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AUDIÇÃO DO ARGUIDO
LIBERDADE CONDICIONAL
Sumário
- No presente caso, não era necessária a audição presencial do arguido, para que o mesmo viesse ao processo justificar as razões de ter incorrido em violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, na medida em que à data da prolação da decisão judicial recorrida tal audição não era obrigatória, nos termos legais previstos no Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro, sendo certo que o CEPMPL - Lei 115/09, de 12.10., só entrou em vigor 180 dias após a sua publicação, ou seja, em 12.4.2010. - Mesmo já no âmbito da nova lei se pronunciou a não audição do condenado antes de ser proferida a decisão de revogação da liberdade condicional não integra qualquer vício, se, para esse efeito, se diligenciou no sentido de o contactar, o que só não foi conseguido porque, incumprindo os deveres que lhe foram fixados na decisão que lhe concedeu a liberdade condicional, o condenado se ausentou da respectiva morada, sem avisar o tribunal. - O não cumprimento das obrigações elementares de não alterar a morada fixada sem dar conhecimento ao tribunal e de se manter em contacto com a entidade que acompanha a liberdade condicional (DGRSP), ausentando-se para parte incerta durante mais de uma década, revela decididamente uma total incapacidade do recorrente para cumprir regras e normas sociais, que estiveram na base da sua colocação em liberdade condicional, o que evidencia que as finalidades da concessão da liberdade condicional não puderam, por meio desta, ser alcançadas e justifica a revogação da liberdade condicional.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na Secção Criminal (5ª) do Tribunal da Relação de Lisboa.
1. – No processo nº 847/19.4TXLSB-C, do 2º Juízo do Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, o arguido NP veio interpor recurso da decisão de 29/11/2006, que determinou a revogação da liberdade condicional e a execução da prisão ainda não cumprida e imposta no P.19/02.7PEBRR, correspondente a 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão, sustentando o recorrente, nas suas conclusões que:
1ª - Nestes autos processual a pena resultante da revogação da Liberdade Condicional é de 1 ano, 9 meses e 15 dias.
2ª - A Liberdade Condicional, foi revogada a 29/11/2006, após tal data já decorreu mais de 12 anos.
3ª - Nos termos do art.º 122º, nº 1, al. d) do CP, o prazo de prescrição é de 4 anos, o qual já decorreu, motivo pelo qual deverá ser declarada a extinção da pena por prescrição. -
Caso hipoteticamente assim sé não entenda, o que se admite embora sem conceder:
4ª - A decisão que revogou a LC foi proferida no âmbito da lei antiga, DL nº 783/76, de 20/11, cujo art.º 66º não impunha a audição, obrigatória do libertado, o qual não foi ouvido.
5ª - Com aprovação do CEP através da lei 115/09, de 12/10, que entrou em vigor a 10/04 de 2010, revogou aquele diploma, a audição do libertado tornou-se obrigatória (nº. 2 do art.º 185º daquele diploma).
6ª - Aliás de acordo com o art.º 9º do nº1, de tal lei, a mesma é de aplicação imediata, inclusive aos processos iniciados anteriormente à sua vigência, como é o caso, desde que tal seja mais favorável para o recluso, o que é manifestamente também ó caso.
7ª - Assim caso se não considere prescrita a pena, deverá ser revogada a decisão de fls. 89 e ss. que deverá ser substituída por outra que leve à audição do libertado;
8ª - Tanto mais que a mera falta de apresentação no IRS, sem mais, único fundamento para revogação da LC, não é apta a tal.
9ª - A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 122º, nº 1, al. d) do CP, nº 2 do art.º 185 e art.º 9º, ambos 115/09, de 12/10.
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A Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância propugnou porque o recurso fosse julgado improcedente e a decisão recorrida mantida, apresentando as seguintes conclusões:
1.O recorrente vem impugnar a decisão judicial de 29.11.2006 que determinou a revogação da liberdade condicional e determinou a execução de prisão ainda não cumprida e imposta no P.19/02.7PEBRR, correspondente a 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão, pugnando pela revogação da decisão recorrida e pela sua substituição por outra que não implique a revogação da liberdade condicional.
2. Alegou que a decisão recorrida violou o disposto nos art.ºs 122, nº1, d.) do C.P., e nº2 do art.º185º e artº9º, ambos da Lei 115/09, de 12.10.
