Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
Sumário
- Não deve escapar à apreciação do julgador o facto de os agentes do crime de tráfico internacional de estupefacientes, navegarem, como já foi visto também em submarinos (e, também, com número reduzido ao mínimo de tripulantes) ou veleiros (como in casu, de igualmente três), de elevado valor económico, especialmente transformados com o único propósito de ocultarem a actividade de transporte de elevadíssimas quantidades de droga, que se destinava à venda da qual resultaria elevado lucro esse que seria distribuída por todos os elementos da associação, o que só pode ser levado a cabo por associações criminosas com sólida estrutura permanente, (como o revela também a orientação de coordenadas de navegação à distância, via rádio,) e com astronómica capacidade económica, e nunca por vulgares cidadãos de modesta, média ou até elevada capacidade económica pessoal, que não estivessem submetidos à vontade e desígnios da associação criminosa e que por todos repartiria os lucros da operação. - A apurada navegação em barco, intencionalmente transformado, sendo orientada à distância por outros, em actividade de tráfico internacional de estupefacientes, o valor económico do produto transportado, como o seu elevadíssimo grau de pureza, a sofisticação de meios e elevadas capacidades de organização evidenciadas, não permitem a conclusão alcançada na decisão recorrida de não verificação de um interesse superior que, de certa forma, ultrapassasse os meros intentos pessoais dos arguidos, e que conduzissem também à conclusão de inexistência de indícios de adesão a associação criminosa, como o demonstra exuberantemente também o facto de serem orientados quanto às coordenadas de navegação, numa típica acção de “Cartel”, que nunca confiaria o transporte de tão valiosa quantidade de cocaína a pessoas “externas” à associação, num “outsourcing” - que poderia permitir o roubo do produto por um “Cartel” rival, - a qualquer pessoa que não fizesse parte integrante da associação criminosa e que no final não recebessem parte do produto da venda resultante de tal operação, como é consabido pelas regras da experiência comum, - daí o controlo e orientação de coordenadas à distância, como também a possível presença nas imediações ainda que a algumas milhas marítimas de outra embarcação com a função de vigilância do trânsito marítimo e das autoridade e de possível escolta contra qualquer “Cartel” concorrente, como normal em tais circunstâncias, não se tratando de uma mera situação de comparticipação ou de actuação em bando.
Texto Integral
Acordam em conferência os Juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.
1. No Processo de Inquérito nº 260/18.6JELSB do Juízo de Competência Genérica da Horta (Juiz 2) do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, no qual são arguidos LH , MA e ZB, todos presos no Montenegro a 19 de Setembro de 2019 a aguardar extradição para Portugal, por decisão instrutória, proferida a 31 de Maio de 2019, foi decidido pronunciar os arguidos pelo crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos art.ºs 21º nº 1 e 24º alínea c) do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela anexa I-B (cocaína) e não pronunciar os arguidos pelo crime de associação criminosa p. e p. pelo art.º 28º do referido diploma legal.
2. Não se conformando com esta decisão o Digno Magistrado do MºPº dela interpôs recurso apresentando motivação da qual extrai as seguintes conclusões:
“1. A decisão recorrida não pronunciou os arguidos pela prática do crime de adesão a associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, nº 2, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na redacção que lhe foi dada pela Lei 45/96, de 3 de Setembro, com referência à tabela anexa l-B.
2. Entendemos que da prova produzida, lida à luz das regras da experiência comum, ressalta que decorrem indícios suficientes da prática de tal crime, sendo de submeter tal questão á ampla discussão d a realizar em julgamento.
3. Os arguidos partiram de Grenada, nas caraíbas, no dia 17 de maio de 2018, a bordo do veleiro "O. ", embarcação na qual que navegaram pela América do Sul, cruzando o Atlântico, até ao dia 22 de Junho de 2018.
4. Nessa data em que foram interceptados pelas autoridades portuguesas e encontrados em posse de 1200 (mil e duzentas) embalagens de cloridrato de cocaína, correspondentes a cerca de 1408 kg (mil quatrocentos e oito quilogramas).
5. A cocaína tinha um grau de pureza de 84%.
6. Estava ocultada em compartimentos do veleiro que tinham sido alterados tendo em vista a sua dissimulação, e designadamente por debaixo do soalho, em dois compartimentos secretos propositadamente criados.
7. A decisão de pronúncia ou de não pronúncia deverá ser tomada com base na apreciação da suficiência de indícios.
8. Pois que a prova disponível, lida à luz das regras da experiência e de critérios da normalidade impõe que se conclua que os arguidos actuaram prestando colaboração a uma organização, mais ampla, dedicada ao tráfico de estupefacientes.
9. De outro modo, como poderiam 3 cidadãos europeus sem qualquer ligação alegada ou conhecida à América do Sul e ao Caribe ali adquirir cerca de tonelada e meia de cocaína com um grau de pureza de 84%?
10. Não falamos de alguns quilogramas, mas de uma quantidade de grandeza tal e com um tal grau de pureza que, razoavelmente, deve ter-se por mais do que plausível que a actividade empreendida pelos arguidos surge no âmbito de uma grande operação internacional de tráfico de estupefacientes.
11. Cremos, portanto, que à luz das regras da experiência comum não pode senão concluir-se que um transporte de tais e tão puras quantidades de estupefaciente deverão ocorrer no âmbito de uma operação de tráfico internacional levada a efeito por uma organização mais ampla, e que não por livre iniciativa individual dos arguidos.
12. Isto dito, temos por totalmente adverso as regras da experiência comum que se conclua, como se fez na douta decisão recorrida, que os arguidos actuaram de modo próprio e para seu interesse pessoal, ainda que em conjugação de esforços com terceiros.
13. Nada nos autos indica que assim tenha sido, sendo que a afirmação do tribunal a quo surge sem que indique prova em que se possa sustentar.
14. São suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança (artigos 283.º n.º 1 e 2 e 286.º do Código de Processo Penal).
15. Indícios suficientes são as "referências factuais, sinais objectivos de suspeita, elementos de facto trazidos pelos meios legais probatórios ao processo" (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Janeiro de 1997, in Boletim do Ministério da Justiça 463, p. 661).
16. A possibilidade razoável de condenação verifica-se quando "os elementos de prova relacionados e conjugados entre si fazem pressentir da culpabilidade do agente e produzem a convicção pessoal de condenação posterior; esses elementos manter-se-ão em julgamento; ou então, a ampla discussão em plena audiência de julgamento permite pressentir que, para além dos elementos já disponíveis, outros advirão no sentido da condenação futura" (TOLDA PINTO, A Tramitação Processual Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 701".
17. Face do exposto, é de concluir pela suficiência de indícios da prática, pelos arguidos, do crime de adesão a associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, nº 2, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na redacção que lhe foi dada pela Lei 45/96, de 3 de Setembro, com referência à tabela anexa l-B.
Ao não pronunciar os arguidos pela prática de tal crime, a douta decisão recorrida violou a lei e os artigos 286.º n.º 1 e 283.º do Código de Processo Penal, devendo ser revogada e substituída por outra que pronuncie os arguidos por todos os factos descritos na acusação deduzida e pela prática de tal crime.”
3. Admitido o recurso com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo os arguidos não responderam
4. Neste Tribunal da Relação o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto.
5. Foram colhidos os vistos e realizada a competente conferência.
6. Suscita-se a apreciação do despacho recorrido na parte de não pronúncia dos arguidos pelo crime de adesão a associação criminosa p. e p. pelo art.º 28º nº 2 do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, na redacção introduzida pela Lei nº 45/96, de 3 de Setembro, com referência à Tabela I-B.
7.1. Assim reza o despacho recorrido:
“Relatório
Os Arguidos MA, ZB e LH requereram a abertura da presente instrução discordando do despacho de acusação proferido pelo Ministério Público, para julgamento em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, por entenderem, em suma, existirem indícios suficientes para lhes imputar a prática em co-autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo de:
- Um crime de adesão a associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, nº 2, do Decreto-Lei n" 15/93, de 22-01, na redacção que lhe foi dada pela Lei 45/96, de 3 de Setembro, com referência à tabela anexa I-B; e
- Um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos arts. 21.º nº 1 e 24.º, al. c), do citado Decreto-Lei n" 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela anexa I-B (...) ".
Para além disso, foi excepcionada a competência territorial nacional, bem como a aplicabilidade na legislação portuguesa aos factos aqui em causa e, ainda, foi suscitada a nulidade da prova recolhida no inquérito, por terem sido adoptados procedimentos cruéis relativamente ao Arguido MA.
*
Foi declarada aberta a instrução, procedeu-se a interrogatório dos Arguidos, não foi admitida a audição da testemunha requerida, e foi determinada a junção de informação sobre a localização da intercepção da embarcação, bem como a emissão de parecer para avaliação dos ganhos prováveis relativos ao produto estupefaciente apreendido.
Procedeu-se à realização do debate instrutório, com observância do legal formalismo, com formulação a final de conclusões pelo Ministério Público e Arguidos.
Saneamento
No que diz respeito às excepções e nulidades suscitadas pelos Arguidos, o Ministério Público nada disse, passando-se de imediato, à respectiva apreciação e decisão.
