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SEGURO DE RESPONSABILIDADE CIVIL FACULTATIVO
SOLIDARIEDADE
Sumário
1. No caso de seguro de responsabilidade civil facultativo, em que se não verifiquem as situações previstas pelos nºs 2 e 3 do art. 140º da LCS, a seguradora/interveniente principal provocada, não assume a posição de devedora solidária, do lado passivo, pois só há um responsável (a ré) e a solidariedade pressupõe, como requisito básico, uma obrigação com pluralidade de devedores.
Texto Integral
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
I. Relatório.
AA, intentou a presente acção declarativa comum contra “Banco 1... – Sucursal em Portugal”, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 56.291,65 €, acrescida de juros moratórios, contados desde a data de citação até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, e em suma, alegou ter contactado um promotor da ré, BB, em finais de 2012, com vista a investir as suas poupanças, no valor de 50.000,00 € a quem informou que apenas queria investimento com capital garantido, nada arriscado. Aquele garantiu à autora que o produto financeiro escolhido era garantido e que nunca perderia, pois estariam atentos e sempre a reestruturar.
Apenas mais tarde, quando percebeu que estava a perder dinheiro e pediu a reestruturação da aplicação, a autora teve noção de que o investimento havia sido feito num produto alavancado.
O aludido promotor da ré procedeu à reestruturação do investimento num novo produto complexo, denominado “N... – ... Dez. 2015”, também alavancado, o qual implicou uma transferência adicional de 7.000,00 € e a celebração, sem a autora ter essa consciência, de um contrato de mútuo com a ré.
A autora imputa à ré a violação do dever de informação que sobre si impendia, enquanto intermediária financeira de crédito, a qual a fez incorrer em erro, levando-a a investir em produtos complexos, que não compreendia e que eram desadequados ao seu perfil de investidora conservadora.
O montante peticionado corresponde aos valores perdidos com as aludidas aplicações – 49.291,65 € e 7.000,00 €.
Devidamente citada a ré contestou, excepcionando a prescrição do direito da autora, por terem decorrido mais de dois anos desde a data em que esta tomou conhecimento da conclusão dos negócios e dos seus termos, de acordo com o art.º 324.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários (CVM), e por impugnação, invocando ter a autora tido conhecimento cabal dos produtos subscritos e dos riscos inerentes, que aceitou.
A ré suscitou ainda a intervenção principal da seguradora “A... Limited – Sucursal em Portugal”, alegando que, por força da subscrição de dois contratos de seguro, esta responde solidariamente consigo pelos danos que lhe são imputados pela autora, constituindo-se na obrigação de a ressarcir nos mesmos termos em que a ré o tenha de fazer.
A autora respondeu à excepção de prescrição, pugnando pela sua improcedência.
Admitida a intervenção requerida pela ré, veio a interveniente, actualmente designada “A... S.A. – Sucursal em Portugal” apresentar a sua contestação, invocando, desde logo, a sua ilegitimidade processual passiva para figurar como parte principal. Mais invocou que os danos cujo ressarcimento é pedido pela autora não se encontram cobertos pelos contratos de seguro celebrados com a ré; e que inexiste qualquer violação dos deveres de informação por parte da ré relativamente à autora.
Proferido despacho saneador, foi a Interveniente julgada parte legítima, tendo sido determinado o prosseguimento do processo com a mesma.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“III – DISPOSITIVO Por todo o previamente exposto, julga-se parcialmente procedente a presente acção e, em consequência, decide-se: A) Condenar a R. “Banco 1... – Sucursal em Portugal” a pagar à A., AA, a quantia de 44.671,65 € (quarenta e quatro mil seiscentos e setenta e um euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% (ou outra que legalmente venha a ser fixada), contados desde a data de citação até efectivo e integral pagamento; B) Condenar a R. “Banco 1... – Sucursal em Portugal” a pagar à A., AA, os valores a esta cobrados a título de juros, comissões e outros encargos relacionados com os contratos de mútuo aludidos em 18 e 45 dos Factos Provados, a liquidar no correspondente incidente, com o limite máximo de 11.620,00 € (onze mil seiscentos e vinte euros); C) Condenar a Interveniente “A... S.A. – Sucursal em Portugal” a pagar solidariamente à A., AA, os valores aludidos em A) e B), deduzidos do montante de 25.000,00 € (vinte e cinco mil euros), correspondente à franquia contratual; D) Condenar a R. “Banco 1... – Sucursal em Portugal”, no pagamento das custas correspondentes ao pedido liquidado (correspondente a 80% do total), cabendo à Interveniente “A... S.A. - Sucursal em Portugal” suportar solidariamente metade deste valor; As custas da parte do pedido referente à condenação ilíquida (correspondente a 20% do total), serão a suportar provisoriamente pela A. AA, pela R. “Banco 1... – Sucursal em Portugal” e pela Interveniente “A... S.A. - Sucursal em Portugal”, na proporção de metade para a primeira e metade para as duas últimas, procedendo-se a rateio definitivo após a liquidação aludida em B).
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Registe e notifique.”
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Inconformada com esta decisão, a interveniente principal dela interpôs recurso, e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): “VI. CONCLUSÕES
1. A Interveniente não se conforma com a sentença condenatória proferida, por entender que o Tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova produzida e que, em consequência, errou no julgamento de facto e, subsequentemente, na aplicação do direito, tanto no que à pretensão da Autora diz respeito, como quanto à apreciação feita ao contrato de seguro celebrado entre o Réu e a Interveniente. 2. Em primeiro lugar, no que concerne à pretensão da Autora, o Tribunal a quo deu como provado, nos factos 3 e 18, que o valor de € 50.000,00 inicialmente investido era capital próprio da Autora, que lhe tinha adveio de aforro e doações feitas pelos seus pais. 3. Todavia, da prova produzida resultou exatamente o contrário, isto é, que o dinheiro investido no Banco 1..., não proveio de capitais próprios da Autora, mas sim da sua irmã, CC. Em concreto, tal resultou:
(i) Das declarações de parte da Autora, em que esta confessou que os € 50.000,00 inicialmente investidos foram, na verdade, retirados pela sua irmã, CC, de uma conta conjunta de ambas. (Declarações de parte prestadas a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 0221014102108_5742514_2870507 e 20221014102455_5742514_2870507 das 00:00:01 às 01:18:40). (ii) Do depoimento do promotor BB, que acompanhou a subscrição dos produtos e que esclareceu que, desde o início da relação contratual, lhe foi transmitido que o dinheiro era de CC, irmã da Autora. (Depoimento prestado a 11/11/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª20221111144543_5742514_2870507, das 14:45:33 às 17:12:21). (iii) Do depoimento de DD, gestora bancária, que foi perentória a afirmar não ter qualquer de que a Autora era apenas titular da conta, e não do dinheiro.(Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014160014_5742514_2870507 das 00:00:01 às 00:55:15) 4. Razão pela qual os factos 3 e 18 da matéria de facto provada, este último na parte em que refere que “o referido produto foi constituído com € 50.000,00 de capitais próprios por parte da Autora”, devem passar a constar do elenco de factos não provados. 5. E deve ainda ser aditado como provado o seguinte facto: “O valor de € 50.000,00 inicialmente investido proveito de capitais próprios de CC, irmã da Autora.” 6. Uma vez que o dinheiro era de CC e que, como a própria Autora esclareceu (Declarações de parte prestadas a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 0221014102108_5742514_2870507 e 20221014102455_5742514_2870507 das 00:00:01 às 01:18:40), foi de CC que partiu a decisão de investimento, nunca poderia ser julgado provado o facto n.º 4, na parte em que se refere que foi a Autora quem “pediu ajuda à sua irmã CC”. 7. Resultou igualmente do acervo probatório, nomeadamente do depoimento da própria CC, que os € 7.000,00 aplicados no segundo produto eram também seus, e não da Autora (26 Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014141436_5742514_2870507, das 00:00:01 às 01:44:20). 8. Pelo que, deve ser aditado à matéria provada o seguinte facto: “A totalidade do capital investido pertencia a CC, e não à Autora.” 9. Note-se que, todo o comportamento de CC, descrito pela Autora (Declarações de parte prestadas a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 0221014102108_5742514_2870507 e 20221014102455_5742514_2870507 das 00:00:01 às 01:18:40), pela própria CC (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014141436_5742514_2870507, das 00:00:01 às 01:44:20) e pelas testemunhas BB (Depoimento prestado a 11/11/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221111144543_5742514_2870507, das 14:45:33 às 17:12:21) e DD (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014160014_5742514_2870507 das 00:00:01 às 00:55:15) confirmam que esta se comportou como proprietária do dinheiro desde o início, partindo de si a decisão de investimento, a escolha dos produtos, todos os contactos feitos com o Réu Banco 1... e as movimentações da conta em que eram recebidos os lucros do investimento e que eram transferidos para contas da mesma. 10. O que demonstra que a Autora se limitou a figurar como parte formal num negócio do qual não era materialmente a verdadeira interessada. 11. Razão pela qual nos termos do disposto no art. 412.º do CPC, deverá ser aditado à matéria dada como provada, o seguinte facto: “A Autora foi mera testa de ferro da sua irmã, verdadeira titular do interesse em causa.” 12. O que leva, necessariamente, à conclusão, de que a Autora não sofreu qualquer dano, requisito necessário da obrigação de indemnizar, pelo que não estão preenchidos os requisitos cumulativos da responsabilidade civil. 13. Mas, ainda que o dinheiro investido não fosse de CC, o que não se concede, mas se admite por mera cautela de patrocínio, o facto é que esta se apresentou, perante o Banco 1..., como a titular do capital, como resultou provado: (i) Do depoimento da própria CC (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014141436_5742514_2870507, das 00:00:01 às 01:44:20);. (ii) Do depoimento de BB (Depoimento prestado a 11/11/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221111144543_5742514_2870507, das 14:45:33 às 17:12:21); (iii) Do depoimento de DD (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014160014_5742514_2870507 das 00:00:01 às 00:55:15); (iv) Das comunicações juntas com as ref.ªs Citius ...98 de 25/10/2022, ...81 de 09/11/2022, e ...21 de 11/11/2022. 14. Pelo que, para o Réu Banco 1..., CC era a verdadeira titular dos direitos subjacentes aos contratos e foi a esta que todas as explicações foram dadas, mesmo quando a Autora estava presente, ao que esta última não se opôs. 15. Ora, o Tribunal a quo deu como provado que CC não tinha formação bancária ou financeira (facto provado 4). 