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RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE REVISÃO
NATUREZA DAS FUNÇÕES DO AGENTE DE EXECUÇÃO
CASO ESTABILIZADO
Sumário
1- O recurso extraordinário de revisão apenas pode ter por objeto decisões judiciais (sentença, acórdão ou despacho) transitadas em julgado, por já não admitirem recurso ordinário nem reclamação, e que enfermem de um dos vícios taxativamente elencados no art. 696º do CPC. 2- Os atos e decisões proferidas pelo agente de execução no âmbito da ação executiva não são atos ou decisões judiciais mas sim atos e decisões materialmente administrativos, nem o agente de execução exerce, na execução, funções judiciais, mas antes funções materialmente administrativas. 3- Acresce que esses atos e decisões do agente de execução, quando não sejam objeto de, respetivamente, reclamação ou impugnação para o juiz da execução, embora se estabilizem na ordem jurídica, onde adquirem uma força vinculativa e de incontestabilidade/inalterabilidade semelhante à que cobre as decisões judiciais transitadas em julgado, não se confunde com o caso julgado que cobre as decisões judiciais, não fazendo sentido falar-se quanto a eles “em caso julgado” mas em “caso estabilizado”, posto que, além de não se estar perante decisões judiciais mas perante atos e decisões materialmente administrativas, a incontestabilidade e inalterabilidade que os cobre, contrariamente ao que sucede com as decisões judiciais transitadas em julgado, não é absoluta, podendo aqueles atos e decisões do agente de execução ser alterados/modificados em determinados condicionalismos legais. 4- Por conseguinte, o meio processual adequado para a exequente reagir contra o despacho do agente de execução que julgou extinta a execução pelo pagamento (pelo produto dos bens penhorados e vendidos no âmbito dessa execução) e que não foi alvo de impugnação para o juiz, com fundamento na al. e), do art. 696º do CPC (falta de citação daquela para os termos da execução ou nulidade da citação edital daquela para os termos dessa execução), não é o recurso extraordinário de revisão mas sim a arguição desses pretensos vícios nos próprios autos de execução, nos termos do art. 851º do CPC.
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, no seguinte:
I-RELATÓRIO
Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa que, em 23/03/2019, M..., Lda. instaurou contra AA, tendo por título executivo uma confissão de dívida assinada por esta em que se confessou devedora da quantia de 2.792,92 euros à primeira, decorrente do incumprimento de um contrato-promessa de compra e venda celebrado em 11/11/2015, correspondente ao sinal em dobro entregue pela exequente, na qualidade de promitente compradora, à executada, esta na qualidade de promitente vendedora, em que a exequente requereu que se declarasse a comunicabilidade dessa dívida ao cônjuge da executada, BB, em que a executada e marido foram citados editalmente para os termos dessa execução, em que nela foram penhorados e vendidos a metade indivisa sobre dois prédios propriedade da executada, e em que, em 05/11/2020, o agente de execução proferiu despacho declarando extinta a execução pelo pagamento, despacho esse que não foi objeto de impugnação, em 04/01/2023, a executada AA instaurou recurso extraordinário de revisão da decisão proferida pelo agente de execução com fundamento no disposto na al. e), do art. 696º, do CPC.
Para tanto alegou, em síntese, que, em 23/06/2016, a exequente instaurou a identificada execução contra a mesma e o seu marido indicando como moradas destes a Rua ..., ... ..., juntando como título executivo a “declaração e o contrato-promessa de compra e venda”.
Acontece que, na mencionada “declaração”, consta como morada da recorrente e do seu falecido marido a morada supra identificada sita em ..., mas no “contrato-promessa” também junto a essa execução consta como morada destes a Avenida ..., ..., ..., ....
A recorrente e o seu falecido marido desde que casaram, em .../.../1982, sempre residiram permanentemente no ..., na morada acabada de identificar, facto esse que é do conhecimento geral, incluindo, da exequente.
Acontece que a recorrente e o seu falecido marido nunca foram citados na sua morada sita no ... para os termos da execução.
O marido da recorrente faleceu em .../.../2016.
Após o falecimento do marido, a recorrente permaneceu a residir no ... até .../.../2022, data em que regressou para Portugal, onde passou a residir na Rua ..., ... ....
Apenas em outubro de 2022, quando se deslocou a ..., verificando que o seu prédio rústico sito em Quinta ..., estava a ser possuído por terceiros, deslocou-se à Conservatória do Registo Predial, onde constatou que o mesmo tinha sido vendido judicialmente no âmbito da supra identificada execução.
A exequente contratou imediatamente um advogado, que requereu a consulta do processo físico da execução, o qual, porque já se encontrava arquivado, apenas lhe foi facultado para consulta em meados de novembro de 2022, pelo que apenas, nessa data, a recorrente teve conhecimento da execução e dos respetivos fundamentos.
Acontece que, constando da execução instaurada contra a recorrente e o seu falecido marido, elementos suficientes em como a morada destes se situava no ... na morada antes identificada, impunha-se que o tribunal os tivesse citado para os termos da execução nessa morada, o que não se verificou e sem que, consequentemente, estivessem reunidos os requisitos legais para se ter recorrido, conforme se recorreu, à citação edital daqueles.
Concluiu pedindo que se julgasse o presente recurso de revisão totalmente procedente e, em consequência, se declarasse a falta de citação da recorrente e do seu falecido marido para a ação principal ou, pelo menos, a nulidade da citação edital destes, com revogação da sentença nela proferida e anulação dos termos do processo posterior à citação ou ao momento em que ela devia ser feita, ordenando-se a citação dos executados para a causa.
Em 13/02/2023, a 1ª Instância indeferiu o recurso extraordinário de revisão, com fundamento de que esse recurso apenas poderia ter por objeto uma decisão judicial, já transitada em julgado, o que não era o caso do despacho proferido pelo agente de execução em que declarou extinta a execução pelo pagamento, constando esse despacho do teor que se segue (que aqui se transcreve ipsis verbis): “AA, executada nos presentes autos, veio interpor recurso de revisão da “douta sentença” proferida nos autos principais nos termos da alínea e) do art. 696.º CPC, invocando a falta de citação ou, pelo menos, a nulidade da citação – arts. 188º, nº 1, als. c) e e) e 191º, nº 1 CPC -, peticionando que, pela procedência do presente recurso, se declare a falta de citação da Recorrente e do seu falecido marido para a ação principal ou, pelo menos, a nulidade da sua citação, com revogação da sentença nela proferida e anulação dos termos do processo posteriores à citação ou ao momento em que ela devia ser feita, ordenando-se a citação dos Executados para a causa, assim se cumprindo a Lei e se fazendo Justiça. Apreciando: É sabido que o recurso extraordinário de revisão constitui um meio processual que alguém, vencido em determinado pleito, pode lançar mão para reabrir um processo, já findo por decisão transitada, invocando para tanto um conjunto de circunstâncias, taxativamente enumeradas no art.º 696.º do Código de Processo Civil. É, pois, um expediente processual que faculta a quem tenha ficado vencido num processo anteriormente terminado a sua reabertura, mediante a invocação de certas causas taxativamente indicadas na lei. Diferencia-se dos recursos ordinários dado que o recurso de revisão visa a rescisão de uma sentença já transitada em julgado (Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, pág. 338). Nessas circunstâncias, entende o legislador, que se configuram exigências de realização da justiça que contrariam, e prevalecem, sobre a segurança jurídica resultante do caso julgado, fazendo-o, contudo, em situações de tal modo graves em que a subsistência da decisão em causa, abalaria de forma clamorosa, a almejada justiça material, no entendimento que essa decisão a rever assentou num vício grave, adjetivando uma realidade patentemente desconforme com o direito reto e justo que se pretende alcançar. A Recorrente invoca, como fundamento do seu recurso de revisão, a alínea e) do art. 696.º do CPC onde se pode ler o seguinte: “A decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando tendo corrido o processo à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que: i) Faltou a citação ou que é nula a citação feita; ii) O réu não teve conhecimento da citação por facto que não lhe é imputável; iii) O réu não pode apresentar a contestação por motivo de força maior”. A nosso ver, há uma condição de admissão do presente recurso que se prende com o facto de o recurso de revisão só poder incidir sobre qualquer decisão judicial, independentemente da sua natureza ou objeto, assim como da categoria do tribunal de onde emana, sendo mais vastos os fundamentos que poderão ser invocados, com relação ao recurso para uniformização de jurisprudência (neste sentido, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, pág. 403.º e seguintes), (sublinhado nosso). Pressuposto então do recurso de revisão é o facto de a decisão judicial ter transitado em julgado, o que colide com a pendência de recurso ou de reclamação. Assim sendo, e como ocorre com a generalidade dos recursos pressupõe-se, naturalmente, que exista uma sentença – no recurso de revisão já transitada em julgado – que possa ser objeto desse recurso. Contudo, nos presentes autos executivo, salvo melhor opinião, não foi proferida qualquer sentença judicial, mas apenas foi proferida uma decisão pelo agente de execução que extinguiu a execução pois, como se sabe, no caso ora em apreço, não foi proferida qualquer decisão nos apensos declarativos pois não chegaram sequer a ser apresentadas oposições à execução e/ou à penhora, desde logo porque, como alega a Recorrente, não chegou a ter conhecimento de terem sido intentados os autos principais de execução. Face à estrutura do novo Código de Processo Civil, verificamos que, presentemente, a extinção da execução opera de forma automática uma vez verificada uma das situações a que a lei atribui esse efeito (art. 849.º do CPC), devendo o agente de execução uma vez verificada uma dessas situações notificar as partes da extinção da execução e informar o tribunal dessa extinção. Assim, salvo o devido respeito, parece-nos que, no caso concreto, não há uma sentença judicial que a Recorrente pretenda atacar. Assim sendo, inexistindo qualquer sentença subjacente ao presente recurso de revisão, o mesmo não tem, no nosso modesto entendimento, qualquer fundamento ou viabilidade, o que implica o seu indeferimento liminar, nos termos do art. 699.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
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DECISÃO
Pelo exposto, indefiro liminarmente o presente recurso de revisão. Custas pela Recorrente”.
Inconformada com o assim decidido a recorrente AA interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as conclusões que se seguem:
1- Nos presentes autos, peticiona a Apelada que seja declarada procedência ao recurso de revisão da douta sentença, e se declare a falta de citação da Apelante e do seu falecido marido para a ação principal ou, pelo menos, a nulidade da sua citação, com revogação da sentença nela proferida e anulação dos termos do processo posteriores à citação ou ao momento em que ela devia ser feita, ordenando-se a citação dos Executados para a causa, assim se cumprindo a Lei e se fazendo Justiça, nos termos do artigo 696º aliena e) do CPC.
