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RESPONSABILIDADE CIVIL
DANO PATRIMONIAL FUTURO
EQUIDADE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Sumário
I - Quando o défice funcional permanente de que o lesado fica a padecer é impeditivo da atividade profissional habitual, permitindo apenas que esse lesado exerça outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnica desde que não exijam a execução de tarefas complexas, a limitação acrescida que tal situação implica, justifica que no cálculo do dano patrimonial futuro seja devidamente ponderada tal situação, reduzindo o impacto que a habitual redução por antecipação do capital implica. II - Considerando que o A. à data do acidente com 23 anos de idade, estava desempregado, que o salário médio nacional em tal data era de € 925,00 e que o A. ficou afetado de uma incapacidade de 61 pontos impeditiva da atividade profissional habitual, permitindo apenas que esse lesado exerça outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnica desde que não exijam a execução de tarefas complexas, entende-se adequado e recorrendo a critérios de equidade fixar o valor indemnizatório a título de dano patrimonial futuro no montante de € 400.000,00 tal como peticionado pelo autor. III - Levando em consideração a total ausência de culpa do autor na produção do acidente que à data do acidente era um jovem de 23 anos de idade; a sua modesta condição económica; a imensa gravidade das lesões sofridas pelo autor que implicaram um défice funcional permanente de 61 pontos e a prolongadíssima recuperação – até à consolidação médico-legal das lesões decorreram sensivelmente dois anos e meio; o quantum doloris fixado no grau 6 de uma escala de 7 , a permanência para o resto da vida das dores físicas, incómodo e mal estar que as sequelas lhe provocam e que o acompanharão para o resto da vida, entende-se ser de arbitrar a título de danos não patrimoniais o valor de € 175.000,00.
I-Relatório AA instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra “A...CompanhiadeSeguros,S.A.”.
Pela procedência da ação peticionou o A. a condenação da R. a pagar ao A. a quantia de € 484.728,00, acrescida de juros de mora contados desde a citação e até integral e efetivo pagamento.
Para tanto e em suma alegou ter ocorrido um acidente de viação no qual foi interveniente o veículo identificado em 4º da p.i., onde o A. seguia como passageiro e que ao descrever uma curva entrou em despiste por do mesmo ter perdido controlo o seu condutor, nos termos que melhor descreveu na p.i..
Condutor que conduzia esse mesmo veículo por conta e no interesse de sua proprietária – pelo que se presume a culpa - a qual transferira para a aqui R. a responsabilidade civil emergente da circulação deste veículo.
R. que sempre responderia a título de risco.
Em consequência do acidente descrito tendo o A. sofrido vários danos que nos autos identificou e cuja indemnização peticiona da R..
Posteriormente (por requerimento de 08/11/2021), o A. formulou ampliação do pedido para o montante de €1.279.728,00. Ampliação de pedido admitida por despacho de 10/11/2021 (em ata).
Contestou a R. em suma:
i- excecionando a inexistência de seguro válido e eficaz.
Para tanto alegou a prestação de declarações inexatas por parte da segurada quanto ao condutor habitual do veículo, com o propósito de enganar a R. quanto a tal facto, que teria influenciado na decisão sobre o risco assumido pela R. e na quantificação do prémio.
Invalidando esta inexatidão ou falsidade ab initio os efeitos da apólice nos termos dos artigos 24º e 25º do DL 72/2008.
Não estando a ré obrigada a cobrir o sinistro que ocorra antes de ter conhecimento do incumprimento doloso da obrigação do tomador do seguro ou do segurado declarar com exatidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para a apreciação do risco pelo segurador.
Pelo que deve o tribunal considerar o contrato anulado com efeitos a 17/02/2016, nos termos da comunicação que a R. enviou à segurada em 13/09/2017;
ii- Sem prescindir, impugnou a R. a factualidade alegada.
Tendo ainda alegado ter o A. também responsabilidade nos danos que sofreu, já que circulava sem cinto de segurança colocado, para além de o veículo circular sem os airbags a funcionar. Desconhecendo a R. se o A. sabia deste problema dos airbags.
iii- Requereu ainda a R. a intervenção acessória da tomadora do seguro e do condutor do veículo, atendendo às questões por si suscitadas sobre o contrato de seguro propriamente dito e com a inexistência de condições técnicas de segurança ao nível dos airbags destinados a proteger o passageiro, e outras ainda respeitantes à responsabilidade do próprio autor por falta da utilização do cinto de segurança.
Respondeu o A. às exceções invocadas, tendo a final requerido a intervenção principal provocada:
- Do Fundo de Garantia Automóvel;
- De BB e - De CC.
Foi admitida a intervenção principal provocada de BB, CC e “Fundo de Garantia Automóvel”.
Citados, todos contestaram, concluindo a final pela sua absolvição do pedido.
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Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova, sem reclamação.
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Por requerimento da aqui R. “A...” de 06/01/2021 peticionou esta a apensação a estes autos, da ação intentada pelo Centro Hospitalar ..., EPE contra os aqui intervenientes passivos e na qual o autor peticionou a condenação dos ali RR. ao pagamento total de 79.987,28 €, acrescido dos juros vencidos peticionados, no montante de 6.148,16 € e que perfazem um total de 85.135,44 € e dos vincendos até efetivo e integral pagamento.
Valor este peticionado a título de assistência hospitalar prestada ao aqui A. como consequência do acidente em discussão nos autos.
Apensação que foi deferida nos termos da decisão de 27/04/2021 [cfr. ainda cota de apensação do apenso C de 07/05/2021].
