O art. 1685.º do Código Civil determina a conversão sistemática da disposição por morte de coisa certa e determinada do património comum em legado pecuniário, sem prejuízo da sua satisfação em espécie, mediante dação em cumprimento.
Recorrente: AA
Recorridos. BB e CC
I. — RELATÓRIO
1. Os presentes autos de inventário foram abertos por óbito de DD e de EE, em ... de Abril de 2014 e em ... de Abril de 2015, respectivamente.
2. Em ... de Julho de 2017, a Exma. Senhora Notária notificou os interessados para se pronunciarem sobre a forma da partilha.
3. O interessado AA, ao pronunciar-se sobre a forma da partilha, suscitou a questão prévia da invalidade do testamento do inventariado EE.
4. Em ... de Janeiro de 2020, a Exma. Senhora Notária remeteu os autos ao tribunal competente — em concreto, ao Juízo de Competência Genérica de ....
5. Em ... de Abril de 2020, o Tribunal de 1.ª instância determinou a suspensão da instância, por causa da relação de prejudicialidade entre as questões suscitadas no processo comum n.º 1884/19.4... e as questões suscitadas no presente processo.
6. Em ... de Julho de 2020, foi proferida sentença no processo n.º 1884/19.4..., por que se declarou que “o testamento [de EE], identificado no ponto 7) dos factos provados [testamento público, lavrado no Livro de Testamentos Públicos e Escrituras de Revogação de Testamentos n.º 7, de folhas cento e trinta quatro a folhas cento e trinta e quatro verso], no que concerne às disposições testamentárias, é válido quanto ao seu valor e nulo/inválido quanto à substância, convertendo-se ope legis em legado de valor”.
7. Em ... de Setembro de 2020, a sentença proferida no processo n.º 1884/19.4... transitou em julgado.
8. Em ... de Dezembro de 2020, o Tribunal de 1.ª instância proferiu despacho determinativo da forma da partilha.
I. — A decisão foi precedida das considerações seguintes:
“Atendendo a que a tramitação subsequente do processo deve revelar-se idónea a conciliar o respeito pelos efeitos dos actos processuais já regularmente praticados, em sede de inventário notarial, com o ulterior processamento do inventário judicial, há que sobrelevar o seguinte:
— em sede de inventário notarial, procedeu-se a conferência de interessados, no âmbito da qual se adjudicou ao interessado AA a verba n.º 45, por ter oferecido proposta de maior valor, bem como lhe foram adjudicados todos os restantes bens constantes da sua proposta, e, não tendo sido apresentada qualquer proposta sob as verbas n.ºs 6 a 12, 22, 34 e 92 a 94, decidiu-se que a verba n.º 94 fosse adjudicado aos interessados CC e BB, em comum e partes iguais, pelo valor € 6.953,00;
— na vigência do RJPI (Lei n.º 23/2013, de 05 de Março) a conferência de interessados precedia a prolação de despacho sobre a forma de partilha (artigos 49.º e 57.º da Lei n.º 23/2013, de 05 de Março), o que se inverteu no novo regime de inventário judicial (artigos 1110.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil). - a tramitação subsequente do presente inventário deve respeitar aqueles efeitos.
Segue-se, por isso, a prolação de despacho determinativo da forma da partilha, mantendo-se integralmente os efeitos do anteriormente processado”.
II. — Em consonância com as considerações transcritas, o teor da decisão foi, no essencial, o seguinte:
IV – Em face do exposto, deve proceder-se à partilha do seguinte modo:
a) Quanto à herança da inventariada DD: (…)
b) Quanto à herança do inventariado EE:
i) O valor da herança, correspondente à soma da metade referida supra em 2), mais a metade do valor dos bens comuns, mais os bens próprios do inventariado, nos termos do disposto nos artigos 2131.º, 2133.º, n.º1, al.a), e 2139.º, n.º 2, todos do Código Civil.
ii) o valor total divide-se em duas partes iguais, constituindo uma delas o valor da quota indisponível do inventariado e a outra metade o valor da sua quota disponível – artigo 2159.º, n.º 2, do Código Civil.
iii) o valor da quota indisponível do inventariado cabe ao cabeça-de-casal (constituindo a sua legítima subjectiva);
iv) na quota disponível do inventariado começa por imputar-se o valor dos legados [o valor pecuniário das coisas objecto do legado e apenas à parte que pertencia ao inventariado – artigos 1685.º, n.º 2, e 2252.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil] que o inventariado deixou aos interessados BB e CC e, se o valor de tais legados exceder o valor da quota disponível, o excesso será imputado na legítima subjectiva do cabeça-de-casal, sendo reduzido o legado de valor se exceder a quota disponível do inventariado e a legítima subjectiva do cabeça-de-casal;
v) havendo sobras da quota disponível, o valor das mesmas caberá aos interessados BB e CC.
O preenchimento dos respectivos quinhões será efectuado em conformidade com o que foi parcialmente acordado na conferência de interessados em sede de inventário notarial.
Tendo havido licitações e adjudicações de verbas em sede de conferência de interessados no inventário notarial, mas inexistindo propostas quanto a outros bens relacionados, para a realização da conferência de interessados, designa-se o dia ... de Janeiro de 2021, pelas 14h00, que se destina, em primeiro lugar, à tentativa de procurar uma solução amigável para a partilha, ainda que parcial, dos restantes bens e a proceder à composição dos quinhões dos interessados, deliberação do passivo e forma do seu pagamento, bem como sobre a forma de cumprimento de legados e demais encargos da herança – cf. artigos 1110.º, n.ºs 2, al. b), e 4, e 1111.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, do Código de Processo Civil, na redacção dada pela Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro. (…)”.
9. Em ... de Janeiro de 2021, iniciou-se a conferência de interessados.
10. Constatada a falta de acordo entre os interessados,
I. — decidiu-se prosseguir com a abertura da licitação, de acordo com o art. 1113.º, n.º1 do Código de Processo Civil;
II. — decidiu-se formar dois lotes:
a. — o primeiro era composto pelos bens 6,8, 9, 10,11, 15, 22 e 34 e tinha um valor base fixado em 1.780,00 euros;
b. — o segundo era composto pelas verbas 92 e 93 e tinha um valor base fixado em 9.716,50 euros.
III. — determinou-se que a conferência de interessados continuaria com a licitação.
11. Em ... de Fevereiro de 2021, na continuação da conferência, os interessados declararam que não pretendiam licitar nenhum dos lotes.
12. O Tribunal de 1.ª instância proferiu então despacho com o seguinte teor:
“Considerando a posição assumida pelos interessados e concluídas as diligências previstas no artigo 1113.º e seguintes do Código de Processo Civil, notificam-se os interessados e o Ministério Público, para no prazo de 20 dias, (…), juntar proposta de mapa da partilha, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1120.º, n.º 1, do Código Processo Civil”.
13. O cabeça de casal AA pronunciou-se no sentido de que as verbas não licitadas deviam ser sorteadas entre os interessados CC e BB para preenchimento dos respetivos quinhões hereditários.
14. Os interessados CC e BB pronunciaram-se no sentido de que as verbas nº(s) 6, 8, 9, 10, 11, 15, 22, 34, 92 e 93 deviam ser adjudicadas ao cabeça de casal, “na proporção do valor que lhe faltar para preenchimento do seu quinhão”.
15. Em ... de Maio de 2021, o Tribunal de 1.º instância decidiu que devia prosseguir-se com a “realização de sorteio, entre todos os interessados, dos bens sobrantes correspondentes às verbas n.º s 6, 8, 9, 10, 11, 15, 22, 34, 92 e 93, por aplicação analógica do artigo 1117.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código [de Processo] Civil (artigo 10.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil)”.
16. Em ... de Maio de 2021, da acta judicial designada como Sorteio, consta o seguinte:
“O quinhão do cabeça-de-casal já se encontra excedido (isto é, licitou em excesso), pelo que o sorteio que se determinou será feito quanto às aludidas verbas e apenas entre os interessados CC e BB, com vista a preencher os seus quinhões, formando-se, para tal, dois lotes sensivelmente iguais (natureza e valor dos bens), sendo o primeiro lote designado por lote A, composto pelas verbas 10, 34, e 92, e o segundo lote, designado por lote B, composto pelas verbas 6, 8, 9, 11, 15, 22, 42-A e 93, sendo o valor do primeiro lote € 6.980,00, e o do segundo lote € 4.566,50,
Em face de todo o exposto, dos argumentos acima aduzidos, (…), constatando-se que ao cabeça-de-casal foram já adjudicados bens no valor de € 87.814,88 [tantos bens móveis como imóveis], enquanto aos outros interessados apenas, cada um deles, € 4.090,00 [um imóvel adjudicado, em partes iguais, a estes], sendo os bens sobrantes no valor total de € 11.546,50, determina-se que esse mesmo sorteio, dos lotes A e B acima descrito, seja realizado apenas entre os interessados CC e BB, com vista a preencher os seus quinhões e evitar criar créditos avultados a pagar pelo cabeça-de-casal àqueles”.