3. Contrariamente ao que alega o recorrente, não se verifica qualquer prescrição da pena de 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão, por não se tratar de uma pena de 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão, mas sim de uma pena de 4 anos e 2 meses de prisão em que o recorrente foi condenado no P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro, por sentença transitada em julgado em 9.7.2003 (fls. 26 a 42), e que o mesmo cumpria quando lhe foi concedida a liberdade condicional, posteriormente revogada pela decisão ora recorrida.
4. Tal pena de 4 anos e 2 meses de prisão prescreve no prazo de 10 anos, após o trânsito em julgado da sentença que a aplicou, nos termos do artº122º,nºs 1, al. c) e nº2 do C.P., ou seja, a prescrição teria ocorrido a 9.7.2013, caso não tivesse ocorrido qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição.
5. Acontece que, efetivamente ocorreu uma causa de suspensão da prescrição da pena, com a declaração de contumácia proferida nos pelo P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro em 5.12.2008 (fls. 146 e 208 do Apenso B), em conformidade com o disposto na al. b) do nº1, do artº125º do C.P., pelo que, a pena não está prescrita.
6. Por decisão judicial de 28.10.2004 do 4º Juízo do TEP de Lisboa foi concedida a liberdade ao recorrente pelo período compreendido entre 28.10.2004 e 13.8.2006, ficando sujeito, nomeadamente, às obrigações de fixar residência em morada concreta, aceitar a tutela do I.R.S. (DGRSP) e nele comparecer sempre que para tal fosse convocado.
7. Em 20.4.2006, foi instaurado o presente processo de Revogação da Liberdade Condicional (Incumprimento - Apenso B), em virtude de o recorrente ter incorrido em violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, uma vez que se ausentou da sua residência sem autorização do tribunal e deixou de comparecer no IRS (DGRS), violando esses deveres.
8. Tentou-se a notificação do mesmo, não sendo possível tal notificação por desconhecimento do seu paradeiro (fls. 19 a 21), pelo que foi determinada, por despacho de 20.9.2006, a sua notificação na pessoa do seu Defensor nomeado, da proposta de revogação da liberdade condicional, nos termos do disposto no artº113, nº9 do CPP, aplicável por via dos art.ºs 54º,nº4 e 56º,nºs 2, aplicáveis por força dos art.ºs 69º,nº1 e 66º, todos do Dec. Lei nº783/76, de 29.10. (fls. 83).
9. Na sequência dessa notificação (fls. 84), nada foi requerido ou junto aos autos pelo arguido/recorrente e sua defesa.
10. Por decisão judicial de 20.11.2006, foi revogada a liberdade condicional ao recorrente, sem a sua audição por ser desconhecido o seu paradeiro, nos termos do disposto nos art.ºs 64º,nº1 e 56º,nº1, al. b) do C.P. e 74º a 77º do Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro, pelos fundamentos constantes dessa decisão judicial - violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, tais como, deixar de comparecer perante os técnicos do IRS desde maio de 2005, e ausentar-se da morada fixada para parte incerta, inviabilizando o seu acompanhamento.
11. Tal decisão foi notificada à Exma. Defensora do arguido através de carta registada enviada em 30.11.2006 – art.º113º, nº 2 do CPP ( fls. 93), o qual nada disse ou requereu, só tendo o recorrente sido notificado da mesma em 28 de maio de 2017.
12. Por ser desconhecido o paradeiro do arguido, foi o mesmo declarado contumaz no P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro, por decisão judicial, de 5.12.2008 (fls.208).
13. Contrariamente ao que alega o recorrente, não houve qualquer violação do artº185º do CEPMPL atual, que nos seus nºs 2 e 3 prevê a audição do arguido, na medida em que à data da prolação da decisão judicial recorrida tal audição não era obrigatória, nos termos legais previstos no Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro, e o CEPMPL - Lei 115/09, de 12.10., que só entrou em vigor 180 dias após a sua publicação, ou seja, em 12.4.2010.
14. Como tal, não se verificou a invocada violação de lei, na medida em que o arguido sempre teve a possibilidade de exercer o contraditório e de se defender.
15.O recorrente invoca ainda que o art.º 9º, nº 1 da Lei n.º 115/2009, de 12.10., a mesma é de aplicação imediata, inclusive quanto aos processos iniciados anteriormente à sua vigência desde que tal seja mais favorável para o recluso, como é o caso, pelo que, a decisão recorrida também violou esta disposição legal.
