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APELAÇÃO AUTÓNOMA
ADMISSÃO DE MEIO DE PROVA
DECISÃO ABSOLUTAMENTE INÚTIL
Sumário
I - A admissibilidade de apelação autónoma relativamente à admissão ou rejeição de algum meio de prova, prevista no artigo 79.º-A, n.º 1, alínea d) do Código de Processo do Trabalho não se estende a todas as vicissitudes que possam surgir quanto à produção de prova, mas apenas às decisões que efectivamente rejeitem ou admitam meios de prova. II - A admissibilidade de apelação autónoma de decisão da 1.ª instância com o fundamento de que a impugnação da mesma com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil, nos termos previstos na alínea K) dos mesmos artigo e número, impõe que se faça um juízo de absoluta inutilidade de uma eventual decisão favorável que venha a ser obtida em sede de recurso conjunto com o recurso da decisão final.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães
I – RELATÓRIO
No âmbito do processo especial emergente de acidente de trabalho supra identificado, figura como sinistrada AA, nos autos melhor identificada, e como entidade responsável G..., S.A., também com os sinais dos autos, processo que, na falta de acordo na fase conciliatória prosseguiu para a fase contenciosa, no âmbito da qual foi requerida, ordenada, e realizada, junta médica.
Notificada do respectivo auto, veio a sinistrada reclamar do mesmo e requerer que se notifiquem os Sr.s peritos médicos para prestarem esclarecimentos, elencando, sob alíneas, as suas dúvidas.
O Tribunal recorrido proferiu então o seguinte despacho:
“Requerimento da sinistrada de 18.07.2022:
Pelo requerimento que antecede, veio a sinistrada apresentar reclamação ao teor do exame por junta médica realizado nos autos, requerendo a final se notifiquem os Exmos. peritos subscritores da mesma para que esclareçam as questões enunciadas sobre as als. a) a f), e respetivas subalíneas. A resposta a tais questões, visa, alega a Requerente, “permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho que vitimou a Sinistrada em 09/01/2019 e para se aferir o grau de IPP e se a sinistrada se encontra ou não com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira).
Num esforço de agrupamento dos fundamentos invocados pela Sinistrada, iremos que os esclarecimentos visam identificar; as concretas tarefas/funções exercidas pela sinistrada antes do acidente de trabalho nos autos; as concretas tarefas/funções que a mesma pode e não pode executar atualmente com a mesma categoria profissional habitual de “operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira”; determinar o núcleo fundamental das funções habituais exercidas pela sinistrada à data do acidente; se as lesões sofridas em decorrência do acidente condicionam/implicam a perda de competências à data de 09/01/2019; se ficou ou não incapacitada para executar as tarefas que descrimina e que alegadamente integram o conteúdo funcional da profissão habitual à data de 09/01/2019.
Apreciando
Partindo dos quesitos apresentados pela sinistrada, recordam-se, se: “9. A sinistrada em consequência das sequelas atuais e permanentes de que padece em virtude do acidente de trabalho que o vitimou em 09/01/2019, está afetada com uma incapacidade permanente absoluta para o exercício do trabalho habitual (ipath) de operadora de máquinas na indústria têxtil? 10. Em caso afirmativo com efeitos a partir de que data?”, verifica-se que as respostas dadas pelos Exmos. peritos não comportam os esclarecimentos pretendidos, por as questões suscitadas extravasarem largamente os quesitos apresentados pela Sinistrada e aos quais responderam, sem prejuízo da maior parte destes “novos quesitos”, não ter índole médica e como tal não serem suscetíveis de ser por estes respondidos, o que se afere da análise do respetivo teor. Por outro lado, a resposta do perito por si indicado, divergente do entendimento sufragado pelos peritos da seguradora e do Tribunal (que decidiram que “As sequelas derivadas do acidente em apreço não determinam uma situação de IPATH”), não justifica o deferimento do pedido em apreço. Com efeito, este pronunciou-se no sentido de que “Na sequência das sequelas do acidente do joelho direito e joelho esquerdo devido a acidente anterior a sinistrada não tem condições para executar o seu trabalho habitual pelo que está em situação de IPATH por sofrer de gonartrose grave bilateral aguardando a colocação de prótese bilateral no Hospital da região”, não se vislumbrando que esta resposta ao quesito da existência de IPATH justifique, também, a requerida prestação de esclarecimentos por parte do colégio dos peritos que integraram a junta médica. A considerar, ainda, que no anterior relatório pericial médico legal realizado no GML, não foi atribuída à sinistrada IPATH, confirmando o laudo maioritário nesta parte a conclusão a que chegou o Exmo. perito que realizou essa perícia singular.
No mais, o art. 139º, n.º 7 do Código de Processo do Trabalho prescreve que “O juiz, se o considerar necessário, pode determinar a realização de exames e pareceres complementares ou requisitar pareceres técnicos”. Ora, nos autos foi determinado, ao abrigo do disposto no nº13, alíneas a) e b), das Instruções Gerias da Tabela Nacional de Incapacidades, e nº 7 do artº 139º do C. P. Trabalho, a realização do Inquérito profissional e Análise do posto de trabalho, tendo em vista a avaliação da incapacidade, ou não, da sinistrada exercer a sua profissão habitual, cujo relatório foi junto aos autos em 07.09.20221, cujas conclusões foram conhecidas dos Exmos. peritos que integraram a junta médica, não se justificando, assim, a realização de quaisquer outras diligencia por parte do Tribunal, designadamente, a realização de novos exames à Sinistrada ou a obtenção de qualquer parecer complementar ou técnico.