2- Assenta os presentes autos na decisão proferida pelo agente de execução de extinção da instância, sem que a Apelante e o seu falecido marido tivessem sido citados.
3- A Apelante pretende com o recurso extraordinário de revisão a rescisão da sentença transitada, com vista a corrigir os erros que atingem a mesma, nomeadamente a falta de citação da Apelante que a impediu de se defender nos presentes autos, ou de proceder voluntariamente à quantia exequenda sem a venda do imóvel que era sua propriedade.
4- Contudo, o Tribunal a quo, entendeu, que esta decisão proferida pelo agente de execução, que extinguiu a execução não é uma sentença, o que salvo o devido respeito não lhe assiste razão.
5- É certo que uma decisão de agente de execução não é uma sentença em sentido estrito, mas essa decisão no caso de não ser objeto de reclamação tem uma eficácia vinculativa semelhante à da sentença.
6- Não tendo sido impugnada pela forma prevista no artigo 723º do CPC essa decisão consolidou-se na ordem jurídica, com efeitos idênticos ao caso julgado próprio das decisões judiciais, v.j. neste sentido Acórdão do Tribunal de Relação de Évora Processo 870/14.5TBCTX-A.E1 e 2561/15.0T8STB-E.E1 e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa no Processo 686/14.9T2SNT-B.L1-7, o que se verifica in casu.
7- Tendo o agente de execução declarado extinta a execução esta decisão constitui decisão finalinho processo, devendo, por isso, equiparar-se a uma sentença judicial.
8- Pois, se assim não se entender a decisão de agente de execução estabilizada/consolidada, não poderá ser objeto de recurso aos meios jurisdicionais, colocando em causa a justiça material e estando perante uma violação de direitos.
9- Ao seguir-se o entendimento da Mma. Juiz a quo as decisões do agente de execução estariam protegidas de qualquer verificação da legalidade, o que não se verifica com as sentenças proferidas pelos Tribunais, ficando assim vedado um direito que assiste às partes processuais de requerer a reabertura de um processo, mesmo depois de ficarem vencido num processo já terminado, através do recurso extraordinário de revisão, ainda que em casos taxativamente elencados.
10-Assim, estando nós perante uma decisão de extinção da execução por pagamento da quantia exequenda resultante da venda de um bem pertença da Apelante, sem que esta e o seu marido tivessem sido citados, não tendo tido conhecimento de terem sido intentados os autos principais da execução, a mesma não foi objeto de oportuna reclamação, pelo que constitui decisão final do processo transitada em julgado.
11-Pelo que ao contrário do entendimento da Mma. Juiz a quo existe sentença subjacente ao presente recurso de revisão, existindo assim fundamento nos termos do artigo 696º do CPC.
12-Devendo ser admitido o recurso nos termos do n.º 2 do artigo 699º do CPC.
13-A Mma Juiz a quo ao decidir como decidiu violou o disposto no artigo 696º do CPC.
Nestes termos e nos do mui douto suprimento de Vªs Exªs, no provimento do presente recurso, deve a douta sentença recorrida ser substituída por outra que admita o recurso extraordinário de revisão.
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O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Por decisão sumária proferida pelo relator, em 04 de maio de 2023, julgou-se o recurso de apelação improcedente e, em consequência, confirmou-se a decisão recorrida, que inferiu o recurso extraordinário de revisão, por manifesta falta de fundamento para a revisão requerida pela apelante do despacho proferido pelo agente de execução em que julgou extinta a execução pelo pagamento, constando essa decisão singular do seguinte teor (transcreve-se aqui ipsis verbis a fundamentação jurídica exarada na decisão sumária): “Tendo a apelada M..., Lda. instaurado execução para pagamento de quantia certa contra a apelante AA (e não, também, contra o marido desta, conforme vem alegado pela última no requerimento de interposição do recurso de revisão), pretendendo obter a cobrança coerciva da quantia de 2.871,83 euros, sendo 2.792,92 euros de capital em dívida, o remanescente de juros de mora vencidos à taxa legal, a que acrescem os juros de mora vincendos, servindo de título executivo a essa execução uma confissão de dívida em que a apelante se confessa devedora à apelada (exequente) da quantia de 2.792,92 euros, decorrente do incumprimento de um contrato-promessa que celebrou, na qualidade de promitente vendedora, com a exequente, esta na qualidade de promitente compradora, correspondente ao sinal em dobro que a última lhe entregou no âmbito desse contrato-promessa, e em que a exequente pretende que se declare a comunicabilidade dessa dívida ao cônjuge da apelante, BB, frustrou-se a citação pessoal da apelante (aí executada e ora recorrente) e do seu cônjuge, pelo que se procedeu à respetiva citação edital. No âmbito da identificada execução penhorou-se ½ indivisa do prédio rústico inscrito na matriz sob o art. ...62º da freguesia ... (...), descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...1, da freguesia ..., e, bem assim, ½ indivisa do prédio urbano inscrito na matriz sob o art. ...13º da freguesia ... (...), descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...46, da freguesia ..., direitos indivisos esses que acabaram por ser vendidos judicialmente, por negociação particular, no âmbito dessa execução. Acontece que, tendo o produto dessa venda sido suficiente para satisfazer a quantia exequenda e as custas da execução, por decisão de 05/11/2020, o agente de execução declarou extinta a execução pelo pagamento, despacho esse que não foi objeto de impugnação. Mediante o presente recurso extraordinário de revisão, instaurado em 04/01/2022, por apenso à identificada execução, a apelante (aí executada) AA pretende que se revogue o despacho do agente de execução de 05/11/2020, que declarou extinta a execução pelo pagamento, com fundamento na falta da citação daquela e do seu falecido marido para os termos dessa execução ou, pelo menos, se declare a nulidade da citação edital nela efetuada, fundando-se, portanto, o presente recurso de revisão na al. e), do art. 696º do CPC. A 1ª Instância rejeitou o recurso interposto com fundamento de que este cabe apenas de decisões judiciais já transitadas em julgado, quando “face à estrutura do novo Código de Processo Civil, a extinção da execução opera de forma automática, uma vez verificada uma das situações a que a lei atribui esse efeito (ar. 849º do CPC), devendo o agente de execução, uma vez verificada uma dessas situações, notificar as partes da extinção da execução e informar o tribunal dessa extinção”, sem que essa notificação configure qualquer decisão judicial, entendimento esse com o qual não se conforma a apelante, imputando ao decidido erro de direito, advogando que, “se é certo que uma decisão de agente de execução não é uma sentença em sentido estrito, essa decisão, no caso de não ser objeto de reclamação adquire força vinculativa semelhante à da sentença” e, por isso, pode ser impugnado mediante a interposição de recurso de revisão sempre que padeça de um dos vícios enunciados no art. 696º, do CPC, que permitem a destruição excecional do caso julgado que cobre as decisões judiciais, sob pena das decisões do agente de execução se estabilizarem na ordem jurídica ainda que o nelas decidido abalem clamorosamente o princípio da justiça material. Vejamos se assiste razão à apelante para os erros de direito que assaca à decisão sob sindicância, que rejeitou o recurso extraordinário de revisão com fundamento de que a extinção da execução opera automaticamente verificada que esteja uma das causas de extinção daquela, previstas numa das alíneas do n.º 1, do art. 849º do CPC, limitando-se o agente de execução a comunicar essa extinção, nos termos dos n.ºs 2 e 3 desse mesmo preceito, e que, em todo o caso, esse despacho do agente de execução não consubstancia uma “decisão judicial”, não podendo, portanto, ser objeto de recurso extraordinário de revisão. O recurso extraordinário de revisão encontra-se regulado nos arts. 696º a 702º do CPC, e consubstancia um meio de impugnação excecionalíssimo de decisões judiciais que já tenham transitado em julgado, mediante o qual a lei faculta a quem tenha ficado vencido ou prejudicado num processo já antes findo, por decisão judicial transitada em julgado, a reabertura (revisão) desse processo mediante a invocação de certos fundamentos taxativamente plasmados na lei, com vista a prolação de uma nova decisão judicial[1]. Enquanto os recursos ordinários têm por finalidade eliminar ou corrigir decisões judiciais inválidas, erradas ou injustas, pela devolução do seu julgamento a um órgão jurisdicional hierarquicamente superior, obstando-se que essas decisões transitem em julgado, o recurso extraordinário de revisão visa corrigir os erros de julgamento de que enferme uma decisão judicial já transitada em julgado e que, por isso, é já insuscetível de impugnação pela via ordinária contenciosa, mas em que a legislador considera que a justiça material deverá prevalecer sobre os valores da certeza e da segurança jurídica que são apanágio do caso julgado. No recurso extraordinário de revisão assiste-se, assim, a um conflito entre, por um lado, a certeza e a segurança jurídica e, por outro, a justiça material, pelo que tal recurso apenas deverá ser admitido em situações verdadeiramente excecionalíssimas, em que o legislador considera estar-se perante casos limites que justificam que se desrespeite a força e autoridade do caso julgado que cobre a decisão judicial, com o inerente sacrifício do valor da certeza e da segurança jurídica a favor do primado da justiça material, por a subsistência dessa decisão, transitada em julgado, ser suscetível de abalar clamorosamente o princípio da justiça material e causar maior dano para a sociedade e, em especial, para o prestígios dos tribunais, que aquele que decorre da circunstância de se afastar a intangibilidade da decisão judicial decorrente do caso julgado que a cobre. Nessas situações excecionalíssimas admite-se, portanto, a quebra do caso julgado, violando-se frontalmente o valor da segurança jurídica inerente ao Estado de Direito, em nome das exigência do verdadeiro fim do processo, que é a verdade material e a realização da justiça[2]. Conforme expende Alberto dos Reis, “o recurso de revisão apresenta, à primeira vista, o aspeto duma aberração judicial: o aspeto de atentado contra a autoridade do caso julgado. Há uma sentença transitada em julgado, cercada, portanto, da força, do prestígio e do respeito que merecem as decisões que atingiram tal grau de segurança. (…). O que sucede é que há razões excecionalmente graves para o fazer cair. Bem consideradas as coisas, estamos perante uma das revelações do conflito entre as exigências da justiça e a necessidade da segurança ou da certeza. Em princípio, a segurança jurídica exige que, formado o caso julgado, se feche a porta a qualquer pretensão tendente a inutilizar o benefício que a decisão atribuiu à parte vencedora. Mas pode haver circunstâncias que induzam a quebrar a rigidez do princípio. A sentença pode ter sido consequência de vícios de tal modo corrosivos, que se imponha a revisão como recurso extraordinário para um mal que demanda consideração e remédio. (…). Por outras palavras, pode dar-se o caso de os inconvenientes e as perturbações resultantes da quebra do caso julgado serem muito inferiores aos que derivariam da intangibilidade da sentença”, e concluiu: “Quais os casos excecionais em que o princípio da segurança deve ser sacrificado ao princípio da justiça, é uma questão de medida, de política judiciária”[3]. O recurso de revisão é, assim, o meio processual que permite afastar em situações excecionalíssimas o caso julgado que cobre uma decisão judicial, permitindo que nessas situações excecionalíssimas elencadas taxativamente pelo legislador este considere preferível quebrar a força e autoridade do caso julgado que cobre essa decisão, com a inerente incerteza e insegurança jurídica e se dê primado ao valor da justiça material, sendo o compromisso encontrado entre esses dois princípios que aconselha que a autoridade do caso julgado seja sacrificada a fim de se evitarem o dano e a perturbação, muito maiores, que se produziriam se se mantivesse uma decisão intoleravelmente injusta. Compreende-se, por isso, que o recurso de revisão apenas possa ser admitido em situações excecionalíssimas taxativamente enunciados na lei[4], mais concretamente, no art. 696º do CPC e, bem assim, que esse meio impugnatório excecionalíssimo apenas possa ser exercitado pelo interessado, sob pena de caducidade, dentro de prazos temporalmente apertados, em que, por um lado, sem prejuízo do disposto no n.