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RECUSA A RESPONDER A PERGUNTAS
RECUSA A PRESTAR DEPOIMENTO
COARGUIDO
DECLARAÇÕES
CONVICÇÃO DO TRIBUNAL A QUO
PROVA
TRANSCRIÇÕES
Sumário
Há que distinguir a recusa em responder às perguntas efetuadas, com a recusa de prestar depoimento. A recusa a responder reporta-se a uma determinada questão ou questões podendo a testemunha recusar-se a responder a uma determinada questão e não se recusar às demais questões. Para que usufrua de tal prerrogativa a testemunha terá de o invocar expressamente conforme o n.º 2 do artigo 132º do Código de Processo Penal.
A recusa de depoimento significa a testemunha recusar-se ao dever de testemunhar qua tal. Esta figura de recusa de depoimento está prevista no artigo 134º CPP e no artigo 497º do CPC.
O tribunal não pode advertir a testemunha de que a resposta a determinada pergunta a pode incriminar penalmente. As declarações incriminatórias de coarguido estão sujeitas às mesmas regras de outro e qualquer meio de prova. Sendo tais declarações balizadas pelos princípios da investigação, livre apreciação, in dubio pro reo e, salvaguardado sempre o exercício do contraditório, nenhum argumento subsiste contra a validade de tal meio de prova.
Não sendo possível ao tribunal ad quem o contacto direto e imediato com as provas que a audiência de julgamento em 1.ª instância permite, a impugnação da convicção formada só é viável desde que se demonstre que ela é inadmissível em face das regras da experiência comum, ou seja, que, em face de tais regras, essa convicção não tem lógica, não é coerente, não é possível que os factos assim se tenham passado.
Não relevam para o apuramento do vício do erro notório na apreciação da prova as transcrições extraídas da gravação da prova produzida em audiência, uma vez que extravasam o texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, as quais só podem ser consideradas se, e na medida em que o tribunal a quo as mencione na motivação da decisão de facto.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na 3ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa
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I - RELATÓRIO
1.1. No processo n.º 30/17.3PEPDL, foram julgados em processo comum (Tribunal Coletivo), pelo Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, Ponta Delgada - JC Cível e Criminal - Juiz 3, os arguidos E__________, M____________, D___________, AR__________e AP__________, com os demais sinais dos autos, a quem o MP imputara a prática:
E__________, a prática em concurso real, em coautoria (com os arguidos D________, M____________e AR__________) de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro (Lei da Droga);
M____________, a prática, em coautoria (com os arguidos E____________, D________ e AR__________), de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro (Lei da Droga);
D___________, a prática, em coautoria (com os arguidos E____________, M____________e AR__________), de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro (Lei da Droga);
AR__________, a prática, em concurso real, em coautoria (com os arguidos E____________, M____________e AP______), de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 da LD, e em autoria material de um crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo art.º 368º-A nºs 1, 2 e 3 do Código Penal (CP); e
AP__________, a prática, em concurso real, em coautoria (com o arguido AR__________), de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro (Lei da Droga), e de um crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo art.º 368º-A nºs 1, 2 e 3 do CP.
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1.2. Realizada a Audiência de discussão e julgamento foi proferido o seguinte segmento decisório: 1. Absolver o arguido AR__________ da prática do imputado crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo art.º 368º-A nºs 1, 2 e 3 do Código Penal. 2. Absolver o arguido AP__________ da prática do imputado crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo art.º 368º-A nºs 1, 2 e 3 do Código Penal. 3. Condenar o arguido E__________ pela prática, em coautoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de prisão, absolvendo-o do remanescente (reincidência). 4. Condenar a arguida M____________ pela prática, em coautoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão. 5. Condenar o arguido D___________ pela prática, em coautoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão. 6. Condenar o arguido AR__________ pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 7 (sete) anos e 10 (dez) meses de prisão. 7. Condenar o arguido AP__________ pela prática, como cúmplice, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena especialmente atenuada de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, acompanhada de regime de prova assente num plano de reinserção social que, para além do mais, especialmente preveja (i) o acompanhamento psicológico, (ii) a promoção de uma atividade ocupacional (iii) e a inscrição na Agência para a Qualificação e Emprego e o cumprimento de todas as obrigações dali decorrentes, absolvendo-o do remanescente (prática do mesmo crime em coautoria). 8. Julgar procedente o incidente de liquidação do valor a perder a favor do Estado (liquidação de património) deduzido pelo Ministério Público contra o arguido AR__________ e, em consequência, determinar a perda do valor de €8.676,35 (oito mil, seiscentos e setenta e seis euros e trinta e cinco cêntimos) a favor do Estado. 9. Determinar a recolha de amostra de DNA aos arguidos E__________, M____________, D___________, AR__________ e AP__________, e subsequente inserção na base de dados prevista na Lei nº 5/2008, de 12 de fevereiro. 10. Quanto aos objetos apreendidos: 10.1. determinar a perda a favor do Estado do produto estupefaciente apreendido, e a correlativa destruição; 10.2. determinar a perda a favor do Estado do dinheiro apreendido nos autos, com o destino a que alude o art. 39º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro; 10.3. determinar a perda a favor do Estado do telemóvel apreendido ao arguido E__________ afeto à atividade referido em C. dos factos provados; 10.4. determinar a perda a favor do Estado da navalha, do material plástico e do cartão plástico, e a correspondente destruição; 10.5. determinar a restituição ao arguido E__________ dos dois demais telemóveis apreendidos referidos em C. dos factos provados; 10.6. determinar a restituição ao arguido AP__________ do telemóvel apreendido; e 11. Condenar os arguidos E__________, M____________, D___________, AR__________ e AP__________ nas custas do processo, fixando a taxa de justiça em 4,5 UC relativamente a cada qual. * Notifique e deposite. * Extraia cópia do presente acórdão e arquive em pasta própria (acórdãos – Juiz 3). * Comunique desde já à Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais. * Após o trânsito em julgado: - remeta boletim à Direção de Serviços de Identificação Criminal; - comunique à Direção Central de Investigação do Tráfico de Estupefacientes da Polícia Judiciária; - proceda às comunicações a que aludem os art.ºs 62º nº 6 e 64º nº 1, ambos do cit. Decreto-Lei nº 15/93; e - solicite à Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais a elaboração do plano individual de reinserção social com referência ao determinado no ponto 7. do dispositivo; - oficie o Gabinete de Recuperação de Ativos da Polícia Judiciária com referência ao determinado no ponto 8. do dispositivo; - oficie o Instituto Nacional de Medicina Legal e Clínicas Forenses, I.P. com referência ao determinado no ponto 9. do dispositivo (art.ºs 16º e 17º da cit. Lei nº 5/2008); - informe acerca do estado de conservação, estimativa de valor e possibilidade de os dados serem apagados do telemóvel referido no ponto 10.3. do dispositivo; - notifique os arguidos E__________ e AP__________ nos termos do disposto no art.º 186º nº 3 do CPP, com referência ao determinado nos pontos 10.5 e 10.6. do dispositivo; - certifique o trânsito em julgado à Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais; e - remeta certidão ao Tribunal de Execução de Penas, com nota do trânsito em julgado.
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1.3. Inconformados, recorreram os arguidos E__________, D___________, M____________, e também, o arguido AR__________ -, os quais formularam as seguintes conclusões:
a) Recurso interposto pelos arguidos E__________, D___________, M____________: 1- Em sede de audiência de discussão e julgamento foi ouvida na qualidade de testemunha C_______ que residiu durante sete anos com os recorrentes, incluindo o período a que se reporta a decisão condenatória, foi companheira e dele tem uma filha dum outro filho e irmão dos recorrentes e, inclusive, aos costumes se identificou como nora; 2 - Em face desta ligação peticionou a defesa que fosse facultada à testemunha a faculdade de, querendo, não prestar declarações por ligada familiarmente aos recorrentes, por remissão para o disposto no artigo 134º, nº 1, do C. P. Penal, conforme requerimento gravado no suporte áudio 20190618154503_12135524_2890453.wma. minutos “[00:02:45]; 3 - Tal foi indeferido pelo tribunal recorrido que entendeu que a união de facto não é aplicável às hipóteses previstas no artigo 134º, nº 1, alínea a) d C. P Penal por o legislador ter criado um numerus clausus de aplicabilidade dessa união de facto à norma em causa; 4 - O que pretendeu o legislador com o artigo 134º do C. Penal e o elenco das pessoas a quem foi atribuído a faculdade de recusar o depoimento foi a sujeição do processo penal a um mecanismo defensivo do conceito de família o que não se compagina com as novas realidades vivenciais mormente a união de facto; 5 - Para o tribunal recorrido os parentes e afins (até ao segundo grau) e a noção de equiparação da união de facto ao casamento apenas existe com referencia à alínea b) do artigo 134º já que, qualquer pessoa que conviva e tenha filhos, com os familiares directos e próximos dos arguidos e putativamente abrangidos pelo disposto na alínea a) n.º 1 do artigo 134º não podem e não devem proteger o agregado familiar porque não são casados; 6‐ Advoga‐se por isso, dever considerar‐se materialmente inconstitucional o artigo 134º, n.º 1, alínea a) do C. P. Penal, na interpretação adiantada pelo tribunal recorrido, por violação do disposto nos artigos 13º, n.º 1, 25º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa. E, 7 - Concomitantemente, por remissão para o disposto no art.º 134º, n.º 2 do C. P. Penal ser declarado nulo o depoimento da testemunha C_________. 8 - A aludida testemunha C_______ na sequência do seu depoimento e em obediência ao princípio da proibição da autoincriminação foi advertida para querendo não prestar mais declarações o que esta aceitou. 9 - “A testemunha que em audiência de julgamento se prevalecer da faculdade de recusar a depor inutiliza todas as declarações anteriormente produzidas “pelo que, era vedado ao tribunal recorrido deitar mão como deitou das declarações desta para fundamentar a convicção, 10 ‐ Merecendo censura a douta decisão recorrida e dever ser considerada nula atento o disposto no artigo 134º, n.º 2 do C. P. Penal, na parte em que valorou o depoimento da testemunha C_________. 11‐ Deu o tribunal recorrido relativamente aos arguidos E____________ e seus pais que, A. Os arguidos E____________ e seus progenitores e arguidos D________ e M____________, mediante plano por eles traçado, pelo menos de outubro de 2016 a 13.12.2017, vêm vendendo droga a consumidores que os procuram. A venda de estupefacientes é feita, ora na casa do arguido E____________ sita na Rua ________, ora na casa dos arguidos D________ e M____________ sita na Rua _________. E, ainda, 12 ‐ B. Pelo menos uma parte do produto estupefaciente vendido pelo arguido E____________, D________ e M____________ era fornecida pelo arguido AR__________ em datas não concretamente apuradas naquele período. 13 ‐ Estas imputações “vendiam droga aos consumidores que os procuravam” são demasiado amplas, carecem de concretização e insuficientes à qualificação da conduta criminal dos arguidos. 14 ‐ Em face dos diminutos elementos dados a conhecer pelo tribunal recorrido contra os arguidos não é possível concluir, com certeza ou mínima segurança jurídica, se os mesmo praticaram um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo disposto no artº 21º, nº1 do Decreto Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro ou um crime de tráfico de menor gravidade, p.p. pelo disposto no artº 25 do citado diploma. 15 ‐ Cabendo decidir que ocorreu por parte do julgador uma omissão dos seus deveres/poderes de cognição gerador do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e a douta decisão recorrida ser considerada nula à luz das normas conjugadas dos artigos artigo 368º, nº 2, 374º, nº 2, 379º, 410º, nº 1 e 2 todos do Código de Processo Penal. 16 ‐ Deu a decisão recorrida por assente que” Pelo menos uma parte do produto estupefaciente vendido pelo arguido E____________, D________ e M____________ era fornecida pelo arguido AR__________ em datas não concretamente apuradas naquele período” tendo a convicção dos julgadores radicado, essencialmente, no depoimento testemunhal da aludida C_______sendo os restantes elementos de prova instrumentais dessas declarações. 17 ‐ Acontece que este depoimento na eventualidade não esperada ser entendido como legalmente admissível supra transcrito e retirado do suporte áudio 20190618154503_12135524_2890453.wma., minutos 00.19.34 a 00.19.57, 00.16.49, 00.24.20 a 00.27.46 desmente, categoricamente, qualquer ligação dos recorrentes ao coarguido AR____ pelo que, 18 ‐ Por erro manifesto da apreciação dos factos e por apelo ao disposto no artigo 412º do C. P. Penal e porquanto, nenhuma prova minimamente credível indica que o arguido AR____ se dedicava ao tráfico de droga e nenhuma prova testemunhal legitima e admissível sustenta a conclusão do tribunal recorrido deverá o segmento fáctico traduzido “ Pelo menos uma parte do produto estupefaciente vendido pelo arguido E____________, D________ e M____________ era fornecida pelo arguido AR__________ em datas não concretamente apuradas naquele período” ser dado por não provado. 19 - É imputado aos arguidos D________ e M____________ detinham, na sua residência: 250 gramas de heroína, correspondente ao peso líquido de 15,455gr., de 22,073gr. e de 198,854gr.; 1.490 euros em notas do BCE provenientes da venda de estupefacientes; 20 ‐ Do relato da testemunha C_________, presente no momento da rusga e apreensão da heroína, supratranscrito e retirado do suporte áudio 20190618154503_12135524_2890453.wma., minutos 00.06. 33 a 00.0640, 00.09.48 a 00.10.29 resulta que essa “testemunha “residia num anexo do quintal onde foi apreendida a heroína, 21- Sendo, assim, abusiva por incompleta, a afirmação que as 250 gramas foram apreendidas na residência dos recorrentes pois, com exactidão, foram apreendias no quintal anexo ao espaço onde vivia a testemunha C_________, 22‐ Como resulta e atestado pelo relatório atinente à situação pessoal da recorrente M____________ inserto no capítulo V da decisão recorrida que a recorrente M____________ e marido, possuíam rendimentos oscilando entre os 1000 euros e os 1500 euros mensais da reforma do recorrente e da actividade da recorrente da venda de licores e bolos pelo que, 23‐ Não contendo, ainda, a decisão recorrida qualquer alusão aos valores pelos quais era transacionada a droga desconhecendo‐se, por isso, o raciocínio que levou o tribunal recorrido a sentenciar a quantia de €1.490 euros como proveniente de actividade ilícita, 24- Por manifesto erro na apreciação da prova deverá ser dado como não provado o segmentos fáctico da decisão recorrida do qual consta que os arguidos D________ e M____________ detinham, na sua residência: 250 gramas de heroína, correspondente ao peso líquido de 15,455gr., de 22,073gr. e de 198,854gr.; 1.490 euros em notas do BCE provenientes da venda de estupefacientes; 25 - Expurgada a douta decisão recorrida dos elementos fácticos indevidamente dados por assentes, bem como aqueles relativamente aos quais não lhes é possível exercer o contraditório pois são omissos na sua formulação os factos mantidos intactos configuram a prática pelos recorrentes de um crime de trafico de estupefacientes. 26 ‐ Todavia em face do seu período temporal / dois meses e a qualidade de estupefacientes transacionados Dormicun e Subutex não podem, nem devem, ser enquadrados na pratica do crime de estupefacientes p.p. pelo disposto no artigo 21º, n.º 1 do Decreto‐Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro mas, isso sim, como crime de tráfico de menor gravidade, p.p. pelo disposto no artº 25 do citado diploma o que, 27 ‐ Advogando‐se ter o tribunal recorrido efectuado um erróneo enquadramento jurídico dos factos “in casu “os aludidos artigos 21º e 25º, disposições legais em concreto violadas por não verificação dos seus pressupostos. 28 ‐ Militam contra o arguido E________ os seus antecedentes criminais amplamente descritos na decisão recorrida, muito em especial pela condenação em crimes similares. Todavia, a análise da sua situação económica social e personalidade retratada no capitulo IX no acórdão condenatório, certificam um cidadão que presentemente se encontra em tratamento de desintoxicação, inserido profissionalmente nas áreas de mecânica e construção civil e com uma relação emocional estável. 29 ‐ Ponderando que, o percurso e passado criminoso do recorrente E____________ teve a sua origem directa e necessária no consumo de estupefacientes e deles é toxicodependente, vício do qual se libertou, entende‐se a concreta pena a aplicar ao recorrente deverá ser suspensa na sua execução o que, concomitante, importa a sua redução para menos de 5 (cinco) anos. E, 30 ‐ No caso não esperado de ser deliberado que não haver lugar à suspensão da execução em face do circunstancialismo descrito, ser essa pena reduzida para os seus limites mínimos, ou seja, para 3 (três) anos de prisão. 31- No que respeito diz ao arguido D________, conforme atesta o Capítulo IV da decisão recorrida, haverá que atender aos seus gravíssimos problemas de saúde. Que tem 59 anos de idade, fazendo 60 anos no próximo mês de Fevereiro de 2020. E, 32 - É um homem reformado por invalidez, com baixa escolaridade (3ª classe), recentemente sujeito a operação cirúrgica melindrosa, ainda em convalescença, encontrando‐se inserido socialmente na comunidade onde reside; não possui quaisquer antecedentes criminais pelo que, 33 ‐ É previsível que a simples censura do seu comportamento criminoso a passar pela aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução seja o bastante para as necessidades de prevenção geral e especial que o caso concreto exige. 34 ‐ Desta forma se pugnando pela redução da pena que lhe foi aplicada para 3 (três) anos de prisão suspensa na sua execução ainda que sujeita a regime probatório. 35 ‐ Mutatis mutandis, e por apelo aos factos vertidos no capítulo V do acórdão da decisão recorrida, e sobre a arguida M____________-, possui esta baixa escolaridade (3ª classe), graves problemas de saúde (obesidade, hipertensão e distúrbio ansioso). Tem 60 anos e não possui antecedentes criminais pelo que, 36 ‐ Também a ela, a concreta pena de prisão aplicada deverá ser reduzida para 3 (três) anos de prisão suspensa na sua execução ainda que sujeita a regime probatório. E, 37 - Por atentatórias do disposto nos artigos 70º, 71º, n.º 1, 2 e 50º 51º, todos do C. Penal deverá a decisão recorrida na parte em que condena os recorrentes E____________, D________ e M____________ da -, respectivamente, nas penas de 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de prisão, na pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão e na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, serem revogadas.
