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DEFENSOR OFICIOSO
HONORÁRIOS
PARTE CIVIL
PARTES CÍVEL E CRIMINAL
Sumário
No âmbito do processo penal, tendo a ilustre Advogada nomeada, tal como para o efeito foi notificada, deduzido contestação à matéria criminal e cível, em nome do arguido/demandado, ao mesmo tempo que o defendeu, na audiência de julgamento, tem direito, de acordo com o previsto nos pontos 3.1.1.2 e 3.2 da Tabela anexa à Portaria nº 1386/2004, de 10.11, a receber, cumulativamente, honorários pelos serviços prestados na parte penal e na parte civil
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
1. No processo n.° 246/19.8GCSSB, do Juízo Local Criminal do Seixal, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, foi proferido despacho, de 17 de Fevereiro de 2023, em que a Mmª Juíza a quo decidiu manter a decisão reclamada, proferida pela senhora escrivã do juízo, que rejeitou o pagamento de honorários, na parte cível, à ilustre senhora advogada.
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2. Inconformada com essa decisão, dela recorreu a Ilustre Defensora, pugnando pela sua revogação e substituição por outra, que confirme o pedido de pagamento / compensação, efectuado pela recorrente, designadamente pela contestação do pedido de indemnização civil apresentado, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões: “A. A questão objeto do presente recurso, como emerge do que supra se expôs, está em aferir se são ou não devidos honorários pela contestação do pedido de indemnização civil em processo penal, pelo ponto 3.2 da tabela anexa à Portaria 1386/2004, de 10 de novembro, quando o Defensor Nomeado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 64.° do Código de Processo Penal, ainda não conhecia da decisão por parte da Segurança Social quanto ao requerimento de proteção jurídica apresentado pelo Arguido. B. Refira-se que a aqui recorrente, submeteu a pagamento na Plataforma informática SINOA (Sistema de Informação Nacional da Ordem dos Advogados) os seus devidos e legítimos honorários, designadamente, pelo exercício do patrocínio de forma plena nos termos da nomeação, em virtude das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 16.° da Lei 34/2004, de 29 de Julho, alterada e republicada pela Lei n.° 47/2007 de 28 de Agosto. C. Neste intuito, a aqui recorrente, apresentou, nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 1 do art.° 25.° da Portaria 10/2008, de 03 de janeiro, do previsto na Portaria 1386/2004, de 10 de novembro e tabela anexa, nomeadamente do constante do ponto 3.2 desta, o respetivo pedido de pagamento dos honorários devidos. D. Não obstante, o referido pedido de pagamento de honorários foi rejeitado pela Secretaria do Tribunal apesar de tal pagamento ser legalmente devido nos termos do acervo legal supra citado. E. Na notificação referente à recusa do pagamento em causa peticionado consta "Motivo: Identificação da entidade que não confirmou a prestação do(s) serviço(s) " F. Não se conformando com o entendimento da Secretaria (cfr. Doc. 7), a Recorrente apresentou Reclamação do ato de não confirmação dos honorários por si lançados, nos termos do disposto no n.° 5 do art.° 157.° do CPC ex vi art.° 4.° do CPP. (Cfr. Doc. 5 e Doc. 6) G. Por Despacho de 17.02.2023, veio o Tribunal recorrido pronunciar-se pelo indeferimento da Reclamação apresentada pela Recorrente, sustentando o entendimento da Secretaria. (Cfr. Doc. 8) H. Ora, mantendo o entendimento da Secretaria e indeferindo a Reclamação apresentada pela ora Recorrente, o Despacho em referência e de que ora se recorre enferma, salvo melhor opinião que não se discerne, de errónea apreciação dos factos, bem como de equívoca interpretação e aplicação do quadro jurídico pertinente in casu. I. Resulta claro, incontrovertido e incontrovertível, que a Recorrente foi nomeada para representar o Arguido A, no âmbito do processo-crime n.