto, tenha-se em consideração o seguinte: 1. A sanha judicial dos Recorridos contra os Recorrentes acarretou custos enormes para as finanças da Recorrente Sociedade, envolvendo-a em inúmeras acções judiciais, públicas e de conhecimento de qualquer interessado, inclusive de credores e clientes – cf. facto provado n.º 63) e facto n.º 79) que pela via do presente recurso se pretende ver aditado aos factos provados na sentença recorrida; 2. O comportamento dos Recorridos fez com que a sociedade Recorrente tenha visto as suas contas sucessivamente postas em causa judicialmente – cf. facto 80) que pela via do presente recurso se pretende ver aditado aos factos provados na sentença recorrida; 3. O comportamento dos Recorridos por via de retiradas indevidas de dinheiros da sociedade deu origem a uma inspecção tributária da Autoridade Tributária e Aduaneira – cf. facto provado n.º 68); 4. Os Recorridos instauraram procedimentos disciplinares e aplicaram sanções disciplinares a trabalhadores sem qualquer fundamento, sendo que tal comportamento persecutório criou nos trabalhadores da empresa um sentimento de desmotivação, desgaste e cansaço – cf. factos provados n.º 64) e 71); 5. O comportamento persecutório dos Recorridos aos trabalhadores da sociedade Recorrente resultaram em prejuízos para o funcionamento da empresa, com perdas ao nível da produção, atrasos e incumprimento de fornecimentos e também prejuízos para o bom nome da empresa, junto de clientes – cf. facto n.º 78) que pela via do presente recurso se pretende ver aditado aos factos provados na sentença recorrida.
XXXX. Não se nos afigura ser preciso mais para concluir – com recurso às regras da experiência – pela lesão da credibilidade, do bom nome, da honra e sobretudo da imagem da Recorrente Sociedade, quer face à publicidade de todas as acções judiciais de que foi alvo – maioritariamente na parte passiva, com a conotação que tal tem associado –, quer face à negatividade associada a um procedimento inspectivo iniciado pela Autoridade Tributária.
YYYY. Mais: o sentimento de desmotivação, desgaste e cansaço criado nos trabalhadores resulta numa potencialmente irremediável lesão da imagem da Recorrente Sociedade da óptica dos seus próprios trabalhadores, associada à propalação que tipicamente tais questões sociais têm a nível regional e sectorial, sendo que tal sentimento na classe trabalhadora potencia, igualmente, quebras de produtividade, de zelo e de empenho, que pela sua própria natureza não são geralmente demonstráveis; são circunstâncias imateriais, sensoriais, íntimas e inquantificáveis
ZZZZ. Daí justificar-se, precisamente, o recurso à equidade, que se reportam os artigos 4.º, alínea a) e 496.º, n.º 4, do Código Civil, atendendo aos critérios previstos nesta norma: o grau de culpabilidade dos agentes; à situação económica dos agentes; à situação económica do lesado e às demais circunstâncias do caso.
AAAAA. Assim, ponderando estes dados, levando em consideração que os Recorridos atingiram elementos indispensável à capacidade de a Recorrente Sociedade vingar em pleno no mercado em que está inserido (a saber: a sua imagem perante terceiros, perante os seus trabalhadores e perante o sector de indústria), à difusão temporal das condutas ilícitas perpetradas pelos Recorridos, ao impacto que o descontentamento do tecido laboral detém para as empresas e ao elevadíssimo grau de culpa dos Recorridos, que justificou a sua destituição da gerência por via decisão judicial proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN, tendo os mesmos agido intencionalmente, afigura-se-nos equitativo fixar o montante dos danos não patrimoniais sofridos pela Recorrente Sociedade num montante nunca inferior a € 10.000,00 (dez mil euros).
BBBBB. Tal montante reputa-se, desde logo, adequado, atenta a natureza tendencialmente punitiva dos danos não patrimoniais, em face do elevado grau de culpa dos Recorridos e da acentuada ilicitude da(s) sua(s) conduta(s). Subsidiariamente e caso assim não se entenda:
CCCCC. Sempre deverá a quantificação de tal compensação ser liquidada em sede de incidente de liquidação de sentença.
DDDDD. Na verdade, em face da prova produzida e da factualidade dada como provada, quer na presente acção, quer na acção n.º 1678/12.8TBMACN, deverá ser reconhecido o direito da Recorrente Sociedade à indemnização por danos não patrimoniais, tal como supra explanámos, ainda que carecido de posterior liquidação, nos termos da condenação operada e do disposto no artigo 609.º, n.º 2, do CPC. Da condenação em juros dos Recorrido:
EEEEE. A sentença recorrida decidiu, ainda, “Julgar improcedente o demais peticionado pela reconvinte”, sendo que tal segmento decisório de engloba, segundo cremos, o pedido formulado pelas Recorrentes no sentido da condenação dos Recorridos “no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, no montante que se venha a apurar, acrescidos de juros vencidos e vincendos à taxa legal”.
FFFFF Parece-nos, pois, que a condenação em juros foi propositadamente excluída do objecto da condenação, ainda que por motivos que se desconhece, pelo que urge salientar a violação pelo Tribunal a quo do disposto nos artigos 805.º, n.º 3, 806.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil.
GGGGG. Na verdade, a questão do vencimento de juros sobre a quantia indemnizatória fundada na responsabilidade por factos ilícitos, bem como do momento em que os mesmos começa a contar, é manifestamente pacífica na Doutrina e na jurisprudência dominantes.
HHHHH. Assim, da conjugação dos artigos 805.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), do Código Civil, os Recorridos constituíram-se em mora à data da sua interpelação judicial tendente ao seu cumprimento – aqui, a 22.05.2015, data da notificação aos Recorridos da contestação-reconvenção apresentada – porquanto a obrigação pecuniária provém da prática de factos ilícitos.
IIIII. Deste modo, mal andou o Tribunal a quo ao indeferir o pedido de condenação em juros dos Recorridos, pelo que deverá a sentença recorrida ser revogada nesta parte, condenando-se os Recorridos ao pagamento de juros calculados sobre os montantes já liquidados, e que se venham apurar, que foram indevidamente retirados à Recorrente Sociedade, à taxa legal, contados desde a data da notificação da contestação-reconvenção aos Recorrentes até integral pagamento. Em suma:
JJJJJ. Em face do exposto pelos Recorrentes e do que V. Exas. doutamente suprirão ou oficiosamente conhecerão, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida face aos erros de julgamento de que padece, na proporção e nos termos requeridos.
Os Réus “A..., Lda.”, BB, e CC vieram apresentar contra-alegações relativamente ao recurso interposto pelo Autor, com ampliação do objecto do recurso, terminando com as seguintes
CONCLUSÕES DA AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO:
I. Os Recorridos defenderam-se do pedido formulado pelo Autor nos autos com uma pluralidade de fundamentos, alguns dos quais a sentença recorrida arredou ou saíram prejudicados pela solução jurídica perfilhada pelo Tribunal a quo.
II. Prevenindo a necessidade da sua apreciação na hipótese de procedência do recurso interposto pelo Recorrente – o que por mera hipótese de raciocínio se equaciona –, os Recorridos requerem a reapreciação dos fundamentos que invocaram na sua defesa e que não foram acolhidos na sentença recorrida, a saber: (i) se o Autor não tem direito à indemnização peticionada por não ter exercido efectivamente funções durante o período em causa [como solução jurídica prévia à adoptada na sentença recorrida, que, primeiro afirmou a existência do direito, para depois considerar o seu exercício abusivo]; (ii) se, não se verificando nenhum facto impeditivo do direito invocado pelo Autor, ficou provado o dano do Autor; se, não se verificando nenhum facto impeditivo do direito invocado pelo Autor, ao valor do dano deverão ser deduzidos os montantes que o Autor levantou indevidamente da sociedade e que se encontram dados como provados; (iii) se, não se verificando nenhum facto impeditivo do direito invocado pelo Autor, ao valor do dano deverão ser descontados os montantes que este auferiu a título de baixa médica, reforma ou pensão; e (iv) a responsabilidade pessoal dos 2.º, 3.º e 4.º Réus ao abrigo do disposto no artigo 58.º, n.º 3 do Código das Sociedades Comerciais.
III. Por outro lado, prevenindo a hipótese de reversão da decisão proferida pelo Tribunal a quo quer quanto à apreciação nestes autos da excepção de prescrição do direito indemnizatório deduzido na reconvenção quer quanto à solução de direito acolhida na sentença recorrida que determinou a improcedência dos pedidos principais formulados contra os Réus – o que se faz por mera cautela de patrocínio – os Recorridos pretendem ver reapreciada a decisão daquele Tribunal sobre a matéria de facto, designadamente com recurso à reapreciação da prova gravada, porquanto consideram, por um lado, terem sido dados como provados factos que não ficaram demonstrados e, por outro lado, não terem sido dados como provados factos que efectivamente resultaram demonstrados da prova produzida e que se afiguram com potencial interesse na hipótese de vir a ser proferida uma decisão que altere a sentença recorrida e cogite outras soluções de direito.
IV. Para além dos factos que os ora Recorridos já requereram que fossem aditados ao elenco dos factos provados no âmbito do recurso por aqueles interposto da sentença recorrida – nomeadamente, para o que ora importa, os indicados sob os pontos 73) a 76) do artigo 50.º supra –, deverão ainda ser aditados os seguintes: 81) Em 22.11.2012, através da petição inicial que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, da qual o autor e o chamado se têm por citados em 27.11.2012, a sociedade ré manifestou a intenção de exercer contra eles o direito de indemnização referente aos valores por aqueles indevidamente retirados da sociedade.
V. Tal facto resulta documentalmente provado pelo Doc. 151 junto ao requerimento apresentado pelos ora Recorridos nos autos em 22.11.2012.
VI. Por outro lado, deverá ainda ser dado como provado que: • 82) O Autor e o Interveniente Principal ocultaram os factos descritos em 73) a 76), os quais apenas foram do conhecimento dos réus em data não concretamente apurada, mas seguramente após 22.11.2012.
VII. Tal matéria resulta provada da conjugação da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento com a prova documental junta aos autos e, ainda, através de presunção judicial, com recurso às regras da experiência.
VIII. Na verdade, ambas as testemunhas PP [depoimento prestado na audiência de 07.04.2022, gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01, nas passagens gravadas entre os minutos [00:55:31] a [00:55:48], [01:12:37] a [01:13:00]] e QQ [depoimento prestado na audiência de 26.04.2022, gravado entre os minutos 10:08:40 e 11:24:41, nas passagens gravadas entre os minutos [00:53:40] a [00:56:45]] confirmaram ao Tribunal que o Autor e o Interveniente Principal, as mais das vezes, não davam conhecimento à sociedade, nem ali deixavam evidências de onde resultasse a prática de tais factos, dos levantamentos indevidos de dinheiros societários que em conjunto protagonizavam, que algumas vezes a sociedade apenas veio a tomar conhecimento de tais circunstâncias através de informação do banco.
IX. Acresce que, encontra-se junta aos autos a ata n.º ..., de 17.09.2012, que antecedeu a instauração do processo n.º 1678/12.8T8MCN (cfr. Doc. 3 junto com a petição inicial), de onde resulta claro que, àquela data, a sociedade Recorrida não tinha conhecimento dos levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 – a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida.
X. Com efeito, ali se referem os levantamentos indevidos de dinheiro realizados pelo Autor e Interveniente Principal de que a sociedade tomou conhecimento desde a Assembleia Geral de 22.06.2006 até à data da ata n.º ... (17.09.2012).
XI. Entre esses levantamentos descritos na ata n.º ... não constam as retiradas indevidas de dinheiro protagonizadas pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008.
XII. Decorre das regras da experiência que, tivesse a sociedade Recorrida conhecimento também daqueles comportamentos dolosos – levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de acto dada como provada na sentença recorrida – e teria certamente a eles feito também menção na ata n.º ..., designadamente por constituírem fundamentos adicionais para a acção judicial que visava instaurar (e instaurou) contra aqueles.
XIII. Subsequentemente, veio efectivamente a sociedade Recorrida a dar entrada de acção com vista, entre outros, à destituição de gerentes do Autor e do Interveniente Principal, em 22.11.2012, que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, não tendo a Recorrida nessa acção alegado os levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, o que demonstra que, à data da entrada daquela acção, tais levantamentos não eram ainda do conhecimento da sociedade Recorrida.
XIV. De facto, ali se alegaram todos os levantamentos indevidos de dinheiro ocorridos e conhecidos da sociedade Recorrida até à Assembleia Geral de 22.06.2006, bem como os entretanto ocorridos e conhecidos da sociedade Recorrida até à data da entrada da acção, isto é, os identificados na ata n.º ... (cfr. Docs. 1 e 151 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e Doc. 3 junto com a petição inicial).
XV. Obviamente, tivesse a sociedade Recorrida conhecimento dos levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, e teria certamente alegado tais factos na petição inicial que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, na medida em que os mesmos constituíam fundamento para as pretensões que aí pretendiam fazer valer, designadamente para o pedido de destituição de gerentes do Autor e Interveniente Principal, tendo, por conseguinte, todo o interesse na sua invocação caso deles tivesse conhecimento.
XVI. Assim, não restam dúvidas que dos factos acima mencionados, que são do conhecimento do Tribunal por via dos meios de prova documental (Docs. 1 e 151 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e Doc. 3 junto com a petição inicial), é possível (e dever-se-á), através de um juízo de indução ou de inferência, deles extrair, à luz das regras da experiência, o facto supra indicado sob o ponto 82), ao abrigo do disposto no artigo 349.º, do CC.
XVII. Ademais, com vista à concretização do raciocínio que vem de ser exposto, deverão ser também levados à matéria de facto provada na sentença recorrida os seguintes factos: • 83) O teor da ata n.º ....º, da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 17.10.2012; • 84) O teor da ata n.º 1 e respectivo anexo, da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 22.06.2006; • 85) O teor dos articulados de petição inicial da sociedade Ré no âmbito do processo n.º 1678/12.8T8MCN.
XVIII. Os indicados factos resultam, todos eles, documentalmente provados nos autos: a. O facto 83) através do Doc. 3 junto com a petição inicial; b. O facto 84) através do Doc. 1 junto com o requerimento dos réus de 13.11.2020; e c. O facto 85) através do Doc. 151 junto com o requerimento dos réus de 13.11.2020.
XIX. Prevenindo a hipótese de procedência do recurso do Recorrente na parte em que pretende afastar a solução jurídica perfilhada pelo Tribunal a quo consubstanciada no instituto do abuso do direito, afigura-se importante alterar a decisão da matéria de facto no que concerne à alínea b) do ponto 66) da sentença recorrida porquanto ficou demonstrado mais do que aquilo que a sentença recorrida ali consignou.
XX. Com efeito, do Doc. 117 junto com o requerimento de 13.11.2020 resulta que o levantamento efectuado pelo Autor o foi por conta de remunerações referentes ao período em causa nos autos.
XXI. O que é de extrema relevância uma vez que um dos fundamentos da defesa dos Recorridos consiste, precisamente, no facto de o Autor se ter feito pagar de remunerações referentes ao período que agora peticiona e de outros valores que não lhe eram devidos.
XXII. O documento em questão demonstra que o Autor levantou da sociedade montantes a título de remunerações do período em causa nos autos, os quais não foram sequer impugnados pelo Autor.
XXIII. Não obstante a prova documental evidente a que se fez referência, e que não foi objecto de impugnação, certo é que também a testemunha QQ, colaborador da 1.ª Ré, confirmou a veracidade do documento – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 26.04.2022 gravado entre os minutos 10:08:40 e 11:24:41, nas passagens gravadas entre os minutos [00:52:33] a [00:53:37].
XXIV. Isto posto, entendem os Recorridos que a sentença recorrida deverá ser alterada, de forma a alínea b) do ponto 66) dado como provado passar a ter a seguinte redacção: • 66) – b) Transferência bancária a favor de AA, realizada em 28/06/2007, no valor de € 6.000,00 (seis mil euros), a título de ordenados de 2006 e 2007.
XXV. Prevenindo a hipótese de procedência das questões suscitadas pelo Recorrente, nomeadamente a reapreciação da matéria de facto e as soluções de direito vertidas na sentença recorrida, os Recorridos pretendem também a reapreciação de concretos pontos da matéria de facto não impugnados pelo Recorrentes, com cujo julgamento protagonizado pelo Tribunal a quo os Recorridos discordam por não terem resultado demonstrados da prova produzida.
XXVI. Discordam os Recorridos da parte final do ponto 8) dos factos provados na sentença recorrida, na parte onde se lê “(…) tendo este participado em diversas reuniões de gerência”.
XXVII. Na verdade, o referido trecho do ponto 8) dos factos provados na sentença recorrida não poderá resultar senão de um evidente equívoco do Tribunal a quo.
XXVIII. Pois que o que resultou da prova produzida em audiência de julgamento foi que não existiam reuniões de gerência na sociedade Ré.
XXIX. Isso mesmo disse o Senhor BB em sede de depoimento de parte, o que levou, inclusive, à correcção da assentada na audiência de discussão e julgamento, uma vez que ficou evidente que, quando questionado sobre a participação dos Senhores AA e EE em reuniões de gerência, o Senhor BB interpretou erradamente como Assembleias Gerais de sócios, razão pela qual respondeu afirmativamente - cf. ata da sessão de julgamento de 29.03.2022.
XXX. Assim que se apercebeu do equívoco em que incorria, o Senhor BB esclareceu o Tribunal que não havia reuniões de gerência, pelo que estava a referir-se às Assembleias Gerias de sócios – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 29.03.2022 gravado entre os minutos 10:08:18 e 11:55:18, nas passagens gravadas entre os minutos [00:14:51] a [00:15:00], [00:47:42] a [00:52:55]]
XXXI. A inexistência de reuniões de gerência foi confirmada pela testemunha PP, funcionário de escritório da sociedade Ré – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01, nas passagens gravadas entre os minutos [00:10:12] a [00:10:26].
XXXII. Nenhuma outra testemunha contrariou os depoimentos acima descritos, sendo certo que as testemunhas SS, TT, NN e GG sequer, respectivamente filho e esposa do Senhor AA e filha e genro do Senhor EE sequer trabalhavam na empresa, desconhecendo, por isso, o modo de organização e funcionamento da gerência na prática.
XXXIII. Daí que inexistam nos autos qualquer meio de prova que permita sustentar a parte final do ponto 8) dos factos provados na sentença recorrida, desconhecendo-se onde é que o Tribunal a quo (mal) fundou a sua convicção para dar tal matéria como provada, antes se afigurando mais provável ter-se ficado a dever a um mero lapso.
XXXIV. Nesta conformidade, deverá a sentença recorrida ser alterada e alterada a redacção do ponto 8) dos factos provados na sentença recorrida, o qual deverá passar a ter a seguinte formulação: • 8) Desde a data daquela transacção, e até 2006, a R. remunerou o Autor pela gerência.
XXXV. Impugnam também os Recorridos o ponto 16) dos factos provados na sentença recorrida, requerendo a alteração da decisão proferida pelo Tribunal a quo no sentido de julgar o referido ponto não provado.
XXXVI. Isto porque, no entender dos Recorridos, não resultou provado nada mais além do que decorre do ponto 15) dos factos provados, isto é, que o Autor foi destituído da gerência por deliberação de 22.06.2006 e que, na sequência daquela deliberação, esteve ausente da empresa até 17.09.2012.
XXXVII. O ponto 16) dos factos provados na sentença recorrida ou é uma redundância do que já resulta do ponto 15) dos factos provados, na medida em que se o “afastamento” que ali se refere respeita à deliberação de destituição, é uma redundância dizer que aquela decisão não partiu de uma vontade própria do Autor e de uma imposição da Ré, uma vez que se trata de uma destituição, e não de renúncia ao cargo, ou então o ponto 16) dos factos provados terá de ser entendido como relacionado com aquela outra matéria alegada pelo Autor referente à sua ausência física da empresa se tenha e ao facto de ter sido alegadamente proibido de lá entrar e exercer funções pelos outros gerentes.
XXXVIII. Ou seja, a redacção do facto provado 16) pode sugerir – embora, salvo melhor opinião, dali efectivamente não resulte – que os Recorridos criaram algum tipo de obstáculo ao exercício das funções do Autor na sociedade e que terá sido esse o motivo determinante de as terem deixado de exercer, o que de todo resultou demonstrado.
XXXIX. Aliás, tanto tal matéria não resultou demonstrada que ficou a constar dos factos não provados na sentença recorrida – cf. pontos b) e c) dos factos não provados na sentença recorrida.
XL. A ideia errada que pode sugerir – relacionada com o alegado obstáculo criados pelos demais gerentes ao Autor no que concerne à sua presença na empresa – não resultou, de todo, demonstrada nos autos.
XLI. Senão vejamos, de acordo com a sentença recorrida, a prova do facto supra referido, alegado pelo Autor para sustentar o pedido principal que aqui deduziu contra os Réus, assentou na livre apreciação da prova testemunhal, documental e por declarações de parte produzidas.
XLII. As únicas testemunhas que tentaram perpassar a ideia de que o Autor e o Interveniente Principal estiveram ausentes da sociedade Ré na sequência da deliberação de destituição de 22.06.2006 por terem sido impedidos de ali entrar pelos Réus foram as testemunhas SS, TT, NN e GG arroladas pelo Autor.
XLIII. No entanto, as testemunhas PP e QQ, colaboradores da 1.ª Ré, deixaram explícito que os Senhores AA e EE nunca estiveram impedidos de comparecer na empresa e exercer as suas funções.
XLIV. Sendo certo que nenhuma outra testemunha, com conhecimento directo da actividade da empresa e que ali trabalhasse, depôs atestando o contrário – cf. depoimento da testemunha PP [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01, nas passagens gravadas entre os minutos [01:03:58] a [01:05:33], [01:06:03] a [01:06:25]] e depoimento da testemunha QQ [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 26.04.2022 gravado entre os minutos 10:08:40 e 11:24:41], nas passagens gravadas entre os minutos [00:32:43] a [00:33:04]].
XLV. Em face do exposto, entendem os Recorridos, ter sido feita prova credível de que EE e AA deixaram voluntariamente de exercer funções na empresa a partir da deliberação tomada em 22.06.2006, sem que tenham encontrado qualquer oposição ou proibição por parte dos outros gerentes ou dos colaboradores da sociedade.
XLVI. As supra indicadas testemunhas foram os únicos colaboradores da empresa que prestaram depoimento, capazes de afirmar se AA e EE eram ou não bem recebidos na empresa pelos demais gerentes, sendo certo que do depoimento daquelas duas testemunhas não resultou que, a partir da deliberação de 22.06.2006, AA e EE tivessem deixado de ser bem recebidos, o que foi corroborado pelas declarações do 4.º Réu – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 29.03.2022 gravado entre os minutos 12:01:13 e 12:48:19], nas passagens gravadas entre os minutos [00:10:40] a [00:11:17].
XLVII. Não resultou provado, antes pelo contrário, que EE e AA não fossem bem-recebidos na empresa, designadamente pelos outros gerentes.
XLVIII. Por esse motivo, o ponto 16) dos factos provados deverá passar a integrar o elenco da matéria não provada da sentença recorrida.