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b) Recurso interposto pelo arguido A__________ -: 1- O Acórdão nos autos condenou A______ -“(...) pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 7(sete) anos e 10 (dez) meses de prisão”; e decidiu, quanto a incidente de liquidação de património deduzido pelo MP, “(…)determinar a perda do valor de €8.676,35 (oito mil, seiscentos e setenta e seis euros e trinta e cinco cêntimos) a favor do Estado.” 2- O Acórdão recorrido deu como provados relativamente ao Recorrente os alegados factos acusatórios transcritos na Motivação deste recurso sob os Pontos I.B) (por referência a A) da matéria dada por provada no Ac.), e ainda E) e H), para a qual aqui nos remetemos, dando-os aqui por integralmente reproduzidos para os legais efeitos. 3- O Acórdão considerou não provado “Relativamente à matéria elencada em A., que: O arguido A__________ também traçou idêntico plano com os arguidos E____________, D________ e M____________.” 4- O Acórdão na sua fundamentação refere “Grupos” de alegados factos: “um primeiro grupo relativo à traficância, em conjunto e em comunhão de esforços e intentos, entre os arguidos E____________, M____________ e D________, por um lado e AR__________, por outro lado; e um segundo grupo referente à conduta dos Arguidos AR__________ e AP______ - (…)”- tendo concluído que: “A leitura conjugada dos grupos- na parte em que resultou demonstrada- permite aferir da globalidade das condutas desenvolvidas pelos arguidos, permitindo explicar, outrossim, a posição privilegiada do arguido AP__________ como sendo alguém que vendia/fornecia o produto (aos arguidos E________, D________ e M____________-), recebia avultadas somas de dinheiro e cuidava de o fazer chegar a terceiros (através da colaboração do arguido AR______ -), dele destinatários (sem embargo da “fatia” que lhe coubesse).” 5- Não podia ter assim concluído o Acórdão, pois baseou-se em meios de prova que não devia ter valorado, ou dado a credibilidade que deu; e a ausência de qualquer resultado penalmente relevante quer de buscas, apreensões, revista, vigilância ou registos telefónicos quanto a AR____________ torna a Acusação insustentada/insustentável contra este. 6- Quanto ao primeiro Grupo de alegados factos que o Acórdão deu como provados sob o Ponto I.B) (com referência a A)) referidos em 2 destas Conclusões, o Acórdão fundamentou-se no depoimento de C_________, sendo que os arguidos E____________, D________ e M____________ nas suas declarações confessórias nada imputaram de ilícito ao ora Recorrente. 7- Na ausência de outra prova que corroborasse o 1º Grupo de alegados factos contra o Recorrente, o Ac. bastou-se com o que depôs C______: “questionada sobre o conhecimento acerca de concretos negócios de droga entre o Arguido J__ e a família P______, a referida testemunha C______ para além daquilo que poderia resultar na sua autoincriminação - referiu-se, cristalinamente, a um acordo entre aquele e o arguido E____________ no sentido de entrega de droga pelo primeiro a este, facto este de que teve conhecimento directo e presencial pelo que um e outro lhe disseram.” 8- Ora, assim como em Julgamento este depoimento de C______ não foi valorado, também no Acórdão recorrido não poderia ser valorado nem sequer fundamento de qualquer condenação nomeadamente quanto ao arguido A______. Vejamos: 9-A Testemunha C______ ouvida em 18-06-2019 (depoimento gravado entre 15:45:05h e 16:17:44h): Mmº Juiz (minuto 25:52): “A questão foi essa, se a senhora alguma vez viu o Sr. AR____ a vender droga ao E____________?” - disse: “Vi sim senhora”. (minuto 26:02) Questionada:“(…) eu já percebi que a Sra. não se dá muito bem com o Sr. AR______, pois não?”(minuto 26:33)- disse: “Tá tudo mal, ninguém dá-se bem.”(26:37m) Perguntada: “Ninguém dá-se bem, então a Sra. também não se dá bem ali com o E____________, nem com a sua sogra…?”(minuto 26:42)- disse: “Eu dou mal com ele.”(minuto 26:45) Defensora: “Oh C______, mas aqui a questão é que a Sra. está aqui em julgamento e já disse muita coisa contraditória.”(minuto 27:12)-disse: “Mas eu já vi, já vi sim senhora.”(minuto 27:17) Questionada: “Quando é que viu, quando é que viu?” - disse: “(…) vi sim senhora, porque eu própria estive com ela na mão para dar ao Sr. E____________ (…)” (minuto 27:30ss.). Perguntada:“(…) teria sido a senhora?”(minuto 27:43)-disse: “Fui buscar, não tenho vergonha de dizer, fui buscar a casa do Sr. AR______, o Sr. AR______ teve pressa de dar, que ainda não estava chegando a hora para dará aquilo ao Sr. E____________, teve pressa a dar mais cedo porque a polícia já estava de olho nele, lá mesmo naquela zona onde estava, para mim dar aquilo ao Sr. E____________ e o Sr. E____________ deu-me o dinheiro para eu levar ao Sr. AR______ e eu dei o dinheiro ao Sr. AR______ e, tanto que faltou dinheiro(…)”(minuto 27:46 ss.). 10- Logo o Mmº Juiz determinou:“(…) a senhora ter tido intervenção nisso, eu tenho o dever de alertá-la relativamente àquilo que a senhora tinha obrigação a falar com verdade se isso implicar uma autoresponsabilidade, se isso implicar quer a senhora também tenha responsabilidade, aí excepcionalmente a senhora pode não revelar, portanto nessa parte, daquilo que a senhora tenha tido intervenção directa e se serviu de intermediário, a sra. Nessa parte pode não prestar declarações…não quer falar sobre isso?” C______- “(…)”. Juiz: “Não, muito bem.” (minuto 28:13 e ss.) O Mmº Juiz ainda realçou: “Pronto Sra. C______, este, esta parte que a senhora referiu agora, de ter tido intervenção nisso não conta, não vale, porque a Sra. antecipou-se a dizer isso e isso pode implicar a sua autoresponsabilidade e também manifestou vontade nessa parte, portanto, isso é como se não tivesse dito, e aquilo que vai ser extraído e qualquer questão nunca pode basear-se nisso está bem? Portanto, isso é como se nunca tivesse dito. “(minuto 29:34ss.) Por conseguinte, o Mmº Juiz questionou a Testemunha sobre o Sr. AR______ -: “Sem que a senhora tenha tido intervenção, viu-o a dar droga aos seus sogros ou ao E____________ alguma outra vez?”(minuto 31:30)- Respondeu peremptoriamente a Sra. C______: “Não.”(minuto 31:40- sublinhado nosso.) 11- O Acórdão ao ter valorado o depoimento de C______ na parte por esta descrita decorrente de conhecimento por alegada intervenção directa segunda a própria, “conhecimento directo e presencial pelo que um e outro lhe disseram”, segundo o parágrafo 2.12. da fundamentação de facto do Acórdão, e com base neste depoimento ter dado por provados os factos dos pontos I.B) e H) do Acórdão, quanto ao Arguido AR______ -, incorreu, a nosso ver, em violação do Princípio de Proibição de Valoração da Prova consagrado no artº 355º/1 CPP, incorrendo por conseguinte em nulidade o Acórdão recorrido nos termos do artº 122º/1 CPP. 12- Pois, a imputação que C______ faz no seu depoimento a este arguido pressupõe necessariamente a autoresponsabilidade da Testemunha “directamente interveniente na situação”, segundo a própria, sem cuja intervenção directa não tem qualquer alegado conhecimento nem imputação acusatória a fazer contra o arguido A______ -. Não indo o alegado conhecimento desta Testemunha, ao invés do que entende o Acórdão recorrido, “para além daquilo que poderia resultar da sua autoincriminação”, pois o alegado acordo que descreve ter tido com os arguidos é indissociável da intervenção directa desta Testemunha, ou seja, da própria. 13- Daí a invalidade do depoimento desta Testemunha abranger o que depõe em função da sua alegada intervenção directa, sendo que a própria após informada pelo Mmº Juiz que poderia recusar responder a perguntas que a incriminassem (artº 132º/2CPP) manifestou que não responderia como resulta do seu depoimento supra (minuto 28:13ss.) 14- Sem conceder sobre o acima exposto, mesmo que se considerasse como o Acórdão no seu parágrafo 2.12. que, alegadamente:“…C______ para além daquilo que poderia resultar na sua autoincriminação- referiu-se,(…),a um acordo entre aquele e o arguido E____________, no sentido de entrega de droga pelo primeiro a este, factos estes de que teve conhecimento directo e presencial pelo que um e outro lhe disseram”- também não serviria de fundamentação válida para dar por provados quanto ao arguido AR_______ os alegados factos constantes do Ponto I, B) (por referência a A)) e H) da matéria dada por provada no Acórdão, pois não foi confirmada por qualquer dos arguidos visados no depoimento - nem E____________ nem A.- - logo não seria valorável. 15- Ao ter valorado tal depoimento como fundamento invocado pelo Acórdão para dar como provados os alegados factos acusatórios que assim considerou sob os ponto I.B) (por referência a A) e H) quanto ao Recorrente, incorre, a nosso ver, o Acórdão em nulidade nos termos do artº 379º/1,c) (2ª parte) CPP, pois tendo valorado depoimento que não podia ter valorado, por conseguinte pronunciou-se sobre algo que não devia ter-se pronunciado ao dar como provados esses alegados factos acusatórios (descritos no ponto I.B) e H) do Acórdão) resultantes de depoimento invalorável - nulidade esta que aqui invocamos para os devidos efeitos legais. 16- No mais, sobre o 1º Grupo de alegados factos acusatórios, nenhum outro meio de prova corroborou-os no sentido que o Acórdão deu como provados sob os Pontos I,B) (por referência a A)) e H) supra transcritos na Motivação, os quais deviam ter sido dados como não provados quanto ao Recorrente dada a ausência prova incriminatória. 17- Da busca ao seu domicílio (fls. 133-135 e 149) resultou apreendido só um pedaço de papel com número telefónico e dizer “E________”, do qual não se pode extrair qualquer conclusão no sentido de que o arguido A.- estivesse alegadamente relacionado com alegada traficância de E____________ ou dos pais deste, como o Acórdão, a nosso ver, mal concluiu; e do facto de o Arguido A.- os conhecer, ter o contacto telefónico de E____________ e já ter ido a casa dos pais deste, não se pode concluir, como concluiu indevidamente o Acórdão, que A.- estivesse alegadamente relacionado com alegada traficância de E____________ ou família deste (contactar com alegados “vendedores de droga” por si só não é crime!). Dos telemóveis de AR_______, cfr. fls.701 a 704 dos autos, a si apreendidos, não resultou qualquer conteúdo relevante para os autos ou Acusação. 18- Ao Recorrente nenhum elemento ou objecto que pudesse ser considerado comprometedor foi apreendido, nem qualquer tipo de matéria estupefaciente, nada tendo na sua posse de natureza ilícita, nem sequer dinheiro que se pudesse considerar suspeito, tendo-lhe sido apreendidos só 87,00 euros- quantia perfeitamente compreensível em face das regras de experiência comum e juízos de normalidade da vida de um cidadão como este, com trabalhos precários e ocasionais a que então se dedicava e ainda dedica (pesca/construção civil) dos quais auferia e aufere proventos económicos desde que deixou de auferir subsídio de desemprego. (como resulta do seu Relatório social) 19- Quanto aos alegados factos I.B) (por referência a A)) e H) da matéria dada por provada no Acórdão quanto a A.-, nenhuma das Testemunhas ouvidas e com depoimento valorável referiu que este de algum modo tivesse alguma vez praticado ou estivesse ligado a qualquer actividade de tráfico de droga, nada tendo sido provado no sentido que A.- tivesse alegadamente vendido/fornecido produto estupefaciente aos/ou a qualquer dos arguidos E____________, D________ e M____________, ou sequer alguma vez recebido quaisquer alegados dinheiros que alegadamente adviessem de venda de drogas. 20- O Acórdão reconhece no parág.2.15.:“(…)é certo que o depoimento da cit. Testemunha C______, desacompanhado de outra prova consistente, é inidóneo à prova de que também o Arguido AR____ tinha qualquer participação no acordo “interno “da família P______ de venda de estupefacientes a terceiros e que estaria, com estes, em igualdade de posição (alínea a) da matéria de factualidade não provada). Mas a correlação deste arguido com a entrega de drogas permite contextualizar a factualidade apurada quanto ao segundo grupo de factos, conforme adiante explicaremos.” 21- Ou seja, o Acórdão extraiu meras ilações quando de um indício meramente circunstancial (ida do arguido A.- a casa da família P______) concluiu pela ligação alegadamente “ilícita” do Recorrente com os arguidos P______, e desse alegado facto que deu por provado em I.B) extraiu outra conclusão consistente na alegada “intervenção ilícita” do mesmo nos alegados factos acusatórios do Grupo 2 que infra se impugnarão. 22- O Acórdão não prestou a devida atenção a todos estes elementos/considerações supra explanados em 3 a 21 destas Conclusões de recurso, pois de uma abordagem atenta dos mesmos, resultaria uma decisão diversa da ora recorrida, ou seja, impor-se-ia como se impõe decisão de dar antes como não provados quanto ao arguido AR_______ os alegados factos vertidos nos Pontos I.B) (por referência a A)) e H) da matéria de facto dada por provada no Acórdão, e que ora se impugnam por incorrectamente julgados. 23- Quanto ao Grupo 2 de alegados factos acusatórios dados por provados pelo Acórdão quanto a AR______.- sob os Pontos I.E) e H), foram incorrectamente julgados, pois não devia o Acórdão ter dado por provado que este Arguido tivesse alguma vez detido, guardado, vendido/fornecido/ cedido, transportado ou feito transportar ou dado para o efeito indicações, qualquer tipo de produto estupefaciente ou qualquer dinheiro alegadamente “produto da venda do produto estupefaciente”. 24- Como supra adiantámos a respeito do 1º Grupo de alegados factos, também neste 2º Grupo de alegados factos, o Acórdão de um alegado facto deduziu outro, e desse outro, outro ainda, tendo dado um salto para o desconhecido quando, a nosso ver e salvo o devido respeito, tal não era permitido em face da parca prova produzida em julgamento. 25- Pois, sobre o 2º Grupo de alegados factos acusatórios, só o co-arguido AP______ declarou alegado aliciamento por AR______ sobre aquele (então vizinhos),“tendo nessa sequência o arguido AP______ efectuado o primeiro transporte de dinheiro, cedendo à “tentação” da promessa de recebimento da contrapartida”.“(…)o arguido AP______ - confirmou que suspeitava que o dinheiro vinha da traficância e destinava-se a financiar a droga (estando ciente da sua contribuição para o tráfico), o que de resto se mostra alinhado com as regras da experiência comum.” 26- Porém, as declarações deste co-arguido, desacompanhadas de qualquer outra prova, não são suficientes para, com a certeza exigível, se concluir que o arguido AR________ tivesse alegadamente cometido crime de tráfico de estupefacientes: não existe qualquer registo de qualquer telefonema entre o co-arguido AR______ P______ e AR________, nem sequer indícios de terem o nº de contacto telefónico um do outro, e, ao invés do que o Acórdão preconiza, das vigilâncias pela PSP de fls.364-366 e 367-369 dos autos cujo teor foi reproduzido pelo depoimento do Ag. PSP Filipe Correia, não se pode retirar nenhuma conclusão que não seja mera especulação. 27- Porquanto, a mera ida de AR_________ ao Prédio de dois andares onde já habitara e então habitava também a Testemunha MT____________ em fracção própria, bem como AP______ noutra fracção, não permite afirmar, com a certeza exigível em Julgamento, que o Arguido AR_______ tivesse alegadamente ido ao encontro do arguido AP______ e alegadamente para alegada actividade de tráfico de estupefacientes. Aliás, se ilícito houvesse sido cometido aquando dessas vigilâncias teriam sido logo detidos ambos os arguidos, o que não sucedeu! 28- As declarações prestadas por co-arguidos em não podem ser assumidas como meios de prova relativamente aos outros arguidos afectados por essas, sendo apenas meio de defesa do próprio arguido que as presta (vide Ac. RL de 28-02-01). Cada arguido pode prestar declarações (art.ºs 140º, 343º, 345º CPP) mas há esses limites de valoração. As declarações do co-arguido AP______ pesaram na condenação do recorrente, e não deveriam ter pesado sob pena de se subverterem princípios fundamentais do processo penal como o “in dubio pro reo”, transformando uma postura que visa demonstrar arrependimento como a de AP______, numa forma de prejudicar um co-arguido presumido inocente. 29- As declarações de AP______ carecem de concretização inalcançada pelas mesmas: a que título A.- alegadamente entregou-lhe dinheiro? Que quantia de dinheiro (que AP______ desconhece)? Esse alegado dinheiro provinha de alegada venda de drogas? De que alegado tipo e quantidade de droga? A quem pertencia o alegado dinheiro? E a quem pertencia a alegada droga (que AP______ nunca viu, guardou, cedeu, nunca teve na sua posse nem transportou)? AR_______ sabia se esse alegado dinheiro provinha de alegada venda de droga? Para estas questões não há prova. 