Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
EXECUÇÃO
PENHORA DO VENCIMENTO
NOTIFICAÇÃO
FORMA
TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL IMPRÓPRIO
Sumário
Para a formação de título executivo judicial impróprio, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 773º, nº 1 e 777º, nº 3 do CPC, a notificação está sujeita às regras da citação. Não tendo as mesmas sido observadas inexiste título executivo.
Texto Integral
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa
Nos autos de execução intentada porC, Lda.contraHC,a exequente apresentou requerimento executivo, em cumulação, contraN, Lda.do seguinte teor: “A Exequente intentou execução para pagamento de quantia certa contra o Executado HC, tendo como título executivo a sentença já transitada em julgado que conferiu força executiva à petição inicial apresentada nos termos do art. 2º do Anexo ao DL 269/08 de 01 de Setembro, na sua actual redação, pelo valor de €13.508,16, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento. Em sede de diligências para penhora, e, efectuadas pesquisas junto da Segurança Social pelo Sr. Agente de Execução, apurou-se que o Executado aufere um rendimento mensal que lhe é liquidado pela sociedade comercial N, Lda, e, nessa sequência foi concretizada a notificação da referida sociedade, entidade que consta como pagadora das remunerações do Executado para que procedesse à penhora dos abonos, vencimentos salários ou outros rendimentos periódicos devidos à executada até ao montante de 16.524,00 (cfr. docs. 1 e 2 que se juntam), tudo nos termos do art. 779º do CPC. Por não ter obtido qualquer resposta, o Sr. Agente de Execução, na data de 27/04/2022, remeteu nova notificação à referida sociedade (cfr. doc. n.º 3), sem obter qualquer resposta novamente, fazendo a advertência prevista no art. 773º, n.º 4 do CPC. Nos termos do art. 773º, n.º 4 do CPC, a omissão tem o efeito cominatório de equivaler ao reconhecimento do crédito, nos termos da indicação do mesmo à penhora, presumindo-se, por conseguinte, a existência do crédito nos exatos termos em que foi nomeado à penhora e foi penhorado. O título executivo a que se refere o nº 3 do art. 777º do CPC, é formado pela notificação à terceira devedora (no caso, a sociedade N, Lda.) e a falta de declaração desta, é tido pela doutrina e pela jurisprudência como um título judicial impróprio, porque o mesmo encerra uma condenação da devedora decorrente da lei, que sanciona o seu silêncio com a presunção de que o crédito penhorado existe nos exatos termos em que foi penhorado. Nesta conformidade de face ao supra exposto, considerando que a notificação efectuada pelo Sr. Agente de Execução preenche os requisitos previstos no art. 773.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, requer-se a V. Exa. Se digne a ordenar a prossecução dos presentes autos contra N LDA, pelo montante máximo da execução, conforme o indicado na notificação que lhe foi feita pelo Ser. Agente de Execução, bem como de todas as despesas legais, servindo de título executivo o conjunto dos documentos juntos. Juntam-se os docs. n.ºs 1 a 3,os quais formam título executivo impróprio , o que significa que , para efeitos do disposto nos arts. 550º, nº 2, al. a) e 703º, nº 1, al. a), ambos do CPC, o título executivo assim formado pela notificação efetuada à terceira devedora da penhora do crédito e da falta de declaração desta é havido como sentença judicial condenatória.”