16. Todavia, da prova produzida resultou que CC tem uma licenciatura, experiência em investimentos e suficiente literacia financeira para compreender os atos que a sua irmã, a seu mando, estava a praticar. Isso mesmo resultou: (i) Do depoimento de EE (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014114946_5742514_2870507) de 00:00:01 às 00:43:30); (ii) Das comunicações juntas com as ref.ªs Citius ...98 de 25/10/2022, ...81 de 09/11/2022, e ...21 de 11/11/2022. 17. Razão pela qual tão pouco corresponde à verdade que a irmã CC “também não tinha formação bancária ou financeira e que questionou pessoas suas conhecidas no sentido de lhe aconselharem algum banco [art.º 4.º da p.i.].” 18. Uma vez que a decisão do Tribunal a quo se baseou na imagem que foi artificialmente criada, da autora como uma pessoa simples, com baixo nível de escolaridade e até com evidentes limitações cognitivas, que foi levada a investir todas as suas poupanças em produtos de risco, demonstrada que se encontra a falsidade desta imagem, a alteração da matéria de facto nos termos requeridos terá inevitavelmente de afetar toda a demais apreciação que foi feita da lide e que culminou com a decisão judicial ora recorrida. 19. O Tribunal a quo deu como provado que a Autora sempre clarificou que só queria investimentos com capital garantido (facto n.º 12) e que tal lhe foi assegurado por BB (facto 14) e como não provado que a Autora pretendia uma remuneração superior à praticada nos depósitos a prazo, sabendo que só o conseguiria com o investimento em produtos que implicassem um acréscimo de risco (alínea a) dos factos não provados). 20. Sucede que, da prova documental junta aos autos pelo Réu Banco 1... resulta evidente que, desde o início da relação contratual entre as partes, a Autora subscreveu produtos financeiros de risco, e a própria confirmou em juízo que assinou todos os documentos e manuscreveu as declarações deles constantes. 21. Pelo que não existe qualquer razão, nem foi produzida qualquer prova, para que pudesse ser dado como provado que a Autora deixou claro que só queria investimentos sem riscos, o que terá de ter como consequência que o facto provado n.º 12 seja considerado como não provado. 22. E não só a Autora nunca clarificou que pretendia investimento sem risco, como o promotor BB garantiu aos autos que comunicou à Autora (e à sua irmã) a possibilidade de perda de capital (Depoimento prestado a 11/11/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221111144543_5742514_2870507, das 14:45:33 às 17:12:21), pelo que em face deste depoimento e inexistindo qualquer prova credível em sentido contrário, deverá o facto 14 da matéria de facto provada passar a constar do elenco de factos não provados. 23. Por fim, no que diz respeito ao desidrato da Autora em obter uma remuneração superior à normal de mercado, mal se compreende que tal não tenha sido julgado como provado pelo Tribunal a quo, uma vez que através dos depoimentos de CC (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014141436_5742514_2870507, das 00:00:01 às 01:44:20), BB (Depoimento prestado a 11/11/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221111144543_5742514_2870507, das 14:45:33 às 17:12:21), EE (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014114946_5742514_2870507) de 00:00:01 às 00:43:30) e DD (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014160014_5742514_2870507 das 00:00:01 às 00:55:15) ficou claro que o objetivo da Autora (formal e material) era a maximização de lucros, nomeadamente através da obtenção de uma taxa de juro de 8%, claramente acima da normalmente praticada no mercado, 24. Razão pela qual deverá o facto a) da matéria de facto não provada passar para o elenco dos factos provados. 25. Sendo certo que a alteração dos factos 12 e 14 para o elenco dos factos não provados e da al. a) para o elenco dos factos provado, sempre terá de ser ditada por todas as regras da experiência comum que inevitavelmente obrigam à conclusão de que a narrativa apresentada pela Autora não é minimamente credível. 26. Nos factos provados 27, 53 e 54, o Tribunal a quo considerou que os documentos contratuais nunca foram disponibilizados nem lidos pela Autora. Todavia, o contrário resulta provado dos seguintes elementos: (i) Toda a documentação junta com a contestação do Banco 1... encontra-se assinada e manuscrita, pela Autora, sem que tenha sido feita contraprova que infirmasse o seu teor, assinatura ou vontade; (ii) Das comunicações juntas por com as ref.ªs Citius ...98 de 25/10/2022, ...81 de 09/11/2022, e ...21 de 11/11/2022 resulta que a documentação não só foi disponibilizada, como foi lida e que a Autora (formal e material) teve oportunidade de formular pedidos de esclarecimentos. 27. Razão pela qual os factos provados 27, 53 e 54, nos quais o Tribunal considerou que os documentos nunca foram disponibilizados nem lidos pela Autora, devem passar a constar do elenco de factos não provados. 28. A alteração destes factos não só demonstra que não é verdade que a Autora tenha assinado de cruz e sem qualquer explicação, tal como evidencia que tão pouco é verdade que a Autora não tenha tido conhecimento exato da natureza dos produtos que estava a subscrever, como considerou o Tribunal a quo nos factos provados 29, 33, 38 e 55 e nos factos não provados d), e), f) e q). 29. Com efeito, a conjugação das comunicações juntas por com as ref.ªs Citius ...98 de 25/10/2022, ...81 de 09/11/2022, e ...21 de 11/11/2022, com o depoimento do promotor BB (Depoimento prestado a 11/11/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221111144543_5742514_2870507, das 14:45:33 às 17:12:21). da gestora DD (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014160014_5742514_2870507 das 00:00:01 às 00:55:15) e os extratos juntos com a Contestação do Réu (Doc. ...0 da Contestação do Banco 1...) obrigam a concluir que a verdadeira investidora, CC, estava perfeitamente ciente da natureza dos produtos subscritos, nomeadamente no que concerne ao contrato de mútuo. 30. O que exige que os factos provados 29, 33, 38 e 55 deverão passar a constar do elenco de factos não provados e os factos não provados d), e), f) e q) deverão passar para o elenco dos factos provados. 31. E ainda que a Autora tivesse assinado e manuscrito as declarações sem perceber o seu alcance – o que não se aceita –, bastava-lhe ter tirado tempo para verificar os extratos das contas à ordem, onde vinha repercutida a sua situação, incluindo dos produtos financeiros subscritos, nomeadamente onde constavam as saídas de dinheiro para pagamento das prestações do mútuo que havia contraído. 32. Relativamente ao 2.º produto subscrito, “N...”, FF explicou que as clientes sabiam que produto era e o funcionamento do mesmo, apesar de terem ficado desagradadas com a evolução do mesmo (Depoimento prestado a 14/10/2022, registado no sistema Habilus com a ref.ª 20221014160014_5742514_2870507 das 00:00:01 às 00:55:15). 33. Pelo que, a Autora teve conversas, quer com o promotor BB quer com a gestora~DD, com informações sobre os produtos subscritos, os ativos subjacentes, as flutuações dos mesmos – que eram acompanhadas através dos extratos-, estando perfeitamente esclarecida sobre a natureza dos mesmos e consciente do risco de perda de capital. 34. Razão pela qual deverão os factos provados 31, 32, 33, 38, 53, 54, 55 e 58 passar a constar do elenco de factos não provados, e os factos h), i), q) e r) passar para o elenco dos factos provados. 35. Ainda que assim não se entenda, no que não se concede, o desconhecimento da Autora relativamente aos produtos subscritos em que investiu é apenas imputável à mesma, que confiou todo o processo de subscrição dos produtos na sua irmã, delegando na mesma as conversações com os promotores/gestores bancários, a escolha dos investimentos, o acompanhamento da evolução dos produtos e até a aplicação dos respetivos rendimentos. 36. Por relevante, cumpre salientar que todos os produtos e documentos que são vendidos em Portugal são escrutinados pela CMVM, que revê os boletins de subscrição e os documentos com informação essencial ao investidor. 37. Não se trata, assim, de clausulado geral com letras pequeninas destinadas a omitir informação dos pequenos aforradores, mas sim de produtos com validação pública, cujas páginas contêm letras garrafais com pontos de exclamação a vermelho e que carecem de declarações manuscritas pelos subscritores. 38. Não tendo a Autora satisfeito o desidrato probatório fixado pelo Supremo Tribunal de Justiça o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 8/2022. 39. Por tudo, é forçoso concluir que a Autora sabia bem quais as características inerentes aos produtos que subscreveu junto do Banco e tinha plena consciência que para obter remuneração superior à praticada nos depósitos a prazo, teria de fazer um investimento com um acréscimo de risco, o qual se dispôs a assumir. 40. No decurso da evolução dos produtos a Autora, como muitos investidores de produtos de risco, viu com desagrado o resultado obtido e, inconformada, propôs a presente ação judicial. Contudo, trata-se de um risco que a Autora se dispôs a assumir, pelo que não pode agora ser a entidade bancária obrigada ao pagamento de uma compensação indevida. 41. Em face do exposto, deve a decisão ora recorrida ser revogada e substituída por uma outra que, alterando a matéria de facto ora impugnada, julgue a ação improcedente, por não provada e, em consequência, absolva a Interveniente, ora Apelante, dos pedidos. 42. Ainda que assim não fosse, a própria Autora confessou na petição inicial que em março de 2015 já sabia que se tinham verificado perdas (A sentença errou na decisão de facto e de direito ao considerar que a responsabilidade do banco tomador do seguro pelos atos praticados pelos promotores, na qualidade de comitente, se encontra coberta pelo contrato de seguro), pelo que o prazo de prescrição sempre contará a partir daí, devendo os factos 30 e 57 da matéria de facto não provada passar a constar do elenco de factos provados. 43. Em face do exposto, o prazo de prescrição manifestamente já tinha sido ultrapassado à data da instauração da ação judicial, razão pela qual sempre terá a decisão de ser revogada e substituída por outra que julgue a ação improcedente. Sem conceder, 45. A qualidade de segurado do tomador do seguro não se pode extrair da letra do contrato, nem corresponde claramente à vontade das partes, sendo a interpretação que a sentença faz das clausulas 4.4 e 4.8 manifestamente errada, descontextualizada e contraditória com o demais clausulado e com a lógica subjacente ao tipo de contrato seguro em causa. 46. No contrato de seguro em causa o tomador do seguro apenas pretendeu segurar a responsabilidade civil dos promotores que, em representação do banco, comercializavam produtos financeiros, não tendo pretendido segurar qualquer responsabilidade sua, quer direta, quer indireta ou reflexa. 47. O contrato de seguro em causa é, assim, um contrato de seguro de grupo fechado, ou seja, cobre o risco de um conjunto de pessoas ligadas ao tomador do seguro por um vínculo que não seja o de segurar – cf. art. 76º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (RJCS). 