XLIX. Não conseguem os Recorridos descortinar em que prova se sustentou o Tribunal a quo para dar como provado o ponto 17) dos factos provados na sentença recorrida, na medida em que a referida matéria não resultou demonstrada da prova produzida.
L. Note-se que o referido ponto 17) refere-se a um período muito específico no tempo, após 26.10.2012 – data do registo da destituição do Autor da gerência com base na deliberação de 20.08.2003 –; refere-se em concreto aos 2.º e 4.º Réus como os autores de tal impedimento de entrada do Autor na sociedade; excepciona concretamente o acesso à sala onde decorriam as assembleias gerais da sociedade.
LI. Na verdade, salvo o devido respeito, as testemunhas SS, TT, NN e GG apresentadas pelo Autor são as chamadas “testemunhas cassete”, que se apresentaram em audiência de julgamento, desprovidas de qualquer razão de ciência, a desbobinar um discurso previamente ensaiado, e mal.
LII. As referidas testemunhas, que nunca tiveram qualquer função na empresa, não se inibiram de se apresentar em Tribunal a falar de toda a matéria em causa nos autos, eminentemente societária e do dia-a-dia da empresa, tentando justificar um conhecimento directo de factos que, de acordo com as regras da experiência, nunca poderiam ter.
LIII. Acresce que, as testemunhas apresentaram-se todas elas com um discurso pró-Senhores AA e EE e anti-Senhores BB e DD, revelando-se manifestamente parciais, sendo certo que todas elas, como mulher e filho do Autor e como filha e genro do Interveniente Principal, têm um interesse no desfecho da causa.
LIV. Importa ainda sublinhar que o discurso destas testemunhas não foi espontâneo e fluido, sendo várias vezes conduzido por um interrogatório sugestivo e que as conduzia a lançar temas que depois tão pouco sabiam desenvolver, carecendo de qualquer encadeamento lógico.
LV. Foram estas testemunhas, sem qualquer ligação à actividade da empresa, que tentaram atestar que o Autor e o Interveniente Principal foram impedidos de entrar na sociedade.
LVI. Mas, além de o seu depoimento não dever ser valorado, pela falta de conhecimento directo dos factos e parcialidade dos seus testemunhos, certo é que nenhuma delas atestou em concreto o que se pode ler no ponto 17) dos factos provados na sentença recorrida.
LVII. Os poucos episódios concretos que essas testemunhas referiram tão pouco os situaram no período pós 26.10.2012.
LVIII. A testemunha SS, filho do Autor, não se referiu especificamente, pelo menos dando nota de ter tido conhecimento directo de alguma situação em concreto, ao período posterior a 26.10.2012, tendo referido apenas um único acompanhamento do Pai a uma Assembleia Geral.
LIX. A mulher do Autor, TT, confirmou no seu depoimento ao Tribunal, que tudo quanto relatou não foi do seu conhecimento directo, mas apenas o que ouviu dizer, não versando, além do mais, concretamente sobre o que se pode ler no ponto 17) dos factos provados na sentença recorrida – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 29.03.2022 gravado entre os minutos 15:31:59 e 16:15:47], passagens gravadas entre os minutos [00:05:23] a [00:05:29], [00:14:29] a [00:14:48], [00:15:32] a [00:16:05], [00:16:48] a [00:16:57], [00:30:22] a [00:30:37], [00:38:04] a [00:38:38].
LX. A testemunha GG, de acordo com o que se pode ler na sentença recorrida acerca daquele que foi o teor do seu testemunho, nada terá contribuído para a formação da convicção do Tribunal a quo nesta matéria.
LXI. E, acrescentamos nós, nem poderia ser de outra forma, uma vez que aquela testemunha não depôs com conhecimento directo sobre nenhuma situação de impedimento do Autor à sociedade pelos 2.º e 4.º Réus, tendo inclusive o seu depoimento sido direccionado mais para a situação do seu genro, Interveniente Principal, do que para a do Autor.
LXII. Já a filha do Interveniente Principal, a testemunha NN, confessou não ter conhecimento directo dos factos que relatou ao Tribunal - [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 14:14:58 e 15:05:44], nas passagens gravadas entre os minutos [00:06:02] a [00:06:23] e [00:45:16] a [00:45:29].
LXIII. Note-se que as testemunhas PP e QQ, colaboradores da 1.ª Ré, com funções no escritório, que aí trabalharam diariamente há cerca de 30 anos, não confirmaram – pelo contrário, infirmaram – o depoimento das referidas testemunhas.
LXIV. Desde logo, a testemunha PP contribuiu para o juízo de (dês)credibilidade que deveria ter sido atribuído ao depoimento das testemunhas SS, TT, NN e GG, uma vez que atestou que as referidas testemunhas não estavam com frequência na empresa, pelo que, como é óbvio, não estavam em condições de atestar, com conhecimento de causa, metade daquilo que tentaram afirmar – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01], nas passagens gravadas entre os minutos [01:24:17] a [01:25:22]
LXV. Por outro lado, as testemunhas PP e QQ contrariaram a tese do Autor de que havia sido impedido de entrar ou expulso das instalações da empresa.
LXVI. Sendo certo que estas foram as únicas testemunhas, com razão de ciência, a depor sobre esta matéria, além de imparciais, por não terem interesse no desfecho da causa, e o seu depoimento se ter revelado credível.
LXVII. Não se pode concordar com a valoração que se lê na sentença recorrida sobre o depoimento das referidas testemunhas PP e QQ.
LXVIII. Em primeiro lugar, apreciado o devidamente o depoimento da testemunha PP, não restam dúvidas de que, maneirismos de falar à parte, esta testemunha atestou nunca ter tido conhecimento de que o Autor tivesse sido impedido de entrar nas instalações – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01], nas passagens gravadas entre os minutos [00:10:10] a [00:11:02], [00:21:50] a [00:22:02], [01:04:32] a [01:05:33], [01:06:03] a [01:06:25], [01:08:12] a [01:08:31].
LXIX. Como é óbvio, a testemunha só pode atestar – pelo menos, de forma credível, que é o que se espera – aquelo de que teve conhecimento directo, que presenciou.
LXX. Além do mais, era sobre o Autor que recaia o ónus de provar o facto em questão e para tanto não apresentou prova bastante, como ficou demonstrado.
LXXI. A consequência de não ter produzido prova bastante de que foi impedido de entrar nas instalações – sendo que, como referido, os depoimentos das testemunhas SS, TT, NN e GG não foi prova bastante – é a não prova do facto alegado.
LXXII. Sobre a testemunha QQ, de acordo com a própria sentença, não confirmou a matéria que se lê no ponto 17) dos factos provados.
LXXIII. Refira-se também que os 2.º e 4.º Réus negaram ter proibido o acesso do Autor à empresa – cf. declarações do 2.º Réu [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 29.03.2022 gravado entre os minutos 10:08:18 e 11:55:18], nas passagens gravadas entre os minutos [00:28:18] a [00:29:33], [00:35:59] a [00:36:26] e as declarações do 4.º Réu [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 29.03.2022 gravado entre os minutos 12:01:13 e 12:48:19], nas passagens gravadas entre os minutos [00:10:00] a [00:10:29].
LXXIV. Ora, de tudo quanto ficou exposto resulta à saciedade que o Tribunal a quo andou mal no julgamento que fez sobre o ponto 17) dos factos dados como provados na sentença recorrida porquanto não tinha meios de prova credíveis que permitissem dar como provado o que ali se pode ler.
LXXV. E, como tal, de acordo com as regras do ónus da prova (artigo 342, n.º 1, a contrario, do CC), o referido facto 17) deveria ter sido julgado não provado, o que ora se requer em sede de reapreciação da matéria de facto.
LXXVI. Não se conformam, ainda, os Recorridos com o ponto 20) dos factos provados na sentença recorrida, nem quanto às “condições rigorosas de fiscalização”, nem quanto à parcialidade do acesso à informação.
LXXVII. No que diz respeito às condições de fiscalização, nenhuma das testemunhas depôs sobre o concreto acesso à informação em maio de 2014, pelo que se depreende que o que terá motivado o Tribunal a quo a dar como provado as condições em que se realizou esse acesso terá sido o teor do Doc. 11 junto com o requerimento de 13.11.2020.
LXXVIII. Pelo que deverá apenas dar-se como provado apenas que o acesso foi permitido nas condições descritas naquele documento.
LXXIX. Por outro lado, de lado algum resultou provado a que documentos teve o Autor acesso nessa data e se eles corresponderam ou não ao que havia sido requerido.
LXXX. Nem as testemunhas arroladas pelo Autor o fizeram, desde logo, porque nenhuma atestou o conteúdo do pedido e da informação prestada concretamente em maio de 2014.
LXXXI. Aliás, da comunicação junta como Doc. 11 com o requerimento de 13.11.2020 não se retira qualquer limitação à informação disponibilizada em relação ao que havia sido solicitado.
LXXXII. Nesta conformidade, deverá ser alterada a redacção do ponto 20) dos factos provados na sentença recorrida, o qual deverá passar a ter a seguinte redacção: • 20) Em Maio de 2014, foi permitida ao Autor a análise dos elementos solicitados em Abril de 2014 nas condições descritas no Doc. 11 junto com o requerimento de 13.11.2020.
LXXXIII. Impugnada vai também a decisão do Tribunal a quo quanto ao ponto 21) dos factos provados, que deverá passar a integrar o elenco de factos não provados.
LXXXIV. O que é, aliás, consequência necessária da alteração supra requerida à decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre os pontos 16), 17) e 20).
LXXXV. É que o que vem descrito sob o ponto 21) foi invocado pelo Autor como consequência da alegada destituição infundada da gerência, de ter visto negado o acesso à empresa ou ter sido expulso das instalações desta e da falta de acesso à informação, o que ficou por demonstrar.
LXXXVI. Acresce que, se atentarmos na fundamentação de facto da sentença recorrida, os únicos depoimentos que poderiam suportar a prova do referido facto seria o da mulher do Autor, TT, e o da ex-nora do Autor, UU.
LXXXVII. Sucede que, o depoimento da testemunha TT não deveria ter sido valorado pelo Tribunal a quo, pelas razões já supra aduzidas, especialmente por se ter revelado tendencioso e manifestamente parcial, claramente alinhado para fazer valer a todo o custo a pretensão do Autor nos presentes autos.
LXXXVIII. Por outro lado, de acordo com a sentença recorrida, a testemunha UU apenas se referiu à consequência emocional da destituição de gerência, e já não quanto ao demais.
LXXXIX. A sentença recorrida faz ainda alusão, a propósito do depoimento da testemunha NN, a que esta teria referido que “esta situação causa tristeza ao autor”, mas a verdade é que, reapreciado o depoimento daquela testemunha verificar-se-á que a testemunha dirigiu o seu depoimento essencialmente ao sentimento seu Pai, Interveniente Principal, não tendo atestado o estado emocional do Tio, Autor.
XC. Em virtude do exposto, salvo melhor entendimento, o ponto 21) deverá passar a integrar o elenco dos factos não provados da sentença recorrida.
XCI. Acresce também que, mal andou o Tribunal a quo ao dar como provado o ponto 22) da sentença recorrida.
XCII. Sendo certo que, se atentarmos na fundamentação de facto da sentença recorrida, nenhum dos depoimentos ali destacados sustenta a alegada preocupação do Autor com o estado actual da empresa.
XCIII. Desconhece-se, por isso, em que meio de prova terá o Tribunal a quo suportado um tal entendimento.
XCIV. E a verdade é que da compatibilização de prova testemunhal mais credível que foi produzida em audiência de julgamento resulta à evidência o desleixo do Autor relativamente à vida da sociedade, que remonta a vários anos antes da deliberação de destituição de 22.06.2006, tendo sido referido por todos quantos trabalham na sociedade e prestaram depoimento que o Autor nem sequer estava presente na vida da sociedade – cf., a título de exemplo, o testemunho de PP[depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01], nas passagens gravadas entre os minutos [01:28:16] a [01:29:15].
XCV. Por carecer de sustentação na prova produzida, deverá ser alterada a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre o ponto 22), que deverá passar a integrar o elenco de factos não provados da sentença recorrida.
XCVI. Por fim, quanto ao à matéria de facto, entendem os Recorridos que não podia o Tribunal a quo ter dado como provado o ponto 24) da sentença recorrida.
XCVII. Com efeito, era sobre o Autor que recaia o ónus de provar o vertido no ponto 24), que foi por si alegado, o que não fez.
XCVIII. Nenhuma das testemunhas que prestou depoimento em audiência de julgamento mostrou ter conhecimento firme sobre a matéria, umas tendo referido que tinham ideia (mas não certeza) de não terem sido distribuídos lucros naquele período, outras tendo referido, sem conseguir precisar, que achavam que tinha havido distribuição de lucros entre o período em causa – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01], nas passagens gravadas entre os minutos [00:09:25] a [00:09:41].
XCIX. Mas, a verdade é que se encontram juntas aos autos as atas n.º 69 e 70, de 14.03.2008 e 13.03.2009, respectivamente, que atestam que nos anos de 2007 e 2008 houve, afinal, distribuição de lucros.
C. Impondo-se, portanto, que o ponto 24) passe a constar dos factos não provados da sentença recorrida.
CI. Ainda, entendem os Recorridos que, acautelando a hipótese de reversão da decisão de direito alcançada pela sentença recorrida, revela-se necessário acrescentar ao elenco de factos provados as circunstâncias por eles alegadas e demonstradas com interesse para o cálculo indemnizatório peticionado pelo Autor.
CII. Com efeito, alegaram os Recorridos na Contestação que, na hipótese de procedência da acção, sempre deveriam ser descontados os valores recebidos pelo Autor, no período em causa, a título de reforma, pensão ou baixa.
CIII. Ora, de acordo com essa mesma ata n.º 5 – junta como Doc. 16 á petição inicial –, ficando os sócios impedidos para o trabalho, e estando coberto pela Providência, a sociedade apenas lhes deve pagar a diferença entre o ordenado e o valor recebido da Providência.
CIV. A testemunha QQ, colaborador da 1.ª Ré, confirmou que esta prática se mantinha ainda àquela data na empresa – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 26.04.2022 gravado entre os minutos 10:08:40 e 11:24:41], nas passagens gravadas entre os minutos [00:35:56] a [00:37:16].
CV. Em virtude do exposto, deverá ser acrescentado ao elenco dos factos provados na sentença recorrida o seguinte: • 86) Os sócios da 1.ª Ré que aufiram rendimentos provenientes do sistema de providência, apenas têm direito a receber da sociedade a diferença entre aquele montante e a remuneração mensal fixada.
CVI. Não obstante se entender que o prejuízo do Autor nunca corresponderia ao valor das remunerações não auferidas pela empresa por ter auferido valores a título de baixa pelo seguro, subsídio de doença e reforma – o que seria suficiente para deduzir tais valores ao pedido de condenação formulado pelo Autor nos autos –, afigura-se-nos que à mesma conclusão se teria de chegar por via do referido facto que resultou provado e se pretende aditar, ainda que se entendesse, como faz o Recorrente, que o Autor estaria dispensado de provar o real prejuízo sofrido, tendo sempre direito a receber o valor correspondente à remuneração que deixou de auferir.
CVII. É que, como ficou demonstrado, qualquer sócio em funções coberto pelo sistema de providência, nunca teria direito a receber a remuneração por inteiro, mas apenas a diferença entre a sua remuneração e o valor recebido através do sistema providencial.
CVIII. Na mesma ordem de ideias, deverá também passar a constar dos factos provados na sentença recorrida os concretos montantes que se apuraram que o Autor auferiu no período em causa nos autos, valores que, como se viu, sempre teria de ser descontados à indemnização que hipoteticamente viesse a ser atribuída ao Autor em caso de procedência do seu recurso.
CIX. Nesta conformidade, deverá ser aditado ao elenco de factos provados na sentença recorrida: • 87) Entre Setembro e Outubro de 2009, o Autor recebeu a quantia de € 1.800,73, do seguro de acidentes de trabalho. • 88) No período compreendido entre 26.02.2007 e 28.05.2007, o Autor recebeu € 2.439,24 da Segurança Social, a título de subsídio de doença. • 89) Entre 30.10.2008 e Setembro de 2012, o Autor recebeu da Segurança Social a quantia de € 79.366,61, a título de reforma.
CX. O ponto 87) está documentalmente provado nos autos através da informação junta pela Fidelidade aos autos por e-mail de 13.04.2022, fls..
CXI. O ponto 88) encontra-se também provado por documentos – cf. Informação prestada pela Segurança Social junta aos autos a 30.03.2022, por e-mail, fls..
CXII. O mesmo se diga do ponto 89), documentalmente demonstrado pela informação prestada pela Segurança Social junta aos autos por e-mail de 04.04.2022, fls..
CXIII. Isto posto, na eventualidade de vir a proceder a proceder o recurso do Recorrente na parte em que impugnou a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre o abuso do direito, têm os Recorridos interesse em ver reapreciado o fundamento de defesa que invocaram na sua contestação e que negava à partida o direito de indemnização peticionado pelo Autor ao abrigo do disposto no artigo 257.º do Código das Sociedades Comerciais, não havendo, por isso, necessidade de chegar à solução correctiva do Tribunal a quo fundada no abuso do direito.
CXIV. Com efeito, a lei não confere ao gerente destituído o direito de ser indemnizado sempre que a deliberação que o haja destituído venha a ser declarada nula nem essa é uma consequência dos efeitos retroactivos da declaração de nulidade da deliberação, verificando-se, no caso concreto, um facto impeditivo do direito à indemnização.
CXV. Há, assim, que apreciar se a destituição material a que esteve sujeito teria sido justificada ou não.
CXVI. Ora, a verificação de factos que consubstanciam justa causa de destituição do gerente devem impedir o direito à indemnização do gerente.
CXVII. Relembra-se que, tal como demonstrado supra, a decisão proferida no processo 1114/06.9TBMCN, que declarou nula a deliberação de destituição de 22.06.2006, assentou num motivo meramente formal, não tendo apreciado a existência ou não de justa causa para a destituição deliberada.
CXVIII. Do mero confronto da decisão que destituiu os gerentes, proferida no processo 1678/12.8TBM, e dos factos dados como provados na presente acção com os fundamentos da deliberação de 22.06.206 verifica-se que os actos discriminados nos pontos E), F), e G), dos factos provados na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBM cuja certidão se encontra junta aos autos a fls. constituem também justa causa para a destituição de gerente materializada em Dezembro de 2006, já que a conduta ali imputada ao aqui Autor e os factos que ali se deram como provados e serviram de justa causa para a sua destituição judicial são todos anteriores a Dezembro de 2006.
CXIX. Pelo que a deliberação que se materializou em 2006 foi fundada em justa causa, constituindo esta justa causa um impedimento ao direito indemnizatório previsto no artigo 257.º, do CSC, que o Autor pretende fazer valer nos presentes autos.
CXX. Mais se diga que entendem os Recorridos que a remuneração é a contrapartida de uma prestação de trabalho, que, não tendo existido, sempre retiraria ao Autor o direito à correspondente remuneração, em especial porquanto, como resulta dos estatutos da sociedade juntos como Doc. 3 e 4 ao requerimento de 13.11.2020, da ata n.º ... junta com a petição inicial, desde sempre, que os gerentes desempenhavam uma função na sociedade, sendo essa a razão de ser da remuneração auferida.
CXXI. Ora, ficou provado (ponto 15) dos factos provados na sentença recorrida) que, após a deliberação de 22.06.2006, o Autor deixou de comparecer na sociedade até 17.09.2012 – e, consequentemente, de exercer a gerência.
CXXII. Não ficou provado – a nosso ver, até pelo contrário – que o Autor foi impedido de exercer as funções que lhe estavam adstritas na empresa, não lhe tendo sido vedado o acesso à empresa.
CXXIII. O que significa que o Autor deixou, por vontade própria, de exercer as suas funções na sociedade cuja prestação seria a contrapartida da remuneração que auferia.
CXXIV. É, assim, forçoso concluir não assistir ao Autor qualquer direito à remuneração peticionada nos autos, que, em boa verdade, era devida como contrapartida pelas funções que desempenhava na sociedade, relacionadas com a actividade da empresa – cfr. ata n.º 5 junta como Doc. 16 à petição inicial.
CXXV. O Autor voluntariamente optou por deixar de comparecer na empresa a partir da deliberação de 22.06.2006, apesar de não estar impedido de o fazer.
CXXVI. Tendo, na realidade, se desinteressado de continuar a ali prestar os serviços de que é contrapartida a remuneração que ali auferia.
CXXVII. Pretendem, assim, os Recorridos que, caso venha a proceder a pretensão recursória dos Recorrentes, este Tribunal aprecie o fundamento supra exposto como facto impeditivo do direito invocado pelo Autor e que determina a improcedência do mesmo.
CXXVIII. Sem prescindir, vindo a proceder, por qualquer forma, o recurso do Recorrente, haverá que conhecer das questões que a sentença recorrida não conheceu por terem ficado prejudicadas pela solução jurídica ali perfilhada no sentido da improcedência dos pedidos formulados pelo Autor.
CXXIX. Assim é relativamente à questão invocada pelos Recorridos na sua defesa quanto ao ónus que recaia sobre o Autor de fazer prova do prejuízo que invoca.
CXXX. Com efeito é orientação – cremos, maioritária – dos nossos tribunais, que num cenário de procedência da pretensão do Autor (o que por mera hipótese de raciocínio se equaciona), “o valor dessa indemnização teria de corresponder ao prejuízo real e efectivo que a destituição lhe causou e, como tal, seria necessário que o Autor alegasse e provasse que, nesse período, não teve oportunidade de exercer outra actividade remunerada, de idêntico nível económico, social e profissional, ao deixar de trabalhar para a ré”, pelo que “tal indemnização nunca corresponderia ao valor das remunerações que deixou de auferir entre Dezembro de 2006 e 17 de Setembro de 2012”.
CXXXI. Ora, a verdade é que, no caso concreto, o Autor nada alegou, muito menos provou, quanto ao prejuízo patrimonial alegadamente sofrido além da alegação de perda da remuneração que auferia e na 1.ª Ré – que, como vimos, é insuficiente –, razão por que, a nosso ver, nenhuma indemnização haveria a fixar pelo Tribunal.
CXXXII. Acresce que, a indemnização peticionada pelo Autor sempre ficaria, a nosso ver, limitada pela baliza prevista no artigo 257.º, n.º 7, do CSC, que faz presumir que os gerentes nomeados por período indeterminado não se manteriam no cargo por mais de quatro anos.
CXXXIII. Pelo que, no máximo, estariam em causa as remunerações até Dezembro de 2010, sem prejuízo do necessário desconto dos montantes auferidos pelo Autor a título de baixa, reforma ou pensão.
CXXXIV. Pelo que, num qualquer cenário de procedência dos pedidos formulados pelo Autor, sempre haveria de limitar a indemnização a Dezembro de 2010.
CXXXV. Por outro lado, em virtude da solução jurídica adoptada – e que reiteramos não merecer qualquer reparo – a sentença recorrida não apreciou outro fundamento de defesa dos Recorridos impeditivo ou, pelo menos, modificativo do pedido invocado pelo Autor, consubstanciado na necessária dedução dos valores que o Autor subtraiu à sociedade 1.ª Ré ao montante peticionado nos autos.