Da excepção de incompetência
Factos
A embarcação O. foi adquirida em 2013, pelo Arguido MA, tem o registo n.º …, com pavilhão das Ilhas Virgens Britânicas, cf. fls. 103-117.
No dia 21/06/2018, a embarcação foi detectada nas coordenadas 037º 31'8"N, 030º 19'6"W, onde foi interceptada pela Marinha Portuguesa, e nela estavam os Arguidos MA, ZB e LH , cf. consta de fls, 18 a 29 e 93.
Foi solicitada autorização para adopção das medidas necessárias em relação à embarcação, cf. consta de fls. 13-14 e 18.
Posteriormente, por razões de segurança e urgência, a embarcação foi encaminhada para o porto da Horta, onde chegou, atracou e foi sujeita a buscas e apreensões de produto estupefaciente, cf. fls. 13a 34, 45, 60-61, 82-84, 161-163, 218-219 e 992-993.
Aquela localização situa-se à distância de 95 milhas náuticas da ilha do Faial, cf. ref.ª 3091690.
Direito
Da lei substantiva
Para determinação do lugar da prática do facto deve atender-se ao disposto no artigo 7.º do Código Penal - CP.
No que diz respeito à aplicabilidade da lei penal portuguesa, em razão do lugar da prática do facto, o artigo 4.º do CP estatui, como regra, o seguinte:
“Salvo tratado ou convenção internacional em contrário, a lei penal portuguesa é aplicável a factos praticados:
a) Em território português, seja qual for a nacionalidade do agente; ou
b) A bordo de navios ou aeronaves portugueses (...) ".
Porém, tal regra é excepcionada nos termos do disposto no artigo 49º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na versão aplicável à data dos factos, que assim estatui:
“Para efeitos do presente diploma, a lei penal portuguesa é ainda aplicável a factos cometidos fora do território nacional:
a) Quando praticados por estrangeiros, desde que o agente se encontre em Portugal e não seja extraditado;
b) Quando praticados a bordo de navio contra o qual Portugal tenha sido autorizado a tomar as medidas previstas no artigo 17," da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas de 1988".
Assim, importa verificar se os factos em causa nos presentes autos podem ser considerados praticados em:
• Território nacional;
• Navio ou aeronave com pavilhão nacional; ou
• Fora do território nacional, a bordo de navio contra o qual Portugal tenha sido autorizado a tomar as medidas previstas no artigo 17º da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas de 1988.
No Território Nacional
Desde logo importa enunciar estar delimitado o território nacional pelo artigo 5.º da Constituição da República Portuguesa - CRP, nele se incluindo as águas territoriais, bem como, a zona económica exclusiva — ZEE.
Assim, nos conjugados termos n.º 3 do artigo 2º preambular, do artigo 56.º e artigo 57.º da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 10 de Dezembro de 1982 e o Acordo Relativo à Aplicação da Parte XI da Convenção adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 28 de Julho de 1994, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 60-B/97, de 14 de Outubro e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 67-A/97, de 14 de Outubro - CNUDM - encontra-se reconhecido que Portugal "(...) goza de direitos soberanos e de jurisdição sobre uma zona económica exclusiva de 200 milhas marítimas contadas desde a linha de base a partir da qual se mede a largura do mar territorial (...) ".
Para além disso, está admitida a intervenção da jurisdição penal nacional, para investigações, a bordo de navio estrangeiro que passe pelo mar territorial nacional, quando esteja em causa e sejam necessárias para a repressão do tráfico ilícito de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, atento o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 27.º da CNUDM.
Assim, tomando como ponto de partida a ilha do Faial, até ao local de intercepção da embarcação O., que ocorreu na localização 037º 31'8"N, 030º 19'6"W, a distância é de 95 milhas náuticas, cf. ref.ª 3091690.
Por isso, são águas integradas na ZEE, sujeitas a controlo e fiscalização das autoridades nacionais, designadamente marítimas, com atribuições no âmbito da prevenção e controlo da criminalidade, designadamente, narcotráfico, nos conjugados termos do disposto no n.º 2 do artigo 4.º e alínea k) do n.º 2 do artigo 6, ambos do Decreto-lei n.º 43/2002, de 2 de Março.
Deste modo, estando demonstrado que a intercepção da embarcação ocorreu em águas territoriais sujeitas a soberania e jurisdição nacional, a mesma tem-se por legítima, bem como, terem os factos aqui em causa sido praticados em território nacional, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 7.º do CP. Consequentemente, a lei penal portuguesa é-lhes aplicável nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do artigo 4.º do CP.
Fora do Território Nacional
Para além do acima exposto, mesmo que os factos tivessem ocorrido fora do território nacional, a lei penal portuguesa, no que diz especialmente respeito ao tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, é aplicável nos termos do citado artigo 49.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
In casu importa atender no artigo 17.º da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas - CNUTIESP - aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 29/91 e ratificada por Decreto do Presidente da República n.º 45/91, de 6 de Setembro, com a epígrafe - Tráfico ilícito por mar - que assim estatui:
1 - As Partes cooperam o mais amplamente possível para eliminar o tráfico ilícito por mar, em conformidade com o direito internacional do mar.
2 - A Parte que tenha motivos razoáveis para suspeitar que um navio com o seu pavilhão, ou sem qualquer pavilhão ou matrícula, é utilizado para o tráfico ilícito, pode solicitar auxílio às outras Partes a fim de pôr termo a essa utilização. As Parles assim solicitadas prestam essa assistência no limite dos meios de que dispõem.
3 - A Parte que tenha motivos razoáveis para suspeitar que um navio no uso da liberdade de navegação de acordo com o direito internacional e que arvore o pavilhão ou tenha matrícula de uma outra Parte é utilizado para o tráfico ilícito, pode notificar desse facto o Estado do pavilhão e solicitar a confirmação da matrícula; se esta for confirmada, pode solicitar ao Estado do pavilhão autorização para adoptar as medidas adequadas em relação a esse navio.
4 - De acordo com o n.º 3 ou com os tratados em vigor entre as Partes ou com qualquer outro acordo ou protocolo por elas celebrado, o Estado do pavilhão pode autorizar o Estado requerente a, inter alia:
a) Ter acesso ao navio;
b) Inspeccionar o navio;
c) Se se descobrirem provas de envolvimento no tráfico ilícito, adoptar medidas adequadas em relação ao navio, às pessoas e à carga que se encontrem a bordo.
5 - Quando uma medida é adoptada de acordo com o presente artigo, as Partes interessadas devem ter devidamente em conta a necessidade de não pôr em perigo a segurança da vida no mar nem do navio ou da carga e de não prejudicar os interesses comerciais e jurídicos do Estado do pavilhão ou de qualquer outro Estado interessado.
6 - O Estado do pavilhão pode, em conformidade com as obrigações previstas no n.º 1 do presente artigo, subordinar a sua autorização a condições que sejam acordadas entre o referido Estado e a Parte requerente, incluindo condições relativas à responsabilidade.
7 - Para os efeitos dos n.ºs 3 e 4 do presente artigo, as Parles respondem sem demora aos pedidos de outras Partes com vista a determinar se um navio arvorando o seu pavilhão está autorizado a fazê-lo, assim como aos pedidos de autorização formulados nos termos do n. º 3. Cada Estado designa, no momento em que se tornar Parte da presente Convenção, a autoridade ou, se for caso disso, as autoridades encarregadas de receber e de responder a esses pedidos. Essa designação será notificada pelo Secretário-Geral a todas as outras Parles no mês seguinte ao da designação.
8 - A Parle que tiver adoptado qualquer das medidas previstas no presente artigo informa de imediato o Estado do pavilhão dos resultados dessa medida.
9 - As Partes devem considerar a possibilidade de celebrar acordos ou protocolos bilaterais ou regionais com vista a dar aplicação às disposições do presente artigo ou a reforçar a sua eficácia.
10 - As medidas adoptadas nos termos do n.º 4 do presente artigo só são aplicáveis por navios de guerra ou aeronaves militares ou quaisquer outros navios ou aeronaves devidamente assinaladas e identificáveis como navios ou aeronaves ao serviço de um governo e autorizados para esse fim.
11- Qualquer medida adoptada nos termos do presente artigo terá devidamente em conta a necessidade de não interferir nos direitos e obrigações dos Estados costeiros ou no exercício da respectiva competência, de acordo com o direito internacional do mar, nem de afectar esses direitos, obrigações ou competências (...)".
Resulta da factualidade retratada nos autos que as autoridades nacionais accionaram e aturam de acordo com os procedimentos impostos e admitidos por esta norma, seja no tocante à autorização para intervirem na embarcação, seja na adopção de medidas urgentes e necessárias para salvaguarda de vidas, da embarcação, bem como da respectiva carga.
Do navio ou aeronave com pavilhão nacional
Sendo inquestionável, não ter a embarcação aqui em causa, pavilhão nacional, nada há a dizer nesta parte.
Pelo exposto, nos termos sobreditos, tendo os factos retratados nos autos ocorrido na ZEE nacional, uma vez que a embarcação contendo o produto estupefaciente apreendido, nela entrou tendo sido interceptada e encaminhada para o porto da cidade da Horta, pelas autoridades nacionais, no exercício das respectivas atribuições, ao abrigo do principio da territorialidade, ínsito no artigo 4.º do CP, a lei penal portuguesa é-lhes aplicável.
