ASSÉDIO MORAL
FACEBOOK
DISCRIMINAÇÃO
FILIAÇÃO PARTIDÁRIA
Sumário

I - Constitui assédio moral discriminatório as publicações da superior hierárquica da autora, de que a entidade empregadora teve conhecimento, constantes de página do Facebook do partido político em cujas listas a autora concorreu a eleições autárquicas, onde consta «vende-se por pouco. Se não fosse o pessoal de esquerda a darem-lhe trabalho, comia merda», e «devias ter vergonha. Se não fossem uns gajos de “Esquerda” a darem-te trabalho, comias…».
II – Estando em causa facto público, encontrando-se a referida superior hierárquica inscrita noutro partido político, é de pressupor poderem aceder à aludida página quaisquer outras pessoas estranhas ao respectivo partido, o que também se revela pelos inúmeros comentários de resposta a tais publicações -  é de concluir serem tais publicações de acesso livre, susceptíveis de vir a ser conhecidas e partilhadas por terceiros,  não assumindo caráter privado.
III – Advindo à autora danos não patrimoniais em consequência do referido comportamento, é a ré entidade empregadora responsável pelo seu ressarcimento.

Texto Parcial

Decisão

1. Relatório 
1.1. AAA, veio intentar contra BBB, ambas com os sinais dos autos, a presente ação declarativa de condenação com processo comum, pedindo a condenação da Ré no pagamento à Autora da quantia de € 15.000,00 acrescida de juros à taxa legal. Para tal alega que na pendência da relação laboral que manteve com a Ré foi vítima de descriminação, em razão das suas convicções políticas e ideológica, traduzida numa situação de assédio mediante comportamento humilhante vexatórios e atentatórios da sua dignidade.
Realizada a audiência de partes sem acordo, contestou a ré, impugnado a factualidade alegada e requerendo a condenação da Aurora como litigante de má-fé.
Foi proferido despacho saneador.
Foi dispensada a elaboração do despacho que fixa os temas da prova.
Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Face ao exposto:
I - Julga-se a ação parcialmente procedente, e consequentemente condene-se a Ré a pagar à Autora a indemnização de 4.000,00 (quatro mil euros) acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação da Ré até integral pagamento.
II - Indefere-se a requerida condenação da Autora como litigante de má-fé.”
1.2. Inconformada com esta decisão dela recorre a autora, concluindo a sua motivação do seguinte modo:
(…)
1.3. Não consta que a ré tenha contra-alegado.
1.4. A ré também recorreu da sentença, tendo rematado a sua motivação com as seguintes conclusões:
(…)
1.5. Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.
1.6. Os recursos foram admitidos na espécie, efeito e regime de subida adequados.
1.7. A Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da manutenção da sentença, salvo quanto ao montante da indemnização atribuída. 
Cumpre apreciar e decidir
2. Objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso e das não apreciadas pela solução dadas a outras, ainda não decididas com trânsito em julgado - artigos 635.º, números 3 e 4, 639.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis “ex vi” do art.º 1.º n.º 2 alínea a), do Código de Processo do Trabalho.
Assim, as questões a apreciar no âmbito do recurso da autora, consistem em aquilatar se deve ser alterado o valor fixado pelo tribunal “a quo” a título de danos não patrimoniais. No recurso da ré, as questões a apreciar consistem na impugnação da matéria de facto; em saber se foi legítima a atribuição de funções de limpeza à autora por parte da ré, e se esta não deve ser responsabilizada pela actuação da sua directora técnica relativamente à autora. Por razões de ordem lógica, iniciaremos a nossa análise pelo recurso da ré.
3. Fundamentação de facto
3.1. Matéria de facto provada
1. A Autora iniciou o exercício das suas funções a tempo inteiro, para o cargo de vigilante, ao serviço da Ré, em Setembro de 1999, tendo sido formalmente registada a sua admissão ao serviço no dia 02/05/2000.
2. Em Fevereiro de 2007, já com a categoria de ajudante de ação educativa, a Autora apresentou um pedido de licença sem retribuição pelo prazo de 1 (um) ano, o qual foi aceite pela Ré.
3. Em Abril de 2007 a Autora regressou a Portugal e por acordo com a Ré foi terminada a licença sem retribuição.
4. Nessa data a Ré "readmitiu" a Autora.
5. Em Fevereiro de 2008 a Autora passou a exercer as funções de Ajudante de ação educativa das 15h00 às 19h00.
6. E de modo a preencher o tempo de serviço, a Ré impôs-lhe que procedesse a limpezas das 07h00 às 10h00, limpezas essas não enquadráveis nas limpezas de manutenção realizadas pelas ajudantes de ação educativa.
7. No início de 2015, em período de eleições autárquicas, a Autora participou numa campanha eleitoral do Partido (…), fazendo parte da lista de candidatos à autarquia.
8. Tal facto foi conhecimento da Ré e da diretora técnica da Instituição, Ludovina Ferreira.
9. Esta, a 2 de abril de 2015, escreveu na página do Partido (…) no Facebook relativamente á candidatura da Autora, o seguinte comentário: «vende-se por pouco. Se não fosse o pessoal de esquerda a darem-lhe trabalho, comia merda» 
10. Em data não concretamente apurada, mas posterior ao dia 2 de abril de 2015, a referida diretora técnica escreveu na página do Partido (…) no Facebook, relativamente á candidatura da Autora, o seguinte comentário: «devias ter vergonha. Se não fossem uns gajos de “Esquerda” a darem-te trabalho, comias……»
11. O Presidente da Associação (…), e a diretora técnica são filiados no Partido (…).
12. No dia 5 de Dezembro de 2016, a Ré instaurou um processo disciplinar com intenção de despedimento, imputando-lhe a prática dos factos contantes de fls.8 a 11.
13. Em tal processo disciplinar a Autora foi acusada de não proceder à limpeza e manutenção do espaço afeto ao trabalho e transmitir informações confidenciais, mediante a alegada entrega de documentação a uma das utentes da Instituição, mãe de um menor inscrito na sala afeta à Autora.
14. A mãe de tal utente (…), testemunha indicada pela Autora no processo disciplinar afirmou que a Autora não lhe forneceu quais quer informações.
15. Em tal processo disciplinar foi à Autora aplicada a sanção de suspensão do trabalho com perda de retribuição por 45 dias.
16. A 13 de Março de 2017, a Autora foi notificada de um processo disciplinar pelo facto de em pleno período de suspensão sem direito a retribuição, entre 01/02/2017 e 04/04/2017, ter violado os “ deveres de zelo e diligência de promover e executar os actos tendentes à melhoria da produtividade da empresa, lesando os interesses patrimoniais do empregador, previstos no artigo 128.º n.º 1 al. c) e h) do Código de Trabalho, na redação que lhe foi dada pela Lei 7/2009 de 12 de Fevereiro, bem como o dever de proceder de boa-fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento das respectivas obrigações, previstos no artigo 126.º, n.º 1 do Código de Trabalho".
17. Nesse processo disciplinar a Autora é acusada de apresentar um atestado médico fraudulento.
18. No âmbito de tal processo disciplinar a Autora respondeu à nota de culpa
19. Foi proferida decisão final no referido processo disciplinar considerando-se provados os factos constantes das alíneas a) a t) de fls.44 e 45. 20. A de 24/04/2017 a Ré notificou a Autora de tal decisão onde foi aplicada a sanção de despedimento sem indemnização ou compensação.
21. A Autora impugnou a sanção de despedimento que lhe foi aplicada intentando a ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento que correu termos neste Juízo do Trabalho de Sintra sob o n.º 8634/17.8T8SNT Juiz 3.
22. Realizada a audiência de partes no dito processo, no dia 24/05/2017, as Autora e Ré puseram termo ao litígio mediante o seguinte acordo: «1.º -As partes acordam em fixar o valor do pedido da Autora no montante de €1.5000,00 (mil e seiscentos euros). 2.º-A Empregadora compromete-se a pagar à Trabalhadora, a título de compensação pecuniária de natureza global, pela cessação do contrato que entre ambos existiu e sem prejuízo do ponto 5), a quantia líquida de €1.600,00 (mil e seiscentos euros) referidos no ponto 1.º 3.º- Tal montante será pago em duas prestações, da seguinte forma: a primeira, no valor de €700,00 (setecentos euros) a pagar em 24 horas e, a segunda, no valor de €900,00 (novecentos euros) a pagar em 30 dias. 4.º- Tais prestações serão pagas mediante transferência bancária para a conta da Trabalhadora, cujo IBAN a Empregadora já conhece. 5.º - Trabalhadora e Empregadora declaram que nada mais têm reciprocamente a reclamar ou a exigir, seja a que título for, no âmbito do contrato de trabalho que entre ambas vigorou, sem prejuízo de eventuais danos não patrimoniais que a Ré possa eventualmente ter causado à Autora e que esta se reserva o direito de reclamar em ação judicial própria. 6.º - As custas serão suportadas em partes iguais, prescindindo as partes de custas de parte e de procuradoria, sem prejuízo da isenção de que a Trabalhadora beneficia.».
23. A Autora sofreu de doença natural de 23-2 a 02-06 de 2017 (alterado infra).
24. A Autora foi encaminhada para consulta de psicologia pela sua médica de família a 26-04-2017 como o seguinte motivo: «Problemas a nível do emprego, diz estar a ser vítima de assédio psicológico. Recentemente faleceu o pai. Pede ajuda para enfrentar os problemas» (alterado infra).