16.É certo que o art.º 8º,nº 1, al. b) da Lei n.º 115/2009, de 12.10., revogou o Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro. Mas o que diz o seu artº9º, nº1 é que As disposições do livro ii do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade não se aplicam aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade imediata possa resultar agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do recluso ou quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo, continuando, nesses casos, os processos a reger-se, até final, pela legislação ora revogada.
17. Ou seja, o que isto quer dizer é que a nova lei não se aplica a atos já praticados a coberto de lei antecedente e no âmbito da qual são perfeitamente válidos e eficazes, uma vez que tal quebraria a harmonia e a unidade desses atos processuais.
18.Outra interpretação seria vedada pela lei processual penal que salvaguarda esta situação, bem como a validade dos atos já realizados na vigência de lei anterior - artº5º, n.ºs 1 e 2) al. b) do C.P.P.
19. Como tal, improcede também nesta parte, a nosso ver, a argumentação do recorrente.
20. Contrariamente ao que refere o recorrente, a decisão recorrida não se baseou apenas na sua falta de apresentação no IRS, mas sim, na total impossibilidade de contacto com o mesmo no sentido de acompanhar a sua liberdade condicional, uma vez que se ausentou de forma irregular da morada fixada e ficou com paradeiro desconhecido, o que levou, inclusive, à posterior declaração de contumácia.
21. Ora, sendo a liberdade condicional, um incidente de execução da pena de prisão, ou seja, não é liberdade definitiva, trata-se de um instituto que se justifica politico-criminalmente à luz da finalidade prevenção-especial de reintegração do agente na sociedade e do princípio da necessidade de tutela de bens jurídicos (artº40º,nº1 do C.P).
22. Para valorar tal escopo, existe uma monitorização que é efetuada pelo tribunal de execução de penas no sentido de verificar se o condenado em liberdade condicional consegue cumprir as regras a que ficou sujeito, para se poder fazer uma avaliação do seu comportamento futuro em sociedade.
23. Ora, se alguém não cumpre as obrigações elementares de não alterar a morada fixada sem dar conhecimento ao tribunal e de se manter em contacto com a entidade que acompanha a liberdade condicional (DGRSP), ausentando-se para parte incerta durante mais de uma década, só demonstra uma total incapacidade para cumprir regras e normas sociais.
Por todo o exposto, deverá ser negado provimento ao recurso e mantida, nos seus precisos termos, a douta decisão recorrida que não merece qualquer reparo não incorrendo em qualquer violação de lei.
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Nesta Relação, a Digna Procuradora-geral Adjunta acompanhou a posição defendida pelo Ministério Público junto da primeira instância, emitindo parecer no sentido da improcedência do recurso.
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O recorrente NP, respondeu ao Parecer do MºPº, mantendo que deve ser dado provimento ao recurso.
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Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
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2. De acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do STJ de 19.10.1995 (in D.R., série I-A, de 28.12.1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.
Alega o recorrente que o prazo de prescrição é de 4 anos, o qual já decorreu, devendo a pena ser declarada prescrita e, caso se não considere a pena prescrita, deverá ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que determine a audição do arguido, uma vez que, com a aprovação do CEP através da Lei 115/09, de 12.10, que entrou em vigor e 10.4.2010, a Lei 783/76, de 20/11, cujo artº66º não impunha a audição obrigatória do libertado, foi revogada, e a audição do arguido tornou-se obrigatória, de acordo com o nº 2 do art.º 185º, do CEP, alegando, ainda, que a mera falta de apresentação no IRS não é fundamento para revogação da liberdade condicional.
O objecto do recurso tal como ressalta das conclusões da motivação versa a apreciação das seguintes questões:
- se a pena se encontra prescrita;
- se há violação do artº185º, do CEPMPL - Lei n.º 115/2009, de 12.10. - em virtude da falta de audição do arguido;
- se a mera falta de apresentação no IRS, sem mais fundamento, não pode conduzir à revogação da liberdade condicional.
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3. Quanto á prescrição da pena.
Alega o recorrente que a pena resultante da revogação da Liberdade Condicional é de 1 ano, 9 meses e 21 dias; a Liberdade Condicional foi revogada a 29/11/2006 e, desde então decorreram já mais de 12 anos; nos termos do art.º122º, n.º 1, al. d) do CP, o prazo de prescrição é de 4 anos, pelo que tal prazo já decorreu, no caso dos autos.