º 4, do art. 697º do CPC, nos termos do seu n.º 2, o interessado apenas pode interpor o recurso de revisão dentro do prazo de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão revivenda, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e, por outro lado, dentro do mencionado prazo de cinco anos, terá de interpor o recurso de revisão no prazo de 60 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença em que se funda a revisão, no caso de o fundamento de revisão se integrar na al. a) do art. 696º; ou a contar do momento em que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado, no caso de o fundamento de revisão se integrar nas als. f) e h) do mesmo art. 696º; ou a contar do momento em que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão, nos restantes fundamentos de revisão previstos no mencionado art. 696º; sendo que, no caso do fundamento de revisão se integrar na al. g) do art. 696º, esse prazo de 60 dias é ampliado para dois anos e conta-se desde o conhecimento da sentença pelo recorrente, sem prejuízo do prazo de cinco anos (art. 697º, n.ºs 2, 3 e 4 do CPC). O processo extraordinário de revisão inicia-se mediante a apresentação pelo interessado, dentro dos prazos de caducidade acabados de enunciar, de um requerimento, em que o recorrente terá de alegar um ou vários dos fundamentos de revisão taxativamente enunciados numa das alíneas do art. 696º do CPC e, no caso do fundamento de revisão invocado ser o da al. g), do art. 696º, terá ainda de alegar o prejuízo resultante da simulação processual; já quando os fundamentos de revisão invocados sejam os das als. a), c), f) e g) do mesmo art. 696º, terá de instruir esse requerimento com certidão da decisão ou com o documento em que funda o pedido (art. 698º do CPC). O requerimento é apresentado junto do tribunal que proferiu a decisão a rever e o processo de revisão corre por apenso ao processo em que essa decisão foi proferida (arts. 697º, n.º 1 e 698º, n.º 1, do CPC). Segue-se a prolação de despacho de indeferimento liminar do recurso de revisão ou de admissão deste (art. 699º, n.º 2, do CPC), em que o juiz (ou o relator, no caso de a decisão a rever ter sido proferida por tribunal superior) procede à apreciação liminar do recurso, devendo indeferi-lo sempre que o recorrente não disponha de legitimidade ativa para recorrer; quando a decisão que pretender rever ainda não tiver transitado em julgado; quando os fundamentos de revisão invocados pelo recorrente não se subsumam a nenhum dos fundamentos de revisão taxativamente enunciados nas diversas alíneas do art. 696º; sendo o fundamento de revisão invocado o da al. g), do art. 696º, quando o recorrente não alegue o prejuízo resultante da simulação processual, ou nos casos de os fundamentos de revisão invocados serem os das als. a), c), f) e g) do art. 696º, quando o recorrente não instrua o requerimento de interposição do recurso com certidão da decisão ou com o documento em que se funda o pedido; ou quando se mostrem excedidos os prazos de caducidade fixados no art. 697º, n.ºs 2 a 4[5]. Se o recurso de revisão for liminarmente admitido, procede-se então à notificação pessoal do recorrido para responder no prazo de 20 dias (art. 699º, n.º 2, do CPC), em que a falta de resposta não tem efeito cominatório, devendo a processo seguir a normal tramitação do recurso de revisão prevista no art. 700º, ou seja, procedendo à instrução do mesmo. Trata-se da denominada fase rescindente, em que o tribunal aprecia os fundamentos do recurso invocados pelo recorrente, de modo a poder decidir se a decisão a rever, transitada em julgado, deve (ou não) ser revista consoante se encontrem ou não preenchidos os requisitos legais previsto para a revisão. Nos casos em que os fundamentos do recurso de revisão invocados pelo recorrente sejam os das als. a), c), e) e f) do art. 696º, a fase rescindente é constituída, após o exercício do contraditório por parte do recorrido, independentemente deste responder ou não ao recurso, pela decisão do tribunal decidindo ou não pela revogação da decisão a rever, eventualmente precedida das diligências que tenha por indispensáveis para a prolação dessa decisão (n.º 1, do art. 700º do CPC). Já quando os fundamentos de revisão invocados pelo recorrente sejam os das als. b), d) e g) do art. 696º, a fase rescindente segue, após a resposta do recorrido ou o termo do prazo respetivo, os termos do processo comum declarativo, envolvendo, para além do eventual saneamento do recurso, a produção de prova que se revelar pertinente para apuramento dos factos controvertidos. A fase rescindente consubstancia, portanto, uma fase em que o tribunal procede à instrução do recurso com vista a decidir se estão ou não preenchidos os pressupostos legais que permitam revogar a decisão judicial revivenda transitada em julgado, culminando com uma decisão de improcedência do recurso de revisão, sempre que o recorrente não logre fazer prova da verificação dos factos que alegou e integrativos de um ou de vários dos fundamentos de recurso previstos numa das alíneas do art. 696º do CPC, ou quando se faça prova que o direito daquele a interpor recurso de revisão se encontra extinto, por caducidade, por decurso dos prazos de caducidade previstos no art. 697º do mesmo Código. E culmina com uma decisão julgando o recurso de revisão procedente, revogando a decisão judicial revivenda, apesar do seu trânsito em julgado, quando o recorrente tenha logrado fazer prova dos factos que alegou integrativos de um dos fundamentos de revisão taxativamente elencados no art. 696º e não se prove facticidade demonstrativa em como o seu direito a interpor esse recurso se encontra extinto, por caducidade. Nas situações em que o recurso de revisão seja julgado provido, com a consequente revogação da decisão judicial revivenda, apesar do respetivo trânsito, por se encontrarem preenchidos os pressupostos da revisão, segue-se a fase rescisória, cuja tramitação varia consoante as situações (art. 701º, do CPC), mas em que se vai, em princípio, retomar o processo em que a decisão rescindida foi proferida, de modo a obter-se a decisão substitutiva desta, em que segundo a doutrina e da jurisprudência maioritárias, se renova a instância em que essa decisão revogada foi proferida, ressuscitando-se esta, mantendo-se, portanto, a instância quanto ao valor, sujeitos, pedido e causa de pedir, em que o objetivo é produzir uma nova decisão em substituição da revogada[6]. Dado que o recurso excecional de revisão é integrado pelas fases que se acabam de enunciar, discute-se na doutrina a natureza do recurso de revisão no sentido de se saber se este reveste natureza de uma verdadeira ação autónoma, desencadeada através de um requerimento em tudo semelhante a uma petição inicial, com o objetivo de inutilizar uma decisão judicial transitada em julgado, ou se antes a natureza do recurso de revisão é a de um verdadeiro recurso, interposto com o único objetivo de impugnar uma decisão transitada em julgado, com fundamento num qualquer erro de julgamento cuja verificação implica a revogação da decisão judicial anteriormente proferida, transitada em julgado, mediante a substituição desta por uma decisão em que os erros de julgamento de que a anteriormente proferida enfermava foram eliminados, ou se antes, como nos parece ser o caso, a natureza do recurso de revisão é mista de recurso e de ação, na medida em que assume uma similitude estrutural partilhada por ambas as identificadas figuras processuais, envolvendo um duplo julgamento, uma dupla função jurisdicional, em que numa primeira fase (a fase rescindente) o recurso de revisão assume características próprias de um verdadeiro recurso, e numa segunda fase (a fase rescisória), assume o perfil e a configuração intrínseca de uma verdadeira ação declarativa[7]. O recurso de revisão, conforme decorre do que se vem dizendo e decorre expressis verbis do disposto no art. 696º, do CPC, tem por objeto decisões judiciais, transitadas em julgado, tratando-se do expediente ou remédio processual que visa a substituição dessa decisão (decisão revivenda) por outra não inquinada dos vícios subjacentes à sua impugnação ou anulação. Daí que sejam passíveis de recurso de revisão, tanto as sentenças, como os despachos e os acórdãos dos tribunais superiores, pelo que, como realça a 1ª Instância no âmbito da decisão recorrida, o recurso de revisão pode incidir sobre qualquer decisão judicial, independentemente da sua natureza ou objeto, assim como da categoria do tribunal de onde emana, exigindo-se apenas que tenha transitado em julgado[8]. Note-se, porém, que, no âmbito da arbitragem voluntária, uma vez que o art. 9º da LAV, aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14/12, equipara a intervenção dos árbitros à dos juízes dos tribunais judiciais, e que, nos termos do disposto no art. 42º, n.º 7 desse mesmo diploma, a sentença arbitral de que não caiba recurso e que já não seja suscetível de ser alterada nos termos do seu art. 45º, tem o mesmo caráter obrigatório entre as partes que a sentença de um tribunal estadual transitada em julgado e a mesma força executiva que a sentença de um tribunal estadual, é pacífico o entendimento de que as decisões arbitrais proferidas em processo de arbitragem voluntária devem ser consideradas como verdadeiras decisões judiciais e, como tal, uma vez transitadas em julgado, podem ser objeto de recurso de revisão sempre que se encontrem eivadas de um dos vícios enunciados numa das alíneas do art. 696º do CPC que legitimam o interessada a impugná-las mediante a interposição de recurso extraordinário de revisão. E também é pacífico que as decisões dos árbitros proferidas no âmbito da arbitragem necessária, como é o caso da decisão arbitral proferida no processo de expropriação, dado que, nos termos do disposto nos arts. 52º, n.