Da lei adjectiva
Atendendo à factualidade em causa nestes autos, tendo a embarcação entrado em águas nacionais, ao largo da ilha do Faial, onde aportou, é competente para dela conhecer, nesta fase de instrução, o presente Juízo de Competência Genérica da Horta, atento o conjugadamente disposto no artigo 17.º e 19.º do CPP ex vi alínea a) do n.º 2 do artigo 130.º, artigo 33.º ambos da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, que publicou a Lei da Organização do Sistema judiciário - LOSJ - alínea a) do artigo 64.º, alínea b) do n.º 2 do artigo 66.º, n.º 3 do artigo 4.º e mapa III, do Decreto-lei n.º 49/2004, de 27 de Março, na sua versão actualizada, que publicou o Regime de Organização e funcionamento dos tribunais Judiciais - ROFTJ.
O Tribunal é competente.
O Ministério Público tem legitimidade para acusar.
Os Arguidos gozam de legitimidade para requerer a abertura de instrução.
Das nulidades de prova
Os Arguidos invocaram terem sido sujeitos a tratamentos cruéis, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 126.º do CPP ex vi artigo 1305.º-A do Código Civil - CC - e Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro, designadamente:
• Todos foram sujeitos a revista de segurança e permaneceram algemados desde a intercepção pelas autoridades ate à chegada à cidade da Horta;
• Foram convencidos a prestar declarações, para evitar o afogamento de um canídeo que seguia a bordo da embarcação, sob ameaça realizada por elemento policial; e
• O Arguido MA foi vendado, ficou privado da visão e não mais comandou a embarcação.
Apreciando,
De acordo com o teor dos autos constantes do processo, é inequívoco ter ocorrido a intercepção da embarcação no dia 21/06/2018, cf. consta de autos de fls. 13-14, com identificação dos Arguidos, cf. fls. 43, bem como ter aquela sido dirigida até ao porto da Horta, tendo ao comando o Arguido MA , cf. consta de fls. 45.
Para além disso, depois de aqui chegados, os Arguidos livremente pernoitaram em unidade hoteleira e compareceram para realização de actos de investigação, nos termos constantes e relatados em autos de fls. 59-69.
Em seguida, na presença da Ilustre Advogada, foram sujeitos a interrogatório perante OPC, não tendo prestado declarações, cf. consta de fls. 70-81, para além de terem sido realizadas buscas na embarcação, cf. consta de fls. 82-159 e 161-163.
Foram, detidos em flagrante delito no dia 23/06/2018, pelas 16h25m, cf. consta de autos de fls. 164-169.
Consequentemente foi acautelado o bem-estar do canídeo que se encontrava a bordo da embarcação, nos termos constantes de fls. 217.
Interrogados os Arguidos, na presente instrução, prestaram declarações somente quanto ao alegado comportamento das autoridades policiais, remetendo-se ao silêncio quanto a qualquer outra factualidade. Porém, das declarações prestadas por todos, denotou-se que estavam alinhadas entre ambos, seja na alegada descrição dos comportamentos que imputam aos elementos policiais, seja na estrita delimitação das respectivas declarações, que em momento algum ultrapassaram aquela barreira, de que os mesmos revelaram estar bem cientes, no decurso dos respectivos e individuais interrogatórios.
Obviamente é reconhecido aos Arguidos o direito ao silêncio sem que tal os possa desfavorecer, no entanto, tal não se constitui numa limitação a que o Tribunal tire as ilações das declarações prestadas por estes.
Assim, considerando o alegado pelos Arguidos, face ao teor dos autos produzidos por órgãos de polícia criminal, o que não foi posto em causa, resulta, quanto a nós, evidente que tal se trata de mera alegação, pois não é minimamente corroborada pelos elementos constantes dos autos. Ademais, é frontalmente contrariada, pois a embarcação foi conduzida pelo Arguido MA de acordo com as indicações que lhe foram dirigidas, o que é incompatível com a aposição de uma venda; os Arguidos foram sujeitos a interrogatório na presença da Advogada, nada tendo dito, para além de ter sido acautelado o bem-estar do canídeo, em consequência da detenção dos Arguidos.
A tudo isto, acresce o facto de os Arguidos terem permanecido livremente, tendo-se mostrado colaborantes com as autoridades portuguesas, bem como tiveram oportunidade de junto da Ilustre Advogada terem suscitado e denunciado comportamento abusivo por parte das autoridades em causa, o que naquela altura não fizeram, apesar de o poderem fazer.
Ademais, no âmbito das medidas cautelares e de polícia, ínsitas nos artigos 248.º e artigo 253.º, do CPP, estão autorizadas as entidades que coadjuvam as autoridades judiciárias, classificando-se, em termos operativos, como órgãos de polícia criminal, nos termos do disposto na alínea c) do artigo 1.º do CPP, face aos concretos perigos para os respectivos elementos, arguidos, vítimas e elementos de prova ou outros a procederem, dentro do quadro legal aplicável, de modo antecipado e, por isso, cautelar, antes da intervenção das autoridades judiciárias.
Nestes termos, considera-se não estar indiciada qualquer factualidade susceptível de configurar tortura, coacção, ofensa à integridade física ou moral dos Arguidos, que constitua método ou meio proibido de prova para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 2 e n.º 1 do artigo 126.º do CPP.
Pelo exposto, tem-se por não verificada a adopção de qualquer método proibido de prova, por parte dos órgãos de polícia criminal, improcedendo a alegada nulidade das provas obtidas nos autos, sendo por isso, admissíveis, atento o disposto no artigo 125.º do CPP.
Da validação das apreensões
Invocam os Arguidos a ausência de validação das apreensões efectuadas nos presentes autos, com inobservância do disposto no artigo 178.º do CPP, redundando na respectiva invalidade, atento o artigo 125.º do CPP.
Porém, tal expressa e efectivamente ocorreu, cf. consta do ponto 1 do despacho de fls. 248-251, de 25/06/2018.
Concomitantemente, o resultado daquelas apreensões foi considerado, nos termos constantes do despacho que decretou a medida de coacção aos Arguidos, em 25/06/2018, o teria e tem a virtualidade, ainda que tacitamente e em momento ulterior, de validá-las.
Nestes termos, tem-se por não verificada a suscita ausência de validação das apreensões efectuadas, o que ocorreu nos termos do disposto no artigo 178.º do CPP, improcedendo a suscitada nulidade, sendo por isso admissíveis nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 125.º do CPP.
Da junção aos autos dos objectos apreendidos
Face ao procedimento adoptado para junção dos diversos objectos apreendidos nos autos, suscitam os Arguidos a afectação da respectiva preservação, com repercussão na cadeia de custódia da prova e rastreabilidade da mesma, ao arrepio do disposto no artigo 178.º do CPP.
Depois de perscrutado o teor dos autos de busca e apreensão constantes dos autos, nada há apontar. Relativamente aos objectos neles referidos, parte encontra-se junta aos autos, designadamente aqueles que se corporizam em papel, enquanto as restantes foram acondicionados em local próprio, considerando a sua natureza volume e características, designadamente em armazém, cofre e instituição bancária, cf. consta de fls. 320-323 e 421-428, de modo a serem sujeitos a competentes exames periciais, nos termos retratados nos autos.
No que diz respeito à embarcação, uma vez que a mesma somente constituiu o meio de transporte do produto estupefaciente em causa nos presentes autos e que tal não integra qualquer elemento objectivo dos tipos em causa, nesta fase, escusamo-nos de qualquer outra referência, atentas as finalidades inerentes à presente fase de instrução.
Assim, tem-se por não verificado qualquer incumprimento do disposto no artigo 178.º do CPP, mantendo a respectiva admissibilidade nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 125.º do CPP.
*
Inexistem quaisquer questões prévias ou outras excepções de que cumpra conhecer e que impeçam a prolação de decisão instrutória.
Fundamentação
Antes de mais, importa referir que a fase da instrução constitui uma fase facultativa no processo penal e que visa comprovar judicialmente a decisão de deduzir acusação ou arquivar o inquérito. Esta fase, que decorre sob a direcção do Juiz de Instrução Criminal, compreende todos os actos que este entenda levar a cabo, indicados ou não pelo sujeito processual que requer a abertura de instrução e, obrigatoriamente, um debate instrutório, oral e contraditório, nos termos dos artigos 288.º e 289.º, ambos do CPP.
O juízo de pronúncia ou não pronúncia a formular pelo juiz depende da recolha de indícios suficientes da prática do facto em discussão pelo(s) arguido(s), atento o disposto no n.º 1, do artigo 307.º, do CPP, entendendo-se ser suficiente a indiciação que num juízo de prognose, pressupondo a sua manutenção e eventual reforço em sede de audiência de julgamento, faz antever uma possibilidade razoável de à(aos) Arguida(os) ser aplicada, por força deles, uma pena ou medida de segurança, atento o disposto no n.º 2, do artigo 283.º, do CPP, à semelhança do que se prevê para dedução de acusação. Neste sentido, cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/05/2008, Proc. 1616/08 - DGSI, que assim, resumidamente, sumariou:
“III- Para a pronúncia, como para a acusação, a lei não exige a prova, no sentido da certeza moral da infracção, bastando-se com indícios da sua prática, de onde se possa formar a convicção de que existe uma probabilidade razoável de ter sido cometido um crime pelo arguido.