30- E não tendo AP______ o contacto telefónico de AR______, dar credibilidade às declarações do primeiro seria sempre incongruente face às regras da experiência comum e juízos de normalidade, pois se algo acontecesse de errado durante o alegado transporte de dinheiro por AP______, a quem este recorreria (já que não recorreria a AR________ por nem sequer ter o contacto deste)? O alegado “mandante” ficaria sem contacto com o “transportador”? E se o alegado dinheiro era para alegadamente “financiar droga”, porquê no seu regresso não transportava droga AP______? 31- AP______ nunca viu qualquer alegada compra e/ou venda de qualquer alegada droga por parte de AR_______, porque na verdade este nunca comprou nem vendeu, nem possuiu, nem cedeu ou sequer transportou ou fez transportar, nem entregou drogas a quem quer que seja. Pelo que, não se pode ter tais declarações de AP______ por prova irrefutável das alegadas culpa e participação do arguido A.- nesses alegados factos ilícitos praticados por AP______. 32- Com efeito, o Tribunal “a quo” não pode valorar as declarações desse co-arguido AP______ como se de uma prova testemunhal se tratasse, atentos os termos do art.º 133º/1,a) CPP, nem é prova atendível contra o arguido AR_______, desacompanhada que está de qualquer outra prova, sob pena de, se assim não se entender, correr o risco de dar como boa uma versão falsa, quando em bom rigor as declarações desse co-arguido podem ter por base interesse em auto-exculpar-se mediante incriminação do outro coarguido, ou visar trato judicial/processual favorável (como a final teve ao ser condenado em pena prisão suspensa na sua execução) ou qualquer outra razão ilegítima. 33- Acresce, que no final do Julgamento quando dada a palavra ao arguido A.- este peremptoriamente afirmou referindo-se a AP______: “O AP______ é contratado por uma senhora Mna para levar dinheiro para Lisboa. O AP______ na véspera da rusga em casa do AP______ chegou da Madeira, esse AP______ aqui. O AP______ ele tá a contar tudo é mentira aqui.” Perguntado pelo Mmº Juiz: “O Sr. tem conhecimento que ele recebe dinheiro de uma tal Mna…?” - respondeu o Recorrente: “Sim Sr. ele tem um contrato com ele para carregar dinheiro (…)”. Perguntado pelo Mmº Juiz: “E como é que o Sr. sabe isso?” - respondeu: “Eu sei porque a Mna disse a mim, e o AP______ também disse a mim, é verdade.” Perguntado pelo Mmº Juiz: “O Sr. sabe disso desde quando?” - disse: “Há um ano e tal. É verdade.” (declarações gravadas na sessão 03-09-2019 entre 17:29:51 e 17:30:51, minutos 0:01 a 0:52) Porém, o Acórdão nem considerou estas declarações, quando a nosso ver deveria ter relevado na sua fundamentação, pois põem em causa as declarações prestadas pelo Arguido AP______. 34- Mais uma vez, ora sobre o Grupo 2 de alegados factos acusatórios, o Acórdão limitou-se a extrair de indícios meramente circunstanciais que incidiam sobre AR________, deduções sobre outro alegado facto, e deste alegado facto deduções sobre outro alegado facto: “Neste contexto, as declarações do arguido AP______ -, enquanto co-arguido, concernentes à conduta do Arguido AR__________, afiguram-se-nos credíveis, inexistindo qualquer dúvida de que era este quem comandava o transporte do dinheiro. Esta peça do “puzzle” encaixa na perfeição com aqueloutra, já descrita, relativa à venda/fornecimento de estupefaciente por banda do mesmo, actividade esta que, embora com outros destinatários, se terá prolongado até fevereiro de 2018 enquanto fator justificativo dos milhares de euros apreendidos.” 35- Quando não é legítimo, a nosso modesto ver, presumir e dar como provado relativamente a AR_________ esses alegados factos constantes dos Pontos E) e H) da matéria dada por provada no Acórdão supra transcrita na Motivação, apenas com base nas declarações de co-arguido, quando ainda para mais os alegados factos acusatórios do Grupo 1 não se alicerçam sequer em qualquer prova valorável que permitisse ultrapassar os meros indícios, como atrás supra referimos. 36- E das regras de experiência comum e dos juízos de normalidade não se pode dar como provado sem mais a alegada intervenção nem alegada culpa de A.-, pois nada lhe foi apreendido de comprometedor, do depoimento das Testemunhas de Acusação e das declarações dos demais arguidos (que não o co-arguido AP______) nada resultou no sentido que o arguido AR__________ tivesse alegadamente vendido, cedido, fornecido, guardado, escondido ou transportado droga ou tivesse qualquer intervenção em alegada actividade de tráfico de estupefacientes. 37-Assim, forçoso será concluir que os alegados factos que o Acórdão deu como provados quanto ao ora Recorrente sob os pontos I. B) (com referência a A)), E) e H), foram incorrectamente julgados e requerem reapreciação da prova gravada pelo Digno Tribunal “ad quem”, pois deviam ter sido dados como não provados relativamente ao Recorrente, sendo que a análise atenta e rigorosa da prova produzida em julgamento, a ausência de prova testemunhal valorável, o teor das buscas, revistas, apreensões, vigilâncias e documento referidos no Acórdão, todas essas circunstâncias supra expostas impõem decisão diversa da ora recorrida, impondo a absolvição do Recorrente. 38- O Acórdão baseou-se em ilações e deduções que não têm sustentáculo em qualquer prova produzida e atendível em julgamento, nem em qualquer legal presunção de culpa que seria contrária “in casu” ao art.º 32º/2CRP. Ou seja, extraiu do facto das apreensões de droga e/ou dinheiro terem sido em casas que o arguido ou visitou (casa da família P______) ou conhecia (AP______), um sentido em tais factos não contido, de que teria alegadamente A.- fornecido droga à família P______ e desta recebido alegado dinheiro e ainda feito transportar por AP______ esse alegado dinheiro dando as indicações para o efeito, e ainda alegadamente com conhecimento de drogas e dinheiros nessas casas buscadas teria alegadamente feito transportar drogas e transacções de drogas sentido intrinsecamente inaceitável, salvo o devido respeito que é muito. 39- O Tribunal “a quo”, perante a prova produzida em audiência, poderia apenas e quando muito, suspeitar que o Arguido AR________ alegadamente tivesse sido autor de Tráfico, mas não ultrapassaria contudo as dúvidas razoáveis a respeito das alegadas autoria e responsabilidade deste Arguido relativamente aos alegados factos de que vem acusado por alegado tráfico de droga, pelo que de igual modo apareceria como única atitude legítima a adoptar, a absolvição do Arguido à luz dos princípios do “in dubio pro reo” e da presunção de inocência deste, o que o Acórdão não fez ao ter condenado este Arguido a quem nada foi apreendido com relevância penal. 40- Por conseguinte, e atento o supra exposto nesta Motivação, deve ser julgado improcedente, por infundado, o pedido incidental do M.P. de perda alargada de bens a favor do Estado (liquidação do património) relativamente ao Arguido AR______ -. 41- Sem prescindir de modo algum sobre todas as considerações que fundadamente tecemos sobre a apreciação da prova pelo Tribunal “a quo”- a qual impunha a absolvição do aqui Recorrente, ao invés da sua condenação- caso V. Exas. Entendam manter como provados os alegados factos acusatórios supra impugnados- o que não concedemos porém- nesse caso a pena aplicada a este arguido mostrar-se-ia a nosso ver desproporcional e excessiva, e deveria ser reduzida, e em todo o caso e de qualquer modo ser sempre suspensa na sua execução. 42- Este arguido não regista quaisquer antecedentes criminais, está integrado social e familiarmente (ainda que família resida noutros países), e trabalha ocasionalmente/precariamente (sem contrato laboral) como pescador desde que ficou desempregado, a fim de fazer face aos seus gastos pessoais, cfr. resulta do respectivo Relatório Social, e não há registo de qualquer comportamento ilícito após os alegados factos acusatórios objecto destes autos. 43- Todas estas circunstâncias não foram devidamente atendidas pelo Acórdão, quando deviam ter sido expressamente consideradas na ponderação e determinação da medida da sua pena, devendo ser devidamente valoradas a favor deste arguido. 44- Na determinação da medida concreta da pena, o Tribunal está vinculado aos critérios do art.º 71º CP, nomeadamente, as condições pessoais do agente e a sua situação económica, e o seu comportamento posterior e anterior aos factos. E o Acórdão recorrido não atendeu devidamente a estes factores no que respeita ao Recorrente. 45- As penas devem visar sempre a reinserção social do condenado (art.º 40º CP) e não apenas o castigo puro e simples e a pena de prisão deve ser aplicada em último caso. Sucede que, presentemente, as penas de prisão nem sempre reinserem, porém são sempre estigmatizantes. Condenar este Arguido- e perante todos estes factores supra referidos que deviam ter sido melhor considerados pelo Acórdão e a favor deste arguido - a cumprir 7 anos e 10 meses de prisão, seria estigmatizá-lo irremediavelmente e em vez de se reinserir estar-se-á a impossibilitar deveras a sua reinserção. 46 - A nosso ver, deve a pena concreta a aplicar ao Arguido AR________, ser fixada em medida não superior a 5 anos de prisão, mostrando-se a que lhe foi aplicada pelo Tribunal de 1ª instância excessiva e desproporcional “in casu” perante todos os factores supra referidos e a total ausência de antecedentes criminais por parte deste arguido. 47- Sem concedermos sobre o supra exposto sobre a matéria de facto, sempre se dirá que o Acórdão ao ter aplicado uma pena de 7 anos e 10 meses de prisão ao ora Recorrente, não atendeu devidamente a todas estas circunstâncias concretas e supra referidas, e incorreu na violação do disposto nos art.ºs 40º e 71º/1, 2, d), e) CP, devendo, pois, ser revogado, procedendo-se à redução de prisão que lhe foi aplicada para uma pena concreta não superior a 5 anos de prisão. 48- E, considerando que A.- não tem quaisquer antecedentes criminais, tem 50 anos de idade, está inserido social e familiarmente, tem cumprido escrupulosamente as medidas coactivas aplicadas nestes autos, após os alegados factos acusatórios objecto destes autos não teve qualquer conduta posterior censurável penalmente - a nosso ver, por tudo isso deve ser-lhe dada uma oportunidade, permitindo-se a este seja útil para a sociedade e a sua reinserção social, decretando-se para tal, e em qualquer caso, a redução da pena que lhe foi aplicada e a suspensão da execução da pena de prisão que lhe for aplicada em medida não superior a 5 anos (art.º 50º/1 CP), com regime de prova, sendo que a simples censura do facto e ameaça da pena bastariam e bastarão para prevenir que não volte a delinquir face às necessidades de prevenção geral e especial. 49- Aliás, revela um juízo de prognose favorável relativamente ao possível cumprimento por este Arguido de uma pena de prisão suspensa na sua execução, a conclusão da avaliação feita pela Técnica que realizou o respectivo Relatório Social: “Assim, caso venha a ser condenado e lhe seja aplicada uma pena não privativa da liberdade, entende-se que o arguido deverá ser sujeito a acompanhamento externo, no sentido de o apoiar na consolidação de um projecto de vida mais consistente, com vista a promover um maior desenvolvimento das suas competências pessoais e sociais (com um enfoque centrado nos seus factores de risco- realidade aditiva e inactividade laboral).” 50- Nestes termos, atento o supra exposto nestas Conclusões de recurso, deve o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que: declare as nulidades do Acórdão (pelos vícios p. nos art.ºs 122º/1 (ex vi 355º/1CPP) e 379º/1, c) 2ª parte CPP), e a violação em que este incorreu das normas p. arts. 40º, 50º/1,71º/1,2/d),e) CP,355º/1,127º, 133º/1,a) CPP, 32º/2 CRP e do Princípio “in dubio pro reo”, e considere não provados quanto ao Recorrente os alegados factos acusatórios constantes dos Pontos I.B), E) e H) da matéria de facto dada por provada no Acórdão (supra transcrita na Motivação deste recurso), por manifesta insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto dada por provada e porque a prova produzida impõe decisão diversa da recorrida, absolvendo-se a final o Arguido A.- e, por conseguinte, julgando-se improcedente o pedido do M.P de perda alargada de bens relativamente ao ora Recorrente; 51- e caso assim não se entenda, mas sem conceder, se proceda à redução da pena aplicada a este Arguido, a qual deve ser fixada em medida nunca superior a 5 anos de prisão, devendo, em todo o caso e de qualquer modo, a pena ser suspensa na sua execução com regime de prova, o que satisfará de forma adequada e suficiente as exigências de prevenção geral e especial no caso, assim se permitindo a reinserção social do mesmo.
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1.4. - Notificado para o efeito, o MP junto do tribunal a quo apresentou as suas respostas, com a seguintes conclusões:
a) Resposta ao recurso interposto pelos arguidos E__________, D___________, M____________: 1. O acórdão impugnado não merece qualquer censura, pois que não enferma de omissões, nulidades ou vícios. 2. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada apontando-se, designadamente, o teor dos depoimentos prestados por cada testemunha e o grau de credibilidade dos depoimentos prestados na audiência de julgamento e que fundamentação está conforme com a prova produzida em sede de audiência. 3. Ora, o que se constata na motivação do recurso é que o recorrente ao invocar que a prova produzida impunha decisão diversa, fá-lo tão só porque a apreciação feita pelo tribunal difere daquela que ela própria formou, não aceitando que o tribunal a quo tivesse efectuado apreciação diversa. 4. É assim, em nosso entender, manifesta a falta de razão da recorrente quando pretende atacar a convicção do tribunal apenas porque difere daquela que ela própria formou. 5. A decisão recorrida mostra-se lógica, conforme às regras de experiência comum e é fruto de uma adequada apreciação da prova, segundo o princípio consagrado no artigo 127º do CPP, pelo que aderimos à exaustiva e criteriosa apreciação feita pelo tribunal, a qual deve ser mantida nos seus precisos termos. 6. A pena aplicada aos recorrentes mostra-se justa e adequada não merecendo qualquer censura.
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b) Resposta ao recurso interposto pelo arguido AR__________ -: 1. O acórdão impugnado não merece qualquer censura, pois que não enferma de omissões, nulidades ou vícios. 2. Inexiste qualquer erro na apreciação da prova ou insuficiência na decisão da matéria de facto provada. 3. Não se verifica qualquer violação do princípio de proibição da valoração da prova. 4. A decisão recorrida podia valorar, como o fez, o depoimento prestado pela testemunha C_________. 5. A pena aplicada ao recorrente mostra-se justa e adequada não merecendo qualquer censura.
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1.5. Nesta Relação, o senhor Procurador-Geral Adjunto apresentou o seu parecer, limitando-se a apor o seu “visto”.
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1.6. Considerando o teor do Parecer emitido pelo MP junto desta Relação entendeu-se que não ser suscetível de invocar o cumprimento do art.º 417º, nº 2 do CPP.
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1.7. Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.
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II – FUNDAMENTAÇÃO
2.1. O objeto dos recursos definem-se pelas conclusões que os recorrentes extraíram da motivação, de harmonia com o art.º 412.º, n.º 1, do CPP, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam as cominadas com nulidade do acórdão (art.º 379.º, n.º 1, do CPP) e os vícios da decisão e as nulidades que não se considerem sanadas (art.º 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP), designadamente conforme jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário Secção Criminal STJ n.º 7/95, de 19.10, publicado in D.R. I-A Série de 28.12.1995 e, ainda, entre outros, os acórdãos do STJ: de 25.06.1998, em BMJ n.º 478, pág. 242; de 03.02.1999, em BMJ n.º 484, pág. 271; e de 12.09.2007, no proc. n.º 07P2583, in www.dgsi.pt ; Simas Santos/Leal-Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, 3.ª edição, pág. 48; e Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1994, vol. III, págs. 320/321. In casu, as questões que os arguidos suscitam nas respetivas conclusões e que, portanto, importa decidir, são as seguintes, independentemente de o conhecimento de alguma delas ficar prejudicado pela decisão dada a outras que, logicamente, as precedam:
A) - da proibição de valoração de provas;
B) - da violação do princípio “in dubio pro reo” do arguido AR__________ -;
C) - da nulidade decorrente da falta de fundamentação e erro na apreciação da prova;
D) – do enquadramento jurídico;
E) - da redução da medida das penas.