º 1, 58º e 59º do Cód. das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18/09, estão sujeitos a recurso para o tribunal de comarca, sob pena de transitarem em julgado, tornando-se incontestáveis intra e extraprocessualmente, consubstanciam verdadeiras decisões judiciais, sujeitas a recurso de revisão sempre que transitem em julgado e padeçam de um dos enunciados vícios taxativamente previstos no art. 696º do CPC que constituam fundamento de recurso de revisão[9]. A questão que se suscita nos autos é a de saber se, no âmbito de uma execução para pagamento de quantia certa, instaurada contra a aqui apelante (recorrente) e em que foi requerida a declaração da comunicabilidade da dívida exequenda ao marido desta, no âmbito da qual foram citados editalmente e em que foram penhorados e vendidos judicialmente direitos indivisos da apelante sobre dois prédios, cujo produto foi suficiente para liquidar a quantia exequenda e as custas da execução, a decisão proferida pelo agente de execução declarando extinta a execução pelo pagamento, quando não seja alvo de impugnação, deve ser equiparada a uma decisão judicial para efeitos de recurso de revisão e se, consequentemente, assiste à apelante o direito de interpor recurso de revisão dessa decisão do agente de execução com fundamento no art. 696º, al. e) do CPC, conforme fez, entendimento esse que não foi sufragado pela 1ª Instância, que sustenta que a extinção da execução opera automaticamente, verificados que estejam um dos fundamentos extintivos daquela, previstos no n.º 1, do art. 849º do CPC, limitando-se o agente de execução, mediante o despacho de que a apelante pretende interpor o presente recurso de revisão a dar cumprimento ao disposto nos n.ºs 2 e 3 do mencionado art. 849º do CPC, ou seja, a comunicar a extinção da execução à exequente, ao executado, aos credores reclamantes e ao tribunal, e que, em todo o caso, ainda que a extinção da execução não fosse automática, mas operasse por efeitos da decisão proferida pelo agente de execução, essa decisão não consubstancia uma decisão judicial e, por isso, dela não pode ser interposto recurso extraordinário de revisão, entendimento esse com o qual não se conforma a apelante. Antes da reforma de 2003 ao CPC, a extinção da execução, salvo os casos de deserção da instância, tinha lugar mediante uma sentença que lhe punha termo e essa sentença tinha de ser notificada ao executado, ao exequente e aos credores reclamantes. A natureza dessa sentença era controvertida ao nível da doutrina e da jurisprudência. Com efeito, enquanto uma corrente defendia que a sentença de extinção da execução operava caso julgado formal e material[10], outra sustentava que a sentença de extinção da execução não é dotada de caso julgado material, mas apenas formal, uma vez que nela o juiz se limita a verificar o termo da ação executiva, sem que emita qualquer juízo de mérito sobre a titularidade da relação estabelecida entre exequente e executado, não se pronunciando sobre o fundo dessa relação, pois que não aprecia o pedido formulado na ação executiva e nem sequer chega a abordá-lo[11]. Acontece que com a reforma ao CPC, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 08/03, criou-se a figura do solicitador de execução, a quem foi atribuída competência para proceder às notificações e citações (arts. 239º e 864º do CPC/2003), para, no âmbito das ações executivas, proceder à apreensão de bens do executado (arts. 832º, n.º 2 e 930º, n.ºs 1 e 2 do CPC/2003) e para proceder à posterior penhora e entrega desses bens (art. 930º, n.º 1 do CPC/2003). Na reforma ao CPC, introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, entrada em vigor em 01 de setembro de 2013, para além de outros objetivos prosseguidos pelo legislador, cuidou-se, no âmbito da ação executiva, em redistribuir as competência entre juiz, agente de execução e secretaria, estabelecendo-se que ao agente de execução “cabe efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz”, com o objetivo de que “os intervenientes processuais assumam e observem a repartição de competências fixadas na lei, por forma a evitar intervenções ou atos desnecessários, gerando perdas de tempo numa tramitação que se quer célere e eficiente”[12]. Esses princípios encontram-se explanados no art. 719º do atual CPC, em que se atribui ao agente de execução, no âmbito da ação executiva, competência residual, ao estabelecer-se caber “ao agente de execução efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos “ (n.º 1), devendo este, mesmo após a extinção da instância, assegurar a realização dos atos emergentes do processo que careçam da sua intervenção (n.º 2). Decorre do regime legal que se acaba de enunciar que, atualmente, o poder geral de direção da instância executiva cabe ao agente de execução, a quem compete efetuar todas as diligências de execução, salvo aquelas que os n.ºs 3 e 4 do art. 729º atribuem à secretaria ou que, nos termos do art. 729º sejam da competência do juiz. “Trata-se de uma competência ampla, não tipificada e, por isso, tendencialmente, expansiva”, decorrendo da articulação dos arts. 719º e 723º do CPC, que, “na ação executiva os atos processuais do Estado são, em regra, atos do agente de execução”, em que este “realiza atos, executivos proprio sensu e não executivos, e profere decisões”[13]. No que respeita às causas de extinção da ação executiva, estas encontram-se previstas no n.º 1, do art. 849º do atual CPC, lendo-se neste preceito que “a ação extingue-se nas seguintes situações: (…)”. Destarte, conforme decorre da letra do identificado art. 849º, n.º 1, atualmente a extinção da execução é uma decorrência da verificação de um dos circunstancialismos previstos numa das alíneas desse n.º 1, a que a lei atribui eficácia extintiva da ação executiva. Todavia, apesar da extinção da ação executiva ser uma decorrência do preenchimento de uma das previsões constantes das várias alíneas previstas no identificado art. 849º, n.º 1, contrariamente ao que parece ser o entendimento da 1ª Instância, com exceção da extinção da execução com fundamento em inutilidade superveniente da lide, por inexistência de bens a penhorar, ou na sequência da adjudicação de direitos de crédito, ou no caso de adjudicação das quantias vincendas, em caso de penhora de rendas, abonos ou salários, as quais constituem causas automáticas de extinção da instância executiva, quanto aos restantes fundamentos de extinção da execução previstos nesse n.º 1, não basta a mera verificação desses fundamentos para que a execução se extinga automaticamente, mas essa extinção reclama que se profira uma decisão fundamentada acerca da verificação dos pressupostos da concreta causa de extinção da execução[14]. A competência para proferir o despacho declarando a extinção da execução, na sequência do que se vem dizendo, cabe ao agente de execução, face à natureza residual da competência que lhe é atribuída pelo n.º 1 do art. 719º do CPC no âmbito do processo executivo e a ausência de norma expressa que defira expressamente essa competência ao juiz ou à secretaria; antes pelo contrário, estabelecendo o n.º 3 do art. 849º, que a extinção da execução é comunicada, por via eletrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informática o arquivo eletrónica do processo, “sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria”, esta norma exclui, clara e expressamente, a competência para proferir o despacho declarando extinta a execução ao juiz e à secretaria e, consequentemente, atribui essa competência ao agente de execução. Posto isto, o art. 162º, n.º 1, do Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, aprovado pela Lei n.º 154/2015, de 14/09, define o agente de execução como “auxiliar da justiça que, na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública no cumprimento das diligências que realiza nos processos de execução, nas notificações, nas citações, nas apreensões, nas vendas e nas publicações no âmbito de processos judiciais, ou em atos de natureza similar que, ainda que não tenham natureza judicial, a estes podem ser equiparados ou ser dos mesmos instrutórios”. Na ação executiva o agente de execução aparece como um oficial público que é auxiliar da justiça, que, embora escolhido pelo exequente, não é mandatário nem representante deste (art. 162º, n.º 3 da Lei n.º 154/2015), estando sujeito aos fundamentais deveres de legalidade e justiça, consagrados nos arts. 124º, n.º 3, als. b) e l), 169º, n.º 1, al. g) e 177º, n.º 3, do mesmo diploma, bem como ao dever de imparcialidade, nos termos dos arts. 119º e 168º, n.º 1 deste. Enquanto auxiliar da justiça, na ação executiva, o agente de execução, na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública em nome do Estado, seja na direção do processo, seja na realização dos atos materiais de realização coativa da prestação e integra a administração da justiça, a par de juízes, ministério público, oficiais de justiça, e entes privados, como os administradores judiciais, entre outros. Mas, ao mesmo tempo, o agente de execução não é um funcionário do Estado, mas antes um profissional liberal, nisso se aproximando do solicitador e do advogado, não existindo relação laboral ou hierárquica do agente de execução perante o Estado ou o juiz[15]. Daí que os despachos proferidos pelo agente de execução no âmbito da ação executiva, incluindo o despacho em que declara extinta a instância executiva, não assumam natureza de decisões judiciais, pelo que, salvo melhor opinião, quanto às decisões do agente de execução, dado não terem natureza de decisões judiciais, nem exercendo este funções jurisdicionais, não faz sentido falar-se em caso julgado formal ou material, sem prejuízo de ser pacífico o entendimento de que a decisão proferida pelo agente de execução em que declara extinta uma execução pelo pagamento, não pode deixar de ser invocada noutra execução com vista à cobrança da mesma dívida exequenda, obstando à instauração de nova execução para pagamento dessa mesma dívida[16]. É certo que, nos termos do disposto nas als. c) e d), do n.º 1, do art. 723º do CPC, os meios de reação das partes e dos terceiros intervenientes na ação executiva contra os atos e as decisões nelas proferidas pelo agente de execução são, respetivamente, a reclamação e a impugnação, pelo que se os interessados não reclamarem dos atos ou não impugnarem as decisões proferidas pelo agente de execução, no prazo de dez dias após serem notificados ou terem conhecimento desses atos ou decisões, estes estabilizam-se e consolidam-se na ordem jurídica, tornando-se incontestáveis e inalteráveis, de forma semelhante ao trânsito em julgado da decisão judicial[17], mas não se trata de caso julgado, mas sim de “caso estabilizado”. Neste sentido, expendem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, que “recai sobre os interessados um ónus de reclamação dos atos e de impugnação das decisões do agente de execução, quer o meio processual de reação seja nominado (v.g. embargos de terceiro), quer tenha natureza residual, nos termos das als. c) e d) do art. 723º. (…). Assim, se o interessado não reclamar do ato ou não impugnar a decisão, no prazo de 10 dias após ser notificado ou de ter conhecimento da mesma, a decisão do agente de execução forma caso estabilizado, tornando-se a decisão do agente de execução definitiva, por já não ser suscetível de impugnação perante o juiz. (…), os atos e as decisões do agente de execução tornam-se definitivos sempre que, depois de notificados às partes, estas não reclamarem do ato ou da decisão perante o juiz, nos termos do art. 723º, n.