17. Em resultado do sorteio,
I. — o LOTE A, composto pelas verbas 10, 34, e 92, foi adjudicado ao interessado CC;
II. — o LOTE B, composto pelas verbas 6, 8, 9, 11, 15, 22, 42-A e 93, foi adjudicado ao interessado BB.
18. O Tribunal de 1.ª instância determinou então a notificação dos interessados e do Ministério Público, enquanto interveniente acessório, “para no prazo de 20 dias, juntar proposta de mapa da partilha, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1120.º, n.º 1, do Código Processo Civil”.
19. Em ... de Julho de 2021, o Tribunal de 1.ª instância determinou a elaboração do mapa da partilha, nos seguintes termos:
“Em face do exposto, elabore em conformidade o mapa da partilha, e uma vez concretizado, notifique os interessados para apresentar reclamações contra o mesmo, no prazo de 10 (dez) dias – artigos 1120.º, n.º 5, e 149.º, n.º 1 e 549.º, n.º 1, do Código de Processo Civil)”.
21. A secretaria detectou a omissão das verbas n.º 2-A e n.º 7.
22. Em ... de Outubro de 2021, o Tribunal de 1.ª instância determinou que, não havendo oposição, as verbas n.º 2-A e n.º 7 fossem adjudicadas em comum aos interessados, “na proporção do valor que lhes falta para preenchimento dos seus quinhões”.
23. Os interessados não se opuseram à adjudicação em comum das duas verbas.
24. Elaborado o mapa da partilha,
I. — CC e BB vieram reclamar o pagamento de tornas do cabeça de casal AA;
II. — AA veio reclamar do mapa de partilha e requerer que se determinasse que “a composição [dos quinhões] dos não licitantes se [efectivasse] por atribuição aos mesmos em compropriedade e partes iguais dos restantes bens licitados, mas não escolhidos pelo reclamante, e nos precisos termos do disposto no artigo 1120.º, n.º 4 alínea b) do C.P.C, elaborando-se em conformidade novo mapa de partilha”.
25. Em ... de Dezembro de 2021, o Tribunal de 1.º instância indeferiu o requerimento do cabeça de casal AA, em despacho com o seguinte teor:
“Notificado do mapa de partilha, veio o cabeça de casal apresentar reclamação daquele, aduzindo, em síntese, o seguinte: — em .../03/2021, nos termos do previsto no artº 1116 e 1120 do C.P.C, após notificação para o efeito o ora reclamante apresentou a sua proposta de mapa de partilha, escolhendo os bens constantes da relação de bens, por si licitados, por preenchimento da sua quota hereditária, prescindindo assim da adjudicação dos restantes bens; — não faz sentido que quota hereditária dos não licitantes, não seja preenchida com bens da mesma natureza, quando o seria no caso de o legado se manter válido, e também, quando é manifesto ter o licitante prescindido da adjudicação dos restantes bens que compõe a herança; — o preenchimento de quota dos restantes interessados, deve ser efectivada pelos restantes bens da herança, pelos valores decorrentes da licitação à qual não se opuseram, e assim nos precisos termos do disposto no artº 1117 nº 1 alínea b) do C.P.C; — exerceu os seus direitos, escolhendo os bens para preenchimento da sua quota, e prescindindo assim dos restantes, optando os não conferentes por reclamar pagamento de valores pecuniários, quando, ainda é possível atribuir-lhe bens da mesma espécie natureza dos doados e licitados, como prevê a lei; — ao presente caso se impõe, para uma partilha justa, a aplicação ao disposto no artº 1120 nº 4 alínea b) face ao total alheamento, por falta de escolha dos restantes interessados, que assim o poderiam ter feito, e não fizeram porque não quiseram, e tal omissão não lhe confere o direito de sem mais requererem o pagamento de valores pecuniários. Termina requerendo que se determine que nesse mapa, a composição das quotas (que não são quotas, mas quinhões) dos não licitantes se efective por atribuição aos mesmos em compropriedade e partes iguais dos restantes bens licitados, mas não escolhidos pelo reclamante, e nos precisos termos do disposto no artigo 1120 nº 4 alínea b) do C.P.C, elaborando-se em conformidade novo mapa de partilha. Em resposta, pugnam os demais interessados pelo indeferimento do requerido, por falta de fundamento legal, opondo-se a que lhes seja atribuído em compropriedade e em partes iguais os restantes bens licitados pelo cabeça de casal.
Vejamos. (…) Pelo que se deixou exposto, entende o Tribunal que o requerido pelo cabeça de casal não tem arrimo legal e terá assim de ser indeferido. Mas para além disso, compulsado o teor do mapa de partilha, verifico que o mesmo se limita a cumprir o despacho sobre a forma à partilha, bem como o despacho proferido em .../07/2021. Dessa forma, decide-se indeferir a reclamação contra o mapa de partilha apresentada pelo cabeça de casal AA.
Custas do incidente pelo cabeça de casal AA, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) U.C. (arts. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 7.º, n.º 3, e tabela II, do R.C.P.). Notifique”.
26. Inconformado, o cabeça de casal AA interpôs recurso de apelação.
27. Em ... de Maio de 2022, o Tribunal da Relação de Coimbra confirmou integralmente a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.
28. Inconformado, o cabeça de casal AA interpôs recurso de revista.
29. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
1 – O presente recurso é admissível nos precisos termos do disposto nos artigos 671º, 672º e 629º do C.P.C., porquanto o valor actual do processo é de € 293.156,73, conforme consulta do processo electrónico demonstrará.
2 – As alegações dos pontos 3 e 4 da petição de recurso de 1º instância, ao alegarem a nulidade do processo, consubstanciam em si a alegação de uma nulidade absoluta e insanável.
3 – Não se trata, pois de uma mera irregularidade ou nulidade relativa, e, assim, não precludida, como dos autos parece resultar.
4 – Neste processo está em causa verdadeiramente a aplicação de todo o procedimento decorrente do Regime de Inventário – Lei 23/2013, constituindo os actos praticados, através da gestão da Exmª Srª Drª Notária, uma permanente violação de tal lei processual.
5 – É, assim, manifesto, a violação do interesse público, que sufragou a feitura daquela lei, e a sua aplicação, constituindo assim também manifesta violação do acesso ao direito e à justiça, prevista no artigo 20º da C.R.P.
6 – O Procedimento executado nos autos produziu uma decisão injusta, qual seja a de impor o pagamento de tornas, por um acto praticado (conferência de interessados) antes da definição da legalidade do testamento, feito pelo “de cujus”, contra o qual sempre se reclamou, o que a Lei do Processo de Inventário não permite.
7 – Tal resulta do descritivo apresentado nos autos, reproduzido nestas alegações, e, para efeitos da tempestiva arguição da nulidade do processo, e descritivo que aqui também se dá por reproduzido.
8 – Nos autos existe manifesta nulidade insanável e absoluta do processo, invocável a todo o tempo, e sem preclusão, contrariamente ao constante do Acórdão impugnado.
9 – Além do mais, este tribunal não se pronunciou sobre a questão da nulidade insanável e absoluta do processo, como invocado, o que constitui nulidade do Acórdão, que como tal deve ser declarada nos precisos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d) e 666º, nº 2 do C.P.C..
10 – O decidido mostra-se em manifesta contradição com o decidido no Ac. STJ de 27-01-2022 – Proc. Nº 303/12.1JACBR.P1. S1 – 5ª Secção, donde se decidiu:
“II - As nulidades insanáveis são, por definição, insusceptíveis de reparação, podendo ser conhecidas a todo o tempo na pendência do procedimento, oficiosamente ou a pedido. Não podem, porém, ser declaradas após a formação de caso julgado sobre a decisão final que, neste aspecto, actua como forma de sanação.”
11 – Donde tal entendimento se impõe de aplicação nos presentes autos.
12 – A sentença judicial referida nos autos sempre imporia a anulação de todos os actos após a declaração de cabeça de casal de .../06/2016, e a repetição desta.
13 – O aliás douto acórdão, viola além do mais o disposto no artº 195 e ss. do C.P.C, Lei 23/2013 de ... de Março, e em concreto o disposto nos artºs 47, 49, 50 e 53º da mesma Lei, e além do mais o regime de Inventário previsto no actual Código do Processo Civil, também aplicado nos autos.
Termos em que, face ao exposto, deve revogar-se o aliás douto acórdão, declarando-se a sua nulidade, e substituindo-o sempre por outro que declare a nulidade do processo após as declarações de cabeça de casal de .../06/2016, com inclusão desta, mandando-se após declaração da ilegalidade do testamento referido nos autos, efectivar a sua repetição, seguindo, após e de novo, o processo de inventário.
30. O Exmo. Senhor Juiz Conselheiro relator proferiu decisão singular, no sentido da não admissão do recurso de revista.
31. Inconformado, o cabeça-de-casal AA reclamou para a conferência.
32. Em ... de Dezembro de 2022, o Supremo Tribunal de Justiça confirmou, por unanimidade, a decisão singular do Exmo. Senhor Juiz Conselheiro relator.