25. A Autora desenvolveu um quadro de depressão e ansiedade em 2017 (alterado infra).
26. A 1/09/2016 a Autora tinha o horário de jornada contínua das 15:00h às 21:30h.
 27. Nessa data as auxiliares de educação tinham os seguintes horários de trabalho:
- (…) das 9:00 às 16:30h, com almoço das 13:30 às 14:30h; -(…) das 8:00h às 13:00 e das 17:30 às 19:30h com almoço das 13:00 às 17:30h; -(…) das 11:30h às 18:30h. 28. A Ré comunicou á Autora a 18/11/2016 que a partir de 21 desse mês deixaria de se justificar a realização de horário de jornada continua que vinha realizando por conveniência de serviço.
29. Em tal comunicação foi-lhe fixado o seguinte horário de 35:00h semanais: -segunda a sexta feita das 14:30 às 18:30h na sede da instituição, com o intervalo de 1 hora entre as 18:30 e as 19:30. - reinício do trabalho às 19:30h às 22:30h, na Escola Sacadura Cabral.
30. A Autora, desde o início da relação laboral que tinha o horário de trabalho da parte da tarde.
31. Na sequência de um protocolo celebrado entre a Ré e a Câmara Municipal da (…) aquela comunicou a todos os funcionários da Ré por meio de circular, que as auxiliares de Educação teriam de “limpar os espaços utilizados e deixá-los em condições para a utilização do estabelecimento de ensino, na manhã seguinte”
32. No âmbito do referido protocolo as atividades asseguradas pela Ré decorriam das 7:30h/8:00h às 19:00h/19:30h.
33. Face à licença sem vencimento da Autora pelo período de 1 ano, a Ré ocupou o posto de trabalho da Autora com outra trabalhadora.
34. Por esta razão, aquando a Autora regressou da licença a Ré não lhe atribuiu o seu anterior horário de trabalho.
35. Razão pela qual a Autora teve que trabalhar no horário da tarde e algumas horas de manhã, nomeadamente num horário das 07H00 às 10H00.
36. A Ré teve conhecimento que a ora Autora participou numa campanha eleitoral do Partido … fazendo parte da lista, em 2015.
37. A Ré teve conhecimento, pelo menos desde a resposta à nota de culpa apresentada pela Autora, a 16 de dezembro de 2016, nos processos disciplinar contra si instaurado no doa 5 desse mês e ano, da publicação referida no 9.º facto provado.
38. Nos anos de 2012 e 2013 a Autora fazia limpezas na sede, para além do desempenho das funções de auxiliar de educação.
39. A Autora era única auxiliar de educação que fazia limpezas
40. Na Ré realizavam-se dois tipos de limpezas as de manutenção e as limpezas propriamente ditas.
41. A 22 de novembro de 2016 a Autora remeteu à Ré a carta que se mostra junta 60 verso e 61, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
3.2. Matéria de facto não provada
3.2.1. Na primeira instância foi considerado não provado o seguinte:
Da petição inicial: 9.º em parte; 7.º em parte; 10.º; 11.º;1 3.º; 21.º; 23.º em parte; 28.º; e 36.º.
Da contestação: 4.º em parte; 17.º(horário da tarde); 19.º; 20.º; 21.º; 24.º; 28.º; 35.º; 43.º a 47.º e 62.º.
4. Fundamentação de Direito
4.1. Recurso da ré
4.1.1. Da impugnação da matéria de facto
(…)
Assim sendo, não é de incluir nos factos provados a pretendida versão.
Pelo exposto, julga-se improcedente a presente questão.
-  A respeito da decisão da matéria de facto, importa ainda considerar o seguinte.
Nos termos do art.º 662.º do CPC, “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Como refere Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina 2013, pág. 225, (…) o actual art.º 662.º “representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava” (…) fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis.
No caso em análise, a autora, ora recorrida, alegou no art.º 30.º da sua petição que entre as consequências da conduta da entidade patronal o seu estado de saúde degradou-se conforme relatórios médicos (docs.21 a 26), a sua dignidade moral e profissional foi afectada no seu local de trabalho, sentido vexame vergonha e inquietude; sofreu prolongada incapacidade para o trabalho; desenvolveu um quadro de depressão e ansiedade e os problemas de saúde de que padece já referenciados de que ainda padece.
No que se refere a essa matéria, foi (apenas) dado como provado que “ 23. A Autora sofreu de doença natural de 23-2 a 02-06 de 2017; 24. A Autora foi encaminhada para consulta de psicologia pela sua médica de família a 26-04-2017 como o seguinte motivo: «Problemas a nível do emprego, diz estar a ser vítima de assédio psicológico. Recentemente faleceu o pai. Pede ajuda para enfrentar os problemas» e 25. A Autora desenvolveu um quadro de depressão e ansiedade em 2017.”
Sucede que em face da prova produzida nos autos e de acordo com o alegado pela autora, outra deve ser a versão factual a ter em conta. Com efeito, a testemunha (…), que é amiga da autora há vários anos, e prestou um depoimento isento e imparcial,  referiu que “depois de a autora ter sido candidata na eleições autárquicas  o ambiente de trabalho não era bom”, “andava sempre deprimida, “chorava”, “angustiada com a vida”, ao contrário do que sucedia antes, pois sempre viu a (…), como uma pessoa “muito lutadora”, que vivia com os filhos, sozinha, a quem sustentava. Mais disse que a AAA “foi acompanhada por psicólogo” e que as funções de limpeza que a mesma desempenhava não eram realizadas por mais nenhuma colega com a sua categoria profissional. Relevo assume também, o depoimento da testemunha (…) (psicóloga e colega da autora), cujas declarações foram coerentes e espontâneas. Esta testemunha declarou que “as colegas não gostavam da autora”, “falavam mal dela” e “diziam que era conflituosa”, facto este desmentido pela própria testemunha que referiu sempre ter dela recebido boa colaboração, atestando ainda o seu bom relacionamento com os utentes, mais tendo afirmado que a autora fazia limpezas na sede que não correspondiam às que são feitas na sala de aula, no final do turno, pelas colegas.
Com base em tais depoimentos, tendo em consideração o teor dos documentos médicos apresentados pela autora - onde constam referências a “Problemas a nível de emprego, diz estar a ser vítima de assédio psicológico …” (fls. 53 verso); “Quadro ansioso/depressivo que relaciona com problemas a nível de emprego e a nível familiar …” (fls. 54 versos)), as publicações ofensivas, que devidas à sua filiação partidária foram publicadas Facebook pela sua superior hierárquica; as tarefas de limpeza e horários praticadas pela autora ao longo dos anos (diversas das realizadas pelas restantes colegas de trabalho de idêntica categoria), contra as quais a autora se manifestou  (fls. 60 a 61) ), à luz das regras da vida e da experiência, pode lógica e naturalmente concluir-se que os factos constantes dos números 23, 24 e 25 foram consequência da conduta assumida pela ré acima descrita (atribuição à autora de funções de limpeza diversas das demais colegas com mesma categoria profissional e da publicação no Facebook de expressões ofensivas por motivos políticos por parte da sua superior hierárquica, com conhecimento da ré, pelo menos, em 16-12-2016). 
Assim, nos termos legais citados, deve passar a constar dos referidos factos provados o seguinte:
23. Em consequência da conduta assumida pela ré relativamente à autora, o estado de saúde desta degradou-se, tendo a mesma sofrido de doença natural de 23-2 a 02-06 de 2017;
24. Foi encaminhada para consulta de psicologia pela sua médica de família a 26-04-2017 como o seguinte motivo: «Problemas a nível do emprego, diz estar a ser vítima de assédio psicológico. Recentemente faleceu o pai. Pede ajuda para enfrentar os problemas»,
25. Tendo a Autora desenvolvido um quadro de depressão e ansiedade em 2017.
4.1.2. Da legitimidade da atribuição de funções de limpeza à autora por parte da ré
Sustenta a ré que resultando o exercício das funções de limpeza de acordo entre as partes, acordo esse tornado necessário por força dos interesses da autora, não pode ser afirmada a ilicitude da sua actuação.
Sobre esta matéria, importa desde já assinalar, que as funções de limpeza que a autora passou a desempenhar, de acordo com a factualidade provada, não resultaram do acordo entre as partes, mas sim da imposição feita pela ré à autora. O que se nos afigura ilegal, como se verá de seguida, subscrevendo-se, no essencial, o entendimento vertido na sentença recorrida. Com efeito, como aí se arreferiu: (…) A Ré justificou tal alteração de funções e de horário com o facto de, face à licença sem retribuição da Autora, ter ocupado respetivo posto de trabalho com outra trabalhadora, pelo que, face ao regresso daquela não lhe foi possível atribuiu-lhe o seu anterior horário de trabalho, daí que, para além de trabalhar à tarde, como anteriormente, teve que trabalhar algumas horas de manhã, nomeadamente num horário das 07H00 às 10H00.
No que concerne à alteração operada face ao regresso antecipado da Autora da licença sem retribuição, admite-se que, caso a Ré tivesse contratado um trabalhador substituto, a posição da Autora se mantivesse, de uma forma transitória, com distintos horários e funções. Porém a Ré nunca alegou ter contratado um novo trabalhador nos termos previstos no n.º 3 do referido artigo 355.º e, ainda que o tenha feito, certo é que, tal como resultou provado, à dada em que terminaria a projetada licença sem retribuição de um ano, ou seja, em fevereiro de 2008 a Ré colocou a Autora num horário distinto do que a mesma vinha fazendo até fevereiro de 2007, atribuiu-lhe funções de limpeza. Nessa altura, a justificação apresentada pela Ré é totalmente irrelevante, atento o previsto no n.º 2 do artigo 355.º e o certo é que mais nenhuma justificação apresentou para tal alteração.