º 1, als. c) ou d). Disto decorre que, se o ato ou a decisão daquele agente não for objeto de reclamação pelas partes, o ato ou a decisão torna-se incontestável e inalterável, dado que deixa de ser atacável por iniciativa de qualquer das partes; pode falar-se a este propósito num efeito semelhante ao trânsito em julgado da decisão judicial, ou seja esse ato ou decisão torna-se, em princípio, imodificável”. No entanto, os mesmos autores apesar de apontarem a similitude do caso estabilizado que cobre os atos e as decisões do agente de execução que não tenham sido alvo de reclamação ou de impugnação com o caso julgado que cobre as decisões judiciais, logo acrescentam que diversamente do caso julgado que cobre as decisões judiciais, o “caso estabilizado” que cobre os atos ou decisões do agente de execução que não tenham sido objeto de reclamação ou de impugnação não se confunde com o caso julgado, uma vez que, diversamente do que acontece com as decisões judiciais transitadas em julgado, que são inalteráveis e imodificáveis, os atos e as decisões do agente de execução cobertas por “caso estabilizado” não são absolutamente inalteráveis nem imodificáveis, posto que, nas “situações em que o agente de execução se intromete na reserva de jurisdição do juiz, proferindo decisão fora das suas competências, como acontecerá, por exemplo, quando se pronuncia sobre a admissibilidade da cumulação de execuções. Tal intromissão é sancionada com o vício da inexistência, na medida em que a lei não confere poderes ao agente de execução para tal pronúncia, sendo tal vício insanável e do conhecimento oficioso”. E acrescentam que “fora do âmbito do caso estabilizado ficam ainda as situações em que o juiz pode ter uma intervenção fiscalizadora oficiosa, conforme ocorre com as nulidades de conhecimento oficioso (art. 196º) e no domínio dos pressupostos processuais”[18]. No mesmo sentido pronuncia-se Rui Pinto ao ponderar que: “A necessidade de segurança jurídica e a sua sujeição a um meio de impugnação ditam, necessariamente, que se lhe apliquem alguns princípios gerais dos despachos judiciais. Primeiro princípio: uma vez proferido o despacho, o agente de execução fica com a sua competência decisória esgotada. Ele não pode revogar oficiosamente a sua decisão. Tal decorre da regra do art. 613º, n.º 1. Segundo princípio: o agente de execução pode oficiosamente ou a requerimento, retificar erros materiais, por aplicação analógica do art. 614º. Mas não tem competência para conhecer das nulidades decisórias do art. 615º ou de pedido de reforma, do art. 616º, n.º 2. (…). Terceiro princípio: o despacho do agente de execução apenas pode ser revogado por impugnação do interessado, nos termos da al. c) do n.º 1 do art. 723º, sob pena de sanação dos respetivos vícios. Correlativamente, no plano dos poderes do tribunal, isto significa que o juiz só pode conhecer dos vícios dos atos do agente se um interessado lho solicitar. Ressalva-se, porém, que sempre que o juiz tiver de aceder à instância nos termos tipicamente previstos no art. 723º, n.º 1 – máxime, no despacho liminar, na oposição à execução, na oposição à penhora – tem o poder-dever de verificar a sua regularidade quanto às exceções dilatórias (art. 578º) e às nulidades que lhe cumpra conhecer oficiosamente (art. 196º, remissivo para os arts. 186º, 187º, 191º, n.º 2, segunda parte, 193º e 194º), desde que sobre elas ainda não tenha proferido despacho com valor de caso julgado formal e dentro dos limites temporais do art. 734º. (…). Quarto e último princípio: o despacho do agente de execução considera-se definitivo depois de não ser suscetível de impugnação perante o juiz, seja por que o prazo de dez dias correu sem a sua dedução, seja porque a decisão que julgou a impugnação improcedente transitou em julgado. Não estando nós no exercício da função jurisdicional, bem faz a doutrina de Delgado de Carvalho em designar esta definitivamente como “caso estabilizado”. No entanto, o despacho do agente de execução continua a ser um ato com alguma possibilidade de ser revogado pelo juiz. Assim, se a definitividade sobreveio porque se passaram os 10 dias o despacho ainda pode ser revogado pelo juiz nas condições de conhecimento oficioso da regularidade da instância (…). Portanto, a definitividade não é absoluta”[19]. Destarte, decorre do que se vem dizendo que muito embora os atos e as decisões do agente de execução, nomeadamente, a decisão em que este declara extinta a execução pelo pagamento, como aconteceu no caso dos autos, quando tais atos ou decisões não sejam alvo de, respetivamente, reclamação ou impugnação, se consolidem e estabilizem na ordem jurídica, adquirindo uma força vinculativa semelhante ao trânsito em julgado que cobre as decisões judiciais, esses atos e decisões do agente de execução não consubstanciam decisões judiciais, nem o agente de execução ao praticar esses atos ou ao proferir tais decisões exerce funções jurisdicionais, pelo que a definitividade que as cobre, embora similar à força e autoridade do caso julgado formal que cobre as decisões judiciais, não se confunde com este, na medida em que a definitividade desses atos e decisões do agente de execução não é absoluta, mas antes podem ser modificadas nas circunstâncias acima elencadas. Daí que esses atos e decisões do agente de execução não se encontrem cobertas pela força e autoridade do caso julgado, mas sim pela força e autoridade do “caso estabilizado”, o qual não obsta à sua alterabilidade/modificabilidade em determinadas circunstâncias, como são os casos acima identificados e, bem assim, do previsto no art. 851º, n.º 1 do CPC. Com efeito, com relevo para o caso dos autos, nos termos do art. 851º, n.º 1 do CPC, quando a execução tenha corrido à revelia do executado, pode este invocar, a todo o tempo, na execução, ainda que esta tenha sido já declarada extinta, por decisão proferida pelo agente de execução que não tenha sido objeto de impugnação, formando, assim, “caso estabilizado”, algum dos fundamentos previstos na alínea e), do art. 696º, ou seja, que faltou a sua citação para a execução ou que a citação feita é nula; que não teve conhecimento da citação por facto que não lhe é imputável; ou que não pôde deduzir embargos por motivo de força maior; e se a arguição vier a ser julgada procedente, anula-se tudo o que na execução se tenha praticado (n.º 2, do art. 851º), sem prejuízo do disposto no n.º 4 desse preceito[20]. E não consubstanciando a decisão proferida pelo agente de execução que declarou extinta a execução uma decisão judicial, nem tendo esta sido por ele proferido no exercício de funções jurisdicionais, apesar dessa decisão se encontrar coberta pelo “caso estabilizado” (similar mas não confundível com o caso julgado que cobre as decisões judiciais), a mesma, tal como decidido pela 1ª Instância, não pode ser impugnada através de recurso extraordinário de revisão, sem que daqui decorra que a apelante, contrariamente ao que propugna, fique privada de meios de tutela, uma vez que esse meio de impugnação de tal decisão do agente de execução, atentos os fundamentos de revisão que invoca, encontram-se previsto no art. 851º, do CPC. Decorre do que se vem dizendo, que ao não admitir o recurso excecional de revista, a 1ª Instância não incorreu em nenhum dos erros de direito que são imputados pela apelante à decisão sob sindicância, impondo-se concluir pela improcedência da presente apelação e, em consequência, confirmar essa decisão”.
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Inconformada com a decisão sumária proferida pelo relator, a apelante veio, dentro do prazo geral de dez dias, requerer que, nos termos do disposto no art. 652º, n.º 2 do CPC, sobre a matéria objeto daquela, recaísse acórdão da conferência, dado não se conformar com o nela decidido, em virtude de “manter o entendimento de que estamos perante uma decisão final, transitada em julgado”.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DA RECLAMAÇÃO
Salvo o disposto no n.º 6 do art. 641º do CPC, quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente pode, nos termos do n.º 2, do mesmo preceito, requerer que sobre a matéria do despacho do relator recaia acórdão da conferência, devendo, nesse caso, o relator submeter o caso à conferência, depois de ouvir a parte contrária.
Logo, proferida que foi decisão sumária por parte do aqui relator, que julgou improcedente a apelação, assiste à recorrente o direito de requerer que sobre a matéria da decisão singular proferida pelo relator recaia acórdão da conferência, bastando para o efeito que, dentro do prazo geral de dez dias, o requeira, sem que se exija (mas sem que se vede) que a mesma justifique esse requerimento.
Daí que o objeto do acórdão a proferir pela conferência corresponda ao objeto do recurso sobre que incidiu a decisão singular proferida pelo relator[21].
Ora, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo esta Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam do conhecimento oficioso do tribunal - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC -, no seguimento desta orientação, a única questão que se encontra submetida à apreciação da conferência resume-se em saber se a decisão recorrida, que não admitiu o recurso extraordinário de revisão do despacho proferido pelo agente de execução que declarou extinta a execução pelo pagamento, apesar desse despacho não ter sido alvo de impugnação para o juiz da execução, com fundamento de que o recurso apenas pode ser interposto de uma decisão judicial já transitada em julgado, o que não é o caso dos despachos proferidos pelo agente de execução, os quais não consubstanciam qualquer decisão judicial, padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe revogar essa decisão e substituí-la por outra, em que se admita o presente recurso extraordinário de revista interposto pela apelante com fundamento no art. 696º, al. e) do CPC, prosseguindo esse recurso os seus termos legais, com a notificação pessoal da recorrida (apelada e exequente), para responder, querendo, ao recurso, no prazo de vinte dias, conforme determinado pelo n.º 2, do art. 699º do CPC.
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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos que relevam para se apreciar o presente recurso de apelação são os que constam do relatório acima elaborado.
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IV- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
O recurso extraordinário de revisão, regulado nos arts. 696º a 702º do CPC, constitui o expediente processual que possibilita a quem tenha ficado vencido por decisão judicial transitada em julgado, a reabertura do processo em que essa decisão foi proferida, quando esta se encontre afetada por um dos vícios taxativamente elencados numa das alíneas do art. 696º do mesmo Código, com vista à revogação dessa decisão e à prolação de nova decisão judicial, no processo em que foi proferida, extirpada do vícios ou vícios que afetavam a anterior, por o legislador considerar que a manutenção dessa anterior decisão judicial, com esse tipo de vícios, acarreta maior prejuízo para a justiça material e o prestígio dos tribunais do que aquele que decorreria da manutenção do nela decidido e o consequente respeito do caso julgado que a cobre.