Desta forma, concluímos não se mostrar necessária a realização de qualquer outra diligencia adicional às já realizadas nos autos, e por falta de fundamento para o efeito, indefere-se o pedido de esclarecimentos por parte dos peritos, requerido pela Sinistrada AA.
Notifique.
Guimarães, 02.11.2022”
Inconformada com esta decisão, dela veio a sinistrada interpor o presente recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam com a formulação das seguintes conclusões (transcrição):
“1) A Sinistrada/Recorrente, salvo o devido respeito e melhor opinião em contrário, discorda do Douto Despacho proferido nos presentes autos datado de 02/11/2022, com a ref.ª citius e ...05, o qual, decidiu não se mostrar necessária a realização de qualquer outra diligencia adicional às já realizadas nos autos e indeferiu o pedido de esclarecimentos por parte dos peritos requerido pela Sinistrada em 18/07/2022, com a refª citius ...54.
2) A sinistrada em 08/07/2022, com a refª citius ...10, foi notificada do Auto de Perícia por Junta Médica, datado de 07/07/2022 com a refª citius ...56.
3) A sinistrada por requerimento datado de 18/07/2022, com a refª citius ...54, veio ao abrigo do preceituado no artigo 485.º, nº2 do C.P.Civil por força do disposto no artigo 1 do C.P.Trabalho, artigo 139.º, n.ºs 2, 6 e n.º 7, do Código de Processo do Trabalho, artigos 411º e 6º ambos do C.P.Civil, artigos 20.°, n.° 1, 59º, nº 1, al. f), da CRP, no art.º 21º nº 4 da Lei 98/2009 de 4/09 e artigo 13º, alíneas a) e b) das instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007 de 23 de Outubro, RECLAMAR DO AUTO DE EXAME POR JUNTA MÉDICA REALIZADA EM 07/07/2022 E REQUERER DILIGÊNCIAS PROBATÓRIAS, designadamente no sentido de os Senhores Peritos esclarecerem as questões assinaladas no ponto n.º 23., n.º1, alienas a) a f) do mesmo requerimento
4) Os Senhores Peritos da Seguradora e do Tribunal, não tiveram em linha de conta a fundamentação e as conclusões do Parecer Técnico emitido pelo CRP... - CENTRO DE REABILITAÇÃO ...”, realizado em 07/09/2021 e junto aos autos em 27/09/2021 com a refª citus ...74 relativo à avaliação da Possibilidade de Exercicio da Profissão habitual e respetivo Estudo do Posto de Trabalho da trabalhadora sinistrada.
5) Os Senhores Peritos da Seguradora e do Tribunal não analisaram/valorizaram/identificaram O CONTEXTO em que a sinistrada exercia a sua profissão habitual de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira à data de 09/01/2019, a saber:
a) Condições ambientais: O trabalho era exercido num pavilhão industrial, com condições controladas quanto a luminosidade. Trata-se de um espaço exíguo, obrigando a deslocações em espaços por vezes obstruídos. O seu trabalho implicava a interação com máquinas e exposição a ruído.
b) Utilização de equipamentos de trabalho: O seu trabalho era executado com recurso a máquina industrial e ferramentas manuais
6) Não analisaram/valorizaram/identificaram o NÚCLEO FUNDAMENTAL DAS TAREFAS/FUNÇÕES executadas pela sinistrada no exercicio da sua profissão habitual de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira à data de 09/01/2019, a saber:
1. Transportar, com porta paletes, gigos de cones de fio, do local de cargas e descargas para o seu posto de trabalho;
2. Colocar cones de fio na máquina de bobinar;
3. Monitorizar funcionamento da máquina de bobinar;
4. Ensacar cones com fio, fitar, colocar sobre o porta-paletes e transportar para recolha posterior;
5. Separar cones vazios e descarregá-los para gigo;
6. Cumprir normas de higiene, saúde e segurança no trabalho
7) Não analisaram/valorizaram/identificaram as EXIGÊNCIAS FUNCIONAIS requeridas para o exercicio da sua profissão habitual de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira à data de 09/01/2019, a saber:
1. Competências de aprendizagem e aplicação de conhecimento: competências de atenção, memória, orientação no espaço, discriminação de semelhanças e diferenças;
2. Competências sensoriais: perceção visual, auditiva e tátil;
3. Competências relacionadas com o movimento: permanecer de pé, levantar e transportar objetos/cargas com pesos diversos, por vezes elevado, utilização da mão e do braço, coordenação braços e pernas, realizar movimentos finos da mão, deslocar-se por diferentes espaços e assumir diferentes posições;
4. Competências de comunicação: comunicar oralmente;
5. Competências interpessoais e relacionais: capacidade de regulação emocional, capacidade de trabalho em equipa, articulação com superiores hierárquicos e colegas;
6. Competências organizacionais: assiduidade, pontualidade, organização e tomada de decisão.
8) Não analisaram/valorizaram/identificaram os IMPACTOS DAS LIMITAÇÕES FUNCIONAIS da sinistrada no desempenho da profissão habitualde operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira à data de 09/01/2019, a saber:
1. Alteração funcional de ambos os joelhos, interferindo com a marcha (apoio em 2 canadianas);
2. Sensação de dor constante e intensa;
3. Estas alterações, a sensação de dor intensa interferindo com a marcha e capacidade de permanência em bipedestação, a necessidade de apoio para deslocação em marcha, decorrentes do evento traumático em apreço, interferem com a atividade profissional da examinanda, enquanto bobinadora, pois limitam a capacidade de execução de todas as tarefas descritas na Descrição das atividades que integram o conteúdo funcional da profissão habitual.