CXXXVI. De facto, tal como ficou dado como provado na sentença recorrida, o Autor desviou ilicitamente da sociedade diversos montantes – cfr. os factos provados sob os n.ºs 26), 27), 28), 29), 30), 31), 32), 33), 40), 45), 48), 49), 66) e ainda os pontos 73) a 76) cujo aditamento à matéria de facto os Recorridos requereram no recurso que eles próprios interpuseram da sentença recorrida.
CXXXVII. Assim aconteceu para pagamento de honorários de advogados e outras despesas pessoais do Autor e levantamento de lucros da sociedade a que não tinha direito por força de deliberações sociais validamente tomadas.
CXXXVIII. Por outro lado, o Autor chegou mesmo a fazer-se pagar de montantes por conta de remunerações referentes ao mesmo período que agora peticiona.
CXXXIX. Como é evidente, tais montantes, indevidamente subtraídos da sociedade pelo Autor, sempre deverão ser descontados ao pedido formulado pelo Autor na remota hipótese de vir a proceder o recurso interposto pelo Recorrente, reduzindo o mesmo em conformidade.
CXL. Por outro lado, também em virtude da solução jurídica adoptada – e que reiteramos não merecer qualquer reparo – a sentença recorrida não apreciou outro fundamento de defesa dos Recorridos impeditivo ou, pelo menos, modificativo do pedido invocado pelo Autor, consubstanciado na necessária dedução dos valores que o Autor auferiu a título de baixa, reforma ou pensão no período em causa nos autos.
CXLI. Sendo que, colocando como hipótese de raciocínio a procedência dos pedidos formulados pelo Autor, sempre teria de ser deduzido ao montante indemnizatório concedido ao Autor os valores que o Autor auferiu a título de baixa, reforma ou pensão no período em causa nos autos em conformidade com o que resultou da prova produzida, como acima já se expos.
CXLII. Por fim, ainda acautelando a reversão da sentença recorrida em virtude da procedência do recurso do Recorrente, terá o Tribunal de aquilatar o que não foi escrutinado pelo Tribunal a quo em virtude da solução jurídica perfilhada na sentença recorrida: a responsabilidade solidária dos 2.º, 3.º e 4.º Réus pelo pagamento ao Autor dos valores indemnizatórios.
CXLIII. É que esta responsabilidade pessoal encontra-se prevista no artigo 58.º, n.º 3, do CSC, apenas para quando as deliberações são anuladas com fundamento na alínea b) do n.º 1, o que pressupõe que a deliberação – no caso a deliberação de 22.06.2006 – tenha sido anulada com fundamento na circunstância de com essa deliberação se ter conseguido obter vantagens especiais e abusivas, o que não foi o caso.
CXLIV. Porque, de facto, no processo 1114/06.9TBMCN, como foi já dito, foi proferida uma decisão meramente formal, que se limitou a declarar nula, por um vício formal a deliberação tomada em 22.06.2022.
CXLV. O mesmo é dizer que nunca houve nenhuma anulação da deliberação de destituição, com fundamento na alínea b) do n.º 1, do artigo 58.º, do CSC.
CXLVI. E, conforme também já referido, nesta própria acção também não ficou provado que a deliberação de destituição do Autor, seja a de 2003, seja a de 2006, tenha visado a obtenção de quaisquer vantagens ilegítimas.
CXLVII. E, portanto, não existe qualquer responsabilidade solidária dos Réus, pessoas singulares.
CXLVIII. Por outro lado, relativamente ao 4.º Réu também há que atender ao facto de ele não ter participado da deliberação de destituição do Autor, seja a de 2003, seja a de 2006, motivo pelo qual, como é óbvio, nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada.
CXLIX. Por outro lado, a Sra. D. CC, 3.ª Ré, votou na deliberação de 2006 como representante comum de uma quota.
CL. Nos termos do artigo 222.º, n.º 3, os contitulares respondem solidariamente pelas obrigações legais ou contratuais inerentes à quota.
CLI. No entanto, não foram chamados os contitulares da quota àquela data a esta acção.
CLII. E, portanto, é a Sra. D. CC parte ilegítima, portanto, existe aqui um vício da legitimidade substantiva passiva, que é também do conhecimento oficioso.
CLIII. E, além disso, está de facto junto nos autos o documento [ata] que permitem assim concluir – cfr. Doc. 1 junto com o requerimento de 13.11.2020.
CLIV. Em virtude do exposto, sempre deverão os 2.º, 3.º e 4.º Réus permanecer absolvidos dos pedidos formulados pelo Autor.
CLV. Em suma, a apreciação da matéria de facto – nomeadamente através da reapreciação da prova gravada supra indicada, a par dos demais elementos probatórios – e de direito objecto da ampliação do objecto do recurso sempre redundará numa decisão judicial que confirme a decisão proferida na sentença recorrida.
Os Réus “A..., Lda.”, BB, e CC vieram apresentar contra-alegações relativamente ao recurso interposto pelos habilitados, com pedido de condenação destes e do Autor e respectivos mandatários como litigantes de má fé e com ampliação do objecto do recurso, terminando com as seguintes
CONCLUSÕES DA AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO:
I. Prevenindo a hipótese de reversão da decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto à apreciação nestes autos da excepção de prescrição do direito indemnizatório deduzido na reconvenção, os Recorridos pretendem ver reapreciada a decisão daquele Tribunal sobre a matéria de facto, designadamente com recurso à reapreciação da prova gravada, porquanto consideram não terem sido dados como provados factos que efectivamente resultaram demonstrados da prova produzida e que se afiguram com potencial interesse na hipótese de vir a ser proferida uma decisão que altere a sentença recorrida e cogite outras soluções de direito.
II. Em face do recurso apresentado pelos Recorrentes que colocam em crise a sentença proferida na parte em que, com fundamento na autoridade do caso julgado, julgou improcedente a excepção de prescrição que o Interveniente Principal havia invocado, para a eventualidade de vir a ser-lhes dada razão e sujeita tal questão apreciação e julgamento nos presentes autos, os Recorridos requerem a ampliação do objecto do recurso, de modo a que fique contemplada na sentença recorrida os factos que interessam para a decisão a proferir sobre essa matéria.
III. Assim, para além dos factos que os ora Recorridos já requereram que fossem aditados ao elenco dos factos provados no âmbito do recurso por aqueles interposto da sentença recorrida – nomeadamente, para o que ora importa, os indicados sob os pontos 73) a 76) do artigo 89.º supra –, deverão ainda ser aditados os seguintes: • 81) Em 22.11.2012, através da petição inicial que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, da qual o autor e o chamado se têm por citados em 27.11.2012, a sociedade ré manifestou a intenção de exercer contra eles o direito de indemnização referente aos valores por aqueles indevidamente retirados da sociedade.
IV. Com efeito, tal facto resulta documentalmente provado pelo Doc. 151 junto ao requerimento apresentado pelos ora Recorridos nos autos em 22.11.2012.
V. Por outro lado, deverá ainda ser dado como provado que: • 82) O Autor e o Interveniente Principal ocultaram os factos descritos em 73) a 76), os quais apenas foram do conhecimento dos réus em data não concretamente apurada, mas seguramente após 22.11.2012.
VI. Tal matéria resulta provada da conjugação da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento com a prova documental junta aos autos e, ainda, através de presunção judicial, com recurso às regras da experiência.
VII. Na verdade, ambas as testemunhas PP - [depoimento prestado na audiência de 07.04.2022, gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01], passagens gravadas entre os minutos [00:55:31] e [00:55:48], [01:12:37] e [01:13:00] – e QQ – [depoimento prestado na audiência de 26.04.2022, gravado entre os minutos 10:08:40 e 11:24:41], passagens gravadas entre nos minutos [00:53:40], entre os minutos [00:55:02] e [00:56:45] – confirmaram ao Tribunal que o Autor e o Interveniente Principal, as mais das vezes, não davam conhecimento à sociedade, nem ali deixavam evidências de onde resultasse a prática de tais factos, dos levantamentos indevidos de dinheiros societários que em conjunto protagonizavam, que algumas vezes a sociedade apenas veio a tomar conhecimento através de informação do banco.
VIII. Acresce que, encontra-se junta aos autos a ata n.º ..., de 17.09.2012, que antecedeu a instauração do processo n.º 1678/12.8T8MCN (cfr. Doc. 3 junto com a petição inicial), de onde resulta claro que, àquela data, a sociedade Recorrida não tinha conhecimento dos levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 – a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram, no recurso de apelação da sentença recorrida que interpuseram, que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida.
IX. Com efeito, ali se referem os levantamentos indevidos de dinheiro realizados pelo Autor e Interveniente Principal de que a sociedade tomou conhecimento desde a Assembleia Geral de 22.06.2006 até à data da ata n.º ... (17.09.2012).
X. Entre esses levantamentos descritos na ata n.º ... não constam as retiradas indevidas de dinheiro protagonizadas pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008.
XI. Decorre das regras da experiência que, tivesse a sociedade Recorrida conhecimento também daqueles comportamentos dolosos – levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida – e teria certamente a eles feito também menção na ata n.º ..., designadamente por constituírem fundamentos adicionais para a acção judicial que visava instaurar (e instaurou) contra aqueles.
XII. Subsequentemente, veio efectivamente a sociedade Recorrida a dar entrada de acção com vista, entre outros, à destituição de gerentes do Autor e do Interveniente Principal, em 22.11.2012, que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, não tendo a Recorrida nessa acção alegado os levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, o que demonstra que, à data da entrada daquela acção, tais levantamentos não eram ainda do conhecimento da sociedade Recorrida.
XIII. De facto, ali se alegaram todos os levantamentos indevidos de dinheiro ocorridos e conhecidos da sociedade Recorrida até à Assembleia Geral de 22.06.2006, bem como os entretanto ocorridos e conhecidos da sociedade Recorrida até à data da entrada da acção, isto é, os identificados na ata n.º ... (cfr. Docs. 1 e 151 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e Doc. 3 junto com a petição inicial).
XIV. Obviamente, tivesse a sociedade Recorrida conhecimento dos levantamentos indevidos de dinheiro protagonizados pelo Autor e Interveniente Principal em 28.11.2007, 04.03.2008 e 29.05.2008 a que se reportam os Docs. 142 a 148 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e a que se aludem nos pontos 73) a 76) que os ora Recorridos requereram que fossem aditados à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, e teria certamente alegado tais factos na petição inicial que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, na medida em que os mesmos constituíam fundamento para as pretensões que aí pretendiam fazer valer, designadamente para o pedido de destituição de gerentes do Autor e Interveniente Principal, tendo, por conseguinte, todo o interesse na sua invocação caso deles tivesse conhecimento.
XV. Assim, não restam dúvidas que dos factos acima mencionados, que são do conhecimento do Tribunal por via dos meios de prova documental (Docs. 1 e 151 juntos com o requerimento de 13.11.2020 e Doc. 3 junto com a petição inicial), é possível (e dever-se-á), através de um juízo de indução ou de inferência, deles extrair, à luz das regras da experiência, o facto supra indicado sob o ponto 82), ao abrigo do disposto no artigo 349.º, do CC.
XVI. Ademais, com vista à concretização do raciocínio que vem de ser exposto, deverão ser também levados à matéria de facto provada na sentença recorrida os seguintes factos: • 83) O teor da ata n.º ....º, da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 17.10.2012; • 84) O teor da ata n.º 1 e respectivo anexo, da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 22.06.2006; • 85) O teor dos articulados de petição inicial da sociedade Ré no âmbito do processo n.º 1678/12.8T8MCN.
XVII. Os indicados factos resultam, todos eles, documentalmente provados nos autos: o facto 83) através do Doc. 3 junto com a petição inicial; o facto 84) através do Doc. 1 junto com o requerimento dos réus de 13.11.2020; e o facto 85) através do Doc. 151 junto com o requerimento dos réus de 13.11.2020.
XVIII. Sem prejuízo de se entender, como acima se referiu e pelos motivos ali melhor expostos, que o carácter ilícito da conduta do Autor e Interveniente Principal no que diz respeito aos pagamentos e levantamentos de dinheiro da sociedade em cujo pagamento à 1.ª Ré foram condenados pagar pela sentença recorrida já resulta dos factos dados como provados na sentença recorrida, que os Recorrentes não impugnaram, acautelando a hipótese de reapreciação daquela ilicitude em virtude do recurso interpostos por estes, vêm os Recorridos requerer que sejam aditados à matéria de facto provada na sentença recorrida outros factos que resultam da prova produzida e reforçam o carácter ilícito da conduta do Autor e Interveniente Principal.
XIX. Com efeito, além dos pagamentos e levantamentos realizados pelo Autor e Interveniente Principal com dinheiro da sociedade e a afectação dos mesmos, que estão dados como provados designadamente sob os pontos 26) a 33), 40) a 42), 45) a 49) e 66) a 68) e ainda os pontos 73) a 76) cujo aditamento à matéria de facto os Recorridos requereram no recurso que eles próprios interpuseram da sentença recorrida, com interesse para a boa decisão da causa, nomeadamente para o juízo de aferição do carácter ilícito de tais actos, provou-se também que acções e interesses estavam em causa em cada um deles.
XX. O que, no caso das acções judiciais que o Autor e o Interveniente Principal custearam com dinheiro da sociedade, é possível aferir, entre outros, através do tipo de processo em causa e o seu desfecho.
XXI. Assim, deverá ser aditado ao elenco dos factos provados o seguinte: • 86) O Processo n.º 340/2002 foi instaurado pelo Autor e o Interveniente Principal com vista a ser declarado nulo e sem efeito o artigo 5.º do pacto na parte estabelece que a sócia CC é representada, nas suas funções de gerência, pelo seu marido RR (que entretanto faleceu), por virtude da entrada em vigor do Código das Sociedades Comerciais; a acção veio a ser julgada procedente nesta parte, sendo declarado inexistente, desde 1986-11- 01, o artigo 5.º do pacto social na referida parte; no entanto, os ali Réus foram absolvidos dos restantes pedidos.
XXII. A referida matéria encontra-se provada pelo Doc. 58 junto com o requerimento de 13.11.2020 e também pelo Doc. 1 junto com a petição inicial – cfr. Insc. 9, Av. 1, AP.... na certidão comercial – e encontra-se dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos).
XXIII. Deverá também ser julgado provado o seguinte facto: • 87) O processo 273/02 diz respeito a acção intentada pelo Autor e Interveniente Principal contra a sociedade para anulação das contas referentes ao exercício de 2001, a qual foi julgada improcedente.
XXIV. O que encontra suporte documental no Doc. 59 junto com o requerimento de 13.11.2020 e também na certidão comercial da sociedade junta como Doc. 1 à petição inicial (cfr. Dep 1476/2007- 10-22), além se encontrar também dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos).
XXV. Ainda, deverá também ser dado como provado que: • 88) O processo 637/03 diz respeito a acção intentada pelo Autor e Interveniente Principal contra a sociedade para anulação das contas referentes ao exercício de 2002, a qual foi julgada improcedente.
XXVI. Isto mesmo prova o Doc. 60 junto com o requerimento de 13.11.2020 e encontra-se também essa matéria dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos).
XXVII. Deverá ainda aditar-se aos factos provados na sentença recorrida o seguinte: • 89) O processo 509/04 diz respeito a acção intentada pelo Autor e Interveniente Principal contra a sociedade para anulação das contas referentes ao exercício de 2003.
XXVIII. A mencionada matéria está demonstrada pelo Doc. 57 junto com o requerimento de 13.11.2020.
XXIX. Também deverá ser dado como provado o seguinte facto: • 90) O processo 1057/04.0TBMCN diz respeito a acção intentada pelo Autor e Interveniente Principal enquanto representantes da sociedade para anular o acordo de cessão de quotas por aqueles celebrado com o 2.º e 3.º Réus no procedimento cautelar 1350/03.0TBMCN, a qual foi julgada improcedente, porquanto foi considerado que o acordo de cessão de quotas, tendo sido efectuado entre sócios, extravasa o âmbito da sociedade, pelo que foi assim a aqui autora julgada parte ilegítima.
XXX. A factualidade supra encontra-se provada pelos Doc. 9 e 10 juntos com o requerimento de 13.11.2020, além de essa matéria se encontrar dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos).
XXXI. Ao elenco dos factos provados na sentença recorrida deverá ainda aditar-se que: • 91) O processo 1135/03.3TBMCN diz respeito a acção intentada pelo aqui Autor AA contra a sociedade para anulação da deliberação da sua destituição da gerência deliberada em 20.08.2003, o qual terminou por transacção em que foi acordada a cessão de quotas dos sócios BB e CC ao Autor e Interveniente Principal.
XXXII. A referida matéria encontra-se dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) e 15) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos) e está documentalmente suportada no Doc. 6 junto com a petição inicial.
XXXIII. Mais requerem os Recorridos que seja aditado à matéria de facto provada na sentença recorrida o seguinte: • 92) O Processo n.º 1350/03.0TBMCN diz respeito a procedimento cautelar intentado pela 3.ª Ré CC contra a sociedade, que terminou por transacção em que foi acordada a cessão de quotas dos sócios BB e CC ao Autor e Interveniente Principal.
XXXIV. Pois também a referida matéria se encontra dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos), encontrando-se ainda junta aos autos a ata do respectivo processo na qual está vertida a transacção celebrada – cfr. Doc. 9 junto com o requerimento de 13.11.2020.
XXXV. Acresce que, deverá ser aditado aos factos provados na sentença recorrida o seguinte: • 93) O Processo n.º 1174/05.0TBMCN diz respeito a providência cautelar intentada pelo 2.º Réu contra o Autor e Interveniente Principal tendente à anulação da deliberação social tomada por estes últimos, no sentido de destituir da gerência os sócios BB e CC, 2.º e 3.º Réus, a qual foi julgada procedente, tendo o Autor e Interveniente Principal ali sido condenados como litigantes de má-fé.
XXXVI. A referida matéria encontra-se dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 10) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos).
XXXVII. Ainda no contexto da reapreciação da ilicitude da conduta do Autor e do Interveniente Principal em virtude do recurso interposto pelos Recorrentes, requerem os Recorridos que seja alterada a redacção do ponto 49) da sentença recorrida, de forma a ficar claro que quando se diz que o Interveniente Principal procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos quer-se dizer que esse levantamento não respeitou a deliberação de 10 de Março de 2006, tal como ficou explícito no ponto 48).
XXXVIII. Além de dever também quantificar-se o montante em questão - € 7.529,02 – como resulta do ponto 37) dos factos provados na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN.
XXXIX. Nestes termos, deverá o ponto 49) dos factos provados na sentença recorrida passar a ter a seguinte redacção: • 49) Em 19 de Maio de 2006, também o irmão EE procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos, € 7.529,02, não fosse a deliberação de 10 de Março de 2006, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.
XL. Ainda no âmbito da apreciação da conduta ilícita do Autor e do Interveniente Principal, deverá ser alterada a redacção do ponto 66), alínea a), b) e f), dos factos provados na sentença recorrida, de forma a ficar explícito a que título foi feita a transferência dos valores ali indicados para as contas do Autor e do Interveniente Principal, uma vez que isso resulta da prova produzida.
XLI. A alteração suscitada tem relevo, na medida em que, à data em que as transferências foram efectuadas, o Autor e o Interveniente Principal encontravam-se destituídos da gerência.
XLII. Nesta conformidade, os pontos 66), a), b) e f), da sentença recorrida deverão passar a ter a seguinte redacção: • 66) – a) Transferência bancária a favor de EE realizada em 28/06/2007, no valor de € 12.503,12 (doze mil quinhentos e três euros e doze cêntimos), a título de ordenados e subsídios de Novembro de 2006 até aquela data. • 66) – b) Transferência bancária a favor de AA, realizada em 28/06/2007, no valor de € 6.000,00 (seis mil euros), a título de ordenados de 2006 e 2007. • 66) – f) Transferência bancária a favor de EE, realizada em 28/11/2007, no valor de € 15.003,12 (quinze mil e três euros e doze cêntimos), a título de regularização de ordenados e despesas da empresa.
XLIII. No que diz respeito à alínea a), aquela factualidade resulta documentalmente demonstrada pelo Doc. 114 junto com o requerimento de 13.11.2020.
XLIV.Já o que se pode ler na redacção ora sugerida para a alínea b), ficou demonstrada pelo Doc. 117 junto com o requerimento de 13.11.2020.
XLV. E a matéria indicada na alínea f), está suportada no Doc. 129 junto com o requerimento de 13.11.2020.
XLVI. Não obstante a prova documental evidente a que se fez referência, e que não foi objecto de impugnação, certo é que também a testemunha QQ, colaborador da 1.ª Ré, confirmou a veracidade dos documentos – cf. [depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 26.04.2022 gravado entre os minutos 10:08:40 e 11:24:41], com as passagens gravadas entre os minutos [00:46:45] e [00:53:37].
XLVII. Ademais, pretendem ainda os Recorridos que seja alterada a redacção do ponto 66), alínea d), da matéria de facto provada porquanto se afigura relevante especificar os serviços que o pagamento realizado pelo Autor e Interveniente Principal com dinheiro da sociedade que ali se refere visou pagar, sendo certo que existem elementos nos autos que o permitem concluir.
XLVIII. Assim, o ponto 66), alínea d), da matéria de facto provada, deverá passar a ter a seguinte redacção: • 66) – d) Transferência bancária para pagamento de honorários ao Dr. VV, realizada em 03/10/2007, no valor de € 9.003,12 (nove mil e três euros e doze cêntimos), correspondendo € 5.910,89, acrescido de IVA à taxa de 21% a honorários relativos à acção n.º 699/06.4TTPNF que correu termos no Tribunal do Trabalho de Penafiel e em que aquele mandatário representava a sociedade autora e € 3.000,00, acrescido de IVA à taxa de 21% relativos a provisão de honorários relativa a estudo de informação e preparação de requerimento para requerer inquérito judicial à sociedade.
XLIX. Tal factualidade resulta dos Docs. 126 e 127 juntos com o requerimento de 13.11.2020, mas também se encontra dada como provada na sentença proferida no processo n.º 1678/12.8T8MCN, pelo que deverá, por força da autoridade do caso julgado, ser dada como provada também nos presentes autos (cfr. ponto 54) dos factos provados na sentença proferida no referido processo, cuja certidão se encontra junta aos autos).
L. Ainda, atendendo ao recurso dos Recorrentes, no qual pretendem colocar em causa a ilicitude da conduta do Autor e do Interveniente Principal no que diz respeito à utilização do património social para a instauração de diversas acções judiciais, afigura-se relevante para a boa decisão do pedido reconvencional deduzido contra o Autor e Interveniente Principal, aditar ao elenco dos factos provados na sentença recorrida a seguinte factualidade: • 94) Os Autor e Interveniente Principal utilizaram dinheiros da sociedade, que levantaram em comunhão de esforços, para custearem as acções judiciais que iam propondo, ora contra a sociedade ora contra os outros sócios, acções que intentavam para prosseguimento do seu próprio interesse, ainda que algumas em representação da sociedade enquanto gerentes, evitando dessa forma que os próprios custeassem as acções, designadamente os honorários dos advogados por si contratados, concretamente.