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2.2. Os factos provados e não provados, e a motivação de facto do acórdão recorrido é a seguinte: Da acusação pública A. Os arguidos E____________ e seus progenitores - e arguidos - D________ e M____________ da -, mediante plano por eles traçado, pelo menos de outubro de 2016 a 13.12.2017, vêm vendendo droga a consumidores que os procuram. A venda de estupefacientes é feita, ora na casa do arguido E____________ sita na Rua ________, ora na casa dos arguidos D________ e M____________ sita na Rua da Praia, nº 15, Ribeira Grande. B. Pelo menos uma parte do produto estupefaciente vendido pelo arguido E____________, D________ e M____________ da - era fornecida pelo arguido A__________ em datas não concretamente apuradas naquele período. C. No dia 13.12.2017, o arguido E____________ detinha, na sua residência: - 1,56 gramas de heroína, correspondente ao peso líquido de 1,357gr e de 0,178gr; e - 830 euros em notas do BCE num bolso de um casaco que se encontrava do guarda-fatos; - três telemóveis, sendo um deles utilizado para os seus contactos de compra e venda de droga; - uma navalha e um cartão plástico com vestidos de estupefacientes. E os arguidos D________ e M____________ detinham, na sua residência: - 250 gramas de heroína, correspondente ao peso líquido de 15,455gr., de 22,073gr. e de 198,854gr.; - 1.490 euros em notas do BCE provenientes da venda de estupefacientes; - material plástico para acondiciona a heroína; - quatro embalagens de comprimidos subutex (cujo principio ativo é buprenorfina) e quatro recibos da compra desse produto em nome de TC. D. O arguido D________ adquiria a TC as receitas para a compra de comprimidos Dormicun e Subutex, sendo que posteriormente vendia os comprimidos a toxicodependentes que o procuravam. Tais compras ocorreram durante cerca de dois meses, entregando TC de vinte em vinte dias, receitas de comprimidos de subutex e de dormicum, tendo a última vez sido em dezembro de 2017. E. O arguido AR__________ não trabalha nem tem fonte de rendimento que lhe permita fazer face às despesas normais do dia-a-dia, nomeadamente, de alimentação, de vestuário e ordinárias da casa. O arguido AR__________, mediante acordo previamente gizado com o arguido AP______ e a sua falecida esposa, faziam o transporte para Lisboa, do dinheiro angariado pelo primeiro, produto da venda do produto estupefaciente. Por cada viagem efetuada, o arguido AP______ e a sua falecida esposa recebiam a quantia de 1.500,00 euros. Era o arguido AR__________ quem explicava onde o dinheiro devia ser entregue. No dia 14.12.2017, data da detenção do arguido AR__________, este tinha consigo o manuscrito do número do telemóvel na altura usado pelo arguido E____________. F. O arguido AP______ efetuou uma primeira viagem no final de 2016. Durante o ano de 2017 e até à presente data, alternadamente, o arguido AP______ e a sua falecida esposa realizaram viagens – aquele em número de seis – , sendo que esta tinha agendada e preparada uma viagem para o dia 23.02.2018, pelas 07:30h, que seria realizada por esta no voo Sata Azores, o que não veio a acontecer uma vez que foi detida no dia anterior, quando se preparava para levar a quantia de € 30.610,00 em notas do BCE. Antes desta, a última viagem ocorreu no dia 16.02.2018, no voo da Sata nº S40120, Ponta Delgada/Lisboa, feita pelo arguido AP______ e para transporte de semelhante quantia em dinheiro. O arguido AP______ conhecia a atividade de venda de droga a que o arguido AR__________ se dedica, e com este colaborou fazendo, sob as indicações e ordens do mesmo, o transporte do dinheiro, proveniente da venda da droga, para Lisboa. Assim, no dia 19.02.2018, pelas 15:00h., o arguido AR__________ dirigiu-se a casa do arguido AP______ - e da sua falecida esposa, onde permaneceu cerca de 15 minutos, o que repetiu no dia seguinte, pelas 13:30h., ali permanecendo cerca de 10 minutos. Nestas visitas, o arguido AR__________ levou o dinheiro que entregou aos arguidos AP________ e à sua falecida esposa, para que estes o transportassem para Lisboa, dinheiro este que veio a ser apreendido. G. No dia 22.02.2018, o arguido AP________ e a sua esposa detinham na sua residência: - €30.610,00 em notas do BCE (montante este supra referido em F.), acondicionados em três volumes devidamente embrulhados em plástico e fita cola, em notas de pequeno valor; - um telemóvel; - duas passagens aéreas com destino Ponta Delgada/ Lisboa, com a data de 23.02.2018, uma em nome da falecida esposa e outra em nome de RP______, filho desta e do arguido AP______ , €7.010,00 em notas do BCE guardadas num cofre; H. Os arguidos E____________, D________, M____________ e AR__________ conheciam as características e natureza das indicadas substâncias e sabiam que não lhes era permitida a sua detenção, venda ou cedência a outrem sem que para tal estivessem autorizados. O arguido AP______ sabia ainda que os sucessivos montantes em dinheiro que lhe eram confiado pelo arguido AR__________, destinado ao transporte para Lisboa, provinham da atividade de tráfico de produtos estupefacientes, e, não obstante, aceitou efetuar os transportes pelo ganho acima indicado. Todos os arguidos agiram de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei. II Da imputada reincidência O arguido E____________ foi condenado no âmbito do PCC nº 531/09.7PARGR, por acórdão transitado em julgado em 20.02.2012, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, p e p. pelo art.º 21º da LD, por factos praticados em 2010, na pena de 2 anos e 10 meses de prisão, tendo-lhe sido concedida a liberdade condicional em 04.10.2016, por período igual ao tempo de prisão que faltava cumprir, ou seja, até 16.12.2017. III. Do incidente de liquidação do valor a perder a favor do Estado (liquidação de património) O arguido AR__________ foi constituído arguido em 13.12.2017. No período compreendido entre 13.12.2012 e 13.12.2017 o arguido AR__________ auferiu, a título de rendimento declarado à Fazenda Nacional em sede de IRS, a quantia líquida de €5.823,65, referente aos anos de 2012 (€2.264,88), 2013 (€2.139,81) e 2014 (€1.418,96). Naquele período, foram depositados na conta bancária do arguido AR__________ (excluindo créditos provenientes da Segurança Social no valor de €3.747,51), em numerário, o montante global de €14.500,00. IV. Mais se provou, das condições pessoais do arguido E____________ e a sua situação económica e das condutas anteriores aos factos O arguido E____________ é o quarto filho de uma fratria de seis elementos e provém de um agregado familiar com recursos socioculturais modestos. Abandonou os estudos após concluir o 6º ano por desmotivação com os conteúdos escolares e com a vontade de iniciar a sua vida profissional. Começou a trabalhar com o progenitor e, aos 16 anos, iniciou, de forma autónoma, atividade como pintor/bate-chapas numa oficina de mecânica. Desde então tem vindo a desenvolver atividades profissionais – embora de forma precária –, principalmente, nas áreas de mecânica, de construção civil e de eletricidade. O arguido tem dois filhos, com 11 e 7 anos de idade, respetivamente, fruto de duas relações afetivas, mantendo uma relação cordial com as mães das crianças. Não contribui com alimentos para aqueles. Reside desde 2014 com uma companheira, laboralmente ativa, e com a enteada. Cedo iniciou o consumo de heroína, estando sujeito a tratamento na ARRISCA (Associação Regional de Reabilitação e Integração Sócio Cultural dos Açores), integrado no programa com opiáceos de substituição - cloridrato de metadona, desde 2016. Apresenta juízo crítico relativamente ao crime de tráfico de estupefacientes. O arguido E____________ foi condenado pelas seguintes decisões transitadas em julgado: (i) acórdão de 19.05.2008, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes em 06.02.2007, um crime de recetação em fevereiro de 2007 e um crime de condução sem habilitação legal em 06.02.2007, na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período e pena de multa; (ii) sentença de 01.10.2009, pela prática de um crime de ameaça agravada em 23.09.2009, em pena de multa; (iii) sentença de 21.01.2010, pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples em 08.12.2007, em pena de 2 anos e 6 meses de prisão; (iv) sentença de 25.05.2010, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de desobediência qualificada, ambos em 30.04.2010, em pena única de multa; (v) sentença de 02.12.2010, pela prática de um crime de ameaça agravada, de um crime de resistência e coação sobre funcionário e de um crime de injúria agravada, todos em 29.03.2010, em pena única de multa; e (vi) acórdão de 29.09.2011, supra referido no grupo II. V. Mais se provou, das condições pessoais da arguida M____________ e a sua situação económica e das condutas anteriores aos factos A arguida M____________ é oriunda de um núcleo familiar numeroso, sendo a mais nova de uma fratria de seis elementos. Não beneficiou de um 500 de contexto familiar que lhe facilitasse um processo desenvolvimental ajustado, nomeadamente em termos de aquisição de competências pessoais e sociais, decorrente do falecimento prematuro do progenitor e de carência económica. Desta forma, o percurso escolar da arguida, iniciado em idade própria, foi precocemente interrompido por um elevado absentismo, tendo apenas concluído o 3º ano. A sua atividade ocupacional sempre se restringiu a trabalhos de limpezas em casa de particulares e a fabricar produtos caseiros (doçarias, pão e licores), sem qualquer vínculo laboral, obtendo rendimentos mensais na ordem dos €550,00. Contraiu matrimónio aos 18 anos. É mãe de seis filhos, incluindo o arguido E____________, com quem mantém contactos regulares. A relação conjugal é estável e gratificante em termos emocionais. O cônjuge aufere uma reforma mensal no valor de €560,00. Apresenta problemas de saúde de obesidade, hipertensão e distúrbio ansioso. Nada consta averbado no seu certificado do registo criminal. VI. Mais se provou, das condições pessoais do arguido D________ e a sua situação económica e das condutas anteriores aos factos O arguido D________ é o terceiro filho de uma fratria de quatro elementos, provindo de agregado familiar com recursos socioculturais modestos. Iniciou o percurso escolar em idade própria, no entanto, apenas concluiu o 3º ano de escolaridade, uma vez que, precocemente, com oito anos, começou a distribuir, pelas mercearias da zona de residência, o pão confecionado pela progenitora colaborando na economia doméstica. Iniciou o seu percurso laboral por volta dos catorze anos de idade no setor da construção civil, como pedreiro, área na qual trabalhou ao longo de toda a sua vida até há cerca de onze anos, por motivos de saúde, culimando na sua reforma por invalidez. Apresenta problemas de saúde de lipoma cervical circunfecencial, lipomas torácicos, doença hepática crónica de etiologia alcoólica, com sinais de hipertensão portal, status pós fratura do fémur com encavilhamento, espessamento do ângulo hepático do cólon, litíase vascular e obesidade. No início da idade adulta contraiu matrimónio com a arguida M____________, sendo pai de seis filhos, de entre os quais o arguido E____________. A gestão económica familiar é assegurada através da sua pensão de invalidez e complementos sociais, no valor de €560,00, ao que acresce o rendimento que a esposa obtém através da confeção e venda de produtos alimentares, na ordem dos €550,00. Revela algum sentido critico relativamente aos presentes autos. Na comunidade é referenciado pelas suas fracas competências ao nível do relacionamento interpessoal. Nada consta do seu certificado do registo criminal. VII. Mais se provou, das condições pessoais do arguido AR__________ e a sua situação económica e das condutas anteriores aos factos O arguido AR__________ provém de uma família numerosa e modesta. O início do seu percurso pessoal teve lugar na Ilha de São Nicolau, em Cabo Verde, de onde é natural. O processo educativo do arguido foi marcado pela ausência da figura paterna (emigrou para a Holanda à conquista de melhor rendimento), tendo a progenitora assumido uma postura demasiado permissiva, condicionante d o desenvolvimento daquele. realizou um percurso escolar até ao 4º ano de escolaridade, tendo abandonado os estudos aos 14 anos de idade, ocasião em que emigrou para a Holanda onde trabalhou com o progenitor e onde permaneceu até aos 31 anos de idade, acabando por regressar à sua terra natal. É pai de quatro filhos, fruto de relações pouco duradouras em Cabo Verde, e nunca assumiu as suas responsabilidades parentais, deixando transparecer alguma apatia afetiva em ralação aos mesmos. Em 2001, com 33 anos de idade saiu definitivamente do seu País de origem, tendo vindo a laborar com contratos de trabalhos na área da construção civil em algumas das Ilhas dos Açores, nomeadamente no Faial, Terceira, Flores e por fim São Miguel, onde veio a radicar-se em 2010. Encontra-se em situação de desemprego. Vive sozinho. Consome bebidas alcoólicas em excesso, assumindo a sua adição e reconhecendo a necessidade de intervenção a esse nível. Tende a perspetivar a realidade que o rodeia de forma tendencialmente egocêntrica, manifestando dificuldade em integrar, no seu discurso e nas suas ações, os sentimentos, opiniões e interesses de terceiros. Nada consta averbado no seu certificado do registo criminal. VIII. Mais se provou, das condições pessoais do arguido AP______ e a sua situação económica e das condutas anteriores aos factos O arguido AP______ o mais velho de uma fratria de cinco elementos e provém de um agregado familiar de baixa condição socioeconómica. Iniciou as atividades escolares em idade normal, tendo apenas completado o 4º ano de escolaridade. Após o abandono dos estudos iniciou a atividade laboral como lavrador, tendo posteriormente trabalhado numa fábrica e na construção civil como servente de pedreiro. Atualmente trabalha em part-time como vendedor ambulante, auferindo rendimentos variáveis. Contraiu casamento por volta dos 19 anos de idade e dessa relação conjugal nasceram sete filhos, cinco dos quais com idades compreendidas entre os doze e os vinte e um anos de idade, ainda vivem consigo. A esposa faleceu na pendência dos autos, estando o arguido emocionalmente fragilizado. Reside em habitação social, cuja renda ascende a €20,00/ mês. Aufere o rendimento social de inserção no valor mensal de €150,95. Reconhece a ilicitude e a gravidade dos factos pelos quais vem acusado, embora demonstra dificuldade em identificar a existência do dano para terceiros. Nada consta averbado no seu certificado do registo criminal. * Não resultou provado: Relativamente à matéria elencada em A., que: a) o arguido AR__________ também traçou idêntico plano com os arguidos E____________, D________ e M____________ -. b) o período temporal de venda de droga iniciou-se antes de outubro de 2016 e perdurou até à data da dedução da acusação. Relativamente à matéria elencada em C., que: c) os outros dois telemóveis apreendidos ao arguido E____________ também eram utilizados pelo mesmo para os seus contactos de compra e venda de droga. Relativamente à matéria elencada em D., que: d) A arguida M____________ também adquiria a TC as receitas para a compra de comprimidos Dormicun e Subutex, sendo que posteriormente também vendia os comprimidos a toxicodependentes que a procuravam (sem prejuízo da prova do referido em A.). e) as compras duraram cerca de dois anos. Relativamente à matéria elencada em E., que: f) O arguido AP______ e a sua falecida esposa transportavam produto estupefaciente, por vezes, para esta Ilha de S. Miguel, mediante explicação do arguido AR__________. g) a quantia recebida por cada viagem era de 2.000,00 euros. h) Numa das viagens, feita já em janeiro de 2018, a falecida esposa, no regresso a Ponta Delgada, aceitou transportar heroína de Lisboa para a ilha de São Miguel com destino ao arguido AR__________. Relativamente à matéria elencada em H., que: i) Os arguidos AR__________ e AP______ - sabiam que entrega do dinheiro proveniente da venda da droga, a qualquer título, a outra pessoa, dissimulavam assim a verdadeira origem do dinheiro, facto que não lhes era legalmente permitido. * Com interesse para a decisão da causa não resultaram provados ou não provados quaisquer outros factos. * Dos motivos de facto que fundamentam a decisão (§1. a §6.) §1.1. O libelo acusatório debruça-se sobre dois grupos de factos: um primeiro grupo relativo à traficância, em conjunto e em comunhão de esforços e intentos, entre os arguidos E____________, M____________ e D________, por um lado, e AR__________, por outro lado; e um segundo grupo referente à conduta dos arguidos AR__________ e AP______ (envolvendo outrossim a falecida esposa deste e cuja responsabilidade penal foi declarada extinta, precisamente, por força do óbito na pendência dos autos). §1.2. A leitura conjunta dos grupos – na parte em que resultou demonstrada – permite aferir da globalidade das condutas desenvolvidas pelos arguidos, permitindo explicar, outrossim, a posição privilegiada do arguido AR__________ como sendo alguém que vendia/ fornecia o produto (aos arguidos E___________, D________ e M____________), recebia avultadas somas de dinheiro e cuidava de o fazer chegar a terceiros (através da colaboração do arguido AP______), dele destinatários (sem embargo da “fatia” que lhe coubesse). §1.3. Mas, por melhor facilidade de raciocínio, debrucemo-nos, numa primeira fase separadamente, sobre cada um dos grupos factuais. §2.1. Quanto ao primeiro grupo de factos, os arguidos E____________, M____________ e D________, embora procurando sempre minimizar a intervenção de cada qual no que podemos apelidar de “empreitada familiar de traficância” (mormente a motivação, a dimensão das vendas e o concreto conhecimento do volume quantitativo da droga apreendida), acabaram por reconhecer os imputados factos nucleares nos moldes descritos e demonstrados em A. e C. §2.2. Concretizando, o arguido D________ referiu que era ele quem controlava o negócio familiar, desde o momento inicial em que decidiu “investir” as suas poupanças (cerca de €400,00) até à data da realização da busca domiciliária (13.12.2017). Aprendeu a preparar a heroína que adquiria, sempre de pouca monta, com o seu filho E_________ (entretanto saído do Estabelecimento Prisional) que, outrossim, levava uma pequena parte