9) Não analisaram/valorizaram/identificaram os RISCOS PROFISSINAIS da função desempenhada pela examinanda de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira à data de 09/01/2019, a saber:
1. Associados a agentes físicos: i. Ruídos (provenientes da utilização de equipamentos manuais e mecânicos); ii.Vibrações (transmitidas ao sistema mão-braço e a todo o organismo).
2. Associados ao posto e local de trabalho: i. Queda ao mesmo nível; ii. Queda de objetos; iii. Choque com objetos; iv. Choque entre equipamentos ; v. Pancadas ou cortes por objetos; vi. Entalamento; vii. Transporte manual de cargas.
3. Associados aos equipamentos :i. Equipamento manual; ii. Equipamento mecânico.
4. Associados à movimentação de cargas: i. Transporte manual de cargas.
5. Fatores de risco ergonómico: i. Posturas adotadas; ii. Esforço físico; iii. Maipulação de cargas; iv. Movimentos repetitivos.
10) Não analisaram/valorizaram/identificaram/ponderaram os riscos profissioansis e respetiva quantificação/expressão no que concerne à impossibilidade de adaptar o posto de trabalho exercido habitualmente pela sinistrada por forma a minimizer os respetivos riscos à data de 09/01/2019,
11) Os riscos laborais/profissionais da função desempenhada pela examinanda à data do acidente de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira, apresentam uma expressão significativa, pela impossibilidade de adaptar o posto de trabalho por forma a minimizar os riscos referidos à data de 09/01/2019.
12) Pela fundamentação e conclusões constantes do Parecer Técnico emitido pelo CRP... - CENTRO DE REABILITAÇÃO ...” realizado em 07/09/2021 e junto aos autos em 27/09/2021 com a refª citus ...74 relativo à avaliação da Possibilidade de Exercicio da Profissão habitual e respetivo Estudo do Posto de Trabalho da trabalhadora sinistrada, a Sinistrada em consequência do acidente de trabalho que a vitimou em 09-01-2019 encontra-se com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira.
13) Os Senhores Peritos da Seguradora e do Tribunal não aplicaram as instruções gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007 de 23 de Outubro, designadamente no artigo 13º, alineas a) e b), a fim de permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho que vitimou a Sinistrada em em 09-01-2019.
14) A Sinistrada, não compreende e muito menos concorda com a disparidade da fundamentação/conclusões da Perícia de Junta Medica, quando confrontada com a fundamentação/conclusões do Parecer Técnico emitido pelo CRP... -CENTRO DE REABILITAÇÃO ...”, realizado em 07/09/2021 e junto aos autos em 27/09/2021 com a refª citus ...74, relativo à avaliação da Possibilidade de Exercicio da Profissão habitual, e respetivo Estudo do Posto de Trabalho da trabalhadora sinistrada, no que concerne à questão de saber se a Sinistrada em consequência do acidente de trabalho que a vitimou em 09-01-2019, se encontra ou não com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de operadora de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira).
15) A reparação das consequências dos acidentes de trabalho resulta de imperativos de ordem pública inerentes ao estado de direito social, conforme decorre do artigo 59º, nº 1, al. f), da CRP, pelo que ao Tribunal cabe providenciar, anteriormente ou posteriormente à conclusão da perícia médico-legal, pela obtenção dos elementos pertinentes com reflexo na fixação das consequências do acidente e a respectiva ponderação.
16) O direito à tutela jurisdicional efetiva para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, genericamente proclamado no artigo 20.°, n.° 1, da Constituição da Republica Portuguesa (CRP), implica um direito a uma solução jurídica dos conflitos, possibilitando-se a cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultados de umas e outras.
17) A prova pericial está sujeita à livre apreciação pelas instâncias, sendo fixada livremente pelo Tribunal, nos termos dos artigos 389º do Código Civil e 489º do Código de Processo Civil, não existindo impedimento legal a que o Tribunal atribua maior força probatória a outros meios de prova e a que, perante motivos de ordem técnica ou probatória que apontem para a rejeição ou modificação do resultado da perícia média realizada nos autos, fixe um entendimento divergente daquela
18) Nesta questão de IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual) não se pode esquecer que a descoberta da verdade material tem nesta sede da produção de provas um papel preponderante .
19) Estipula o artº 411 do C. P. Civil, sob a epigrafe “Princípio do inquisitório” que: ”Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
20) Por força desta norma, atribui-se agora ao tribunal um poder dever de indagação e recolha de prova relativamente aos factos sujeitos á sua apreciação.
21) É, no fundo, como decorre do artº 489.º do C. P. Civil, “uma prova a mais, que servirá ao tribunal para melhor esclarecimento dos factos”, ou seja, uma prova adicional facultada pela lei às partes
22) Em processo de acidente de trabalho, o Juiz não está obrigado à observância rigorosa das conclusões dos peritos e, se o considerar necessário, pode determinar a realização de exames e pareceres complementares ou requisitar pareceres técnicos.