° 246/19.8GCSSB, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 64.° do Código de Processo Penal, tendo, a ora recorrente, ficado nomeada para o respetivo processo, de acordo com o estipulado artigo 2.° da Portaria 10/2008, de 03 de janeiro, dando origem ao Processo AJ n.° 38242/2022. J. Ora, ao contrário do entendimento prolatado pelo Tribunal a quo, dando sustentação a recusa de confirmação dos honorários lançados por parte da Secretaria, a verdade é que, muito embora a contestação do PIC não conste da tabela anexa à portaria 1386/2004, de 10.11, também as contestações das ações cíveis não estão previstas e obviamente que têm de ser pagas, pelo que tal argumento é completamente desprovido de razão. K. Mais, os instrumentos de apoio invocados pela Senhora Escrivã e confirmados pela Meritíssima Senhora Juiz de Direito no despacho ora em causa face à Reclamação apresentada pela Recorrente, não constituem fonte de Direito, mas simplesmente um mero documento de apoio, razão pela qual é de atentar na Portaria n.° 1386/2004, de 10.11., a qual dispõe, no seu n.° 1 do art. 2.° que "São devidos aos Advogados, pelos serviços que prestem no âmbito da proteção jurídica, os honorários constantes da tabela em anexo." L. Aliás, inclusivamente já existem diversas decisões judicias proferidas em casos análogos ao presente em que, justamente os Tribunais Judiciais respetivos decidiram das reclamações dos atos de rejeição proferidos pelas secretarias. M. E, pois, manifesto que as decisões judiciais já proferidas e transitadas em julgado sobre a presente matéria, prevalecem sobre os documentos de apoio invocados (Manual da DGAJ) que não são de todo fontes de direito, ao contrário do que sucede com as decisões judiciais! N. Atendendo ao supra referido, há que fazer menção, a título meramente exemplificativo de várias situações análogas - existindo muitas outras - à questão em apreço, que foram apreciadas e bem decididas, designadamente: • Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do processo n.° 144/18.2T9BRG-A.G1, datado de 04-04-2022, do qual se cita no sumário: - Tendo sido a ilustre advogada nomeada defensora ao arguido por imposição legal, na sequência de acusação contra ele deduzida nos mitos, essa representação mantém-se para os actos subsequentes do processo, incluindo para os atinentes à instância cível enxertada nos autos, independentemente de a nomeação não decorrer de requerimento de proteção jurídica nessa modalidade formulado pelo arguido à autoridade administrativa competente. II - Decorre do disposto no art. 66°, n° 5, do CPP a possibilidade de os honorários devidos ao defensor nomeado serem suportados pelas «partes civis», isto é, demandante ou demandado, consoante o desfecho do pedido de indemnização civil, do que se depreende que a remuneração do defensor inclui a sua actividade no que tange à instância cível, pois que de outra maneira não se compreenderia que a «parte civil» que decaiu fosse responsabilizada pela liquidação de honorários devidos a advogado com intervenção circunscrita à parte criminal. III- Tendo a ilustre advogada nomeada deduzido contestação à matéria criminal e cível em nome do arguido/demandado, arrolado testemunhas e igualmente defendido o arguido/demandado na audiência de julgamento tem direito, de acordo com o previsto nos pontos 3.1.1.2 e 3.2 da Tabela anexa à Portaria n° 1386/2004, de 10.11 [ex vi do art. 66°, n°5, do CPP], a receber, cumulativamente, honorários pelos serviços prestados na acção penal e na acção civil, pagamento que incumbe ao Estado em virtude de o seu representado ter obtido, entretanto, protecção jurídica na modalidade de dispensa de pagamento da compensação devida ao seu defensor.(...)" (negrito e sublinhado nosso) Lmfc:http://Www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/afe87a897482aa298025882c004db896?OpenDocument E, • Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do processo n.