IV - Assim sendo, os indícios probatórios - que não a mera discordância legal, doutrinal ou jurisprudencial - são suficientes sempre que dos mesmos resultar uma probabilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou medida de segurança – art.ºs 283.º, n.ºs 1 e 2, e 308.º, n.ºs 1 e 2, do CPP.
V - Tanto a doutrina como a jurisprudência têm realçado que a "possibilidade razoável" de condenação é uma possibilidade mais positiva que negativa: "o juiz só deve pronunciar o arguido quando pelos elementos de prova recolhidos nos autos, forma a sua convicção no sentido de que é mais provável que o arguido tenha cometido o crime do que o não tenha cometido" ou, noutras palavras, os indícios são suficientes quando existe "uma alta probabilidade de futura condenação do arguido, ou, pelo menos, uma probabilidade mais forte de condenação do que de absolvição (...)".
Pelo que a presente instrução visa a comprovação judicial da decisão de proferir despacho de acusação em ordem a submeter ou não a causa a julgamento, atento o disposto no n.º 1, do artigo 286.º do CPP.
Circunstâncias a serem indagadas e aferidas tendo por horizonte a verificação ou não da prática, designadamente, dos imputados crimes de adesão a associação criminosa, previsto e punível pelo n.º 2 do artigo 28.º e tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelo artigo 21.º ex vi alínea a) do artigo 24.º, ambos do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, cf. acusação pública com a ref.ª 47478741, de 18/12/2018.
Estes autos, na parte que agora releva, incidiram sobre as circunstâncias em que embarcação O., adquirida pelo Arguido MA em 2013, proveniente de Grenada, nas Caraíbas, no dia 21/06/2018, de manhã, navegava com os Arguidos MA, ZB e LH a bordo, na ZEE nacional, transportando produto estupefaciente, na quantidade descrita nos autos, colocado e dissimulado no interior da embarcação, em local não facilmente acessível.
Nos termos explanados no RAI os Arguidos, relativamente à acusação pública, suscitam o seguinte:
• Insuficiência dos autos para lhes ser imputada a factualidade vertidas no n.º 2, n.º 3, n.º 6, n.º 11 e nº 14 (Plano e Rota).
• Insuficiência dos autos para lhe ser imputada a factualidade vertida no n.º 28 (avultados ganhos).
• Incoerência da acusação relativamente à quantidade de produto estupefaciente imputada, vertida nos pontos 12, 13, 17 e 22.
Concluem, por fim, considerando ser admissível a conclusão pela co-autoria do crime de tráfico de estupefacientes, mas não quanto ao crime de adesão a associação criminosa, por inexistirem indícios, bem como, por tal crime estar em concurso aparente com o crime de tráfico agravado de que os
Arguidos vêm acusados.
Considerando o teor dos elementos probatórios recolhidos em sede de inquérito e instrução, desde já se adianta, afigura-se-nos existir fundamento suficiente para concluir, ainda que parcialmente, no mesmo sentido daquele que logrou ser alcançado pelo Ministério Público em despacho de acusação com a ref.ª 47478741, de 18/12/2018.
• Insuficiência dos autos para lhes ser imputada a factualidade vertida no nº 2, nº 3, nº 6, nº 11 e nº 14 (Plano e Rota).
No que diz respeito a esta, consta dos autos informação proveniente do MAOC, cf. fls. 5, que identifica e sinaliza a origem e destino da embarcação, até ter sido localizada e interceptada, cf. fls. 15-17, relatório de exame a aparelhos de navegação de fls. 868-878, bem como declarações prestadas pelo Arguido MA , aquando do respectivo interrogatório de arguido detido no dia 25/06/2018, cf. auto de fls. 257-265.
Assim, considera-se que tal factualidade está suficientemente indiciada.
• Insuficiência dos autos para lhe ser imputada a factualidade vertida no n.º 28 da acusação pública (avultados ganhos).
Relativamente ao ganho expectável com a quantidade de produto estupefaciente apreendido, considerando o teor do exame laboratorial junto aos autos, foi realizada a respectiva avaliação, concluindo-se que os respectivos ganhos estão contidos entre os valores de trinta e seis milhões, seiscentos e oito mil, trezentos e trinta e seis euros e sessenta e nove cêntimos (€ 36.608.336,69 euros) e quarenta e quatro milhões, setecentos e trinta e um mil, seiscentos e quarenta e sete euros e trinta e dois cêntimos (€ 44.731.647,32 euros), cf. parecer com a ref.ª 3124389.
• Incoerência da acusação relativamente à quantidade de produto estupefaciente imputada, vertida nos pontos 12, 13, 17 e 22.
No que diz respeito à quantidade de produto estupefaciente imputada, desde logo importa atender ao teor do exame laboratorial, de fls. 973, do qual resulta a quantidade de 1.208.610,52 Kg, devendo ser esta a quantidade considerada, por pericialmente validada.
Do crime de associações criminosas
Estatui o artigo 28º do Decreto-lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, o seguinte:
“1 - Quem promover, fundar ou financiar grupo, organização ou associação de duas ou mais pessoas que, actuando concertadamente, vise praticar algum dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º é punido com pena de prisão de 10 a 25 anos.
2 - Quem prestar colaboração, directa ou indirecta, aderir ou apoiar o grupo, organização ou associação referidos no número anterior é punido com pena de prisão de 5 a 15 anos.
3 - Incorre na pena de 12 a 25 anos de prisão quem chefiar ou dirigir grupo, organização ou associação referidos no n.º 1.
4 - Se o grupo, organização ou associação tiver como finalidade ou actividade a conversão, transferência, dissimulação ou receptação de bens ou produtos dos crimes previstos nos artigos 21. º e 22. º o agente é punido:
a) Nos casos dos n.ºs 1 e 3, com pena de prisão de 2 a 10 anos;
b) No caso do n." 2, com pena de prisão de um a oito anos (...) ".
O bem jurídico protegido por esta incriminação é a paz pública, constituindo-se como um crime de perigo abstracto, baseado na sua elevada perigosidade.
Relativamente ao tipo objectivo de ilícito, em primeiro lugar, é necessária a verificação da existência da associação, entendida esta como um agrupamento de dois ou mais indivíduos, que de forma minimamente organizada, com carácter de estabilidade e permanência, como que de forma sinalagmática acordem uma permanente cooperação. Ressalte-se ainda que deste acordo de vontades tem de resultar uma ideia de comunhão relativamente superior, ou colectiva, que subsiste e prevalece face à vontade individual de cada elemento considerado. Bem poderemos dizer que, no âmbito da associação terá de existir, surgir um próprio e específico conceito de bem comum, para o qual os membros partilham, para o qual devem participar. E ainda necessário que a associação tenha um "escopo criminoso", isto é, que tenha em vista a prática de crimes, neste caso, de tráfico de produtos estupefacientes ou percursores.
Para além disso, é punível pelo cometimento do crime de associações criminosas quem: as promover, fundar ou financiar, no sentido de intervir activamente na formação ou criação da própria associação; quem com ela colaborar directa e/ou indirectamente, aderindo ou apoiando-a, no sentido de dela fazer parte, em suma, dela ser associado, se subordine à sua vontade colectiva.
Quanto ao tipo subjectivo do ilícito, é pacífico na doutrina e jurisprudência que o tipo em análise é obviamente doloso, em qualquer das suas formas.
Dos elementos constantes dos autos, não se olvida que o produto estupefaciente em causa nos autos terá sido produzido por terceiros não identificados e, considerando a quantidade, bem como, o grau de pureza, admitem estar-se perante uma organização, susceptível de integrar o tipo em causa. No entanto, não resulta dos autos quaisquer indícios que sustentem a existência de tal organização, designadamente quanto ao seu carácter permanente e estável.
Porém, no que diz respeito à sua comercialização e transporte, apesar do produto estupefaciente apreendido e dissimulado na embarcação, nos termos retratados nos autos, não resulta dos autos que os Arguidos tivessem, assim, a prestar colaboração a qualquer organização criminosa, para efeitos do citado artigo, redundando que o faziam de modo próprio, para o seu interesse pessoal, com intervenção de terceiros, em conjugação de esforços, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 26.º do CP.
Efectivamente somente evidenciam os autos a existência de uma conjugação de vontades entre os Arguidos, para concretização do transporte do produto estupefaciente apreendido, sem que esteja indiciado que os mesmos tenham aderido ou prestado colaboração a qualquer associação, mas tão-somente, por mote próprio, concertaram vontades e saberes para, a troco de quantia pecuniária, procederem ao transporte de tal quantidade de produto estupefaciente, ainda que tenham recebido instruções de terreiros, quanto ao percurso a realizar.