Ora, à data determinava o artigo 151.º do C. do Trabalho de 2003: 1 - O trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado. 2 - A atividade contratada, ainda que descrita por remissão para categoria profissional constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou regulamento interno da empresa, compreende as funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, para as quais o trabalhador detenha qualificação profissional adequada e que não impliquem desvalorização profissional. 3 – Para efeitos do número anterior, e salvo regime em contrário constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, consideram-se afins ou funcionalmente ligadas, designadamente, as atividades compreendidas no mesmo grupo ou carreira profissional. 4- (…) 5- (…)”
Não tendo a Ré alegado e demonstrado factos enquadráveis nos requisitos mobilidade funcional prevista ao artigo 314.º do referido Código, torna-se evidente que ao impor à Autora a realização de tarefas limpeza que extravasam a funções correspondentes à sua categoria profissional, violou uma das garantias dos trabalhadores, plasmada na alínea e) do artigo 122.º do mesmo Código. Segundo o apurado, esta alteração de funções, que ocorria numa parcela do horário de trabalho da Autora, durante o qual a mesma tinha que realizar tarefas de limpeza propriamente ditas, ou seja, limpezas normalmente atribuídos aos trabalhadores de limpeza e que extravasavam as limpezas de manutenção da sala onde se realizavam as atividades, mantinham-se nos anos de 2012 e 2013 e 2016, o que levou a Autora a comunicar á Ré, por carta datada de 22 de novembro de 2016 que, por considerar que tal atividade não se enquadrava no âmbito das funções de auxiliar de educação, as deixaria de as realizar. A este respeito a Ré alegou, e demonstrou que, na sequência de um protocolo que celebrou com a Câmara Municipal da Amadora, comunicou a todos os funcionários da Ré por meio de circular, que as auxiliares de Educação teriam de “limpar os espaços utilizados e deixá-los em condições para a utilização do estabelecimento de ensino, na manhã seguinte”. Contudo, tendo-se apurado que âmbito do referido protocolo o funcionamento das atividades asseguradas pela Ré funcionavam das 7:30h/8:00h às 19:00h/19:30h e que as demais auxiliares de educação da Ré, que estavam igualmente obrigadas a realizar as tarefas de limpezas previstas na aludida circular, apresentavam horários de trabalho que não ultrapassavam as 19:30h, necessariamente que a Autora, tanto  até novembro de 2016, que cumprindo um horário de jornada contínua das 15:00h às 21:30h, como a partir desse mês em diante, ao passar a cumprir o horário das 14:30 às 18:30h na sede da instituição, com o intervalo de 1 hora entre as 18:30 e as 19:30, e reinicio do trabalho às 19:30h às 22:30h, na Escola Sacadura Cabral, levava a cabo tarefas distintas das correspondente à sua categoria profissional.
É que, tal como se mostra previsto no CCTi aplicável à relação laboral, a categoria profissional da Autora, auxiliar de educação, que se mostra integrada no grupo de trabalhadores com funções pedagógicas, integra as funções de elaborar "planos de actividades das classes, submetendo-os à apreciação dos educadores de infância e colaborando com estes no exercício da sua actividade”
Ora, das 19:30h às 21:30h, como das 19:30h às 22:30h a atividade pedagógica da Ré não estava a ser exercida e as limpezas previstas na mencionada circular teriam que ser realizadas nas respetivas salas de cada uma das auxiliares, portanto até às 19:30h. Logo, mesmo que se considere que estas limpezas, ainda que não integrantes do núcleo essencial da categoria (normativa) da Autora, se revelam atividades afins ou funcionalmente ligadas à mesma, o certo as tarefas realizadas pela Autora, que já em 2008 a Ré lhe atribuiu com o intuito de completar o seu horário de trabalho, são redutoras, porque correspondentes a tarefas de categoria profissional inferior e, à semelhança do já referido quanto ao regime vigente no Código de 2003, correspondem a comportamentos violadores do disposto nos artigos 129.º, n.º 1, alínea e), 118.º, 119.º, todos do Código do Trabalho de 2009 e não se mostrando justificados à luz do disposto no artigo 120.º do mesmo diploma legal, relativo ao ius variand funcional. Ainda que não resulte da factualidade apurada que a violação dos mencionados direitos tenham ocorrido de forma ininterrupta desde fevereiro de 2008 até ao despedimento da Autora em 2017, ainda assim é possível caraterizar a conduta da Ré como reiterada e que ao longo do tempo vai adquirindo contornos de maior gravidade à medida que se vai avançando com o horário de trabalho atribuído à Autora para a realização das tarefas de limpezas, inicialmente das 07h00 às 10h00 em 2008 e em 2016, primeiramente até novembro às 21:30h e até às 22:30h a partir desse mês.
Desta feita, é de concluir que a ré, ao determinar a realização pela autora de funções de limpeza, não enquadráveis nas funções atinentes à sua categoria profissional de “ajudante de acção educativa  «Participa nas actividades sócio-educativas; ajuda nas tarefas de alimentação, cuidados de higiene e conforto directamente relacionados com a criança; vigia as crianças durante o repouso e na sala de aula; assiste as crianças nos transportes, nos recreios, nos passeios e visitas de estudo», infringiu o disposto no art.º 118.º do Código do Trabalho (e no antecedente art.º 151.º do Código do Trabalho de 2003), um vez que tais funções manifestamente implicam uma “desvalorização profissional da autora”, porque correspondentes a categoria profissional inferior, de Trabalhador auxiliar (serviços gerais), que de acordo com a convenção coletiva aplicável,  «Procede à limpeza e arrumação das instalações; assegura o transporte de alimentos e outros artigos; serve refeições em refeitórios; desempenha funções de estafeta e procede à distribuição de correspondência e valores por protocolo; efectua o transporte de cadáveres; desempenha outras tarefas não específicas que se enquadrem no âmbito da sua categoria profissional e não excedam o nível de indiferenciação em que esta se integra». 
Acresce que perante a factualidade provada, ao caso se não aplica a figura da mobilidade funcional prevista no art.º 120.º do CT (e art.º 314.º do Código do Trabalho de 2003), porquanto não se está perante o exercício transitório de funções não compreendidas na actividade contratada, para além de que o desempenho de tais funções de limpeza  implicaram “modificação substancial” da posição da autora  (tais funções eram diversas e de nível inferior, como já dito, das que eram praticadas pelas colegas de idêntica categoria profissional).
No presente caso, não somente a situação vivenciada pela trabalhadora se não pode considerar temporária -  a ré não alegou qualquer interesse objectivo, sério e transitório para a situação em que colocou a autora  durante vários anos, como a alteração funcional perpetrada na pessoa desta, no tempo e contexto em que ocorreu, não foi justificada pela ré, tendo-se antes traduzido, como tem vindo a ser assinalado em situações similares, numa “situação injustamente penosa para a trabalhadora, num desnível hierárquico susceptível de provocar desprestígio ou afectar a sua dignidade profissional” (Cfr., entre outros, o Ac. do STJ de 30-06-89,  CJ, I, pág. 22).
Termos em que improcede, sem mais, a presente questão.
4.1.3. Da não responsabilização da ré pela actuação da sua directora técnica relativamente à autora
Sustenta a ré, a este propósito, que as expressões proferidas por (…) (directora técnica da instituição) foram-no a título próprio. Não podendo a ré imiscuir-se em todo e qualquer conflito entre trabalhadores, especialmente quando tais conflitos têm espaço nas redes sociais, não relacionadas com a entidade patronal ou conduzidas pelos trabalhadores na qualidade de cidadãos no pleno exercício dos seus direitos. Não sendo legítimo o exercício disciplinar na sequência da actuação da directora técnica por praticada na esfera privada deste e sem reflexos na relação laboral. 
A sentença recorrida, após ter elencado os normativos legais referentes ao assédio, concluiu ter a ré assumido uma postura omissiva, reveladora de total inércia face à conduta assumida pela directora técnica em relação à autora reveladora de total desrespeito pela sua integridade física e moral.
Como é sabido, o assédio no trabalho é estudado por várias disciplinas. Trata-se de fenómeno ancestral, uma disfunção social, não circunscrita ao universo laboral, que se pode manifestar de múltiplas maneiras, ser praticado por vários sujeitos e nas mais diversas circunstâncias.
Estudos feitos apontam para que grande número de trabalhadores já tenha sido alvo de assédio no trabalho, sendo, em vários planos, muito nefastas as suas consequências.
Trata-se, normalmente, de comportamentos hostis, humilhantes ou persecutórios, destinados a perturbar emocionalmente o trabalhador, a ferir a sua dignidade enquanto pessoa, com o intuito, por regra, de o levar a abandonar o trabalho.
Com vista a melhor caracterizar esta realidade, têm-lhe sido atribuídas várias designações em vários países, muitas delas tributárias de outras ciências, sendo actualmente, mais comum, entre nós, a designação de assédio moral. Assim,
“Nos países escandinavos [Dinamarca, Finlândia e Suécia], na Suíça, e na Alemanha o assédio moral no trabalho é designado por “Mobbing” - termo que surgiu, pela primeira vez, através de KONRAD LORENZ para abordar os comportamentos de determinados animais da mesma espécie, mas mais débeis, que se uniam em grupo como forma de afastarem outro animal mais forte e mais perigoso que os demais elementos do grupo. O médico sueco PETER-PAUL HEINEMANN, utilizou este termo, nos anos setenta, a propósito dos comportamentos hostis praticados entre as crianças nas escolas [violência infantil em grupo]. Nos anos oitenta foi utilizado por HEINZ LEYMANN para, pioneiramente, se referir “ao assédio nas organizações”, servindo de veículo para outros investigadores que trabalham na área do “stresse” profissional.
 Na Inglaterra, nos Estados Unidos e noutros países de língua inglesa o assédio é designado por “Bullying” - termo que inicialmente não se aplicava no mundo laboral pois era mais comumente utilizado para descrever fenómenos de violência verificados em contexto escolar entre crianças.