para transacionar (após o que lhe entregava o preço). E também ele, arguido D________, vendera parte da droga, incluindo os parcos comprimidos de dormicum que recebia de TC a troco do depósito dos demais, e destinara o dinheiro como lhe aprouvera (ponto D.). §2.3. A arguida M____________, num discurso assaz confuso e defensivo (designadamente quanto a datas, grau de envolvimento dos demais, concreto conhecimento do volume do negócio, etc.), também acabou por reconhecer o (seu) apurado envolvimento na dita “empreitada familiar da traficância”. §2.4. O arguido E________ contextualizou a sua intervenção no negócio dos seus progenitores já instalado quando saiu do Estabelecimento Prisional e, uma vez regressado ao agregado de origem, voltou (mais uma vez…) a recair nos consumos de heroína. Justificou a sua intervenção apenas com o fito de adquirir droga para o seu consumo através do lucro das vendas (sendo o seu pai o fornecedor, note-se). §2.5. A atividade conjunta da família P______ mostra-se também sustentada no teor do auto de busca e apreensão à residência do arguido E____________ a fls. 92-94 e reportagem fotográfica a fls. 99-102, do auto de busca e apreensão à residência dos arguidos M____________ e D________ a fls. 107-109 e reportagem fotográfica a fls. 118, 120 e 122-123, dos documentos a fls. 119 (recibos das compras dos comprimidos dormicum em nome de TC) e a fls. 121 (listagens de vendas a “clientela”), do teor do relatório pericial a fls. 658-658v. (exame toxicológico realizado pelo Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária) – que permitiu, outrossim, concretizar na factualidade assente o peso líquido das substâncias – e das declarações das testemunhas RP (prestadas em sede de inquérito e lidas em audiência – fls. 74-75, LF e KB, todos consumidores de substâncias estupefacientes. §2.6. Sem prejuízo, e conforme acima aludimos, estes três arguidos procuraram “aligeirar” a atividade, com notória parcialidade e protectividade de uns relativamente aos demais, quer na motivação, quer no volume dos lucros, quer o período da atividade e inerente grau, atribuindo à “nora”/ “cunhada” C______ (ou melhor, “sacudindo”), companheira do irmão do arguido E__________/ filho dos arguidos M___________ e D________, a esmagadora “fatia” da responsabilidade: na ótica dos três arguidos, terá sido esta: (i) quem teve a iniciativa (terá sugerido ao arguido D________ a traficância apenas por uns meses de forma a este poupar o suficiente para a realização de obras de conservação na casa); (ii) quem arranjou, de forma exclusiva e secreta, o fornecedor (todos eles referiram, pois, que desconhecem a identidade deste); (iii) quem preparava a maior parte da heroína (“corte” e doseamento); (iv) quem ficava com uma “fatia” significativa do produto das vendas; (v) e quem, nos tempos antecedentes à busca, “tomou” o lugar do arguido D________ no negócio (pois este fora operado e estivera em convalescença), tendo inclusivamente investido a quantia de dinheiro que entendeu (concretamente por eles três desconhecida) na aquisição da tamanha quantidade da droga apreendida, muito maior do que o volume corrente dos fornecimentos anteriores e, por isso, desalinhada daquilo que era a “normalidade” da atividade... Em suma, tudo debalde ensaiaram para nos convencer de que C______ não era uma mera peça da engrenagem, mas sim parte do motor! e não só responsável pelo “desencaminhamento” dos arguidos D________ e M____________(a ardil “mentora”), como também decisora da aquisição da grande monta de heroína que veio a ser apreendida (portanto, em quantidade única, por que excecionalíssima, no contexto daquele negócio familiar). §2.7. Sucede, porém, que esta tese não teve a mínima sustentação na prova produzida, inclusivamente nas declarações da própria C______, na veste de testemunha (indeferido que foi o requerimento apresentados por estes arguidos em sede de audiência de julgamento no sentido de lhe ser feita a advertência do alegado direito de recusar o depoimento…). Esta testemunha, confrontada com o dever de prestar o seu depoimento com verdade, e após ter logrado ultrapassar a barreira inicial do distanciamento do assunto (isto é, como infrutiferamente de início procurou convencer), acabou por “desabafar”, de forma perfeitamente objetiva, séria, clara e natural, descrevendo um quadro de intensa atividade de traficância por parte daqueles três (ao qual era totalmente alheia), com conhecimento direto dos factos (a sua razão de ciência decorre do que presenciava em casa dos arguidos M___________ e D________, progenitores do seu companheiro que se encontrava recluso, local onde passava grande parte do dia porquanto aqueles providenciavam pela alimentação e pelo abrigo dos seus dois filhos). E, neste contexto, também acabou por confirmar, sem margem para quaisquer dúvidas, as deslocações do arguido AR__________ a casa daqueles, incluindo a ida no dia da busca domiciliária (antes da realização da busca), a pretexto de visita ao arguido D________ (combalido que estaria na sequência da chegada a casa, na véspera, do Hospital do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada, E.P.E., após a intervenção a que fora sujeito). §2.8. Estas “visitas” do arguido AR__________ “deitam por terra” o cenário procurado pelos arguidos E____________, M___________ e D________ de que jamais se relacionaram com o aquele (os dois últimos referiram que somente sabem quem ele é de festas populares e que travaram conhecimento – ele e o arguido D________ – há cerca de uma década, por ocasião de uma empreitada). Aliás, aquele primeiro (arguido E____________) referiu quer nas declarações prestadas em fase de inquérito (ouvidas na última sessão da audiência de julgamento), quer na própria audiência, que não conhecia o arguido AR__________… §2.9. Esta atitude de pretenso afastamento entre a família P______ e a pessoa do arguido AR__________, sustentado por aqueles com audácia e obstinação, é facílima de entender em função do segundo grupo de factos imputados ao segundo na acusação, na parte em que resultaram assentes, pois “embrulham-no” em poder de avultadas quantidades de dinheiro, o que se mostra consentâneo com a traficância em considerável escala, precisamente compatível com os 250 gramas de heroína apreendidos na residência daqueles arguidos M__________ e D________. Ou seja, no plano da lógica, a ligação da família P______ à pessoa arguido AR__________ (enquanto fornecedor), “costura” a quantidade de droga apreendida àqueles, por um lado, com as avultadas somas de dinheiro afetas a este, por outro lado. Portanto, na ótica da defesa, o relacionamento entre eles tratar-se-ia de um cenário a afastar (tendo por efeito imediato não o atrair para o “negócio”), o que, como vimos, não mereceu o nosso acolhimento. §2.10. Ademais, neste particular, o depoimento da testemunha C______ é ainda consentâneo com as declarações prestadas na fase de inquérito pelo próprio arguido AR__________ (igualmente ouvidas na última sessão da audiência de julgamento) de que se relacionava com o arguido E____________ mais ou menos desde há “um ano e pouco” (por exemplo, em discotecas), de que o número manuscrito no pedaço de papel por debaixo de “E________” a fls. 137 (apreendido àquele arguido AR__________ – cfr. auto de busca e apreensão a fls. 133-135 e imagem a fls. 149) correspondia ao número telefónico deste (arguido E____________) e de que na véspera do interrogatório fora a casa dos arguidos M___________ e D________, onde estava este último e a “preta” (expressão utilizada pelo arguido AR__________ para identificar a “cunhada” do arguido E__________, ou seja, a testemunha C______). §2.11. O relacionamento do arguido AR__________ àquela família é explicável não só na exiguidade do “mundo das drogas” neste meio insular, mas também pela circunstância de ter sido namorado da progenitora da testemunha C______ (esta testemunha identificou-o como tendo sido “uma espécie de padrasto”), e em tempos residente por seu turno no r/c do prédio onde vive o arguido AR______ -, conforme infra melhor explicaremos (sublinhamos que a dita progenitora da testemunha C______, MT____________, foi arrolada como testemunha pelo arguido AR__________ e procurou colocar-se à margem de qualquer relacionamento amoroso, ainda que passado, com este… e de tal forma veio “centrada” nas declarações que prestou acerca daquele, que, inexplicavelmente, referiu “aos costumes” que não conhecia os arguidos E____________, D________ e M____________, falha que só corrigiu quando foi concretamente questionada sobre se eles não seriam o tio e os avós das suas netas…). Bem vistas as coisas, os “elos” são próximos: os arguidos E____________, M____________ e D________ são, correspondentemente, tio e avós das netas da dita ex-namorada do arguido AR__________. §2.12. Mais: questionada sobre o conhecimento acerca de concretos negócios de droga entre o arguido AR__________ e a família P______, a referida testemunha C______ – para além daquilo que poderia resultar na sua autoincriminação – referiu-se, cristalinamente, a um acordo entre aquele e o arguido E____________ no sentido de entrega de droga pelo primeiro a este, factos este de que teve conhecimento direto e presencial pelo que um e outro lhe disseram. §2.13. Assim, e em suma, as declarações dos arguidos E__________, M____________ e D________, desassociadas de outros elementos probatórios, não mereceram acolhimento no sentido de afastar as regras de experiência comum quanto à proveniência da totalidade do dinheiro, quanto à posse da totalidade da droga e quanto ao destino que teria caso não houvesse sido apreendida (somente concedemos o que resulta não provado nas alíneas b), c) e e), por falta de corroboração de outro meio de prova consistente). A versão factual apresentada pelos mesmos não passa de uma mera versão própria dos factos, não contendo a virtualidade, atento o supra explanado, de impor decisão diversa. §2.14. Clarificamos ainda neste domínio que também não mereceu acolhimento a tese defendida de que a maioria dos comprimidos de durmicum estavam “depositados” na residência, a par dos recibos de compra, embora na disponibilidade de TC (que vivia na condição de “sem abrigo”), a troco de uma contrapartida de dois ou três comprimidos que o arguido D________ comercializava (como este reconheceu). Basta atentar no depoimento daquele na veste de testemunha (insolente, arrogante, desafiador, malcriado e irreverente), na parte em que referiu que era o arguido D________ quem lhe dava o dinheiro para adquirir as caixas (€ 30,00 cada par de caixas, sendo que a testemunha obtinha receitas médicas para adquirir as caixas de vinte em vinte dias)… ou seja, se este arguido financiava € 30,00 para a aquisição de um par de caixas e “meritoriamente” recebia, a troco dessa mesma aquisição, dois ou três comprimidos, como se explica o prejuízo decorrente da venda de cada comprimido por € 1,50 (preço de mercado comumente praticado na comunidade e confirmado pela testemunha Luís Ferreira)? Não temos dúvidas, pois, de que aquele arguido era o dono dos comprimidos, cuja “gestão”, pois, lhe cabia (igual prova não foi produzida quanto à arguida M____________ – cfr. a alínea d) dos factos não provados). §2.15. Ainda a este propósito, é certo que o depoimento da cit. testemunha C______, desacompanhado de outra prova consistente, é inidóneo à prova de que também o arguido AR__________ tinha qualquer participação no acordo “interno” da família P______ de venda de estupefacientes a terceiros e que estaria, com estes, em igualdade de posição (alínea a) da factualidade não provada). Mas a correlação deste arguido com a entrega de drogas permite contextualizar a factualidade apurada quanto ao segundo grupo de factos, conforme adiante melhor explicaremos. Recuperamos aqui a menção já explicada “visita” do arguido AR__________ à residência dos arguidos M____________ e D________, antes da realização da busca domiciliária, não colhendo a versão deste (no âmbito das declarações prestadas em sede de inquérito) de que, acabado de chegar de Lisboa, foi lá levar… um telemóvel! §3.1. Quanto ao segundo grupo de factos, atendemos desde logo às declarações confessórias, providas de substância, prestadas pelo arguido AP______, num itinerário discursivo lógico, mormente relativas (i) às viagens ao continente português, correspondente propósito, periodicidade, número de transportes de dinheiro, período temporal e modo de entrega aos destinatários, (ii) à contraprestação que cada um dos membros do casal obtinha pelo serviço de transporte – lucro e adiantamento para despesas (precisando-se que era €1.500,00 e não €2.000,00 – cfr. alínea g) da factualidade não provada) –, (iii) à proveniência do dinheiro apreendido [quer os €30.610,00 que se destinavam a ser transportados no dia 23.02.2018 e entregues no continente português ao destinatário (cfr. reportagem fotográfica a fls. 415-419) – em montante idêntico ao dos transportes anteriores, conforme também salientou – quer os € 7.010,00 que estavam no cofre e correspondiam ao lucro obtido pelos transportes anteriores], tudo, de resto, coerentemente com o teor do auto de busca e apreensão na residência daquele a fls. 397-401 e correspondentes documentos (apreendidos) a fls. 403 (talões de embarque da viajem projetada para o dia 23.02.2018), 406-413 e 450-451 (comprovativos de viagens/ estadias realizadas em datas anteriores). §3.2. O arguido AP______ explicou ainda, com algum detalhe, os contornos da primeira abordagem/ aliciamento por parte do arguido AR__________ sobre o temário (à data eram vizinhos), conhecedor (este) da pobreza do agregado familiar daquele. O aliciamento deu-se, pois, numa conversa tida entre os dois, tendo nesta sequência o arguido AP______ efetuado o primeiro transporte de dinheiro, cedendo à “tentação” da promessa de recebimento da contrapartida. E embora este arguido tenha referido que, daí por diante, a sua esposa passou, no seio conjugal, a liderar o “esquema”, certo é que a testemunha Filipe Correia, Agente principal da PSP, visualizou encontros entre aqueles dois arguidos, quando já não eram vizinhos, conforme relatou e mostra-se consignado nos autos de vigilância a fls. fls. 364-366 e 367-369. §3.3. Ademais, o arguido AP______ confirmou que suspeitava que o dinheiro vinha da traficância e destinava-se a financiar a droga (estando ciente da sua contribuição para o tráfico), o que, de resto, se mostra alinhado com regras de experiência comum. §3.4. Neste contexto, as declarações do arguido AP______, enquanto coarguido, concernentes à conduta do arguido AR__________, afiguraram-se-nos absolutamente credíveis2, inexistindo qualquer dúvida de que era este quem comandava o transporte do dinheiro. Esta “peça do puzzle” encaixa na perfeição com aqueloutra, já descrita, relativa à venda/ fornecimento de estupefaciente por banda do mesmo, atividade esta que, embora com outros destinatários, se terá prolongado até fevereiro de 2018 enquanto fator justificativo dos milhares de euros apreendidos. 2 Notamos que o arguido AP________ respondeu a todas as questões que lhe foram perguntadas neste domínio – cfr. art.º 345º nº 4 do Código de Processo Penal (CPP). §3.5. Nenhuma prova foi produzida, contudo, no sentido de que o casal P______ também efetuava transportes de droga do continente português para esta Ilha de S. Miguel (notamos que não é legítimo presumir este facto apenas com referência à contraprestação pelo serviço – que o arguido AP______ circunscreveu ao transporte de dinheiro – de €1.500,00), designadamente segundo instruções e por conta do arguido AR__________ (cfr. alíneas f) e h) da factualidade não provada). §3.6. A falta de prova da matéria constante da alínea i) da factualidade assente prende-se com a ausência de descrição fáctica de atos de onde se pudesse retirar a aludida “dissimulação” da origem do dinheiro. Isto é, o mero transporte e entrega a terceiros de dinheiro proveniente de droga, para além de fazer parte do negócio (uma venda de droga implica, por natureza, o acordo de entrega do preço), não traduz em si mesmo qualquer ato dissimulatório (ao contrário, por exemplo, de investir em negócios lícitos, de aplicar em produtos financeiros, etc.). Em suma, não é naturalmente lógico, pois, agir com a imputada intenção “dissimuladora” quando não há factos suscetíveis de determinar essa mesma “dissimulação”. §4. Por fim (no que respeita ao libelo acusatório), quanto ao ponto H., a prova dos factos de índole subjetivo resulta, naturalmente, para além das declarações dos arguidos E____________, M____________, D________ e AP______ -, de regras de experiência comum e juízos de normalidade, tendo ainda presente, por inferência, a remanescente matéria assente. §5. Relativamente ao grupo III., atendemos ao teor da documentação fiscal e bancária constante dos apensos “A” e “F”. Considerámos também que o arguido AR__________ não logrou demonstrar, como lhe cabia, a proveniência (lícita) dos rendimentos em questão (cfr. art.ºs 7º nº 1 e 9º nºs 1, 2, 3 e 5 da Lei nº 5/2002, de 11 de janeiro), porquanto: o depoimento da testemunha que arrolou Ana Margarida de Sousa Cabral foi deveras parcial, referindo-se a rendimentos obtidos por aquele ao longo de anos sem qualquer comprovação em prova documental, incluindo a suposta indemnização obtida por via do Tribunal do Trabalho (e não cremos que fosse difícil ao arguido reunir esta documentação), tendo a testemunha situado a sua relação (com o arguido) no mero plano da amizade quando aquele, em declarações prestadas anteriormente em sede de inquérito, referiu-se à mesma como sendo, afinal de contas, a sua namorada… E parcial foi também o depoimento da cit. testemunha MT____________, sendo certo que a sua razão de ciência quanto aos supostos rendimentos afigurou-se-nos bastante débil. §6. Por último, quanto aos grupos II. e IV. a VIII (condições pessoais dos arguidos e a sua situação económica, bem como as condutas anteriores e posteriores aos factos), atendemos ao teor dos relatórios sociais elaborados pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais a fls. 838-839v., 841-842., 844-845v., 853-854v. e 866-867v., dos certificados do registo criminal atualizados a fls. 835, 836, 837, 856 e 857-864, e, especificamente quanto aos arguidos D________ e M___________, também quanto ao teor dos documentos a fls. 869B e 869Bv. (documentação clínica).