LI. Com efeito, à semelhança dos outros factos que a sentença recorrida transpôs da materialidade provada no processo n.º 1678/12.8T8MCN, também este ficou ali demonstrado - ponto 11) dos factos dados como provados naquela sentença cuja certidão judicial se encontra junta aos autos – e tem relevância para a boa decisão desta causa e, como tal, deverá também ser vertido na sentença recorrida.
LII. Como quer que seja, sempre seria tal factualidade uma consequência lógica dos demais factos dados como provados na sentença recorrida e aqueles que por esta via se pretendem ali ver aditados.
LIII. Invocam os Recorrentes que a partir de 22.06.2006 o Autor e o Interveniente Principal nada mais receberam da sociedade, o que é falso, não só porque aqueles, durante esse período, transferiram diversos valores para si próprios, que retiraram do património social, tal como ficou demonstrado, mas é também falso que a sociedade não tenha, desde aquela data, distribuído mais lucros.
LIV. Razão pela qual entendem os Recorridos que não podia o Tribunal a quo ter dado como provado o ponto 24) da sentença recorrida.
LV. Com efeito, era sobre o Autor e o Interveniente Principal que recaia o ónus de provar o vertido no ponto 24), o que não fizeram.
LVI. Nenhuma das testemunhas que prestou depoimento em audiência de julgamento mostrou ter conhecimento firme sobre a matéria, umas tendo referido que tinham ideia (mas não certeza) de não terem sido distribuídos lucros naquele período, outras tendo referido, sem conseguir precisar, que achavam que tinha havido distribuição de lucros entre o período em causa - cf., por exemplo, o depoimento da testemunha PP ([depoimento prestado na audiência de julgamento de dia 07.04.2022 gravado entre os minutos 15:06:41 e 16:43:01], com as passagens gravadas entre os minutos [00:09:25] e [00:09:41].
LVII. Mas, a verdade é que se encontram juntas aos autos as atas n.º 69 e 70, de 14.03.2008 e 13.03.2009, respectivamente, que atestam que nos anos de 2007 e 2008 houve, afinal, distribuição de lucros.
LVIII. Impondo-se, portanto, que o ponto 24) passe a constar dos factos não provados da sentença recorrida.
LIX. A apreciação da matéria de facto – nomeadamente através da reapreciação da prova gravada supra indicada, a par dos demais elementos probatórios – objecto da ampliação do objecto do recurso sempre redundaria numa decisão judicial idêntica, ou próxima, à decisão recorrida e longe dos efeitospretendidos pelos Recorrentes com o recurso interposto.
Quanto ao incidente de condenação em litigância de má fé, os Réus alegam resultar da Acta da primeira sessão da audiência de julgamento, que teve lugar no dia 29/03/2022, que os Chamados e aqui Recorrentes se encontravam presentes na referida audiência através de representação pelo mandatário do Autor, o Dr. II, em virtude de substabelecimento conferido pelo Dr. KK. Acrescentam que esta regular presença se confirma nas sessões posteriores.
Advogam que o suposto e alegado desconhecimento, pelos Habilitados, da realização daquela audiência de julgamento, e as nulidades que dele pretendem desdobrar, não poderão senão corresponder a um comportamento processual contraditório e manifestamente abusivo, um venire contra factum proprium processual assente numa conduta de má fé.
Afirmam que das duas uma – ambas revestidas de idêntica gravidade no que concerne aos deveres deontológicos que impendem sobre os advogados e aos deveres de cooperação e colaboração com o Tribunal –: ou o Dr. II não tinha, afinal, os poderes de representação que atestou ao Tribunal ter em plena audiência de julgamento ou o Dr. KK, não obstante estar investido com poderes de representação dos Chamados e os ter substabelecido no Dr. II, pretende agora nega-los e fazer-se valer de uma expediente dilatório, desleal e atentório da boa fé em proveito dos seus Constituintes.
Defendem estarmos perante um caso evidente de litigância de má fé processual e pedem que o mesmo seja exemplarmente sancionado com a condenação de todos os referidos intervenientes em litigância de má-fé e multa condigna.
Com data de 17/11/22, o Autor veio apresentar contra-alegações pugnando pela improcedência dos demais recursos apresentados nos autos.
Na mesma data, o Autor e o respectivo mandatário vieram responder ao incidente de litigância de má fé alegando, em síntese, que, na sequência do óbito do Interveniente EE, a sua filha NN, veio aos autos comunicar tal facto.
Afirma que, no dia anterior ao julgamento, o mandatário desta interveniente acidental, Dr. KK, lhe solicitou que o substituísse no julgamento, uma vez que não poderia estar presente.
Diz que, no dia 29/03/22, requereu a junção aos autos do respectivo substabelecimento com reserva, cuja cópia junta.
Assegura que nunca referiu alguma vez que representava os habilitados de EE, falecido, não só porque nem os conhece, mas também porque os poderes forenses substabelecidos pelo Dr. KK, como consta do substabelecimento junto a eles não se refere, nem os referem.
Alega que tudo o que consta nas atas de audiência de julgamento do dia 29 de Março, 7 de Abril e 26 de Abril de 2022, que se refira ao mandatário do A. como sendo advogado dos habilitados/chamados FF, viúva de EE e GG e HH e não exclusivamente da interveniente acidental NN, está errado e não corresponde à verdade.
Requer que tais Actas sejam corrigidas em conformidade.
Com data de 25/11/22, os Habilitados vieram responder aos pedidos de condenação em litigância de má fé contra si deduzido e à ampliação do recurso, deduzido pelos Réus.
Alegam, em síntese, que apenas outorgaram Procurações Forenses em 31/08/22, na sequência da notificação que receberam da sentença, com a qual ficaram muito surpreendidos e precisamente para possibilitar a interposição de recurso.
Reiteram não terem sido notificados de quaisquer actos processuais após a sentença de habilitação de herdeiros, nem o advogado signatário da presente resposta os poderia informar do que quer que fosse porque, em primeiro lugar, apenas representava no processo a Interveniente Chamada Acidental NN e não foi notificado da maior parte dos actos praticados no processo, começando logo pela audiência prévia.
Impugnam a totalidade dos fundamentos da ampliação do objecto de recurso peticionado pelos Réus.
Concluem pedindo que a ampliação do objecto do recurso seja julgada totalmente improcedente, bem como o incidente de condenação como litigantes de má fé contra si deduzido.
Os Réus vieram exercer o seu contraditório relativamente ao pedido de correcção das Actas da audiência de julgamento alegando que se mostra esgotado o prazo legal para o efeito.
Afirmam que o Dr. II se apresentou na audiência de julgamento invocando representar o(s) Chamado(s), tendo o tribunal assim entendido e sempre o referido.
Acrescentam que a prometida junção do substabelecimento aos autos via Citius nunca veio a ser concretizada.
Rematam pedindo o indeferimento do pedido de correcção das Actas da audiência de julgamento.
Foi proferido despacho a admitir os recursos como de apelação, com subida imediata e efeito meramente devolutivo.
Indeferiu-se o requerimento de correcção das Actas de audiência de julgamento, com fundamento em não se estar perante lapsos passíveis de rectificação.
Apreciou-se a nulidade invocada pelos Habilitados de anulação de todo o processado a partir da sua notificação da sentença que os julgou habilitados, julgando-a extemporânea.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Resulta do disposto no art.º 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil[1], aqui aplicável ex vi do art.º 663.º, n.º 2, e 639.º, n.º 1 a 3, do mesmo Código, que, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o Tribunal só pode conhecer das questões que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.
Como questão prévia, cumpre ter em conta que os Habilitados/Recorrentes sustentam no recurso por si apresentado que os Réus não deduziram reconvenção contra o Interveniente Chamado na acção que ele próprio propôs contra eles e que correu termos com o número 81/13.7TBMCN, peticionando o que o Autor peticiona na presente acção.
Defendem que, uma vez que os factos em que assenta a reconvenção deduzida pelos ora Réus na presente acção contra o Interveniente Chamado são há muito conhecidos por eles e são os mesmos que foram discutidos na acção com o número de processo 81/13.7TBMCN, o facto de não terem deduzido naquela acção reconvenção, podendo e devendo fazê-lo em cumprimento do ónus da concentração da defesa, a reconvenção apresentada no presente processo não escapa ao efeito preclusivo resultante da autoridade do caso julgado daquela acção, pelo que deverá a presente reconvenção ser julgada improcedente, por inadmissibilidade legal.
Ora, o objecto do recurso está balizado pelo objecto da acção, designadamente pela causa de pedir e pedidos formulados nos articulados.
Explica, a este respeito, António Abrantes Geraldes[2] que “Os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis.”
No mesmo sentido, o Supremo Tribunal de Justiça tem decidido que “Os recursos são meios de impugnação das decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo e não meios de renovação da causa através da apresentação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada) ou formulação de pedidos diferentes (não antes formulados): a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo tribunal ad quem.”[3]
Analisados os autos, verifica-se que esta questão da eventual preclusão do direito invocado na reconvenção é uma questão totalmente nova, que não foi suscitada pelo Interveniente/Chamado até agora, designadamente no seu articulado de Contestação (cf. fls. 259 e ss.).
Assim sendo, e sem necessidade de mais considerações, conclui-se que esta questão, por configurar uma questão nova, não pode ser conhecida por este Tribunal da Relação.
Feita esta delimitação, temos que as questões a dirimir, delimitadas pelas conclusões do recurso, são as seguintes:
I. Reapreciação do despacho proferido a 28/02/22 a julgar improcedente a reclamação apresentada pelos Réus quanto ao despacho que elencou os Temas da Prova (recurso dos Réus);
II. Nulidade de todo o processado a partir da notificação aos Habilitados da sentença que os julgou habilitados (recurso dos Habilitados);
III. Nulidade da sentença por omissão de apreciação de questão relevante (recurso do Autor);
IV. Nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto (recurso dos Réus);
V. Prescrição do direito da sociedade contra os gerentes Autor e Interveniente relativamente à obrigação de a indemnizar (recurso do Autor e dos Habilitados);
VI. Em caso de procedência do antecedente fundamento de recurso, conhecimento da ampliação do objecto de recurso apresentado pelos Réus neste particular, com reapreciação da matéria de facto com base nas provas produzidas (recurso dos Réus);
VII. Modificação da matéria de facto por reapreciação das provas produzidas (recurso do Autor e dos Réus);
VIII. Em caso de improcedência da invocada prescrição do direito da sociedade contra os gerentes ou em caso de procedência do antecedente fundamento de recurso, reapreciação da existência de conduta dolosa ou culposa do Autor e Interveniente (recurso dos Habilitados), reapreciação da condenação ilíquida do pedido reconvencional, da não atendibilidade dos danos não patrimoniais invocados quanto à sociedade Ré e da condenação em juros de mora (recurso principal dos Réus);
IX. Cancelamento do registo da deliberação social de 20/08/2003 que destituiu o Autor da gerência da 1.ª Ré (recurso do Autor);
X. Reapreciação da aplicação do instituto do abuso de Direito aos pedidos formulados pelo Autor (recurso do Autor);
XI. Em caso de procedência dos fundamentos de recurso apresentados pelo Autor e pelos Habilitados, conhecimento da ampliação do objecto de recurso apresentado pelos Réus neste particular, com reapreciação da matéria de facto com base nas provas produzidas (recurso dos Réus);
XII. Incidente de litigância de má fé deduzidos contra o Autor, Habilitados e respectivos mandatários judiciais.
*
III – REAPRECIAÇÃO DO DESPACHO QUE JULGOU IMPROCEDENTE RECLAMAÇÃO DOS RÉUS QUANTO AOS TEMAS DA PROVA
Em sede de reconvenção, os Réus alegam que o Autor e o seu irmão EE se apropriaram de dinheiros societários para custearam as acções judiciais que foram propondo contra a sociedade 1.ª Ré e os outros sócios, tendo ainda levado a cabo um conjunto de transferências bancárias de conta bancária da sociedade a seu favor.
Pedem que a reconvenção seja julgada procedente, por provada, e, em consequência, o Autor e o seu irmão EE condenados no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, no montante que se venha a apurar, acrescidos de juros vencidos e vincendos à taxa legal, sendo ainda solidariamente condenados a indemnizar a 1.ª Ré pelos prejuízos causados com a sua conduta, em montante nunca inferior a EUR 40.000,00.
Proferiu-se despacho saneador, definiu-se o objecto do litígio e fixaram-se os Temas da Prova, sendo que nenhum deles se reporta a esta factualidade.
Os Réus vieram, em 13/11/20, requerer a realização de Audiência Prévia com vista a reclamar dos Temas da Prova definidos. No mesmo requerimento, vieram igualmente juntar um conjunto de documentos, designadamente os Doc. n.º 63 a 92 e 112 a 148, declarando fazê-lo para prova dos factos alegados na Contestação.
Em sede de Audiência Prévia os Réus alegaram, entre o mais, que faltam alguns Temas da Prova relacionados com o pedido reconvencional, designadamente (entre outros) o prejuízo patrimonial que foi provocado pelos Reconvindos na sociedade Ré e os valores que os Reconvindos devem reembolsar à sociedade Ré quer a título de danos patrimoniais, quer de danos não patrimoniais que estão peticionados.
Por despacho de 28/02/22, decidiu-se, neste particular, pelo indeferimento do requerido, com o seguinte fundamento: “Não serão aditados, por não carecerem de prova nestes autos em face da figura da autoridade do caso julgado, a que já se aludiu em sede de despacho saneador. Com efeito, analisando a sentença proferida no J3 deste Tribunal temos por julgada a matéria de facto relacionada com as demais questões suscitadas, nomeadamente, estão já fixados os factos relacionados com a destituição, sendo que, no que se reporta aos danos sofridos, estes também estão definidos. Tal significa que apenas resta fixar a compensação adequada, o que ocorrerá em sede de sentença e quando se subsumir aquela factualidade ao direito aplicável.”
Os Réus vêm recorrer desta decisão alegando que a mesma padece de erro de julgamento, quer porque: (i) não obstante a maior parte dos prejuízos tenham sido objecto de discussão e julgamento no processo n.º 1678/12.8TBMCN, outros houve que apenas foram descobertos posteriormente e que, por esse motivo, não foram ali apreciados, objecto de prova e julgados; e (ii) a decisão proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN deixou intocada a discussão do relevo jurídico que tais factos apresentam.
Especificam tratar-se dos prejuízos decorrentes das retiradas indevidas de dinheiros da sociedade pelos Recorridos, documentalmente demonstrados por via dos documentos n.ºs 142 a 148, juntos aos autos através do requerimento apresentado a 13/11/2020, de ref.ª 6701192.
Entendem que, tendo o ressarcimento de tais prejuízos sido peticionado em sede da reconvenção deduzida – mediante o pedido formulado, no sentido de que fossem os Reconvindos condenados a restituir, no valor que se viesse a apurar, os montantes indevidamente retirados da sociedade Recorrente –, tal factualidade deve constar dos temas da prova.
Entendemos que não lhes assiste razão, pelas razões que passamos a expor.
O que a lei prescreve é que, quando a acção houver de prosseguir, “o juiz profere despacho a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova.” (cf. art.º 596.º do CP Civil).
Tal como explica Paulo Pimenta[4] “(…) é evidente que a enunciação dos temas da prova só deve contemplar a hipótese de a instrução recair sobre matéria de facto que ainda não possa ter-se como demonstrada na fase intermédia do processo.”
Ou seja, somente se justifica a elaboração de Temas da Prova relativamente a matéria de facto controvertida.
No caso dos autos, os factos que os Réus alegam em sede de reconvenção relativamente a apropriação de dinheiros societários são exactamente os mesmos que tinham sido alegados no processo n.º 1678/12.8TBMCN e que foram aí considerados provados.
No requerimento de 13/11/20, os Réus limitaram-se a juntar aos autos um conjunto de documentos, designadamente os Doc. n.º 63 a 92 e 112 a 148, referindo expressamente que fazem tal junção para prova dos factos alegados na Contestação.
Em sede de audiência prévia, os Réus apenas alegaram, entre o mais, que faltam alguns temas da prova relacionados com o pedido reconvencional, designadamente (entre outros) o prejuízo patrimonial que foi provocado pelos Reconvindos na sociedade Ré e os valores que os Reconvindos devem reembolsar à sociedade Ré quer a título de danos patrimoniais, quer de danos não patrimoniais que estão peticionados.
Assim sendo, na sequência de decisão já tomada em sede de despacho saneador, o tribunal de 1.ª Instância procedeu correctamente ao indeferir o pretendido aditamento de Temas da Prova por os mesmos não carecerem de prova nestes autos, em face da figura da autoridade do caso julgado.
Os Recorrentes/Réus vêm agora alegar que, não obstante a maior parte dos prejuízos tenham sido objecto de discussão e julgamento no processo n.º 1678/12.8TBMCN, outros houve que apenas foram descobertos posteriormente e que, por esse motivo, não foram ali apreciados, objecto de prova e julgados, designadamente os prejuízos decorrentes de retiradas indevidas de dinheiro da sociedade pelos Recorridos, documentalmente demonstrados por via dos documentos n.ºs 142 a 148, juntos aos autos através do requerimento apresentado a 13/11/2020, de ref.ª 6701192.
A relevância desta questão será apreciada mais à frente, em sede de reapreciação da decisão de facto.
A conclusão é, pois, a da improcedência deste fundamento de recurso.
*
IV – NULIDADE DE TODO O PROCESSADO A PARTIR DA NOTIFICAÇÃO AOS HABILITADOS DA SENTENÇA
Os Habilitados vieram suscitar a nulidade da sentença e de todo o processado a partir da sua notificação da sentença que os julgou habilitados.
Alegam para tanto que, em 04/03/16, o Interveniente Chamado EE respondeu à reconvenção deduzida pelos Réus por meio de um articulado que através do qual requereu que aquela reconvenção fosse julgada totalmente improcedente e não provada, indicando meios de prova a produzir em audiência de julgamento.
Dizem que, na sequência do óbito daquele, eles foram julgados habilitados, como únicos herdeiros do Interveniente falecido, sentença essa que lhes foi notificada através de três cartas registadas datadas de 10/12/2021.
Declaram que, em 19/01/22, sem que eles estivessem representados por advogado, a Meritíssima Juíza do tribunal a quo marcou a audiência prévia na presente acção para o dia 01/02/22, sem que estes tivessem sido notificados da mesma e não tendo comparecido.
Bem como que o mesmo se passou com os requerimentos apresentados pelo Autor e pelos Réus após a realização da audiência prévia e com todos os despachos que sobre aqueles requerimentos recaíram, pelo que os herdeiros habilitados do Interveniente Chamado EE, ora Recorrentes, viram totalmente obliterado pelo tribunal o seu direito de intervirem e de exercerem o contraditório em todos os actos do processo após a notificação que lhes foi feita da sentença de habilitação de herdeiros.
Mais alegam que também não estiveram representados na audiência de discussão e julgamento, que se realizou sem eles ao longo de três sessões.
Defendem que todos os actos praticados no processo após a sua habilitação como herdeiros do Interveniente Chamado falecido são nulos, nos termos do disposto no nº1 do artigo 195º do CP Civil, uma vez que grande parte desses actos não lhes foram notificados e esta omissão de uma formalidade que a lei prescreve é uma grave irregularidade, que lhes cerceou o direito de defesa, influindo, obviamente, no exame e na decisão da causa.
Analisados os autos, verifica-se que a generalidade dos factos processuais alegados são verdadeiros.
Apenas há que acrescentar/rectificar que os habilitados, no acto da citação, não foram notificados da obrigatoriedade de constituição de mandatário judicial.
Também que, com data de 23/03/22, os Habilitados foram notificados da data designada para o início da audiência de julgamento.
Bem como que os Habilitados foram notificados do despacho, datado de 01/06/22, através do qual o tribunal recorrido concedeu o contraditório às partes quanto à possibilidade de aplicação nos autos do instituto do abuso de direito.
Finalmente que a sentença final foi notificada aos Habilitados.
O tribunal recorrido apreciou esta nulidade, julgando-a extemporânea.
Entendemos ser efectivamente esta a solução jurídica correcta da questão.
Antes de mais, cumpre ter em conta que a citação constitui o acto pelo qual se dá conhecimento do réu de que foi proposta contra si uma acção e se chama ao processo para se defender (cf. art.º 219.º, n.º 1, do CP Civil).
Tem associados importantíssimos efeitos, designadamente a interrupção da prescrição, a cessação da situação de boa-fé, a constituição em mora e, claro, a aplicação de um conjunto de cominações, em especial a de se considerarem confessados os factos articulados pelo autor (cf. art.º 567.º, n.º 1, do CP Civil).
Estas disposições legais aplicam-se, com as necessárias adaptações, às situações de citação de Intervenientes admitidos a intervir nos autos.
A falta de citação, consagrada nos art.º 187.º e 188.º do CP Civil, constitui uma nulidade principal enquanto a nulidade da citação, prevista no art.º 191.º do CP Civil, equivale “apenas” à preterição de formalidades prescritas na lei, sendo uma nulidade secundária, dependendo de reclamação pelo próprio interessado.
A nulidade por falta de citação ocorre nas situações tipificadas nas alíneas do n.º 1 do art.º 188.º do CP Civil, por remissão do artigo antecedente.
A Alínea a) do n.º 1 deste art.º 188.º determina que há falta de citação “Quanto o acto tenha sido completamente omitido.”
Esta “falta de citação” traduz-se na inexistência pura e simples do acto de citação ou sempre que se verifiquem determinadas situações que devam ser legalmente equiparadas a essa falta de citação.
Tal como se refere no “Código de Processo Civil Anotado” de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe de Sousa[5]: “O conceito de falta de citação integra diversas situações, tendo uma amplitude que vai para além da omissão completa do acto.”.
No mesmo Código Anotado apresentam-se diversas situações exemplificativas de equiparação a falta de citação, designadamente sempre que a carta de citação seja remetida para pessoa diversa do réu ou sempre que a carta para citação seja entregue a pessoa diversa do réu (fora do circunstancialismo marcado no art.º 228.º, n.º 2, do CP Civil).
Na jurisprudência têm vindo igualmente a ser identificadas algumas situações como equiparadas a falta de citação.
Assim, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/11/97, tendo como Relator Costa Soares[6], decidiu-se que “A citação ordenada por carta registada com aviso de recepção, mas que não foi enviada para a sede da sociedade ré em contravenção do artigo 238-A do CPC67, embora assinada por funcionário da ré não é feita na conformidade do artigo 234 n 3 n 4 do mesmo Código, havendo, pois, em tal caso, falta absoluta de citação.”
No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/09/2004, tendo como Relator Azevedo Ramos[7], decidiu-se que “A validade da citação com hora certa pressupõe que o citando tenha residência no local onde aquela foi realizada e que a falta de conhecimento da citação não lhe seja imputável.”
Por seu turno, no Acórdão desta Relação de 13/01/20, tendo como Relator Mendes Coelho[8], decidiu-se que “Verificando-se que a carta registada com aviso de recepção para citação para citação do Réu foi enviada para local que não corresponde à sua residência, sem que ocorra qualquer comportamento ao mesmo imputável para impedir que chegue ao seu conhecimento tal acto de citação, é de concluir, face ao disposto nos arts. 187º a) e 188º nº 1 e) do CPC, pela nulidade da falta de citação em relação a tal Réu.”