° 1958/15.0T9BRG-E.G1, datado de 12-09-2022, do qual se cita no sumário: " (...)! - Por força do art.º 44°, L. n.° 34/04, 29/7 (Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais) são aplicáveis aos casos de nomeação de Advogado em Processo Penal, os preceitos anteriores que se referem ao apoio judiciário, com exceção dos n.° 2) e 3), do respetivo art.º 18°, II - São pois, nesta sede diretamente aplicáveis as normas dos nº. 4) e 5) do referido art.° 18°, em que se pretende que a nomeação abranja tudo o que se relaciona com o processo em que ocorreu a nomeação. III - A nomeação de Defensor em Processo Crime abrange, pois, e também o pedido cível, se deduzido. IV - A Portaria nº 386/04, 10/11, trata autonomamente os honorários devidos ao Advogado pela intervenção em Processo Crime e no Processo Cível enxertado, pelo que os respetivos montantes devem ser cumulados - cfr. pontos 3.2. e 11.1.3., da referida tabela/...)'' (negrito e sublinhado nosso) Li«fe:http://Www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/400a6fle63a38fd9802588cb00335496?OpenDocument O. Nesta conformidade, salvo o devido respetivo por opinião distinta, toma-se evidente que não há qualquer fundamento legal para o determinado pela Meritíssima Juiz de Direito a quo no despacho ora em causa. P. Aliás, com a prolação do Despacho Judicial em apreço, s.m.o, a Meritíssima Juiz a quo parece desvalorizar o trabalho da defensora oficiosa nomeadamente quando refere, "(...) No caso dos autos a defesa do arguido não se mostra estar suportada pelo instituto de apoio judiciário, razão pela qual a nosso ver a senhora defensora não tem direito a honorários - a suportar pelo Estado - decorrentes do pedido cível (onde apresentou contestação por negação apenas). (...) "(sublinhado e negrito nosso) Q. Face ao teor das «conclusões» aportadas, e ressalvado o respeito devido, "A intervenção do Tribunal na fixação dos honorários deve limitar-se à aplicação da tabela, não havendo já campo para ponderar o tempo gasto, o volume e a complexidade da intervenção, os actos e as diligências realizadas pelo defensor, ou outros factores, que foram tidos em conta no estabelecimento dos escalões tabelares...". Acórdão da Relação de Lisboa, de 29.10.2003, in www.dgsi.pt. (sublinhado nosso) R. Ora, no presente caso é crucial não se perder de vista que aquando da notificação a 16-08-2022 para a Recorrente (defensora nomeada) contestar o PIC no prazo de 20(vinte dias), já o Arguido tinha apresentado o Requerimento de Proteção Jurídica para dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e compensação de Patrono para a respetiva defesa no processo crime e quanto ao Pedido de Indemnização Civil contra si formulado ( Cfr. Doc, 1) contudo ainda não havia decisão por parte da Segurança Social à data. S. Pelo que, como é evidente, sempre com o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do Arguido a Recorrente acompanhou todo o processo, tendo inclusivamente apresentado, em tempo, a respetiva contestação face ao pedido de indemnização civil apresentado pelo Assistente/Ofendido nos autos. T. Aliás, muito embora se refira, nomeadamente no TERMO apresentado pela Senhora Escrivã "(...) a falta de contestação não implica confissão dos factos( art° 78 n° 3 do CPP)" a verdade é que prazo para contestar o PIC não suspende havendo defensora oficiosa nomeada, e como é facilmente percetível por cada um de nós, salvo o devido respeito por opinião distinta, caso a ora Recorrente não contestasse o PIC apresentado pela parte contrária e posteriormente o pedido de proteção jurídico até viesse a ser deferido pela Segurança Social qual o grau de confiança que o Arguido teria no trabalho da Recorrente? U. Ora, s.m.o, passaria a ideia de que manifestamente há uma justiça para ricos e outra para pobres, pois se caso não estivéssemos perante uma situação de nomeação