23) O Douto Despacho proferido e objeto do presente recurso, na medida em que está causa a questão da IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual) não atentou ao principio da descoberta da verdade material e ao principio do inquisitório o qual nesta matéria da produção de provas tem um papel preponderante (cfr. artigo 411 do CPC).
24) Por força do princípio constitucional do direito à tutela jurisdicional efetiva para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (artigo 20.°, n.° 1, da CRP), o tribunal tem o “poder dever” de indagação e recolha de prova relativamente aos factos sujeitos à sua apreciação, mais concretamente no que concerne à questão de saber se a sinistrada em consequência do acidente de trabalho que o vitimou em 09-01-2019 se encontra ou não com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira).
25) Douto Despacho proferido e objeto do presente recurso, não atentou ao direito à tutela jurisdicional efetiva para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, genericamente proclamado no artigo 20.°, n.° 1, da Constituição da Republica Portuguesa (CRP), o qual implica um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar, possibilitando-se, um correto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultados de umas e outras .
26) O Douto Despacho proferido é restritivo e nessa medida é inconstitucional, por violação do direito à tutela jurisdicional efetiva para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos previsto nos artigos 2º, 20.°, n.º 1, da Constituição da Republica Portuguesa e ainda por violação do princípio da Função jurisdicional previsto no artigo 202º.
27) A Douto Despacho proferido violou também o disposto no artigo 6º Convenção para Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.
28) Pelas razões de facto e de direito supra expostas e no que concerne a aferir se se a sinistrada em consequência do acidente de trabalho que a vitimou em 09/01/2019 se encontra ou não com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de de máquinas na indústria têxtil/bobinadeira) e ao abrigo do preceituado nos artigos 411º e 6º ambos do CPC, artigos 20.°, n.° 1, 59º, nº 1, al. f), da CRP, no art.º 21º nº 4 da Lei 98/2009 de 4/09 e artigo 13º, alineas a) e b) das instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007 de 23 de Outubro, e a fim de permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho que vitimou a Sinistrada em em 09/01/2019 e para se aferir o grau de IPP e se a sinistrada se encontra ou não com IPATH (incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira), deverão os senhores peritos médicos esclarecer as questões assinalados no ponto n.º 23., n.º1, alienas a) a f) do requerimento da Sinistrada com refª citius ...54, datado de 18/07/2022, a saber:
a) Quais as concretas tarefas/funções EXERCIDAS PELA SINISTRADA ANTES do acidente de trabalho em discussão nos presentes autos ocorrido em 09/01/2019, no exercício da categoria profissional habitual de “operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira”, apesar do acidente de trabalho que a vitimou 10/10/2016?
b) Quais as concretas tarefas/funções que a mesma PODE executar actualmente com essa mesma categoria profissional habitual de “operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira” em consequência das limitações que lhe advieram por força das queixas e sequelas causadas pelo acidente de trabalho em discussão nos presentes autos ocorrido em 09/01/2019?
c) Quais as tarefas/funções que a sinistrada NÃO PODE executar actualmente com essa mesma categoria profissional habitual de “operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira”em consequência das limitações que lhe advieram por força das queixas e sequelas causadas pelo acidente de trabalho discussão nos presentes autos ocorrido em 09/01/2019?
d) Tendo em consideração a natureza e o NÚCLEO FUNDAMENTAL DAS FUNÇÕES habituais exercidas pela sinistrada à data do acidente em discussão nos presentes autos ocorrido em 09/01/2019 (operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira) e apesar do acidente de trabalho que a vitimou 10/10/2016, bem como as condições do seu posto de trabalho e respetivas especificidades, se o mesmo posto de trabalho implicava, ou não, que a sinistrada executasse as seguintes tarefas à data de 09/01/2019:
a) Transportar, com porta paletes, gigos de cones de fio, do local de cargas e descargas para o seu posto de trabalho?
b) Colocar cones de fio na máquina de bobinar?
c) Monitorizar funcionamento da máquina de bobinar?
d) Ensacar cones com fio, fitar, colocar sobre o porta-paletes e transportar para recolha posterior?
e) Separar cones vazios e descarregá-los para gigo?
f) Cumprir normas de higiene, saúde e segurança no trabalho?
e) A nível do desempenho da profissão habitual de “operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira”, atentas as limitações funcionais decorrentes das queixas e sequelas que advieram para a sinistrada em consequência do acidente de trabalho que a vitimou em 09/01/2019, as mesmas condicionam/implicam a perda de competências à data de 09/01/2019 relacionadas com:
a) Alteração funcional de ambos os joelhos, interferindo com a marcha (apoio em 2 canadianas) ?
b) Sensação de dor constante e intensa?
c) Estas alterações, a sensação de dor intensa interferindo com a marcha e capacidade de permanência em bipedestação, a necessidade de apoio para deslocação em marcha, decorrentes do evento traumático em apreço, interferem com a atividade profissional da examinanda, enquanto bobinadora, pois limitam a capacidade de execução de todas as tarefas descritas na descrição das atividades que integram o conteúdo funcional da profissão habitual?
f) Tendo em conta o impacto das limitações funcionais decorrentes das queixas e sequelas que advieram para a sinistrada em consequência do acidente de trabalho que a vitimou em 09/01/2019, para o desempenho da profissão habitual de “operadora máquinas na indústria têxtil/bobinadeira”, e apesar do acidente de trabalho que a vitimou 10/10/2016, se a sinistrada ficou ou não incapacitada para executar as seguintes tarefas que integram o conteúdo funcional da profissão habitual à data de 09/01/2019:
a) Transportar, com porta paletes, gigos de cones de fio, do local de cargas e descargas para o seu posto de trabalho?
b) Colocar cones de fio na máquina de bobinar?
c) Monitorizar funcionamento da máquina de bobinar?
d) Ensacar cones com fio, fitar, colocar sobre o porta-paletes e transportar para recolha posterior?
e) Separar cones vazios e descarregá-los para gigo?
f) Cumprir normas de higiene, saúde e segurança no trabalho?