48. Atendendo à intenção supra, as partes acordaram na alteração da redação da cláusula 4.10., adaptando a apólice àquelas que eram as necessidades das partes – ou seja, a cláusula 4.10 (que o tribunal classifica de averbamento) deve ser entendida como uma condição específica do contrato, que adapta as suas cláusulas gerais em função daquele que era o objetivo do seguro. 49. A cláusula 4.10. passou assim a excluir expressamente a Ré Banco, enquanto tomador do seguro, do âmbito de cobertura pessoal do contrato de seguro. 50. Desta alteração à cláusula 4.10 das condições gerais decorre que, toda a apólice, todas as suas cláusulas, nomeadamente as clausulas 4.4. e 4.8. em que se baseia a sentença, e que se encontram precisamente na mesma epigrafe 4. “Definições” do contrato, devem ser lidas e interpretadas à luz do disposto na cláusula 4.10. do averbamento. 51. Assim, a interpretação que a sentença pretende fazer valer de que “…o segurado é tanto a Pessoa Segura como a Sociedade, identificada esta como a Tomadora do Seguro.”, baseando-se, exclusivamente na conjugação do elemento literal constante das clausulas 4.4. e 4.8. não pode ser manifestamente acolhida por ser frontalmente contra o que as partes expressamente negociaram e contrataram. 52. A tese da sentença de que a Ré banco apesar de não caber na definição de pessoa segura, cabe na definição de segurado, não tem, pois, qualquer cabimento na letra nem na lógica do contrato, antes colidindo frontalmente com o que foi expressamente excluído pelas partes. 53. Todo o contrato, sendo um seguro de grupo, está contruído para segurar apenas responsabilidade de pessoas singulares, nomeadas como promotores e que aderem ao contrato, sendo apenas as pessoas concretamente identificadas na lista aprovada no início do contrato ou em cada renovação anual, conforme consta das atas de início e de cada renovação (Lista de promotores (Segurados) “Sul e Norte”. 54. O contrato de seguro em causa é, portanto, um contrato de seguro de grupo que apenas cobre a responsabilidade por atos praticados pelos promotores do banco constantes de uma determinada lista aprovada, não se encontrando cobertos os atos próprios do banco nem a sua responsabilidade na qualidade de comitente dos promotores. 55. Assim, caso um promotor da Ré Banco, que se encontre seguro (o que não sucede no caso concreto), pratique atos que causem danos a terceiros e a Ré Banco seja condenada a indemnizar esse terceiro, por força da sua posição de devedora solidária, na qualidade de comitente do promotor, a seguradora cobre os danos derivados da responsabilidade do promotor, mas terá de o ser em sede de direito de regresso exercido pela Ré banco contra a seguradora. 56. E o contrato de seguro só cobre tais danos na medida exata da responsabilidade do promotor que terá que ser previamente definida no âmbito das relações internas entre este e o banco, nos termos do artigo 500. nº 3 do CC. 57. Em consequência do supra exposto, deve ser alterada a decisão de facto constante do ponto 72. do elenco dos factos provados, de modo a ficar claro que, por via do contrato de seguro em discussão, apenas foi transferida para a Interveniente a responsabilidade civil dos atos dos promotores, e não a responsabilidade do banco tomador do seguro, para a seguinte redação: “72. Por via do contrato de seguro titulado pela apólice número ..., o Réu transferiu a Responsabilidade Civil emergente da prestação de serviços financeiros ou profissionais pelos promotores por si designados, para a Seguradora “A... Limited – Sucursal em Portugal”, conforme teor das apólices e clausulados juntos a fls. 348 e 370 vº e respectiva tradução de fls. 399 a 428, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais [art.º 146.º da cont. da R. “Banco 1...”].” 58. Igualmente em consequência do supra exposto, desaparecendo o fundamento pelo qual a sentença considerou existir um regime de solidariedade entre o banco e a interveniente – ser a Ré banco pessoa Segura - deve igualmente ser revogada a sentença na parte que considera que existe uma responsabilidade solidaria entre a Ré banco e a interveniente Seguradora, por falta de fundamento legal ou contratual. 59. O despacho que admitiu a intervenção da seguradora é um despacho de carácter meramente processual, não se debruçando sobre o mérito da relação entre as partes, nomeadamente sobre as coberturas do contrato de seguro. 60. Assim, tal decisão apenas tem força de caso julgado formal no que se refere à decisão de aceitação da intervenção, não vinculando a sentença que decide sobre o mérito da causa a decretar um regime de solidariedade entre a Ré Banco e a interveniente seguradora. 61. A responsabilidade pelos atos praticados pelo promotor BB não está coberta pelo contrato de seguro, dado que este cessou a sua atividade junto da Ré Banco em 25.08.2017, ou seja, antes ainda do início da vigência da apólice, a ...17, conforme decorre dos factos provados e da instrução da causa45, pelo que nunca foi incluído nas listas de pessoas seguras, nem tendo existido, por consequência, pagamento de prémio à seguradora pela inclusão deste promotor. Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, deve ser revogada a decisão recorrida, e substituída por uma outra que absolva a apelante dos pedidos pois só assim se fará JUSTIÇA!”.
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Contra-alegou a ré, terminando com as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES:
A) O recurso interposto pela Interveniente Principal visa alterar a sentença que julgou a presente ação procedente, por provada e, em consequência, condenou o Banco 1... e a referida Interveniente a “pagar solidariamente à A., AA, os valores aludidos em A) e B), deduzidos do montante de 25.000,00 € (vinte e cinco mil euros), correspondente à franquia contratual, B) Ora, e quanto interpretação que a Interveniente Principal apresenta quanto à incorreta apreciação da prova produzida, nomeadamente relativamente à pretensão da Autora e que, em consequência, errou no julgamento de facto e, subsequentemente, na aplicação do direito, o aqui Apelante concorda,naturalmente, com tais considerações. C) Por referência ao contrato de seguro titulado pela apólice número ... (aquele cuja interpretação a Seguradora coloca em causa), ficou demonstrado que o Réu transferiu a sua responsabilidade civil emergente da prestação de serviços financeiros ou profissionais pelos promotores por si designados, para a Seguradora “A... Limited – Sucursal em Portugal”, conforme teor das apólices e clausulados juntos aos autos. D) De acordo com o artigo 4.2 do referido contrato de seguro, a cobertura de responsabilidade civil abrange os danos sofridos e reclamados por terceiro (como sucede na presente acção), que sejam decorrentes de um erro profissional imputável a um segurado no exercício da sua atividade profissional de promoção de produtos financeiros. E) Por sua vez, o artigo 4.24 do contrato define os serviços profissionais que se encontram abrangidos na cobertura contratual: “a prestação ou alegada prestação, ou falha na prestação de serviços financeiros ou profissionais pela ou em nome da Companhia a um terceiro, que façam parte da sua actividade comercial e cujos serviços sejam declarados na proposta de seguro”. F) Ficou demonstrado nos autos que o contrato de seguro (titulado pela apólice número ...) em apreço tem natureza facultativa e teve o seu início em 01.10.2017, portanto, após a subscrição dos Produtos Financeiros Complexos por parte da Autora (em 2012 e 2015) em consequência da violação do dever de informação pelo representante do Banco Réu. G) De igual forma, tem-se como assente que a pessoa que em representação do Banco Réu, promoveu a venda dos produtos financeiros, cuja perda fundamenta o pedido indemnizatório da Autora foi o Dr. BB. H) Este promotor encontrava-se adstrito à agência de promotores externos do Banco Réu de ..., como Pessoa Segura, por via da definição constante do artigo 4.10, sendo que a Interveniente Principal não logrou demonstrar qualquer exclusão relativamente a esta pessoa. I) Aliás, este tema nem acaba por ser controvertido, na medida em que a Interveniente Principal, sabendo daquela que é a sua fragilidade nesta matéria, acaba por não se socorrer do depoimento de qualquer testemunha por si arrolada (situação diversa do que ocorre no restante articulado por si apresentado), nem tão pouco fundamenta aquilo que é a sua interpretação em quaisquer documentos que tenham sido juntos aos autos (nomeadamente, as referidas listas, que não foram juntas por si aos autos). J) Deste modo, e sem prejuizo da apreciação que o Tribunal ad quem fará sobre a primeira parte do douto Recurso da Interveniente Principal (o qual o Banco Réu subscreve na integra), a interpretação que o Tribunal a quo apresentou sobre cobertura do contrato de seguro não merece qualquer censura (antes pelo contrário). K) Pelo que a Interveniente “A...” está obrigada a pagar à A., solidariamente com a R., o montante que a esta caiba no âmbito da presente acção, deduzido, contudo, da parte correspondente ao valor da franquia contratualizada, ou seja, 25.000,00 €, que caberá ao aqui Réu pagar exclusivamente. L) Por fim, como referiu e bem o douto Tribunal a quo, “ambas as contraentes estão de acordo em considerar o âmbito temporal delimitado na modalidade de Claims made basis ou sistema da cobertura anterior ou retroactiva, conforme resulta da parte introdutória do clausulado do contrato. Como tal, a cobertura do aludido contrato está temporalmente circunscrita às reclamações efectuadas durante a vigência do contrato, ainda que os factos geradores de danos tenham ocorrido antes da data do início de vigência daquele, apenas ficando excluída a cobertura se o segurado já tivesse, nessa data, conhecimento dos mesmos (artigo 3.12).” M) Pelo que deverá ser negado provimento ao recurso apresentado pela recorrente, no que se reporta à interpretação diversa do referido contrato de seguro. Em face do supra exposto, bem decidiu o tribunal a quo na sentença recorrida, devendo o mesmo manter-se nos precisos termos em que foi proferido, com todas as consequências legais, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!”.
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Também a autora contra-alegou, terminando com as seguintes conclusões: VI) DAS CONCLUSÕES
1. Sucintamente o recurso levanta três questões: (i) a propriedade do dinheiro investido em produtos do recorrido, có-reu, Banco 1... (doravante, Banco 1...), (ii) o conhecimento e as capacidades que a irmã da recorrida, Autora (doravante, A) teria para ser capaz de compreender o(s) produtos em que a sua irmã investiu e (iii) o cumprimento (ou não) por parte do Banco 1..., dos deveres pré-contratuais de informação. 2. Mais se levanta a questão da prescrição – dependente da procedência da impugnação da decisão de facto. 3. Ademais, e nas relações com o Banco 1..., o presente recurso visa uma interpretação do contrato de seguro dos autos distinta da que foi efectuada pelo Tribunal a quo, já que, no entendimento da recorrente, o Banco 1... não pode ser considerado “segurado”. 4. Como infra se explanará e demonstrará, o presente recurso não pode proceder, já que o Meritíssimo Julgador do Tribunal a quo fez uma correcta e incisiva apreciação da prova (testemunhal e documental) produzida, acompanhada de uma pormenorizada e descritiva fundamentação da sua decisão de facto.