Neste requerimento a exequente indicou como quantia exequenda o valor de € 16 524,00. Por despacho de 28/06/2022 foi admitida a cumulação sucessiva, ao abrigo dos artigos 711º, n.º 1 e 709º, n.º 1, ambos do Código Processo Civil; ordenada a notificação e citação da entidade patronal do executado para, querendo e em 20 dias, pagar ou deduzir oposição à execução cumulada. A executada deduziu embargos à execução. Alegou, em síntese, a inexistência de título executivo por falta de citação. Aduz que o documento nº 2 anexo ao requerimento executivo correspondente à notificação efetuada pelo sr. Agente de Execução ao abrigo do artigo 779º do CPC, e documento obtido no site dos CTT do qual resulta que a referida notificação terá sido entregue a 04/03/2022 a PC, bem como o documento n.º 3, correspondente a notificação efetuada pelo sr. Agente de Execução com data de 27/04/2022 e um documento obtido no site dos CTT do qual resulta que a referida notificação terá sido entregue a 29/04/2022 a IE. Mais alegou que não teve conhecimento das notificações a que correspondem os referidos documentos, pois as mesmas nunca foram por si recebidas, desconhecendo as mencionadas pessoas. Os referidos documentos não constituem título executivo bastante que permita fundamentar a presente execução, devendo, em consequência, ser declarada extinta por falta de título, nos termos constantes do n.º 5 do artigo 10º, artigo 703º e artigo 777º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil. A não se entender assim, e considerando-se que a ora embargante incorreu em incumprimento, a responsabilidade por tal incumprimento é limitada à medida do valor da sua obrigação. À exequente só é lícito exigir o valor da prestação em que a entidade patronal é faltosa, ou seja o valor que deveria ter penhorado no vencimento do seu funcionário, cumprindo as limitações do artigo 738º do CPC face às penhoras que já recaem sobre o referido vencimento, e não o valor total em dívida pelo executado HC, valor que atentos os limites impostos pelo artigo 738º do CPC e atentas as penhoras já existentes no salário do seu funcionário, que são anteriores à presente execução, corresponderá, na presente data, a um valor que não ascenderá aos 900,00€ (novecentos euros). A exequente apresentou contestação. Alegou, em suma, que no âmbito da notificação/citação das pessoas coletivas, conforme art. 223º, n.º 1 e 3 do CPC, e, remissão do art. 246º, n.º 1 do CPC, a primeira modalidade legal é a citação (pessoal) postal inicial prevista no art. 228º do CPC, com as especificidades previstas no número 2 da mesma disposição legal, devendo a notificação/citação operar-se na sede da notificanda/citanda inscrita no ficheiro central de pessoas coletivas do Registo Nacional de Pessoas Coletivas. As notificações dirigidas e remetidas pelo Sr. Agente de Execução à ora Embargada, nos termos e para os efeitos do art. 779º do CPC, não foram objeto de recusa de aceitação, nos termos do art. 246º, n.º 3 do CPC, presumindo-se que a ora Embargada /destinatária teve oportuno conhecimento do teor das notificações que lhe foram remetidas. Mais alegou que perante a falta de colaboração e informação da ora embargante, aquando das notificações que lhe foram dirigidas, nos temos do art. 779º e 777, ambos do CPC, não tendo a ora Embargada informação sobre o montante do crédito, nada lhe impede que peticione ao devedor, com referência à totalidade da dívida exequenda na execução movida contra o Executado HC; cabendo à Embargante, invocar, que o valor da sua obrigação é inferior ao direito exequendo, alegando, todos os elementos que permitam restringir a obrigação exequenda ao real valor da sua obrigação, nomeadamente, o valor do salário e a data do respetivo vencimento. Com dispensa de realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador sentença que julgou os embargos procedentes e declarada extinta a execução contra a embargante.
A exequente recorre desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: 1.ª-A notificação que foi efetuada à ora Recorrida, nos termos do art. 779º e 773º do CPC, não se mostra realizada em observâncias das formalidades prescritas para a citação. 2.ª-A notificação levada a cabo pelo Sr. Agente de Execução, na data de 02 de Março de 2022 foi realizada mediante carta registada com aviso de recepção, cumprindo o disposto nos arts. 773º, n.º 1 e 228º, n.º 1 e 246º, n.º 2 do CPC 3.ª-O requerimento executivo impróprio dado à execução, sujeito a despacho liminar, nos termos do art. 726º do CPC não foi objecto de indeferimento liminar por insuficiente ou falta de título. 4.ª-O título nos presente autos é formado pela notificação à devedora, in casu, entidade patronal e pela sua ausência de resposta. 5.ª-Se o tribunal a quo dúvidas tivesse quanto ao cumprimento das formalidade de notificação prescritas nos arts. 779º, 773º, n.º 1 e 228º, n.º 1 e 246º, n.º 2 do CPC, ao abrigo do art. 411º do CPC, previamente à prolação do despacho de que ora se recorre, ao abrigo do princípio do inquisitório, poderia ter encetado ou ordenado todas as diligências pertinentes à busca da verdade material e justa composição do litígio, perante os factos que podia conhecer, o que não fez. 6.