29) Pelas razões supra expostas, e sempre com o Douto suprimento de V. Exas, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente por provado e, em consequência, deve ser revogado o Douto Despacho proferido nos presentes autos datado de 02/11/2022, com a ref.ª citius e ...05, o qual deverá ser substitudo por Douto Acórdão que ao abrigo do disposto no artigo 139.º, n.ºs 2, 6 e n.º 7, do Código de Processo do Trabalho ordene a reabertura da perícia colegial e ordene que os Senhores Peritos esclareçam os elementos assinalados no ponto n.º 23., n.º1 , alienas a) a f) pela sinistrada no seu requerimento com refª citius ...54, datado de 18/07/2022.
30) O Douto Despacho recorrido violou as seguintes disposições legais:
1. 485.º, nº2 do C.P.Civil por força do disposto no artigo 1 do C.P.Trabalho,
2. artigo 139.º, n.ºs 2, 6 e n.º 7, do Código de Processo do Trabalho,
3. artigos 411º e 6º ambos do C.P.Civil,
4. artigo 13º, alíneas a) e b) das instruções gerais da Tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007 de 23 de Outubro 5. artigos 2º, 20.°, n.º 1, 59º, nº 1, al. f) e 202º da Constituição da Republica Portuguesa;
6. artigo 6º Convenção para Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.”
A recorrida não apresentou contra-alegações.
O recurso foi admitido na 1.ª instância, na espécie e regime de subida tidos por adequados.
Foi já nesta Relação, e após cumprido o disposto no art. 655.º/1 do CPC, proferida a decisão, em que se discorreu, e a final decidiu, nos termos seguintes: “O Juiz Relator colocou a questão da (in) admissibilidade ou não do recurso por a decisão ser, ou não suscetível de recurso imediato autónomo e por isso determinou a audição das partes sobre tal admissibilidade, nos termos do artigo 655.º n.º 1 do CPC. A recorrente veio pronunciar-se pugnando pela admissibilidade do recurso, defendendo agora que a decisão seria absolutamente inútil se realizado a final, por dizer respeito à prática de ato processual a realizar antes da prolação da sentença. Cumpre apreciar e decidir: Antes de mais incumbe dizer que tal como estabelece o n.º 5 do art.º 641.º do CPC. a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior. No caso incumbe analisar se a decisão recorrida admite recurso autónomo, sendo certo que a questão passa por apurar se está em causa a admissão ou rejeição de algum meio de prova ou se a impugnação da decisão em causa com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil. Cabe referir, que estando perante um processo de natureza laboral em primeira linha são de aplicar as normas do código do processo do trabalho e apenas subsidiariamente as normas do código do processo civil - cfr. artigo 1º n.ºs 1 e 2 al. a) do CPT. Assim, ao recurso interposto pela recorrente é lhe aplicável o regime dos recursos previstos no código do processo do trabalho, designadamente são aplicáveis as regras previstas nos artigos 79.º a 87.º do CPT. Prescreve o artigo 79.º-A n.º 2 do CPT., com a epígrafe “Recurso de Apelação” o seguinte: “1 - Cabe recurso de apelação: a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente; b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou a alguns dos pedidos. 2 - Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância: a) Da decisão que aprecie o impedimento do juiz; b) Da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal; c) Da decisão que ordene a suspensão da instância; d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova; e) Da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual; f) Da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo; g) Da decisão prevista na alínea a) do n.º 3 do artigo 98.º-J; h) Do despacho que, nos termos do n.º 2 do artigo 115.º, recuse a homologação do acordo; i) Da decisão prevista na alínea a) do n.º 5 do artigo 156.º; j) De decisão proferida depois da decisão final; k) Da decisão cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil; l) Nos demais casos especialmente previstos na lei. 3 - As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1. 4 - No caso previsto no número anterior, o tribunal só dá provimento às decisões impugnadas conjuntamente com a decisão final quando a infracção cometida possa modificar essa decisão ou quando, independentemente desta, o provimento tenha interesse para o recorrente. 5 - Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único, a interpor após o trânsito da referida decisão.” Resulta da citada disposição legal que o recurso de apelação visa prioritariamente as decisões que ponham termo ao processo (sentenças e despachos), ou que determinem a extinção da instância. Contudo, o legislador acautelou a possibilidade de serem também instaurados recursos autónomos (de apelação), que se reportam às situações elencadas no n.º 2 daquele art.º 79.º-A do CPT. Sem necessidade de uma análise muito exaustiva da citada norma legal, podemos desde já afirmar que a decisão recorrida, tal como foi já entendido pelo colega relator, não é passível de integração em qualquer um dos nºs. 1 e 2 do artigo 79.º-A do CPT., designadamente nas alíneas d) e k) do n.º 2 do artigo 79.º-A do CPT. No que respeita à alínea d) do n.º 2 do art.º 79.