Em todas estas situações, estamos perante a existência de diligências com vista à citação, mas praticadas de forma ilegal e redundando na impossibilidade da efectiva citação do citando.
A situação dos autos não tem estes contornos: a citação dos Habilitados foi efectuada de forma legal, apenas tendo ocorrido a omissão de uma formalidade acessória, a saber a informação da obrigatoriedade de constituição de mandatário judicial.
Assim sendo, conclui-se que estamos “tão-só” em face de uma nulidade da citação, nos termos prevista no art.º 191.º do CP Civil a qual, é uma nulidade secundária.
A omissão sucessiva de notificação aos Habilitados de um conjunto de actos processuais e convocatórias para actos processuais constituem, da mesma forma, nulidades secundárias, considerando que, pelo menos parte delas, influíram na exame e na decisão da causa (cf. art.º 195.º do CP Civil).
Decorre expressamente da estatuição do art.º 196.º do CP Civil que o tribunal conhece oficiosamente das nulidades mencionadas nos artigos 186.º e 187.º, na segunda parte do n.º 2 do artigo 191.º e nos artigos 193.º e 194.º todos do CP Civil.
Diversamente, de acordo com o disposto no art.º 199.º do CP Civil, as demais nulidades têm que ser invocadas no próprio processo e nos prazos legais fixados para o efeito, sob pena de preclusão.
Especifica este mesmo normativo que tais nulidade têm de ser arguidas pela parte, por si ou por mandatário, e, no caso da ausência da parte aquando da prática do acto gerador da nulidade, no prazo de 10 dias, contado quer aquando da sua intervenção em algum acto por si praticado no processo, quer aquando da sua notificação para qualquer termo do processo, desde que, nesta última hipótese, se deva presumir que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
No caso dos autos, os Habilitados foram, ao longo do processo, notificados de diversos actos processuais, notificados da data designada para a Audiência de Julgamento e, finalmente, da sentença proferida.
No entanto, não suscitaram nenhuma das apontadas irregularidades/nulidades no decurso do processo nem sequer no prazo de 10 dias a contar da notificação da sentença final, optando por apenas as invocar no presente recurso.
A consequência necessária é a de considerar precludido o direito de invocação das nulidades em causa, por falta de arguição atempada.
Noutra perspectiva, também nos estaria vedada a apreciação de tais questões, por se tratar de irregularidades não apreciadas nos autos.
Explica, a este respeito, António Abrantes Geraldes[9] que “Os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis.”
No mesmo sentido, o Supremo Tribunal de Justiça tem decidido que “Os recursos são meios de impugnação das decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo e não meios de renovação da causa através da apresentação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada) ou formulação de pedidos diferentes (não antes formulados): a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo tribunal ad quem.”[10].
Entendendo que foi cometida qualquer nulidade processual antes de ser proferida a sentença, os Habilitados deveriam tê-la suscitado perante o tribunal a fim de este decidir a reclamação apresentada e, num segundo momento, eventualmente recorrer da mesma, nos termos gerais. O que não podiam era, como fizeram, suprimir a obrigação de arguir a nulidade perante o tribunal onde a nulidade foi cometida e suscitar a sua apreciação e decisão apenas perante o presente tribunal de recurso.
Tratando-se estas de questões totalmente novas, que não foram suscitadas pelos Recorrentes/Habilitados até agora no processo, e não sendo de conhecimento oficioso, nunca poderiam ser conhecidas por este Tribunal da Relação.
A conclusão final é, portanto, a da improcedência do presente fundamento de recurso.
*
V – NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE APRECIAÇÃO DE QUESTÃO RELEVANTE
O Recorrente/Autor suscita a nulidade da sentença alegando que, em reconvenção, os Réus peticionam do Reconvindo quantia que referem dizer respeito ao período compreendido entre 2002 e 2007, contrapondo este a prescrição de tal direito.
Entende que a Mma. Juíza do tribunal recorrido não poderia entender que a autoridade de caso julgado decorrente do julgamento no Processo n.º 1678/12.8 TBMCN determina a improcedência, por não provada, desta excepção de prescrição do direito invocada.
Justifica que nestes autos o pedido é manifestamente diferente do pedido formulado naqueles.
Defende que, por esta via, a sentença é nula por não se ter apreciado autonomamente a excepção invocada.
Decorre do disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea d), do CP Civil que a sentença é nula – entre o mais – quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Tratam-se – como os demais - de vícios de natureza formal e não substancial.
Com efeito, decorre do disposto no art.º 608.º, n.º 2, do CP Civil que “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…).”
Remetendo para a interpretação que vem sendo feita reiteradamente pelo Supremo Tribunal de Justiça, devem considerar-se “questões” para este efeito “os temas alegados pelas partes que constituem, de forma directa e imediata, dados integradores dos elementos constitutivos ou impeditivos dos direitos cuja tutela é procurada pelas partes na instância, na lógica e na perspectiva dos pedidos.”[11]
Em decorrência, devem apreciar-se todas as questões submetidas ao conhecimento do Tribunal e, por contraponto, apenas se podem conhecer as questões suscitadas legal e processualmente, exceptuando obviamente aquelas que sejam de conhecimento oficioso.
No caso dos autos, o tribunal recorrido apreciou a “questão” da prescrição em causa, entendendo que a decisão proferida no Processo n.º 1678/12.8T8MCN fez caso julgado quanto à mesma.
A discordância do Recorrente prende-se diversamente com o conteúdo da decisão, questão que será apreciada oportunamente.
Julga-se, pois, não verificada a nulidade suscitada pelo Recorrente/Autor.
*
VI – NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO
Os Recorrentes/Réus defendem que a sentença recorrida padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto, nos termos do disposto no artigo 615.º n.º 1, alínea b), do CP Civil, em face da falta do exame crítico das provas previsto no artigo 607.º, n.º 4, do mesmo diploma legal.
Sustentam que quanto à prova documental junta aos autos por via do requerimento de 13.11.2020, de ref.ª 6701192 a sentença se limita a referir que “Atendeu-se, ainda, à documentação junta pelos réus aos autos em 13/11/2020, nomeadamente […]”, concluindo que “A demais documentações junta no requerimento entrado em juízo em 13/11/2020, não foi atendida, porquanto nada de novo trazia aos autos em face da autoridade do caso julgado aplicada aos factos a que se reportavam”.
Entendem que a sentença a quo padece de dois vícios estruturalmente insustentáveis, à luz do exame crítico da prova que lhe vem imposto pelo artigo 607.º, n.º 4, do CPC e da respectiva fundamentação de facto: (i) Não especifica quais dos concretos documentos juntos pelos Recorrentes por via do seu requerimento de 13/11/2020 atendeu (ou não) na formação da sua convicção e na subsequente decisão final, em face da utilização do advérbio de modo “nomeadamente”; (ii) Não concretiza, de forma cognoscível, o porquê de não atender à demais documentação junta por via do referido requerimento, especificando a sua (ir)relevância para a decisão da causa, ignorando os Recorrentes, em absoluto, quais dos documentos juntos foram (ou não) desconsiderados, em face da anterior utilização do advérbio “nomeadamente”.
Em nosso entendimento, não se verifica a apontada nulidade.
A doutrina e a jurisprudência têm decidido de forma reiterada e unânime que a falta de fundamentação só existe no caso de se verificar uma absoluta e total falta de fundamentação, quer ao nível do quadro factual apurado quer no que respeita ao respectivo enquadramento legal. Por contraponto, a sentença que contenha uma fundamentação deficiente ou incompleta poderá padecer de vários vícios, mas não será, por esta via, nula.
No caso em apreço, verifica-se que a fundamentação de facto da decisão recorrida refere ter atendido à documentação junta pelos Réus aos autos em 13/11/20, nomeadamente à cópia da Acta da assembleia geral de 22/06/06, aos Estatutos e alteração ao pacto social, às Actas n.º … e …, à cópia da sentença proferida no Processo n.º 1642/12.7TBMCN e à remessa de fundos n.º …, acrescentando que a demais documentação entrada em Juízo no dia 13/11/20 não foi atendida, por nada de novo trazer aos autos, em face da autoridade de do caso julgado aplicada aos factos a que se reportavam.
Temos, portanto, que a apreciação crítica da prova junta aos autos pelos Réus em 13/11/20 foi cabalmente realizada, não se compreendendo como os Recorrente sustentam não resultar da mesma quais os documentos considerados relevantes nem os motivos por que os demais não foram atendidos.
Improcede, portanto, este fundamento de recurso.
*
VII – PRESCRIÇÃO DO DIREITO DA SOCIEDADE CONTRA OS GERENTES AUTOR E INTERVENIENTE RELATIVAMENTE À OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
O Autor e os Habilitados vieram sustentar que, em face da reconvenção em que a Ré peticiona quantia que refere dizer respeito ao período compreendido entre 2002 e 2007, tal pedido se encontra prescrito, porquanto entre o último levantamento ocorrido em 2007 e a data da sua citação para a presente reconvenção passaram pelo menos 7 anos e meio.
Referem que no Processo nº 1678/12.8TBMCN a Recorrida peticiona exclusivamente a destituição dos gerentes AA e EE e que o Acórdão da Relação, aí proferido, decidiu pela improcedência, por não provada, da excepção de prescrição do direito invocada.
Defendem que nestes autos o pedido é manifestamente diferente do pedido formulado naqueles, sendo que o facto de a Relação ter entendido que não havia prescrição para efeitos de destituição de gerente, não permite alargar tal entendimento para um pedido que nessa acção não foi formulado e pelo contrário, quando tentado em ampliação, foi indeferido e transitou em julgado.
Cumpre apreciar e decidir.
O tribunal recorrido entendeu que a questão da excepção de prescrição foi já apreciada no âmbito do Processo n.º 1678/12.8T8MCN, tendo-se formado caso julgado quanto à mencionada matéria. Acrescenta que, ainda que a sua apreciação tenha tido em vista apurar da existência de fundamento para a destituição do ora Autor da gerência da Ré, sendo os factos os mesmos e o prazo prescricional o mesmo, tal questão já está decidida.
O indicado Processo n.º 1678/12.8T8MCN tratou-se de uma acção especial de destituição de titulares de órgãos sociais proposta pela sociedade aqui Ré “A..., Lda.” contra os aqui Autor e Interveniente AA e EE e pedindo a sua destituição do cargo de gerentes e a título cautelar a suspensão das funções de gerentes daqueles daquela sociedade.
Esta acção foi julgada procedente, tendo sido determinada a destituição dos aí Réus AA e EE dos cargos de gerentes na sociedade aí Autora.
No respectivo despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de prescrição aí deduzida, resultando de tal decisão que os factos que estiveram na base de tal decisão foram efectivamente os mesmos em apreciação na reconvenção destes autos (tal como se refere na decisão recorrida).
Independentemente disso, entendemos não se poder julgar aplicável nos presentes autos o caso julgado decorrente da decisão tomada naquele Processo n.º 1678/12.8T8MCN.
As decisões judiciais, em especial as sentenças, conduzem à pacificação das relações jurídicas controvertidas, contribuindo para a indispensável segurança jurídica e social.
Por inerência, razões de verdade, harmonia, certeza e segurança jurídica e sociais impõem que não se possa verificar uma contradição de decisões sobre a mesma questão fáctico-jurídica concreta.
A nossa lei consagrou a chamada teoria da substanciação, nos termos da qual a excepção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa, quanto aos sujeitos, à causa de pedir e aos pedidos (cf. arts. 580.º, n.º 1 e 581.º, n.º 1 do CP Civil). Determina que há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica (nº 2 do artigo 581º); que há identidade do pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico (nº 3 do artigo 581º) e que há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico (nº 4 do artigo 581º do CP Civil).
Descendo ao caso concreto, temos que no antecedente Processo nº 1678/12.8 TBMCN e na reconvenção deduzida nos presentes autos as partes são sensivelmente as mesmas (sendo que nos presentes autos se verifica que os Reconvintes são em número superior, o que não assume particular relevo).
No entanto, é evidente que estamos perante pedidos distintos numa e noutra acção: enquanto no indicado Processo n.º 1678/12.8T8MCN a sociedade Autora “A..., Lda.” pediu a destituição do cargo de gerentes por parte dos aí Réus AA e EE na reconvenção deduzido nos presentes autos a mesma sociedade e outros Réus/Reconvintes pedem que o Autor e o seu irmão EE sejam condenados no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade, no montante que se venha a apurar, acrescidos de juros vencidos e vincendos à taxa legal, sendo ainda solidariamente condenados a indemnizar a 1.ª Ré pelos prejuízos causados com a sua conduta, em montante nunca inferior a EUR 40.000,00.
Sendo manifestamente diversos os pedidos em confronto, não pode estabelecer-se entre as duas acções uma relação de caso julgado, tal como se decidiu na decisão recorrida.
A circunstância adiantada na decisão recorrida de os factos que estiveram na base da decisão naqueles autos terem sido os mesmos em apreciação na reconvenção destes autos (apelando para uma equivalência parcial da causa de pedir) não é, a nosso ver, suficiente.
A lei exige, como se viu, a identidade das partes, da causa de pedir e dos pedidos.
Tal como defendem os Recorrentes, são os direitos que prescrevem e não os factos naturalísticos.
Em concreto, não tendo sido formulado o pedido reconvencional destes autos naquela acção, a decisão de apreciação da excepção de prescrição não retirou qualquer consequência quanto à pretensão indemnizatória aqui deduzida. Assim sendo, tratando-se um pedido formulado pela primeira vez, impõe-se a sua apreciação in totum.
Apreciando, de novo, a excepção de prescrição é pacífico que a prescrição extintiva é o instituto de ordem pública por via do qual os direitos subjectivos se tornam inexigíveis, transformando-se em meras obrigações naturais, quando não são exercidos durante o lapso de tempo fixado na lei (cf. art.º 298.º, n.º 1, e 304.º do C Civil).
Em termos processuais, a prescrição traduz-se numa excepção peremptória de direito material, de tipo modificativo, por eliminação de um dos elementos do vínculo obrigacional: a exigibilidade da prestação.
No caso em apreciação, e tal como se refere na decisão recorrida, é aplicável a estatuição do art.º 174.º, n.º 1, alínea b), do Código das Sociedades Comerciais do seguinte teor: “Os direitos da sociedade contra os fundadores, os sócios, os gerentes, os administradores, os membros do conselho fiscal e do conselho geral e de supervisão, os revisores oficiais de contas e os liquidatários, bem como os direitos destes contra a sociedade, prescrevem no prazo de cinco anos, contados a partir da verificação dos seguintes factos: (…) b) O termo da conduta dolosa ou culposa do fundador, do gerente (…).”
Como refere Carolina Cunha[12] “Afastando-se do regime geral e dos regimes especiais disciplinados nos arts. 309.º C Civ., o art. 174º disciplina os prazos de prescrição dos direitos subjectivos que o CSC confere à sociedade, aos sócios e a terceiros”.
Estamos, pois, perante um regime especial de prescrição.
Analisada a Contestação/Reconvenção, verifica-se que o último facto temporalmente imputado aos Reconvindos data de 28/11/2007 (art.º 302.º). Será, pois, esta a data para o início da contagem do prazo legal de 05 anos e o termo do mesmo na data de 28/11/2012.
Os Réus somente manifestarem intenção de deduzir reconvenção nos autos na data da apresentação do respectivo articulado, em 11/05/2015. Ou seja, muito depois do decurso daquele prazo.
Além disso, não ocorreu qualquer causa de interrupção da prescrição até esta última indicada data de 11/05/2015.
Na decisão proferida no Processo n.º 1678/12.8T8MCN considerou-se constituir causa de interrupção do prazo de prescrição a citação para a acção de anulação da deliberação social (Processo 1114/06.9TBMCN), a qual apenas transitou em julgado em 17/09/2012.
Esta acção não releva para os presentes autos por que, mais uma vez, tinha por objecto “apenas” a destituição do cargo de gerente (sem qualquer pretensão atinente a um direito indemnizatório como aquele aqui reclamado).
Concluímos, portanto, com os Recorrentes que na data em que a Ré sociedade e os restantes Réus apresentaram em tribunal reconvenção contra os Autor e Interveniente Chamado, pedindo pela primeira vez que estes fossem condenados no reembolso dos valores que os primeiros consideram indevidamente retirados à sociedade, tendo os factos alegadamente praticados por estes que justificariam o pagamento daquela indemnização sido praticados até 28 de Novembro de 2007, o direito da sociedade a ser indemnizada pelos gerentes dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa destes já estava prescrito desde 28 de Novembro de 2012.
A nossa decisão vai, assim, no sentido da procedência deste fundamento de recurso.
Esta decisão prejudica a apreciação do fundamento de recurso dos Habilitados de inexistência de conduta dolosa ou culposa do Autor e Interveniente. Bem como o conhecimento dos fundamentos de recurso dos Réus de reapreciação da condenação ilíquida do pedido reconvencional, da não atendibilidade dos danos não patrimoniais invocados quanto à sociedade Ré e da condenação em juros de mora.
Contudo, esta procedência do fundamento baseado na verificação da excepção de prescrição está dependente da apreciação que a seguir se fará da ampliação do recurso apresentada pelos Réus neste particular, a qual poderá vir a alterar esta decisão.
Caso a ampliação do recurso apresentado pelos Réus seja procedente, apreciar-se-ão os fundamentos de recurso apresentados pelos Habilitados e pelos Réus acima indicados.
*
VIII – MODIFICABILIDADE DA MATÉRIA DE FACTO POR REAPRECIAÇÃO DAS PROVAS PRODUZIDAS
Decorre do disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CP Civil que "A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa."
O Recorrente/Autor pretende o aditamento dos seguintes factos ao elenco dos Factos Provados: A - Os recorridos BB (irmão do recorrente e pai do outro recorrido) e DD (Sobrinho do recorrente e filho do outro recorrido) agiram em comunhão de esforços, com o objectivo afastar da gerência da empresa o sócio AA de forma a poderem dirigir livremente os negócios da recorrida A..., Lda., garantindo para si e para os seus familiares, vantagens especiais e ilegítimas, Matéria alegada no ponto 87 da P.I. B - Obtidas à custa do prejuízo dos sócios AA e EE, entretanto falecido, que, deixando de ser gerentes, nunca mais receberam qualquer importância da sociedade, pois, durante os seis anos de ausência forçada da gerência da empresa, esta não distribuiu quaisquer lucros aos sócios.
Invoca como único fundamento para este aditamento de factos, em conjunto com os factos já dados como provados, o teor do Acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 22 – no âmbito do Processo n.º 34/13.5TELSB, onde são arguidos e já condenados em 1.ª Instância os aqui Recorridos BB, DD e “A..., Lda.”
A sua pretensão é improcedente por duas ordens de razões diferentes.
Desde logo, os Itens propostos para aditamento são, no essencial, conclusivos, designadamente quanto às expressões “agiram em comunhão de esforços, “de forma a poderem dirigir livremente os negócios da recorrida”, “garantindo para si e para os seus familiares vantagens especiais e ilegítimas “e “obtidas à custa do prejuízo dos sócios AA
Usando as palavras de Helena Cabrita[13], “Os factos conclusivos são aqueles que encerram um juízo ou conclusão, contendo desde logo em si mesmos a decisão da própria causa ou, visto de outro modo, se tais factos fossem considerados provados ou não provados, toda a acção seria resolvida (…).”
É pacífico que os factos conclusivos, irrelevantes ou de direito não devem ser considerados provados ou não provados, devendo, ao invés, ser desconsiderados na fundamentação de facto.
Aliás, Helena Cabrita[14] refere mesmo que “A matéria conclusiva, irrelevante e de direito não deverá merecer uma pronúncia por parte do tribunal em termos de ser considerada provada ou não provada, mas, ao invés, ser incluída em lista que o tribunal elaborará (após a indicação dos factos não provados e antes de passar à fase da análise crítica da prova) e na qual indicará (através dos artigos onde tal matéria se encontra alegada nos articulados das partes) que a concreta matéria da qual não tomou conhecimento por entender que a mesma era conclusiva, irrelevante ou de direito.”
Por outro lado, o Acórdão proferido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 22 – no âmbito do Processo n.º 34/13.5TELSB, não indicia sequer a factualidade sugerida. Mais do que isso: o Acórdão não tem a mais leve alusão à pessoa dos aqui Autor e Interveniente AA e EE.
Diversamente a factualidade aí dada como provada e alusiva ao elemento subjectivo refere que “Os arguidos BB e DD quiseram agir pela forma mencionada, em representação da sociedade arguida D..., e em comunhão de esforços e de intenções com o arguido OO, na sequência de plano elaborado por este e a que aqueles aderiram, tendo em vista a obtenção pela sociedade arguida D... do reembolso do IVA correspondente a valores documentados nas facturas emitidas pelo arguido OO em representação da sociedade arguida B... a favor daquela.”
Temos, portanto, que, ainda que entendêssemos os Itens propostos para aditamento como contendo factos naturalísticos suficientes, o Acórdão invocado como fundamento probatório dos mesmos nunca poderia suportar a prova dos mesmos.
Improcede, pois, este fundamento de recurso.
*
Os Recorrentes/Réus vieram, em recurso principal, sustentar que o tribunal recorrido se esqueceu de dar como provados factos abrangidos pela autoridade do caso julgado do processo n.º 1678/12.8TBMCN e que, como tal, à semelhança de muitos outros que a sentença recorrida dali transpôs, também aqui deveriam ter sido julgados provados, designadamente os seguintes: 77) O Autor e o Interveniente EE procederam a levantamentos de dinheiro do caixa da Autora para pagar as suas deslocações aos mais diferentes advogados. Designadamente, o Autor AA, em conluio com o Interveniente EE, retirou do caixa, de uma só vez, a quantia de € 486,70 para pagamento das suas deslocações a advogados.
Justificam que tal facto foi dado como provado no Item 19) dos Factos Provados daqueles autos. 78) De tal sanção resultaram prejuízos para o funcionamento da empresa, com perdas ao nível da produção, atrasos e incumprimento de fornecimento e também prejuízos para o bom nome da empresa, junto de clientes.