DO ENQUADRAMENTO PRÉVIO REALIZADO PELA RECORRENTE
5. A recorrente vem, nesta sede, invocar factualidade nova que, ainda por cima, não demonstra, já que nem se dá ao trabalho de identificar, correctamente, as ditas 28 acções judiciais… 6. Esta extemporânea alegação é contrária aos princípios da concentração da defesa e da estabilidade da instância, motivo pelo qual não deverá ser considerada. 7. É só infeliz que a parte se tenha dado ao trabalho de mencionar outras acções judiciais em que os RR tenham sido parte (sem que se saiba se as mesmas transitaram em julgado), com o intuito manifesto de desvalorizar, por comparação, o trabalho efectuado pelo Meritíssimo Julgador – e pelas partes e mandatários - nos presentes autos, tanto mais que, por coincidência constatada e conversada em sede de julgamento, aquele integrou o Tribunal Colectivo que julgou (e condenou) alguns dos antigos agentes e/ou funcionários e/ou promotores do balcão de ... do R Banco 1.... A recorrente parece ter-se olvidado de mencionar essas acções penais… 8. Enfim, cada caso é um caso e tanto a A, como a signatária, desconhecem essas ditas acções judiciais cíveis, alegadamente julgadas improcedentes, pelo que se limitarão – como processualmente lhes compete – a analisar o caso dos autos.
I – “DA A COMO TESTA DE FERRO”
9. É rotundamente falso que a A tenha confessado que os € 50.000,00 investidos fossem da sua irmã, porque não o são. 10. Como bem esclarece a sentença, é manifesto que a A seria incapaz de utilizar qualquer aplicação ou site bancário e, muito menos, de perceber extractos bancários. Assim, a irmã apenas fez a transferência, do dinheiro da A, de uma conta conjunta, para a conta aberta no R Banco 1..., nas palavras da A, para a “ajudar”. 11. Inquirida pelo Meritíssimo Julgador, a A refere que, quando era preciso falar com o banco, “era a minha irmã que me ajudava a fazer” (vd. pp. 18 e 20 das alegações de recurso, onde foram parcialmente transcritas as declarações de parte da A). 12. A irmã, testemunha CC (cujo depoimento foi parcial e selectivamente transcrito pela R recorrente) usa a expressão “eu tive de apoiá-la”. 13. Não resulta de qualquer prova – testemunhal ou documental – que o dinheiro investido fosse propriedade da irmã da A, tanto mais que a R recorrente, apesar de mencionar que “ficou provado” que o capital era da irmã da A, não indica um qualquer meio probatório que justifique aquela afirmação. 14. A fundamentação da decisão de facto, supra citada, é claríssima quanto a esta questão, pelo que para a mesma se remete. 15. A recorrente transcreve, parcialmente, o depoimento da testemunha DD, nele se alicerçando para (tentar) demonstrar que o dinheiro pertencia à irmã da A, mas parece esquecer-se doutas palavras da sentença, que se debruçam sobre esse depoimento: “para além de se ter tratado de um depoimento muito automatizado, claramente influenciado pela anterior vinculação da testemunha à R. – e, actualmente, à entidade bancária sucessora daquela – e pela sua experiência profissional e não tanto pela memória do que realmente terá ocorrido no caso concreto, foi visível uma situação de litígio e tensão com a irmã da A., revelado por esta, o que tudo contribuiu para retirar alguma credibilidade ao depoimento.” (vd. p. 27 da sentença – destaques nossos. 16. Em suma: não foi produzida qualquer prova capaz de demonstrar o que resulta do alegado e do demonstrado documentalmente: o capital investido pertencia à A. A intervenção da sua irmã foi uma ajuda, como resulta das regras de experiência comum e que dispensa outras apreciações.
E independentemente disso:
II – DO CONHECIMENTO DA IRMÃ DA A SOBRE O(S) INVESTIMENTO(S) E O(S) CRÉDITO(S):
17. A este propósito, importará relembrar/rever o depoimento prestado pela testemunha EE, gestor bancário, que a sentença em crise resume assim: Por forma a tentar entender o que se estava a passar, a A. e a sua irmã contactaram a testemunha EE, gestor bancário do Banco 2... desde há 7 anos, que declarou ter sido gestor de conta da A. no passado. Informou que, em data anterior a 2020, foi questionado pela irmã da A. para perceber que tipo de investimento esta tinha feito no “Banco 1...”. No momento em que foi questionado, a irmã da A. já tinha consigo os documentos de subscrição. Analisou a documentação e explicou-lhe o tipo de investimento. Percebeu que elas não estavam esclarecidas sobre o produto subscrito e que não tinham noção de que havia um crédito associado. Tratava-se de um produto financeiro complexo (...), para investidores com perfil e experiência para tal. Não se recorda especificamente do que é que tinha associado a esse ..., mas recorda-se de que só numa segunda fase é que se apercebeu de que havia um crédito associado. Admitiu que, nestas situações, as pessoas só se questionam quando as coisas não correm como esperado. Deu notícia de que nem a A. nem a sua irmã alguma vez haviam feito este tipo de investimento consigo, acrescentando que, a seu ver, elas não tinham perfil para esses produtos. Elas só faziam depósitos a prazo e contas-ordenado. Os produtos subscritos pela A. na R. “Banco 1...” eram muito específicos, para clientes com conhecimentos, perfil e experiência prévia. (destaques e sublinhados nossos) 18. Das declarações daquela testemunha, resulta que nem a A, nem a sua irmã CC tinham, sequer, percebido que o investimento realizado tinha um crédito associado. 19. Note-se um pormenor importante a este propósito: as prestações para pagamento do crédito eram anuais; só se venceram três prestações que foram pagas (automaticamente, i é, sem intervenção manual da A ou da irmã) com o dinheiro dos juros. 20. O pagamento anual das prestações, nos extractos bancários, revelavam-se diluídas, ou seja, qualquer leigo poderia entendê-las como despesas bancárias, sem perceber que se tratava do pagamento de um crédito. 21. Ou seja, não é pelo facto de ter formação superior, e de ser uma pessoa instruída, e com capacidades intelectuais muito superiores às da irmã, que a dita CC tem de ter compreendido, pela análise dos extractos bancários, que o produto era “de risco” e que a irmã AA (A) havia constituído um crédito.
III) DO CUMPRIMENTO (OU NÃO) POR PARTE DO Banco 1..., DOS DEVERES PRÉ-CONTRATUAIS DE INFORMAÇÃO
22. Antes de mais, chama-se a atenção para o depoimento da testemunha BB, promotor do Banco 1... responsável pela contratação dos produtos dos autos, por parte da A e para o e-mail data de 29.11.2012 (junto em audiência de julgamento com a ref.ª ...81) 23. Eis o e-mail de resposta ao e-mail transcrito nas alegações de recurso (p. 35) em que a testemunha CC afirma ter lido com atenção o documento de informação do produto a aplicar: “Mas permita-me discordar do termo aventureira. A aplicação é extremamente segura porque é emitida e controlada na íntegra pelo Banco 1.... O Banco garante-lhe segurança total no seu investimento porque pode terminar com a operação a qualquer momento sem perda do capital investido”. (destaque nosso) 24. Remete-se, mais uma vez, e pela sua clareza, para a fundamentação da decisão de facto, nomeadamente, no que respeita à apreciação dos depoimentos das testemunhas BB e GG. 25. Resumidamente, e como bem faz notar o Meritíssimo Julgador, o BB, promotor do Banco 1... responsável pela venda dos produtos à A, acabou por assumir a sua responsabilidade no desencadear desta situação, bem explicando como apresentava o produto, e como transmitia a falsa sensação de segurança aos seus clientes, admitindo que não explicou a documentação assinada. 26. “Admitiu que nunca disse aos clientes que o capital era garantido, mas disse sempre disse que era seguríssimo, porque o “Banco 1...” poderia reembolsar o capital sem prejuízo para os clientes. (…) Apresentava isto como uma garantia aos clientes.” 27. As próprias expressões e explicações dadas pelas testemunhas BB e HH, os então funcionários/promotores do Banco 1... reflectem o teor da própria petição inicial, cuja terminologia foi usada pela signatária no uso das palavras da sua constituinte, espelham, por si só, a sensação de segurança (de “capital garantido”) que foi transmitida à A. 28. GG, à data, gerente da agência de ... do Banco 1..., elucidou, de forma particularmente clarividente, como actuava o promotor que vendeu os produtos à A, i é, como foi a fase pré contratual (designadamente, no que toca aos deveres de informação), das vendas dos autos: “revelou ter recebido instruções da direcção do “Banco 1...” para ajudar os clientes do BB, de .... Foram-lhe dadas instruções específicas para avaliar o nível de conhecimento dos produtos dos clientes daquele porque o BB tinha uma quantidade anormal de venda deste tipo de produtos, cujos clientes estavam em perda. (…) Afirmou, por fim, que o Senhor BB vendia os produtos do “Banco 1...” aos seus clientes sobretudo com crédito a alavancar o investimento daqueles, numa lógica de comissionista. Quanto mais vendesse e mais crédito (alavancagem) o “Banco 1...” concedesse, mais ele ganhava. Em sua opinião, o Senhor BB tinha vendido o produto de 2012 (“... Dezembro de 2015”) numa lógica de o próprio ganhar dinheiro (comissões). Ele tinha uma forma de vender que a testemunha GG considerou não ser normal: por cada 10 que a agência desta testemunha vendesse, o Sr. BB vendia 100. Reafirmou que isto não era normal. Admitiu ter tido algumas situações em que os clientes do Senhor BB chamavam ao empréstimo (alavancagem) do “Banco 1...” uma “parceria”. Muitos clientes lhe disseram que o Sr. BB lhes havia afirmado que o “Banco 1...” iria intervir se os índices descessem, evitando perdas. Era assim que ele apresentava o produto. Deste depoimento foi possível extrair a ilação de que, em 2015, o “Banco 1...” terá incumbido a testemunha GG de ajudar o BB porque suspeitaria dos métodos deste de venda de produtos financeiros. De resto, a testemunha II, bancário, que exerceu funções no “Banco 1...” durante cerca de 20 anos, até 2019, nomeadamente na rede de distribuição daquela instituição, trouxe a informação de que o Sr. BB terá deixado o Banco por práticas comerciais indevidas, algumas das quais relacionadas com falsificação de assinaturas.” 29. EM SUMA: não só é falso que se tenha provado que foram prestadas (adequadamente) as informações devidas, como se provou o seu inverso: todos os procedimentos legalmente previstos para evitar situações com a dos autos foram ostensivamente desrespeitados: atestados presenciais de assinaturas falsos, falsificação dos questionários aptos a aferir o perfil do investidor, advertências assinadas sem qualquer explicação, duplicados nunca entregues, zero informação útil prestada! 30. A decisão da matéria de facto deve manter-se integralmente, já que não se verifica qualquer erro de julgamento, muito menos “grosseiro”, como, unanimemente, a jurisprudência entende ser exigível.