O conceito foi adotado por LAZARUS, em 1984, no seu estudo sobre o “stresse”, incluindo o “bullying” no que classificou como “sresse” social.
Para MARIE-FRANCE HIRIGOYEN o “bullying” é um termo mais amplo do que o “mobbbing” porque compreende, sobretudo, comportamentos de violência individuais tais como a troça, a exclusão, condutas abusivas e agressões físicas, ao passo que este se refere mais a atos de violência organizacional.
Entre nós o “bullying” é um termo habitualmente usado para descrever fenómenos de violência verificados, no contexto escolar, entre as crianças.
No Japão adotou-se o termo “ijime” para definir o assédio no trabalho, tendo-se como objetivo  moldar os indivíduos aquando a sua inclusão no seio do grupo.
Na verdade, o Japão é um país em que se cultivou, na sociedade, ao longo das gerações a ideia de que se deve atingir a perfeição e o êxito em tudo o que se fizer. Tudo o que não atingisse este padrão era considerado um fracasso e deveria ser punido.
Este sentimento de perfeição era incutido logo no início da formação da personalidade do indivíduo, no âmbito do sistema educativo, pois acreditava-se que o “ijime” era uma técnica essencial para o bom desenvolvimento técnico dos alunos.
Com este modelo de educação demasiado inflexível, através do qual se transmitia a ideia de que só os melhores podiam triunfar, fomentava-se o espírito de competição desmedida e de rivalidade o que, mais tarde, viria a repercutir-se, na fase adulta, no campo do trabalho.
Este termo veio a sofrer alterações e o que era, outrora, um processo de modelação dos trabalhadores, passou-se, agora, para uma forma de gestão mais excessiva e mais cruel, que não olha a meios para obter e atingir os índices de produtividade que as organizações pretendem.
Apesar destas condições os trabalhadores japoneses são muito focados no seu trabalho, fazendo elevadas horas de trabalho seguidas, não tirando os dias de folga totalmente legais e relegando para segundo plano o seu período de férias:
 Na Itália utiliza-se o termo “vessazione” para representar o maltrato continuado e repetido.
Adotando este termo, a questão do assédio não é analisada do ponto de vista objetivo, das condutas efetivamente adotadas, mas, pelo contrário, pelos sentimentos provocados no sujeito passivo, ou seja, do ponto de vista subjetivo.
 Em Espanha o assédio é identificado pelo termo “acosso moral”, acentuando-se mais os efeitos subjetivos, pois salienta-se o carácter psicológico do fenómeno, ou seja, as consequências psicológicas que se manifestam nas vítimas.
 Em França o fenómeno do assédio é identificado por “Harcèlement moral”.
Segundo a sua definição legal podem constituir “harcèlement” os comportamentos repetidos, tendo por objeto ou por efeito uma degradação das condições de trabalho suscetível de poder atingir os direitos e a dignidade do trabalhador, de alterar a sua saúde física e mental ou de comprometer a sua vida profissional.
 Entre nós é utilizado o termo “Assédio moral”. Moral para fazer referência específica ao bem jurídico protegido – o direito à integridade moral do trabalhador, por a sua verificação estar sujeita à constatação de sentimentos de humilhação, degradação e aviltamento. Esta terminologia, além de ser usada no mundo do trabalho, é também utilizada para fazer alusão aos mesmos tipos de comportamento, mas noutros âmbitos, nomeadamente o familiar”. Cfr. Ac. do STJ de 11-09-2019, proc. 8249/16.8T8PRT.P1.S1, www.dgsi.pt.
São também usadas várias classificações com vista à identificação da realidade assediante; umas ligadas às motivações do agente, outras atendendo à posição ocupada pelos sujeitos.
Assim, segundo as motivações do agente - assédio laboral emocional: o praticado entre diversos níveis de hierarquia, normalmente por alguém dotado de personalidade obsessiva, perversa ou patológica; assédio laboral estratégico: o praticado pela empresa quando esta pretende promover ilegalmente o afastamento dos trabalhadores tidos como incómodos e assédio laboral institucional: o aplicado pelo empregador ao universo dos trabalhadores com vista à implementação de procedimentos ou à proibição de certos comportamentos, com vista a atingir melhores resultados produtivos. Segundo a posição ocupada pelos sujeitos - assédio vertical descendente: o assediante encontra-se em nível hierárquico superior ao do assediado; assédio ascendente o agente assediante é subordinado do assediado; assédio horizontal: assediante e assediado estão no mesmo plano de igualdade em termos de categoria profissional; assédio externo: o assediante é um terceiro, e assédio misto: o assédio é praticado tanto pelo superior hierárquico, como pelos colegas do trabalhador (Cfr., entre outros, Ana Luísa Caldas Canedo, “Assédio Discriminatório e Assédio Moral Simples: Um Contributo Para a Análise do Conceito de Assédio Moral no Código do Trabalho”, Universidade do Minho, Escola de Direito, 2011, pág. 23 e segs.).
Face à gravidade do fenómeno, o assédio tem vindo a ser tratado a nível comunitário e internacional (nomeadamente, através da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a Directiva 2006/54/CE, a Resolução do Parlamento Europeu de 08-10-2015, a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica e a Resolução do Parlamento Europeu A5-0283/2001), tendo sido regulado, expressamente, pela primeira vez entre nós, pelo Código do Trabalho de 2003, como integrante da discriminação (art.º 24.º “Constitui discriminação o assédio a candidato a emprego e a trabalhador; Entende-se por assédio todo o comportamento indesejado relacionado com um dos factores indicados no n.º 1 do artigo anterior, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de afectar a dignidade da pessoa ou criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador; Constitui, em especial, assédio todo o comportamento indesejado de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objectivo ou o efeito referidos no número anterior” (n.ºs 1, 2 e 3); art.º 23.º “1 -O empregador não pode praticar qualquer discriminação, directa ou indirecta, baseada, nomeadamente, na ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência ou doença crónica, nacionalidade, origem étnica, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical. 2 - Não constitui discriminação o comportamento baseado num dos factores indicados no número anterior, sempre que, em virtude da natureza das actividades profissionais em causa ou do contexto da sua execução, esse factor constitua um requisito justificável e determinante para o exercício da actividade profissional, devendo o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional. 3 - Cabe a quem alegar a discriminação fundamentá-la, indicando o trabalhador ou trabalhadores em relação aos quais se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que as diferenças de condições de trabalho não assentam em nenhum dos factores indicados no n.º 1)”.
O assédio encontra-se actualmente previsto no art.º 29.º do Código do Trabalho (CT), aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, na redacção vigente à data dos factos, sendo agora a discriminação uma das modalidades em que se pode traduzir o assédio. Aí se prescreve, com efeito: “1-Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
2 - Constitui assédio sexual o comportamento indesejado de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objectivo ou o efeito referido no número anterior.
3 - À prática de assédio aplica-se o disposto no artigo anterior.
4 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo”.
Cumpre ainda referir, o disposto nos artigos 25.º e 24.º do Código do Trabalho que rezam o seguinte:
Art.º 25.º - Proibição da discriminação
1-O empregador não pode praticar qualquer discriminação, directa ou indirecta, em razão nomeadamente dos factores referidos no n.º 1 do artigo anterior.
2 - Não constitui discriminação o comportamento baseado em factor de discriminação que constitua um requisito justificável e determinante para o exercício da actividade profissional, em virtude da natureza da actividade em causa ou do contexto da sua execução, devendo o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional.
3 - São nomeadamente permitidas diferenças de tratamento baseadas na idade que sejam necessárias e apropriadas à realização de um objectivo legítimo, designadamente de política de emprego, mercado de trabalho ou formação profissional.
4 - As disposições legais ou de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que justifiquem os comportamentos referidos no número anterior devem ser avaliadas periodicamente e revistas se deixarem de se justificar.
5 - Cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores em relação a quem se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer factor de discriminação.
6 - O disposto no número anterior é designadamente aplicável em caso de invocação de qualquer prática discriminatória no acesso ao trabalho ou à formação profissional ou nas condições de trabalho, nomeadamente por motivo de dispensa para consulta pré-natal, protecção da segurança e saúde de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, licenças por parentalidade ou faltas para assistência a menores.
7 - É inválido o acto de retaliação que prejudique o trabalhador em consequência de rejeição ou submissão a acto discriminatório.
8 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto nos n.ºs 1 ou 7.
Art.º 24.º - Direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho
1 - O trabalhador ou candidato a emprego tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, não podendo ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, devendo o Estado promover a igualdade de acesso a tais direitos.
2 - O direito referido no número anterior respeita, designadamente:
a) A critérios de selecção e a condições de contratação, em qualquer sector de actividade e a todos os níveis hierárquicos;
b) A acesso a todos os tipos de orientação, formação e reconversão profissionais de qualquer nível, incluindo a aquisição de experiência prática;
c) A retribuição e outras prestações patrimoniais, promoção a todos os níveis hierárquicos e critérios para selecção de trabalhadores a despedir;
d) A filiação ou participação em estruturas de representação colectiva, ou em qualquer outra organização cujos membros exercem uma determinada profissão, incluindo os benefícios por elas atribuídos.
3 - O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação:
a) De disposições legais relativas ao exercício de uma actividade profissional por estrangiro ou apátrida;
b) De disposições relativas à especial protecção de património genético, gravidez, parentalidade, adopção e outras situações respeitantes à conciliação da actividade profissional com a vida familiar.
4 - O empregador deve afixar na empresa, em local apropriado, a informação relativa aos direitos e deveres do trabalhador em matéria de igualdade e não discriminação.