Neste sentido, cumpre citar o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11/10/2016, Proc. n.º 196/14.4JELSB - DGSI - que assim sumariou:
"I. Para a existência do crime de associação criminosa para a prática de actividades de tráfico de droga, devem existir uma pluralidade de indivíduos, com o mínimo de estrutura organizatória e com um sentimento comum de ligação dos seus membros a um qualquer processo de formação da vontade colectiva;
II. Assim, verifica-se este crime quando duas ou mais pessoas decidiram criar uma estrutura de carácter permanente, organizada e estável, com vista a dedicar-se ao crime de tráfico de droga ou para a prática de branqueamento de bens e capitais provenientes do tráfico, e a existência de um qualquer processo de formação de vontade colectiva;
III. Tal não ocorre se entre os arguidos existia uma conjugação de esforços e vontades, com vista à prossecução de um fim comum - o transporte e desembarque de droga visando a obtenção de proventos económicos - que não ultrapassa a noção de comparticipação criminosa, em que cada um dos co-arguidos actuou, tendo em vista o seu próprio e exclusivo beneficio, o lucro pessoal que esperavam obter - e não um interesse superior que, de certa forma, os ultrapassasse, - sabendo que para atingirem tal desiderato necessitavam da colaboração e da intervenção de outros indivíduos (...) ".
Em face do exposto, considerando não estarem reunidos suficientes indícios susceptíveis de, num juízo de prognose, ser provável a condenação dos Arguidos pelo imputado crime de associações criminosas, previsto e punível pelo n.º 2 do artigo 28.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, impõe-se a sua não pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto na parte final do n.º 1 do artigo 308.º do CPP, o que se decide.
Do crime de tráfico de estupefacientes
Estatui o n.º 1 do artigo 21.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, o seguinte:
"1 - Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.º plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos (...)".
Este preceito legal contém o tipo base relativo à previsão e ao tratamento penal das actividades de tráfico de estupefacientes, constituindo um tipo de crime que assume a natureza de um crime de perigo abstracto.
A lei, nas condutas que descreve, basta-se com a mera aptidão que releva para constituir um perigo para determinados bens ou valores (a vida, a saúde pública, a tranquilidade e a coesão social), considerando integrado o tipo de crime logo que qualquer das condutas descritas se revele, independentemente das consequências que possa determinar ou efectivamente determine. Ou seja, a lei faz recuar a protecção normativa para momentos anteriores, isto é, para o momento em que o perigo se manifesta.
A construção e a estrutura dos crimes ditos de tráfico de estupefacientes, como crimes de perigo abstracto, de protecção recuada a momentos anteriores a qualquer manifestação de consequências danosas, e com a descrição típica alargada, pressupõem, porém, a graduação em escalas diversas dos diferentes padrões de ilicitude em que se manifeste a intensidade do perigo, que é abstracto para os bens jurídicos protegidos.
Ao nível da tipicidade objectiva deste ilícito, os elementos que a constituem são os seguintes:
• A prática não autorizada de qualquer das actividades descritas no normativo supra reproduzido;
• A não verificação de actividade de cultivo, aquisição ou detenção, com finalidade do consumo pessoal exclusivo; e
• A existência de plantas, substâncias ou preparações, compreendidas nas tabelas anexas 1, II, III e IV.
Por sua vez, o elemento típico subjectivo exigível para a incriminação pelos crimes de tráfico, é o dolo genérico, ou seja, a vontade de desenvolver sem autorização e sem ser para consumo pessoal exclusivo, as actividades descritas no tipo e a representação e o conhecimento por parte do agente da natureza e características estupefacientes do produto objecto da acção e uma actuação deliberada, livre e consciente de ser proibida a sua conduta.
Porém quando se verifique alguma das circunstâncias qualificativas agravantes estatuídas no artigo 24.º do mesmo diploma legal, designadamente, quando o agente obtenha e ou procure obter avultada compensação remuneratória, nos termos da respectiva alínea c), os limites mínimos e máximos da moldura das penas aplicáveis são agravados em um quarto.
Atendendo a todo o acervo probatório constante dos autos, designadamente declarações prestadas pelos Arguidos, autos de apreensão, exame laboratorial e parecer de avaliação que ganhos pecuniários advenientes com a comercialização do produtos estupefaciente apreendido aos Arguidos, considera-se estar suficientemente indiciados todos os pressupostos da responsabilidade jurídico-penal que, num juízo de prognose favorável, levarão à aplicação de uma pena aos Arguidos pela prática deste crime de tráfico de estupefacientes agravado, impõem-se a sua pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto na 1ª parte do n.º 1 do artigo 308º do CPP, o que se decide.
Decisão
Nestes termos, procedendo à avaliação de todo o material probatório constante dos autos e aderindo parcialmente às razões de facto e de direito enunciados na acusação pública decide-se:
Não pronunciar os Arguidos MA, ZB e LH, pela prática em Junho de 2018 do crime de associação criminosa, previsto e punível pelo artigo 28º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; e
Pronunciar para julgamento, em processo comum, perante Tribunal Coletivo os Arguidos: MA, melhor identificados nos autos; ZB, melhor identificados nos autos; e LH, melhor identificados nos autos.
Porquanto,
1. Os arguidos MA, LH e ZB, conjuntamente transportaram, desde a América do Sul para a Europa, com entrada através de Portugal, cocaína em pó, com vista à sua venda a terceiros e tendo por objectivo o lucro resultante dessa actividade.
2. Para o efeito, conceberam um plano tendente a permitir-lhes introduzir na Europa, em Junho de 2018, através de Portugal, por via marítima, 1.208.610,521 g de cocaína.
3. Em execução deste plano previamente delineado pelos Arguidos, decidiram proceder ao transporte de cocaína, por via marítima da referida quantidade de cocaína em pó.
4. Para o efeito, utilizaram o veleiro tipo Sailing Vessel, com um mastro, denominado "O. ", com pavilhão Ilhas Virgens Britânicas, com o número de registo 745425, com cerca de 49,25 pés de comprimento e 15,0 pés de largura, com o comprimento de cerca de 15 metros e que é propriedade desde 9 de Maio de 2013 do arguido MA e que por si foi comandado.
5. Ainda em execução deste plano, os Arguidos decidiram-se a reconfigurar através de obras, como reconfiguraram, algumas partes que ficam por debaixo do soalho do veleiro, por forma a aí poderem acondicionar, dissimuladamente, como o fizeram, grandes quantidades de cocaína em pó, para assim poderem fazer o seu transporte para a Europa e designadamente para os Açores.
6. Após, os Arguidos procederam ao transporte até à embarcação, acondicionamento e ocultação daquela cocaína que mais tarde lhes viria a ser apreendida.
7. O veleiro "O.", tripulado pelos 3 Arguidos e comandado pelo arguido MA, partiu de Grenada, nas Caraíbas, no dia 17 de Maio de 2018.
8. Entre os dias 27 de Maio e 2 de Junho de 2018, navegou pela América do Sul, nomeadamente pelo norte da República Cooperativa da Guiana, Suriname, Guiana Francesa e nordeste do Brasil, tendo por destino de navegação o arquipélago dos Açores.
9. Os aludidos pontos de navegação eram desconhecidos dos arguidos à partida de Caraíbas, e foram-lhes sendo transmitidos, via rádio, ao longo da viagem, por outros elementos e cuja identidade não se logrou apurar.
10. Em um dos pontos de navegação, que não foi possível concretamente identificar, e de acordo com o previamente combinado entre todos os arguidos, em data não concretamente apurada, mas que certamente se situa no período imediatamente anterior à sua partida com destino à Europa, em 17 de Maio de 2018, e o dia 22 de Junho de 2018, data da sua intercepção pelas autoridades portuguesas, vieram os ora arguidos, executando o plano já referido, a colocar, no interior do veleiro "O. ", um total de 1200 embalagens contendo cocaína cloridrato, ocultando-a nos compartimentos secretos que tinham sido criados para o efeito por debaixo do soalho.
11. Estas embalagens de cocaína cloridrato, têm o peso de 1.208.610,52Kg e 84% de pureza.
12. Após, os 3 Arguidos, sempre agindo de comum acordo e concertadamente, tripularam a aludida embarcação dando execução ao plano previamente acordado, fazendo a viagem com destino à Europa, assim guardando e transportando aquela cocaína cloridrato.
13. Na sequência de informações obtidas via MAOC - Maritime Analysis and Operations Centre - Narcotics, as autoridades portuguesas localizaram o veleiro "O. " e os Arguidos nas coordenadas 037º 31.8 N, 030º 19.6 W, no Oceano Atlântico, ao largo dos Açores, que assim vieram interceptar no dia 21 de Junho de 2018 pelas 7h30, naquelas mesmas coordenadas 037º 31.8"N; 030º 19.6"W.
14. Pelas condições do estado do mar, que não permitia abordagem em segurança ao veleiro O., foi a embarcação conduzida ao porto comercial da cidade da Horta, na ilha do Faial, Açores, onde chegou no dia 22 de Junho de 2018 pelas 8h da manhã.
15. As buscas foram iniciadas no dia 22 de Junho de 2018 pelas 12h00 e terminadas no dia 24 de Junho pelas 15h.
16. Foi no dia 23 de Junho, entre as 15h e as 21 h, no interior do veleiro "O." e na posse dos arguidos, que foram encontradas e apreendidas, um total de 1200 embalagens cocaína cloridrato com o peso de 1.208.610,52 Kg.