Justificam que este facto foi dado como provado no Item 41) da sentença proferida no processo n.º 1678/12.8TBMCN e assume particular relevância em face do pedido indemnizatório deduzido pela Recorrente Sociedade contra o Autor e Interveniente EE a título de danos morais. 79)Desde Setembro de 2000, que foram instauradas no Tribunal Judicial da Comarca de Marco de Canavezes, designadamente, as acções constantes e averbadas na certidão de registo comercial: - Processo n.º 340/2002 do 1.º Juízo, tendente a ser declarado nulo e sem efeito o artigo 5.º do pacto na parte estabelece que a sócia CC é representada, nas suas funções de gerência, pelo seu marido RR (que entretanto faleceu), por virtude da entrada em vigor do Código das Sociedades Comerciais; a acção veio a ser julgada procedente nesta parte, sendo declarado inexistente, desde 1986-11- 01, o artigo 5.º do pacto social na referida parte; no entanto, os ali Réus foram absolvidos dos restantes pedidos (Insc. 9, Av. 1, AP....); - Processo n.º 273/2002 do 2.º Juízo, tendente à anulação da deliberação que aprovou as contas de 2001; a acção foi julgada improcedente – ...; - Processo n.º 637/03.6TBMCN do 2.º Juízo, tendente à anulação da deliberação que aprovou as contas de 2002, intentada pelos aqui réus e que fora julgada improcedente; - Processo n.º 1135/03.3TBMCN do 1.º Juízo e o Processo n.º 1350/03.0TBMCN do 2.º Juízo, ambos providências cautelares, intentados pelos aqui réus, terminaram por transacção em que foi acordada a cessão de quotas dos sócios BB e CC aos aqui Réus; - Posteriormente, os Réus vieram a intentar, enquanto representantes da sociedade, o Processo n.º 1057/04.0TBMCN do 1.º Juízo, para anular tal acordo; acção julgada improcedente, porquanto foi considerado que o acordo de cessão de quotas, tendo sido efectuado entre sócios, extravasa o âmbito da sociedade, pelo que foi assim a aqui autora julgada parte ilegítima. Os réus decidiram intentar esta acção para anulação do acordo de cessão de quotas, dado terem tomado conhecimento do registo da marca ...” (marca utilizada pela sociedade autora) em nome de DD. - Processo n.º 1174/05.0TBMCN do 1.º Juízo, providência cautelar intentada pelo sócio BB, contra os sócios EE e AA, tendente à anulação da deliberação social tomada por estes últimos, no sentido de destituir da gerência os sócios BB e CC; a providência cautelar foi julgada procedente, tendo os aqui requeridos ali sido condenados como litigantes de má-fé; -Processo n.º 409/15.5T8AMT, intentado (já no Juízo de Comércio de Amarante) pelo aqui réu AA contra a sociedade autora e demais sócios (com excepção de EE), ainda pendente; - Processo n.º 81/13.7TBMCN, intentado pelo aqui réu EE contra a sociedade autora e demais sócios (com excepção de AA), ainda pendente. 80) As contas da autora aprovadas em deliberação social foram postas em causa em consequência das sucessivas acções interpostas pelos réus de anulação de deliberação social de aprovação de contas.
Justificam o aditamento destes factos por os mesmos terem sido discutidos e objecto de decisão no âmbito do processo n.º 1678/12.8TBMCN.
Os Réus pedem também a alteração da redacção do Item 49) dos Factos Provados[15], nos seguintes termos: “Em 19 de Maio de 2006, também o irmão EE procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos, no montante de € 7.529,02, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.”
Justificam tal alteração com a redacção do Item 37) dos Factos Provados naqueles autos, onde se quantificam os valores levantados pelo Autor e pelo Interveniente.
Assiste razão aos Réus ao defenderem que, tendo o tribunal recorrido incluído nos factos provados um conjunto de factos extraídos do Processo n.º 1678/12.8TBMCN com fundamento na autoridade do caso julgado, também deveria ter incluído igualmente os acima transcritos, por, tal como aqueles, terem sido alegados pelos Réus na sua Contestação e serem relevantes para a apreciação e decisão da presente causa.
No entanto, entendemos não dever aditar todos os factos propostos ao elenco dos Factos Provados, por parte deles serem ostensivamente factos conclusivos e/ou irrelevantes.
Tal como ficou já acima explicado, os factos conclusivos são aqueles que se traduzem, não em factos naturalísticos, mas num juízo ou conclusão, contendo em si mesmos uma ponderação conclusiva sobre outros factos.
Os factos irrelevantes são, obviamente, aqueles que não assumem interesse para a apreciação e decisão da causa.
Assim, incluem-se no elenco dos Factos Provados os seguintes factos adicionais: 73) O Autor e o Interveniente EE procederam a levantamentos de dinheiro do caixa da sociedade Ré para pagar as suas deslocações aos mais diferentes advogados, designadamente, o Autor AA, em conluio com o Interveniente EE, retirou do caixa, de uma só vez, a quantia de € 486,70 para pagamento das suas deslocações a advogados. 54-A)[16] De tal sanção resultaram prejuízos para o funcionamento da empresa, com perdas ao nível da produção, atrasos e incumprimento de fornecimento, de valor concreto não apurado, e também prejuízos para o bom nome da empresa, junto de clientes.
Por ficar mais completo, em termos de liquidez contabilística, altera-se a redacção do Item 49) dos Factos Provados nos precisos termos propostos: “Em 19 de Maio de 2006, também o irmão EE procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos, no montante de € 7.529,02, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.”
Por contraponto, indefere-se o pretendido aditamento dos factos sugeridos sob o Item 79) por a referência às acções judiciais pendentes em Tribunal entre as aqui partes, para além das já referenciadas nos Factos Provados, ser absolutamente supérfluo para a apreciação e decisão da causa.
Mais se indefere o aditamento dos factos sugeridos sob o Item 80) por, limitando-se a referir que as conta aprovadas em deliberação social foram “postas em causa”, ser factualidade manifestamente conclusiva.
*
Pedem igualmente os Réus/Recorrentes, ainda em sede de recurso principal, que sejam adicionados ao elenco dos Factos Provados, em face da prova produzida, os prejuízos provocados pelas condutas ilícitas dos Recorridos que não foram objecto de discussão e julgamento no âmbito da acção n.º 1678/12.8TBMCN.
Pedem o aditamento dos seguintes factos concretos: 73) A 28 de Novembro de 2007, foi ordenada à agência do Banco 1..., S.A. sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência bancária no valor de € 12.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º ... da titularidade da Ré Sociedade, e com destino à conta bancária ..., a favor do Autor AA, com o descritivo “Regulariz ordenados”, realizada no próprio dia. 74) A 04 de Março de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia. 75) A 29 de Maio de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência de um balcão da Banco 2..., S.A., uma transferência interbancária no valor de € 6.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino à conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados e outros”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia. 76) A 28 de Fevereiro de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Interveniente Principal EE, com o descritivo “Regularização de Ordenados e Despesas da Empresa”, tendo tal transferência sido realizada a 04 de Março de 2008.
Invocam como elementos de prova tendentes a comprovar estes factos o teor dos documentos n.º 142, 143, 144, 145, 146, 147 e 148 juntos aos autos em 13/11/20, corroborado pelos depoimentos das testemunhas PP e QQ e pelas declarações e depoimentos de parte de BB e DD.
Já ficou apreciado acima, em sede de reapreciação do despacho que julgou improcedente reclamação dos Réus quanto aos Temas da Prova, que os factos que os Réus alegam em sede de reconvenção relativamente a apropriação de dinheiros societários são exactamente os mesmos que tinham sido alegados no processo n.º 1678/12.8TBMCN e que foram aí considerados provados.
No requerimento de 13/11/20, os Réus juntaram aos autos um conjunto de documentos, designadamente os Doc. n.º 63 a 92 e 112 a 148, referindo expressa e unicamente que fazem tal junção para prova dos factos alegados na Contestação.
Neste contexto, e tal como admitem os próprios Réus no seu articulado de recurso, estes factos agora pretendidos ver aditados não foram objecto de alegação específica da sua parte.
Paralelamente, em sede de ampliação do recurso, para a eventualidade do recurso atinente à prescrição do pedido reconvencional ser julgado procedente, os Réus/Recorrentes vieram requerer o aditamento de um conjunto de factos ao elenco dos Factos Provados (para além daqueles já acima analisados), designadamente os seguintes[17]: 81) Em 22.11.2012, através da petição inicial que deu origem ao processo n.º 1678/12.8T8MCN, da qual o autor e o chamado se têm por citados em 27.11.2012, a sociedade ré manifestou a intenção de exercer contra eles o direito de indemnização referente aos valores por aqueles indevidamente retirados da sociedade.
Justificam que tal factualidade resulta documentalmente provada pelo Doc. 151 junto ao requerimento por si apresentado nos autos em 22/11/2012. 82) O Autor e o Interveniente Principal ocultaram os factos descritos em 73) a 76), os quais apenas foram do conhecimento dos réus em data não concretamente apurada, mas seguramente após 22/11/2012.
Sustentam que esta matéria resulta provada da conjugação da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento (designadamente dos depoimentos das testemunhas PP e QQ) com a prova documental junta aos autos (Acta n.º ..., de 17/09/2012 e articulados do Processo n.º 1678/12.8T8MCN) e, ainda, através de presunção judicial, com recurso às regras da experiência. 83) O teor da Acta n.º ..., da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 17/10/2012.
Invocam para tanto o teor do Doc. n.º 3 junto com a Petição Inicial. 84) O teor da Acta n.º ... e respectivo anexo, da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 22/06/2006.
Invocam neste sentido o Doc. n.º 1 junto com o requerimento por si apresentado em 13/11/2020. 85) O teor dos articulados de petição inicial da sociedade Ré no âmbito do Processo n.º 1678/12.8T8MNC.
Invocam para tanto o teor do Doc. n.º 151 junto com o seu requerimento de 13/11/2020.
Tal como os factos anteriores, também estes não foram objecto de alegação específica por parte dos Recorrentes/Réus.
Releva, agora, apreciar da atendibilidade destes factos e, num segundo momento, da pertinência dos mesmos.
O sistema processual civil assenta na livre disponibilidade das partes e na auto-responsabilização destas: o tribunal apenas pode conhecer o que lhe é trazido em termos de factos e de pedido, não podendo ultrapassar estes limites.
A versão actual do CP Civil continua a consagrar o princípio do dispositivo, de onde decorre que às partes cabe alegar os factos essenciais que constituam a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas, tal como decorre do disposto no art.º 5.º, n.º 1, do CP Civil.
Exceptuados estes, o juiz da causa, oficiosamente ou a requerimento das partes, pode considerar os factos complementares (os que não desempenhando a função de identificar ou individualizar o direito ou excepção em causa, concretizam os factos essenciais, designadamente enquanto constitutivos, modificativos ou impeditivos do direito invocado) e os factos concretizadores (os que têm por função explicitar mais pormenorizadamente os factos essenciais e/ou complementares) resultantes da instrução da causa, nos termos previstos no art.º 5º, nº 2, alínea b), do CP Civil.
O mesmo art.º 5.º, alínea a), do CP Civil refere ainda que podem igualmente ser considerados pelo juiz os factos instrumentais que resultem da instrução da causa. Ao contrário dos acima analisados, estes não constituem factos naturalísticos, mas são “apenas” os que justificam a prova dos factos essenciais, complementares ou concretizadores. Isto é, os factos instrumentais situam-se ainda no âmbito da prova.
Tal como explica Paulo Pimenta[18] “Nessa conformidade, o campo privilegiado dos factos instrumentais é o da motivação da convicção do julgador, sendo este o sentido do segmento “indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais” constante do n.º 4 do art.º 607.º”
No caso dos autos, os Réus formularam em sede de reconvenção um pedido genérico, tendo ficado decidido, na sentença recorrida, tratar-se de um pedido processualmente admissível.
Em face desta forma específica de pedido, os Réus poderiam trazer novos factos ao longo do processado e, se assim entendessem, liquidar a indemnização antes de começar a discussão da causa – o que optaram por não fazer.
Já ficou repetidamente dito acima que os factos apresentados para aditamento não foram objecto de alegação específica por parte dos Recorrentes/Réus.
No entanto, poderão, ainda assim, ser, em abstracto, objecto de aditamento por todos eles serem estruturalmente factos complementares ou instrumentais, à luz das definições acima apresentadas.
O tribunal recorrido poderia, em sede de sentença final, ter optado por atender a tais factos, por aplicação do citado art.º 5.º do CP Civil, na parte em que admite a possibilidade de serem ainda considerados pelo juiz os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar (cf. art.º 5.º, n.º 2, alínea b), do CP Civil).
Tal como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/04/2023, tendo como Relatora Graça Amaral[19]: “O reforço dos poderes de gestão processual do juiz introduzidos com a reforma do processo civil não se confinam à gestão formal, abarcando, igualmente, uma gestão material do processo no campo da decisão de facto. Nessa medida, a lei processual (art. 5.º do CPC) veio permitir que, oficiosamente, o juiz possa tomar em consideração factualidade não alegada pelas partes nos respectivos articulados, com excepção da reportada aos factos essenciais que constituam a causa de pedir em que se sustenta o pedido do autor, ou em que se fundamentem as excepções invocadas pelo réu (n.º l do art. 5.º).”
Não tendo o tribunal recorrido tido tal iniciativa, os Réus poderiam, tendo nisso interesse, requerer tal aditamento e o cumprimento do contraditório quanto aos factos concretos pretendidos aditar, mas não o fizeram.
Em sede do presente recurso, podemos nós proceder da mesma forma.
Contudo, a atendibilidade deste conjunto de factos não alegados nos autos obriga, nos termos prescritos no citado art.º 5.º, n.º 2, alínea b), do CP Civil, ao cumprimento de prévio contraditório.
Em concreto, a intenção de aditamento de novos factos implica que seja cumprido o contraditório, alertando as partes para a intenção de ampliar a matéria de facto, concedendo-lhes a oportunidade de requererem a produção de novos meios de prova sobre os mesmos.
Isso mesmo vem sendo repetidamente afirmado pelo Supremo Tribunal de Justiça. Veja-se, a título meramente exemplificativo, o Acórdão deste Tribunal Superior de 06/09/2022, tendo como Relatora Graça Amaral: “No âmbito da própria actividade instrutória que a lei lhe atribui, o tribunal da Relação não se encontra cerceado nos poderes de cognição oficiosa para efeitos do artigo 5.º, n.º 2, do CPC. Contudo, atenta a interpretação a dar ao preceito no que toca à exigência acrescida de prévia notificação da pretensão de aditamento dos factos, não se mostra viável que, sem a anuência das partes, a Relação, em sede de conhecimento do recurso de matéria de facto, possa valorar a prova produzida quanto aos novos factos, ampliando a matéria de facto, sem previamente permitir que as partes possam ser alertadas para o efeito e, nessa medida, facultar a possibilidade de as mesmas produzirem a prova que entenderem por conveniente.”
Entendemos que, estando perante um conjunto de factos não alegados e em relação aos quais os Réus não manifestaram até ao final da audiência de julgamento intenção de os ver aditados à matéria de facto dos autos, os mesmos apenas deverão ser aditados por esta Relação se tiverem resultado da instrução da causa com uma consistência relevante, atendendo à obrigatoriedade de, procedendo desta forma, se ter de dar o contraditório à contra-parte, eventualmente com produção de novas provas.
Analisemos então os factos concretos propostos para aditamento pelos Réus.
Quanto ao recurso principal, os factos propostos aditar sob os Itens 73) a 76) aludem a transferências bancárias ordenadas pelo Autor e Interveniente Principal da conta bancária da sociedade Ré para uma conta bancária titulada pelo Autor, todas com o descritivo “Regularização de Ordenados”.
Estes factos assentam no teor dos documentos n.º 142, 143, 144, 145, 146, 147 e 148 juntos aos autos em 13/11/20.
Em resposta a este requerimento, o Autor veio aceitar expressamente os mesmos, ao referir impugnar todos os documentos, com excepção dos por si subscritos.
O Interveniente/Habilitados não veio/vieram pronunciar-se quanto ao teor dos mesmos e os Habilitados nem sequer se vieram pronunciar quanto ao aditamento destes factos em sede de contra-alegações.
Assim, por aplicação do disposto no art.º 574.º, n.º 2 e 3, do CP Civil e uma vez que estamos perante factos pessoais do Autor e Interveniente, torna-se desnecessário aferir se os mesmos resultaram da instrução da causa, por se deverem ter por confessados por estes, em consequência da não impugnação motivada do teor dos documentos respectivos.
Defere-se, consequentemente, o seu aditamento ao elenco dos Factos Provados, com o seguinte teor: 74) A 28 de Novembro de 2007, foi ordenada à agência do Banco 1..., S.A. sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência bancária no valor de € 12.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º ... da titularidade da Ré Sociedade, e com destino à conta bancária ..., a favor do Autor AA, com o descritivo “Regulariz ordenados”, realizada no próprio dia. 75) A 04 de Março de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia. 76) A 29 de Maio de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência de um balcão da Banco 2..., S.A., uma transferência interbancária no valor de € 6.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino à conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados e outros”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia. 77) A 28 de Fevereiro de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Interveniente Principal EE, com o descritivo “Regularização de Ordenados e Despesas da Empresa”, tendo tal transferência sido realizada a 04 de Março de 2008.
Passando para a ampliação do recurso, e quanto ao pretendido aditamento proposto sob o Item 81), da certidão judicial que constitui o Doc. n.º 151 junto ao requerimento apresentado nos autos em 13/11/2020 resulta que no Processo n.º 1678/12.8T8MCN a sociedade Autora “A..., Lda.” pediu a destituição do cargo de gerentes por parte dos aí Réus AA e EE.
Na respectiva Petição Inicial, entrada em Juízo em 22/11/2012, a aí Autora invoca, como fundamento para os pedidos principais, apropriação indevida de dinheiros da sociedade, levantamentos indevidos de dinheiros societários para pagamento de supostos créditos, instauração de procedimentos disciplinares e aplicação de sanções disciplinares a trabalhadores sem qualquer fundamento e geradores de prejuízos para a sociedade.
A final pede, entre o mais, a condenação de AA e EE no reembolso dos valores indevidamente retirados à sociedade e a indemnizarem a sociedade pelos prejuízos causados com a sua conduta, em montante nunca inferior a € 40.000,00.
Resulta da mesma Certidão Judicial que estes pedidos inicialmente formulados foram eliminados na Petição Inicial reformulada, na sequência de despacho, datado de 11/06/2013, de convite da Autora a vir indicar quais os pedidos que pretende ver reapreciados com fundamento em apreciação de excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de pedidos.
Da análise dos autos resulta complementarmente que a citação dos aí Réus ocorreu, respectivamente, em 25/10/2016 (o AA) e em 27/10/2016 (o EE), depois da apresentação da petição aperfeiçoada e na sequência da decisão do procedimento cautelar de suspensão das funções de gerente (cf. decisão cautelar constante de fls. 322 e ss. dos autos).
Resulta ainda do teor desta decisão cautelar de fls. 322 e ss. dos autos que a citação dos Réus para contestar foi feita por referência à petição inicial aperfeiçoada.
Este conjunto de factos processuais obriga-nos a concluir pelo não aditamento dos factos sugeridos: a citação dos Réus no âmbito desta acção não ocorreu por referência aos pedidos formulados inicialmente, mas somente por referência aos pedidos apresentados na Petição Inicial reformulada, de onde já não constavam os acima referidos pedidos indemnizatórios.
Em termos jurídicos, esta situação fáctica é completamente inócua, designadamente para efeitos de interrupção da prescrição, nos termos consagrados no art.º 323.º, n.º 1, do Código Civil.
Por outro lado, não se justifica a aplicação da presunção de 05 dias sugerida pelos Recorrentes (cf. art.º 323.º, n.º 2, do Código Civil), na medida em que a citação dos aí Réus apenas foi ordenada, como se referiu já, após a decisão cautelar dos autos.
Indefere-se, pois, o aditamento deste facto novo.
Os Recorrentes pedem igualmente o aditamento de um outro facto: 82)O Autor e o Interveniente Principal ocultaram os factos descritos em 73) a 76), os quais apenas foram do conhecimento dos réus em data não concretamente apurada, mas seguramente após 22/11/2012.
Quanto a esta factualidade, é para nós evidente que a mesma não resultou da instrução da causa com uma consistência relevante.
Como se refere acima, os factos propostos aditar sob os Itens 73) a 76) aludem a transferências bancárias ordenadas pelo Autor e Interveniente Principal da conta bancária da sociedade Ré para uma conta bancária titulada pelo Autor, todas com o descritivo “Regularização de Ordenados”.
Do teor da Acta n.º ..., de 17/09/2012 e do teor dos articulados do Processo n.º 1678/12.8TBMCN não resulta sequer indiciado que o Autor e o Interveniente tivessem ocultado os factos em causa até 2012.
Além disso, e como argumento central, a testemunha QQ referiu a este respeito aquilo que as regras da experiência já nos indiciavam fortemente: as transferências bancárias em causa eram do conhecimento da sociedade Ré na medida em que recebiam periodicamente informações bancárias dos extractos referentes à sua conta bancária.
Assim, sem necessidade de mais considerações, indefere-se o aditamento desta nova factualidade ao elenco dos Factos Provados, por a mesma não ter resultado da instrução da causa de forma consistente e segura.
Finalmente os Recorrentes pedem ainda o aditamento dos seguintes factos: 83) O teor da Acta n.º ..., da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 17/10/2012; 84) O teor da Acta n.º ... e respectivo anexo, da Assembleia Geral da sociedade Ré, de 22/06/2006, e 85) O teor dos articulados de petição inicial da sociedade Ré no âmbito do Processo n.º 1678/12.8T8MNC.
Invocam para tanto o teor dos documentos respectivos juntos aos autos.
Todos estes factos são estruturalmente factos instrumentais de acordo com a definição acima apresentada. Consequentemente, apenas poderiam ser atendidos em sede de fundamentação de facto, não podendo legalmente ser aditados ao elenco dos Factos Provados.
A conclusão final é, portanto, a da parcial procedência deste fundamento de recurso.
*
IX – REAPRECIAÇÃO DA PRESCRIÇÃO DO DIREITO DA SOCIEDADE CONTRA OS GERENTES AUTOR E INTERVENIENTE
Em face das alterações ordenadas aos Factos Provados, impõe-se reapreciar este fundamento de recurso.
Dando aqui por reproduzidas todas as considerações acima feitas, verifica-se que o último facto temporalmente imputado aos Reconvindos data agora de 29/05/2008 (facto aditado acima). Passará, pois, a ser esta a data para o início da contagem do prazo legal de 05 anos e o termo do mesmo transita para a data de 29/05/2013.
Os Réus somente manifestarem intenção de deduzir reconvenção nos autos na data da apresentação do respectivo articulado, em 11/05/2015. Ou seja, muito depois do decurso daquele prazo.
Além disso, não ocorreu qualquer causa de interrupção da prescrição até esta última indicada data de 11/05/2015.
Concluímos, portanto, com os Recorrentes que na data em que a Ré sociedade e os restantes Réus apresentaram em tribunal reconvenção contra os Autor e Interveniente Chamado, pedindo pela primeira vez que estes fossem condenados no reembolso dos valores que os primeiros consideram indevidamente retirados à sociedade, tendo os factos alegadamente praticados por estes que justificariam o pagamento daquela indemnização sido praticados até 11 de Maio de 2008, o direito da sociedade a ser indemnizada pelos gerentes dos danos que tenha sofrido em resultado da conduta dolosa ou culposa destes já estava prescrito desde 11 de Maio de 2013.
Procede, portanto, este fundamento de recurso, agora de forma definitiva.
Esta decisão prejudica a apreciação do fundamento de recurso dos Habilitados de inexistência de conduta dolosa ou culposa do Autor e Interveniente. Bem como o conhecimento dos fundamentos de recurso dos Réus de reapreciação da condenação ilíquida do pedido reconvencional, da não atendibilidade dos danos não patrimoniais invocados quanto à sociedade Ré e da condenação em juros de mora.