ª-Consta dos presentes autos a comprovação da notificação realizada na data de 02 de Março de 2022, ter sido acompanhada de aviso de receção, aviso este assinado por PC, na data de 04 de Março, o qual se comprometeu a entrega-lo prontamente ao destinatário. 7.ª-Ao decidir como decidiu quanto à nulidade da citação, no douto despacho de que ora se recorre, o douto Tribunal a incorreu em erro de julgamento, violando os arts. 779º, 773º, 228º, n.º 1 e 246º, n.º 2, todos os CPC , bem como o art. 411º do CPC 8.ª-Verifica-se igualmente erro de julgamento de direito, por parte do Tribunal a quo, interpretando e aplicando incorrectamente o disposto nos artº.s 724º nºs 1 e 3, 779º, 773 , 776º, 724º e 775º todos do CPC; Isto porque 9.ª-Perante a notificação da ora Recorrida, na qualidade de entidade patronal do Executado HC, nos termos do art. 773º do CPC, para vir declarar qual o vencimento daquele, na sequência do seu silêncio, ao abrigo do art. 773º, n.º 4 do CPC, entende-se que ele reconhece a existência da obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora; 10.ª-A ausência de resposta por parte do devedor, in casu, a ora Recorrida, equivale a confissão da existência do crédito tal como foi pela Exequente configurado, admitindo a sua existência em termos qualitativo e quantitativos definidos ao tempo da sua nomeação à penhora. 11.ª-Tal como superiormente já decidido e em Acórdãos do presente Venerando Tribunal, processo n.º 4176/09.3T2SNT-A.L1-1, datado de 10/02/2022, no Acórdão datado de 6/7/2017, disponíveis em www.dgsi.pt: (…) para que a identificação do crédito se considere suficiente, basta que seja identificado o credor e o montante máximo do crédito que será o valor da quantia exequenda na execução principal”, e sustentando tal entendimento na consideração de que “se ao devedor notificado incumbe prestar todas as informações relativas ao crédito que possam interessar à execução, cremos não fazer sentido impor ao Exequente o ónus de averiguar exaustivamente todas as circunstâncias relativas ao crédito(…) 12.ª-Pelo que, não é exigível à ora Recorrente, por falta de informação prestada pela Recorrida, que precise e contabilize quais as prestações que estão em falta, sendo-lhe, concomitantemente, fazer prosseguir, como fez a instância executiva pela totalidade da dívida exequenda; NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, IMPONDO-SE A REVOGAÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA QUE REJEITOU A EXECUÇÃO, HAVENDO ESTA QUE PROSSEGUIR OS SEUS TERMOS ULTERIORES.” A embargante apresentou contra-alegação, terminando com as seguintes conclusões: “1.–A execução foi instaurada ao abrigo do artigo 773º, n.º 4 do CPC, por se considerar que a entidade patronal do Executado, a ora Recorrida, incorreu em incumprimento e por, apesar de alegadamente notificada para o efeito, nada ter dito quanto ao pedido de penhora de créditos, nem procedido ao depósito de qualquer quantia a favor da ora Recorrente. 2.–A ora Recorrrida não recebeu a notificação efetuada pelo Sr. Agente de Execução ao abrigo do artigo 779º do CPC e também não recebeu a notificação que terá sido efetuada nos termos do artigo 773º, n.º 4, ambos do CPC 3.–As referidas notificações só chegaram ao conhecimento da ora Recorrida aquando da citação para o processo de execução cumulado no primitivo processo de execução intentado contra um seu funcionário. 4.–A ora Recorrida não rececionou as notificações em causa e a sua não receção não lhe pode ser imputada, pelo que, não pode recair sobre a mesma o efeito cominatório do artigo 773º, n.º 4 do CPC. 5.–Não tendo a ora Recorrida sido notificada ao abrigo do disposto no artigo 779º e do artigo 773º, n.º 4, ambos do CPC não se encontram preenchidos os requisitos do artigo 773º, n.º 1 do CPC, não Lhe podendo ser imputada qualquer falta de declaração, pelo que a notificação de 02.03.2022, não pode constituir título executivo bastante que permita fundamentar a execução. 6.–De todo o modo, a notificação que foi efetuada à ora Recorrida, nos termos dos artigos 779º e 773º do CPC não cumpriu as formalidades prescritas para a citação, não se mostra efetuada com aviso de receção como determinam as regras dos artigos 779º, 773º e 777º conjugados com aos artigos 228º, n.º 1 e 246º, n.º 2, todos do CPC. 7.–A Recorrida indicou factos e juntou documentos relativos ao crédito da Exequente, ora Recorrente, que afetam a preliminar indicação feita quanto à quantia exequenda. 8.–Pelo que, só é lícito à Exequente exigir o valor da prestação em que a entidade patronal, ora Recorrida, terá sido faltosa, ou seja o valor que deveria ter penhorado no vencimento do seu funcionário, cumprindo as limitações do artigo 738º do CPC, não podendo a mesma ser responsável pelo valor indicado na notificação que Lhe terá sido efetuada. 9.