17. Cada uma daquelas 1200 embalagens estava revestida a plástico e ostentava um autocolante com a imagem de uma pantera negra.
18. Estas quantidades de cocaína cloridrato estavam ocultadas debaixo do soalho do veleiro em dois compartimentos secretos propositadamente criados para a sua dissimulação.
19. Assim, 1174 destas embalagens encontravam-se dissimuladas numa estrutura cavernosa construída entre o soalho e o casco do veleiro; e designadamente debaixo da cama/sofá situado a meia-nau, e debaixo da qual deveria estar um depósito de combustível.
20. As restantes 26 estavam escondidas por baixo de uma robusta caixa feita em fibra, que se encontrava cravada no soalho e de difícil remoção, e cuja função seria alojar quatro baterias de grandes dimensões.
21. Os 1.208.610,52Kg de cocaína cloridrato, com um grau de pureza de 84% correspondem a 5.077.372 doses.
22. As doses referidas, atento o grau de 84% de pureza, ainda seriam misturadas, vulgo cortadas, com outras substâncias antes da sua venda ao consumidor final.
23. Os Arguidos conheciam perfeitamente a natureza estupefaciente e proibida da cocaína cloridrato que detiveram, guardaram e transportaram.
24. Foi em conjugação de esforços e em execução de plano previamente delineado, que agiram do modo descrito.
25. A totalidade do produto estupefaciente destinado a venda a terceiros, visando obter, por essa via, globalmente, uma quantia de trinta e seis milhões, seiscentos e oito mil, trezentos e trinta e seis euros e sessenta e nove cêntimos (€36.608.336,69 euros) a quarenta e quatro milhões, setecentos e trinta e um mil, seiscentos e quarenta e sete euros e trinta e dois cêntimos (€44.731.647,32 euros).
26. Os Arguidos ao actuarem conforme descrito contribuíram, na parte que lhes competia, para a prática do crime, agindo sempre com a consciência que o cumprimento das respectivas tarefas era indispensável à prossecução dos seus objectivos.
27. Quiseram levar à prática os factos ilícitos antes mencionados para deles retirarem todos, globalmente, benefícios económicos particularmente importantes que se cifrariam, pelo menos, entre a quantia supra indicada.
28. Os Arguidos actuaram sempre, nos moldes descritos, em comunhão de esforços e união de vontades, destinados à prática do crime de tráfico de estupefacientes em grande quantidade, com a finalidade comum de obterem grandes proventos económicos.
29. Actividade a que já se vinham dedicando desde data não apurada.
30. Agiram de comum acordo, livre, voluntariamente e conscientemente.
31. Bem sabiam que as descritas condutas eram proibidas e punidas por lei.
32. Os arguidos, aquando da sua intercepção em 22 de Junho, detinham €2450,00 (dois mil e quatrocentos e cinquenta euros) em numerário; £420,00 (quatrocentas e vinte libras inglesas) em numerário; e €470,00 (quatrocentos e setenta euros) em numerário.
33. Estas quantias em dinheiro serviam para fazerem face às despesas da viagem entre o seu ponto de partida, nas Caraíbas, e os Açores.
34. Assim, quer as aludidas quantias em dinheiro apreendidas quer o veleiro "O. " são, respectivamente, produto e meio da prática da actividade de tráfico de estupefacientes descrita.
Praticaram os arguidos, pelo exposto, em co-autoria material, na forma consumada:
• Um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelo n.º 1 do artigo 21.º, alínea c) do artigo 24.º e tabela anexa I-B, todos do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Prova: Pericial:
• Relatório do exame de toxicologia do Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária a fls. 881;
• Autos de exame pericial a telemóvel e tablet de fls. 798 e ss. Documental: toda a dos autos e designadamente:
• Autos de Busca e Apreensão de fls. 45, 60, 82, 161,218;
• Autos de Testes rápidos e pesagem do produto aprendido a fis. 160 e 232;
• Autos de apreensão do produto estupefaciente a fls. 161 e 21 8;
• Reportagens Fotográficas a fis. 163, 227 a 231;
• Auto de Apreensão a fls. 170.
• Certificado de registo da embarcação de fls. 85 e ss;
• Relatório de exames de navegação de fls. 867 e ss;
• Informação da Autoridade Marítima Nacional, com a ref.a 3091690; e
• Parecer do Departamento de Perícia Financeira e Contabilística da Polícia Judiciária, com a ref.ª 3124389.
Testemunhal:
…
Custas devidas a final, fixando-se a taxa de justiça em duas (2) UC, por cada Arguido, atento disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 515.º do CPP ex vi n.º 9 do artigo 8.º do RCP.
Notifique.
*
Neste momento, foram confrontados os presentes, com um documento junto pela PSP de Angra do Heroísmo ao processo, ref.ª Citius 3180465, tendo sido dada a palavra ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, pelo mesmo foi dito e redigido, em súmula, para a acta o seguinte:
"As nossas preocupações de há pouco da situação processual dos arguidos predem-se também com este aspecto, do perigo de fuga, com o aproximar-se o processo do final da decisão.
Não tínhamos conhecimento desta situação, mas a verdade é que, aquilo que ela nos diz, é que o perigo de fuga, seja não está consumado está neste momento perfeitamente consumado que eles já nem se vão apresentar e ao violarem essa medida de coacção fugiram às suas obrigações.
Implica para nós, que estes arguidos neste momento estão em fuga, e esta fuga é actual, é uma fuga a que importa pôr um ponto, através desta medida de coacção de prisão preventiva e a emissão imediata de mandados de detenção internacionais contra estes arguidos.
Já há pouco dizia que achava que os arguidos estavam regularmente notificados para esta audiência, e até estranho, sinceramente que alguém venha dizer que eles não estão regularmente notificados, por não terem uma tradução da notificação, mas quando estão representados por mandatário que reúne sistematicamente com eles e o mandatário comparece, é estranho que os arguidos não tenham comparecido mas é certo que eles estão notificados.
Deve ser aplicada a medida de coacção de prisão preventiva aos três arguidos e devem ser emitidos os mandados de detenção internacionais de modo a evitar maiores estragos.
Peço Justiça.
Dada a palavra ao Dr. HF, pelo mesmo foi requerido um prazo de 5 (cinco) dias de vista relativamente a essa informação que lhe foi agora facultada.
Seguidamente pelo Mmº Juiz de Direito foi proferido o seguinte:
DESPACHO:
Considerando e evidenciado o perigo de fuga, se é que já não se concretizou, dos arguidos, para pôs cobro a essa circunstância, se indefere o prazo requerido pelo ilustre mandatário dos arguidos, passando-se de imediato à prolação da decisão relativa ao estatuto coactivo dos arguidos face à decisão de pronúncia ora proferida.
Do estatuto coactivo dos Arguidos
Dos elementos constantes dos autos, resulta fortemente indiciada a prática por parte dos Arguidos MA, ZB e LH do crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, al. c), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela anexa I-B, por que vão pronunciados, nos termos supra enunciados.
Depois de notificados do despacho proferido a 26/04/2019, com a ref.ª 48067359, alegando constrangimentos de ordem pessoal, que se prendem com o respectivo estatuto coactivo, vieram os Arguidos requerer, cf. ref.ª 3137829, para o que agora releva:
• A emissão e entrega aos Arguidos de cópia certificada dos respectivos passaportes.
• A revogação da proibição de contactos entre si ou, a autorização para que os três arguidos se reúnam em conjuntos com os seus advogados.
O Ministério Público considerando a recrudescência do perigo de fuga, cf. ref.ª 48079581 e 3134060 promoveu a adopção de medidas de efectivação e controlo do cumprimento das medidas de coacção dos arguidos e a alteração das medidas de coacção de apresentações diárias para três vezes ao dia, às 9h, 14h e 20h, bem como o indeferimento do requerido pelos Arguidos.
Exercido o contraditório vieram os Arguidos pugnar pelo deferimento do que haviam requerido e pelo indeferimento do requerimento do Ministério Público.
Para além disso, depois de sujeitos às medidas de coacção determinadas por despacho proferido no passado dia 26/04/2019, com a ref.ª 48067359, ficaram os Arguidos sujeitos às medidas de coacção ali determinadas, designadamente de apresentações periódicas, as quais cumpriram, tendo, por isso, delas ficado cientes, até ao passado dia 24 e 26 de maio, dias em que os três arguidos incumpriram com tais medidas coactivas, tendo deixado de ser vistos, cf. consta de informação da PSP de Angra do Heroísmo, remetida hoje, com a ref.ª 3180465.
O Ministério Público considerando a existência de perigo de fuga, promoveu a aplicação de prisão preventiva aos Arguidos.
Apreciando,
Nos presentes autos, mantem-se o concreto perigo de fuga, atenta a natureza, a gravidade e as circunstâncias em que o ilícito, por que vão pronunciados, foi praticado, nos termos constantes do despacho de fls. 264-265, que se deu e se dá por integralmente reproduzido para os legais efeitos, cf. artigo 204.º, alínea a) do CPP.