IV) DA PRESCRIÇÃO 31. A procedência da prescrição invocada pela recorrente dependeria, nesta fase, da procedência da impugnação da matéria de facto o que, como supra exposto, não se admite. 32. Como resultou demonstrado, só em finais de 2018 a A recebeu a documentação contratual pertinente, só nesse momento tendo tomado conhecimento de que, inter alia, havia celebrado com a R. contratos de mútuo associados aos ... subscritos.
V) DO CONTRATO DE SEGURO 33. A interpretação efectuada pelo Julgador, a este propósito, parece ter sido a mais adequada à luz do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais e do disposto no art. 238º/1 do CC. 34. A interpretação que é feita pela recorrente esvazia de conteúdo (e de interesse comercial) o contrato celebrado, pelo que não poderá ser admitida. 35. Ademais, o argumento de que o contrato celebrado não cobre os actos praticados pelo promotor BB é, in casu, irrelevante, já que se discute a responsabilidade do próprio Banco e não do promotor. 36. Este argumento só poderia colher se o anterior colhesse também, i é, se se considerasse que o banco não é “segurado”. 37. Assim, também quanto a este tema deverá o presente recurso improceder.
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TERMOS EM QUE:
Deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a sentença sob censura, com o que se fará a acostumada JUSTIÇA!”.
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O recurso foi admitido, como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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Já nesta instância, veio a interveniente/apelante requerer a não admissão das contra-alegações apresentadas pela ré, ao que esta não respondeu.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.
Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC) –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem de precedência lógica, consistem em:
1. Como questão prévia, da admissibilidade das contra-alegações apresentadas pela ré;
2. Saber se a interveniente/apelante nestes autos, assume a posição de devedora solidária, para poder ser responsabilizada e condenada no âmbito da presente acção;
3. Em caso de resposta positiva à questão anterior, conhecer da impugnação da matéria de facto;
4. Em caso de resposta positiva às duas questões anteriores, saber se deve a sentença apelada ser revogada/alterada, decidindo-se pela improcedência da acção, no que à apelante diz respeito.
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III. Fundamentação de facto.
Os factos que foram dados como provados na sentença sob recurso são os seguintes: “1. A demandante é uma pessoa humilde e trabalhadora, e exerce a profissão de caixa – atendimento ao público [art.º 1.º da p.i.]. 2. A demandada dedica-se, além do mais, à actividade bancária [art.º 2.º da p.i.]. 3. Em finais de 2012, a demandante quis investir € 50.000,00 (cinquenta mil euros), resultante de aforro e doações feitas pelos pais [art.º 3.º da p.i.]. 4. Contudo, uma vez que não tem qualquer formação bancária e nunca havia feito um único investimento, pediu ajuda à sua irmã CC, que também não tinha formação bancária ou financeira e que questionou pessoas suas conhecidas no sentido de lhe aconselharem algum banco [art.º 4.º da p.i.]. 5. Foi-lhes aconselhado o Sr. BB, promotor da demandada, adstrito à agência de promotores externos da demandada de ... [art.ºs 5.º da p.i. e 2.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 6. e que sempre actuou, no âmbito dos factos em causa, como representante/agente da demandada [art.º 6.º da p.i.]. 7. Na circunscrição territorial de ..., o Banco 1... não operava por via daquilo que é uma normal agência bancária com trabalhadores internos, mas antes, por via de promotores externos, com os quais tinha celebrado um contrato de promoção [art.º 3.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 8. A demandante é de ..., nunca tinha aberto qualquer conta em ... e nunca chegou a entrar, sequer, no balcão de ..., já que o Sr. BB sempre se encontrou consigo em ..., no seu local de trabalho [art.ºs 7.º e 8.º da p.i.]. 9. Assim, no exercício da sua atividade comercial, o Réu celebrou com a Autora, em 15 de Novembro de 2012, um “Contrato de Abertura de Conta de depósito à Ordem e de Intermediação Financeira” com o n.º ...68, contrato este composto por “Condições Particulares” e “Condições Gerais”, o qual se encontra junto com a contestação da R. como doc...., e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 3.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 10. Na data da abertura de conta, em 15 de Novembro de 2012, a aqui Autora assinou o documento denominado de “Questionário: Perfil de Investidor”, tendo em vista o apuramento do seu Perfil de Investidor – o qual se encontra junto com a contestação da R. como doc...., cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 38.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 11. Perante as respostas constantes do aludido “Questionário”, foi classificado pela Ré o perfil da Autora como investidor “nível 2 – Conservador” no âmbito do documento intitulado “Sugestão Personalizada de Investimento”, que se encontra junto com a contestação da R. como doc. n.º ..., cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.ºs 39.º e 40.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 12. Foi sempre clarificado pela demandante que só queria investimento sem risco, com capital garantido [art.ºs 10.º e 11.º da p.i.]. 13. O produto sugerido pelo Sr. BB e aceite pela Autora era um produto financeiro complexo denominado “... Dez.2015”, tendo sido subscrito em 15 de Novembro de 2012 e com vencimento em 24 de Dezembro de 2015 [art.º 17.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 14. Foi garantido pelo Sr. BB que “aquele investimento era garantido, nunca perderiam”; Que “estariam atentos e sempre a reestruturar o produto escolhido” [art.º 12.º da p.i.]. 15. Assim, confiando na palavra do promotor da demandada, em 15 de Novembro de 2012, a Autora investiu no seu primeiro produto estruturado denominado “... Dez.2015”, nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) Prospeto Informativo juntos com a contestação da R. como docs. ns.º ... e ..., e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.ºs 13.º da p.i. e 44.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 16. Conforme resulta da documentação contratual, o produto denominado “N... Dez.2015” era um produto com um nível de risco/perfil 5 -Agressivo, porquanto estava sujeito às cotações dos activos DJ ... 50, S&P 500 e ..., não existia garantia de remuneração ou de capital na maturidade do produto e havia a possibilidade da existência de um evento de crédito, o que daria origem a um reembolso antecipado [art.º 45.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 17. Tal como consta do “Boletim de Subscrição” onde é identificado o produto subscrito “... Dez.2015”, o valor da operação foi de € 100.000,00 (cem mil euros), tendo como prazo de vencimento 4 anos, ou seja, iniciou a sua vigência em 20.12.2012 e teria o seu termo em 24.12.2015 [art.º 46.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 18. O referido produto foi constituído com € 50.000,00 de capitais próprios por parte da Autora e os remanescentes € 50.000,00 por meio de empréstimo concedido pela ora Ré, conforme contrato de mútuo junto com a contestação da R. como doc. n.º ..., cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 47.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 19. Nos termos do aludido contrato de mútuo, e para efeitos de garantia do empréstimo concedido, foram empenhadas a favor do Banco as “... Dez.2015” [art.º 47.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 20. A Autora assinou não só o aludido contrato de mútuo, mas igualmente subscreveu uma livrança, a qual faz parte integrante da documentação do mútuo junta com a contestação da R. [art.º 51.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 21. Não obstante já ter um perfil apurado, o certo é que existia uma desadequação do mesmo e o produto aqui em crise, porquanto este último havia sido classificado como sendo o produto que exigiria um Perfil de “Nível 5 – Agressivo” [art.º 59.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 22. A Autora assinou a declaração datada de 15.11.2012, junta com a contestação da R. como doc. ..., cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 60.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 23. O produto em questão oferecia uma remuneração trimestral correspondente a uma taxa de cupão bruta de 2%, equivalente a uma TANB de 8% [art.º 61.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 24. A Autora estava ciente desta realidade, tendo assinado e rubricado toda a documentação inerente à subscrição do produto [art.º 62.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 25. O Sr. BB referiu à Autora que o valor de € 100.000,00 reflectia um investimento do próprio banco para “alavancar” o produto [art.º 23.º da p.i.]. 26. O Sr. BB deslocou-se à loja onde a demandante trabalha – ... – e apresentou-lhe os documentos, de forma muito informal e, sempre, enquanto a demandante fazia atendimento a clientes [art.º 29.º da p.i.]. 27. Nunca o Sr. BB explicou ou leu qualquer documento à demandante [art.º 30.º da p.i.]. 28. Nem deixava duplicados dos documentos assinados [art.º 30.º da p.i.]. 29. Os documentos foram assinados pela Autora num clima de confiança no Sr. BB e sem que houvesse qualquer explicação sobre os produtos [art.º 39.º da p.i.]. 30. Apenas no final de 2018 a Autora recebeu os documentos juntos com a p.i., só então tendo percebido que havia celebrado um contrato de mútuo [art.ºs 54.º da p.i. e 6.º da resposta da A.]. 31. Se a demandante soubesse que estava a contrair um empréstimo jamais teria assinado qualquer documento/contrato [art.º 57.º da p.i.]. 32. Se a Autora tivesse percebido que o “investimento” aludido em 25 era um contrato de mútuo, nunca o teria celebrado [art.º 70.º da p.i.]. 33. A A. subscreveu o produto denominado “... Dez.2015” induzida em erro pelo Sr. BB [art.º 58.º da p.i.]. 34. O produto em causa pagava trimestralmente, sendo que neste produto a Autora ganhou só em juros brutos a maquia de €10.080,00 nos termos dos seguintes pagamentos (cfr. extratos de conta juntos como doc. n.º ...): a) 22.03.2013 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros; b) 25.06.2013 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros; c) 25.09.2013 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros; d) 27.12.2013 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros; e) 25.03.2014 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros; f) 25.06.2014 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros; g) 25.09.2014 – pagamento de € 1.440,00, a título de juros [art.º 63.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 35. Tudo correu, aparentemente, bem até Março de 2015 [art.º 14.º da p.i.]. 