33. O Tribunal de 1.ª instância proferiu sentença homologatória da partilha.
34. Inconformado, o interessado AA:
I. — apresentou requerimento, arguindo a nulidade do processo desde o auto de declarações do cabeça-de-casal de ... de Junho de 2016;
II. — interpôs recurso de apelação da sentença homologatória da partilha.
35. Em primeiro lugar, apresentou requerimento, arguindo a nulidade do processo desde o auto de declarações do cabeça-de-casal de ... de Junho de 2016, com os seguintes fundamentos:
1 - Foi desde logo nestes autos inicialmente invocado a existência de testamento outorgado pelo Inventariado seu pai FF, outorgado em ... de Fevereiro de 2015, a favor de seus filhos e dele netos, BB e CC, identificados nos autos, legando-lhe o prédio urbano inscrito na matriz sob o Nº 1193 da freguesia de ..., concelho de ... e os prédios rústicos inscritos sob o artº 9461, 9466 e 9467, a da mesma freguesia.
2 – No mais instituiu-os herdeiros da sua quota disponível.
3 – É assim o reclamante o único herdeiro legitimário do referido FF e de sua mãe DD
4 – Apresentada a Relação de bens, aqueles bens não foram desde logo na mesma identificados como LEGADO, pois o reclamante, sempre condenou o mesmo como NULO.
5 – Ainda assim, desde logo a representada dos menores GG, na sua reclamação à relação de bens, após .../11/2016, reclamou, as verbas nº 35. 68, 69 e 70, como pertença e propriedade dos menores, face ao invocado legado.
6 – Na resposta de fls.213, desde logo o reclamante reiterou a nulidade do testamento, e assim a sua ineficácia em relação ao registo dos referidos imóveis, e efectuado pelos menores a seu favor, reclamação reiterada a fls. 244.
7 – Conforme consta do despacho de .../03/2017, a Exmª Srª. Drª. Notária, não tomou posição definitiva sobre tal questão, apesar de reconhecer a razão do cabeça de casal, remetendo as partes para uma tentativa de conciliação de .../03/2014.
8 – Porém tal conciliação, ou resposta à questão suscitada não ocorreu como resulta dos autos quer a .../03/2017, quer a ... de Abril de 2017, tendo as partes sido remetidas para a conferência preparatória de ... de Maio de 2017.
9 – Mas também nessa conferência, nenhuma referência mais uma vez foi efectuada sobre a realidade do legado, e foram as partes as partes sem mais remetidas para a conferência de interessados de ... de Junho de 2017, para adjudicação dos bens, em proposta de carta fechada.
10 – E nessa perspectiva, como se o testamento fosse ignorado ou nulo, e o reclamante e os netos, seus filhos herdeiros legitimários, em pé de igualdade e todos os herdeiros da mesma herança, e não no caso, entendidos como legatários.
11 – Donde, erradamente se efectivou aquela conferência de interessados de ... de Junho de 2017, que é um acto processualmente nulo, por ser um acto que a lei não admite naquelas circunstâncias, que veio notoriamente a prejudicar o reclamante, e a influenciar a decisão da causa.
12 – De verdade como o impõe hoje o disposto no artº 1092 nº 3 do C.P.C, e o impunha o artº 36 nº 1 do RJPI , a Exmª Notária deveria ter-se pronunciado sobre a questão, e produzido despacho, que conhecesse da mesma, e eventualmente remetesse as partes para os meios comuns, como mais tarde em .../12/2017 o fez.
13 – Ora tal omissão prejudicou o requerente, pois, como único herdeiro legitimário, poderia não optar por efectuar qualquer licitação, no caso em proposta de carta fechada, pois na situação da nulidade do testamento, o que poderia ter de fazer apenas nos termos do disposto no artº 53 nº 1 do RJPI,
14 – Aliás, mantendo-se até aquela data como válido aquele testamento, também não foram as partes notificadas para os termos do artº 53 nº 1 do RJPI, situação em que fará aplicar aos autos, o regime da licitação, ou o regime da avaliação.
15 – De verdade, o reclamante, face ao atrás exposto mais uma vez, a fls 274, apresentou forma à partilha, onde mais uma vez reclamando sobre a nulidade do testamento, propondo ainda assim a adjudicação de bens em espécie, aos legatários, para preenchimento do valor do mesmo testamento, o que independentemente da falta de pronúncia do Exmº Sr. Notário, tal não foi aceite pelos referidos legatários.
16 – Motivos pelos quais e só na data de .../12/2017, a Exmª Notária, remeteu as partes para os meios comuns, e sem qualquer outra pronúncia, sobre a partilha e adjudicação, ilegalmente efectivada nos autos.
17 – Os autos foram remetidos a este tribunal em .../01/2020, em cumprimento do disposto no nº 1 do artº 12 do capítulo III da Lei 117/2019 de .../09/2019, e isto sem qualquer outro requerimento das partes, e oficiosamente.
18 – Apesar disso conforme despacho de ...-04-2020, aqui reproduzido, foram nessa data os autos suspensos da instância, até decisão da questão da validade do testamento, suscitada nos autos desde o seu início.
19 – E conforme despacho de ...-10-2020, que também aqui se reproduz, face à sentença do processo Nº 1884/19.4..., junta aos autos, foi cessada a suspensão, e declarado válido o testamento quanto ao valor, e nulo quanto à substância, ordenando-se o cancelamento do registo dos imóveis visados no testamento com as consequências legais.
20 – Sucede que sem mais, como despacho de ...-12-2020 resulta, os autos foram mandados prosseguir, sem mais, quando o mesmo nunca podia ter avançado, sem a pronúncia sobre o julgamento da questão prejudicial (validade do testamento) e seus efeitos sobre o processo, actos praticados e por praticar.
21 – De verdade, quando aqui chegou, deveriam os autos, face ao disposto nos artºs 47 e 1092 nº 3 do C.P.C quanto à decisão judicial acima referida, serem anulados após declarações do cabeça de casal, para nova tramitação em consequência da mesma decisão judicial.
22 – É que, a partilha dos autos foi efectivada ( .../07/2017), no pressuposto da validade do testamento, e efectivadas licitações, quando a legalidade deste estava posta em causa, caso em que deveria ter sido cumprido o disposto no artº 53 do RJPI .
23 – O Inventário está a ser terminado, no pressuposto da invalidade do testamento, e validade quanto ao valor, sendo que parte da conferência de interessados, não foi efectuada segundo tal pressuposto.
24 – Mais, parte da conferencia de interessados foi efectuada no regime de licitação em carta fechada, e outra mais tarde em licitação aberta, o que notoriamente influenciou a decisão da causa.
25 – É manifesto que todo o processo de Inventário é nulo, e como tal deve ser declarado após declarações do cabeça de casal, que tem de ser renovada face à decisão judicial acima invocada.
26 – Estamos perante uma nulidade absoluta por violação da Lei do Inventário, com prevalência de interesse público, face ao acesso ao direito e à justiça previsto no artº 20º da C.R.P, e especialmente da Administração da Justiça. E tal prevalência do interesse público decorrente da Lei do Inventário, forma este vicio de nulidade insanável e assim absoluta, passível de reconhecimento deste tribunal, não sujeito a preclusão e suscitável pelo reclamante a qualquer tempo, tudo nos termos do disposto nos artºs 195 e ss do C.P.C, e Lei 23/2013 de ... de Março – Regime Jurídico Processo de Inventário (notoriamente violados os artº 47, 49, 50 e 53 da mesma lei), e demais lei aplicável.
Termos em que face ao exposto, deve ser declarado nulo o presente processo de Inventário (nulidade absoluta) e assim anulados todos os actos produzidos no mesmo após as declarações de cabeça de casal de ... de Junho de 2016, face à sentença judicial sobre a validade do testamento, acima invocada, e mandados repetir para os devidos efeitos, as declarações do cabeça de casal, face à nulidade absoluta do processo atrás invocadas, e ainda não precludida, tudo com as legais consequências, e após, o processo de novo seguir os seus legais termos.
36. Em segundo lugar, o interessado AA interpôs recurso de apelação da sentença homologatória da partilha.
37. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
1ª As decisões interlocutórias do Notário, proferidas no âmbito do RJPI são passiveis de impugnação no recurso interposto da decisão de partilha, no caso a sentença homologatória do artº 1122 do C.P.C
2ª Donde as questões suscitadas, de nulidade absoluta do processo, vai em tempo (efetivou-se um processo totalmente contra a lei processual ignorando-se o efeito e a eficácia da sentença judicial referida nos autos, que remeteu as partes para os meios comuns).
3º Nos autos está em causa a partilha dos bens de DD e EE, dos quais o recorrente é o único e legitimo herdeiro.
4ª E no pressuposto da validade do testamento efectivado pelo inventariado EE, a favor dos netos, se efectivou o requerimento do presente inventário.
5ª Mas tal testamento, como resulta dos autos, posteriormente à partilha efectivada nos autos em .../12/2017, foi em .../07/2020 no processo nº 1884/19.4..., declarado nulo em substância e válido quanto ao valor, nos precisos termos do disposto no artigo 1685 nº 2 do C.C
6ª Deveriam, assim face á eficácia de tal decisão, no despacho de ...-12-2020 , terem sido anulados todos os actos anteriores, e os mesmos prosseguirem após novas declarações do cabeça de casal, para nova partilha, caso em que o recorrente, por ser herdeiro de todos os bens, não teria necessidade de efectivar qualquer licitação, como na realidade sucedeu em seu prejuízo, no pressuposto da nulidade do testamento, que não existia, e por si sempre impugnada do valor do testamento à data da sucessão em reivindicação dos legatários netos do inventariado.