Tal pretensão é, porém, manifestamente improcedente.
Com efeito, e como bem salienta o Digno Magistrado do MºPº, não se verifica qualquer prescrição da pena de 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão porque, em primeiro lugar, por não se tratar de uma pena de 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão, mas sim de uma pena de 4 anos e 2 meses de prisão em que o recorrente foi condenado no P.19/02.7PEBRR, do1º Juízo Criminal do Barreiro, por sentença transitada em julgado em 9.7.2003 (fls. 26 a 42), e que o mesmo cumpria quando lhe foi concedida a liberdade condicional, posteriormente revogada pela decisão ora recorrida, constituindo a pena de 1 ano, 9 meses e 15 dias de prisão, o remanescente por cumprir em consequência dessa revogação.
Em segundo lugar, tal pena de 4 anos e 2 meses de prisão prescreve no prazo de 10 anos, após o trânsito em julgado da sentença que a aplicou, nos termos do art.º 122º, nºs 1, al. c) e nº2 do C.P., ou seja, a prescrição teria ocorrido a 9.7.2013, caso não tivesse ocorrido qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição.
Porém, com a declaração de contumácia proferida pelo P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro em 5.12.2008 (fls. 146 e 208 do Apenso B), ocorreu uma causa de suspensão da prescrição da pena, em conformidade com o disposto na al. b) do nº1, do artº125º do C.P, pelo que a pena não se encontra prescrita.
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4. Quanto à alegada violação do art.º 185º, do CEPMPL - Lei n.º 115/2009, de 12.10. - em virtude da falta de audição do arguido.
Alega o recorrente que a decisão que revogou a LC foi proferida no âmbito da lei antiga, DL nº 783/76, de 20/11, cujo art.º 66º não impunha a audição, obrigatória do libertado, o qual não foi ouvido mas, com aprovação do CEP através da lei 115/09, de 12/10, que entrou em vigor a 10/04 de 2010, que revogou aquele diploma, a audição do libertado torna-se obrigatória (nº 2, do art.º 185º daquele diploma) e, de acordo com o art.º 9º do nº 1, de tal lei, a mesma é de aplicação imediata, inclusive aos processos iniciados anteriormente à sua vigência, como é o caso, desde que tal seja mais favorável para o recluso, o que é manifestamente também o caso. Conclui assim o recorrente que, caso se não considere prescrita a pena, deverá ser revogada a decisão de fls. 89 e ss, que deverá ser substituída por outra que ordene a audição do libertado, tanto mais que a mera falta de apresentação no IRS, sem mais, único fundamento para revogação da LC, não pode conduzir à revogação de tal medida.
Cumpre desde já afirmar que, também aqui, não assiste razão ao recorrente pois, contrariamente ao que alega, não houve qualquer violação do art.º 185º do CEPMPL atual, que nos seus nºs 2 e 3 prevê a audição do arguido.
Para melhor apreciação da questão importa ter presente o seguinte:
Por decisão judicial de 28.10.2004 do 4º Juízo do TEP de Lisboa foi concedida a liberdade ao recorrente pelo período compreendido entre 28.10.2004 e 13.8.2006, ficando sujeito, nomeadamente, às obrigações de fixar residência em morada concreta, aceitar a tutela do I.R.S. (DGRSP) e nele comparecer sempre que para tal fosse convocado.
Em 20.4.2006, foi instaurado o presente processo de Revogação da Liberdade Condicional (Incumprimento - Apenso B), em virtude de o recorrente ter incorrido em violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, uma vez que se ausentou da sua residência sem autorização do tribunal e deixou de comparecer no IRS (DGRSP), violando esses deveres.
Tentou-se a notificação do mesmo, não sendo possível tal notificação por desconhecimento do seu paradeiro (fls. 19 a 21), pelo que foi determinada, por despacho de 20.9.2006, a sua notificação na pessoa do seu Defensor nomeado, da proposta de revogação da liberdade condicional, nos termos do disposto no art.º 113, nº 9 do CPP, aplicável por via dos art.ºs 54º, nº 4 e 56º,nºs 2, aplicáveis por força dos art.ºs 69º, nº 1 e 66º, todos do Dec. Lei nº 783/76, de 29.10. (fls. 83).