No recurso extraordinário de revisão assiste-se, assim, a um conflito entre, por um lado, a certeza e a segurança jurídica, que são apanágio do caso julgado que cobre a decisão judicial antes proferida e, por outro lado, a justiça material, gravemente lesada pelos vícios taxativamente enunciados no art. 696º que afetam essa decisão judicial anteriormente proferida, já transitada em julgado.
Perante esse conflito, entende o legislador que perante os vícios que taxativamente elenca nas diversas alíneas do art. 696º do CPC e sempre que não se mostrem decorridos os prazo de caducidade previstos no art. 697º, n.ºs 2, 3 e 4 do CPC, se está perante casos limite de violação da justiça material os quais impõem que se afaste o caso julgado que cobre a decisão antes proferida, com o inerente sacrifício da certeza e da segurança jurídica, e se reabra o processo em que esta foi proferida com vista à prolação de nova decisão em que esses vícios sejam expurgados.
Destarte, como se expende na decisão singular proferida pelo relator, o recurso extraordinário de revisão comporta três fases distintas e sucessivos: a) a fase liminar, que se inicia com a apresentação de requerimento inicial por parte do recorrente, em que terá de alegar os factos constitutivos de um os de vários dos fundamentos de revisão taxativamente enunciados no art. 696º do CPC e, no caso do fundamento invocado ser o da al. g) daquele art. 696º, terá de alegar o prejuízo resultante da simulação e, nos casos dos fundamentos de revisão que invoca serem os das als. a), c), f) e g) desse mesmo preceito, terá de adicionalmente instruir o requerimento inicial com os documentos identificados no n.º 2, do art. 698º, em que o juiz deverá indeferir liminarmente o recurso extraordinário de revisão sempre que se verifique uma das situações enunciadas na decisão sumária proferida pelo relator, com o que não só prossegue os interesses dos recorridos, mas também o do próprio recorrente, evitando-se, assim, a prática de atos processuais inúteis, com os inerentes custos, quando o recurso extraordinário de revisão que interpôs, de acordo com as várias soluções de direito plausíveis suscetíveis de lhe serem aplicadas, não tem qualquer viabilidade de vir a proceder (cfr. art 899º, n.º 1, do CPC); b) a fase rescindente, em que ultrapassada a fase liminar, se notifica pessoalmente o recorrido para responder, querendo, no prazo de vinte dias ao recurso e em que a ausência de resposta ao recurso não tem qualquer efeito cominatório, em que, no caso do recurso extraordinário de revisão se fundar nas als. a), c), e) e/ou f) do art. 696º, independentemente do recorrente responder ou não ao recurso, após a realização das diligências instrutórias que tenha por indispensáveis para a prolação de decisão, o juiz decide se existe ou não fundamento para a revisão da decisão judicial proferida, transitada em julgado, de que o recorrente recorre, com a consequente revogação ou não desta – decisão rescindenda (arts. 699º, n.º 2 e 700º, n.º 1), ou fundando-se o recurso nas als. b), d) e/ou d) do art. 696º, após a resposta do prazo para o recorrido responder ao recurso, ou logo que o prazo para o efeito se mostre decorrido, o recurso extraordinário de revisão seguirá os termos do processo comum declaratório, proferindo-se a final decisão julgando procedente ou improcedente o recurso de revisão, com a consequente revogação ou não da decisão rescindenda; e, finalmente, c) a fase rescisória, em que, no caso de prolação de decisão, julgando o recurso de revisão procedente, com a consequente revogação da decisão rescindenda antes proferida e transitada em julgado, se reabre o processo em que esta foi proferida, com vista à prolação de nova decisão expurgada do vício ou vícios que afetavam a anterior decisão proferida (a decisão rescindida).
Conforme decorre do que se vem dizendo e se ponderou na decisão proferida pela 1ª Instância e, bem assim, na decisão singular prolatada pelo relator, o recurso extraordinário de revisão tem como pressuposto a prolação de uma decisão judicial, seja ele despacho, sentença ou acórdão e, bem assim, que essa decisão já se encontre transitada em julgado, por não admitir recurso ordinário ou reclamação (art. 628º) e que esta padeça de um dos vícios previstos no art. 696º, na medida em que o recurso de revisão consubstancia o mecanismo processual ou remédio que o legislador coloca ao dispor de quem ficou vencido nessa decisão para afastar a obrigatoriedade e incontestabilidade intra processual (no caso de caso julgado formal – art. 620º), ou intra e extraprocessualmente do nela decidido (tratando-se de caso julgado material – arts. 619º, n.º 1 e 621º), decorrente do respetivo trânsito em julgado, sempre que a mesma padeça de um ou de vários dos vícios taxativamente elencados no art. 696º.
Dito por outras palavras, o recurso extraordinário de revisão tem impreterivelmente de ter por objeto uma decisão judicial (despacho, sentença ou acórdão), já transitada em julgado, e que essa decisão enferme de um ou de vários dos vícios taxativamente enunciados no art. 696º.
O fundamento de revisão que vem invocado pela apelante do despacho proferido pelo agente de execução, que julgou extinta, pelo pagamento, a execução para pagamento de quantia certa instaurada, em 23/03/2019, pela exequente M..., Lda. (aqui apelada e recorrida) contra a aqui recorrente e apelante, AA (ali executada), servindo de título executivo a essa execução uma confissão de dívida subscrita pela última, em que se declara devedora à aí exequente da quantia de 2.792,92 euros, decorrente do incumprimento de um contrato-promessa celebrado em 11/11/2015, correspondente ao sinal em dobro que a exequente, na qualidade de promitente compradora, lhe entregou no âmbito desse contrato promessa, enquanto aí promitente vendedora, e em que a exequente requereu que se declarasse a comunicabilidade dessa dívida (dívida exequenda) ao cônjuge-marido da exequente (apelante e recorrente), BB, execução essa no âmbito da qual a apelante (aí executada) e o seu marido foram citados editalmente, quando, inclusivamente, o seu marido era já então falecido, e no âmbito da qual foram penhorados e vendidos direitos indivisos propriedade da ora apelante (aí executada) sobre dois prédios, cujo produto de venda se mostrou suficiente para liquidar a quantia exequenda e as custas da execução, é o da al. e), do art. 696º do CPC, pretendendo a apelante que, por via da procedência do presente recurso extraordinário de revisão, se declare a falta de citação daquela e do seu falecido marido para os termos da identificada execução ou, pelo menos, se declare a nulidade da citação edital daqueles nela efetuada, com a revogação da decisão proferida pelo agente de execução que julgou extinta essa execução pelo pagamento, e de tudo o quanto nessa execução foi processado posteriormente à citação edital daqueles e se ordene a citação “dos executados para a causa”, isto é, para os termos da identificada execução.
Enfatiza-se que, contrariamente ao que parece ser o entendimento da apelante, na decisão sumária proferida pelo aqui relator, não se discute que a decisão proferida pelo agente de execução, que julgou extinta a execução pelo pagamento, não seja uma decisão final. Pelo contrário, lida essa decisão sumária nela aceita-se expressamente que a decisão em referência é uma decisão final, mas o que não se aceita é que essa decisão (final) do agente de execução seja uma decisão judicial e que o “caso estabilizado” que a cobre, decorrente de não ter sido objeto de impugnação para o juiz da execução, possa ser equiparado à noção de “caso julgado” para efeitos da sua impugnação através do recurso extraordinário de revisão.
Com efeito, tendo o recurso extraordinário de revisão necessariamente por objeto uma decisão judicial já transitada em julgado, escreve-se na decisão sumária em referência que: “A questão que se suscita nos autos é a de saber se, no âmbito de uma execução para pagamento de quantia certa, instaurada contra a aqui apelante (recorrente) e em que foi requerida a declaração da comunicabilidade da dívida exequenda ao marido desta, no âmbito da qual foram citados editalmente e em que foram penhorados e vendidos judicialmente direitos indivisos da apelante sobre dois prédios, cujo produto foi suficiente para liquidar a quantia exequenda e as custas da execução, a decisão proferida pelo agente de execução declarando extinta a execução pelo pagamento, quando não seja alvo de impugnação, deve ser equiparada a uma decisão judicial para efeitos de recurso de revisão e se, consequentemente, assiste à apelante o direito a interpor recurso de revisão dessa decisão do agente de execução com fundamento no art. 696º, al. e) do CPC, conforme fez”.
A propósito dessa questão, ponderou-se que, com a reforma ao CPC, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 08/03, criou-se a figura do solicitador de execução, a quem foi atribuída competência para proceder às notificações e citações (arts. 239º e 864º do CPC/2003), para, no âmbito das ações executivas, proceder à apreensão de bens do executado (arts. 832º, n.º 2 e 930º, n.ºs 1 e 2 do CPC/2003) e para proceder à posterior penhora e entrega desses bens (art. 930º, n.º 1 do CPC/2003)” e, bem assim, que, na sequência da reforma ao mesmo Código, “introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, entrada em vigor em 01 de setembro de 2013”, nos termos do art. 719º, n.º 1 do CPC, atribuiu-se “ao agente de execução, no âmbito da ação executiva, competência residual”, passando este a ter competência para todas as diligências da execução, salvo aquelas que a lei expressamente reserva ao juiz ou à secretaria.
Mais se ponderou que, embora atualmente, nos termos do art. 849º, n.º 1, do CPC, a extinção da execução seja uma decorrência da verificação de um dos circunstancialismos previstos nesse dispositivo legal a que a lei atribui eficácia extintiva da execução, com exceção de extinção da execução com fundamento em inutilidade superveniente da lide por inexistência de bens a penhorar ou na sequência de adjudicação de direitos de crédito, ou no caso de adjudicação de quantias vincendas, em caso de penhora de rendas, abonos ou salários, as quais constituam causas automáticas de extinção da instância executiva, quanto aos restantes fundamentos extintivos da execução previstos no n.º 1, do art. 849, estes não são de funcionamento automático, ou seja, não basta “a mera verificação desses fundamentos para que a execução se extinga automaticamente, mas essa extinção reclama que se profira uma decisão fundamentada acerca da verificação dos pressupostos da concreta causa de extinção da execução”, cabendo “a competência para proferir o despacho declarando a extinção da execução, na sequência do que se vem dizendo, ao agente de execução, face à natureza residual da competência que lhe é atribuída pelo n.º 1 do art. 719º do CPC” e do disposto no n.º 3, do art. 849º.