oficiosa, não contestar um pedido de indemnização civil apresentado pela parte contrária, a não ser que fosse logicamente estratégia processual, nunca seria, evidentemente, opção!! V. Será que nestes casos, enquanto não há decisão por parte da Segurança Social o Arguido deverá constituir mandatário quanto à matéria cível? W. E que seguindo o entendimento proferido pelo Tribunal a quo, o Arguido ficaria completamente conhecer da decisão sobre o pedido de proteção jurídica apresentado junto da Segurança Social. X. O que s.m.o, viola por completo o princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva! Y. No entanto importa ter presente que se os Defensores Oficiosos seguissem esta posição a verdade é que nos casos em que os pedidos de proteção jurídica viessem a ser deferidos e os Defensores Oficiosos nada tivessem feito em matéria civil de modo a acautelar os interesses dos Arguidos enquanto não soubessem a resposta ao pedido de proteção jurídica apresentados na Segurança Social poderiam inclusivamente vir a ser responsabilizados disciplinarmente. Z. Por outro lado, a interpretação que o Tribunal a quo propugna mostra-se de impossível harmonização com o disposto no n° 3 do art. 3º da Lei n.° 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 47/2007, de 28 de agosto, uma vez que, "3- E vedado aos profissionais forenses que prestem serviços no âmbito do acesso ao direito em qualquer das suas modalidades auferir, com base neles, remuneração diversa da que tiverem direito tios termos da presente lei e da portaria referida no n° 2 do artigo 45.° (negrito e sublinhado nosso). AA. Pelo que, dúvidas não podem haver de que tendo sido requerida pelo beneficiário de proteção jurídica, terá de aplicar-se analogicamente, o previsto no n° 4 do artigo 18.° da Lei n.° 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 47/2007, de 28 de agosto, onde, "o apoio judiciário mantém-se para efeitos de recurso, qualquer que seja a decisão sobre a causa, e é extensivo a todos os processos que sigam por apenso àquele em que essa concessão se verificar, sendo-o também ao processo principal quando concedido em qualquer apenso”. (negrito e sublinhado nosso) BB. E consequentemente, deverá também aplicar-se à remuneração da Recorrente, o ponto 3.2 da Tabela anexa à Portaria n° 1386/2004 de 10 de novembro. CC. Face ao supra exposto, outra solução não teve a ora recorrente senão recorrer do presente Despacho, pois até mesmo por uma questão de igualdade e justiça, a ora recorrente tem o pleno direito de receber a compensação material adequada pelos serviços jurídicos que efetivamente prestou! DD. Nesta conformidade, de acordo com a jurisprudência supra referida, de acordo com o disposto no n.° 1 do artigo 2º da Portaria n° 1386/2004, de 10 de novembro, e tabela anexa, ponto 3.2, entende aqui a ora recorrente (nomeada Defensora Oficiosa) que lhe é legitimamente devido o pedido de honorários referente à contestação do pedido de indemnização civil apresentado.”
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3. O recurso foi admitido, com efeito devolutivo, a subir de imediato e em separado.
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4. Subido o recurso a este Tribunal e, colhidos os vistos, foram os autos a conferência.
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5. Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem as razões de divergência com a decisão impugnada, a questão a examinar e decidir prende-se em saber se, em processo penal, os honorários devidos a defensor, oficiosamente nomeado ao arguido, incluem retribuição autónoma, designadamente pelo ponto 3.2 da tabela anexa à Portaria 1386/2004, de 10 de Novembro, por defesa ao pedido de indemnização civil, formulado, nos autos, pelo lesado, quando ainda não se conhecia a decisão, por parte da Segurança Social, quanto ao requerimento de protecção jurídica, apresentado pelo arguido.