º-A do CPT, esta refere-se à admissão/rejeição dos meios de prova, ou seja, respeita à pronúncia pelo tribunal relativa a requerimento de prova, cabendo recurso autónomo, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo, pretendendo assim salvaguardar que a admissão ou a rejeição de determinada prova concreta e autónoma seja passível de recurso imediato. Como refere António Santos Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, no Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª edição, pág. 805 e 806, a apelação autónoma é “justificada, em ambos os casos, pela necessidade de preservar, tanto quanto possível, o efeito útil da actividade desenvolvida no processo enquanto a questão não for objecto de reapreciação pela Relação (STJ 6-12-18, 300/13). De todo o modo como é natural, os trâmites processuais ou diligências que tenham, entretanto, sido realizadas sujeitar-se-ão às vicissitudes do que vier a ser decidido: se for confirmada (…)” Em suma, as razões que justificam a admissibilidade da apelação autónoma e imediata das decisões sobre os meios de prova visam, para além da celeridade processual, minorar os riscos de uma futura inutilização o processado, por isso e no que respeita aos meios de prova, a referida al. d) do n.º 2 do art.º 79.º do CPT., apenas abrange a admissão e a rejeição de meios de prova, não se estendendo nem abrangendo todas as vicissitudes da prova – cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4.ª edição, Coimbra, 2017, p.198. No caso em apreço, o meio de prova em questão é a junta médica, que foi oportunamente admitida. Conforme decidimos recentemente no acórdão desta Relação de 21-04-2022, Proc. 315/20.1T8VNF-B.G1(consultável em www.dgsi.pt) e se fez constar do respectivo sumário “I – Só as decisões que consubstanciam a admissão ou a rejeição da prova, ou seja, aquelas em que se julga a admissão ou não de um meio de prova para o processo, podem ser objecto de apelação autónoma, a coberto da previsão do art.º 79.º-A n.º 2 al. d) do CPT., nelas não se incluem o despacho que fixa o objecto da prova ou o despacho que julga um incidente de prova. II – Limitando-se o despacho recorrido a apreciar e decidir sobre da substituição do depoente, numa situação em que o meio de prova já estava admitido (depoimento de parte), é de considerar estarmos perante um incidente suscitado no âmbito da prova, que não se confunde com as situações de admissibilidade ou de rejeição do meio de prova a que alude a al. d) do n.º 2 do art.º 79.º do CPT.” Como a este propósito refere o Prof.º Rui Pinto, na Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Ano LXI, 2020, número 2, “Oportunidade processual de interposição de apelação à luz do artigo 644.º CPC” pág. 640, ainda que se referindo ao art.º 644.º n.º 2 al. d) do CPC., que corresponde ipsis verbis à redacção da al. d) do n.º 2 do art.º 79.º-A do CPT. “o despacho de admissão ou rejeição de algum meio de prova é o despacho em que se julga da sua admissão para o processo e não o que lhe fixa o respectivo objecto ou o que julga um requerimento de incidente da prova. Estes sujeitam-se à regra geral do n.º 3 do artigo 644º, sem prejuízo do seu n.º 4.” A título de exemplos de despachos não abrangidos pela citada disposição legal refere o mencionado Professor o despacho que fixa o objecto da perícia (previamente admitida por meio de despacho que não foi objecto e recurso); bem como as decisões que indefiram uma acareação ou uma contradita. Só as decisões que consubstanciam a admissão ou a rejeição da prova, ou seja, aquelas em que se julga a admissão ou não de um meio de prova para o processo, podem ser objecto de apelação autónoma, a coberto da previsão do art.º 79.º-A n.º 2 al. d) do CPT., nelas não se incluem o despacho que fixa o objecto da prova ou o despacho que julga um incidente de prova, ou o despacho que aprecia a reclamação contra o relatório da perícia. A título meramente exemplificativo consideramos que estão abrangidos pela apelação autónoma quer os casos em que o juiz admite ou rejeita o rol de testemunhas, ou o seu aditamento, defira ou indefira uma perícia ou uma inspecção judicial, admita ou mande desentranhar documento, defira ou indefira a requisição de documento ou a obtenção de informações em poder da parte contrária ou de terceiro; defira ou indefira o depoimento de parte. No caso está em causa a reclamação contra o relatório da perícia não contendendo esta questão, nem sequer de forma indireta, nem no sentido amplo do termo com a admissibilidade ou não de um meio de prova, não sendo mais do que um incidente suscitado no âmbito da prova, que não se confunde com as situações de admissibilidade ou de rejeição do meio de prova, pelo que não se vislumbra que ao abrigo desta alínea pudesse ser admissível o recurso. Importa agora proceder à análise da imediata recorribilidade da decisão apelada à luz do prescrito no n.º 2, alínea k), do artigo 79.