Contudo, ponderou-se nessa decisão sumária que, apesar da competência para julgar extinta a execução pelo pagamento competir ao agente de execução e dessa decisão final ter de ser proferida por este, sem o que a execução não se considera extinta, que apesar de, “na ação executiva o agente de execução apareça como um oficial público que é auxiliar da justiça, que, embora escolhido pelo exequente, não é mandatário nem representante deste (art. 162º, n.º 3 da Lei n.º 154/2015), estando sujeito aos fundamentais deveres de legalidade e justiça, consagrados nos arts. 124º, n.º 3, als. b) e l), 169º, n.º 1, al. g) e 177º, n.º 3, do mesmo diploma, bem como ao dever de imparcialidade, nos termos dos arts. 119º e 168º, n.º 1 deste”, na qual, “na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública em nome do Estado” (…), integrando “a administração da justiça, a par de juízes, ministério público, oficiais de justiça, e entes privados, como os administradores judiciais, entre outros”, o mesmo “não é um funcionário do Estado, mas antes um profissional liberal, nisso se aproximando do solicitador e do advogado, não existindo relação laboral ou hierárquica do agente de execução perante o Estado ou o juiz. Daí que os despachos proferidos pelo agente de execução no âmbito da ação executiva, incluindo o despacho em que declara extinta a instância executiva, não assumam natureza de decisões judiciais, pelo que, salvo melhor opinião, quanto às decisões do agente de execução, dado não terem natureza de ações judiciais, nem exercendo este funções jurisdicionais, não faz sentido falar-se em caso julgado formal ou material”, quando esses atos ou decisões não sejam objeto de, respetivamente, reclamação ou impugnação para o juiz da execução.
Na verdade, apesar desses atos ou decisões do agente de execução se estabilizarem e consolidarem “na ordem jurídica, tornando-se incontestáveis e inalteráveis, de forma semelhante ao trânsito em julgado da decisão judicial, mas não se trata de caso julgado, mas sim de “caso estabilizado”, (…), uma vez que, diversamente do que acontece com as decisões judiciais transitadas em julgado, que são inalteráveis e imodificáveis, “embora os atos e as decisões do agente de execução, nomeadamente, a decisão em que este declara extinta a execução pelo pagamento, quanto tais atos ou decisões não seja, alvo de, respetivamente, reclamação ou impugnação, se consolidem e estabilizem na ordem jurídica, adquirindouma forma vinculativa semelhante ao trânsito em julgado que cobre as decisões judiciais, esses atos e decisões do agente de execução não consubstanciam decisões judiciais, nem o agente de execução ao praticar esses atos ou ao proferir tais decisões exerce funções jurisdicionais, pelo que a definitividade que as cobre, embora similar à força e autoridade do caso julgado formal que cobre as decisões judiciais, não se confunde com este, na medida em que a definitividade desses atos e decisões do agente de execução não é absoluta, mas antes podem ser modificadas em determinadas circunstâncias”(as identificadas na decisão sumária).
Ora, analisados os amplos argumentos doutrinários e jurisprudenciais que se encontram explanados na decisão sumária proferida pelo relator, não podemos deixar de sufragar que o agente de execução não exerce, na execução, funções materialmente judiciais, mas sim materialmente administrativas e que os atos e as decisões que aí profere não são materialmente judiciais, mas sim materialmente administrativas[22], pelo que, quanto a elas, por não se estar perante qualquer decisão judicial, não faz sentido falar-se em caso julgado, uma vez que se trata de instituto apenas aplicável às decisões judiciais, sem prejuízo do que a esse propósito se escreveu na decisão sumária sobre a abrangência do conceito de “decisão judicial”.
Acresce que, os atos e decisões do agente de execução, quando não sejam objeto de, respetivamente, reclamação ou de impugnação para o juiz da execução, apesar de se estabilizarem na ordem jurídica, tornando-se inalteráveis e imodificáveis, onde adquirem uma força vinculativa semelhante ao trânsito em julgado que cobre as decisões judiciais, essa definitividade e inalterabilidade não se confunde com a que é própria do trânsito em julgado, na medida em que, contrariamente ao que acontece com as decisões judiciais transitadas em julgado, em que a definitividade e inalterabilidade do nelas decidido é absoluta, os atos e as decisões do agente de execução que não sejam objeto, respetivamente, de reclamação ou de impugnação, não gozam de definitividade e inalterabilidade absolutas, posto que podem, em determinadas circunstâncias, ser alteradas/modificadas, compreendendo-se, por isso, que a doutrina fale em relação a estes de “caso estabilizado”[23].
Por conseguinte, não sendo a decisão do agente de execução que julgou extinta a execução, pelo pagamento, uma decisão judicial, mas sim uma decisão materialmente administrativa, nem exercendo o agente de execução, no âmbito da execução, funções judiciais, mas antes funções materialmente administrativas, embora a decisão do agente de execução que julgou extinta a execução seja efetivamente uma decisão final, posto que pôs termo à execução instaurada pela exequente (apelada) M..., Lda. contra a aqui recorrente (ali executada), essa decisão, na medida em que não foi objeto de impugnação para o juiz, apesar de se encontrar consolidada na ordem jurídica em termos semelhantes às decisões judiciais transitadas em julgado, não se encontra coberta pelo caso julgado, mas si pelo “caso estabilizado”.
Daí que essa decisão do agente de execução que julgou extinta a execução pelo pagamento, tal como decidido na decisão sumária, não possa ser objeto de recurso extraordinário de revisão por, reafirma-se, esse recurso ter necessariamente por objeto decisões judiciais, já transitadas em julgado, que padeçam dos vícios taxativamente elencados no art. 696º do CPC, o que não é o caso daquela decisão do agente de execução.
Acresce dizer que, contrariamente ao pretendido pela apelante, o facto da decisão do agente de execução que julgou extinta a execução, coberta pelo “caso estabilizado”, não poder ser impugnada mediante o recurso extraordinário de revisão, não significa que a lei deixe a apelante sem tutela jurisdicional efetiva para a pretensa falta de citação da executada e do seu falecido marido para os termos dessa execução ou da indevida citação edital daqueles para os seus termos.
Com efeito, conforme se pondera na decisão sumária, esse mecanismo de impugnação a que a apelante pode recorrer consta do art. 851º do CPC, onde se lê que: “Se a execução ocorrer à revelia, pode o executado invocar, a todo o tempo, algum dos fundamentos previstos na alínea e) do artigo 696º” (n.º 1); “A reclamação pode ser feita mesmo depois de finda a execução” (n.º 3) e, bem assim, que “Se, após a venda, tiver decorrido o tempo necessário para a usucapião, o executado fica apenas com o direito de exigir do exequente, no caso de dolo ou de má-fé deste, a indemnização do prejuízo sofrido, se esse direito não tiver prescrito entretanto” (n.º 4).
De resto, cumpre enfatizar que a circunstância de a lei prever este mecanismo específico de reação a que o executado pode recorrer a fim de impugnar os atos e decisões nela praticados sempre que essa execução tenha corrido à sua revelia por falta de citação daquele para os termos dessa execução ou da citação nela efetuada ser nula, por não ter tido conhecimento da sua citação para os termos da execução por motivo que não lhe é imputável, ou por não ter podido deduzir oposição à execução por motivo de força maior (al. e), do art. 696º do CPC), mostra-se em plena concordância com o facto do meio de reação contra aos atos e decisões proferidas pelo agente de execução no âmbito do processo executivo, que não tenham sido objeto de reclamação ou impugnação, respetivamente, não ser o recurso extraordinário de revisão, mas sim a anulação da execução em caso de revelia, prevista no art. 851º do CPC.
Resulta do que se vem dizendo, improceder a apelação, mantendo-se a decisão sumária do relator reclamada, que julgou improcedente a reclamação e confirmou a decisão recorrida.
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Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
1- O recurso extraordinário de revisão apenas pode ter por objeto decisões judiciais (sentença, acórdão ou despacho) transitadas em julgado, por já não admitirem recurso ordinário nem reclamação, e que enfermem de um dos vícios taxativamente elencados no art. 696º do CPC.
2- Os atos e decisões proferidas pelo agente de execução no âmbito da ação executiva não são atos ou decisões judiciais mas sim atos e decisões materialmente administrativos, nem o agente de execução exerce, na execução, funções judiciais, mas antes funções materialmente administrativas.
3- Acresce que esses atos e decisões do agente de execução, quando não sejam objeto de, respetivamente, reclamação ou impugnação para o juiz da execução, embora se estabilizem na ordem jurídica, onde adquirem uma força vinculativa e de incontestabilidade/inalterabilidadesemelhanteà que cobre as decisões judiciais transitadas em julgado, não se confunde com o caso julgado que cobre as decisões judiciais, não fazendo sentido falar-se quanto a eles “em caso julgado” mas em “caso estabilizado”, posto que, além de não se estar perante decisões judiciais mas perante atos e decisões materialmente administrativas, a incontestabilidade e inalterabilidade que os cobre, contrariamente ao que sucede com as decisões judiciais transitadas em julgado, não é absoluta, podendo aqueles atos e decisões do agente de execução ser alterados/modificados em determinados condicionalismos legais.
4- Por conseguinte, o meio processual adequado para a exequente reagir contra o despacho do agente de execução que julgou extinta a execução pelo pagamento (pelo produto dos bens penhorados e vendidos no âmbito dessa execução) e que não foi alvo de impugnação para o juiz, com fundamento na al. e), do art. 696º do CPC (falta de citação daquela para os termos da execução ou nulidade da citação edital daquela para os termos dessa execução), não é o recurso extraordinário de revisão mas sim a arguição desses pretensos vícios nos próprios autos de execução, nos termos do art. 851º do CPC.
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V- Decisão:
Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, julgam a reclamação apresentada pela apelante totalmente improcedente e, em consequência:
- mantêm a decisão sumária proferida pelo relator, que julgou improcedente a apelação e confirmou a decisão recorrida.
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Custas da apelação pela apelante (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 07 de junho de 2023
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:
José Alberto Moreira Dias – Relator
Alexandra Maria Viana Parente Lopes - 1ª Adjunta
Rosália Cunha - 2ª Adjunta.--
[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, pág. 566; Ac. STJ., de 22/03/2018, Proc. 3236/11.5TBMAI-A.P1.S1, in base de dados da DGSI, onde constam todos os acórdãos que se venham a citar sem menção em contrário. [2] Acs. STJ. de 17/09/2009, Proc. 09S0318; de 21/10/2009, Proc. 12124/04.OTDLSB-A.S1. [3] Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. IV, Coimbra -1985, págs. 335 a 337. [4] Taxatividade esta que resulta do vocábulo “só” empregue no art. 696º do CPC.