7ª Existe assim, nos autos verdadeira nulidade de todo o processo, por contrário às leis do processo aplicáveis, e após declarações do cabeça de casal, sendo todas as decisões que lhe seguiram nulas, por violação de tal lei, face à eficácia da sentença judicial já acima referida, e como tal devem ser declaradas.
8ª Tais nulidades, consubstanciam em si, uma nulidade do processo, nulidade absoluta e insanável.
9ª Não se trata, pois de uma mera irregularidade ou nulidade relativa, e, assim, não precludida, como dos autos parece resultar.
10ª Neste processo está em causa verdadeiramente a aplicação de todo o procedimento decorrente do Regime de Inventário – Lei 23/2013, constituindo os actos praticados, através da gestão da Exmª Srª Drª Notária, uma permanente violação de tal lei processual.
11ª É, assim, manifesto, a violação do interesse público, que sufragou a feitura daquela lei, e a sua aplicação, constituindo assim também manifesta violação do acesso ao direito e à justiça, prevista no artigo 20º da C.R.P.
12ª Não é irrelevante para a causa efectivarem-se licitações e adjudicação no pressuposto da validade do testamento, (licitações de .../12/2017, porque os bens legados não lhe pertenciam) as quais se mostram homologadas, quando na verdade tal, não seria necessário para o recorrente na situação actual de declaração de nulidade do testamento, uma vez que é o único herdeiro, e todos os bens lhe pertencem, apesar da definição do valor do testamento, questão que apenas aos legatários interessa reivindicar .
13ª É que, o procedimento executado nos autos produziu uma decisão injusta, qual seja a de impor o pagamento de tornas, por um acto praticado (conferência de interessados) antes da definição da legalidade do testamento, feito pelo “de cujus”, contra o qual sempre se reclamou, o que a Lei do Processo de Inventário não permite.
14ª Tal resulta do descritivo apresentado nos autos, reproduzido nestas alegações, e, para efeitos da tempestiva arguição da nulidade do processo, e descritivo que aqui também se dá por reproduzido.
15ª Nos autos existe manifesta nulidade insanável e absoluta do processo, invocável a todo o tempo, e ainda sem preclusão.
16ª Além do mais, este tribunal ainda não se pronunciou sobre a questão da nulidade insanável e absoluta do processo, como invocado, e suscitado no requerimento de ... de Junho de 2022, ainda não decidido.
17ª “II - As nulidades insanáveis são, por definição, insusceptíveis de reparação, podendo ser conhecidas a todo o tempo na pendência do procedimento, oficiosamente ou a pedido. Não podem, porém, ser declaradas após a formação de caso julgado sobre a decisão final que, neste aspecto, actua como forma de sanação”, o que ainda não sucedeu.
18ª Donde tal entendimento se impõe de aplicação nos presentes autos.
É que,
19ª A sentença judicial referida nos autos sempre imporá a anulação de todos os actos após a declaração de cabeça de casal de .../06/2016, e a repetição desta. Assim,
20ª A aliás douta sentença homologatória, viola além do mais o disposto no artº 195 e S.S. do C.P.C, Lei 23/2013 de 5 de Março, e em concreto o disposto nos artºs 47, 49, 50 e 53º da mesma Lei, e além do mais o regime de Inventário previsto no actual Código do Processo Civil, também aplicado nos autos.
Termos em que face ao exposto deve revogar-se a aliás douta sentença homologatória, declarando-se a nulidade, do processo, após as declarações de cabeça de casal de .../06/2016, mandando-as repetir se necessário, face à sentença judicial referida e sempre substituindo-a por outra que declare a nulidade do processo após as declarações de cabeça de casal de .../06/2016, com inclusão desta, mandando-se após declaração da ilegalidade do testamento referido nos autos, efectivar a sua repetição, seguindo, após e de novo, o processo de inventário os seus legais termos, pois tal se mostra ser de JUSTIÇA e de DIREITO.
38. Em ... de Abril de 2023, o Tribunal da Relação de Coimbra confirmou integralmente a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.
39. Inconformado, o interessado AA interpôs recurso de revista.
40. Finalizou a sua alegação nos seguintes termos:
1 – O presente recurso é admissível nos precisos termos do disposto nos artigos 671º nº2 alínea a) e b), 672º nº1 alínea c) e 629º nº 2 alínea a) do C.P.C., face à excepção ao caso julgado invocada, e inutilidade superveniente da lide, e ainda por ofensa ao Acórdão da Relação deste Tribunal – Acórdão Fundamento – Proc. Nº 112/12.8TBOFR.C2 .
2 – As alegações dos pontos 3 e 4 da petição de recurso de 1º instância, ao alegarem a nulidade do processo, consubstanciam em si a alegação de uma nulidade absoluta e insanável.
3 – Não se trata, pois de uma mera irregularidade ou nulidade relativa, e, assim, não precludida, como dos autos parece resultar.
4 – Neste processo está em causa verdadeiramente a aplicação de todo o procedimento decorrente do Regime de Inventário – Lei 23/2013, constituindo os actos praticados, através da gestão da Exmª Srª Drª Notária, uma permanente violação de tal lei processual.
5 – É, assim, manifesto, a violação do interesse público, que sufragou a feitura daquela lei, e a sua aplicação, constituindo assim também manifesta violação do acesso ao direito e à justiça, prevista no artigo 20º da C.R.P.
6 – O Procedimento executado nos autos produziu uma decisão injusta, qual seja a de impor o pagamento de tornas, por um acto praticado (conferência de interessados) antes da definição da legalidade do testamento, feito pelo “de cujus”, contra o qual sempre se reclamou, o que a Lei do Processo de Inventário não permite.
7 – Tal resulta do descritivo apresentado nos autos, reproduzido nestas alegações, e, para efeitos da tempestiva arguição da nulidade do processo, e descritivo que aqui também se dá por reproduzido.
8 – Nos autos existe manifesta nulidade insanável e absoluta do processo, invocável a todo o tempo, e sem preclusão, contrariamente ao constante do Acórdão impugnado, que as considera sanadas, considerando não terem sido arguidas em tempo, quando as mesmas foram objecto de contantes reclamações.
9 – Assim, o decidido mostra-se em manifesta contradição com o decidido no Ac. STJ de 27-01-2022 – Proc. Nº 303/12.1JACBR.P1. S1 – 5ª Secção, donde se decidiu:
“II - As nulidades insanáveis são, por definição, insusceptíveis de reparação, podendo ser conhecidas a todo o tempo na pendência do procedimento, oficiosamente ou a pedido. Não podem, porém, ser declaradas após a formação de caso julgado sobre a decisão final que, neste aspecto, actua como forma de sanação.”
10 – Donde tal entendimento se impõe de aplicação nos presentes autos.
11 – A sentença judicial referida nos autos sempre imporá a anulação de todos os actos após a declaração de cabeça de casal de .../06/2016, e a repetição destes, caso se pretenda aproveitar o presente inventário, para fixação do valor pecuniário do legado.
12 – E que a partir da sentença dos autos, - Proc. Nº 1884/19.4..., os bens que constituem a herança são total propriedade do recorrente, podendo registá-las e inscrevê-las em seu nome, apenas tendo de responder pelo valor em dinheiro do legado, nos termos do disposto no artigo 1685º, nº 2 do C.C..
13 – E assim, não há necessidade da efetivação de partilha, podendo o valor daquele legado ser fixado através de acordo, ou por ação deduzida pelos interessados.
14 – Motivos pelos quais o recorrente chegou a querer desistir do presente Inventário, não sendo tal possível face à oposição dos legítimos.
15 – A habilitação do recorrente à totalidade da herança, é assim possível e legal face à escritura de habilitação de herdeiros de ... de Maio de 2017, que se junta, carecendo apenas de ser completada com menção inscrita da sentença da ação judicial atrás mencionada.
16 – É que o recorrente, apesar do decidido na sentença, sempre apelou aos legatários seus filhos que assumissem o legado através de bens da herança, o que o, mesmo, jamais aceitaram.
17 – E que por isso sempre invocou a nulidade das diferentes decisões interlocutórias.
18 – O requerimento de .../03/2021, nos autos, nenhuma pronuncia efetiva teve, apesar dos despachos de ...-04-2021 e ...-05-2021.
19 – É que, o processo é nulo, após as declarações iniciais do cabeça de casal, face a decisão judicial daquela Ação de Processo Comum, e como tal deve ser declarado, uma vez que as nulidades insanáveis são de conhecimento oficioso, e a todo o tempo, por parte do tribunal.
20 – A preponderância do interesse público torna, o eventual vício insanável, passível de um conhecimento de ofício do magistrado, e sindicável pela parte a qualquer tempo já que não estará sujeiro a preclusão; E ainda,
21 – Mostra-se violado o disposto no artigo 13º nº 2 da Lei nº 117/2019 – Novo Regime do Inventário – pois nos autos não foi efetivada a notificação aí prevista, e para os efeitos, no mesmo dispositivo previsto.