As medidas de coacção constituem limitações a direitos fundamentais, cuja compressão, somente são legalmente admissíveis, quando sejam necessárias, adequadas e proporcionais, atendendo às concretas exigências cautelares, à gravidade do crime em causa e face à pena aplicável, atento o disposto no artigo 18.º, artigo 32.º, ambos da CRP e artigo 193.º do CPP.
Nos presentes autos, concorda-se com o Ministério Público sobre a premência do perigo de fuga dos Arguidos, nos termos retratados nos autos, agudizado com o incumprimento das apresentações a que estavam sujeitos, inexistindo qualquer outra, que seja suficiente para o acautelar, o que releva para efeitos do disposto no artigo 203.º do CPP.
Considerando a decisão de pronúncia ora proferida, que dilata o prazo de prisão preventiva, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 215.º do CPP, face à existência de fortes indícios da prática pelos Arguidos de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelo artigo 21.º, artigo 24.º e tabela anexa, todos do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, bem como a factualidade supra evidenciada de incumprimento das medidas de coacção a que os Arguidos se encontram sujeitos, o que evidencia a impossibilidade de audição prévia destes Arguidos, uma vez que a sua localização é desconhecida, por se revelar adequada, proporcional e necessária, atendendo ao conjugadamente disposto nos artigos 191.º a 194.º, alíneas a) e b), do n. 0 1, do artigo 202.º, alínea a) do artigo 204.º, artigo 203.º, alínea c) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 215.º, todos do CPP, determina-se que os Arguidos MA , ZB e LH aguardem os ulteriores termos processuais submetidos à medida de coacção de prisão preventiva.
Até à efectivação da medida de coacção agora determinada, mantêm-se as medidas anteriormente estabelecidas, atento o disposto no artigo 210.º do CPP.
Emita mandados de detenção, inclusive internacional, e de condução ao EP. Notifique e comunique nos termos do disposto no n.º 10, do artigo 194.º, do CPP. Proceda-se à correspondente tradução.
Oportunamente, comunique a prisão preventiva ao TEP e DGRSP.
*
Oportunamente, remeta à distribuição para julgamento.
*
Dada a palavra ao Ilustre Mandatário dos arguidos, Dr. HF, pelo mesmo foi dito o seguinte:
Não foi dado cumprimento ao disposto no nº 4 do art.º 194 do CPP, pelo que a presente decisão deve ser reparada ou deve declarar-se que não produz efeitos o despacho de 26 de Abril de 2019, não foi atempadamente comunicado na língua que os arguidos dominam, requerendo-se que, logo que possível, a secretaria do Tribunal da Horta, remeta via Email as correspondentes traduções.
Ainda que se entenda que houve violação de obrigações impostas, o art.º 203 do C.P.P. manda atender aos motivos da violação, razão pela qual é essencial conceder aos arguidos um prazo de 10 (dez) dias, para virem aos autos explicar os motivos pelos quais não se apresentaram nalguns dias na esquadra da PSP.
Acresce que, quer o art.º 107º-A do CPP, quer o art.º 117º nº 3 do mesmo compêndio normativo consentem que os arguidos venham justificar a falta de comparência no dia de hoje.
Assim requer-se que, para além de ser reconhecida a invalidade invocada, seja designada nova data para o interrogatório dos arguidos.
Acresce que conforme ensina Jorge Miranda na Constituição anotada em co-autoria com Rui Medeiros, do art.º 28 nº 4 da Constituição, não consente que haja hiatos temporais subtraídos à contagem dos prazos que delimitam a duração máxima da prisão preventiva.
Pelo que, uma vez que extinta esta por ultrapassagem do seu limite temporal é inviável a sua nova aplicação.
*
Dada a palavra ao Digníssimo Magistrado do Ministério Público, pelo mesmo foi requerido, em súmula:
Indeferir-se aquilo que agora se requer e manter a emissão dos mandados internacionais com vista à detenção destes arguidos onde quer que se encontrem.
*
Após, pelo Mmº Juiz de Direito foi proferido o seguinte:
DESPACHO
Conforme já constava do despacho anteriormente proferido os arguidos notificados do despacho de 26 de Abril de 2019, que lhes impôs as medidas de coacção nele referidas, nomeadamente apresentações periódicas.
Independentemente da notificação dos mesmos, passaram a cumprir as apresentações tanto mais que nada foi relatado pelo OPC (Órgão de Polícia Criminal) da área de residência, o que demonstra que os mesmos ficaram cientes das suas obrigações, considerando-se por isso sanada a arguida irregularidade.
Estando cientes das respectivas apresentações, o que fizeram até pelo menos ao dia 24 de Maio de 2019 ou 25 de Maio de 2019, deixaram de o fazer nos termos que constam da informação prestada pela PSP, o que evidencia e demonstra efectivo incumprimento das medidas de coacção a que sabiam e estavam sujeitos, o que releva para efeitos do artigo 213º do C.P.P.
Inexistem dúvidas de que os arguidos incumpriram as medidas o que evidencia que as mesmas não eram suficientes para colmatar os perigos que justificaram a aplicação das mesmas.
Atendendo a natureza dos factos aqui em causa, bem como ao facto de ser desconhecido o paradeiro dos arguidos inexistem fundadamente condições para audição prévia dos arguidos nos termos requeridos pelo ilustre defensor dos mesmos, havendo circunstâncias factuais fundadas que evidenciam a impossibilidade da realização daquela audição, nos lermos e para os efeitos no n.º 4 do art.º 194º do CPP.
Em suma, tem se por não verificadas quaisquer irregularidades ou nulidades enunciadas pela defesa dos arguidos.
No que diz respeito à notificação dos mesmos para comparência no dia de hoje foi já proferida decisão, pelo que nada mais há a determinar.
Notifique.”
7.2. Apreciação.
O Digno Magistrado do MºPº sustenta contrariamente ao entendimento efectuado na decisão recorrida que se mostra indiciado o crime de adesão a associação criminosa.
Afigura-se-nos claro e evidente a razão do recorrente.
Como não considerar que três homens de profissões simples, sendo um chefe de mesa e os outros dois marinheiros, sendo dois residentes na Croácia e outro em Maiorca (Baleares, Espanha), actuaram no âmbito de uma organização mais ampla, quando se têm por certo os seguintes factos reconhecidos em parte no despacho de pronúncia:
Transportaram desde o Caribe até à Europa (Açores) por barco, que foi objecto de transformações (esconderijos), cerca de tonelada e meia de cocaína em elevado grau de pureza (84%), cujo valor ascende a dezenas de milhões de euros.
Sendo um dos arguidos proprietário do barco desde 2013, não podia desconhecer o facto indiciado de que o mesmo foi objecto de modificações que consistiram em reconfigurar algumas partes, que ficam por debaixo do soalho do veleiro, por forma a aí poderem acondicionar, dissimuladamente, como o fizeram, grandes quantidades de cocaína em pó, para assim poderem fazer o seu transporte, tal como reconhecido no despacho de pronúncia.
O veleiro "O. ", tripulado pelos três arguidos e comandado pelo arguido MA, partiu de Grenada, nas Caraíbas, no dia 17 de Maio de 2018.
Entre os dias 27 de Maio e 2 de Junho de 2018, navegou pela América do Sul, nomeadamente pelo norte da República Cooperativa da Guiana, Suriname, Guiana Francesa e nordeste do Brasil, tendo por destino de navegação o arquipélago dos Açores.
E, tal como reconhecido no despacho de pronúncia, “Os aludidos pontos de navegação eram desconhecidos dos arguidos à partida de Caraíbas, e foram-lhes sendo transmitidos, via rádio, ao longo da viagem, por outros elementos e cuja identidade não se logrou apurar.”
A apurada navegação em barco intencionalmente transformado, sendo orientada à distância por outros, em actividade de tráfico internacional de estupefacientes, o valor económico do produto transportado, como o seu elevadíssimo grau de pureza, a sofisticação de meios e elevadas capacidades de organização evidenciadas, não permitem a conclusão alcançada na decisão recorrida de não verificação de um interesse superior que, de certa forma, ultrapassasse os meros intentos pessoais dos arguidos, e que conduzissem também à conclusão de inexistência de indícios de adesão a associação criminosa, como o demonstra exuberantemente também o facto de serem orientados quanto às coordenadas de navegação, numa típica acção de “Cartel”, que nunca confiaria o transporte de tão valiosa quantidade de cocaína a pessoas “externas” à associação, num “outsourcing” - que poderia permitir o roubo do produto por um “Cartel” rival, - a qualquer pessoa que não fizesse parte integrante da associação criminosa e que no final não recebessem parte do produto da venda resultante de tal operação, como é consabido pelas regras da experiência comum, - daí o controlo e orientação de coordenadas à distância, como também a possível presença nas imediações ainda que a algumas milhas marítimas de outra embarcação com a função de vigilância do trânsito marítimo e das autoridade e de possível escolta contra qualquer “Cartel” concorrente, como normal em tais circunstâncias.