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6. É o seguinte o teor do despacho recorrido:
“I - Reclamação da ilustre senhora advogada do arguido/ demandado A no que reporta à recusa de honorários relativos ao pedido de pedido de indemnização civil por parte da senhora escrivã; Vejamos; No caso, concorda-se com o exposto pela senhora escrivã no termo que antecede no que se reporta à rejeição de atribuição de honorários – autónomos- pelo pedido cível à senhora defensora nomeada do arguido/ também demandado A Salienta-se que este arguido/ demandado não beneficia de apoio judiciário, nomeadamente na modalidade de dispensa de taxa de justiça/ custas e de pagamento de honorários a advogado nomeado. Como é sabido nos termos dos artsº 62 nº1 e 64 nºs, ambos do CPP, a nomeação de defensor ao arguido é obrigatória quando contra ele for deduzida acusação, cabendo ao defensor exercer os direitos que a lei reconhece ao arguido, devendo, nessa medida, assisti-lo, como demandado, no pedido civil contra este interposto. A intervenção do defensor oficioso do arguido, sendo legalmente obrigatória, impõe, que exerça os direitos que a lei reconhece aos arguidos, incluindo a sua defesa no que concerne ao pedido de indemnização civil, até porque vigorando na nossa lei processual penal o sistema de adesão da demanda civil, nos termos do artº 71 do CPP, em regra, no mesmo processo, devem ser resolvidos e decididos os pedidos – crime e civil – ainda que as duas acções mantenham a sua natureza e características próprias. A função de defensor oficioso - é sempre remunerada, nos termos e quantitativos a fixar pelo tribunal, dentro dos limites constantes das tabelas aprovadas pelo Ministério da Justiça, sendo que os honorários a atribuir ao defensor em processo penal, ainda que nomeado fora do apoio judiciário, são as constantes da tabela anexa à Portaria nº 1386/2004, de 10/11, como estipula os Artº1 e 2 nº1 deste diploma. De acordo com esta tabela, os honorários a atribuir no âmbito do processo penal são os previstos nos pontos 3.1.1.1.1. e 3.1.1.1.2. (consoante a punibilidade dos crimes em causa), sendo que no ponto 3.2. da mesma se estabelece a atribuição de honorários ao pedido de indemnização civil deduzido no âmbito do processo penal, reportados aos previstos nas acções declarativas. Nestes termos, e efetivamente estabelecendo-se diferentes níveis de honorários em relação ao processo penal e ao pedido de indemnização civil que neste seja formulado, decorre a nosso ver, da lei que, no âmbito do apoio judiciário, os advogados têm direito a receber honorários pelos serviços prestados na acção penal e na acção civil, ou seja, em modo cumulativo (Cfr, neste sentido, Acórdão da Relação do Porto de 22/05/02, Proc. 0240412 e Acórdãos da Relação de Évora, Processo 229/13.1TAELV-A.E1 16 de dezembro de 2021, Proc. 115/17.6PBSTB.E1 de 06/10/20 e de 09/03/21, Proc. 20/15.0F1EVR-A.E1 e no mesmo sentido Acórdão - embora implicitamente - citado pela senhora advogada da Relação de Guimarães, Processo 144/18.2T9BRG-A.G1 de 04-04-2022 de todos in www.dgsi.pt). Neste último se se faz constar síntese que “ julgamos que assim será quer o defensor tenha sido nomeado ao arguido no processo penal por imposição legal,” pressuposto obviamente que este litigue com apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa e demais encargos com o processo e de pagamento da compensação a defensor oficioso, como sucede no caso (pois que de outra forma a responsabilidade pelo pagamento não caberia aos cofres do Estado), quer a sua nomeação se opere, a seu requerimento, no âmbito do instituto da proteção jurídica”. (Todos os destacados da nossa autoria). Assim apenas nesta sede, ou seja, quando o arguido / demandado litigue com apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa e demais encargos com o processo e de pagamento da compensação a defensor oficioso, se pode chegar à conclusão que os advogados têm direito a receber honorários pelos serviços prestados na acção penal e na acção civil, de modo cumulativo existindo uma diferença conforme os serviços prestados no âmbito da demanda civil enxertada no processo penal, estão ou não, cobertos pelo apoio judiciário. Se assim não acontecer, (como é o caso dos autos) mostra-se totalmente defensável que ao defensor obrigatoriamente nomeado ao arguido, nos termos do Artº 64 do CPP, apenas lhe seja devida a compensação pelo trabalho efectuado no âmbito do processo penal, até porque a defesa penal do arguido envolve, naturalmente, e consequentemente a sua defesa civil, pela necessária conexão das matérias em causa e pela plena tutela do exercício de defesa do arguido. No caso dos autos a defesa do arguido não se mostra estar suportada pelo instituto de apoio judiciário, razão pela qual a nosso ver a senhora defensora não tem direito a honorários - a suportar pelo Estado - decorrentes do pedido cível (onde apresentou contestação por negação apenas). Assim sendo, e em face do acima exposto decide-se manter a decisão reclamada proferida pela senhora escrivã do juízo que rejeitou o pagamento de honorários na parte cível à ilustre senhora advogada. Notifique.”