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2.3. Da proibição de valoração de provas.
a) No que concerne ao recurso interposto pelos arguidos E__________, M____________ e D___________ alegam os recorrentes: Em sede de audiência de discussão e julgamento foi ouvida na qualidade de testemunha C______ _cujo depoimento se encontra gravado no suporte áudio 20190618154503_12135524_2890453.wma. Deste depoimento temos que a aludida testemunha residiu durante sete anos com os recorrentes, incluindo o período a que se reporta a decisão condenatória, foi companheira e dele tem uma filha dum outro filho e irmão dos recorrentes e, inclusive, aos costumes se identificou como nora, tudo conforme melhor se poderá ver da transcrição infra: [00:01:05] Mandatário: O nome completo da senhora é…? [00:01:07] C_________: C______. [00:01:09] Juiz Presidente: A senhora reside onde? [00:01:12] C_________: Rua do Saco, na Ribeira Seca. [00:01:15] Juiz Presidente: É a morada que aí tem? Número…? [00:01:17] C_________: 48 A. [00:01:19] Juiz Presidente: Já foi dito aqui que a senhora que seria a nora do Sr. D________ e da Sra. M___________ e cunhada do E____________. A senhora chegou a casar com o filho deles ou não? [00:01:29] C_________: Não, estive junta 7 anos. [00:01:31] Juiz Presidente: Esteve junta. Portanto, não chegou a contrair casamento. A senhora na qualidade de testemunha que aqui está tem que responder a tudo o que lhe vai ser perguntado e tem que responder com verdade… ... [00:05:18] Procuradora: A senhora onde é que vivia? A senhora tem… vivia em que casa? Onde é que vivia? [00:05:23] C_________: Convivi durante uns anos em casa da minha sogra M____________. .... [00:05:46] C_________: Sim. [00:05:46] Procuradora: O seu companheiro era filho desta senhora. [00:05:48] C_________: Filho daquela senhora. Era, sim senhor. .... Em face desta ligação peticionou a defesa que fosse facultada à testemunha a faculdade de, querendo, não prestar declarações por ligada familiarmente aos recorrentes. É o que consta do requerimento gravado no ficheiro áudio supra identificado e que se reproduz a preceito: “[00:02:45] Mandatário: Então, eu quero que seja por… entendo que por… por referência ao n.º 1 alínea a) do artigo 134.º n.º 1 alínea a) deverá entender-se que a testemunha é… beneficia da possibilidade de, querendo, não prestar declarações.” Sublinha-se que neste particular a Digna Procuradora da República aderiu a esta tese conforme transcrição que se segue: “[00:03:20] Procuradora: Pese embora o artigo 134.º refira… não tenha em consideração este vínculo análogo, mas a verdade é que a própria lei reconhece as condições da união de facto, e verificando‐se uma situação de vivência em união de facto, eu entendo que a testemunha deve beneficiar desta prorrogativa.” Acontece que o tribunal recorrido indeferiu o peticionado admitindo, consequentemente, o depoimento de C_______ alegando para o efeito que e a saber: “[00:03:43] Juiz Presidente: Da prorrogativa. Muito bem. O Tribunal indefere o requerido, pese embora a posição do Ministério Público. A lei é taxativa no que diz respeito a quem beneficia deste direito. O n.º 2 contém uma norma… o n.º 2... a alínea b) contém uma norma relativamente a pessoas que convivem em situações análogas à dos cônjuges. No n.º 1 nós estamos… no n.º 1, alínea a) estamos apenas e tão-‐só no domínio das relações de parentesco ou de afinidade. É certo que o legislador quase que confunde o estado de união de facto com o casamento, quer nos direitos, quer nos deveres, mas para todos os efeitos ainda há regras e essas regras são no sentido que quem se casa, acarreta alguns direitos e acarreta alguns deveres, quem não se casa ainda não tem todos os direitos que as pessoas que contraíram casamento. Este número… este 134.º é precisamente o escopo do legislador foi precisamente em termos de numerus clausus de definir as pessoas por causa desta ligação. Ou seja, é a própria ligação de parentesco ou de afinidade em si mesma que está subjacente a este direto e, nessa medida, indefere-‐se o requerido pela defesa. Senhora procuradora, faça favor tem V. Exa. a instância. “ Ora, sempre com o devido respeito e melhor opinião, a interpretação do tribunal recorrido neste particular, para além manifestamente redutora do espírito que preside ao artigo 134º do C. Penal é inconstitucional: O que pretendeu o legislador com o artigo 134º do C. Penal e o elenco das pessoas a quem foi atribuído a faculdade de recusar o depoimento foi proteger o relacionamento familiar ou análogo sendo um direito subjectivo com características potestativas, (cfr, comentário judiciário do C. P. Penal Tomo II anotação ao artigo 134º, pg.s 119 a 141 -‐ António Gama -‐ Luís Lemos Triunfante nesta parte plagiado). Esta noção de relacionamento familiar, necessariamente, tem que ser interpretada à luz das realidades vigentes, ou seja, englobando todos os relacionamentos que não passam apenas pelo modelo tradicional do casamento, mas, antes sim, pela união de facto, Realidade não atendida pelo tribunal recorrido que literalmente interpretou o artigo 134º do C. P. Penal no sentido de, apenas, por ele serem abrangidas as pessoas ligadas pelo laço do casamento. Melhor escrevendo: fosse a testemunha C_______ casada com o irmão e filho dos recorrentes encontrava‐se abrangida pela faculdade de não prestar declarações por ser enquadrada como afim em segundo grau (artigo 134º, n.º 1 alínea a) do C. Penal). Todavia, como não casou ainda que tenha vivido em condições análogas às dos cônjuges com o irmão e filho dos arguidos não é abrangida pese embora o seu relacionamento com esse irmão e filho dos recorrentes (de quem teve uma filha recorda‐se) em nada ter sido diferente do que seria caso fosse casada. E, não obstante, os interesses que a mesma pretendia proteger fossem iguais num e noutro caso. Significa isto escrever, salvo melhor opinião, que para o tribunal recorrido ‐ e este aceita expressamente ‐ existe um “numerus clausus” de pessoas que gozam do benefício de não prestarem declarações em audiência de julgamento para protegerem o relacionamento familiar mas este “numerus clausus” encontra-se dependente de uma condição previa que é o ... Casamento. Ou seja, terminando, para o tribunal recorrido os parentes e afins (até ao segundo grau) e a noção de equiparação da união de facto ao casamento apenas existe com referencia à alínea b) do artigo 134º já que, qualquer pessoa que conviva e tenha filhos, com os familiares directos e próximos dos arguidos - e putativamente abrangidos pelo disposto na alínea a) n.º 1 do artigo 134º ‐ não podem e não devem proteger o agregado familiar porque não são casados. Advoga‐se por isso, dever entender‐se materialmente inconstitucional o artigo 134º, n.º 1, alínea a) do C. P. Penal na interpretação adiantada pelo tribunal recorrido por violação do disposto nos artigos 13º, n.º 1, 25º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa. E, Concomitantemente, por remissão para essa inconstitucionalidade e para o disposto no art.º 134º, n.º 2 do C. P. Penal ser declarado nulo o depoimento da testemunha C_______ depoimento, aliás, entendido como crucial na decisão recorrida (cfr. §2.11, §2.12, §2.15 e muito em particular os §2.6 e §2.7), nulidade que expressamente se peticiona.
Cotejando os autos, mormente as audições relativas à testemunha C_________, requerimentos e despacho judicial a esta respeitante, confirma-se o teor do alegado na motivação no que concerne ao enquadramento fáctico acima referido.
Vejamos:
Em primeiro lugar, importa referir que a questão suscitada tem enquadramento legal para ser apreciada em sede de recurso de decisão final, como aqui sucede (cfr. artigo 118º, nº 3 do Código de Processo Penal).
O artigo 134.º do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “Recusa de depoimento”, preceitua: 1 - Podem recusar-se a depor como testemunhas: a) Os descendentes, os ascendentes, os irmãos, os afins até ao 2.º grau, os adoptantes, os adoptados e o cônjuge do arguido; b) Quem tiver sido cônjuge do arguido ou quem, sendo de outro ou do mesmo sexo, com ele conviver ou tiver convivido em condições análogas às dos cônjuges, relativamente a factos ocorridos durante o casamento ou a coabitação. 2 - A entidade competente para receber o depoimento adverte, sob pena de nulidade, as pessoas referidas no número anterior da faculdade que lhes assiste de recusarem o depoimento.
Como bem é referido no acórdão nº 71/16.8GBLMG.C1, do TRC, sendo seu Relator o Sr. Desembargador VASQUES OSÓRIO, datado de 8.02.2017, in www.dgsi.pt: A norma, ao conferir a faculdade de recusa de depoimento a determinadas pessoas, em razão dos laços de família ou de natureza semelhante, com o arguido, visa prevenir formas larvadas e indirectas de auto incriminação e preservar a integridade e a confiança nas relações de maior proximidade familiar (cfr. Costa Andrade, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 137, pág. 280) ou seja, pretende evitar que quem vive ou viveu com o arguido em condições análogas às dos cônjuges portanto, em união de facto [como sucede nos autos], seja colocado perante a alternativa de, mentir, correndo o risco de ser responsabilizado criminalmente, ou não mentir e concorrer para a condenação do companheiro, assim desmantelando a relação de confiança inerente à relação. Porém, o direito ao silêncio deixa de ser protegido pela norma quanto a factos ocorridos fora do período de coabitação valendo, neste caso, a regra geral da obrigação de prestar depoimento (cfr. art.ºs 131º, nº 1 e 132º, nº 1, d), do C. Processo Penal). Para que esta modalidade do direito ao silêncio possa efectivamente ser exercida, a lei impõe que a entidade competente para receber o depoimento, sob pena de nulidade, previamente advirta o titular de que lhe assiste o direito de recusar o depoimento (nº 2 do art.º 134º do C. Processo Penal). Embora Paulo Pinto de Albuquerque entenda que esta nulidade consubstancia uma verdadeira proibição de prova resultante da intromissão na vida privada que, nos termos do disposto no art.º 126º, nº 3 do C. Processo Penal, acarreta a nulidade das provas obtidas, salvo consentimento do titular (Comentário do Código de Processo Penal, 2007, Universidade Católica Editora, pág. 362), a maioria da doutrina entende – e não encontramos razões válidas para dela divergir – tratar-se de uma nulidade sanável e portanto, a arguir até ao termo da prestação do depoimento (cfr. Simas Santos e Leal-Henriques, Código de Processo Penal Anotado, Volume I, 3ª Edição, 2008, Rei dos Livros, pág. 957, Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10ª Edição, 1999, Almedina, pág. 333, e Santos Cabral, obra colectiva, Código de Processo Penal Comentado, 2014, Almedina, pág. 533).
Podemos dizer, que é este entendimento que domina na doutrina e na jurisprudência, servindo de exemplo o estudo do Exmº Juiz Desembargador José - Cruz Bucho, sob o título “A Recusa de Depoimento de Familiares do Arguido: o Privilégio Familiar em Processo Penal (notas de estudo)”, disponível no site do Tribunal da Relação de Guimarães [endereço www.dgsi.pt/jtrg], Maia Gonçalves, in “Código de Processo Penal, Anotado”, 16ª edição, Almedina, 2007, pág. 341 e 342, M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, in “Código de Processo Penal, Anotado”, 2ª edição, Rei dos Livros, 1999, pág. 731 e 732, M. Simas Santos, M. leal-Henriques e João Simas Santos, in “Noções de Processo Penal”, 2ª edição, Rei dos Livros, 2011, pág. 200 a 266, Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, vol. II, 4ª edição, Verbo, 2008, pág. 130 a 152 e 163 a 168 e, Tribunal da Relação de Évora, acórdão de 13.07.2017, relatado pela Exmª Juíza Desembargadora Ana Barata Brito, proferido no processo nº 1508/.9 T9BJA.E1, e disponível em www.dgsi.pt/jtre.
Tendo procedido à audição da sessão de julgamento ocorrida em 18.06.2019, constata-se que o Ilustre Mandatário dos arguidos E____________ P______, M____________ e D________ P______, logo após a identificação da testemunha C_________, requereu ao tribunal que fosse cumprido o disposto no artigo 134º do Código de Processo Penal. Pese embora, o Ministério Público nada ter a opor ao cumprimento do disposto no artigo 134º do Código de Processo Penal, o tribunal a quo inferiu o cumprimento do disposto no aludido artigo 134º do Código de Processo Penal, por entender que a situação em concreto não era de subsumir na aludida norma processual.
Ou seja, o tribunal a quo indeferiu o requerido e, consequentemente, determinou que a testemunha C_______ prestasse depoimento.
O Ilustre mandatário nada disse, não tendo invocado, naquele momento, a nulidade relativa. Efetivamente, neste enquadramento, impunha-se que o Ilustre Mandatário tivesse arguido a referida nulidade até ao fim do depoimento, o que não sucedeu, como resulta da referida ata da audiência de julgamento e do respetivo registo gravado.
Não o tendo feito atempadamente, a nulidade sanou-se (cfr. art. 120º, nºs 1 e 3, a) do C. Processo Penal), pelo que fica prejudicada a apreciação da referida nulidade agora invocada.
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b) No que concerne ao recurso interposto pelo arguido AR__________
Alega este recorrente que o acórdão recorrido, “ao ter valorado o depoimento desta Testemunha C______ na parte por esta descrita decorrente de alegada intervenção directa segunda a própria, “conhecimento directo e presencial pelo que um e outro lhe disseram” segundo o parágrafo 2.12. da fundamentação de facto do Acórdão ora recorrido, e com base neste depoimento ter considerado provados os factos supra transcritos no pontos I. B) e H) da matéria de facto dada por provada pelo Acórdão, relativamente ao Arguido AR______, incorreu a nosso ver, e salvo o devido respeito, em violação do Princípio de Proibição de Valoração da Prova consagrado no artº 355º/1 CPP, incorrendo por conseguinte em nulidade o Acórdão recorrido nos termos do art.º 122º/1 CPP.”.
Por outro lado, e no que concerne aos pontos I. B) e H) da matéria de facto, o arguido entende, ainda, que o Tribunal não poderia ter dado como provado os referidos factos, por considerar que, também, as declarações prestadas pelo coarguido AP______ não poderiam ser valorados e conduzir à condenação do ora recorrente.
O MP expressa na sua resposta um entendimento diferente dos arguidos. Ou seja, que “este facto e/ou prorrogativa concedida à testemunha não abala em nada a credibilidade do seu depoimento nem viola qualquer preceito legal, pelo que há que concluir pela não violação do princípio apontado.”. Mais refere que “o tribunal a quo explicitou o processo lógico que está subjacente à formação da sua convicção para dar como assente a factualidade que deu como provada e como não provada. E da prova produzida na audiência de julgamento apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador não podia o Tribunal deixar de dar como provados os factos ora questionados.”.
Vejamos:
Não obstante o esforço argumentativo do recorrente AR__________ o entendimento que expende sobre as questões suscitadas não podem proceder.
Na verdade, e como bem refere o MP na resposta ao recurso, o recorrente não pode olvidar o facto de as suas declarações prestadas em fase de inquérito terem sido ouvidas na última sessão da audiência de julgamento. E de facto dessa audição resulta que o arguido se relacionava efetivamente com o arguido E____________ mais ou menos desde há “um ano e pouco”, que o número manuscrito no pedaço de papel por debaixo de “E________”, junto a fls. 137 dos autos (apreendido a este mesmo arguido AR__________ – cfr. auto de busca e apreensão a fls. 133-135 e imagem a fls. 149) correspondia ao número telefónico do arguido E____________ e de que na véspera do interrogatório fora a casa dos arguidos M___________ e D________, onde estava este último e a “preta” (conforme decorre dos autos, esta expressão era utilizada pelo arguido AR__________ para identificar a testemunha C_________).
Portanto, não se diga que os factos relativos ao arguido AR__________ resultaram apurados com único suporte no depoimento da testemunha C______ e do coarguido AP______.
Quanto ao depoimento da testemunha C_________, que o recorrente entende que não poderia ser valorado pelo tribunal recorrido e servir de fundamento para a condenação do arguido, diremos o seguinte:
Confirma-se da audição do depoimento da testemunha C______ prestado 18-06-2019 (gravado entre 15:45:05h e 16:17:44h):
Sr. Juiz (minuto 25:52): “A questão foi essa, se a senhora alguma vez viu o Sr. AR____ a vender droga ao E____________?” - disse: “Vi sim senhora”. (minuto 26:02) Questionada:“(…)eu já percebi que a Sra. não se dá muito bem com o Sr. AR______, pois não?”(minuto 26:33)- disse: “Tá tudo mal, ninguém dá-se bem.”(26:37m) Perguntada: “Ninguém dá-se bem, então a Sra. também não se dá bem ali com o E____________, nem com a sua sogra…?”(minuto 26:42) - disse: “Eu dou mal com ele.”(minuto 26:45) Defensora: “Oh C______, mas aqui a questão é que a Sra. está aqui em julgamento e já disse muita coisa contraditória.”(minuto 27:12) - disse: “Mas eu já vi, já vi sim senhora.”(minuto 27:17)
Questionada: “Quando é que viu, quando é que viu?” - disse: “(…) vi sim senhora, porque eu própria estive com ela na mão para dar ao Sr. E____________ (…)” (minuto 27:30ss.). Perguntada:“(…) teria sido a senhora?”(minuto 27:43) - disse: “Fui buscar, não tenho vergonha de dizer, fui buscar a casa do Sr. AR______, o Sr. AR______ teve pressa de dar, que ainda não estava chegando a hora para dará aquilo ao Sr. E____________, teve pressa a dar mais cedo porque a polícia já estava de olho nele, lá mesmo naquela zona onde estava, para mim dar aquilo ao Sr. E____________ e o Sr. E____________ deu-me o dinheiro para eu levar ao Sr. A______ e eu dei o dinheiro ao Sr. AR______ e, tanto que faltou dinheiro(…)”(minuto 27:46 ss.).
Pelo tribunal recorrido foi determinado:“(…) a senhora ter tido intervenção nisso, eu tenho o dever de alertá-la relativamente àquilo que a senhora tinha obrigação a falar com verdade se isso implicar uma autoresponsabilidade, se isso implicar quer a senhora também tenha responsabilidade, aí excepcionalmente a senhora pode não revelar, portanto nessa parte, daquilo que a senhora tenha tido intervenção directa e se serviu de intermediário, a sra. Nessa parte pode não prestar declarações…não quer falar sobre isso?” C______- “(…)”. Juiz: “Não, muito bem.” (minuto 28:13 e ss.) O Sr. ainda referiu: “Pronto Sra. C______, este, esta parte que a senhora referiu agora, de ter tido intervenção nisso não conta, não vale, porque a Sra. antecipou-se a dizer isso e isso pode implicar a sua autoresponsabilidade e também manifestou vontade nessa parte, portanto, isso é como se não tivesse dito, e aquilo que vai ser extraído e qualquer questão nunca pode basear-se nisso está bem? Portanto, isso é como se nunca tivesse dito.” (minuto 29:34ss.) O Sr. Juiz questionou a Testemunha sobre o Sr. AR______ -: “Sem que a senhora tenha tido intervenção, viu-o a dar droga aos seus sogros ou ao E____________ alguma outra vez?”(minuto 31:30) - Respondeu perentoriamente a Sra. C______: “Não.”(minuto 31:40)
É com base neste segmento que o recorrente entende que o acórdão ao ter valorado o depoimento de C______ na parte em que teve intervenção direta nos factos, e que já havia considerado que não poderia ser valorado nessa parte quanto ao Arguido AR______ -, violou o princípio de proibição de Valoração da Prova consagrado no art.º 355º/1 CPP, incorrendo por conseguinte em nulidade nos termos do artº 122º/1 CPP.