22 – Aliás este Tribunal da Relação não se pronunciou sobre o requerimento apresentado nos autos em ...-03-2023, devendo ter determinado a extinção da instância, nos termos legais aí requeridos, pedido que se renova, face à autoridade do caso do julgado, e inutilidade e impossibilidade superveniente da lide invocada.
23 – A sentença já referida da ação judicial, que declarou nulo o testamento quanto à substância e validade quanto ao seu valor a ser pago em dinheiro, produzida em .../07/2020, sentença junta aos autos, produz autoridade de “caso julgado”, constituindo excepção dilatória, e determina a extinção da instância de Inventário e com as legais consequências, pois o recorrente apenas tem de pagar o valor do legado em dinheiro.
24 – E não podem ser adjudicados aos interessados legatários, bens que constituem a herança, para pagamento desse valor, sem a aceitação destes, que não existe nos autos, nem o Inventário foi requerido para o efeito da fixação do pagamento em dinheiro do valor do legado.
25 – E o inventário em discussão, contrariamente ao decidido na ação, impõe sejam adjudicados alguns bens aos legatários, bens esses propriedade do recorrente por ser o único herdeiro legitimário, obrigando-o a pagar tornas, com um valor fixado destas, decorrente de um processo de licitação, efetivado tendo em conta um quadro factual diferente do constante do Testamento aprovado, o que a lei não permite.
26 – É que a manter-se a exequibilidade e eficácia da sentença homologatória deste Inventário, ofende-se assim a eficácia da sentença daquela ação judicial e processo que lhe é anterior.
27 – Existe assim uma prejudicialidade entre a sentença daquele processo – Proc. Nº 1884/19.4... – e a sentença homologatória do Inventário em impugnação, e assim o decidido no Acórdão de que se recorre.
28 – Deve assim ser declarada a excepção do caso julgado, com as legais consequências previstas na lei adjetiva expressamente invocada e jurisprudência invocada no corpo das alegações.
29 – Além do mais, a manter-se a sentença homologatória e Acórdão recorrido, ofende-se e viola-se o entendimento referido no Acórdão deste Tribunal da Relação – Proc. Nº 112/12.8T8BOFR.C2 – proferido em 09-10-2018, reproduzido nos autos, onde se defende que nos termos do disposto no artigo 2685, nº 2 do C.C., por força do disposto no artigo 2251º e 2252º do mesmo diploma legal, os interessados legatários, face à nulidade declarada do testamento quanto a substância, apenas têm direito ao valor do legado em dinheiro.
30 – É que neste quadro, conforme jurisprudência invocada – Proc. Nº 2972/19.LTBLRA.C1, in www.dgsi.pt, a eventual inoficiosidade do legado, não obsta à transmissão para o legatário do direito sobre os bens legados sem necessidade de partilha, partilha aliás que os mesmos não requereram nos autos.
31 – E o quadro factual do Acórdão invocado – Acórdão Fundamento – é afinal o mesmo do Acórdão recorrido, estando assim em causa a aplicação da mesma legislação o disposto no artigo 1685º, nº 2 do C.C.
32 – É que, diga-se ainda, que nesses autos os bens do legado, jamais foram identificados como tal, até para efeitos da necessária avaliação.
33 – E assim não cabe no âmbito da partilha que se possa admitir o que consta da forma a partiha o que aí foi decidido que:
“O preenchimento dos respetivos quinhões será efetivado em conformidade com o que foi previamente acordado, na conferência de interessados em sede de Inventário Notarial.
Sendo certo que na data da conferência, o testamento ainda não tinha sido declarado NULO.
34 – E contrariamente ao que resulta do mapa de partilha, os legatários sempre requereram lhe fosse pago o valor pecuniário do legado, como consta dos autos, ao que o recorrente sempre se opôs, por lhes pretender entregar bens.
35 – E, como já se disse o Acórdão de 23-10-2018 defende que os legatários apenas têm o direito a reclamar em dinheiro o valor do legado.
36 – E pela aplicação da doutrina deste Acórdão se impõe, entender que o valor do legado poderá resultar sempre os seguintes procedimentos:
a) – Acordo;
b) – Ação judicial para reconhecimento desse valor;
c) – Eventual inventário requerido para o efeito pelos legatários interessados.
37 – Impõe-se assim a revogação da sentença homologatória, face ao entendimento constante daquele Acórdão fundamento e as decisões interlocutórias, constantes de:
a) – Conferência de interessados de ...-06-2017;
b) – Despacho de ...-12-2020, em conformidade com o alegado no corpo alegatório;
c) - Despacho de .../07/2021, como referido;
d) – Mapa de partilha, de ...-11-2021;
e) – Despacho de ...-12-2021;
38 – De verdade conforme consta de tal Acórdão Fundamento, prevalece o princípio de receber em dinheiro o valor do legado, nos termos do artigo 1685º, nº 2 do C.C., mas a determinar por procedimento de Avaliação, a ocorrer em ação judicial requerida para o efeito, o que não é o caso dos autos, prevalecendo como é óbvio e sempre a possibilidade de realização de acordo sobre o valor e forma de pagamento, a realizar entre os interessados.
39 – A similitude do quadro factual dos dois processos é clara e coincidente, por se tratar do interpretar um testamento, onde são legados bens certos e determinados, que não eram pertença do testador.
40 – Assim, o Acórdão recorrido, viola o disposto no artigo 13º, nº 2 da Lei nº 117/2019, artigo 195º, 277º, alínea e), 278º, nº 1, alínea b) e 577, nº 1, alínea b) do C.P.C., e artigos 1685º, nº 2, 1251º e 2152º, todos do C.C.
Termos em que deve revogar-se o aliás douto acórdão, declarando-se a nulidade do Processo de Inventário como invocado, e declarando-se a extinção da instância face à autoridade do caso julgado, e impossibilidade superveniente da lide, e sempre revogando-se a sentença homologatória, e as decisões interlocutórias referidas, e caso se entenda anulando-se o processado após a conferência de interessados, aproveitando-se os autos para a realização do Inventário, nos termos da nova Lei do Processo de Inventário, com avaliação de bens da herança propriedade do recorrente e legalmente requerida, para efeitos de definição do valor da legitima do recorrente, e quota disponível do inventariado testador, pois tal se mostra ser de JUSTIÇA E DE DIREITO!
41. Em ... de Junho de 2023, o interessado AA veio apresentar requerimento,
“[…] referindo, para os devidos e legais efeitos, que o tribunal ainda não se pronunciou, conforme ponto 22 constante nas conclusões do presente recurso, sobre o pedido de extinção da presente instância, por inutilidade e impossibilidade superveniente da lide, em conformidade com o disposto no artº 277 alínea e) do C.P.C, e conforme requerimento junto aos autos em ...-03-2013 – Refª. 220554 que aqui de novo se dá por reproduzido, para os mesmos efeitos legais”.
42. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes:
I. — se a declaração de nulidade do testamento de EE determina a impossibilidade ou, em todo o caso, a inutilidade do processo de inventário;
em caso de resposta negativa á questão anterior,
II. — se a sentença homologatória da partilha proferida no presente processo conflitua com o caso julgado formado sobre a decisão proferida no processo n.º 1884/19.4...
II. — FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
43. Os factos relevantes para a decisão da causa encontram-se descritos no relatório.
O DIREITO
44. A questão da admissibilidade do recurso é uma questão prévia.
45. Embora o Tribunal da Relação tenha confirmado, por unanimidade, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância 1, o Recorrente invoca a terceira alternativa da alínea a) do art. 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil — ofensa de caso julgado.
46. Ora, o art. 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil diz expressamente “[s]em prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível” — logo, sem prejuízo dos casos previstos no art. 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
47. Em consequência, deve conhecer-se a questão da ofensa de caso julgado.
48. O problema está em averiguar se o âmbito do recurso deve abranger as duas questões suscitadas pelo Recorrente ou, não as abrangendo, deve restringir-se à segunda questão.
49. Estando em causa um recurso admitido ao abrigo da terceira alternativa da alínea a) do art. 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o Supremo Tribunal de Justiça tem considerado, constantemente, que “o âmbito do recurso é restrito à invocada ofensa do caso julgado que se cita” 2.
50. O acórdão do STJ de 4 de Julho de 2019 — processo n.º 1332/07.2TBMTJ.L2.S1 3 — diz, de forma paradigmática, que “[s]endo o recurso admitido ao abrigo da al. a) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, designadamente com fundamento (específico e excepcional) na ofensa de caso julgado, o seu objecto fica circunscrito à apreciação da questão que está na base da sua admissão, não podendo alargar-se a outras questões” 4.
51. Em consequência, “o recurso apenas [seria] admissível relativamente à apreciação da questão da invocada ofensa [da] autoridade do caso julgado” 5.