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7. Observados os autos, com interesse para a decisão a proferir, mostra-se assente a seguinte factualidade:
- Em 03.03.2022, no âmbito do processo-crime n.° 246/19.8GCSSB, foi nomeada a Senhora Dra. B, ora recorrente, para representar o arguido A, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 64.° do Código de Processo Penal;
- A 01.04.2022, foi apresentado PIC pelo Assistente/Ofendido.
-A 06.06.2022, o arguido apresentou Requerimento de Proteção Jurídica para dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e compensação de Patrono para a respetiva defesa no processo crime e quanto ao Pedido de Indemnização Civil contra si formulado.
- A 16.08.2022, foi a Exma. Senhora Dra. B notificada para o exercício dos prazo e obrigações decorrentes dos arts 311°-A e 311°-B do CPP, e, bem assim, do todo o conteúdo do pedido de indemnização civil formulado [1], cuja cópia foi junta, para, no prazo de 20 dias, apresentar, querendo, a contestação, nos termos do art. 78.° do CPP.
- A 27.08.2022, a Exma. Senhora Dra. B apresentou a respetiva contestação, quer à acusação deduzida contra o arguido, nos termos do art. 315º nº 1 e 2 do CPP, quer ao pedido de indemnização civil, nos termos do art. 78º nº 1 do mesmo diploma legal.
- Em Outubro de 2022, tomou a Senhora Dra. B conhecimento que o requerimento de proteção jurídica requerido pelo arguido tinha sido indeferido.
- Após a sentença proferida nos autos ter transitada em julgado (19-01-2023), foram submetidos a pagamento, na Plataforma informática SINOA (Sistema de Informação Nacional da Ordem dos Advogados), os honorários, tidos por devidos, designadamente pela defesa no âmbito do Processo Penal e pela contestação do Pedido de Indemnização Civil.
- O pedido de honorários relativos à apresentada contestação do pedido de indemnização civil foi rejeitado, pela Secretaria, no dia 22/01/2023 com o seguinte fundamento: "Motivo: Identificação da entidade que não confirmou a prestação do(s) serviço(s)”, apenas tendo sido confirmado o pedido de honorários referente ao Processo Penal.
- Não se conformando com o entendimento da Secretaria, a aqui recorrente apresentou, nos termos e para os efeitos do disposto no n.°5 do artigo 157.° do Código de Processo Civil, na data de 26/01/2023, complementada em 13/02/2023, Reclamação perante a Meritíssima Juiz a quo, nos termos da qual se insurgiu contra a circunstância de não lhe terem sido confirmados os honorários, relativos à Contestação do Pedido de Indemnização Civil, que deduziu nos autos principais, apesar de ter sido notificada para o efeito, pelo tribunal, considerando que inexiste fundamento legal para a recusa do referido pagamento.