É pacifico que a testemunha não é obrigada a responder a perguntas de que resulte pela sua resposta a sua própria responsabilização penal (cfr. artigo 132º n.º 2 do Código de Processo Penal). Efetivamente, nenhuma testemunha tem o dever de se autoincriminar. Ou seja, considerando que o arguido se pode recusar a responder sobre factos que lhe sejam imputados, também as testemunhas podem recusar-se a responder a perguntas quando das suas respostas resultar a sua responsabilidade criminal.
Contudo, há que distinguir a recusa em responder às perguntas efetuadas, com a recusa de prestar depoimento. São duas figuras completamente distintas. Na verdade, a recusa a responder reporta-se a uma determinada questão ou questões. Assim, a testemunha pode recursar-se a responder a uma determinada questão e não se recusar às demais questões. Mas, para que lhe usufruía de tal prerrogativa a testemunha terá de o invocar expressamente conforme o n.º 2 do artigo 132º do Código de Processo Penal.
Já no que tange à recusa de depoimento significa a testemunha se recusar ao dever de testemunhar qua tal. Esta figura de recusa de depoimento está prevista no artigo 134º do Código de Processo Penal e no artigo 497º do CPC. In casu, mal andou o tribunal quando advertiu a testemunha de que a resposta a determinada pergunta a podia incriminar penalmente, e determinou, nos termos em que o fez, de que não seria obrigada a responder a tal matéria e que, na verdade, já havia respondido.
Ora, seguimos, nesta parte o pugnado no acórdão 104/10.1ZRCSC.L1-5, do TRL, sendo seu relator o Sr. Desembargador CARLOS ESPÍRITO SANTO, datado de 26-05-2015, in www.dgsi.pt: I- Nada impede que alguém que através do seu depoimento se possa responsabilizar criminalmente, possa prestar depoimento. Pelo contrário, não constando tal testemunha do elenco dos art.º 133º e 134º, C. P. Pen. (impedimentos e recusas), o seu depoimento é obrigatório, nos termos do art.º 131º e 132º, C. P. Pen., sendo sujeita e juramento e advertida de que tem de responder com verdade às perguntas que lhe são colocadas, sob pena de incorrer em responsabilidade criminal. II - Assim, aos sujeitos, não arguidos, indicados como testemunhas, a quem possa a vir a ser imputada a prática de crime no âmbito do processo, restam duas alternativas: - ou requer a constituição de arguido, beneficiando, assim, do impedimento previsto no art.º 133º, 1, a), C. P. Pen.; - ou se recusa a responder a pergunta que o possa incriminar, invocando tal argumento – art.º 132º, 2, C. P. Pen.. III - Em lado algum da lei processual se institui a obrigatoriedade de o tribunal advertir a testemunha de que a resposta a determinada pergunta o pode incriminar penalmente, constituindo tal apenas um direito a invocar pela testemunha, como sucede, p. ex., no caso do art.º 134º, 2,C. P. Pen.. IV - O facto de as testemunhas em causa não se terem recusado a depor acerca de nenhumas das perguntas que lhes foram feitas, apesar de não terem sido advertidas de que determinadas respostas os poderiam fazer incorrer em responsabilidade criminal, não constitui nenhum meio proibido de prova nem qualquer nulidade, nos termos dos art.ºs 132º, 2, 126º, 119º e 120, C. P. Pen. e, por maioria de razão, não confrontam o art.º 32º, 8 da C. R. Port..
Nestes termos, não obstante o tribunal recorrido ter entendido, no momento da prestação do depoimento da testemunha C_________, de que na parte em que poderia ser responsabilizada criminalmente não era obrigada a responder, não obstante o ter feito num primeiro momento, não invalida que o tribunal recorrido possa valorar tal depoimento nos termos em que o faz na motivação de facto do acórdão recorrido, e, consequentemente, não incorre, a nosso ver, em violação do Princípio de Proibição de Valoração da Prova consagrado no artº 355º/1 CPP, e por conseguinte em nulidade o Acórdão recorrido nos termos do artº 122º/1 Código de Processo Penal.
Com o mesmo enquadramento, o acórdão recorrido, também, não é nulo pela invocada violação do artº 379º/1, c) (2ª parte) do Código de Processo Penal.
Termos em que improcede a requerida invalidade do depoimento da testemunha C_________.
Não obstante, sempre se diga, que tudo conjugado no que concerne à prova produzida na sua plenitude, o tribunal a quo seguiu um raciocínio lógico e sustentado no depoimento da testemunha C_________, declarações do coarguido AP__________ e leitura em audiência das declarações prestadas pelo arguido AR__________ em sede de inquérito, para dar como provados os factos constantes do acórdão recorrido em conformidade com o princípio da livre convicção do Julgador (artigo 127.º, do Código de Processo Penal).
Alega o recorrente que as declarações prestadas pelo coarguido AP__________ não pode ser assumida como meio de prova relativamente ao arguido recorrente afetado por esse meio de prova, sendo apenas meio de defesa do próprio arguido que as presta. Assim, as declarações do coarguido AP______ não poderiam ser valoradas pelo tribunal recorrido para suportar a condenação do ora recorrente.
Sobre esta questão, e sem mais delongas para dizer que não assiste razão ao recorrente, confronte-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-09-2008, inhttps://blook.pt/caselaw/PT/STJ/212349/, (Proc. 08P2044, sendo relator o Cons. Santos Cabral):[1] (…) “II - No que respeita à questão de saber se é processualmente válido o depoimento do arguido que incrimina os restantes arguidos, a resposta é frontalmente afirmativa e dimana desde logo da regra do art.º 125.º do CPP, que dispõe que são admitidas as provas que não forem proibidas por lei. Por outro lado, não se sente qualquer apoio numa interpretação rebuscada da Constituição que aponte a inconstitucionalidade de tal interpretação: pelo contrário, a consideração de que o depoimento do arguido – que é, antes do mais, um cidadão no pleno uso dos seus direitos – se reveste à partida de uma capitis diminutio só pelo facto de ser arguido ofende o princípio da igualdade dos cidadãos. Portanto, a questão que se coloca neste caso é, como em relação a todos os meios de prova, a da credibilidade do depoimento do co-arguido. III - Esta credibilidade só pode ser apreciada em concreto, face às circunstâncias em que é produzida. O que não é admissível é a criação de regras abstractas para essa apreciação, retornando ao sistema da prova tarifada: assim, dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova sem qualquer apoio na letra ou no espírito da lei. IV - A admissibilidade do depoimento do arguido como meio de prova em relação aos demais co-arguidos não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação, mostrando-se adequada à prossecução de legítimos e relevantes objectivos de política criminal, nomeadamente no que toca à luta contra a criminalidade organizada. V - A proibição de valoração, contra o arguido, do exercício do direito ao silêncio incide apenas sobre o silêncio que aquele adoptou como estratégia processual, não podendo repercutir-se na prova produzida por qualquer meio legal, designadamente a que venha a precisar e demonstrar a responsabilidade criminal do arguido, revelando a falência daquela estratégia. VI - O depoimento incriminatório de co-arguido está sujeito às mesmas regras de outro e qualquer meio de prova, ou seja, aos princípios da investigação, da livre apreciação e do in dubio pro reo. Assegurado o funcionamento destes e o exercício do contraditório, nos termos preconizados pelo art.º 32.º da CRP, nenhum argumento subsiste contra a validade de tal meio de prova. VII - Aliás, a partir do momento em que o arguido depõe no exercício do seu direito de defesa, é evidente que as suas palavras têm uma dupla conotação: sendo emergentes de um inviolável direito de defesa, elas são também um meio de prova. Não é possível, em termos práticos, separar aquela realidade concreta que é o depoimento arguido, considerando-o ora como um exercício legítimo de um direito ora como meio de prova. Tal visão, para além de um inequívoco maniqueísmo, esquece que o processo penal visa a descoberta da verdade material e não de tantas realidades quantas as que interessam aos diversos sujeitos processuais. (…) IX - É evidente que, tal como em relação ao depoimento da vítima, é preciso ser muito cauteloso no momento de pronunciar uma condenação baseada somente nas declarações do co-arguido, porque este pode ser impulsionado por razões aparentemente suspeitas, tal como o anseio de obter um trato policial ou judicial favorável, o ânimo de vingança, o ódio ou ressentimento, ou o interesse em auto-exculpar-se mediante a incriminação de outro ou outros acusados. X - Por isso, para dissipar qualquer dessas suspeitas objectivas, é razoável que o co-arguido transmita algum dado externo que corrobore objectivamente a sua manifestação incriminatória, com o que deixará de ser uma imputação meramente verbal para se converter numa declaração objectivada e superadora de uma eventual suspeita inicial. Não se trata de criar, à partida e em termos abstractos, uma exigência adicional ao depoimento do co-arguido quando este incrimine os restantes, mas sim de uma questão de credibilidade daquele depoimento em concreto. XI - A credibilidade do depoimento incriminatório do co-arguido está na razão directa da ausência de motivos de incredibilidade subjectiva, o que, na maioria dos casos, se reconduz à inexistência de motivos espúrios e à existência de uma auto-inculpação, assumindo igualmente uma real importância a concorrência de corroborações periféricas objectivas que demonstrem a verosimilhança da incriminação. XII – (…).”
Em suma, o que está em causa no recurso em apreciação, e no que tange a esta matéria, é a divergência entre a convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida em audiência e aquela que o tribunal firmou sobre os factos.
Não sendo possível ao tribunal ad quem o contacto direto e imediato com as provas que a audiência de julgamento em 1.ª instância permite, a impugnação da convicção formada só é viável desde que se demonstre que ela é inadmissível em face das regras da experiência comum, ou seja, que, em face de tais regras, essa convicção não tem lógica, não é coerente, não é possível que os factos assim se tenham passado, por outras palavras, que não é possível – fazendo apelo às regras da experiência comum, da lógica e aos critérios da normalidade da vida – que os factos se tenham passado tal como constam da decisão recorrida. E como referido, não se vislumbra do acórdão recorrido que tal tenha ocorrido.
Assim, questionando-se se os elementos probatórios existentes são suficientes para sustentar a condenação do arguido AR__________ -, a resposta não pode deixar de ser afirmativa.
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2.4. Da violação do princípio “in dubio pro reo” do arguido AR__________
Alega o recorrente que o «Tribunal “a quo”, perante a prova produzida em audiência, poderia apenas e quando muito, suspeitar que o Arguido AR__________ alegadamente tivesse sido autor de Tráfico, mas não ultrapassaria contudo as dúvidas razoáveis a respeito das alegadas autoria e responsabilidade deste Arguido relativamente aos alegados factos de que vem acusado por alegado tráfico de droga, pelo que de igual modo apareceria como única atitude legítima a adoptar, a absolvição do Arguido à luz dos princípios do “in dubio pro reo” e da presunção de inocência deste, o que o Acórdão não fez ao ter condenado este Arguido a quem nada foi apreendido com relevância penal.»
Não podemos deixar de referir que, sobre esta matéria, salvo o devido respeito, o recorrente está manifestamente equivocado. In casu não decorre da fundamentação que o tribunal a quo tenha sido invadido por uma dúvida relevante, nem se vê, considerando a prova produzida, que a devesse ter tido, sendo certo que o tribunal de recurso só pode censurar o uso feito do princípio em referência se da decisão recorrida resultar que o julgador chegou a um estado de dúvida insanável.[2]
Não existe, pois, qualquer violação do princípio "in dubio pro reo".
Como se constata do teor da sentença, o Tribunal a quo não manifestou quaisquer dúvidas relativamente aos factos, pelo que não estão verificados os pressupostos deque depende a aplicação de um tal princípio.
O princípio “in dubio pro reo” que o recorrente invoca é, como refere Maia Gonçalves[3], "um princípio de prova que vigora em geral, isto é, quando a lei, através de uma presunção não estabelece o contrário. Este princípio identifica-se com o da presunção de inocência do arguido, e impõe que o Julgador valore sempre em favor daquele um 'non liquet', e ainda que em processo penal não seja admitida a inversão do ónus da prova em seu detrimento".
Significa que o Julgador deve decidir a favor do arguido se, face ao material probatório produzido em audiência de julgamento, tiver dúvidas sobre qualquer facto, sendo certo que se trata de mero equívoco estender um princípio relativo à prova a matéria de interpretação.
O uso deste princípio só poderia ser censurado se da decisão recorrida resultasse que o tribunal a quo chegou a um estado de dúvida insanável e que, face a ela, escolheu a tese desfavorável ao arguido.
Ou seja, e em síntese:
A prova foi valorada com razoabilidade, os elementos apontados na sentença como relevantes para a decisão de facto foram coerentemente explanados e foram valorados de acordo com um raciocínio lógico-dedutivo que não fere as regras da experiência comum.
Uma vez verificado que o tribunal recorrido formulou a sua convicção relativamente à matéria de facto com respeito pelos princípios que disciplinam a prova e sem que tenham subsistido dúvidas quanto à autoria dos factos submetidos à sua apreciação, não tem cabimento a invocação do princípio in dubio pro reo, que como reflexo que é do princípio da presunção da inocência do arguido, pressupõe a existência de um non liquet que deva ser resolvido a favor deste.
O princípio em questão afirma-se como princípio relativo à prova, implicando que não possam considerar-se como provados os factos que, apesar da prova produzida, não possam ser subtraídos à «dúvida razoável» do tribunal[4]. Contudo no caso dos autos, o tribunal a quo não invocou, na fundamentação da sentença, qualquer dúvida insanável. Bem pelo contrário, a motivação da matéria de facto denuncia uma tomada de posição clara e inequívoca relativamente aos factos constantes da acusação, indicando clara e coerentemente as razões que fundaram a convicção do tribunal. Em todo o caso, a dúvida relevante de que cuidamos, não é a dúvida que o recorrente entende que deveria ter permanecido no espírito do julgador após a produção da prova, mas antes e apenas a dúvida que este não logrou ultrapassar.[5]
O in dubio pressupõe que, após a produção e apreciação dos meios de prova, o julgador se depare com a existência de uma dúvida razoável (não hipotética e abstrata), assumindo, para o efeito, relevância «a dúvida que o tribunal teve, não a dúvida que o recorrente acha que, se o tribunal não teve, deveria ter tido».[6]
Termos em que improcede a invocada violação do princípio do in dubio pro reo.
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2.5. Da nulidade decorrente da falta de fundamentação e erro na apreciação da prova
Os recorrentes E__________, M____________ e D___________, invocam no recurso que o tribunal deveria indicar expressamente qual o tipo de droga comercializada, qual o numero de consumidores e os concretos valores envolvidos – quer na compra quer na alegada venda aos consumidores, pois, só desta forma seria possível concluir, com certeza ou com o mínimo de segurança jurídica, se os mesmo praticaram um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo disposto no art.º 21º, nº 1 do Decreto Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro ou um crime de tráfico de menor gravidade, p.p. pelo disposto no art.º 25 do citado diploma.
Invocam os recorrentes que “cabendo decidir que ocorreu por parte do julgador uma omissão dos seus deveres/poderes de cognição gerador do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e a douta decisão recorrida ser considerada nula à luz das normas conjugadas dos artigos artigo 368º, nº 2, 374º, nº 2, 379º, 410º, nº 1 e 2 todos do Código de Processo Penal.”.
Em sede de recurso para o Tribunal da Relação, a matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: quer por arguição dos vícios a que faz referência o art.º 410.º, n.º 2, do CPP (a chamada revista alargada), quer pela impugnação ampla da matéria de facto, a que alude o art.º 412.º, n.ºs 3, 4 e 6 do mesmo diploma. O recorrente socorre-se das duas vias para impugnar a matéria de facto assente na decisão recorrida.
Segundo alegam os arguidos e ora recorrentes E__________, M____________ e D___________ o acórdão recorrido padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, vícios a que aludem as alíneas, respetivamente, a) e c) do n.º 2 do art.º 410.º do CPP.
Refira-se que, embora o recorrente os invoque, estes vícios sempre são de conhecimento oficioso.
Mas vejamos a invocada questão de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada:
Sabido que este vicio existe quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a decisão de direito. E só existe quando o tribunal deixar de investigar o que devia e podia, tomando a matéria de facto insuscetível de adequada subsunção jurídica, concluindo-se pela existência de factos não apurados que seriam relevantes para a decisão da causa.
A insuficiência a que se refere a alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP é a que decorre da omissão de pronúncia, pelo tribunal, sobre factos alegados ou resultantes da discussão da causa que sejam relevantes para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados ou como não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão da causa, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão.
Como refere o Prof. Germano Marques da Silva, no “Curso de Processo Penal”, Vol. III, pag.325/326 «é necessário que a matéria de facto dada como provada não permita uma decisão de direito, necessitando de ser completada. Antes de mais, é necessário que a insuficiência exista internamente, dentro da própria sentença ou acórdão. Para se verificar este fundamento, é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão que deveria ter sido proferida por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito.”
A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não tem nada a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida.
Ora, uma decisão incorre em tal vício, quando o tribunal recorrido podendo fazê-lo deixou de investigar toda a matéria de facto relevante, de tal forma que essa materialidade não permite, por insuficiência a aplicação do direito ao caso que foi submetido à apreciação do tribunal.
Tal insuficiência determina a formulação incorreta de um juízo porque a conclusão ultrapassa as premissas, ou seja, quando os factos provados forem insuficientes para fundamentar a solução de direito encontrada.
Ou seja, há insuficiência para a decisão sobre a matéria de facto provada quando os factos dados como provados não permitem a conclusão de que o arguido praticou ou não um crime, ou não contém, nomeadamente, os elementos necessários ou à graduação da pena ou à elucidação de causa exclusiva da ilicitude ou da culpa ou da imputabilidade do arguido.