5 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto no n.º 1 e constitui contra-ordenação leve a violação do disposto no n.º 4.”
Pese embora o texto legal, a noção de assédio ainda não se encontra estabilizada, divergindo os autores e a jurisprudência, quanto aos seus elementos integradores, falando-se mesmo em “poliformia” do fenómeno. Para uns, o assédio pressupõe um “conjunto de actos reiterados e sistemáticos violadores da integridade moral da vítima, com possíveis consequências a nível da sua saúde física e psíquica” (Mago Graciano Rocha Pacheco, “ O Assédio Moral no Trabalho o Elo Mais Fraco”, Almedina, Julho de 2007, págs. 47 e segs.); “uma violência psicológica em pequenas doses” (Isabel Ribeiro Parreira, “ O Assédio Moral no Trabalho”, V Congresso de Direito do Trabalho, Memórias, Coordenação de António Moreira, Coimbra, Almedina, Janeiro de 2003, pág. 209 e segs); para outros, trata-se de “uma sequência de comportamentos, melhor ou pior encadeados, alguns dos quais, se isoladamente considerados, pareceriam não só perfeitamente lícitos como legítimos ou inofensivos” (Rita Garcia Pereira, “Mobbing ou Assédio Moral no Trabalho, Contributo para a sua Conceptualização”; Coimbra Editora 2009, pág. 106; ou “uma insana de perseguição, metodicamente organizada, temporalmente prolongada, dirigido normalmente contra um só trabalhador que, por consequência se vê remetido para uma situação de indefesa e desesperada, violentado e frequentemente constrangido a abandonar o seu emprego por sua iniciativa ou não” (Maria Regina Redinha, “O Assédio Moral no Trabalho”, “Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José de Oliveira Ascenção”, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2003, 2.º Volume, pág. 833 e segs.). Abordam também essa temática, entre outros, António Monteiro Fernandes “Direito do Trabalho”, Almedina, 16.ª Edição, pág. 159. Júlio Gomes, “Direito do Trabalho”, Volume I, Coimbra Editora, pág. 425 e segs. Maria Rosário Ramalho, “Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais”, Almedina, 6.ª Edição, pág. 188 e segs. António Menezes Cordeiro, “Direito do Trabalho, II Direito Individual”, Almedina, págs. 252 e segs. E Luís Menezes Leitão, “Direito do Trabalho”, Almedina, 2.ª Edição, pág. 193.
O trabalhador vítima de assédio, de um modo geral, vem a padecer de várias consequências em termos psíquicos e físicos, o que afecta negativamente as suas relações sociais e familiares. Devido ao assédio, em muitos casos, o trabalhador passa a sofrer de stresse, ansiedade, depressão, alterações psicossomáticas e psicoses, sendo também comuns os desequilíbrios hormonais, aumento da tensão arterial e os problemas cardíacos (Pedro Morgado, “Impacto do trabalho na saúde mental - uma perspectiva do séc. XXI”, in “Trabalho Sem Fronteiras”, Almedina 2017, pág. 127).
O referido art.º 29.º, determina que o assédio tem o objectivo ou o efeito, de “afectar a dignidade” do trabalhador. Sendo a dignidade a raiz dos direitos fundamentais (art.º 1.º da CRP), será de concluir que o bem jurídico tutelado é a dignidade do trabalhador.
Através da consagração do assédio laboral, é reforçado “o quadro tutelar dos direitos fundamentais e de personalidade que emergem do Código Civil”, ampliando-se, assim, como também tem sido dito, a tutela da dignidade do trabalhador enquanto pessoa relativamente à prática de actos que atingem a integridade e dignidade daquele” (Cfr., Júlio Gomes, “Algumas reflexões sobre a evolução recente do conceito jurídico de assédio”, PDT 90, CEJ, Setembro a Dezembro de 2011, pág. 75. E também Guilherme Machado Dray e Outros, “Código do Trabalho Anotado”, Almedina, 2009, pág. 187 e segs.).
Os nossos tribunais superiores, têm procedido ao enquadramento do assédio laboral, reportando o mesmo à verificação de um “comportamento” integrado, em regra, por vários actos; “comportamento esse indesejado, incómodo e injusto para a vítima - ao qual preside a intenção (imediata) de exercer pressão moral sobre o outro, tirando partido de algum factor, seja de debilidade ou menor resistência (dependência económica, receio de perder o emprego, vulnerabilidade psicológica da vítima) e o objectivo final ilícito ou no mínimo eticamente reprovável, consubstanciado na obtenção do efeito psicológico na vítima, desejado pelo assediante”. Salienta-se, ainda, que no nosso ordenamento jurídico, “o assédio implica comportamentos do trabalhador real e verdadeiramente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador aos quais estão em regra associados - a par de um objectivo final ilícito ou pelo menos eticamente reprovável - mais dois elementos: certa duração e, por princípio, determinadas consequências” “(…) Apesar de se não exigir na conformação concreta do assédio moral, o “objectivo” de afectar a vítima, bastando que este resultado seja o “efeito” do comportamento adoptado pelo “assediante”, aquela forma de lesão da dignidade do trabalhador em qualquer das modalidades, tem em regra presente um objectivo final ou no mínimo eticamente censurável” (Cfr., entre outros, os acórdãos do STJ do STJ de 03-12-2013, proc. 712/6TTPRT.P1.S1, de 18-12-2013, proc. 248/10.0TTBRG.P1.S1, de 01-10-2014, proc. 420/06.7TTLSB.L1 e de 26-05-2015, proc. 2056/12.4TTLSB.L1, in  www.dgsi.pt ). 
Face ao teor do referido normativo legal, contudo, vários são os autores que salientam não ser necessariamente de exigir uma sequência de actos para que possa afirmar a existência de “comportamento” assediante. Admite-se que comportamento isolado, grave, em face nomeadamente da “sensibilidade da vítima, fragilidade psicológica, passado doloroso e/ou capacidades intelectuais ou grau de instrução da mesma, pode constituir assédio”. Segundo Diana Esteves, “Mobbing: Algumas Considerações Sobre a Sua Duração”, Universidade Católica, Porto, 2011, pág. 38 e 41, “(…) para a ciência jurídica o que, verdadeiramente, releva no mobbing é a violação flagrante de princípios fundamentais do nosso Estado Social e Democrático de Direito: o direito à dignidade humana e integridade física e moral da vítima, bem como o seu direito ao trabalho”(…) Não é exigível que se verifique um plano ofensivo de duração pré-definida…”. “ (…) numa situação em concreto, mais importante que analisar apenas e de forma exaustiva a duração dos comportamentos, entendemos ser necessário prestar igualmente atenção a outras variantes, pessoais e circunstanciais, susceptíveis de favorecer o alcance rápido do objectivo do assédio.” Citada pela mesma autora, veja-se também, Alexandra Marques Sequeira, “Do assédio no local de trabalho – Um caso de flirt legislativo? Exercício de aproximação ao enquadramento jurídico do fenómeno”, Questões Laborais, Ano XIII, n.º 28, 2006, pág. 241 e segs.
Para além disso, referindo-se a lei em termos alternativos ao objectivo e ao efeito de criar um ambiente hostil, degradante, humilhante - para alguns autores, ao invés do propósito, é de pôr a tónica nos efeitos, pelo que bastará, em certas circunstâncias, que o comportamento do agente tenha o efeito de “perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”. O que releva não são tanto as intenções, mas antes o significado objectivo das práticas na pessoa do assediado (Cfr. Júlio Gomes, “Algumas Reflexões Sobre a Evolução Recente do Conceito Jurídico De Assédio Moral”, PDT 90, Coimbra Editora, pág. 81).
No que se refere às consequências, tem-se vindo a entender não ser necessário para a verificação do assédio que o trabalhador sofra danos de natureza psicológica ou uma doença - embora normalmente tais danos emerjam da prática do assédio. O que deve decorrer do comportamento assediante, é uma afectação dignidade do trabalhador como pessoa (Vd., designadamente, o acórdão do TRL de 5-11-2013, processo 4889711.0TTLSB.L1).
Acresce ainda que as vítimas de assédio não têm que reunir quaisquer características especiais, nem ser pessoas emocionalmente frágeis ou detentoras de especial sensibilidade.
Ao contrário do que se possa pensar, o assédio não atinge (somente) os trabalhadores medíocres ou os incumpridores das suas obrigações laborais. “Na realidade, mesmo aqueles trabalhadores que desempenham funções de chefia ou de direcção ou que sejam exemplares no cumprimento das suas actividades não estão livres deste fenómeno por serem exactamente estes que, pela sua inteligência, capacidades e aptidões, despertam a inveja no assediador.” (Vd. Ana Luísa M. M. Canedo, “Ob. Cit. pág. 27).
Importa ainda assinalar, prever a lei, como já dito, o assédio baseado em factor de discriminação – o assédio moral discriminatório. O comportamento indesejado e com efeitos hostis baseia-se em qualquer factor discriminatório, que não o sexo (art.º 24.º n.º 1), discriminatory harassement. (Cfr. Maria do Rosário Ramalho, “Ob. Cit.” pág. 189). O assédio discriminatório, decorre da violação do princípio da igualdade e não discriminação, e diz normalmente respeito a comportamentos assediantes fundados em qualidades específicas do sujeito passivo. Em termos estritos, no assédio moral discriminatório, o comportamento do agente assediante, tem em primeira linha, como objectivo ou efeito, violar o direito à igualdade e à não discriminação, assentando o assédio moral em várias motivações que não apenas a discriminatória.
A este respeito importa relembrar o referido art.º 25.º n.º 5 do CT, por via do qual “Cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores em relação aos quais se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer factor de discriminação”.