*
X – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
São os seguintes os factos considerados provados pela sentença recorrida, com as alterações acima ordenadas:
1) A Ré é uma sociedade comercial com sede social sita na Rua ..., freguesia ... e ..., concelho de Marco de Canaveses, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Marco de Canaveses sob o número ..., com o objecto social de “indústria de produtos de alumínio e de redes de arame”, e tem um capital social de € 249.398,95 correspondente à soma das quotas seguintes: - uma quota no valor nominal de € 46.448,06 pertencente ao sócio DD; - uma quota no valor nominal de € 28.371,63; pertencente à sócia WW; - uma quota no valor de € 46.448,06 pertencente ao sócio XX; - uma quota no valor nominal de € 18.076,43 pertencente ao sócio XX; - uma quota no valor nominal de € 62.259,95 pertencente ao sócio EE; - uma quota no valor nominal de € 46.448,06 pertencente ao sócio AA; - uma quota no valor nominal de € 673,38 pertencente ao sócio BB; - uma quota no valor nominal de € 673,38 pertencente à própria Sociedade.
2) Em assembleia geral da sociedade Ré, realizada em 20 de Agosto de 2003, foi deliberado destituir o A. da sua gerência.
3) O A. impugnou judicialmente a referida deliberação através de providência cautelar que correu termos sob o proc.1135/03.3TBMCN do 1º Juízo do tribunal Judicial de Marco de Canaveses.
4) No âmbito da providência cautelar mencionada, as partes aí intervenientes, o aqui A. AA e a aqui R A... Lda., puseram fim aos autos nos termos da transacção aí homologada, em acordo datado de 27 de Abril de 2004.
5) O A. não intentou a respectiva acção principal.
6) Consta da ata número cinquenta e sete, referente a uma Assembleia Geral extraordinária da sociedade ré, realizada em 8 de Outubro de 2004, como ponto único “deliberar sobre dar sem efeito a decisão tomada na assembleia-geral de vinte de Agosto de dois mil e três que destitui da gerência o Sr. AA e, em consequência, confirmar o mesmo como gerente da sociedade A... limitada com efeitos desde a data da referida deliberação.”
7) Consta da ata mencionada no número anterior a seguinte declaração de voto “A presente assembleia-geral extraordinária, convocada pelo sócio EE, é um acto perfeitamente inútil. Com efeito, a questão da destituição da gerência do sócio Sr. AA, deliberada em Assembleia geral de vinte de Agosto de dois mil e três, é uma questão que não se coloca neste momento, uma vez que, de facto e de direito, tal sócio nunca deixou de exercer as funções de gerente, já que interpôs providência cautelar de suspensão de tal deliberação, que correu termos no primeiro juízo do tribunal de Marco de Canaveses, sob o nº 1135/03.3TBMCN. Como é do conhecimento de todos os presentes, tal providência terminou com uma transacção judicial que pôs termo à causa, já homologada por sentença transitada em julgado, donde resulta que a referida deliberação nunca chegou a ter efeito. Face ao exposto, e apenas por uma questão de cautela, os sócios CC e BB votaram contra o ponto único da ordem de trabalhos.”
8) Desde a data daquela transacção, e até 2006, a R. remunerou o Autor pela gerência, tendo este participado em reuniões diversas de gerência.
9) Em 22 de Junho de 2006, em assembleia geral da sociedade 1ªR, foi deliberada a destituição dos gerentes EE e AA.
10) Por sentença proferida na acção sumária com o número de processo 1114/06.9TBMCN, que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses, proposta por EE e por AA contra a sociedade aqui 1ªR, transitada em julgado em 17 de Setembro de 2012, foi declarada nula a deliberação proferida na Assembleia Geral de Sócios realizada em 22 de Junho de 2006, de destituição de EE e. AA de gerentes da aqui 1ªR A..., Lda.
11) Em 26 de Outubro de 2012, pela Ap. ..., foi efectuado o registo definitivo da destituição das funções de gerente de AA, deliberada na Assembleia Geral Extraordinária que teve lugar no dia 20 de Agosto de 2003, pelas 10.00 horas.
12) O A. intentou uma providência cautelar não especificada onde pediu, “… o cancelamento do registo da deliberação social tomada na assembleia geral extraordinária da requerida realizada no dia 20 de Agosto de 2003, pelas onze horas, na sede social da requerida na Conservatória do Registo Comercial com a suspensão imediata dos seus efeitos, até à decisão proferida na acção principal. A não se entender assim, então e sem prescindir, sempre a presente providência cautelar comum deve ser julgada procedente, por provada e, em consequência, ordenar-se a suspensão do registo na C.R.C da deliberação social tomada na assembleia geral extraordinária da requerida realizada no dia 20 de Agosto de 2003, pelas onze horas, na sede social da requerida na Conservatória do Registo Comercial com a suspensão imediata dos seus efeitos, até á decisão proferida na acção principal.”.
13) Tal providência cautelar correu termos pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses, sob o n.º 1745/12.8TBMCN e foi julgada improcedente, em primeira instância, por não se verificarem os pressupostos de que depende a sua procedência.
14) Da decisão mencionada no número anterior foi interposto recurso, tendo o Tribunal da Relação proferido decisão nos seguintes termos: “aprovada a deliberação de 20-08-2003, que destituiu o requerente da gerência da requerida, aquele requereu, cautelarmente, a sua suspensão, processo no decurso do qual as partes acordaram nos termos constantes de fls. 197 a 199. Ou seja, e entre o mais, acordaram os sócios EE e AA em comprometer-se em comprar aos sócios BB e CC, que, por sua vez, se comprometeram a ceder as respectivas quotas ao preço que resultar da peritagem “pelo valor que por maioria venha a ser indicado pelos peritos nomeados”. Daqui decorre que as partes, tacitamente, revogaram aquela deliberação. Revogação, aliás, confirmada pela assembleia de 8/4/2004 – ata 57, de fls. 200 e ss. – (...) E confirmada, ainda, pelo facto de, até 2006, a requerida nunca ter impedido o requerente de desenvolver a sua actividade «de gerente, remunerando-o por essa actividade; e pelo facto de, por deliberação de 22-06-2006, a requerida ter aprovado a destituição do gerente da mesma – donde, naturalmente, o considerar como tal. E assim sendo, ou seja, revogada tal deliberação, não podia a mesma ser registada. Tornando-se desnecessária, em consequência, a apreciação da questão, quer com base na sua eventual nulidade, quer com base no alegado abuso de direito. Verifica-se, assim, o primeiro requisito apontado: probabilidade séria da existência do direito invocado. Afigura-se-nos, todavia, não se verificar o segundo requisito. … acorda-se em face do exposto, em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão proferida”.
15) Na sequência da destituição da gerência, ocorrida em 2006, o A. esteve ausente da empresa até ao trânsito em julgado da Sentença que declarou nula tal destituição em 17-09-2012.
16) O seu afastamento foi uma imposição da R e não uma vontade própria.
17) Após 26/10/2012, data do registo da deliberação tomada em 2003, o A. foi proibido, pelos sócios BB e DD, de entrar nas instalações da empresa, só lhe permitindo permanecer nas instalações da R, e na sala respectiva, para participar nas assembleias-gerais quando convocado.
18) Em 02 de Outubro de 2013, o A. pediu informações ao sócio BB.
19) A missiva referida no número anterior não obteve resposta.
20) Em Maio de 2014, e mediante condições rigorosas de fiscalização, foi permitida ao Autor a análise de parte dos elementos.
21) Os factos referidos causaram no A. sentimentos de humilhação, sentindo-se desrespeitado e impotente, havendo noites em que não consegue repousar, e que são contínuas, e revolta com a situação criada.
22) O A. está preocupado com a situação actual da empresa.
23) Desde Setembro de 2006, a Ré não paga ao Autor a remuneração mensal que auferia como gerente, no valor mensal de €1.571,21 (mil quinhentos e setenta e um euros e vinte e um cêntimo), 14 meses por ano.
24) Entre Setembro de 2006 e Setembro de 2012, a Ré não distribuiu quaisquer lucros aos sócios.
25) Em 30/9/2009 foi deliberado aumentar o salário de gerente de BB de €1.571,21 para €2.500,00 por mês.
26) O Autor e o interveniente EE retiraram da sociedade as seguintes quantias para efectuar pagamentos ao Exmo. Senhor Dr. KK, ilustre causídico que os patrocinou nas acções ordinárias n.º 340/02 (1.º Juízo), n.º 273/02 (2.º Juízo), n.º 637/03 (2.º Juízo) e n.º 509/04 (2.º Juízo), num montante global de € 11.000,00: a) € 2.405,23, com recibo datado de 13/04/2004; b) € 2.405,23, com recibo datado de 05/05/2004; c) € 2.982,35, com recibo datado de 26/07/2004; d) € 3.207,00, com recibo datado de 26/07/2004.
27) O Autor e o interveniente EE retiraram da sociedade € 2.500,74 para pagar honorários ao Exmo. Senhor Dr. YY relativos ao patrocínio da acção ordinária n.º 1057/04.0TBMCN em que o Autor e o seu irmão EE, ali em representação da sociedade, pedem a anulação do acordo celebrado com o então sócio BB e com a então sócia CC (cessão de quotas) no âmbito do procedimento cautelar n.º 1350/03.0TBMCN.
28) O Autor e o interveniente EE retiraram da sociedade a quantia de € 2.000,00, para pagamento de honorários ao Exmo. Senhor Dr. ZZ, pelo patrocínio do Autor no processo n.º 1135/03.3TBMCN (providência cautelar que interpôs contra a sociedade para anular a deliberação dos sócios que o destituiu da gerência e que terminou no acordo homologado por sentença, cujo pedido de anulação veio mais tarde requerer judicialmente.
29) O Autor e o interveniente EE retiraram dinheiro da sociedade para efectuar pagamento de honorários ao Exmo. Senhor Dr. AAA, ilustre causídico que os patrocina em juízo, nomeadamente: - pagaram a quantia de € 2.500,00, contra um recibo de honorários, datado de 24/06/2005, pelo patrocínio na acção n.º 538/05.9TBMCN, em que os Réus pretendem que seja anulada a deliberação da assembleia geral de 14/03/2005, que aprovou as contas do exercício de 2004. -em 15 de Maio de 2006, o Autor e o seu irmão EE procederam ao levantamento em caixa da quantia de € 3.100,00 para alegadamente pagamento do recibo apresentado pelo Exmo. Senhor Dr. AAA, a título de honorários, sendo certo que no documento de remessa de fundos se diz apenas “Honorários, posteriormente manda listagem acções”, que nunca foi remetida à Sociedade.
30) O Autor e o interveniente EE retiraram da sociedade a quantia líquida de € 4.267,25, para pagamento dos honorários ao Dr. VV pelo patrocínio em várias acções judiciais, sendo que a quantia de € 850,00 + € 1.300,00 = € 2.150,00 respeita ao procedimento cautelar n.º 1174/05.0TBMCN, intentado pelo sócio gerente BB para anular a deliberação dos sócios que o destituiu da gerência.
31) Daquela quantia, € 200,00 foram para pagamento de honorários pela elaboração da réplica no processo n.º 1057/04.0TBMCN e a quantia de € 3.849,11, através da remessa de fundos onde se diz “Honorários, manda listagem posteriormente”.
32) O Autor e o interveniente EE retiraram, ainda, dinheiro da sociedade para pagamento de taxas de justiça no Processo n.º 1350/03.0TBMCN (€ 44,30), que se trata de uma oposição à execução, em que o Autor e o seu irmão EE eram ali executados e o então sócio BB e a então sócia CC eram ali exequentes, para cumprimento do acordo celebrado entre os quatro sócios.
33) Mais tarde, e por imposição do tribunal, aquela taxa inicial foi rectificada para a quantia de € 1.068,00, sendo que o Autor e o interveniente EE procederam ao pagamento da mesma, com dinheiro da aqui 1.ª Ré.
34) Em 2001, o Autor era credor, em relação à 1.ª Ré, de ESC. 6.727.137$80 (€ 33.529,88), não se contabilizando aqui diversos levantamentos feitos por si do caixa da empresa desde 1994.
35) Em 2002, o Autor recebeu € 5.612,38 – € 841,86 (IRS) = € 4.770,52, a título de distribuição dos lucros referentes ao exercício de 2001, tendo devolvido essa quantia, alegando existir uma acção de anulação da deliberação das contas, pelo que ficou credor de € 38.300,40.
36) Ainda em 2002, foram feitos lançamentos de alguns levantamentos feitos pelo Autor, tendo ficado credor de € 29.794,90.
37) 37- Em 2003, foram lançados na conta do Autor cheques que tinham sido emitidos a seu favor através da sua assinatura e do Réu EE, em 2000, um no montante equivalente a € 7.980,77, e outro no montante equivalente a € 6.983,17, e que só em 2003 foram justificados.
38) Em 2003, a 1.ª Ré entregou ao Autor a sua parte nos lucros relativos ao exercício de 2002 (€ 17.397,30 - € 2.609,60 – IRS), ao que foi deduzida a quantia pelos atrás referidos cheques, bem como parte dos levantamentos efectuados por aquele sócio gerente entre 1994 e 2002.
39) O Autor devolveu o cheque – novamente com o argumento da irregularidade das contas apresentadas.
40) Em Dezembro de 2003, o Autor com a colaboração do interveniente seu EE, procedeu ao levantamento de um cheque da sociedade, no montante de € 8.302,12, alegando tratar-se de quantias a que tinha direito como compensação pela diferença do que recebeu da Segurança Social, a título de baixa médica e durante o período da mesma, e do que teria direito pela sua remuneração integral, caso estivesse ao serviço.
41) Fundou-se, para tanto, na acta n.º ... da sociedade, datada de 04/07/1974.
42) Tais baixas médicas correspondem aos seguintes períodos: Fevereiro de 1984 a Abril de 1985; Abril de 1986 a Maio de 1986; Setembro de 1991 a Setembro de 1992; Maio de 1994 a Agosto de 1994; Agosto de 1995 a Janeiro de 1996; Fevereiro de 1996 a Abril de 1996.
43) Em 2004, o Autor recebeu os lucros relativos a 2003 (€ 10.216,44 - € 1.532,47 (IRS) = € 8.683,97).
44) Em 2005, o Autor recebeu os lucros relativos a 2004 (€ 14.855,86 - € 2.228,37 (IRS) = € 12.627,94).
45) O Autor, com a colaboração do interveniente seu EE, levantou, em 8 de Fevereiro de 2006, um cheque sacado sobre esta sociedade no montante de € 14.787,71.
46) Por deliberação da assembleia geral de 10 de Março de 2006, a maioria do capital deliberou que parte dos lucros do exercício não fosse distribuído, de forma a começarem a acertar as contas do caixa.
47) O Autor e o seu irmão EE votaram contra e devolveram os cheques com os dividendos a que, por força daquela deliberação, tinham direito.
48) Em 18 de Maio de 2006, o Autor procedeu ao levantamento da totalidade dos lucros a que teria direito, € 5.616,91, não fosse a deliberação de 10 de Março de 2006, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.
49) Em 19 de Maio de 2006, também o irmão EE procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos, no montante de € 7.529,02, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.
50) Por ocasião do julgamento da providência cautelar n.º 1174/05.0TBMCN, que visava suspender a deliberação que destituiu o 2.º Réu e a 3.ª Ré da gerência, os empregados da 1.ª Ré pediram dois dias de férias ao então sócio-gerente BB, para poderem assistir ao julgamento, sendo que Seis dos empregados eram testemunhas no processo.
51) O 2.º Réu entendeu que os empregados da empresa estavam no seu direito de conhecer a verdade, razão pela qual entendeu conceder-lhes os dois dias de férias.
52) Em virtude da imposição unilateral do Autor e do interveniente EE e à revelia dos outros gerentes, tais dias acabaram por ser descontados nos vencimentos dos trabalhadores (tendo as faltas sido consideradas injustificadas, exceptuando as dos que eram testemunhas).
53) Com fundamento nestas duas faltas ao trabalho, o Autor e o interveniente EE decidiram, novamente em comunhão de esforços e à revelia dos outros gerentes, instaurar processos disciplinares a todos os empregados.
54) E, em 9 de Janeiro de 2006, todos os empregados da firma foram punidos pelo Autor e interveniente e à revelia dos outros gerentes, com uma sanção de 30 dias de suspensão do trabalho, com perda de retribuição, por terem estado ausentes 2 dias.
54-A) De tal sanção resultaram prejuízos para o funcionamento da empresa, com perdas ao nível da produção, atrasos e incumprimento de fornecimento, de valor concreto não apurado, e também prejuízos para o bom nome da empresa, junto de clientes.
55) Seis dos trabalhadores punidos com a sanção de suspensão do trabalho recorreram ao competente Tribunal do Trabalho de Penafiel com vista à declaração da ilicitude e do abuso da sanção, reclamando, ainda, a inerente indemnização.
56) Tal processo, que correu termos sob o n.º 699/TTPNF pelo 2.º Juízo do referido Tribunal do Trabalho de Penafiel, terminou com a realização de uma transacção em que a sociedade aceitou anular a sanção aplicada e pagar aos trabalhadores ali demandantes o montante equivalente ao salário dos 30 dias em que estiveram suspensos.
57) Na transacção a sociedade esteve representada pelo Autor e pelo interveniente EE.
58) Face a esta decisão judicial, os então sócios gerentes BB e CC, decidiram revogar igualmente a sanção aos restantes trabalhadores e pagar-lhes o salário dos 30 dias em que estiveram suspensos.
59) Os empregados QQ e PP– os únicos que asseguram o trabalho de escritório- sofreram nova sanção (perda de dois dias de férias), na sequência de outro processo disciplinar, uma vez mais movido unilateralmente pelo Autor e pelo interveniente EE e à revelia dos outros gerentes.
60) A aplicação da referida sanção disciplinar da perda de 2 dias de férias, bem como a decisão de instaurar novo procedimento disciplinar com vista ao despedimento, foram revogadas por deliberação de assembleia geral que teve lugar no dia 26 de Abril de 2006, aprovada com os votos favoráveis do sócio BB e da então sócia CC.
61) O Autor e o seu irmão EE interpuseram então uma providência cautelar com vista à anulação desta deliberação, que correu termos sob o n.º 674/06.9TBMCN neste Tribunal Judicial da Comarca de Marco de Canavezes, procedimento esse que veio a ser julgado improcedente.
62) O Autor e o seu irmão EE, decidiram contratar uma empresa de segurança, o que implicou um custo mensal de 3000,00€, acrescido de IVA.
63) A sanha judicial do A. e do seu irmão EE tem acarretado custos enormes para as finanças da 1.ª Ré, seja pelo pagamento de encargos judiciais, seja pela apropriação indevida de fundos para alegadamente pagar despesas e honorários a advogados.
64) Os trabalhadores da empresa – que sempre foram um modelo de empenhamento na prossecução do seu trabalho e na defesa dos interesses da empresa – começaram a ficar claramente desmotivados e fartos da actuação dos Réus: porque se sentem injustamente perseguidos; porque pressentem que, por força da desestabilização da empresa, o seu emprego está em risco; porque o Autor e o seu irmão EE se opõem às suas reivindicações salariais, ao mesmo tempo que os vêem despender enormes quantias na contratação de seguranças inúteis.
65) Por tais factos, todos os trabalhadores fizeram greve nos dias 29 e 30 de Maio de 2006 (ainda que parcial), só não a tendo prosseguido por mais tempo, porque o então sócio gerente BB se comprometeu a satisfazer as suas exigências e a adoptar as iniciativas que estivessem ao seu alcance para desenvolver a estabilidade à 1.ª Ré.
66) O Autor e o seu irmão efectuaram os seguintes movimentos de dinheiros da sociedade Ré: a) Transferência bancária a favor de EE realizada em 28/06/2007, no valor de € 12.503,12 (doze mil quinhentos e três euros e doze cêntimos); b) Transferência bancária a favor de AA, realizada em 28/06/2007, no valor de € 6.000,00 (seis mil euros); c) Cheque n.º ..., datado de 18/07/2006, para alegado pagamento de honorários à Dra. BBB, no valor de € 210,00 (duzentos e dez euros); d) Transferência bancária para alegado pagamento de honorários ao Dr. VV, realizada em 03/10/2007, no valor de € 9.003,12 (nove mil e três euros e doze cêntimos); e) Transferência bancária para alegado pagamento de honorários a CCC – Sociedade de Advogados, realizada em 28/11/2007, no valor de € 4.003,12 (quatro mil e três euros e doze cêntimos); f) Transferência bancária a favor de EE, realizada em 28/11/2007, no valor de € 15.003,12 (quinze mil e três euros e doze cêntimos).
67) Estas saídas de dinheiro não foram destinadas ao pagamento de qualquer despesa da sociedade.
68) Estas retiradas de dinheiro vieram a dar origem a uma Inspecção Tributária, cujo relatório considerou que tais levantamentos não são enquadráveis como rendimentos de trabalho dependente, precisamente por o Autor e o seu irmão EE não exercerem funções remuneradas como gerentes a partir do momento em que foram destituídos, e presumiu-os feitos a título de lucros ou adiantamento de lucros, pelo que haveria lugar a uma retenção na fonte de 20%.
69) Em 20.07.2018 foi proferida sentença no processo n,º 1678/12.8TBMCN , J3 deste juízo do comércio, transitada em julgado, que determinou a destituição dos, ali réus, AA e EE dos cargos de gerente na sociedade “A..., Lda.”.
70) A sentença citada conclui pela violação do dever de lealdade e cuidado dos gerentes, ali réus, para com a sociedade e de respeito pela integridade patrimonial da sociedade, actos contrários ao interesse social e apenas visando o interesse pessoal, de tal modo graves, susceptíveis de causar ruptura no vínculo de confiança que deve ligar os gerentes à sociedade, demais sócios e até trabalhadores.
71) E concluiu pela prova de que os Réus EE e AA praticaram os seguintes factos: E) Apropriação indevida de dinheiros da sociedade, designadamente, para pagamento de honorários contratados pelos réus. F) levantamentos indevidos de dinheiros societários para pagamento de supostos créditos. G) instauração de procedimentos disciplinares e aplicação de sanções disciplinares a trabalhadores sem qualquer fundamento e gerador de prejuízos para a sociedade, bem como comportamento dos réus gerador de desmotivação dos trabalhadores.
72) Os factos referidos em E), F) e G) ocorreram entre os anos de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007.
73) O Autor e o Interveniente EE procederam a levantamentos de dinheiro do caixa da sociedade Ré para pagar as suas deslocações aos mais diferentes advogados, designadamente, o Autor AA, em conluio com o Interveniente EE, retirou do caixa, de uma só vez, a quantia de € 486,70 para pagamento das suas deslocações a advogados.
74) A 28 de Novembro de 2007, foi ordenada à agência do Banco 1..., S.A. sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência bancária no valor de € 12.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º ... da titularidade da Ré Sociedade, e com destino à conta bancária ..., a favor do Autor AA, com o descritivo “Regulariz ordenados”, realizada no próprio dia.
75) A 04 de Março de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia.
76) A 29 de Maio de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência de um balcão da Banco 2..., S.A., uma transferência interbancária no valor de € 6.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino à conta com o NIB ..., titulada pelo Autor AA, com o descritivo “Regularização de Ordenados e outros”, tendo tal transferência sido realizada no próprio dia.