Neste sentido, veja-se Acs. STJ de 16/10/2018, Proc. 16620/08.2YYLSB.D.L1.S1, de 19/10/2017, Proc. 181/09.8TBAVV.A.G1.S1, RP. de 30/01/2017, Proc. 402/12.0TTVNG-B.P1. [5] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, págs. 863 e 864, notas 1 e 2. [6]Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Flipe Pires de Sousa, ob. cit., págs. 864 a 865; Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 567; Acs. STJ., de 02/06/2016, Proc. 13262/14.7T8LSB-A.L1.S1; RG., de 10/01/2019, Proc. 98/16.0T8BGC-A.G1. [7] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 567; Lebre de Freitas, “Recurso Extraordinário: recurso ou ação”, in “As Recentes Reformas na Ação Executiva e nos Recursos”, págs. 25 e segs.; Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, págs. 492 e 493, nota 702. [8] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., pág. 858, nota 2; Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 568, em que expende: “Foi muito de caso pensado que o proémio do (atual) art. 696º substituiu, expressis verbis, a referência ao vocábulo sentença do preceito homólogo do Código anterior pela expressão qualquer decisão judicial transitada em julgado. Isto para significar, sem margem para qualquer dúvidas, serem passíveis do recurso de revisão, tanto as sentenças e despachos dos tribunais de 1ª instância como os acórdãos dos tribunais superiores”. Realçando, contudo, que: “Atentas, porém, as causas de revisão elencadas na lei (e salvo raras exceções) a revisão só se adapta às sentenças propriamente ditas e aos acórdãos dos tribunais superiores. A revisão pressupõe, em regra, uma decisão final de mérito proferida no respetivo processo ou incidente”. [9] Ferreira de Almeida, ob. cit., págs. 568 e 569; Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, ob. cit., pág. 495. [10] Ac. RP, de 03/05/1994, Proc. 9321180. [11] Acs. STJ, de 05/11/1992, BMJ, 421º, pág. 341; RG, de 15/03/2006, Proc. 401/06-1; Lebre de Freitas, “A Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª ed., Coimbra Editora, pág. 415. [12] Exposição de Motivos da Lei n.º 41/2013, de 26/06. [13] Rui Pinto, “A Ação Executiva”, 2018, AAFDL Editora, págs. 105 e 106.
Ainda Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. II, Almedina, 2020, págs. 59 a 62, em que escrevem: “No atual modelo da ação executiva, as competências do juiz são restritivas e tipificadas, sem prejuízo da reserva de jurisdição a que alude o art. 202 n.º 2 da CRP. O juiz apenas pode fiscalizar a legalidade dos atos processuais no âmbito do que lhe for solicitado, para além de apreciar questões de conhecimento oficioso”. Após sustentarem, a fls. 719, competir “ao agente de execução a prática da quase totalidade dos atos de execução, com exceção dos materialmente jurisdicionais e especificamente daqueles cuja competência é legalmente deferida ao juiz”, continuam, a fls. 61, que: “o agente de execução pratica atos executivos e profere decisões sobre a relação processual (v.g. art. 855º, n.º 2, al. a)) e ainda sobre a realização coativa da prestação (v.g. arts. 763º, n.º 1, 803º, n.º 1 e 849º). Os atos executivos podem ser vinculados (v.g. modo de realização da penhora), discricionários (v.g. arts. 812º, n.º 5 e 833º, n.º 1) ou de mero expediente (v.g. fixação da data da venda). Perante a prática de um ato executivo ou a prolação de uma decisão do agente de execução, há que se verificar se a lei prevê um específico meio processual de reação, o qual pretere a aplicação das als. c) e d) do n.º 1 do art. 723º. (…) Ou seja, a reclamação regulada no art. 723º não constitui meio alternativo nem cumulativo face a outros meios de reação especificamente previstos: a existência destes últimos afasta os expedientes previstos no art. 723º, n.º1, als. c) e d)”. [14] Neste sentido Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, pág. 272, após, na nota 1, ponderarem que: “Nos termos deste preceito (referindo-se ao art. 849º, n.º 1), a extinção da execução é uma decorrência da verificação de um dos seguintes circunstancialismos: (…)”, logo, na nota 2, acrescentam: “As situações enumeradas nas alíneas e) e f) constituem causas automáticas de extinção da instância, ao passo que as referidas nas demais alíneas não operam sem mais, implicando uma decisão fundamentada do agente de execução acera de verificação dos pressupostos da concreta causa de extinção”.
No mesmo sentido, acs. RG. de 15/05/2014, Proc. 5523/13.9TBBRG-G1; RL. de 20/06/2017, Proc. 34/12.2TBFC-A.L1; RE de 23/03/2017, Proc. 3133/07.9TJLB.B1.E1; de 11/09/2014, Proc. 3079/10.3TBFAR.E1; RC. de 07/06/2016, Proc. 302/13.6TBLSA.C1, lendo-se neste que: “Na ação executiva, a verificação da extinção da instância por deserção, incumbirá, em regra, ao agente de execução. Embora a deserção da instância (na ação executiva) não necessite de ser declarada por despacho judicial, não prescinde de uma apreciação prévia sobre a verificação dos seus pressupostos e que serão a negligência do exequente em promover o respetivo andamento”.
No sentido de que as causas extintivas da execução previstas no art. 841º, n.º 1 do CPC, operam automaticamente, produzindo automaticamente o efeito extintivo da instância, independentemente de qualquer sentença ou despacho, aparentemente Lebre de Freitas, ob. cit., págs. 415 e 416, onde pondera que: “Com a reforma da ação executiva, deixou de ter lugar essa sentença, produzindo-se automaticamente o efeito extintivo da instância (art. 849º, n.º 1). A questão da formação de caso julgado no processo executivo deixou, pois, de se poder pôr”. Contudo, logo acrescenta: “Mas, hoje como ontem, o efeito de direito substantivo do facto extintivo da obrigação exequenda (pagamento ou outro) invocado na ação executiva não deixa de se produzir, obstando ao êxito duma nova ação executiva, mas não impedindo a propositura, pelo executado, duma ação de restituição do indevido”. [15] Rui Pinto, ob. cit., págs. 125 a 127. [16] Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 416; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, pág. 273, nota 8; Rui Pinto, ob. cit., pág. 963. [17] Acs. R.E., de 23/05/2022, Proc. 870/14.5TBCTX-A.E1; R.C., de 27/06/2017, Proc. 522/05.7TBAGN.C1. [18] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta a Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, págs. 62 e 63, notas 12 e 13. [19] Rui Pinto, ob. cit., págs. 122 e 124. [20] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, págs. 275 e 276; Rui Pinto, ob. cit., págs. 963 e 964. [21] Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, págs. 246 e 247, em que expende: “Mais do que encarar esta iniciativa como uma forma de impugnação da decisão singular, trata-se de um instrumento que visa a substituição dessa decisão por uma oura com intervenção do tribunal coletivo, passo fundamental para que possa ser interposto recurso de revista. Atenta esta configuração, a atuação pela parte pode consistir tão-só na manifestação de vontade de que a matéria em causa seja levada à conferência integrada pelo relator e pelos respetivos adjuntos. Com efeito, a lei prevê simplesmente que a parte prejudicada por algum despacho do relator requeira que sobre o mesmo “recaia um acórdão”, sem exigir expressis verbis (mas também sem vedar) qualquer justificação para essa iniciativa ou sequer a motivação que leva a sustentar uma posição diversa. O facto de ter sido proferido despacho sobre qualquer questão processual ou material delimita suficientemente o objeto do posterior acórdão, dispensando outros desenvolvimentos. (…). A intervenção da conferência deve ser requerida no prazo de 10 dias (art. 149º, n.º 1)”. E onde conclui: “Em qualquer dos casos, é sobre o projeto elaborado pelo relator que o coletivo irá incidir, com manutenção, revogação ou alteração da decisão reclamada, de acordo com o entendimento que se revelar maioritário”. [22] Rui Pinto, “A Ação Executiva”, 2018, AAFDL Editora, pág. 129, em que, a propósito da natureza jurídica dos atos executivos praticados pelo agente de execução, escreve impor-se distinguir “os planos orgânico e material. No plano formal ou orgânico o processo executivo é um processo judicial, pois está distribuído a um tribunal, apesar de o agente de execução, ter a sua direção. Daí a sua qualificação legal como “ação” no artigo 10º, n.ºs 1 e 4. O tribunal tem competências de resolução de questões controvertidas e de tutela de direitos subjetivos. Por contraste, o Procedimento extrajudicial pré-executivo da Lei n.º 32/2012, de 30 de maio, é, justamente, extrajudicial, pois é atribuído somente ao agente de execução. Já no plano material ou funcional o processo executivo não é um processo jurisdicional, quando desconsiderados os incidentes declarativos, ergo, a sua função primária, o processo executivo é materialmente administrativo”, e a fls. 963, reportando-se à decisão do agente de execução que julga extinta a execução, pondera que: “Ora, atualmente o encerramento da execução é feita por uma entidade administrativa – o agente de execução. Trata-se de um ato interno da instância em causa, inidóneo só por si a vincular externamente. Portanto, em absoluto se lhe poderá assacar algum tipo de eficácia de caso julgado. Por outro lado, a extinção da dívida por pagamento numa execução, poderá ser invocada noutro processo, como proposto por Lebre de Freitas.
No mesmo sentido Lebre de Freitas, “A Ação Executiva à Lua do Código de Processo Civil de 2013”, 6ª ed., Coimbra Editora, págs. 415 e 416: “Com a reforma da ação executiva, deixou de ter lugar essa sentença” (referindo-se à sentença de extinção da execução). “A questão da formação de caso julgado no processo executivo, deixou, pois, de se poder pôr. Mas, hoje como ontem, o efeito de direito substantivo do facto extintivo da obrigação exequenda (pagamento ou outro) invocado na ação executiva não deixa de se produzir, obstando ao êxito duma nova ação executiva, mas não impedindo a propositura, pelo executado, duma ação de restituição do indevido”. [23] Rui Pinto, ob. cit., págs. 122 a 124; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. II, Almedina, págs. 62 e 63, notas 12 e 13, também citadas na decisão sumária proferida pelo relator.