36. Pela análise da sua conta online, a demandante percebeu que estava a perder dinheiro [art.º 15.º da p.i.]. 37. Contactou, de imediato, o Sr. BB e pediu a análise e reestruturação da aplicação [art.ºs 16.º e 17.º da p.i.]. 38. O Sr. BB, a dada altura, informou que o investimento havia sido feito num produto “alavancado”, palavra que a Autora desconhecia, e que era necessário investir num novo produto para poder “salvar” o investimento e recuperar os montantes já perdidos [art.ºs 18.º e 19.º da p.i.]. 39. Após contacto com a A., o Sr. BB apresentou-lhe um novo produto financeiro complexo para recuperar das perdas, cujo nome vieram a saber mais tarde: “N...” [art.ºs 21.º da p.i. e 17.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 40. Neste contexto, conforme se alcança do extrato junto com a contestação da R. “Banco 1...” como doc...., a Autora concordou em proceder à desmobilização antecipada do produto denominado “... Dez.2015”, em 18.05.2015, tendo-lhe sido creditado o valor de mercado referente à cotação do produto, ou seja, €62.190,00 [art.º 68.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 41. Tendo sido liquidado integralmente à Ré, em 22.05.2015, o valor mutuado aludido em 18 e 19 [doc. n.º ...]. 42. Em 14.05.2015, por indicação do Sr. BB, a Autora subscreveu o produto denominado “N... – Produto complexo”, nos termos do (i) “Boletim de Subscrição” e (ii) “Informações Fundamentais ao Investidor”, juntos com a contestação da Ré “Banco 1...” como docs. ns.º ... e ...0, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 69.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 43. O produto “N...” foi adquirido a 67% do seu valor nominal, ou seja, de € 67.000,00 (i.e. a compra das 100 notes não foi efetuada pelo valor global de € 1.000,00 por note, mas ao invés a € 670,00 por note, com um desconto inicial de 33%) [art.ºs 70.º e 73.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 44. Do documento denominado “Informações Fundamentais ao Investidor” do referido produto (doc. n.º ... supra aludido), resulta a expressão manuscrita pelo próprio punho da Autora “Tomei conhecimento das advertências” [art.ºs 71.º e 72.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 45. Do montante de €67.000,00 com que este produto foi subscrito, a Autora investiu € 17.000,00, a título de capital próprio, e €50.000,00 decorreram de um novo empréstimo concedido pela Ré, conforme contrato de mútuo junto com a contestação da Ré “Banco 1...” como doc. n.º ...1, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 74.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 46. Sendo que parte deste valor de capital da Autora foi proveniente da venda do anterior produto “... Dez.2015” – cerca de €11.590,71 – e o remanescente resultou de uma transferência da Autora, ou a pedido desta, datada de 28.05.2015, no valor de €5.460,00 [art.º 75.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 47. A Autora subscreveu uma nova livrança associada ao empréstimo [art.º 76.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 48. Nos termos do contrato de mútuo junto como doc. n.º ...1, e para efeitos de garantia do empréstimo concedido, foram empenhadas a favor do Banco as “N...” [art.º 77.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 49. O prazo de vencimento do produto “N...” era de 4 anos, 11 meses e 26 dias, ou seja, tendo iniciado a sua vigência em 26.05.2015 e teria o seu termo em 22.05.2020 [art.º 80.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 50. O produto “N...” está dependente da cotação das acções de três sociedades: I..., S A. e G... Inc. [art.º 72.º da p.i.]. 51. O aludido produto estava classificado, em termos de avaliação de conhecimentos e experiência do investidor no perfil 5, numa escala de 0 a 5. 52. O risco de perder a totalidade do capital investido é 4, numa escala de 0 a 4. 53. Nunca o Sr. BB explicou ou leu qualquer documento à demandante [art.º 30.º da p.i.]. 54. Nem deixava duplicados dos documentos assinados [art.º 31.º da p.i.]. 55. Os documentos foram assinados pela Autora num clima de confiança no Sr. BB e sem que houvesse qualquer explicação sobre os produtos [art.º 39.º da p.i.]. 56. Em 2015, a documentação contratual foi solicitada ao Sr. BB, que nunca chegou a enviá-la [art.º 53.º da p.i.]. 57. Só em finais de 2018 a Autora percebeu que havia celebrado um contrato de mútuo [art.ºs 54.º da p.i. e 6.º da resposta da A.]. 58. Se a demandante soubesse que estava a contrair um empréstimo jamais teria assinado qualquer documento/contrato [art.º 57.º da p.i.]. 59. A Autora assinou os questionários para o apuramento de Perfil de Investidor e Risco juntos com a contestação da R. “Banco 1...” como docs. ...2 e ...3, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 84.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 60. Em 2018, a Autora teve uma reunião com a gestora DD, onde foi solicitado a esta um reforço de garantias [art.º 86.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 61. Com data de 11.10.2018, a Ré enviou à Autora a carta junta com a p.i. como doc. n.º ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais [Doc.]. 62. Com data de 15.11.2018, a Ré enviou à Autora a carta junta com a p.i. como doc. n.º ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais [Doc.]. 63. Perante a performance do produto, a 21 de Dezembro de 2018 foi expedida uma carta pelo Banco Réu para a Autora, a recordar que havia sido constituído penhor sobre o instrumento financeiro denominado “N...”, e que àquela data, a garantia não preenchia os requisitos exigidos nos termos das cláusulas “...” e “...”, apresentando à data uma cotação de mercado no valor de € 46.690,00 – conforme carta junta com a contestação da R. “Banco 1...” como doc. ...4, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 95.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 64. No contexto daquela carta, foi ainda referido à Autora que, de acordo com o estipulado nas cláusulas 1.1.8 e 1.1.11 das Condições Gerais do referido contrato, e cláusulas 1.18 a) e b) das Condições Particulares, foram estabelecidas regras de acionamento de cláusulas “...” e “...”, nos seguintes termos: • “...”: o limite mínimo para o valor dos Instrumentos Financeiros indicado na cláusula 1.18(a) das Condições Particulares, abaixo do qual o BANCO poderá exigir ao CLIENTE, nos termos da cláusula 18ª das Condições Gerais, o reforço das garantias prestadas – 120% do valor do financiamento. • “...”: o limite mínimo para o valor dos Instrumentos Financeiros, indicado na cláusula 1.18(b) das Condições Particulares, abaixo do qual o BANCO poderá decretar, nos termos da cláusula 17ª das Condições Gerais, o vencimento antecipado do contrato – 110% do valor do financiamento [art.º 96.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 65. A mesma carta referia que, considerando que não se encontrava (naquela data) assegurado o cumprimento das referidas cláusulas, face ao valor actual da cotação das “N...”, era solicitado que, no prazo máximo de 10 (dez) dias, o Autor procedesse em conformidade com o contratualmente acordado, através da constituição de um reforço de garantias para o contrato em apreço [art.º 97.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 66. Tendo o Banco Réu informado a Autora que, se tal não viesse a ocorrer, seria obrigado a considerar o incumprimento definitivo do contrato e a declarar o seu vencimento antecipado, com consequente mobilização antecipada da aplicação financeira associada ao mesmo, ao abrigo das cláusulas 8ª, 12ª, 17ª e 18ª das Condições Gerais do contrato em questão [art.º 98.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 67. Com data de 28.03.2019, a Ré enviou à Autora a carta junta com a p.i. como doc. n.º ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais [art.º 99.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 68. Da referida carta foi dado a conhecer à Autora que foi acionado o penhor a favor do Banco Réu e, em 21.03.2019, foram resgatadas 100 Obrigações “N...”, do qual resultou um valor bruto de €52.780,00 (doc....4), aos quais seriam deduzidos €158,34(comissão bancária) e €6,33 (imposto de selo) [art.º 100.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 69. Desta operação resultou um valor líquido de €52.615,33, o qual, em conjunto com o saldo existente na conta à ordem (€1,82), serviu para liquidar o mútuo n.º ...62 na sua totalidade [art.º 101.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 70. Assim, efectuadas as descritas operações, a Ré deixou depositados na conta da demandante a quantia de € 708,35 [art.º 63.º da p.i.]. 71. As duas menções “Assinaturas feitas na minha presença, ..., (datas e assinaturas ilegíveis)” constantes do contrato de mútuo junto com a contestação da R. como doc. n.º ..., não correspondem à verdade [art.º 22.º da resposta da A.]. 72. Por via do contrato de seguro titulado pela apólice número ..., o Réu transferiu a sua Responsabilidade Civil emergente da prestação de serviços financeiros ou profissionais pelos promotores por si designados, para a Seguradora “A... Limited – Sucursal em Portugal”, conforme teor das apólices e clausulados juntos a fls. 348 e 370 vº e respectiva tradução de fls. 399 a 428, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais [art.º 146.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 73. A apólice referida em 72 teve o seu início em 01.10.2017 e vigorou pelo prazo de um ano, até 30.09.2018, tendo sido renovada até 15.06.2019 [art.ºs 67.º e 68.º da cont. da Interveniente]. 74. Por averbamento com vigência a partir de 10.06.2019, a R. e a Seguradora “A... Limited – Sucursal em Portugal” acordaram, além do mais, em substituir o prazo da apólice referida em 72 pelo período compreendido entre 10 de Junho de 2019 e 9 de Junho de 2025 e definir que, com efeitos a partir de 10 de Junho de 2019, a dita apólice apenas pagará os prejuízos de qualquer reclamação apresentada contra o segurado durante o prazo da apólice, conforme definido no ponto 1 do averbamento, em relação a qualquer ilícito praticado antes da data da entrada em vigor do dito averbamento [art.ºs 69.º e 70.º da cont. da Interveniente]. 75. Por via do contrato de seguro titulado pela apólice número ..., o ora Réu, transferiu a sua responsabilidade civil geral extracontratual emergente da sua atividade comercial e/ou industrial e dos seus produtos, de novo, para a Seguradora “A... Limited – Sucursal em Portugal”, conforme teor das apólices e clausulados juntos a fls. 331 a 347 vº, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais [art.º 148.º da cont. da R. “Banco 1...”]. 76. A partir de 01 de dezembro de 2018, por efeitos da cisão da A... (...), a parte seguradora nos contratos de seguro em causa passou a ser a sucursal em Portugal da A... S.A (...), Companhia de Seguros com o número ... do ... ... com sede em 35 D Avenue ..., ..., tendo assumido a denominação de “A... S.A. - Sucursal em Portugal” [art.º 8.º da cont. da Interveniente].”