Ou seja, verifica-se o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem dados e elementos que, podendo e devendo ser investigados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação (e da medida desta) ou de absolvição.[7]
Fazendo apelo a um juízo de prognose, seria aceitar que os factos que ficaram por apurar, se viessem a ser averiguados pelo Tribunal a quo através dos meios de prova disponíveis, poderiam ser dados como provados, determinando uma alteração da qualificação jurídica da matéria de facto, ou da medida da pena ou de ambas.[8] In casu, diremos que os factos apurados são suficientemente demonstrativos do crime pelo qual os arguidos vieram a ser condenados. Basta atentar na quantidade e qualidade de estupefaciente e dinheiro apreendido aos arguidos, associado às suas confissões de que a heroína e os comprimidos eram para venda. Ora, tais elementos fácticos conjugados com o longo período de tempo em que os arguidos traficaram, as quantidades de heroína que vendiam e os lucros que auferiam e a forma concertada de como concretizavam a atividade de tráfico é, por si só, reveladora do dolo direto e intenso com que atuaram e que preenchem o crime pelo qual foram condenados.
Pelo exposto, do acórdão recorrido não se vislumbra a omissão dos seus deveres/poderes de cognição invocado, e que na tese dos recorrentes era gerador do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
Improcede, pois, a invocada nulidade do acórdão nos termos dos art.ºs 368º, nº 2, 374º, nº 2, 379º, 410º 2 a) todos do Código de Processo Penal.
*
Por último, quanto ao invocado erro notório na apreciação da prova previsto na alínea c) do nº 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal.
Para que haja erro notório na apreciação da prova é necessário que da decisão recorrida, por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum se patenteie um erro que seja de tal forma evidente e percetível por um qualquer cidadão médio, e não apenas o que se traduza numa leitura possível, aceitável, razoável, da prova produzida.[9]
Acresce que esse erro tem de configurar uma falha grosseira e ostensiva na análise da prova, percetível pelo cidadão comum, reveladora de que se deram provados factos inconciliáveis entre si, i. e., que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, seja, por que foram provados factos incompatíveis entre si ou as conclusões são ilógicas ou inaceitáveis ou que se retirou de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável.
Por outras palavras, constata-se a existência de tal erro quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência, ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis. Erro notório, será, pois, a desconformidade com a prova produzida em audiência ou com as regras da experiência (a título de exemplo, decidiu-se contra o que se provou ou não provou ou deu-se como provado o que não pode ter acontecido).[10]
Assim, não relevam para o apuramento do vício em causa as transcrições extraídas da gravação da prova produzida em audiência, uma vez que extravasam o texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum (vg. os excertos do depoimento da testemunha C_________), os quais só podem ser considerados se e na medida em que o tribunal a quo os mencione na motivação da decisão de facto).
Alegam os recorrentes que o Tribunal a quo não poderia ter dado como provado os factos elencados sob os pontos A. e B. da matéria provada e fundamentam-se, essencialmente em vários excertos transcritos do depoimento prestado pela testemunha C_________. Ora, como referido, no âmbito deste vício suscitado pelos recorrentes, o Tribunal da Relação está impedido de apreciar a questão nos moldes invocados.
Quanto ao demais, diremos:
Alegam os recorrentes que “o tribunal recorrido, como se sublinhou, fundamenta a sua convicção relativamente à ligação entre AR____ e os recorrentes ‐ tão só e apenas - no depoimento de C_______ que, aliás qualifica como objectivo, sério, cabal e natural (cfr. (cfr. §2.11, §2.12, §2.15 e muito em particular os §2.6 e §2.7)). Reitera‐se que nenhuma outra testemunha se pronunciou sobre esta (putativa) ligação exceção feita à C_________. Mas, em momento algum a C_______ referiu que os recorrentes (D________ P______ e M____________ -) tinham recebido droga desse AR____ pois quem a teria recebido (uma única vez) foi C_______ desconhecendo‐se o tipo de droga, quantidade e em que data.”.
Ora, salvo o devido respeito, cotejando a motivação de facto do acórdão recorrido, constata-se que o tribunal a quo,no que concerne à ligação existente AR____ e os recorrentes, é perentório quando afirma suportar-se também nas “declarações prestadas na fase de inquérito pelo próprio arguido AR__________ (igualmente ouvidas na última sessão da audiência de julgamento) de que se relacionava com o arguido E____________ mais ou menos desde há “um ano e pouco” (por exemplo, em discotecas), de que o número manuscrito no pedaço de papel por debaixo de “E________ ”a fls. 137 (apreendido àquele arguido AR__________ – cfr. auto de busca e apreensão a fls. 133-135 e imagem a fls. 149) correspondia ao número telefónico deste (arguido E____________) e de que na véspera do interrogatório fora a casa dos arguidos M____________ e D________, onde estava este último e a “preta” (expressão utilizada pelo arguido A_R_________ para identificar a “cunhada” do arguido E__________, ou seja, a testemunha C______).”. Mais à frente expende o seu raciocínio lógico e coerente da seguinte forma:
“O relacionamento do arguido AR__________ àquela família é explicável não só na exiguidade do “mundo das drogas” neste meio insular, mas também pela circunstância de ter sido namorado da progenitora da testemunha C______ (esta testemunha identificou-o como tendo sido “uma espécie de padrasto”), e em tempos residente por seu turno no r/c do prédio onde vive o arguido AP______, conforme infra melhor explicaremos (sublinhamos que a dita progenitora da testemunha C______, MT____________, foi arrolada como testemunha pelo arguido AR__________ e procurou colocar-se à margem de qualquer relacionamento amoroso, ainda que passado, com este… e de tal forma veio “centrada” nas declarações que prestou acerca daquele, que, inexplicavelmente, referiu “aos costumes” que não conhecia os arguidos E____________, D________ e M____________, falha que só corrigiu quando foi concretamente questionada sobre se eles não seriam o tio e os avós das suas netas…). Bem vistas as coisas, os “elos” são próximos: os arguidos E____________, M____________ e D________ são, correspondentemente, tio e avós das netas da dita ex-namorada do arguido AR__________.”.
Como bem refere o MP na resposta ao recurso interposto pelos recorrentes, e que aqui subscrevemos: “É, assim, em nosso entender, manifesta a falta de razão dos recorrentes quando pretendem atacar a convicção do tribunal apenas porque difere daquela que ela própria formou. Assim, a decisão recorrida mostra-se lógica, conforme às regras de experiência comum e é fruto de uma adequada apreciação da prova, segundo o princípio consagrado no artigo 127º do CPP, pelo que aderimos à exaustiva e criteriosa apreciação feita pelo tribunal, a qual deve ser mantida nos seus precisos termos.”
Termos, em que improcede o invocado vicio de erro notório da apreciação da prova previsto no artigo 410º, nº 1 c) do Código de Processo Penal.
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2.6. - Do enquadramento jurídico
Entendem os recorrentes E__________, D___________ e M____________, que os factos configuram a prática pelos arguidos de crime de tráfico de menor gravidade, p.p. pelo disposto no artº 25 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, ao invés do artigo 21º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro.
Vejamos:
Refere o acórdão recorrido quanto à qualificação jurídica dos factos: “§8.3. Ora, no caso dos autos, em face da factualidade provada, dúvidas não existem de que as condutas dos arguidos E____________, M___________ e D________, por um lado, em coautoria atenta a conjugação de esforços e intentos no plano delineado (art.º 26º do CP), e do arguido A__________ em autoria material, dolosa que foi (dolo direto – art.º 14º nº 1 do CP), mostra-se contemplada pelo sobredito preceito, na medida em que procederam à venda de heroína a terceiros (e o arguido D________ também a venda de buprenorfina – tabela IV anexa ao cit. diploma), com regularidade, durante cerca de um ano e dois meses (o arguido AR__________ em datas não concretamente apuradas naquele período e posteriormente, até finais de fevereiro de 2018), produto este que, aliás, aqueles três detinham quando da data das apreensões, tudo com conhecimento e vontade de o fazer, inexistindo qualquer causa de exclusão de ilicitude e/ou da culpa, nem faltando qualquer condição de punibilidade. §8.4. Atento o período de tempo em questão, a natureza da substância – a heroína é uma das “drogas duras” com efeitos mais perniciosos e destrutivos para a saúde - as quantidades apreendidas aos arguidos E____________, M____________ e D________, por um lado, e os montantes movimentados pelo arguido AR__________, por outro lado, a “imagem global” afasta qualquer juízo de menor gravidade a que alude o art.º 25º al. a) da LD.”.
Questionam os recorrentes, subsidiariamente, a qualificação jurídico-penal da matéria provada, subsumida pelo acórdão recorrido no artigo 21º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro e que os recorrentes pretendem ver enquadrada no crime privilegiado previsto no art.º 25º do mesmo diploma.
O tipo base ou comum do tráfico de produtos estupefacientes é definido no art.º 21º do DL 15/93:
“Quem... cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no art.º 40º, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III…”.
Prevê assim toda e qualquer acto relativo aos produtos estupefacientes identificados nas tabelas anexas, desde a produção, transporte ou venda, mera detenção ou aquisição não previstas no art.º 40º do mesmo diploma – aquisição para consumo.
O art.º 25º do mesmo Diploma Legal preceitua: Se, nos casos dos artigos 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de: a) Prisão de um a cinco anos, se se tratar de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, V e VI; b) Prisão até 2 anos ou multa até 240 dias, no caso de substâncias ou preparações compreendidas na tabela IV.
Este tipo legal previsto no art.º 25º tem vindo a ser utilizado cada vez mais como uma válvula de segurança do sistema[11], evitando assim que situações de menor gravidade (aquém do conceito de tráfico como comércio e forma de ganhar dinheiro fácil) sejam tratadas com penas desproporcionadas.
O advérbio “consideravelmente” não foi usado por mero acaso e que, no seu significado etimológico, prevalece a ideia de notável, digno de consideração, grande, importante ou avultado[12].
Apesar de constarem expressamente da previsão legal índices caracterizadores da ilicitude, a utilização do advérbio “nomeadamente” significa que tal enunciação não é taxativa, devendo pois ser ponderadas todas as concretas circunstâncias de cada caso concreto, a fim de se poder concluir ou não, que, objetivamente, a ilicitude da ação típica tem menor relevo que a tipificada para os art.ºs 21º e 22º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro.
Assim, importa considerar as seguintes circunstâncias:
a) meios utilizados;
b) grau de perigosidade para a difusão da droga;
c) qualidade das plantas, substâncias ou preparações;
d) quantidade das plantas, substâncias ou preparações.
No caso, escusando-nos a repetir a matéria de facto provada e que já consta supra, pelo que para lá se remete, constata-se que a imagem global dos factos ora em apreço é dada pela natureza e quantidade do estupefaciente detido – heroína e cocaína - a modalidade típica verificada – venda direta a número plural de consumidores – e o período de tempo em que se provou tal atividade, bem como a forma minimamente enquadrada como atuava, cabendo destacar o local isolado especialmente procurado para o efeito em procedia às vendas, na companhia de outros indivíduos que igualmente o faziam, os quais apontam para um comprometimento claro com a atividade de venda a pequenos consumidores.
Ora, a natureza do produto estupefaciente objeto da atividade ilícita (heroína), a modalidade da ação (venda a terceiros), as quantidades vendidas, a atividade geograficamente circunscrita, as referências concretas à dimensão dos proventos auferidos e a um período de vendas reportado a outubro de 2016 a 13.12.2017, apontam para uma situação de média escala, com suporte a uma organização ou logística própria de uma atividade de tráfico com dimensão apropriada a integrar o crime previsto no art.º 21º e não artigo 25º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro.
Isto posto, a atividade ilícita dos arguidos, tal como resulta dos factos provados, enquadra-se no universo do traficante para efeitos da incriminação prevista no art.º 21 do Dec. Lei 15/93, e não do artº 25º como pretendiam os arguidos.
Impõe-se assim, também, a improcedência do recurso relativamente à qualificação jurídica da matéria de facto provada.
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2.7. - Da redução da medida das penas.
Neste segmento do recurso os recorrentes AR__________, E__________, D___________ e M____________, manifestam a sua discordância com as penas que lhes foram aplicadas, considerando-a excessivas.
Quanto à pena concreta, como é sabido, a sua determinação faz-se em função da culpa do agente e entrando em linha de conta com as exigências de prevenção de futuros crimes.
A culpa é um referencial que o julgador nunca pode ultrapassar. Até ao máximo consentido pela culpa, é a medida exigida pela tutela dos bens jurídicos que vai determinar a medida da pena, criando-se uma moldura de prevenção geral, cujo limite máximo é a proteção máxima pensada para os bens jurídicos da comunidade e cujo limite mínimo é aquele abaixo do qual já não há proteção suficiente dos bens jurídicos.
Dentro destes limites intervêm, para a concretização, a prevenção geral e a ideia de ressocialização.
Quanto às exigências de prevenção geral, dizem as mesmas respeito à confiança da comunidade na ordem jurídica vigente que fica sempre abalada com o cometimento dos crimes, têm a ver com a proteção dos bens jurídicos, com o sentimento de segurança e a contenção da criminalidade, em resumo, visam a defesa da sociedade.
Já as exigências de prevenção especial se prendem com a capacidade do arguido de se deixar influenciar pela pena que lhe é imposta, estão ligadas à reintegração do agente na sociedade.
No caso:
- O grau de ilicitude é elevado, atentos os bens jurídicos violados e a quantidade e natureza do produto apreendido, assim como elevado se terá de considerar o grau da culpa (atenta a intenção lucrativa com que agiram e a sua indiferença perante os malefícios que os produtos em causa causariam aos futuros consumidores e à sociedade em geral).
- As necessidades de prevenção geral são prementes, constituindo o combate ao tráfico de droga um objetivo dos Estados e uma exigência da própria sociedade.
-As necessidades de prevenção especial são moderadas quanto aos arguidos M__________, D________, AP______ e AR__________, atenta a primariedade destes arguidos, e elevada como se comprova pelo teor do CRC no que concerne ao arguido E____________.
- As condições pessoais apuradas de acordo com o teor dos relatórios sociais elaborados pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais a fls. 838-839v., 841-842., 844-845v., 853-854v. e 866-867v., e, especificamente quanto aos arguidos D________ e M____________, também quanto ao teor dos documentos a fls. 869B e 869Bv. (documentação clínica).
Ora, ponderando todos estes fatores e tendo em conta a medida da pena abstrata aplicável (quatro a doze anos de prisão), o tribunal recorrido optou por penas de prisão não muito acima do limite mínimo (dois anos e quatro meses para a pena mais grave acima desse limite, referente ao arguido E__________, já com várias condenações publicitadas, inclusive por crimes de idêntica natureza), o que revela moderação e preocupação com as necessidades de reinserção social dos agentes, razão por que não merecem qualquer censura.
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III - DECISÃO
Pelo exposto, os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa, acordam em negar provimento aos recursos, confirmando o acórdão recorrido.
Condena-se, cada um dos recorrentes, em 5 Ucs de taxa de Justiça, devendo ter-se em consideração que o arguido AR__________ beneficia de apoio judiciário.
Lisboa e Tribunal da Relação, 29 de janeiro de 2020 Processado e revisto pelo relator (art.º 94º, nº 2 do CPP). Alfredo Costa Vasco Freitas
_______________________________________________________ [1] Posição que já era maioritária como se confirma no acórdão de 25-02-1999 (Proc. 98P1404, sendo relator o Cons. Hugo Lopes): «I - Conferir valor probatório às declarações proferidas, em audiência de julgamento, por um arguido em desfavor de outro, estando este impossibilitado de efectuar, mesmo através do próprio tribunal, um contra interrogatório, seria, sem sombra de dúvida, deixar de todo em esquecimento os princípios de que o processo criminal deve assegurar todas as garantias de defesa e de que a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar estão subordinados ao princípio do contraditório (artigo 32, n.ºs 1 e 5, da CRP). II - De resto, o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre o valor probatório deste tipo de declarações, julgando "inconstitucional, por violação do artigo 32, n. 5, da Constituição da República Portuguesa, a norma extraída com referência aos artigos 133, 134 e 345 do CPP, no sentido que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando, a instância deste outro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio" - cfr. Ac. do T.C. n. 524/97 (1. Sec.), de 14 de Julho, BMJ n. 469 pág. 116. III - Se o tribunal julgador valorar probatoriamente declarações como as em causa, enfermará a decisão que profira de vício que a invalida, devendo ser prolatada nova decisão que as não valore». [2] acórdãos do TRC de 03.06.2015 (proc. n.º 12/14.7GBRST.C1), TRG de 16.11.2015 (proc. n.º 599/14.4GAFAF.G1), TRE de 02.02.2016 (proc. 114/13.7TARMR.E1) [3] Código de Processo Penal Anotado, 2002, 13ª edição, pág. 338 [4] Figueiredo Dias, “Direito Processual Penal”, pág. 213. [5] Ac. TRC, procº. 28/13.0GAAGD.C1, sendo Relator o Sr. Desembargador Vasques Osório, datado de 25-02-2015, in www.dgsi.pt [6] Acórdão do STJ de 14.04.2011, Proc. n.º 117/08.3PEFUN.L1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj [7] Cfr. Acórdãos do STJ de 6/4/2000 (BMJ n.º 496, pág. 169) e de 13/1/1999 (BMJ n.º 483, pág. 49). [8] Cfr. Cons. Simas Santos e Leal Henriques, in "Código de Processo Penal anotado", 2ª ed., pág. 737 a 739 [9] vide Acs. STJ, de 16-10-08, Proc. n° 08P2851; de 15-7-08, Proc. nº 08P1787; e de 9-4-08, Proc.
n° 06P1188, in www.dgsi.pt [10] Cfr. Simas Santos/Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 7ª ed., pgs. 77-78; Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 2ª ed., pgs. 1102 a 1103 e A. Tolda Pinto, A Tramitação Processual Penal, 2ª ed., pgs. 1036 e 1037 [11] Como lhe chamou LOURENÇO MARTINS, IN NOVA LEI ANTIDROGA, UM EQUILÍBRIO INSTÁVEL [12] cfr. Ac. do S.T.J. de 03/07/96, CJ, S, IV, II, 206