Esta norma decorre do estipulado no direito da União Europeia, em particular, das Directivas 2000/43 do Conselho de 29.06.2000 e 2000/78, do Conselho de 27 de Novembro, sendo seu propósito facilitar a prova nos casos de assédio discriminatório, com vista a combater a discriminação e a promover a igualdade dos cidadãos. 
Assim, e por força das referidas disposições legais (artigos 29.º, n.º 2, 25.º, n.º 5) quando esteja em causa a prática de assédio baseado em factor de discriminação, como sejam, nos termos do art.º 24.º n.º 1, do Código do Trabalho, a “ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião convicções politicas ou ideológicas e filiação sindical”, deve aplicar-se o regime especial, de repartição do ónus da prova, decorrente da proibição da discriminação referido no supra citado n.º 5 do art.º 25.º do Código do Trabalho. 
“Resulta do artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República, sob a epígrafe, «direitos dos trabalhadores», que «todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito»: b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar.
Este dispositivo projecta ao nível da fixação das condições de trabalho, como base para garantir uma existência condigna, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Lei Fundamental, nos termos do qual, «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei» e «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual (…)”.
De acordo com aquela norma do n.º 5 do artigo 25.º do Código do Trabalho, quem invoca uma situação de discriminação tem apenas de provar a discriminação concreta de que é vítima e os factos integrativos do factor de discriminação referidos no n.º 1 do artigo 24.º, incumbindo depois ao empregador provar que a diferença de tratamento assenta em critérios objectivos e não decorre do factor de discriminação invocado.
Esta inversão do ónus da prova prevista hoje no n.º 5 do artigo 25.º do Código de 2009, encontrava-se igualmente estabelecida no artigo 23.º, n.º 3, do Código de 2003, aplicado no acórdão deste Secção de 22 de abril de 2009, proferido no processo n.º 3040/08, questão sobre a qual se referiu naquele aresto o seguinte:
«Deste modo, a quem invoca a prática discriminatória compete alegar e provar, além do diferente tratamento (resultado de tal prática), os factos integrantes de um daqueles factores, pois que o juízo sobre a discriminação pressupõe que «em razão de um factor de discriminação uma pessoa seja sujeita a um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável» (…).
Alegado e demonstrado um desses factores, a lei presume que dele resultou o tratamento diferenciado, fazendo recair sobre o empregador a prova do contrário, ou seja, a prova de que a diferença de tratamento não se deveu ao factor invocado, mas sim, a motivos legítimos, entre os quais se contam os relacionados com a natureza, qualidade e quantidade do trabalho prestado pelos trabalhadores em confronto.
Isto significa que a presunção de discriminação não resulta da mera prova dos factos que revelam uma diferença de remuneração entre trabalhadores da mesma categoria profissional, ou seja da mera diferença de tratamento, pois, exigindo a lei que a pretensa discriminação seja fundamentada com a indicação do trabalhador ou trabalhadores favorecidos, naturalmente tal fundamentação há-de traduzir se na narração de factos que, reportados a características, situações e opções dos sujeitos em confronto, de todo alheias ao normal desenvolvimento da relação laboral, atentem, directa ou indirectamente, contra o princípio da igual dignidade sócio-laboral, que inspira o elenco de factores característicos da discriminação exemplificativamente consignados na lei.». Itálicos e sublinhados nossos (Cfr. Ac.do STJ de 20-06-2018, proc. 31947/15.9T8LSB.L1.S1).
Está em causa a apreciação do comportamento da directora técnica da instituição, (…) que a 2 de abril de 2015 escreveu na página do Partido (…) no Facebook relativamente à candidatura da autora às eleições autárquicas por aquele partido, o seguinte comentário: «vende-se por pouco. Se não fosse o pessoal de esquerda a darem-lhe trabalho, comia merda», tendo a mesma directora técnica escrito na dita página do Partido (…) no Facebook, relativamente à candidatura da autora, em data não concretamente apurada, mas posterior ao dia 2 de abril de 2015, o seguinte comentário: «devias ter vergonha. Se não fossem uns gajos de “Esquerda” a darem-te trabalho, comias……», bem como apreciar a posição assumida pela ré, a qual teve conhecimento da referida publicação, pelo menos, com a resposta à nota de culpa apresentada pela autora em 16-12-2016 e nada fez. 
Em termos de enquadramento fáctico, importa ainda relembrar que no início de 2015, em período de eleições autárquicas, a autora participou numa campanha eleitoral do Partido (…), fazendo parte da lista de candidatos à autarquia, e que tal facto foi conhecimento da ré e da directora técnica da instituição, (…), ambas filiadas no Partido (…).
A este respeito, desde já se adianta, que a ré não tem razão quando pretende que tal publicação se insere no âmbito a vida privada da funcionária, de que a ré não teve conhecimento, e que as referidas expressões foram produzidas a título próprio e no âmbito de conflitos entre trabalhadores.
Não se ignora que nos termos do art.º 16.º Código do Trabalho, “O empregador e o trabalhador devem respeitar os direitos de personalidade da contraparte, cabendo-lhes, designadamente, guardar reserva quanto à intimidade da vida privada; O direito à reserva da intimidade da vida privada abrange quer o acesso, quer a divulgação de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes, nomeadamente relacionados com a vida familiar, afectiva e sexual, com o estado de saúde e com as convicções políticas e religiosas” (n.º s 1 e 2). E que, segundo o art.º 22.º “O trabalhador goza do direito de reserva e confidencialidade relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal e acesso a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte, nomeadamente através do correio electrónico, correio electrónico”. Nos termos do art.º 14.º “É reconhecida, no âmbito da empresa, a liberdade de expressão e de divulgação do pensamento e opinião, com respeito dos direitos de personalidade do trabalhador e do empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e do normal funcionamento da empresa.”
Impondo-se ainda realçar que, no âmbito dos direitos liberdades e garantias, previstos na Constituição da República Portuguesa (CRP), por força do seu art.º 26.º, “a todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”.
Determinando, por seu turno, o art.º 18.º da nossa Lei Fundamental, que “os preceitos constitucionais respeitantes a direitos liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas”. Trata-se da chamada eficácia horizontal dos direitos liberdades e garantias, pelo que, à semelhança do que ocorre com o Estado, também os sujeitos privados não devem perturbar ou impedir o exercício de outros direitos fundamentais dos cidadãos.
É também sabido, que o direito à reserva da intimidade da vida privada, assenta na protecção da dignidade da pessoa humana, nos planos físico e psíquico, bem como na valoração da sua individualidade e autonomia. A protecção a conceder à vida privada dependerá da área da personalidade afectada, delimitada, segundo alguns autores, pela chamada teoria das esferas em que a mesma está envolvida. Assim, a esfera de publicidade  corresponde aos actos praticados em público e com o desejo de os tornar públicos; a esfera pessoal compreende as relações com o meio social, sem que sujeito as pretenda divulgar ou tenha interesse na sua divulgação; a esfera privada diz respeito aos dados relativos a situações de maior proximidade emocional, e a esfera íntima diz respeito ao mundo psíquico do sujeito (vg. a auto-estima e a auto-confiança) e à sexualidade. Em linha com o referido “Estará fora do objecto do direito sob estudo toda e qualquer informação divulgada pelo próprio referente da informação quando feita em local público, isto é, no qual se cruzam ou podem cruzar destinatários não compreendidos nas outras esferas por ausência de relações próxima com o sujeito”. Cfr. Domingos Farinho, “A Intimidade da Vida Privada e Media no CiberEspaço”, Almedina, pág. 45 - 46.
É conhecido, na actualidade, o importante espaço comunicacional e de partilha de informação ocupado pelas redes socias, como é o caso do Facebook, e as inúmeras questões que o seu uso pode suscitar, nomeadamente em termos sociais, familiares, criminais, que não cabe aqui analisar.
Para o que ora nos ocupa, importa atentar que não obstante os apontados preceitos referentes aos direitos de personalidade do trabalhador se não reportem (expressamente) às redes sociais, as manifestações comunicacionais dos seus usuários trabalhadores são passiveis de beneficiar da reserva da confidencialidade, desde que referentes a conteúdos (mensagens) não profissionais emitidas ou recepcionadas através desses meios.
Sobre essa matéria têm-se os nossos tribunais pronunciado, fazendo apelo à “expectativa de privacidade”, no sentido de se averiguar, em cada caso, se o trabalhador ao usar uma rede social, proferindo comentários susceptíveis de integrar infracção disciplinar, pode fundada e legitimamente contar que tais publicações se restringem a um número limitado de pessoas nas quais confia, não sendo passíveis de integrar a esfera pública.
No presente caso, consoante emerge da factualidade provada, a ré e a directora técnica da instituição, (…), tiveram conhecimento de candidatura da autora às eleições autárquicas pelo Partido (…) visto se tratar de um facto político e eminentemente público. Nos termos assinalados na sentença recorrida, “tratando-se de um facto público, uma candidatura a um cargo político, o mesmo era necessariamente do conhecimento da generalidade dos cidadãos, máxime dos residentes e eleitores do município da …”. Para além disso, a dita publicação foi inserida em página do Facebook do Partido (…) pela referida directora técnica (inscrita noutro partido), o que leva a pressupor poderem àquela aceder quaisquer outras pessoas estranhas ao dito partido, deste modo tomando conhecimento do conteúdo das publicações aí inseridas.
No sentido do carácter público e aberto de tais publicações apontam os documentos de fls. 12 a 14 (mensagens do Facebook), onde para além dos comentários da dita (…)  constam muitos comentários de resposta àqueles, de várias outras pessoas, aparentemente não conhecidas daquela, tendo a mesma inclusive respondido, a insurgir-se, contra alguns desses comentários.