77) A 28 de Fevereiro de 2008, o Autor e o Interveniente Principal solicitaram à gerência do balcão do Banco 1..., S.A. da agência sita na Rua ..., em Amarante, uma transferência interbancária no valor de € 10.000,00, com origem na conta bancária aberta junto daquele Banco sob o n.º DO ..., titulada pela Ré Sociedade, e com destino na conta com o NIB ..., titulada pelo Interveniente Principal EE, com o descritivo “Regularização de Ordenados e Despesas da Empresa”, tendo tal transferência sido realizada a 04 de Março de 2008.
São os seguintes os factos considerados não provados pela sentença recorrida:
a) A partir da data da transacção referida em 4) dos factos provados o A. diariamente compareceu na empresa, desenvolveu as actividades de gerência que lhe estavam confiadas, deu ordens aos diversos empregados da R, que lhe obedeciam e auxiliou os restantes gerentes quando lhe foi solicitado.
b) O A. foi expulso das instalações pelo sócio gerente DD (seu sobrinho).
c) Desde a suspensão em 2006, nunca mais foi permitido ao A. tomar contacto com a actividade desenvolvida na empresa, nem com os trabalhadores ou documentos referentes à mesma.
d) Com a sanção disciplinar aplicada aos trabalhadores e apesar de tais suspensões de trabalho terem sido concretizadas por vários turnos, o funcionamento da empresa foi fortemente prejudicado: houve avarias nas máquinas que não foram reparadas em tempo útil; houve um profundo decréscimo na produção que levou à ruptura de “stocks”; foram inviabilizados fornecimentos; houve encomendas que não puderam ser cumpridas, etc.
e) Com tais comportamentos, o Autor e o seu irmão EE, para além de uma vingança mesquinha e de uma tentativa de intimidação dos empregados, pretenderam prejudicar o normal funcionamento da sociedade, na tentativa de provocar uma diminuição do respectivo valor para assim adquirir as quotas dos então sócios BB e CC a um preço baixo.
f) A situação mencionada colocou em causa o bom nome da empresa, junto de fornecedores e clientes e alguns clientes tiveram mesmo que ir abastecer-se na concorrência.
g) A contratação de seguranças foi um acto de gestão a demonstrar que o Autor e o seu irmão EE mais não visavam senão a descapitalização da sociedade, está o facto de terem optado pela empresa “G..., Lda.” em detrimento de outras que, pelo mesmo serviço, cobravam metade do preço praticado pela referida G....
h) Todas estas práticas do Autor e do seu irmão EE têm vindo a provocar nos demais sócios e gerentes um enorme desgaste físico e psíquico.
i) O Autor e o seu irmão EE só passavam pela sociedade para desestabilizar e para prejudicar o seu normal funcionamento.
j) Os trabalhadores fizeram greve nos dias 29 e 30 de Maio de 2006 (ainda que parcial), só não a tendo prosseguido por mais tempo, porque os então sócia gerente CC se comprometeu a satisfazer as suas exigências e a adoptarem as iniciativas que estivessem ao seu alcance para desenvolver a estabilidade à 1.ª Ré
*
XI – CANCELAMENTO DO REGISTO DA DELIBERAÇÃO SOCIAL DE 20/08/2003 QUE DESTITUIU O AUTOR DA GERÊNCIA
O Autor formulou, entre o mais e sob a alínea c), o pedido de se ordenar o cancelamento do registo da deliberação de 20 de Agosto de 2003 que o destituiu da gerência da 1.ª Ré, com a suspensão imediata dos seus efeitos retroagindo à data do respectivo averbamento.
A sentença recorrida decidiu não atender a este pedido, pese embora a decisão final de declaração de que a deliberação social de destituição foi tacitamente revogada.
Justifica que, em face da decisão proferida no âmbito do Processo n.º 1678/12.8T8AMT e que determinou a destituição do Autor das funções de gerente da Ré, nenhum interesse subsiste neste pedido que consubstanciaria um acto inútil.
No recurso apresentado o Autor insurge-se contra esta decisão, sustentando que a consequência necessária da revogação da deliberação em causa é a sua inexistência e, por isso, insusceptível de sustentar qualquer registo da mesma. Logo terá de ser cancelado.
Defende que resulta do peticionado e da sentença prolatada que deverá ser cancelado tal registo, com todos os efeitos legais.
Acrescenta que não se trata de nenhum acto inútil, muito pelo contrário.
Entendemos dever dar razão ao Recorrente neste ponto.
Da certidão Permanente da sociedade Ré junta aos autos resulta inscrita, com data de 27/10/2006, a cessação de funções de funções de gerente do Autor, com fundamento em destituição decidida em 22/06/2006 (cf. Averbamento n.º 3).
Mais resulta, com data de 02/10/2012, o cancelamento do Averbamento n.º 3 (cf. Averbamento n.º 8) na sequência de decisão judicial.
Resulta ainda, com a mesma data de 02/10/2012, a decisão judicial de declaração da nulidade da deliberação de destituição de EE e AA tomada na Assembleia Geral de Sócios realizada em 22 de Junho de 2006 (cf. Inscrição n.º 15).
Entretanto, com data de 26/10/2012 foi efectuado o registo da cessação de funções de gerente do Autor, com fundamento em destituição na sequência da deliberação da Assembleia Geral Extraordinária de 20/08/2003 (cf. Apresentação 1).
Além disso, como se refere na sentença recorrida, a sentença proferida no Processo n.º 1678/12.8T8MCN, transitada em julgado, determinou a destituição dos ali Réus, AA e EE dos cargos de gerente na sociedade Ré, com registo de tal decisão.
Percebe-se o argumento do tribunal recorrido, no sentido de que, em face desta decisão, o pedido em análise é inútil.
Entendemos, no entanto, dever ponderar a questão sob a perspectiva do interesse manifestado pelo Recorrente de ver cancelada a decisão de destituição do cargo de gerente e à luz da disciplina constante do Código de Registo Comercial, aprovado pelo D.L. n.º 403/86, de 03 de Dezembro.
O registo comercial “(…) destina-se a dar publicidade à situação jurídica dos comerciantes individuais, das sociedades comerciais, das sociedades civis sob forma comercial e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada, tendo em vista a segurança do comércio jurídico.” (cf. art.º 1.º, n.º 1).
Estão sujeitos a registo, entre o mais, “A designação e cessação de funções, por qualquer causa que não seja o decurso do tempo, dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização das sociedades, bem como do secretário da sociedade.” (cf. art.º 3.º, n.º 1, alínea m)).
Decorre igualmente da lei que estão sujeitas a registo “As acções que tenham como fim, principal ou acessório, declarar, fazer reconhecer, constituir, modificar ou extinguir qualquer dos direitos referidos nos artigos 3.º a 8.º.” e “As decisões finais, com trânsito em julgado, proferidas nas acções e procedimentos cautelares referidos nas alíneas anteriores.” (cf. art.º 9.º, alíneas b) e h)).
Por fim, decorre ainda da mesma que “Os registos são cancelados com base na extinção dos direitos, ónus ou encargos neles definidos, em execução de decisão administrativa, nos casos previstos na lei, ou de decisão judicial transitada em julgado.” (cf. art.º 20.º).
Temos, portanto, que a aplicação directa da lei impõe a comunicação da sentença recorrida para efeitos de cancelamento do registo da deliberação de 20 de Agosto de 2003, que destituiu o Recorrente da gerência da 1.ª Ré.
Sendo esse o seu desejo, e ponderando que o cumprimento da lei determinará o cancelamento de um dos registos de deliberação de destituição da gerência (independentemente da manutenção de outra decisão no mesmo sentido, decorrente do Processo n.º 1678/12.8T8MCN), decidimos deferir este fundamento de recurso, presumindo que tal eliminação beneficiará potencialmente a posição deste.
Conclui-se, pois, pela procedência deste fundamento de recurso.
*
XII – APLICAÇÃO DO INSTITUTO DO ABUSO DE DIREITO AOS PEDIDOS FORMULADOS PELO AUTOR
A sentença recorrida atendeu a que o Autor foi definitivamente destituído da gerência da Ré no âmbito da acção que correu termos no J3 sob o número 1678/12.8T8AMT, com fundamento na prática dos seguintes factos ocorridos entre os anos de 2003 a 2007: apropriação indevida de dinheiros da sociedade; levantamentos indevidos de dinheiros societários para pagamento de supostos créditos e instauração de procedimentos disciplinares e aplicação de sanções disciplinares a trabalhadores sem qualquer fundamento e gerador de prejuízos para a sociedade.
Considerando esta factualidade, decidiu julgar improcedente o pedido de pagamento de remuneração e de pagamento de indemnização a título de danos morais por manifesto abuso de direito.
O Autor/Recorrente veio insurgir-se contra esta decisão.
Sustenta, em síntese, que os pedidos por si formulados sob as alíneas c) e d) tiveram por fundamento a decisão proferida na Acção Sumária proferida no Processo n.º 1114/06.9TBMCN, no âmbito da qual foi declarada nula a deliberação proferida na Assembleia Geral de Sócios realizada em 22/06/2006 de destituição de EE e AA de gerentes da sociedade Ré, em que foram ponderados a generalidade dos factos dados como provados nestes autos.
Defende que esta decisão, ao reconhecer a nulidade da deliberação que o expulsou de gerente da aqui recorrida, lhe conferiu todos os direitos que essa anulação da deliberação lhe concede, desde logo o direito de gerente, conferindo-lhe nos termos estatutários a respectiva remuneração de gerente durante o período desse afastamento da gerência.
Acrescenta que os factos que ocorreram posteriormente a 2006, foram-no num momento em que estava afastado coercivamente da gerência da Ré, sem qualquer remuneração. Advoga que se tratou de uma acção directa de recuperação de rendimentos a que teria direito e lhe permitiriam sobreviver numa altura em que destituído ilegalmente da gerência da Ré ficou sem auferir quaisquer rendimentos.
Conclui que, neste enquadramento, o invocado abuso de direito viola o caso julgado, pondo em causa com essa violação os princípios da segurança e da certeza jurídicas.
Cumpre apreciar e decidir.
Prescreve o art.º 334.º do C Civil que “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.”
Quanto à noção de abuso de direito, deixa-se aqui, por incisiva e clara, a definição de Jorge Coutinho de Abreu[20]: "Há abuso de direito quando um comportamento, aparentando ser exercício de um direito, se traduz na não realização dos interesses pessoais de que esse direito é instrumento e na negação de interesses sensíveis de outrem."
Ou, usando uma expressão concisa de Cunha de Sá[21], o abuso de direito traduz-se no dever de não abusar do direito próprio.
No caso em apreciação, concordamos com a sentença recorrida no entendimento de que, estando assente no âmbito da sentença proferida no Processo n.º 1678/12.8T8AMT que o Autor foi destituído da gerência da sociedade Ré com fundamento na prática de factos ocorridos entre os anos de 2003 a 2007 de apropriação indevida de dinheiros da sociedade, levantamentos indevidos de dinheiros societários para pagamento de supostos créditos e instauração de procedimentos disciplinares e aplicação de sanções disciplinares a trabalhadores sem qualquer fundamento e gerador de prejuízos para a sociedade, a procedência dos pedidos aqui formulados de pagamento de remuneração e de indemnização a título de danos morais ofenderia os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico dos direitos em que funda a sua pretensão.
Mantemos, pois, a paralisação dos direitos reclamados, por aplicação do instituto do abuso de direito.
Os argumentos aqui apresentados pelo Recorrente não têm qualquer valia jurídica.
A decisão final proferida no Processo n.º 1114/06.9TBMCN foi efectivamente no sentido de declarar a nulidade da deliberação proferida na Assembleia Geral de Sócios realizada em 22/06/2006 de destituição de EE e AA de gerentes da sociedade Ré.
Há, no entanto, que atender a que o fundamento para tal declaração de nulidade foi a circunstância de, à luz do pacto social, os Autores/gerentes só poderiam ser destituídos por deliberação da Assembleia Geral que reunisse, pelo menos, 67,50 % do capital social. Tendo em conta que a deliberação de destituição em causa foi aprovada apenas com votos favoráveis de 55,87 % dos votos, aí se concluiu pela nulidade da mesma, por violação de uma norma imperativa.
A decisão final destes autos, em resposta à invocação de excepção de abuso de direito suscitada com o fim de paralisar a eficácia de tal deliberação, refere inclusivamente, em termos subsidiários, que “Na situação concreta, compulsando-se o teor da deliberação, conclui-se que a mesma se funda num acervo de factos imputados aos Autores, sendo, assim, minimamente fundamentada.”
Assim sendo, tendo a decisão final proferida no Processo n.º 1114/06.9TBMCN tido exclusivamente por fundamento vícios formais da deliberação e tendo o Autor sido definitivamente destituído da gerência da Ré no âmbito da acção que correu termos no J3 sob o número 1678/12.8T8AMT, não se justifica o apelo a um qualquer caso julgado decorrente da decisão proferida naqueles primeiros autos, sendo perfeitamente legítimo ao tribunal recorrido retirar para estes autos as consequências da decisão de fundo proferida nos últimos autos indicados.
Improcede, portanto, este fundamento de recurso.
*
XIII – INCIDENTE DE CONDENAÇÃO DO AUTOR, HABILITADOS E RESPECTIVOS MANDATÁRIOS COMO LITIGANTES DE MÁ FÉ
Os Réus “A..., Lda.”, BB, e CC vieram apresentar pedido de condenação dos Habilitados e do Autor e respectivos mandatários como litigantes de má fé.
Alegam, para tanto, resultar da Acta da primeira sessão da audiência de julgamento, que teve lugar no dia 29/03/2022, que os Chamados e aqui Recorrentes se encontravam presentes na referida audiência através de representação pelo mandatário do Autor, o Dr. II, em virtude de substabelecimento conferido pelo Dr. KK. Acrescentam que esta regular presença se confirma nas sessões posteriores.
Advogam que o suposto e alegado desconhecimento, pelos Habilitados, da realização daquela audiência de julgamento, e as nulidades que dele pretendem desdobrar, não poderão senão corresponder a um comportamento processual contraditório e manifestamente abusivo, um venire contra factum proprium processual assente numa conduta de má fé.
Defendem estarmos perante um caso evidente de litigância de má fé processual e pedem que o mesmo seja exemplarmente sancionado com a condenação de todos os referidos intervenientes em litigância de má-fé e multa condigna.
O Autor e o respectivo mandatário vieram responder alegando, em síntese, que, na sequência do óbito do Interveniente EE, a sua filha NN, veio aos autos comunicar tal facto.
Afirmam que, no dia anterior ao julgamento, o mandatário desta interveniente acidental, Dr. KK, lhe solicitou que o substituísse no julgamento, uma vez que não poderia estar presente.
Dizem que, no dia 29/03/22, o mandatário requereu a junção aos autos do respectivo substabelecimento com reserva, cuja cópia junta.
Asseguram que este mandatário nunca referiu alguma vez que representava os habilitados de EE, falecido, não só porque nem os conhece, mas também porque os poderes forenses substabelecidos pelo Dr. KK, como consta do substabelecimento junto a eles não se refere, nem os referem.
Alegam que tudo o que consta nas atas de audiência de julgamento do dia 29 de Março, 7 de Abril e 26 de Abril de 2022, que se refira ao mandatário do A. como sendo advogado dos habilitados/chamados FF, viúva de EE e GG e HH e não exclusivamente da interveniente acidental NN, está errado e não corresponde à verdade.
Por sua vez, os Habilitados vieram responder alegando, em síntese, que apenas outorgaram Procurações Forenses em 31/08/22, na sequência da notificação que receberam da sentença, com a qual ficaram muito surpreendidos e precisamente para possibilitar a interposição de recurso.
Reiteram não terem sido notificados de quaisquer actos processuais após a sentença de habilitação de herdeiros, nem o advogado signatário da presente resposta os poderia informar do que quer que fosse porque, em primeiro lugar, apenas representava no processo a Interveniente Chamada Acidental NN e não foi notificado da maior parte dos actos praticados no processo, começando logo pela audiência prévia.
Tal como já afirmava Paulo Cunha em 1935[22], afirmação que se mantém plenamente actual, “com o litígio processual não se propõe o Estado determinar e declarar uma verdade fictícia, formal, meramente judiciária: é à verdade genuína e séria que o processo tende.”
Apela-se, portanto, à boa-fé, como critério impositivo e delimitativo do comportamento das partes e, nesta medida, como princípio norteador de todo o ordenamento jurídico processual.
Actualmente, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 542.º do CP Civil, “Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a)Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar ; b)Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c)Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d)Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”
A responsabilidade processual por litigância de má-fé é uma responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, tendo por facto ilícito típico o abuso do direito de agir e como elemento culposo específico a actuação com dolo ou negligência grave, sendo sancionada pela lei com a imposição de uma multa e eventualmente com a atribuição de uma indemnização à contraparte.
Nos presentes autos, a situação apresentada pelos Réus é, em abstracto, grave e seria, a considerar-se provada, seguramente justificativa de uma exemplar condenação ao abrigo da litigância da má fé.
Contudo, não temos nos autos elementos que nos possibilitem apurar qual das versões (dos Réus ou dos Autores/Habilitados) corresponde à verdade.
Concretizando, verifica-se que na Acta de Audiência de Julgamento de 29/03/22, consta como presentes “Autor: AA; Mandatário do Autor: Dr. II (acompanhado por advogada estagiária –Dra. JJ, cédula profissional nº ...); Mandatário dos Chamados: Dr. II (substabelecimento Dr. KK) Réus: - BB; - DD; Mandatária dos Réus: Dra. LL (acompanhada por advogada estagiária - Dra. MM).” Consta da mesma Acta que “Pelo Ilustre Mandatário do Autor foi requerida a junção aos autos de substabelecimento com reserva emitido pelo Ilustre Mandatário dos Chamados a seu favor, juntando cópia de tal substabelecimento e comprometeu-se a remeter via citius do citado documento.”
Na segunda e terceira sessão de audiência de julgamento, realizadas nos dias 07/04/22 e 26/04/22, consta das respectivas Actas como presentes “Mandatário do Autor e os Chamados (com substabelecimento junto aos autos): Dr. II; Mandatária dos Réus: Dra. LL (…).”
Não obstante o teor destas Actas, a verdade é que o Ilustre mandatário do Autor não juntou nesses actos qualquer Substabelecimento aos autos.
Aliás, tal Substabelecimento nunca foi junto aos autos até ao presente.
Por outro lado, o tribunal recorrido indeferiu o requerimento de correcção das Actas de audiência de julgamento, com fundamento em não se estar perante lapsos passíveis de rectificação.
Finalmente, apesar de termos tentado ouvir a primeira sessão de audiência de julgamento nos momentos iniciais, em que terá ocorrido a junção deste Substabelecimento, a verdade é que essa parte da gravação se encontra imperceptível.
Apesar de, legalmente, estar precludido o direito de pedir a rectificação de tais Actas de Audiência de Julgamento, esta “verdade formal” não pode, por si só, legitimar a condenação das partes e respectivos mandatários como litigantes de má fé, a qual reclama a verificação de um indesmentível e real abuso do direito de agir, praticado com dolo ou negligência grave.
Posta de parte esta verdade meramente formal, estamos impossibilitados de julgar se se verificou efectivamente a situação relatada nas Actas de Audiência de Julgamento, designadamente a junção de Substabelecimento pelo Ilustre mandatário do A., no sentido de ter passado a ser advogado dos habilitados/chamados FF, viúva de EE e GG e HH.
A conclusão necessária é, pois, a da improcedência do pedido de Autor, Habilitados e respectivos mandatários como litigantes de má fé.
*
XIV - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedentes os recursos do Autor, dos Habilitados e dos Réus, alterando-se a decisão recorrida nos seguintes termos: Pelo exposto, o Tribunal decide: A) Declarar revogada a deliberação de 20 de Agosto de 2003 que destituiu o Autor da gerência da 1.ª Ré e, em face disso, julgar prejudicado o pedido de nulidade da citada deliberação; B) Ordenar o cancelamento do registo daquela deliberação social, com a suspensão dos seus efeitos. C) Julgar improcedente o demais peticionado pelo Autor, dele absolvendo os réus; D) Julgar prescrito o direito de condenação do Autor AA e Chamado EE a reembolsar a sociedade Ré dos valores indevidamente retirados e a indemnizá-la pelos prejuízos causados com a sua conduta, em montante nunca inferior a € 40 000,00.
*
Julga-se improcedente o pedido de condenação como litigantes de má fé do Autor, Habilitados e respectivos mandatários.
*
Custas da acção e do presente recurso fixadas nos seguintes termos: custas da acção a cargo do Autor, Habilitados e Réus na proporção de respectivamente, 50 %, 20 % e 30 % e custas da reconvenção a cargo dos Réus (art.º 527.º do CP Civil).
*
Notifique e registe.
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos)
Porto, 26 de Setembro de 2023
Lina Baptista
Alexandra Pelayo
Fernando Vilares Ferreira
________________ [1] Doravante designado apenas por CP Civil, por questões de operacionalidade e celeridade. [2] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, p. 109. [3] In Acórdão de 28/05/2009 proferido no Processo n.º 160/09.5YFLSB, tendo como Relator Oliveira Rocha e disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [4] In Processo Civil Declarativo, 2.ª Edição, 2017, Almedina, pág. 318. [5] Vol. I, 2018, Almedina, Pág. 224. [6] Proferido no Processo n.º 97B714 e disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [7] Proferido no Processo n.º 04ª2277 e disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [8] Proferido no Processo n.º 399/19.5T8VLG.P1 e disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [9] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 109. [10] In Acórdão de 28/05/2009 proferido no Processo n.º 160/09.5YFLSB, tendo como Relator Oliveira Rocha e disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [11] In Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/12/2000 proferido na Revista n.º 715/99 e constante de Sumários 37º. Veja-se, no mesmo sentido, Lebre de Freitas in “Do conteúdo da base instrutória” in Julgar, n.º 17, Coimbra Editora, pág. 71. [12] In Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Vol. II, 2.ª Edição, 2015, Almedina, pág. 814. [13] In A Fundamentação de Facto e de Direito da Decisão Cível, 1.ª Edição, 2015, Coimbra Editora, pág. 106-107. [14] Ob. Cit. pág. 147. [15] Do seguinte teor: “Em 19 de Maio de 2006, também o irmão EE procedeu ao levantamento da totalidade dos dividendos, sem nunca proceder à retenção na fonte das quantias devidas ao Fisco a título de IRS.” [16] Por se tratar de um facto sequencial dos dados como provados sob o Item 54). [17] Consigna-se que os demais factos apresentados em sede de ampliação do recurso dos Réus têm diversamente por fundamento a eventualidade de procedência dos demais fundamentos de recurso apresentados pelo Autor e Habilitados. [18] In “Ónus de alegação e de impugnação das partes e poderes de cognição do tribunal” in II Colóquio de Processo Civil de Santo Tirso, com coordenação de Paulo Pimenta, 2016, Almedina, pág. 120. [19] Proferido no Processo n.º 1205/19.6T8VCD.P1.S1 e disponível em www.dgsi.ptna data do presente Acórdão. [20] In Abuso de Direito, 1999, Almedina, pág. 43. [21] In Abuso do Direito, 1997, pág. 640. [22] In Simulação Processual, Anulação e Caso Julgado, 1935, Minerva, pág. 20.