Na sequência dessa notificação (fls. 84), nada foi requerido ou junto aos autos pelo arguido/recorrente e sua defesa.
Por decisão judicial de 20.11.2006, foi revogada a liberdade condicional ao recorrente, sem a sua audição por ser desconhecido o seu paradeiro, nos termos do disposto nos art.ºs 64º,nº1 e 56º, nº 1, al. b) do C.P. e 74º a 77º do Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro, pelos fundamentos constantes dessa decisão judicial - violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, tais como, deixar de comparecer perante os técnicos do IRS desde maio de 2005, e ausentar-se da morada fixada para parte incerta, inviabilizando o seu acompanhamento e, como consequência, foi determinada a execução da pena que lhe faltava cumprir à ordem do P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro.
Tal decisão foi notificada à Exma. Defensora do arguido através de carta registada enviada em 30.11.2006 - art.º 113º, nº 2 do CPP (fls. 93), o qual nada disse ou requereu, só tendo o recorrente sido notificado da mesma em 28 de maio de 2017.
Por ser desconhecido o paradeiro do arguido, foi o mesmo declarado contumaz no P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro, por decisão judicial, de 5.12.2008 (fls.208).
Contrariamente ao que alega o recorrente, não houve qualquer violação do artº185º do CEPMPL atual, que nos seus nºs 2 e 3 prevê a audição do arguido.
Na verdade, no presente caso, não era necessária a audição presencial do arguido, para que o mesmo viesse ao processo justificar as razões de ter incorrido em violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, na medida em que à data da prolação da decisão judicial recorrida tal audição não era obrigatória, nos termos legais previstos no Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro, sendo certo que o CEPMPL - Lei 115/09, de 12.10., só entrou em vigor 180 dias após a sua publicação, ou seja, em 12.4.2010.
E, como bem salienta o Digno Magistrado do MºPº, mesmo já no âmbito da nova lei se pronunciou o Ac. TRP, de 15.12.2010, no P.1622/06.1TXPRT-B.P1 e publicado no site da dgsi, determinando que «A não audição do condenado antes de ser proferida a decisão de revogação da liberdade condicional não integra qualquer vício, se, para esse efeito, se diligenciou no sentido de o contactar, o que só não foi conseguido porque, incumprindo os deveres que lhe foram fixados na decisão que lhe concedeu a liberdade condicional, o condenado se ausentou da respectiva morada, sem avisar o tribunal».
Não se verifica, pois, a invocada violação de lei, na medida em que o arguido sempre teve a possibilidade de exercer o contraditório e de se defender.
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Improcede também a pretensão do recorrente, quando alega que a Lei nº 115/2009, de 12.10 é de aplicação imediata (nos termos do art.º 9º), inclusive quanto aos processos iniciados anteriormente à sua vigência desde que tal seja mais favorável para o recluso, como é o caso, pelo que, a decisão recorrida também violou esta disposição legal.
Com efeito, é certo que o art.º 8º, n.º 1, al. b) da Lei n.º 115/2009, de 12.10., revogou o Dec. Lei 783/76, de 29 de outubro mas, o que diz o citado art.º 9º, n.º 1 é que As disposições do livro ii do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade não se aplicam aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade imediata possa resultar agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do recluso ou quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo, continuando, nesses casos, os processos a reger-se, até final, pela legislação ora revogada.
Ou seja, o que isto quer dizer é que a nova lei não se aplica a atos já praticados a coberto de lei antecedente e no âmbito da qual são perfeitamente válidos e eficazes, uma vez que tal quebraria a harmonia e a unidade desses atos processuais, e outra interpretação – como bem salienta o Digno Magistrado do MºPº - seria vedada pela lei processual penal que salvaguarda esta situação, bem como a validade dos atos já realizados na vigência de lei anterior - art.º 5º, nºs 1 e 2) al. b) do C.P.P., havendo, aliás, neste sentido decisão judicial nos autos, datada de 26.1.2015 (fls. 133) indeferindo promoção do Ministério Público em sentido contrário, e da qual não foi interposto recurso havendo, como tal, conformação com a essa decisão judicial.
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5. Quanto à apreciação da questão da verificação ou não dos pressupostos para revogação da liberdade condicional.
Alega o recorrente que a mera falta de apresentação no IRS, sem mais fundamento, não pode conduzir à revogação da liberdade condicional.