No presente caso, não se dispõe, pois, de dados seguros que apontem no sentido do carácter privado a aludida página, tudo levando a crer serem os respectivos conteúdos de acesso livre (como é a regra), sendo, assim, perfeitamente razoável à mencionada (…)  e à ré pressuporem que após tais publicações passarem a constar da dita página do Facebook, as mesmas eram susceptíveis de vir a ser conhecidas e partilhadas por terceiros - não assumindo caráter privado.
Deste modo, não se podendo afirmar assumirem cunho sigiloso ou privado as referidas publicações (o que a ré tão pouco demonstrou), é de considerar não gozarem as ditas publicações da reserva da vida privada, pelo que a ré sempre poderia ter delas tomado conhecimento sem lesar o direito à privacidade da mencionada funcionária (…).
Acresce ainda que, ao contrário do sufragado pela ré, nos autos nada foi apurado que revele a existência de conflito entre a autora e a sua superior hierárquica. Não resulta da matéria de facto provada, nem foi alegado que a autora tenha sequer respondido à dita publicação.
Por último, a referida publicação (e a que se lhe seguiu) não foi produzida a título próprio (pessoal) como pretende dar a entender a ré. As expressões em causa foram inseridas na mencionada página do Facebook por alguém que é a directora técnica da instituição, superior hierárquica da autora, filiada em partido político diverso daquele em que autora concorreu às eleições autárquicas. Tais expressões, estão directamente conexionadas com o trabalho que a autora presta à ré, no âmbito do contrato de trabalho vigente entre as partes, tendo sido proferidas, precisamente, por causa desse trabalho, “se não fossem os gajos de esquerda darem-lhe trabalho comias merda”. Conforme referido na sentença recorrida, trata-se de “comentário público, no “site” do partido da autora, levado a cabo pela sua superior hierárquica e onde se faz menção à sua relação laboral. As duas frases colocadas pela superiora hierárquica da autora no Faceboock, atento o respetivo conteúdo, e tendo presente que o Presidente da ré é filiado no Partido (…), são suscitáveis de, por um lado, ofender a Autora, na medida em que insinuam que a mesma, não fora a Ré, não trabalharia em mais nenhum lado, pondo em causa a sua dignidade profissional; atemorizar a Autora chamando a atenção, ou dando a entender, ainda que de forma velada, a perfilhação política dos dirigentes da Ré seriam incompatíveis com a opção politica assumida pela Autora.”
Tais publicações consubstanciam, outrossim, clara afronta ao direito que a autora tem, como cidadã de “tomar parte na vida política e na direcção dos assuntos públicos do país, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos”, nos termos previstos no art.º 48.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
Trata-se, manifestamente, de comportamento indesejado, integrante da figura de assédio laboral discriminatório, perpetrado através de mencionada rede social, baseado nas convicções políticas e ideológicas da autora, por oposição às da referida superior hierárquica da autora, com o objectivo ou efeito de perturbar e constranger a autora, afectar a sua dignidade ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil degradante humilhante ou desestabilizador.
Da sobredita publicação teve pelo menos a ré conhecimento através da resposta à nota de culpa apresentada pela autora em 16-12-2016, e como se denota pela posição assumida no relatório e decisão final do processo disciplinar que instaurou à autora, e da sua própria contestação, desvalorizou o assunto e nada fez.
Essa postura omissiva e de desinteresse - perante comportamento tão grave e ilícito da directora técnica para com uma sua trabalhadora subordinada - implicam seja a ré responsável pelo mesmo, na medida em que o trabalhador tem direito a que lhe seja garantida pela entidade empregadora a integridade física e psíquica, assim como a prestação de trabalho em condições dignificantes e de segurança, higiene e saúde (encarada esta em termos físicos e psíquicos) o que a ré, manifestamente, não fez.
Com efeito, o empregador é responsável pelo bom funcionamento da empresa. Nos termos do art.º 127.º do Código do Trabalho, na redacção vigente à data dos factos: “1- O empregador deve, nomeadamente: a) Respeitar e tratar o trabalhador com urbanidade e probidade; (…); c) Proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral; (…); g) Prevenir riscos e doenças profissionais, tendo em conta a protecção da segurança e saúde do trabalhador, devendo indemnizá-lo dos prejuízos resultantes de acidentes de trabalho; h) Adoptar, no que se refere a segurança e saúde no trabalho, as medidas que decorram de lei ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho”.
Impõe-se ainda realçar, que nos termos do art.º 59.º da CRP, “Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito (…), c) À prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde” - o que se traduz no direito fundamental do trabalhador à disponibilização de condições de segurança e saúde no trabalho (Cfr. Milena Rouxinol “ A Obrigação de Segurança e Saúde do Empregador”, Coimbra editora, 2008, pág. 108 e segs.).
Segundo o art.º 28.º do CT, “A prática de acto discriminatório lesivo de trabalhador ou candidato a emprego confere-lhe o direito a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais de direito”. Uma vez que se trata de actos cuja autoria é de imputar à empregador (perante quem a autora denunciou o assédio de que foi alvo pela sua superior hierárquica), responde a mesma pelos danos causados à autora, visto não ter provado que agiu sem culpa (art.º 799.º do Código Civil). E mesmo noutra perspectiva que considere tratar-se de acto praticado por trabalhadora subordinada da ré, sempre esta poderá ser responsável nos termos do art.º 800.º n.º 1 do Código Civil (“O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor”), como têm vindo a entender os nossos tribunais. “Nas situações de assédio moral, a lesão dos direitos de personalidade surge no quadro da especial vulnerabilidade que caracteriza a posição do trabalhador na relação laboral e em infracção de deveres de protecção e segurança emergentes desta relação. (…) Na verdade, e como já o Prof. Vaz Serra explanava em tempos bem recuados, é geralmente admitido nos direitos modernos que o devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados por ele próprio, compreendendo-se que este, tal como responde pelas “coisas materiais que emprega, responde pelas pessoas cujos serviços utiliza”, e que “a insuficiência das pessoas, tal como a das coisas que emprega, não constitui justificação de não ter obtido o resultado prometido”. Nesta ordem de ideias, continua o mesmo autor, “o devedor responde por todos aqueles que deixou penetrar no seu domínio de atividades ou que admitiu a colaborar com ele, de maneira mais ou menos permanente e mais ou menos completa, na execução das suas obrigações”, bastando que “sejam permitidos a participar na realização da prestação devida, empregados, criados, operários, ajudantes (...), para que o seu facto não possa já ser tido como caso fortuito ou um caso de força maior nas relações do devedor com o credor”. Agora na expressão de Maria Victória R. F. Rocha “a ratio do preceito está na necessidade objectiva de tutela do crédito que na moderna organização empresarial se faz sentir”, sendo, nesta matéria, “irrelevante o tipo de obrigação, tanto podendo ser de meios como de resultado, como até uma obrigação negativa, de abstenção”, como é o caso da situação do comerciante que, obrigado por um pacto de não concorrência, o viola por actuação do seu chefe de vendas Deste modo, como explicita a mesma autora, a expressão “no cumprimento” deve entender-se como reportada à “relação obrigacional no sentido de relação obrigacional complexa”. Na verdade: se, como vimos, o devedor não está apenas obrigado a realizar a prestação principal, é imperioso concluir que qualquer conduta que infrinja a globalidade da relação obrigacional - e que tenha lugar no âmbito da inerente dinâmica - consubstancia um incumprimento (lato sensu) (…). Vale por dizer que o devedor deverá ser responsabilizado pelos danos quando haja uma “conexão íntima” entre os atos lesivos dos auxiliares e a tarefa a estes cometida pelo devedor, ou seja, quando o dever de proteção violado decorre, especificamente, do contrato”. Cfr. Ac. do STJ de 12-03-2014, proc. 590/12.5. TTLRA.C1.S1. Ora, no presente caso, pode-se considerar que os danos causados à autora estão conexionados com as funções da sua superior hierárquica, para quem se devem considerar delegadas as responsabilidades da ré em termos de protecção dos seus trabalhadores.
Improcede, assim, sem mais, a presente questão.
4.2. Recurso da autora
4.2.1. Da indemnização por danos não patrimoniais
Insurge-se a autora contra a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais no valor de €4.000,00. Refere que a sentença recorrida considerou que a mesma foi alvo de assédio, pelo que deverá fixar-se uma indemnização justa e equitativa nos termos do art.º 496.ºdo Código Civil. 
Vejamos,
Segundo o referido art.º496.º, “Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito;” “O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores.” (n.ºs 1 e 4) 
Como decorre do mencionado dispositivo legal, para além dos requisitos gerais da obrigação de indemnizar decorrentes do art.º 483.º do Código Civil (facto ilícito e culposo, dano, e nexo de causalidade), é ainda necessário que tais danos sejam graves e mereçam a tutela do direito. (Acórdãos do STJ de 05.03.2013 e de 25.01.2012). A gravidade do dano é, pois, elemento indispensável à sua compensabilidade. Na linha do proposto pelo Professor Antunes Varela, a jurisprudência, em particular, a do STJ, tem rejeitado a indemnizabilidade de danos que se possam enquadrar em “simples incómodos, transtornos ou contrariedades”, visto não assumirem a gravidade prevista na lei. Tem-se entendido merecer a tutela do direito o dano cuja gravidade, assumindo-se como exorbitante ou excepcional, sai da mediania, ultrapassando as fronteiras da banalidade; um dano considerável que no seu mínimo espelha a intensidade duma dor, duma angústia, dum desgosto, dum sofrimento moral, que segundo as regras a experiência e do bom senso, se torna inexigível em termos de resignação. E, sendo a gravidade do dano um conceito relativamente indeterminado, carece o mesmo de ser preenchido caso a caso, de acordo com a realidade fáctica apurada. A gravidade deve, porém, medir-se por um padrão objectivo, e não de acordo com factores subjectivos, ligados a uma sensibilidade particularmente aguçada ou especialmente fria e embotada do lesado; e, por outro lado, deve ser apreciada em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. (Acórdãos do STJ de 04-03-2004 - Revista n.º 4439/03 - 2.ª Secção e 25-01-2012, Revista 4212/07.8TTLSB.L1.S1 ). Esta (restritiva) posição tem a vantagem de funcionar como uma espécie de filtro para que se não desvirtuem as exigências do legislador no que concerne à selecção de danos não patrimoniais indemnizáveis, atenta a natureza dos bens envolvidos e ao facto da compensação ser fixada equitativamente, não se pretende com a mesma operar reparação do dano, mas sim conceder-se uma espécie de lenitivo para aliviar a dor e os padecimentos suportados pela vítima.