52. Em todo o caso, em concreto, as duas questões são, simplesmente, dois aspectos de uma única questão: o ponto está, e está só, em averiguar se o caso julgado formado sobre a decisão proferida no processo n.º 1884/19.4... é compatível com o processo de inventário e com a decisão a final proferida no processo de inventário — concretizada na sentença homologatória da partilha. O recurso deve, por isso, abranger as duas questões suscitadas.
53. A primeira questão consiste em averiguar se a declaração de nulidade do testamento de EE determina a impossibilidade ou, em todo o caso, a inutilidade do processo de inventário.
54. O art. 1685.º do Código Civil, sob a epígrafe Disposições para depois da morte, é do seguinte teor:
1. — Cada um dos cônjuges tem a faculdade de dispor, para depois da morte, dos bens próprios e da sua meação nos bens comuns, sem prejuízo das restrições impostas por lei em favor dos herdeiros legitimários.
2. — A disposição que tenha por objecto coisa certa e determinada do património comum apenas dá ao contemplado o direito de exigir o respectivo valor em dinheiro.
3. — Pode, porém, ser exigida a coisa em espécie:
a) Se esta, por qualquer título, se tiver tornado propriedade exclusiva do disponente à data da sua morte;
b) Se a disposição tiver sido previamente autorizada pelo outro cônjuge por forma autêntica ou no próprio testamento;
c) Se a disposição tiver sido feita por um dos cônjuges em benefício do outro 6.
55. A sentença proferida no processo n.º 1884/19.4..., aplicando o art. 1685.º do Código Civil, declarou que “o testamento [de EE], identificado no ponto 7) dos factos provados [testamento público, lavrado no Livro de Testamentos Públicos e Escrituras de Revogação de Testamentos n.º 7, de folhas cento e trinta quatro a folhas cento e trinta e quatro verso], no que concerne às disposições testamentárias, é válido quanto ao seu valor e nulo/inválido quanto à substância, convertendo-se ope legis em legado de valor”.
56. O Recorrente pretende deduzir daí duas consequências:
I. — em primeiro lugar, pretende pôr em causa o processado anterior à sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4...,
II. —em segundo lugar, pretende pôr em causa o processado posterior à sentença proferida ... de Julho de 2020, incluindo as licitações e o sorteio.
57. Como pretenda pôr em causa o processado anterior à sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4..., o Recorrente alega que
2 – As alegações dos pontos 3 e 4 da petição de recurso de 1º instância, ao alegarem a nulidade do processo, consubstanciam em si a alegação de uma nulidade absoluta e insanável.
3 – Não se trata, pois de uma mera irregularidade ou nulidade relativa, e, assim, não precludida, como dos autos parece resultar.
4 – Neste processo está em causa verdadeiramente a aplicação de todo o procedimento decorrente do Regime de Inventário – Lei 23/2013, constituindo os actos praticados, através da gestão da Exmª Srª Drª Notária, uma permanente violação de tal lei processual.
5 – É, assim, manifesto, a violação do interesse público, que sufragou a feitura daquela lei, e a sua aplicação, constituindo assim também manifesta violação do acesso ao direito e à justiça, prevista no artigo 20º da C.R.P.
6 – O Procedimento executado nos autos produziu uma decisão injusta, qual seja a de impor o pagamento de tornas, por um acto praticado (conferência de interessados) antes da definição da legalidade do testamento, feito pelo “de cujus”, contra o qual sempre se reclamou, o que a Lei do Processo de Inventário não permite.
7 – Tal resulta do descritivo apresentado nos autos, reproduzido nestas alegações, e, para efeitos da tempestiva arguição da nulidade do processo, e descritivo que aqui também se dá por reproduzido.
8 – Nos autos existe manifesta nulidade insanável e absoluta do processo, invocável a todo o tempo, e sem preclusão, contrariamente ao constante do Acórdão impugnado, que as considera sanadas, considerando não terem sido arguidas em tempo, quando as mesmas foram objecto de contantes reclamações.
9 – Assim, o decidido mostra-se em manifesta contradição com o decidido no Ac. STJ de 27-01-2022 – Proc. Nº 303/12.1JACBR.P1. S1 – 5ª Secção, donde se decidiu:
“II - As nulidades insanáveis são, por definição, insusceptíveis de reparação, podendo ser conhecidas a todo o tempo na pendência do procedimento, oficiosamente ou a pedido. Não podem, porém, ser declaradas após a formação de caso julgado sobre a decisão final que, neste aspecto, actua como forma de sanação.”
10 – Donde tal entendimento se impõe de aplicação nos presentes autos.
11 – A sentença judicial referida nos autos sempre imporá a anulação de todos os actos após a declaração de cabeça de casal de .../06/2016, e a repetição destes, caso se pretenda aproveitar o presente inventário, para fixação do valor pecuniário do legado.
12 – E que a partir da sentença dos autos, - Proc. Nº 1884/19.4..., os bens que constituem a herança são total propriedade do recorrente, podendo registá-las e inscrevê-las em seu nome, apenas tendo de responder pelo valor em dinheiro do legado, nos termos do disposto no artigo 1685º, nº 2 do C.C..
13 – E assim, não há necessidade da efetivação de partilha, podendo o valor daquele legado ser fixado através de acordo, ou por ação deduzida pelos interessados.
14 – Motivos pelos quais o recorrente chegou a querer desistir do presente Inventário, não sendo tal possível face à oposição dos legítimos.
15 – A habilitação do recorrente à totalidade da herança, é assim possível e legal face à escritura de habilitação de herdeiros de ... de Maio de 2017, que se junta, carecendo apenas de ser completada com menção inscrita da sentença da ação judicial atrás mencionada.
16 – É que o recorrente, apesar do decidido na sentença, sempre apelou aos legatários seus filhos que assumissem o legado através de bens da herança, o que o, mesmo, jamais aceitaram.
17 – E que por isso sempre invocou a nulidade das diferentes decisões interlocutórias.
18 – O requerimento de .../03/2021, nos autos, nenhuma pronuncia efetiva teve, apesar dos despachos de ...-04-2021 e ...-05-2021.
19 – É que, o processo é nulo, após as declarações iniciais do cabeça de casal, face a decisão judicial daquela Ação de Processo Comum, e como tal deve ser declarado, uma vez que as nulidades insanáveis são de conhecimento oficioso, e a todo o tempo, por parte do tribunal.
20 – A preponderância do interesse público torna, o eventual vício insanável, passível de um conhecimento de ofício do magistrado, e sindicável pela parte a qualquer tempo já que não estará sujeiro a preclusão; […].
58. Como pretenda pôr em causa o processado posterior à sentença proferida ... de Julho de 2020, incluindo as licitações e o sorteio, o Recorrente alega que
22 – […] este Tribunal da Relação não se pronunciou sobre o requerimento apresentado nos autos em ...-03-2023, devendo ter determinado a extinção da instância, nos termos legais aí requeridos, pedido que se renova, face à autoridade do caso do julgado, e inutilidade e impossibilidade superveniente da lide invocada.
23 – A sentença já referida da ação judicial, que declarou nulo o testamento quanto à substância e validade quanto ao seu valor a ser pago em dinheiro, produzida em .../07/2020, sentença junta aos autos, produz autoridade de “caso julgado”, constituindo excepção dilatória, e determina a extinção da instância de Inventário e com as legais consequências, pois o recorrente apenas tem de pagar o valor do legado em dinheiro.
24 – E não podem ser adjudicados aos interessados legatários, bens que constituem a herança, para pagamento desse valor, sem a aceitação destes, que não existe nos autos, nem o Inventário foi requerido para o efeito da fixação do pagamento em dinheiro do valor do legado.
25 – E o inventário em discussão, contrariamente ao decidido na ação, impõe sejam adjudicados alguns bens aos legatários, bens esses propriedade do recorrente por ser o único herdeiro legitimário, obrigando-o a pagar tornas, com um valor fixado destas, decorrente de um processo de licitação, efetivado tendo em conta um quadro factual diferente do constante do Testamento aprovado, o que a lei não permite.
26 – É que a manter-se a exequibilidade e eficácia da sentença homologatória deste Inventário, ofende-se assim a eficácia da sentença daquela ação judicial e processo que lhe é anterior.
27 – Existe assim uma prejudicialidade entre a sentença daquele processo – Proc. Nº 1884/19.4... – e a sentença homologatória do Inventário em impugnação, e assim o decidido no Acórdão de que se recorre.
28 – Deve assim ser declarada a excepção do caso julgado, com as legais consequências previstas na lei adjetiva expressamente invocada e jurisprudência invocada no corpo das alegações.
29 – Além do mais, a manter-se a sentença homologatória e Acórdão recorrido, ofende-se e viola-se o entendimento referido no Acórdão deste Tribunal da Relação – Proc. Nº 112/12.8T8BOFR.C2 – proferido em 09-10-2018, reproduzido nos autos, onde se defende que nos termos do disposto no artigo 2685, nº 2 do C.C., por força do disposto no artigo 2251º e 2252º do mesmo diploma legal, os interessados legatários, face à nulidade declarada do testamento quanto a substância, apenas têm direito ao valor do legado em dinheiro.
59. Os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de ... de Maio de 2022 e de ... de Abril de 2023, agora recorrido, apreciaram a pretensão do Recorrente relativa aos actos praticados antes da sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4....