- Em 09.02.2023, foi elaborado TERMO pela Senhora Escrivã de Direito, Referência n.° 423072593, a fundamentar a respetiva rejeição com a seguinte posição: "Consigno que os honorários pedidos pela Sra. Dra. B quanto à contestação do PIC foram rejeitados tendo em conta a tabela anexa à portaria 1386/2004 de honorários que apenas refere o pedido e não a contestação, bem como as indicações do Centro de Formação da DGAJ, que refere que “ o defensor tem direito ao pagamento dos honorários da parte cível quando for solicitada a sua nomeação através da Segurança Social. Quando a sua nomeação for obrigatória nos termos do art° 64° do CPP, os honorários são pagos em função da parte criminal pois a falta de contestação não implica confissão dos factos (art° 78° n° 3 do CPP)."
- Em 17.02.2023, em resposta à reclamação apresentada, por Despacho da Meritíssima Juiz a quo, foi indeferido o pedido de honorários referente à contestação do pedido de indemnização civil apresentado, por se ter entendido, em suma, que: “no caso dos autos, a defesa do arguido não se mostra estar suportada pelo instituto de apoio judiciário, razão pela qual a nosso ver a senhora defensora não tem direito a honorários - a suportar pelo Estado - decorrentes do pedido cível (onde apresentou contestação por negação apenas). Assim sendo, e em face do acima exposto decide-se manter a decisão reclamada proferida pela senhora escrivã do juízo que rejeitou o pagamento de honorários na parte cível à ilustre senhora advogada.”
Vejamos, agora, a questão que cumpre apreciar:
A Ilustre Advogada, ora recorrente, foi, em cumprimento do disposto no art. 64º, nº 3 do CPP, nomeada defensora ao arguido, na sequência de acusação, contra ele deduzida, nos autos, sendo que, enquanto não for substituída, tal representação se mantem, para os actos subsequentes do processo, conforme decorre do art. 66º, nºs 3 e 4 do CPP.
Cabe ao defensor exercer os direitos que a lei reconhece ao arguido, devendo, nessa medida, assisti-lo, como demandando, no pedido civil contra este interposto.
A função do defensor oficioso nomeado é sempre remunerada, de acordo com as tabelas em vigor, sendo certo que a responsabilidade do pagamento da remuneração é das pessoas referidas no art. 66º nº 5 do CPP, se forem condenadas e não gozarem de apoio judiciário ou dos cofres do Ministério da Justiça.
Com efeito, e conforme se refere no Ac do TRG de 04.04.2022, Processo: 144/18.2T9BRG-A.G1, disponível in www.dgsi.pt. : “Decorre do disposto no art. 66º, nº 5, do CPP a possibilidade de os honorários devidos ao defensor nomeado serem suportados pelas «partes civis», isto é, demandante ou demandado, consoante o desfecho do pedido de indemnização civil, do que se depreende que a remuneração do defensor inclui a sua actividade no que tange à instância cível, pois que de outra maneira não se compreenderia que a «parte civil» que decaiu fosse responsabilizada pela liquidação de honorários devidos a advogado com intervenção circunscrita à parte criminal”.
Já vimos que, em 16.08.2022, foi a Exma. Senhora Dra. B notificada, pelo tribunal recorrido, para o exercício dos prazo e obrigações decorrentes dos arts 311°-A e 311°-B do CPP, e, bem assim, do todo o conteúdo do pedido de indemnização civil formulado, para, no prazo de 20 dias, apresentar, querendo, a contestação, nos termos do art. 78.° do CPP, não obstante, a final, no mesmo tribunal ter sido proferida decisão que lhe negou o direito a receber honorários pela sua intervenção, na parte cível.
É sabido que, pelos serviços prestados no âmbito da proteção jurídica, [que abrange a nomeação de Defensor Oficioso, em Processo Penal, por via de imposição legal] são devidos honorários, fixados nos termos da tabela anexa à Portaria 1386/04, de 10/11.
Nos termos de tal Tabela, mais propriamente nos pontos 3.1. e 3.2., verifica-se que trata, de forma autónoma, os honorários devidos pela intervenção no processo crime em relação ao processo cível enxertado em processo penal [para a intervenção na parte crime preveem-se valores em U.R, sendo, por sua vez, o pagamento da intervenção na parte cível remetida, consoante o valor da acção, para os termos das acções cíveis declarativas].