º-.A do CPT, por alegadamente estar em causa uma decisão cuja impugnação com a decisão final seria absolutamente inútil. Ora, para que nestas situações seja admissível o recurso é preciso que exista inutilidade e esta tem de ser do recurso (e não da tramitação) e tem de ser absoluta – sublinhado nosso. Trata-se de uma exigência semelhante à que na anterior redação do Código do Processo do Trabalho estabelecia para a subida imediata do recurso de agravo, pois o regimeregra de subida do recurso de agravo em processo laboral era o da subida diferida – cfr. artigo 86.º do CPT. Com efeito apenas subiam imediatamente, nos próprios autos os agravos interpostos nas situações taxativamente elencadas no n.º 1 do art.º 84.º do mesmo diploma e, ainda, aqueles “cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis”, como resultava no n.º 2 do citado artigo. No citado n.º 2 integravam-se os casos não previstos no n.º 1 do artigo 84.º, em que a subida imediata do agravo tornaria o recurso, em absoluto, ineficaz e inútil. Esta norma correspondia com idêntica redacção ao disposto no n.º 2 do artigo 734.º do CPC. Quer a doutrina, quer a jurisprudência sempre entenderam que a retenção tem de inutilizar a finalidade ou a própria razão de ser do recurso, o que é completamente diferente da simples inutilização de actos ou termos, em consequência do provimento do recurso – cfr. Leite Ferreira, Cod. Proc. Trabalho Anotado, 4.ª ed., pág. 402. O recurso só será absolutamente inútil, quando favorável ao recorrente, já em nada lhe aproveita, por a demora na sua apreciação tornar irreversíveis os efeitos da decisão impugnada. Neste sentido, ver entre outros os Ac. do STJ de 9/11/1984, BMJ, 341, pág. 369 e de 10/03/93, BMJ n.º 430, pág. 424, da Relação do Porto de 5/06/1990, BMJ n.º 398º, pág. 585 e da Relação de Coimbra de 11/03/98, BMJ n.º 475º, pág. 786 e de 14/01/03, in CJ, T.º I, pág.10. Não é assim suficiente a inutilidade relativa, a que corresponde a anulação do processado posterior, para justificar a admissão do recurso. A situação a relevar tem de ser tal que, se o recurso não for apreciado imediatamente, não servirá para nada. Mantém assim atualidade a jurisprudência fixada no Ac. do STJ, de 21/05/97, BMJ n.º 467.º, pág. 536, segundo a qual “a inutilidade há-de produzir um resultado irreversível quanto ao recurso, retirando-lhe toda a eficácia dentro do processo, não bastando, por isso, uma inutilização de actos processuais para justificar a subida do recurso.” Como elucida António Santos Abrantes Geraldes, obra cit., pág. 203 a este propósito “Com este preceito o legislador abre a possibilidade de interposição de recursos intercalares quando a sujeição à regra geral do diferimento da impugnação do recurso de outra decisão, nos termos do n.º 3, importe a absoluta inutilidade de uma decisão favorável que eventualmente venha a ser obtida em sede de recurso. O advérbio (“absolutamente2).” assinala bem o nível de exigência imposto pelo legislador(…) “Deste modo, não basta que a transferência da impugnação para um momento posterior comporte o risco de inutilização de uma parte do processado, ainda que se inclua a sentença final. Mais do que isso, é necessário que imediatamente se possa antecipar que o eventual provimento do recurso não passará de uma «vitória de Pirro», sem qualquer reflexo no resultado ou na esfera jurídica do interessado”. De tudo isto resulta que a utilidade do recurso em subir de imediato, apenas ocorre quando da sua retenção não adviesse qualquer vantagem para o recorrente, designadamente por a revogação da decisão recorrida não provocar qualquer utilidade para o recorrente e não por qualquer outra razão como a perturbação ou a economia processual. Revertendo para o caso em apreço, mormente no que respeita ao recurso do despacho que indeferiu o pedido de esclarecimentos do auto de junta médica, tal pode até por em causa parte do processado, nele até se incluindo a sentença (poderá ter de se reabrir a junta médica, com as respectivas consequências (anulação de alguns dos actos processuais praticados), mas como resulta do acima exposto, não é essa a situação que a norma acautela, pelo que mais não resta do que concluir que por esta via o recurso não é admissível. Destarte, não se subsumindo a situação a que os autos se reportam nem na al. d), nem na alínea k) do n.º 2 do art.º 79.º-A do CPT, é de concluir que a decisão recorrida, mais não é do que uma decisão intercalar, que como as demais fica submetida à regra geral sobre a impugnação de decisões intercalares, nos termos previstos nos ns.º 3, 4 e 5 do art.º 79.º-A do CPT., ou seja, só pode ser impugnada no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1, onde se insere a sentença final, ou num recurso único a ser interposto após o trânsito em julgado da sentença. Nesta conformidade e ao abrigo das disposições legais referidas e ainda dos artigos 641.º n.º 5 e 652º n.º 1 al. b) ambos do CPC., por inadmissibilidade/extemporaneidade rejeito o recurso de apelação que a Recorrente AA, interpôs da decisão que indeferiu a reclamação contra o relatório pericial (auto de junta médica).”
Notificada da rejeição do recurso, veio a recorrente requerer que “seja proferido Acórdão nos termos do artigo 652º, n.º 3 e 543º, n.º 4 parte final, ambos do N.C.P.Civil.”
Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 657.º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.