–A eventual responsabilidade da Recorrida terá sempre de ser limitada à medida do valor da sua obrigação relativamente ao seu funcionário, primitivo Executado nos presentes autos, e não relativa à dívida Daquele perante a Exequente, ora Recorrente. 10.–Tal como decorre da Doutrina e da Jurisprudência, (…) o efeito cominatório de reconhecimento do crédito nos exatos moldes da sua indicação à penhora, (…) “não pode ser encarado como um reconhecimento inabalável, fundado numa presunção “juris et de jure” decorrente de um cominatório pleno ou semipleno como o existente entre partes processuais, pois é bastante diferente da inacção de quem, sendo parte na causa, e estando citado para a acção, pura e simplesmente se não quis defender de factos que lhes eram directamente imputáveis”, certo que “na cominação entre as partes, o sujeito cominado conhecia a causa de pedir e o pedido contra ele era formulado, e poderia logo equacionar as consequências dessa omissão comportamental em toda a sua extensão, havendo assim uma relação de conhecimento directo, que justifica a proporcionalidade entre a falta de acção e as consequências. Aqui, pelo contrário, estamos perante uma sanção imposta a quem é estranho à causa, que não conhece os exactos termos dela” (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11.01.2018, in www.dgsi.pt). 11.–E, “Do mesmo modo, não pretendendo negar a existência do crédito, poderá, o devedor (entidade patronal) discutir o seu montante, apresentando na oposição todos os factos relativos ao dito crédito que possam afetar a preliminar indicação feita quanto à quantia exequenda” (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11.01.2018, in www.dgsi.pt). 12.–As conclusões das Alegações de Recurso da Recorrente não procedem, pois não há a violação de nenhuma norma legal. 13.–Devendo assim, decidir-se pela total improcedência do Recurso e decidir-se pela confirmação integral do Despacho Saneador. TERMOS EM QUE, deve esse Venerando Tribunal proferir Acórdão que julgue o Recurso totalmente improcedente, devendo o Despacho Saneador recorrido ser integralmente confirmado, julgando os Embargos procedentes e nessa sequência declarar extinta a execução quanto à ora Recorrida.” *
A factualidade com relevo para a apreciação do presente recurso é a constante do relatório que antecede, bem como a seguinte:
A)–Na execução intentada por C, Lda. contra HC, em 02/03/2022, o Sr. AE expediu carta para notificação da entidade patronal do executado, N, Lda., do seguinte teor: “Fica(m) V. Exa(s). pela presente notificado(s), nos termos e para efeitos do disposto no artigo 779º do Código Processo Civil (C.P.C.), na qualidade de entidade patronal/entidade pagadora, para a penhora de 1/3 dos respetivos abonos, vencimentos, salários ou outros rendimentos periódicos devidos ao executado adiante indicado, nomeadamente indemnização ou compensação que aquele tenha a receber, até que seja atingido o limite previsto também adiante indicado. No prazo de DEZ DIAS deve(m) declarar qual o vencimento do referido funcionário (ver informações complementares para melhor esclarecimento). Nos termos do artigo 738º do CPC são impenhoráveis dois terços da parte líquida dos vencimentos, salários, prestações periódicas pagas a título de aposentação ou de qualquer outra regalia social, seguro, indemnização por acidente, renda vitalícia, ou prestações de qualquer natureza que assegurem a subsistência do executado. Para efeitos de apuramento da parte líquida das prestações referidas no número anterior, apenas são considerados os descontos legalmente obrigatórios. A impenhorabilidade atrás referida tem como limite máximo o montante equivalente a três salários mínimos nacionais à data de cada apreensão e como limite mínimo, quando o executado não tenha outro rendimento, o montante equivalente a um salário mínimo nacional. VALOR TOTAL PREVISTO 16.524,00 Euros IDENTIFICAÇÃO DO EXECUTADO HC COMINAÇÃO / ADVERTÊNCIAS Se nada disser, entende-se que reconhecem a existência da obrigação (nº 4 do artigo 773º do CPC). Se faltarem conscientemente à verdade incorrem na responsabilidade do litigante de má-fé (nº5 do artigo 773º do CPC). Não sendo cumprida a obrigação, pode o exequente ou o adquirente exigir, nos próprios autos da execução, a prestação, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, a notificação efetuada e a falta de declaração ou o título de aquisição do crédito. Nos termos do Artigo 417.º do CPC, a falta de colaboração pode ser sancionada com multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis.” B)–Em 27/04/2022 o Sr. AE expediu carta para notificação de N, Lda., com o seguinte teor: “Na sequência da minha anterior notificação, de que em anexo remeto cópia, sou a insistir por uma resposta urgente à mesma, bem como o envio de cópias dos três últimos recibos de vencimento do executado. Aproveito para lembrar de que na falta de declaração entende-se que reconhecem a existência da obrigação nos precisos termos da indicação do presente crédito à penhora, cf. Artº 773º, nº 4 do NCPC, respondendo pelos danos causados, caso não cumpra a obrigação (nº 3 do art. 777º do NCPC).”