Nos termos da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que regula o Acesso ao Direito e aos Tribunais, mais concretamente no seu artigo 44.º nº 1, intitulado, “Disposições aplicáveis”, estabelece-se que se aplicam à nomeação de Defensor em Processo Penal todas as regras do anterior Capítulo referente ao apoio judiciário, com exceção dos n.º 2) e 3) do art.º 18º, aplicando-se, por isso, os referidos n.º 4) e 5) do art.º 18º, aos casos de nomeação de Defensor em Processo Penal, onde se refere que “o apoio judiciário mantém-se para efeitos de recurso, qualquer que seja a decisão sobre a causa, e é extensivo a todos os processos que sigam por apenso àquele em que essa concessão se verificar, sendo-o também ao processo principal, quando concedido em qualquer apenso” e “o apoio judiciário mantém-se ainda para as execuções fundadas em sentença proferida em processo em que essa concessão se tenha verificado.”
Assim, se a ilustre Advogada nomeada, tal como para o efeito foi notificada, deduziu contestação à matéria criminal e cível, em nome do arguido/demandado, ao mesmo tempo que o defendeu, na audiência de julgamento, tem direito, de acordo com o previsto nos pontos 3.1.1.2 e 3.2 da Tabela anexa à Portaria nº 1386/2004, de 10.11, a receber, cumulativamente, honorários pelos serviços prestados na parte penal e na parte civil – no mesmo sentido, se decidiu, entre outros, nos acórdãos proferidos pelo TRG, de 04.04.2022 (já mencionado) e de 12.09.2022, ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
Como bem refere a recorrente, ao contrário do entendimento prolatado pelo tribunal a quo, dando sustentação à recusa de confirmação dos honorários lançados, por parte da Secretaria, a verdade é que, muito embora a contestação do PIC não conste da tabela anexa à portaria 1386/2004, de 10.11, também as contestações das acções cíveis não estão previstas e obviamente que têm de ser pagas.
Saliente-se, igualmente, que, aquando da notificação que lhe foi feita em 16.08.2022, já o arguido tinha apresentado o Requerimento de Proteção Jurídica para dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e compensação de Patrono para a respetiva defesa no processo crime e quanto ao Pedido de Indemnização Civil contra si formulado, não havendo, ainda, à data, decisão, por parte da Segurança Social, pelo que, em cumprimento do dever de agir na defesa dos interesses legítimos do arguido / demandado, apresentou, em tempo, para além da contestação à parte crime, a respectiva contestação, face ao pedido civil apresentado.
Aliás, como bem se refere no já assinado Ac. do TRG, de 12.09.2022, disponível in www.dgsi.pt.: “nunca vimos um arguido ter um Advogado no Processo Crime e requerer a nomeação de outro para o enxerto cível ou ser até defendido por dois Defensores, um na parte crime e outro na parte cível.”
A nomeação feita abrange, assim, o pedido civil, em conformidade, aliás, com a notificação que o tribunal recorrido efectuou à Ilustre Defensora em 16.08.2022.
Assim sendo, deverá, também, se aplicar à remuneração da Recorrente o ponto 3.2 da Tabela anexa à Portaria n° 1386/2004, de 10 de Novembro.
Procede, pois, o recurso interposto.
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– Decisão:
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes Desembargadores da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso interposto pela Ilustre Defensora, Dra. B, revogando-se, consequentemente, o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro que confirme o pedido de pagamento / compensação efectuado pela recorrente, designadamente pela contestação ao pedido de indemnização civil apresentado.
Sem custas.
Lisboa, 23 de Maio de 2023
Os Juízes Desembargadores
Anabela Simões Cardoso
Jorge Antunes
Sandra Oliveira Pinto
[1] PIC, nos termos do qual foi deduzida, em relação ao aqui Arguido, demandado, a quantia total de 55 mil euros.