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 64º nº 1 e 56º nº 1 al. b) do Código Penal, a liberdade condicional «é revogada sempre que, no seu decurso o condenado (...) infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou, regras de conduta impostos (...)».
No caso dos autos, por decisão judicial de 28.10.2004 do 4º Juízo do TEP de Lisboa foi concedida a liberdade ao recorrente pelo período compreendido entre 28.10.2004 e 13.8.2006, ficando sujeito, nomeadamente, às obrigações de fixar residência em morada concreta, aceitar a tutela do I.R.S. (DGRSP) e nele comparecer sempre que para tal fosse convocado. Foi notificado da decisão, e ficou bem ciente das condições e regras de conduta inerentes, maxime, a de não incorrer na prática de novos delitos.
Porém, em 20.4.2006, foi instaurado processo de Revogação da Liberdade Condicional (Incumprimento - Apenso B), em virtude de o recorrente ter incorrido em violação dos deveres a que estava sujeito pela decisão de liberdade condicional, tais como, deixar de comparecer perante os técnicos do IRS desde maio de 2005, e ausentar-se da morada fixada para parte incerta, inviabilizando o seu acompanhamento e, como consequência, foi determinada a execução da pena que lhe faltava cumprir à ordem do P.19/02.7PEBRR, do 1º Juízo Criminal do Barreiro.
Verifica-se assim que, contrariamente ao alegado, a decisão recorrida não se baseou apenas na falta de apresentação do recorrente no IRS, mas sim, na total impossibilidade institucional de contacto com o mesmo no sentido de acompanhar a sua liberdade condicional, uma vez que se ausentou de forma irregular da morada fixada e ficou com paradeiro desconhecido, o que levou, inclusive, à posterior declaração de contumácia.
Colocado em liberdade, embora condicional, na aposta de que o recorrente cumpriria a sua parte na sua própria reinserção social, tendo-lhe para o efeito sido impostas regras de conduta entre as quais se contava a de fixar residência em morada concreta, aceitar a tutela do I.R.S. (DGRSP) e nele comparecer sempre que para tal fosse convocado, o recorrente simplesmente incumpriu injustificadamente, frustrando de todo o objetivo pretendido.
Na verdade, o recorrente fez tábua rasa de todos os deveres que sobre si recaíam com vista à sua reinserção.
Pelo que é de aceitar a fundamentação do Tribunal recorrido, quando afirma: “(…) A PARTIR DE MAIO DE 2005 DEIXOU DE COMPARECER PERANTE OS TÉCNICOS DO IRS E DE ACATAR AS SUAS PRESCRIÇÕES, AUSENTANDO-SE DA MORADA DEIXADA SEM AUTORIZAÇÃO NEM CONHECIMENTO DESTE TRIBUNAL E AUSENTOU-SE PARA PARTE INCERTA, ATÉ HOJE, INVIABILIZANDO, ASSIM, O SEU ACOMPANHAMENTO. Ao fazê-lo frustrou as concretas finalidades que basearam a sua liberdade condicional. Na verdade, objectivo da liberdade condicional é «criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante a qual o delinquente possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da Reclusão» (nº 9 do preâmbulo do Decreto-Lei nº 400/82, de 23 de Setembro), visando «uma adequada reintegração social do internado». Ora, essa reintegração foi frontalmente inviabilizada no âmbito da liberdade condicional de que beneficiava.”.
Concluindo:
O recorrente foi indiferente às obrigações que lhe foram impostas.
É assim manifesto que o não cumprimento das obrigações elementares de não alterar a morada fixada sem dar conhecimento ao tribunal e de se manter em contacto com a entidade que acompanha a liberdade condicional (DGRSP), ausentando-se para parte incerta durante mais de uma década, revela decididamente uma total incapacidade do recorrente para cumprir regras e normas sociais, que estiveram na base da sua colocação em liberdade condicional. O que evidencia que as finalidades da concessão da liberdade condicional não puderam, por meio desta ser alcançadas.
Justifica-se, conforme decidido, a revogação da liberdade condicional.
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6. Face ao exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal (5ª) deste Tribunal em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
Fixar em 4 Ucs a taxa de justiça devida pelo recorrente.
Lisboa, 11 de fevereiro de 2020.
Cid Geraldo
Ana Sebastião