C)–Em 08/06/2022 a exequente apresentou requerimento executivo contra N, Lda., tendo apresentado como título executivo, cópia da carta mencionada em A), print do site dos CTT, onde consta ter a mesma sido entregue a PC; cópia da carta mencionada em B) e print do site dos CTT, onde consta ter a mesma sido entregue a IE. D)–Na contestação aos presentes embargos a exequente juntou aviso de receção relativo à citação para a execução incidental. Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões nestas colocadas pelo apelante e das que forem de conhecimento oficioso (arts. 635º e 639º do CPC), tendo sempre presente que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (art.º 5º, nº3 do CPC).
Assim, as questões a decidir são as seguintes: 1.–Da regularidade da notificação da embargante 2.–Da liquidação da quantia exequenda *
1.–Da regularidade da notificação da embargante Dispõe o artº 779º, nº 1 do CPC, sob a epígrafe “Penhora de rendas, abonos, vencimentos, salários ou rendimentos periódicos”, que “quando a penhora recaia sobre rendas, abonos, vencimentos, salários ou outros rendimentos periódicos, incluindo prestações sociais e pensões, é notificado o locatário, o empregador ou a entidade que os deva pagar para que faça, nas quantias devidas, o desconto correspondente ao crédito penhorado e proceda ao depósito em instituição de crédito.”
E o artº 773º do CPC estabelece que: “1–A penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução. 2–Cumpre ao devedor declarar se o crédito existe, quais as garantias que o acompanham, em que data se vence e quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução. 3–Não podendo ser efetuadas no ato da notificação, as declarações referidas no número anterior são prestadas por escrito ao agente de execução, no prazo de 10 dias. 4–Se o devedor nada disser, entende-se que ele reconhece a existência da obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora. (…).”
Estatui o artº 777º do CPC que: “1–Logo que a dívida se vença, o devedor que não a haja contestado é obrigado: a)-A depositar a respetiva importância em instituição de crédito à ordem do agente de execução ou, nos casos em que as diligências de execução sejam realizadas por oficial de justiça, da secretaria; e b)-A apresentar o documento do depósito ou a entregar a coisa devida ao agente de execução ou à secretaria, que funciona como seu depositário. 2–Se o crédito já estiver vendido ou adjudicado e a aquisição tiver sido notificada ao devedor, a prestação é entregue ao respetivo adquirente. 3–Não sendo cumprida a obrigação, pode o exequente ou o adquirente exigir, nos próprios autos da execução, a prestação, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, a notificação efetuada e a falta de declaração ou o título de aquisição do crédito. 4–Verificando-se, em oposição à execução, no caso do n.º 4 do artigo 773.º, que o crédito não existia, o devedor responde pelos danos causados, nos termos gerais, liquidando-se a sua responsabilidade na própria oposição, quando o exequente faça valer na contestação o direito à indemnização. 5– É aplicável o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 779.º, com as devidas adaptações.” Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, CPC Anotado, Almedina, vol. II, pág. 162 “caso o terceiro devedor não cumpra a prestação, poderá ser executado nos próprios autos de execução pelo exequente ou pelo adquirente, constituindo título executivo, consoante as circunstâncias, a certificação da declaração do se reconhecimento do crédito, a certificação da sua notificação e subsequente silêncio (artº 773º, nº 4) ou o título de aquisição do crédito (artº 827º, nº 1).” E em anotação ao artº 773º (ob. citada, pág. 158), escrevem os referidos autores, “uma vez assumida, na execução, a existência do crédito, seja por via do reconhecimento do terceiro, seja pela sua inação, cabe ao debitor debitoris cumprir o disposto no artº 777º, nº 1, sob pena de ser executado a partir do título executivo judicial impróprio constituído pela certificação da anterior notificação feita pelo agente de execução e da falta de declaração (arrtº 773º, nº 3).” Constitui título executivo impróprio, a certificação da notificação efetuada e a falta de declaração do devedor. Nos termos do disposto no artº 773º, nº 1 do CPC a referida notificação está sujeita às regras da citação, designadamente ao disposto no artº 228º, ex vi do artº 246º, nº 1 do CPC. “(…) nos termos do