60. O Recorrente alegava que foram praticados actos do processo de inventário sem que a Exma. Senhora Notária perante quem decorria o processo se tivesse pronunciado sobre a nulidade do testamento de EE, arguida nas declarações do cabeça de casal de ... de Junho de 2016.
61. Ora, o facto de terem sido praticados actos do processo de inventário sem que a Exma. Senhora Notária perante quem decorria o processo se tivesse pronunciado sobre a nulidade do testamento de EE, arguida nas declarações do cabeça de casal de ... de Junho de 2016, era causa de nulidade de todo o processado subsequente.
62. O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de ... de Maio de 2022 pronunciou-se no sentido de que não havia nenhuma razão para a arguição de nenhuma nulidade e de que, ainda que alguma razão houvesse, sempre a arguição da nulidade seria intempestiva.
63. Em primeiro lugar, pronunciou-se no sentido de que não havia nenhuma razão para a arguição de nenhuma nulidade.
64. A decisão proferida no no processo n.º 1884/19.4... no sentido da conversão ope legis em legado de valor significaria que continuavam a estar preenchidos os pressupostos da licitação:
“[…] tendo sido suscitada a questão da invalidade do testamento do inventariado [EE] no processo n.º 1884/19.4... sucedeu que por sentença proferida no âmbito deste dito processo, a .../07/2020, e transitada em julgado a ...-09-2020, se decidiu declarar que o ‘testamento, identificado no ponto 7) dos factos provados [testamento público, lavrado no Livro de Testamentos Públicos e Escrituras de Revogação de Testamentos n.º 7, de folhas cento e trinta quatro a folhas cento e trinta e quatro verso], no que concerne às disposições testamentárias, é válido quanto ao seu valor e nulo/inválido quanto à substância, convertendo-se ope legis em legado de valor’.
Ora se assim sucedeu, não é verdade que o legado tivesse deixado de existir, antes se converteu, ope legis, em legado de valor.
Assim sendo, não vislumbramos que se possa considerar que deixaram de existir os pressupostos de validade da licitação no legado em causa”.
65. Explicitando o argumento deduzido, o Tribunal da Relação de Coimbra declara que:
“Na medida em que por força da decisão proferida no dito processo n.º 1884/19.4..., teve lugar conversão ope legis do legado, em legado de valor, subsistia plenamente válida a arrematação/licitação dos bens propriamente ditos objeto do legado.
O que nos parece perfeitamente incontestável por estar em causa a arrematação/licitação por parte do cabeça de casal CC, pois que sempre subsiste salvaguardado o legado de valor a favor dos demais interessados a manter-se como válida a arrematação/licitação operada por aquele, resumindo-se agora tudo a uma questão de ‘deve’ e ‘haver’ nas contas do mapa de partilha, com o pagamento de tornas sendo disso caso!”.
66. Em segundo lugar, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de ... de Maio de 2022, proferido nos presentes autos, pronunciou-se no sentido de que, de que, ainda que alguma razão houvesse, sempre a arguição da nulidade seria intempestiva:
“[…] admitindo para este efeito que assiste razão ao cabeça de casal […] ora recorrente, isto é, que a modificação da natureza dos bens legados de que ele foi arrematante ainda na fase do inventário notarial, ocorreu quando os autos se encontravam já no tribunal para o qual haviam sido entretanto remetidos, o que é certo é que resulta insofismavelmente do descrito no Relatório supra, que esse mesmo cabeça de casal […] ora recorrente de tal teve devido conhecimento, por os autos até terem estado suspensos aguardando o desfecho do processo que tinha por objeto a invalidação do testamento, necessariamente antes de ...-12-2020 quando foi proferido pelo Exmo. Juiz de 1ª instância o despacho determinativo da forma da partilha, pelo que, teria ele que ter reclamado de tal oportunamente, isto é, na sequência da decisão do dito processo n.º1884/19.4...
Ora se assim foi, entendendo que constituía nulidade processual a tramitação do inventário com aproveitamento dos anteriores atos ainda da fase notarial e antes da decisão do processo n.º1884/19.4... esse interessado tinha que contra ela reclama e a reclamação devia ser apresentada e julgada no "tribunal perante o qual a nulidade ocorreu, ou o tribunal a que a causa estava afecta no momento em que a nulidade se cometeu”.
Deste modo, se o cabeça de casal […] entendia que antes de ser elaborado o mapa de partilha sobre cujos termos ora recorre foi cometida a alegada nulidade, tinha que, em devido tempo, dela ter reclamado no tribunal a quo e, julgada essa reclamação, se discordasse da respetiva decisão poderia, então, questioná-la em sede de recurso.
Ora, não tendo deduzido qualquer arguição da nulidade, a mesma ficou oportunamente sanada”.
67. O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de ... de Abril de 2023, agora recorrido, subscreve sem reserva os argumentos do acórdão de ... de Maio de 2022.
68. Expostos os termos em que dois acórdão apreciaram a pretensão relativa aos actos praticados antes da sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4..., deverá considerar-se a pretensão relativa aos actos praticados depois da sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4...
69. Os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de ... de Maio de 2022 e de ... de Abril de 2023, agora recorrido, não se pronunciaram expressamente sobre o processo posterior à sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4...
70. — Em todo o caso, os argumentos deduzidos para dar uma resposta à questão do valor dos actos anteriores determinariam a resposta à questão do valor dos actos posteriores à sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4... — se, por força da conversão ope legis do legado em legado de valor, “subsistia plenamente válida a arrematação/licitação dos bens propriamente ditos objecto do legado”, então não pode sustentar-se, como sustenta o Recorrente, que “a sentença já referida da ação judicial, que declarou nulo o testamento quanto à substância e validade quanto ao seu valor a ser pago em dinheiro, produzida em .../07/2020, […] determina a extinção da instância de Inventário”.
71. Entrando agora na apreciação dos argumentos deduzidos, dir-se-á o seguinte:
72. O art. 3.º da Lei n.º 23/2013, de 5 de Março, aplicável à data de abertura do presente processo de inventário, era do seguinte teor:
1. — O processo de inventário destina-se a pôr termo à comunhão hereditária ou, não carecendo de se realizar a partilha, a relacionar os bens que constituem objeto de sucessão e a servir de base à eventual liquidação da herança.
2. — Ao inventário destinado à realização dos fins previstos na segunda parte do número anterior são aplicáveis as disposições da presente lei, com as necessárias adaptações.
3. — Pode ainda o inventário destinar-se, nos termos previstos nos artigos 79.º a 81.º, à partilha consequente à extinção da comunhão de bens entre os cônjuges.
73. Embora a Lei n.º 23/2013 tenha sido revogada pela Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro, o teor do art. 3.º da Lei n.º 23/2013 corresponde, em substância, ao teor do actual art. 1082.º do Código de Processo Civil:
O processo de inventário cumpre, entre outras, as seguintes funções:
a) Fazer cessar a comunhão hereditária e proceder à partilha de bens;
b) Relacionar os bens que constituem objeto de sucessão e servir de base à eventual liquidação da herança, sempre que não haja que realizar a partilha da herança;
c) Partilhar bens em consequência da justificação da ausência;
d) Partilhar bens comuns do casal.
74. O facto de o Recorrente ser o único herdeiro é, só por si, insuficiente para que se conclua pela impossibilidade ou, em todo o caso, pela inutilidade do processo de inventário — ainda que não houvesse que fazer cessar a comunhão hereditária, sempre o processo de inventário cumpriria a função de relacionar os bens que constituem objecto da sucessão.
75. Esclarecido que o facto de o Recorrente ser o único herdeiro é, só por si, insuficiente para que se conclua pela impossibilidade ou, em todo o caso, pela inutilidade do processo de inventário, deve concluir-se que o o Recorrente não tem razão em pôr em causa nem o processado anterior nem, tão-pouco, o processo posterior à sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4..., com fundamento em impossibilidade ou em inutilidade.
76. O problema não está na validade e na eficácia dos actos processuais — estará, sim, na compatibilidade ou incompatibilidade das decisões com o caso julgado formado sobre a sentença proferida em ... de Julho de 2020 no processo n.º1884/19.4...
77. Em resposta á primeira questão, dir-se-á que a declaração de nulidade do testamento de EE não determina nem a impossibilidade nem a inutilidade do processo de inventário.
78. A segunda questão consiste em averiguar se a sentença homologatória da partilha proferida no presente processo conflitua com o caso julgado formado sobre a decisão proferida no processo n.º 1884/19.4...
79. O art. 577.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe Excepções dilatórias, contempla a excepção de litispendência [alínea j)], e os arts. 580.º e 581.º determinam os conceitos e os requisitos das excepções de caso julgado e de litispendência.
80. O critério do actual art. 581.º deve interpretar-se de acordo com o n.º 2 do actual art. 580.º — em termos em tudo semelhantes aos subscritos por Antunes Varela para os arts. 497.º e 498.º do Código de Processo Civil de 1961, deverá dizer-se que,
“[p]ara sabermos se há ou não repetição da acção deve atender-se não só ao critério formal (assente na tríplice identidade dos elementos que definem a acção) […] mas também à directriz substancial traçada no n.º 2 [do actual art. 580.º], onde se afirma que a excepção da litispendência tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior” 7.