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Foram considerados não provados, os seguintes factos: a) A Autora, de modo a ver concretizado o seu desiderato de obter remuneração superior à praticada nos depósitos a prazo, sabia que só o conseguiria com o investimento em produtos que implicassem um acréscimo de risco, em relação aos depósitos a prazo [art.º 11.º da cont. da R. “Banco 1...”]. b) A Autora respondeu, a 16 de Novembro de 2012, posteriormente à abertura de conta, a várias perguntas tendo em vista o apuramento do seu Perfil de Investidor [art.º 38.º da cont. da R. “Banco 1...”]. c) Perante as respostas dadas pela própria Autora, foi possível determinar o seu perfil como investidor [art.º 39.º da cont. da R. “Banco 1...”]. d) A Autora estava plenamente ciente da realidade descrita em 16, 18, 19 e 20 [art.º 49.º da cont. da R. “Banco 1...”]. e) Nesta medida, a circunstância aludida em 21 foi explicada à aqui Autora, a qual tomou conhecimento de todas as advertências que lhe foram feitas à data [art.º 60.º da cont. da R. “Banco 1...”]. f) A Autora decidiu adquirir o produto denominado “N... – Produto complexo” [art.º 69.º da cont. da R. “Banco 1...”]. g) A A. teve de entregar mais € 7.000,00 (sete mil euros) para investir no segundo produto “N... – Produto complexo” [art.º 66.º da p.i.]. h) A Autora bem conhecia e livremente assinou as condições associadas ao contrato de mútuo de 26.05.2015 [art.º 76.º da cont. da R. “Banco 1...”]. i) A Autora estava devidamente informada sobre os termos e condições da aplicação subscrita - consubstanciada nas Informações Fundamentais ao Investidor - e do mútuo contratualizado [art.ºs 80.º e 81.º da cont. da R. “Banco 1...”]. j) Ainda que em momento prévio à subscrição do produto denominado “N... – Produto complexo”, a Autora respondeu ainda a dois novos questionários para o apuramento de Perfil de Investidor e Risco, respetivamente em 23 de Abril de 2015, conforme questionários que ora se juntam como doc. ...2 e ...3, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais [art.º 84.º da cont. da R. “Banco 1...”]. k) A Autora, em 2015, continuava a ser uma investidora com conhecimentos e apetência para o risco, e que a mesma se enquadrava no tipo de clientes aptos a investir no produto “N... – Produto complexo” [art.º 85.º da cont. da R. “Banco 1...”]. l) Na reunião presencial aludida em 61 foi efectuado um ponto de situação do produto “N...”, do crédito associado e do saldo da conta à ordem [art.º 87.º da cont. da R. “Banco 1...”]. m) Foi nomeadamente explicado o desempenho da aplicação “N...” (que nessa data estava já bastante desvalorizada), o desempenho das empresas que constituíam os activos subjacentes, os riscos associados, a barreira de protecção de capital, o vencimento e o crédito ao investimento associado [art.º 88.º da cont. da R. “Banco 1...”]. n) Em particular, e no que tange ao crédito ao investimento no valor de €50.000,00, a gestora informou da prestação anual de juros que estaria em cobrança e que seria ser necessário a cliente provisionar a conta à ordem, quer para a prestação, quer para regularização do saldo a negativo que na altura se verificava [art.º 89.º da cont. da R. “Banco 1...”]. o) Já em 30 de Outubro de 2018, e perante uma evolução ainda mais negativa do produto “N... – Produto complexo”, houve nova reunião entre a gestora e a cliente, uma vez que a aplicação já se encontrava mais desvalorizada e estaria já a entrar em “...” [art.º 90.º da cont. da R. “Banco 1...”]. p) A Autora foi novamente informada pela gestora que seria necessário reforçar garantias ou reduzir ou liquidar o crédito, tendo a mesma replicado que não se encontrava disponível para reforçar garantias, uma vez que já tinha perdido bastante e não queria entrar com mais dinheiro [art.º 91.º da cont. da R. “Banco 1...”]. q) Neste contexto, e sabendo perfeitamente o que se encontrava em causa e quais os riscos associados, a Autora indicou que preferia esperar pelo vencimento da aplicação para ver como resultaria no final [art.º 92.º da cont. da R. “Banco 1...”]. r) Já no final de Novembro de 2018 foi promovido um contacto telefónico pela gestora com a cliente, com um novo pedido de reforço de garantias, uma vez que a aplicação continuava com desempenho bastante negativo face ao valor do crédito de investimento associado, tendo a Autora sido relembrada da possibilidade do banco acionar a garantia (vender a aplicação) para liquidar o crédito [art.ºs 93.º e 94.º da cont. da R. “Banco 1...”].”.
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IV. Do objecto do recurso.
1. Da questão prévia.
Entende a apelante que não pode a ré contra-alegar nos presentes autos pois que, a interveniente/apelante assume no presente processo a condição de parte principal, exercendo um direito e um interesse paralelo ao da ré Banco 1..., ou seja, tem a posição de co-ré.
Caber-lhe-ia razão, caso a tramitação dos autos não tivesse decorrido do modo como decorreu.
Ou seja, tendo sido admitida a sua intervenção principal provocada, também a interveniente não poderia assumir interesses opostos aos da parte a que se associou, o que fez.
Assim, vindo a interveniente/apelante, em sede de recurso invocar novamente esses seus interesses opostos aos da ré, não pode esta deixar de poder pronunciar-se, em contra-alegações, sobre os mesmos, sob pena de violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes.
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2. Saber se a interveniente/apelante nestes autos, assume ou não a posição de devedora solidária, para poder ser responsabilizada e condenada no âmbito da presente acção.
Da tramitação dos autos resulta que a aqui ré, na sua contestação, requereu a intervenção principal provocada da seguradora, aqui interveniente/apelante, ao abrigo do disposto pelo art. 316º do CPC (não indicando nº ou alínea).
Tal intervenção veio a ser admitida liminarmente, ao abrigo do disposto pelo art. 316º nº 3 al. a) do CPC, por se ter entendido que resulta do alegado pela ré que a sua pretensão encontra fundamento na circunstância de a chamada assumir a posição de co-devedora solidária, relativamente à indemnização peticionada pela autora.
Citada a interveniente, na contestação que apresentou, invocou a sua ilegitimidade processual.
Essa questão veio a ser decidida, por despacho de 13.01.2021, no sentido de que a interveniente era parte processualmente legítima nos presentes autos, entendendo-se que era questão distinta a de decidir sobre se a chamada assume ou não a posição de devedora solidária, a qual constituirá questão pertinente ao mérito da causa, o que não contende com a legitimidade processual.
Vejamos então se a interveniente/apelante nestes autos, assume ou não a posição de devedora solidária, para poder ser responsabilizada e condenada no âmbito da presente acção, visto que a legitimidade, enquanto pressuposto processual, é formal, não substantiva, e em nada se confunde com a procedência ou improcedência da pretensão do autor, nem com a efetiva existência da relação jurídica subjacente.
As pessoas cuja intervenção principal como associados dos réus é provocada (art. 316º nº 3 al. a) do CPC – norma expressamente invocada pelo despacho que admitiu a intervenção) assumem a posição de réus e são réus tanto como os primitivos réus.
Os intervenientes seriam, tal como os réus primitivos, supostamente (no momento do despacho de admissão da intervenção) sujeitos passivos da relação material controvertida (parte final do citado art. 316º nº 3 al. a) do CPC) e a sentença que vier a ser proferida sobre o mérito da causa aprecia se realmente o são, constituindo, quanto a eles, caso julgado (art. 320º do CPC).
Decorre do disposto pelo art. 513º do Código Civil que as obrigações plurais de natureza civil são, por regra, parciárias, sendo este o regime regra, o qual é aplicável salvo se o regime excepcional da solidariedade resultar da lei ou da vontade das partes.
Assim, de acordo com a referida norma, a solidariedade entre devedores ou entre credores constitui um regime excepcional, apenas podendo resultar directamente da lei (solidariedade legal) ou da vontade das partes (solidariedade convencional).“Porém, se não arvorou a solidariedade em regra, nem do lado activo nem do lado passivo da relação, também não foi ao ponto de exigir, para a sua estipulação entre as partes, uma declaração expressa. Para a estipulação dela, na falta de qualquer exigência especial da lei, qualquer forma de declaração (expressa ou tácita: artigo 217º) é bastante, não havendo para o efeito fórmulas sacramentais”(cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume I, 10ª edição, página 765.)
Nos termos dispostos pelos arts. 512° n° 1 e 519º n° 1, do Código Civil, a obrigação é solidária quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera, tendo o credor o direito de exigir toda a prestação de qualquer deles.
Assim, a relação de solidariedade pressupõe a existência de uma pluralidade de devedores de uma mesma obrigação, obrigados, por isso, a cumprir em primeiro plano.
Resulta também do disposto pelo art. 518° do Código Civil que o devedor solidário demandado não pode opor o benefício da divisão, e embora possa chamar os co-devedores à demanda, não lhe é legalmente permitido desvincular-se de realizar a prestação por inteiro.
Por seu lado, o credor, pode optar entre demandar a pluralidade de devedores, conjunta ou isoladamente, embora cada um destes responda pela totalidade da dívida.
Como dissemos já, a solidariedade da obrigação só existe se ela resultar da lei ou da vontade das partes. Entre os casos de solidariedade resultante da lei encontramos a dos responsáveis civilmente (art. 497.º do Código Civil), a dos fiadores (art. 649.º do Código Civil), e a dos administradores ou gerentes de sociedades quanto a dívidas fiscais destas (art. 24.º da Lei Geral Tributária).
Há que ver então se na presente acção de responsabilidade civil, e independentemente de nos encontrarmos perante responsabilidade extracontratual ou contratual, a aqui interveniente/seguradora, com a qual a ré celebrou um contrato de seguro (facultativo ou não obrigatório), é devedora com a ré, de uma mesma obrigação.
Para tal, devemos socorrer-nos, desde logo, do regime jurídico do contrato de seguro estabelecido no Dec. Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril (LCS).
Resulta do art. 1º de tal diploma legal que “Por efeito do contrato de seguro, o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente».
Como se afirma no Ac. desta Relação de Guimarães, de 27.02.2020, relator Alcides Rodrigues, disponível in www.dgsi.pt, e que agora passamos a seguir de perto, o segurador tem perante o tomador, o segurado ou o beneficiário, consoante o caso, duas obrigações principais:
- a obrigação de assumir o risco coberto;
- a obrigação de pagar a prestação contratada.
O seguro de responsabilidade civil, no âmbito do citado regime jurídico, é classificado em:
a) seguro facultativo – quando a sua celebração deriva exclusivamente da autonomia das partes e a que são aplicáveis as disposições relativas ao regime comum do seguro de responsabilidade civil (arts. 137º a 145º); deve também considerar-se seguro facultativo o que exceda, e na medida em que o faça, o seguro obrigatório;
b) seguro obrigatório – quando resulta de obrigatoriedade prevista em disposição legal ou regulamentar, a que se aplicam, para além dos regimes das espécies contratuais que dele disponham, os arts. 146º a 148º.