Importa, contudo, sempre atentar ao circunstancialismo concreto de cada caso, e não olvidar que o critério da gravidade do dano não pode deixar de pressupor uma ponderação “baseada na dignidade, no valor intrínseco do bem ou interesses protegidos”, razão pela qual, e de antemão, “os danos consequentes a lesões da personalidade podem ser rotulados, em regra de graves (…). Cfr. Maria Manuela Veloso “Danos não Patrimoniais”, “Comemorações dos 25 Anos do Código Civil”, BFDUC, 2007, pág. 505, não se devendo ignorar que no domínio dos danos não patrimoniais, estão em sobretudo em causa, direitos humanos fundamentais constitucionalmente protegidos.
Por determinação do art.º 496.º n.º 4 do Código Civil, o montante da indemnização é fixado equitativamente, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art.º 494.º do mesmo diploma. Ou seja, embora fazendo apelo à equidade, o legislador indica os critérios pelos quais se deve mover o julgador na determinação do quantum indemnizatório, devendo atender-se ao grau de culpabilidade do agente, à sua situação económica e à do lesado e às demais circunstâncias do caso, como sejam, os padrões de indemnização geralmente adoptados pela jurisprudência. Como tem sido assinalado pela jurisprudência, o recurso à equidade na fixação dos danos não patrimoniais, não implica se desconsiderem as exigências do princípio da igualdade, o que implica para o julgador a busca de critérios uniformes, tendo em consideração as particularidades de cada caso (Cfr. Acórdão do STJ de 29-06-2017, proc. 976/12.5TTBCC.L1). À fixação da indemnização devem ainda presidir critérios de proporcionalidade (atenta a gravidade de cada tipo de dano) e, sobretudo de uniformidade.
A indemnização arbitrada não deve ser miserabilista, devendo assumir carácter sancionatório e preventivo para ser eficaz contra prática do assédio.
Sobre a temática dos danos não patrimoniais e fixação da respectiva indemnização tem-se o STJ pronunciado em vários arestos, e por referência à sua própria jurisprudência em casos similares. Assim, “(…) o ressarcimento por danos não patrimoniais não tem a natureza de uma verdadeira indemnização, dado não ser uma exata contrapartida pelo dano, representando antes uma compensação a atribuir ao lesado por prejuízos por este sofridos, que não têm reparação direta através de satisfações de natureza pecuniária. Deste modo, se justifica que, no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração (Vd. Vaz Serra in RLJ., Ano 113, pág. 104). Com a reparação por danos não patrimoniais tem-se em vista compensar o lesado, proporcionando-lhe os meios económicos que constituam, de certo modo, um refrigério para as mágoas e adversidades que sofrera e que, porventura, continue a suportar. E estes princípios respeitantes aos danos de natureza não patrimonial carecem de ser observados no âmbito do direito laboral por este nada de específico conter nesta matéria (…). Por outro lado, sempre será necessário atentar em que os danos sofridos pelo trabalhador devem integrar uma lesão grave, que vá para além daquela que sempre acontece em situações similares de despedimento, porque o direito a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais não é de admitir como regra, mas apenas no caso singular de haver uma justificação segura, que leve a concluir pela necessidade de reparar uma lesão que restaria apodicticamente não satisfeita (…). Sobre a problemática da reparação dos danos não patrimoniais.
Referiu-se, com efeito, no acórdão de 1 de março de 2018, proferido no processo n.º 606/13.8TTMTS.P1.S2, o seguinte:
«Na verdade, podemos encontrar decisões do Supremo Tribunal de Justiça, nomeadamente desta 4.ª secção, sobre a indemnização por danos não patrimoniais, no âmbito do foro laboral, que nos podem ajudar neste julgamento de equidade, como é apelidado por Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela (Código Civil, anotado, Coimbra Editora, Vol. 1, pág. 339).
No Acórdão de 25/11/2014, proferido no Recurso n.º 781/11.6TTFAR.E1.S1, proclamou-se o princípio de que a “A indemnização por danos não patrimoniais pressupõe, concretamente no foro laboral, que se trate de danos que constituam lesão grave, com justificação causalmente segura, decorrente de atuação culposa do agente, e que sejam dignos da tutela do Direito”.
No Acórdão, datado de 14-02-2013, proferido no Recurso n.º 1508/06.0TTLSB.L1.S1, concretizou-se que “Configurando-se a violação do dever de ocupação efetiva do trabalhador e a sua despromoção ilícita, e considerando que esses factos contribuíram para a situação de doença do trabalhador, que se prolongou por bastante tempo, é de reputar como equilibrada a importância de €15.000,00, a título de compensação pelos danos não patrimoniais causados”.
Na mesma linha, também o Acórdão, de 05/03/2013, proferido no Recurso n.º 1361/09.1TTPRT.P1.S1, sublinhou “Configurando-se a violação do dever de cometer funções correspondentes à atividade contratada, justifica-se a atribuição, ao autor, de uma compensação pelos danos não patrimoniais gerados por tal violação”.
O Acórdão de 12/09/2013, proferido no Recurso n.º 18003/11.8T2SNT.L1.S1, frisou que “Provando- se que, devido à conduta do empregador, a trabalhadora ficou afetada emocional e psicologicamente de forma grave, passando a carecer de acompanhamento psiquiátrico e de internamento hospitalar, deverá considerar-se que ocorreram danos não patrimoniais relevantes que justificam a atribuição de indemnização no montante de € 17.500,00, como forma de compensação”.
Também o Acórdão, de 17-12-2014, proferido no Recurso n.º 292/11.0TTSTR.E1.S1, salienta que “Resultando provado que a ré não atribuiu à autora as funções correspondentes à categoria profissional contratada – mas sim funções de categoria inferior, desempenhadas a par e ao lado de colegas que lhe estavam hierarquicamente subordinados – e que violou o seu direito a não trabalhar aos sábados e domingos, provocando-lhe danos graves, atentatórios da sua saúde física e psicológica (sentimentos de humilhação, tristeza, angústia, ansiedade e stresse), estão verificados os pressupostos da indemnização por danos não patrimoniais”.
Finalmente, o Acórdão, de 28/01/2016, proferido no Recurso n.º 2501/09.6TTLSB.L2.S1, adianta que “Tendo a ré despedido ilicitamente a autora, e esta sofrido danos não patrimoniais graves, em virtude do despedimento realizado, justifica-se que lhe seja atribuída uma compensação por danos não patrimoniais, sendo de reputar como equilibrada a quantia de € 10.000,00 conferida, a esse título, no acórdão recorrido.” (Cfr. o citado Ac. do STJ de 20-06-2018).  
Estão demonstrados nos presentes autos - o facto ilícito (assédio); a culpa da ré nessa prática; o nexo de causalidade (em consequência da conduta assumida pela ré) e os danos (o estado de saúde da autora se degradou, tendo a mesma sofrido de doença natural de 23-2 a 02-06 de 2017, foi encaminhada para consulta de psicologia pela sua médica de família a 26-04-2017 como o seguinte motivo: «Problemas a nível do emprego, diz estar a ser vítima de assédio psicológico. Recentemente faleceu o pai. Pede ajuda para enfrentar os problemas», tendo a autora desenvolvido um quadro de depressão e ansiedade em 2017). Tais danos, pelas suas características, são de considerar suficientemente graves, merecedores da tutela do direito. Na verdade, como consequência do comportamento da ré, a autora viu profundamente afectadas a sua saúde física (o que se demonstra pelo largo período de incapacidade por doença de que padeceu), como sua saúde psíquica, tendo sofrido de um quadro de depressão e ansiedade em 2017, o que está em sintonia com o referido pela sua médica de família nas consultas a que se submeteu.
Procedendo à ponderação dos elementos relevantes que os autos patenteiam, sendo de considerar modesta condição económica e social da autora (auxiliar de educação há vários anos), não se dispondo de elementos que nos permitam concluir ser muito favorável ou potentosa a situação económica e financeira da ré (uma IPSS), tendo em consideração a incidência e duração da prática de assédio na pessoa da autora, o contexto em que a situação laboral se desenvolveu, e que foi apenas em 2017 que emergiram os danos, ignorando-se a sua perduradurabilidade, à luz da apontada jurisprudência sobre casos com alguma similitude, considera-se justo e adequado fixar a indemnização por danos não patrimoniais à autora em €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros).
Termos em que procede, parcialmente, a presente questão. 
5. Decisão
Em face do exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas;
Nega-se provimento ao recurso da ré na sua dupla vertente de facto e de direito. Concede-se parcial provimento ao recurso da autora, pelo que se fixa à mesma, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros).
Mantém-se no mais a sentença recorrida.
Custas pela ré no seu recurso.
Custas por ambas, na proporção, no recurso da autora.

Lisboa, 2020-09-08
Albertina Pereira