Os fundamentos que a recorrente agora aduz procurando sustentar a admissibilidade do recurso - 1) A sinistrada, salvo melhor opinião em contrário, entende que o recurso de apelação que interpôs da decisão que indeferiu a reclamação contra o relatório pericial (auto de junta médica), deverá ser admitido, ao abrigo do preceituado nas seguintes disposições legais:
a) artigos n.º 644.º, n.º 2, al. d), 645.º, n.º 2 e 638.º, n.º 1, na sua parte final, ambos do C.P.Civil e b) artigo 79.º -A, n.º 2, alíneas d) e K) ambos do Código Processo de Trabalho, 2) Na medida em que cabe recurso autónomo do despacho de rejeição do meio de prova, e 3) É uma decisão/despacho cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil. Com efeito, 4) O despacho partiu de um pressuposto errado, não levando em conta que o regime dos despachos proferidos após decisão final tem como pressuposto questões colocadas depois da decisão final, ou relativas a essa fase processual. 5) O despacho tem que ser não apenas cronologicamente mas também logicamente posterior à decisão final. 6) No caso em apreço a questão é relativa a prova, portanto logicamente anterior à decisão final e o recurso deverá ser admitido e subir imediatamente, resolvendo-se logo a questão, o que evitará eventualmente vir a afetar a decisão final. 7) Nem faz sentido esperar pelo trânsito da decisão final, para depois, por causa da procedência do recurso retido vir a anular o processado e consequentemente a decisão transitada. 8) Pelo exposto, deverá a Douta Decisão Singular proferida a fls.. dos autos, a qual ao abrigo das disposições legais referidas e ainda dos artigos 641.º n.º 5 e 652º n.º 1 al. b) ambos do CPC., por inadmissibilidade/extemporaneidade decidiu rejeitar o recurso de apelação que a Recorrente AA, interpôs da decisão que indeferiu a reclamação contra o relatório pericial (auto de junta médica), ser revogada e substituída por Douto Acórdão que admita o recurso de apelação que a Recorrente AA, interpôs da decisão que indeferiu a reclamação contra o relatório pericial (auto de junta médica).” -, são substancialmente os mesmos que já alegou quando se pronunciou nos termos do art. 655.º n.º 1 do CPC, e sobre eles também já se debruçou a decisão singular de rejeição do recurso.
II – CONHECENDO:
A questão que importa desde já conhecer, é, pois, a da admissibilidade do recurso.
E começa-se por dizer que nos revemos inteiramente na decisão singular. Decisão essa, aliás, que segue o entendimento que tem sido sufragado nesta Secção Social e que analisou a questão com profundidade e acerto.
Com efeito, para além do acórdão mencionado na decisão singular (Ac. RG de 21-04-2022, Proc. 315/20.1T8VNF-B.G1, Vera Sottomayor, www.dgsi.pt), veja-se por ex. o Ac. desta RG de 03.11.2022[1], no qual se escreveu:
“Em suma, as razões que justificam a admissibilidade da apelação autónoma e imediata das decisões sobre os meios de prova visam, para além da celeridade processual, minorar os riscos de uma futura inutilização o processado, por isso e no que respeita aos meios de prova, a referida al. d) do n.º 2 do art.º 79.º do CPT., apenas abrange a admissão e a rejeição de meios de prova, não se estendendo nem abrangendo todas as vicissitudes da prova – cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4.ª edição, Coimbra, 2017, p.198.”
Sendo na mesma linha muito recente acórdão da RL[2], em que se entendeu (dando-se também nota de outros arestos em que se perfilhou idêntico entendfimento):
“Sumário: 1 – A admissibilidade de apelação autónoma relativamente à admissão ou rejeição de algum meio de prova, prevista no artigo 644º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil não se estende a todas as vicissitudes que possam surgir quanto à produção de prova, mas apenas às decisões que efectivamente rejeitem ou admitam meios de prova.”
Na fundamentação deste acórdão lê-se:
“Assim, aquilo que vem sendo considerado pela jurisprudência é que a admissibilidade de apelação autónoma não se estende a todas as vicissitudes que possam surgir quanto à produção de prova, mas apenas às decisões que efectivamente rejeitem ou admitam meios de prova – cf. acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 6-05-2021, processo n.º 10981/19.5T8LSB.L1-6; e do Tribunal da Relação do Porto de 4-11-2019, processo n.º 701/17.4T8MAI.P1, sendo que neste se entendeu que a segunda perícia não é um meio de prova no sentido da previsão do preceito que admite a recorribilidade imediata e autónoma, cuja razão de ser não se estende a todas as vicissitudes da prova, onde se inclui a segunda perícia ou a contradita, por exemplo.”
Em suma, não estão em causa diferentes meios de prova – “esta é e sempre continua a ser a Prova Pericial”/junta médica[3] -, não tendo o despacho recorrido rejeitado um meio de prova, nem é este um caso em que a impugnação da decisão juntamente com a impugnação da decisão final torne aquela (impugnação) absolutamente inútil.
III - DECISÃO
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em rejeitar o recurso de apelação que a Recorrente AA, interpôs da decisão que indeferiu a reclamação contra o relatório pericial (auto de junta médica).
Custas da apelação a cargo da recorrente.
Notifique.
Guimarães, 14 de Setembro de 2023
Francisco Sousa Pereira (relator)
Antero Veiga
Vera Maria Sottomayor
[1] Proc. 839/22.6TBRG-A.G1, Vera Sottomayor [2] Ac. RL de 02-05-2023, Proc. 752/21.4T8LSB-B.L1-7, Micaela da Silva Sousa, www.dgsi.pt [3] Ac. RP de 04-11-2019, Proc. 701/17.4T8MAI.P1, José Eusébio Almeida, www.dgsi.pt