nº 2, incumbe à secretaria aceder à base de dados e averiguar qual a sede estatutária da pessoa coletiva parta onde será remetida a citação postal, observando-se o disposto nos artºs 227º e 228, nº 1.” (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, ob. citada, pág. 299, em anotação ao artº 246º). Ora, a exequente juntou ao requerimento executivo cópia da carta expedida para notificação da entidade patronal do executado para que procedesse à penhora no vencimento do executado, bem como documento obtido no site dos CTT, do qual consta ter aquela sido entregue a PC. Não foi junto o aviso de receção. É certo que na petição de embargos a embargante não concretizou a falta do aviso de receção, mas não deixou de centrar a defesa na falta da sua notificação e consequentemente na falta de título executivo. E perante a arguição da exceção, a exequente, na contestação que apresentou, também não juntou o referido aviso de receção, tendo defendido constar dos autos “a comprovação da notificação realizada na data de 02 de Março de 2022, ter sido acompanhada de aviso de receção, aviso este assinado por PC, na data de 04 de Março, o qual se comprometeu a entregá-lo prontamente ao destinatário.” Não se descortina de que documento extraiu a apelante tal ilação, quando esta apenas pode resultar do aviso de receção assinado. Acresce que o juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo (artº 734º, nº 1 do CPC). E não se impunha ao Tribunal convidar a exequente a juntar tal documento, quando a questão da falta de notificação foi arguida na petição de embargos, bem como a inexistência de título executivo, tendo a exequente na contestação se socorrido do referido print para comprovar que a carta foi recebida por PC, e a partir dele extrair a presunção do conhecimento da notificação pela embargante, por aquele se ter comprometido a entregar a carta. Estando a exequente representada por mandatário é necessariamente do seu conhecimento que o referido print extraído do site dos CTT não substitui o aviso de receção. A apelante, em momento algum, indica estar junto aos autos o referido aviso de receção.
Como se refere no Ac. RG de 14/09/2020, processo nº 735/13.8TBGMR-A.G1, inwww.dgsi.pt, “o que aqui está em causa é a constituição de título executivo contra a executada, entidade patronal do aludido B. F., por um lado, e relativamente à obrigação de descontos dos subsídios de férias e de Natal, por outro. Neste particular - formação do título executivo - mostra-se relevante a notificação a que alude o artº 773.º, do CPC, o qual impõe as formalidades da citação pessoal e sujeitação ao regime desta, como emerge do seu nº1 (“A penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução”).
Ora, tal não ocorreu com as notificações efetuadas em 28/08/2018 e de 26/09/2018.
Com efeito, como bem salienta a sentença recorrida, no caso em apreço, “o título executivo apresentado consubstancia a notificação dirigida à entidade empregadora para proceder à penhora dos subsídios e a certificação da falta de resposta da mesma, nos termos do art. 777º, nº 3, do Cód. Proc. Civil”. (…) … a exigência das formalidades legais equivalentes à citação pessoal nessa notificação ao devedor deriva do facto de estar garantida indubitavelmente que este tomou conhecimento da comunicação feita e de que ficou devidamente informado e esclarecido do seu conteúdo, face às consequências nefastas advindas para o terceiro devedor, nomeadamente nos casos de falta de declaração (o que implica o reconhecimento do crédito pelo devedor) ou de omissão do depósito: incumprimento da obrigação e possibilidade de o exequente exigir, nos próprios autos da execução, a prestação, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, a notificação efetuada e a falta de declaração – artº 777º, nºs 1, al. a) e nº3.”
Não é, pois, possível considerar verificados os pressupostos exigidos pelas disposições conjugadas dos artºs 777º, nº 3, 773º, nº 1, 246º e 228º do CPC para a formação de título executivo, por não se mostrar comprovado que a notificação foi efetuada com as formalidades da citação pessoal.
A inexistência ou insuficiência do titulo executivo impunha a procedência dos embargos, com a consequente extinção da execução quanto à embargante.
Em consequência, fica prejudicada a apreciação da segunda questão.
Pelos fundamentos ora expostos, julga-se improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida. Custas do recurso a cargo da apelante.