Nos termos do disposto nos arts. 137º e 138.º do citado diploma legal, “[n]o seguro de responsabilidade civil, o segurador cobre o risco de constituição, no património do segurado, de uma obrigação de indemnizar terceiros”, garantindo “a obrigação de indemnizar, nos termos acordados, até ao montante do capital seguro por sinistro”.
No seguro obrigatório mostra-se expressamente consagrada a possibilidade de acção direta do lesado contra a seguradora, estatuindo o art. 146º que o “lesado tem o direito de exigir o pagamento da indemnização directamente ao segurador”.
Mas já quanto a seguro de responsabilidade civil facultativo releva o estatuído no art. 140º, sob a epígrafe “Defesa jurídica”, nos termos do qual:
«1 - O segurador de responsabilidade civil pode intervir em qualquer processo judicial ou administrativo em que se discuta a obrigação de indemnizar cujo risco ele tenha assumido, suportando os custos daí decorrentes. 2 - O contrato de seguro pode prever o direito de o lesado demandar directamente o segurador, isoladamente ou em conjunto com o segurado. 3 - O direito de o lesado demandar directamente o segurador verifica-se ainda quando o segurado o tenha informado da existência de um contrato de seguro com o consequente início de negociações directas entre o lesado e o segurador. (…)».
À luz do citado regime, se no seguro obrigatório está consagrada a possibilidade de acção direta do lesado contra a seguradora, no seguro facultativo o titular do direito face à seguradora será, por via regra, a título exclusivo, o tomador de seguro/segurado.
Quanto aos demais seguros de responsabilidade civil, os n.ºs 2 e 3 do art. 140º da LCS concedem, de facto, ao lesado o direito de demandar diretamente o segurador, isoladamente ou em conjunto com o segurado, nas duas situações aí mencionadas:
i) - quando tal se encontre expressamente previsto no contrato de seguro;
ii) - quando o segurado tenha informado o lesado da existência de um contrato de seguro com o consequente início de negociações directas entre o lesado e o segurador.
Certamente ciente da polémica jurisprudencial e doutrinária até aí existente, o legislador fez questão de explicitar a sua posição sobre o tema, fazendo constar do Preâmbulo de tal diploma legal o seguinte:
“No seguro de responsabilidade civil voluntário, em determinadas situações, o lesado pode demandar directamente o segurador, sendo esse direito reconhecido ao lesado nos seguros obrigatórios de responsabilidade civil. Por isso, a possibilidade de o lesado demandar directamente o segurador depende de se tratar de seguro de responsabilidade civil obrigatório ou facultativo. No primeiro caso, a regra é a de se atribuir esse direito ao lesado, pois a obrigatoriedade do seguro é estabelecida nas leis com a finalidade de proteger o lesado. No seguro facultativo, preserva-se o princípio da relatividade dos contratos, dispondo que o terceiro lesado não pode, por via de regra, exigir a indemnização ao segurador”.
E, como escreve Margarida Lima Rego (in Contrato de Seguro e Terceiros, Estudos de Direito Civil, Dissertação para doutoramento em direito privado na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Agosto de 2008, https://run.unl.pt/bitstream/10362/8402/3/MLR_TD_2008.pdf, p. 533: “as partes num contrato de seguro de responsabilidade civil podem atribuir ao terceiro lesado uma pretensão contra o segurador, um direito de exigir-lhe o pagamento de uma indemnização pelos danos imputáveis ao segurado que se encontrem cobertos pelo seguro. Tratar-se-á, pois, de um contrato a favor de terceiro. Esta pretensão, fundada no contrato, só existe quando as partes assim estipularem”. Deste modo, “se todos os seguros de responsabilidade civil podem ser gizados como contratos a favor de terceiro, no sentido, desta feita, de que em todos podem as partes estipular a atribuição, ao terceiro lesado, de um direito de exigir ao segurador o cumprimento da sua obrigação de prestar, também poderão não o ser, pelo que essa qualificação terá de resultar da interpretação que se faça de cada contrato”.
Assim, é de concluir que nem todos os contratos de seguro de responsabilidade civil facultativo são contratos a favor de terceiro (Margarida Lima Rego, estudo citado, p. 534 e Ac. desta Relação de 17.12.2019 (relator Fernando Fernandes Freitas), in www.dgsi.pt.
No caso dos autos, não foi alegado, nem se mostra documentalmente provado, que nos referidos contratos de seguro (facultativos) tenha sido expressamente prevista a atribuição ao lesado do direito de exigir diretamente à interveniente seguradora a prestação contratual, de acordo com o n.º 2 do art.º 140.º da LCS., ou seja, que a constitua como garante directa da sua responsabilidade perante a autora.
Por outro lado, não foi também alegado ou provado que a autora foi informada sobre a existência dos seguros e o consequente início das negociações directas entre a lesada (autora) e a seguradora (interveniente) (nº 3 do mesmo preceito legal).
Acresce também que a relação jurídica (causa de pedir), tal como se mostra delineada pela autora, desenvolveu-se entre ela e a ré.
Em momento algum é invocado pela autora qualquer relação jurídica material, entre si e a interveniente, não sendo esta parte da relação material controvertida, nem a autora parte do contrato de seguro.
E finalmente, a relação de solidariedade obrigacional inexiste entre ré e interveniente, considerando também que, não estando em causa seguros obrigatórios de responsabilidade civil, mas antes facultativos, não há solidariedade passiva na obrigação de indemnizar o lesado, pela qual respondem, quer o responsável civil, seu primeiro titular, quer o segurador, por não existir na situação dos autos o direito de acção directa consagrado no art. 146º da LCS.
Ou seja, a autora não tinha o direito de exigir a prestação integral da interveniente (como não exigiu) e não se justifica a condenação da interveniente/seguradora, por ela ser uma das pessoas responsáveis pelos danos (art. 497º nº 1 do Código Civil), pois que não o é.
Quem é responsável pelos danos é apenas a ré.
A responsabilidade pelos danos, como elemento da previsão do art. 497º nº 1 do Código Civil, deve ser relacionada apenas com a responsabilidade civil por danos e não como abrangendo também a obrigação de responder por eles por força de um contrato.
A seguradora/interveniente não é, pois, mais uma responsável pelos danos; quem é responsável pelos danos, a título de culpa ou pelo risco, é apenas a ré.
É que, no contrato de seguro de responsabilidade civil, o risco que se pretende cobrir é a eventual ocorrência de danos que possam vir a ser imputados ao segurado, e que este tenha que indemnizar.
Este dever de indemnizar que nasce na esfera do segurado é diferente do dever a que a seguradora se vincula por força do contrato de seguro.
De facto, apenas ao segurado se imputa um dever de indemnizar em sentido estrito, pois que sobre a seguradora impende, um dever de prestar, fundado no contrato e não decorrente da responsabilidade civil (cfr., Margarida Ramalho de Lima Rego, “Contrato de Seguro e Terceiros. Estudo de Direito Civil”, pp. 520- 562, Dissertação para doutoramento em direito privado na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Agosto de 2008). “Não tem aqui aplicação a norma do art. 497º do CC, uma vez que tal regra, ao referir como várias as pessoas responsáveis pelos danos, manifestamente se refere às causadoras, por acção ou omissão, do evento lesivo ou às detentoras e beneficiárias da fonte do dano e como tal por ele chamadas a responder, e não às que, como as seguradoras, só indirectamente respondem, em termos reflexos e em função do contrato” (cfr. Ac. Relação do Porto de 31.01.2013, relator José Amaral, in www.dgsi.pt.).
No caso dos autos, não estamos na presença de seguros obrigatórios, em que, como regra geral, o lesado tem o direito de exigir o pagamento da indemnização directamente ao segurador (cfr. art. 146º da LCS), mas antes perante seguros facultativos, em que tal só pode ocorrer nas duas situações, já acima citadas (art. 140º nºs 2 e 3 LCS).
Assim, apenas nesses dois casos (que não se verificam nos autos), o lesado tem o direito de optar por demandar o lesante/segurado e/ou a seguradora.
Nesta medida, não se verifica a existência de qualquer solidariedade de responsabilidade entre a ré e a interveniente/apelante, pois, do lado passivo, só há um responsável (a ré) e a solidariedade pressupõe, como requisito básico, uma obrigação com pluralidade de devedores, porquanto o efeito fundamental da solidariedade passiva consiste, exactamente, em cada um dos co-devedores se responsabilizar pela inteira prestação e o efeito extintivo recíproco da satisfação dada por qualquer dos co-devedores ao direito do credor (artigo 512º, n.º 1 do Código Civil).
É que, perante o terceiro lesado, a seguradora, em face do contrato de seguro, não se apresenta como co-devedora nem como principal devedora, muito menos a título de obrigação solidária (Ac. da Relação do Porto de 31.01.2013, relator José Amaral, in www.dgsi.pt).
Ora, não sendo a interveniente/apelante devedora solidária, com a aqui ré, da quantia que é peticionada nos autos pela autora, nem sendo titular de qualquer relação jurídica com a mesma (autora), inexiste fundamento legal para a sua condenação, nestes autos, razão pela qual deve ser absolvida do pedido.
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3. Face à solução encontrada previamente, entendemos ser inútil o conhecimento da impugnação da matéria de facto.
É que, a interveniente/apelante, foi admitida a intervir nos autos como interveniente principal provocada, não como acessória.
Resulta do disposto pelo art. 320º do CPC que a sentença que vier a ser proferida sobre o mérito da causa aprecia a relação jurídica de que seja titular o chamado a intervir, constituindo quanto a ele caso julgado.
Dessa apreciação jurídica, como acabámos de verificar, resultou a absolvição da interveniente do pedido, por não ser esta devedora solidária com a ré, dos montantes peticionados pela autora, nem ser titular de qualquer relação jurídica com a mesma (autora). Assim, não tem qualquer relevo a reapreciação da matéria de facto, uma vez que apenas constitui caso julgado quanto à interveniente, nos termos do citado art. 320º, a apreciação da relação jurídica de que ela fosse titular e discutida nos autos, e que como vimos, não existe.
Procede, pois, a apelação.
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):
1. No caso de seguro de responsabilidade civil facultativo, em que se não verifiquem as situações previstas pelos nºs 2 e 3 do art. 140º da LCS, a seguradora/interveniente principal provocada, não assume a posição de devedora solidária, do lado passivo, pois só há um responsável (a ré) e a solidariedade pressupõe, como requisito básico, uma obrigação com pluralidade de devedores.
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V. Decisão.
Perante o exposto, acordam as Juízes da 3ª Secção Cível deste Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar a apelação procedente, revogando assim parcialmente a decisão apelada, absolvendo a interveniente/apelante de todos os pedidos.
No mais, mantém-se a sentença apelada.
Custas da acção e apelação, na proporção dos respectivos decaimentos.