Não se trata de uma mera situação de comparticipação ou de actuação em bando, pois de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, verbi gratia o Ac. de 7 de Janeiro de 2004, que assim reza:
“A noção de “bando”, figura de pluralidade, de concertação e também de organização, situa-se, no plano da construção, entre as dimensões da comparticipação, em relação à qual se apresenta como um “plus” diferenciador, e a organização de nível e relevo que integre já o conceito, tipicamente relevante, de associação criminosa.
A diferença qualitativa há-de situar-se essencialmente na dimensão organizativa e na predeterminação dos fins; só esta dimensão acrescenta ao «acordo ou juntamente com outros» um quid material de distinção. A actuação em “bando”, ou como membro de “bando”, significa necessariamente a existência de um sentimento de comunhão de fins, de pertença a uma pluralidade inorgânica diversa das individualidades, de especificidade de fins e objectivos determinados, diversos da simples conjugação ou soma de vontades individuais agregadas.
Na jurisprudência do STJ a noção de “bando” visa todas as situações de pluralidade de agentes, actuando de forma voluntária, concertada e de colaboração mútua, com um princípio de estruturação de funções (estruturação incipiente), que, embora mais graves do que a mera comparticipação, não podem ser ainda consideradas associações criminosas, por não existir uma organização suficientemente caracterizada, com níveis e hierarquias e com uma relativa diversidade e especialização de funções de cada um dos membros ou aderentes.
Considera-se necessário que “a actuação, em concreto, seja levada a efeito, ao menos por dois elementos”.
“Hão-de, assim, ser relevantes a existência de um grupo de pessoas, o sentimento e a vontade de pertença, uma estruturação organizatória mínima na direcção e na divisão de tarefas, a permanência no tempo e a predeterminação de finalidades, a actuação conforme plano previamente elaborado e em conjugação de esforços, o conhecimento por todos da actividade de cada um, e a divisão entre elementos do grupo dos proventos obtidos com a actividade”. (final de citação.)
Não deve escapar à apreciação do julgador o facto de os agentes do crime de tráfico internacional de estupefacientes, navegarem, como já foi visto também em submarinos (e, também, com número reduzido ao mínimo de tripulantes) ou veleiros (como in casu, de igualmente três), de elevado valor económico, especialmente transformados com o único propósito de ocultarem a actividade de transporte de elevadíssimas quantidades de droga, em elevadíssimo grau de pureza, como também in casu, no valor calculado entre 36 e 45 milhões de euros, e que se destinava à venda da qual resultaria quantia não inferior a 215.889.857 € (duzentos e quinze milhões oitocentos e oitenta mil e oitocentos e cinquenta e sete euros), – valor superior a vários Jackpots do Euromilhões, - lucro esse que seria distribuída por todos os elementos da associação, o que só pode ser levado a cabo por associações criminosas com sólida estrutura permanente, (como o revela também a orientação de coordenadas de navegação à distância, via rádio,) e com muito astronómica capacidade económica, e nunca por vulgares cidadãos de modesta, média ou até elevada capacidade económica pessoal, que não estivessem submetidos à vontade e desígnios da associação criminosa e que por todos repartiria os lucros da operação.
Será por isso o recurso julgado totalmente procedente, pronunciando-se os arguidos pelo crime de adesão a associação criminosa p. e p. pelo art.º 28º nº 2 do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, aditando-se à pronúncia os seguintes factos que constavam da acusação:
“1. Os arguidos MA, LH e ZB, juntamente com outros indivíduos cuja identidade não se logrou apurar, fazem parte de um grupo organizado que se dedica à importação e transporte, desde a América do Sul para a Europa, com entrada através de Portugal, de cocaína em pó, com vista à sua venda a terceiros e tendo por objectivo o lucro resultante dessa actividade.
2. Para o efeito, no seio daquele grupo, foi concebido um plano tendente a permitir-lhes introduzir na Europa, em junho de 2018, através de Portugal, por via marítima, de cerca de uma tonelada e meia de cocaína.
3. Em execução deste plano previamente delineado pelos arguidos e demais indivíduos com quem actuavam concertadamente, os arguidos decidiram proceder ao transporte de cocaína, por via marítima da referida quantidade aproximada de tonelada e meia de cocaína em pó.
4. Para o efeito, haveriam de utilizar o veleiro tipo Sailing Vessel, com um mastro, denominado “O.”, com pavilhão Ilhas Virgens Britânicas, com o número de registo …, com cerca de 49,25 pés de comprimento e 15,0 pés de largura, com o comprimento de cerca de 15 metros e que é propriedade e que foi comandado pelo arguido MA .
5. O referido veleiro é propriedade do arguido MA desde 9 de Maio de 2013. A embarcação O. foi adquirida em 2013, pelo Arguido MA, tem o registo n.º …, com pavilhão das Ilhas Virgens Britânicas.
6. Ainda em execução deste plano, os arguidos decidiram-se a reconfigurar através de obras, como reconfiguraram, algumas partes que ficam por debaixo do soalho do veleiro, por forma a aí poderem acondicionar, dissimuladamente, em dois lugares que não são facilmente acessíveis, como o fizeram, grandes quantidades de cocaína em pó, para assim poderem fazer o seu transporte para a Europa e designadamente para os Açores.
7. Após, os arguidos, por si e com a ajuda dos demais membros da aludida organização criminosa, procederam ao transporte até à embarcação, acondicionamento e ocultação da cerca de tonelada e meia de cocaína que mais tarde lhes viria a ser apreendida nos termos infra melhor descritos.”
(…)
“27. Foi em conjugação de esforços, conjuntamente e em execução de plano previamente delineado, que agiram do modo descrito.
28. A totalidade do produto estupefaciente é destinado a venda a terceiros, visando obter, por essa via, globalmente, quantia não inferior a 215.889.857€ (duzentos e quinze milhões oitocentos e oitenta mil e oitocentos e cinquenta e sete euros) atento o seu peso total e dado que, conforme resulta do Relatório Anual de 2016 do SICAD, tal produto é normalmente vendido ilicitamente aos consumidores por quantia não inferior a 42,52€ o grama.
29. Os arguidos ao actuarem conforme descrito contribuíram, na parte que lhes competia, para a prática do crime, agindo sempre com a consciência da sua integração no grupo e de que o cumprimento das respectivas tarefas era indispensável à prossecução dos objectivos do grupo a que aderiram, fazendo-os seus.
30. Assim, acrescentaram à estrutura da organização os seus meios individuais, o que fizeram através de laços de disciplina e hierarquia definidos para melhor levarem a cabo os seus intentos.
31. Quiseram ajudar a levar à prática os factos ilícitos antes mencionados para deles retirarem todos, globalmente, benefícios económicos particularmente importantes que se cifrariam, pelo menos, na quantia indicada em 26 da acusação.
32. Os arguidos, bem como os demais indivíduos não identificados, com quem actuavam concertadamente, juntaram-se em grupo e actuaram sempre, nos moldes descritos, em comunhão de esforços e união de vontades, destinados à prática do crime de tráfico de estupefacientes em grande quantidade, com a finalidade comum de obterem grandes proventos económicos.
33. Para tanto, actuavam nos termos descritos de forma conjugada e concertada.
34. Actividade a que já se vinham dedicando desde data não apurada.
35. Agiram de comum acordo, livre, voluntariamente e conscientemente.
36. Bem sabiam que as descritas condutas eram proibidas e punidas por lei.
37. Os arguidos, aquando da sua intercepção em 22 de Junho, detinham €2450,00 (dois mil e quatrocentos e cinquenta euros) em numerário; £420,00 (quatrocentas e vinte libras inglesas) em numerário; e € 470,00 (quatrocentos e setenta euros) em numerário.
38. Estas quantias em dinheiro haviam-lhes sido entregues por outros elementos, que não se identificaram, da organização criminosa em cujo âmbito actuavam, para fazerem face às despesas da viagem entre o seu ponto de partida, nas Caraíbas, e os Açores.
39. Assim, quer as aludidas quantias em dinheiro apreendidas quer o veleiro “O.” são, respectivamente, produto e meio da prática da actividade de tráfico de estupefacientes descrita.”
Praticaram os arguidos, pelo exposto, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo:
- Um crime de adesão a associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, nº 2, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na redacção que lhe foi dada pela Lei 45/96, de 3 de Setembro, com referência à tabela anexa I-B;
E
- Um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos art.ºs 21.º, nº 1 e 24.º, al. c), do citado Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela anexa I-B.”
Termos em se conclui pela total procedência do recurso interposto pelo Digno Magistrado do MºPº.
8. Decisão:
Em conformidade com o exposto acordam os juízes neste tribunal em julgar procedente o recurso interposto pelo MºPº e revogar a decisão recorrida, na parte da não pronúncia dos arguidos pelo crime de adesão a associação criminosa p. e p. pelo art.º 28.º, nº 2, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22-01, na redacção que lhe foi dada pela Lei 45/96, de 3 de Setembro, com referência à tabela anexa I-B.
Sem Custas.
(Texto elaborado de acordo com a raiz latina da língua portuguesa, em suporte informático e integralmente revisto pelos signatários)
Lisboa, 11 de Fevereiro de 2020
Ricardo Manuel Chrystello e Oliveira de Figueiredo Cardoso
Artur Daniel Tarú Vargues da Conceição