81. O interessado AA alega que há uma contradição e que a contradição está em que a sentença proferida no processo n.º 1884/19.4... teria determinado a satisfação em dinheiro ou em valor dos legados e em que a sentença homologatória da partilha, agora recorrida, determina a sua satisfação em espécie, com bens da herança.
82. Entre os corolários da sentença proferida no processo n.º 1884/19.4... estaria a de que não poderia proceder-se à partilha — o interessado AA teria um direito real sobre todos bens da herança e os interessados CC e BB teriam, tão-só, um direito de crédito contra o interessado AA. Em consequência da conversão automática, ope legis, em legado pecuniário ou de valor, os interessados CC e BB teriam, tão-só, o direito de exigir o respectivo valor em dinheiro.
83. Entrando na apreciação dos argumentos deduzidos, dir-se-á que o Recorrente tem seguramente razão em sustentar que o art. 1685.º, n.º 2, do Código Civil consagra o princípio da conversão automática, ope legis, da disposição em substância numa disposição em valor.
84. O acórdão do STJ de 28 de Junho de 1974 — processo n.º 065217 —, p. ex., di-lo de forma explícita — citando, como quase sempre se cita, as expressões de Braga da Cruz —:
“[a] disposição que incide sobre bens certos e determinados pertencentes a comunhão e sempre válida quanto ao valor e, em principio, nula quanto à substância”.
Entre as consequências da conversão automática, ope legis, da disposição em substância numa disposição em valor está o de que o contemplado com o legado, feito pelo viúvo, de um prédio, ou de metade de um prédio, que faz parte do património comum não pode exigir o prédio, ou metade do prédio, e sim — só — o respectivo valor em dinheiro 8.
85. O problema está em que o princípio da conversão automática, ope legis, da disposição em substância numa disposição em valor (num legado pecuniário ou num legado de valor) é compatível com a satisfação em espécie do legado de valor.
86. O art. 1685.º do Código Civil impõe a conversão sistemática da disposição por morte de coisa certa e determinada do património comum em legado pecuniário ou legado de valor, “sem prejuízo […] da sua satisfação em espécie, mediante dação em cumprimento, se para tal houver o necessário acordo das partes” 9.
87. Ora, depois de a sentença proferida em ... de Julho de 2020 ter transitado em julgado, o interessado AA deu explícita ou, em todo o caso, implicitamente o seu assentimento à satisfação em espécie dos legados dos interessados CC e BB:
88. O Tribunal de 1.ª instância proferiu despacho determinativo da forma da partilha, sem que o interessado AA o tivesse impugnado; realizou-se a conferência dos interessados e, em consequência da falta de acordo, realizou-se o sorteio, sem que o interessado AA, agora Recorrente, tivesse oposto qualquer objecção às licitações e adjudicações anteriores, cuja validade e eficácia era pressuposta pelo despacho determinativo da forma da partilha e, em todo o caso, pelo sorteio; o Tribunal de 1.ª instância proferiu despacho determinativo de que as verbas n.º 2-A e n.º 7 fossem adjudicadas em comum aos interessados, “na proporção do valor que lhes falta para preenchimento dos seus quinhões”, sem que o interessado AA tivesse oposto qualquer objecção.
89. O comportamento das partes só pode interpretar-se como um acordo para a satisfação em espécie dos legados pecuniários ou legados de valor dos interessados.
90. O resultado só pode ser reforçado pela circunstância de o interessado AA, agora Recorrente, admitir expressamente nas conclusões 16 e 34 do presente recurso de revista que deu o seu acordo à satisfação em espécie dos legados de valor.
91. Embora admita que “apelou aos legatários seus filhos que assumissem o legado através de bens da herança” 10 e reconheça que pretendia entregar-lhes bens 11, o Recorrente sustenta no recurso de revista que os legatários, seus filhos, não aceitaram a satisfação em espécie do legado e que, por não terem aceitado a satisfação em espécie dos legados, o processo de inventário é impossível ou, em todo o caso, inútil.
92. Ora, das duas uma: Ou bem que o Recorrente estava de acordo com a satisfação em espécie dos legados, e não pode impugnar uma sentença homologatória da partilha que adjudica aos interessados legatários bens da herança para a satisfação dos legados; ou bem que não estava de acordo com a satisfação em espécie dos legados, e pode impugná-la.
93. As conclusões do recurso de revista são elucidativas, no sentido de que o Recorrente estava de acordo com a satisfação em espécie dos legados — e, se o Recorrente estava de acordo com a satisfação em espécie dos legados, não pode impugnar a sentença homologatória da partilha por adjudicar aos interessados legatários bens da herança.
94. Em termos semelhantes aos do despacho de ... de Dezembro de 2021, citado no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de ... de Maio de 2022, dir-se-á que
“Não pode assim […] o cabeça de casal, que pretendeu que lhe fossem adjudicadas determinadas verbas, manifestando tal vontade em sede de conferência de interessados, mediante apresentação de propostas, num momento ulterior, quando confrontado com o pagamento de tornas aos demais interessados, sem que tenha sido deduzida oposição ao excesso de licitação vir ´escolher’ por que bens que adjudicou será preenchido o seu quinhão, tendo os demais interessados de ver a sua quota preenchida por bens que foram adjudicados ao cabeça de casal por vontade deste, pois que poderia sempre não requerer a adjudicação e aguardar pelos trâmites ulteriores […]”.
95. Em resposta à segunda questão, dir-se-á que a sentença homologatória da partilha proferida no presente processo não conflitua com o caso julgado formado sobre a decisão proferida no processo n.º 1884/19.4...
III. — DECISÃO
Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido.
Custas pelo Recorrente AA, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe tenha sido concedido.
Lisboa, 14 de Setembro de 2023
Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator)
Manuel Pires Capelo
Maria de Fátima Fomes
______
1. Cf. art. 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”.
2. Cf. José Alberto dos Reis, anotação ao art. 678.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. V — Artigos 658.º a 720º, reimpressão, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, págs. 2220-248 (239).
3. Corroborado, p. ex., pelos acórdãos do STJ de 11 de Novembro de 2020 — processo n.º 214/17.4T8MNC.G1.S1 —, de 9 de Dezembro de 2021 — processo n.º 28189/18.5T8LSB-F.L1.S1 —, de 6 de Julho de 2021 — processo n.º 6537/18.8T8ALM.L1.S1 —, de 30 de Novembro de 2021 — processo n.º 557/17.7T8PTL.G1.S2 —, de 2 de Fevereiro de 2022 — processo n.º 5111/07.9TBVLG-B.P1.S1 —, de 15 de Fevereiro de 2022 — processo n.º 971/07.6TBBNV-A.E1.S1 —, de 11 de Maio de 2022 — processo n.º 60/08.6TBADV.2.E1.S1 —, de 24 de Maio de 2022 — processo n.º 882/12.3TBSJM.P3.S1 — ou de 21 de Junho de 2022 — processo n.º 43/21.0YHLSB.L1-A.S1.
4. Expressão do acórdão do STJ de 4 de Julho de 2019 — processo n.º 1332/07.2TBMTJ.L2.S1.
5. Expressão do acórdão do STJ de 11 de Novembro de 2020 — processo n.º 214/17.4T8MNC.G1.S1.
6. Sobre a interpretação do art. 1685.º do Código Civil, vide por todos Fernando Andrade Pires de Lima / João de Matos Antunes Varela, anotação ao art. 913.º, in: Código Civil anotado, vol. IV — Artigos 1576.º a 1795.º, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1992, págs. 310-315; Rute Teixeira Pedro, anotação ao art. 1685.º, in: Ana Prata (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Artigos 1251.º a 2334.º, 2.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2019, págs.573-574; Francisco Manuel Pereira Coelho / Guilherme de Oliveira (com a colaboração de Rui Manuel de Moura Ramos), Curso de direito da família, vol. I — Introdução. Direito matrimonial, 5.ª ed., Imprensa da Universidade, Coimbra, 2016, págs. 472-476.
7. João de Matos Antunes Varela / José Miguel Bezerra / Sampaio e Nora, Manual de processo civil, cit., pág. 302.
8. Cf. acórdãos do STJ de 28 de Junho de 1974 — processo n.º 065217 — e de 29 de Janeiro de 2019 — processo n.º 3884/16.7T8VIS.C1.S1.
9. Fernando Andrade Pires de Lima / João de Matos Antunes Varela, anotação ao art. 913.º, in: Código Civil anotado, vol. IV — Artigos 1576.º a 1795.º, cit., pág. 312.
10. Cf. conclusão n.º 16: “É que o recorrente, apesar do decidido na sentença, sempre apelou aos legatários seus filhos que assumissem o legado através de bens da herança, o que o, mesmo, jamais aceitaram”.
11. Cf. conclusão n.º 34: “contrariamente ao que resulta do mapa de partilha, os legatários sempre requereram lhe fosse pago o valor pecuniário do legado, como consta dos autos, ao que o recorrente sempre se opôs, por lhes pretender entregar bens”.