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Realizada audiência final foi após proferida sentença, decidindo: “Julga-separcialmenteprocedenteapresenteação,e,consequentemente: a)Condena-seaRé,A...,S.A.,apagaraoA.,AAaquantiade€362.215,58,noentanto,opera-seacompensaçãode€6.000,00pagosatítulodereparaçãoprovisória,peloqueficaaR.obrigadaapagaraquantiade€356.215,58(trezentosecinquentaeseismilduzentosequinzeeurosecinquentaeoitocêntimos),bemcomojurosmoratórioslegaiscivis,contadosdesdeacitaçãoatéefetivoeintegralpagamento. b)Condena-seaR.apagaraoA.AAaquantiaaliquidaremexecuçãodesentençarelativoaovalorcorrespondenteaapoiodeterceirapessoaatéaolimitede€700.000,00,nostermosdoartº609º,nº2,doCPC. c)Condena-seaR.apagaraoCentro Hospitalar ...,EPEovalorde€78.987,28(setentaeoitomilnovecentoseoitentaeseteeurosevinteeoitocêntimos),bemcomojurosdemoravencidosnomontantede€6.148,16(seismilcentoequarentaeoitoeurosedezasseiscêntimos),bemcomoosjurosdemoravincendosàtaxalegal. d)Julga-seimprocedenteoremanescentedopedidodeduzidopeloA.AAedeleseabsolveaR.. e)Absolve-seosIntervenientesPrincipais,BB,CCeFundodeGarantiaAutomóveldapresenteação.
IGUALMENTEAPRESENTOUACHAMADABBCONTRAALEGAÇÕES em suma tendo concluído pela improcedência do recurso da recorrente “A...”, pugnado pela manutenção do decidido pelo tribunal a quo, mantendo-se a sua absolvição do pedido.
Entre o mais, pugnou:
- pela improcedência da alteração pugnada quanto à redação conferida ao ponto 57 dos factos provados;
- e quanto à questão das “Declaraçõesinexatasnocontratodeseguroincidentesobreoveículoacidentado,porpartedatomadoradoseguroeintervenienteBB,aoníveldocondutorhabitual” alegou que a recorrente “nãocumpreminimamenteoónusprevistonoart.640ºdoCPC,umavezquenãoindicaosconcretospontosdefactoqueconsideramincorretamentejulgados.Assim,nãosevêcomopossamerecerprovimentooalegadoquantoaestaquestão,umavezquearecorridanemsequerconseguedescortinarcomopoderesponderaestaalegação,atentaanãoindicaçãodequepontodamatériadefactodeveriaseralterado.”;
- relativamente às razões subjacentes à aquisição da viatura por parte da interveniente BB [em causa os factos provados 83, 84, 88, 89, 90, 94, 95, 100, 102, 103, 104 e 109] alegando serem tais questões “absolutamenteirrelevantes,umavezqueaúnicaquestãoquepoderiaresolverodiferendoafavordarecorrenteseriaaprovadequearecorridanãoeraacondutorahabitualdoveículo.”, tendo resultado “inequivocamenteprovadoquearecorridaeraacondutorahabitualdaviatura,peloquetudooquemaissepodedizersetornairrelevante.”; Semprejuízodeconcluirpelaimprocedênciadapretensãodarecorrentetambémnestecampo;
- finalmente e sobre a questão da “Circulaçãodoveículoacidentadosemairbagsemfuncionamento,comoconhecimentodointervenienteCC” tendo tal matéria sido julgada não provada, pelo que também aqui não merece censura o decidido pelo tribunal a quo.
TAMBÉMOINTERVENIENTE“FUNDODEGARANTIAAUTOMÓVEL” APRESENTOUCONTRAALEGAÇÕES em suma tendo concluído pela improcedência do recurso da recorrente “A...”, pugnando pela manutenção do decidido pelo tribunal a quo, mantendo-se a sua absolvição do pedido.
APRESENTOUARÉ“A...”CONTRAALEGAÇÕES em suma tendo concluído pela improcedência do recurso do recorrente autor, quer quanto à alteração da decisão de facto por este pugnada, quer quanto à decisão de direito no sentido pelo mesmo pretendido. No mais dando por reproduzido o por si alegado no seu recurso.
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Os recursos foram admitidos como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
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II-Âmbitodorecurso.
Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pelos apelantes, serem questõesaapreciar: A)DorecursodaR.“A...”
i- erro na apreciação da prova e assim nadecisãodamatériadefacto. ii- erronaaplicaçãododireito. B)DorecursodoAutorAA”
i- erro na apreciação da prova e assim nadecisãodamatériadefacto. ii- erronaaplicaçãododireito.
Conhecendo.
Na reapreciação da decisão de facto, importa ter presente os seguintes pressupostos: 1- Estando em causa a impugnação da matéria de facto, obrigatoriamente e sob pena de rejeição deve o recorrente especificar (vide artigo 640º n.º 1 do CPC): “a)Osconcretospontosdefactoqueconsideraincorretamentejulgados; b)Osconcretosmeiosprobatórios,constantesdoprocessoouderegistoougravaçãonelerealizada,queimpunhamdecisãosobreospontosdamatériadefactoimpugnadosdiversadarecorrida;
por que pede a alteração ou anulação da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC - na certeza de que as conclusões têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC. Pelo que das conclusões é exigível que no mínimo das mesmas conste deforma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamentejulgados, sob pena de rejeição do mesmo.
Podendo os demais requisitos serem extraídos do corpo alegatório. Tratamento diverso merece o vício imputado à decisão de facto com base em eventual deficiência, obscuridade ou contradição da decisão proferida, que quando invocado e se procedente, ou mesmo conhecido oficiosamente, poderá implicar quando dos autos não constem todos os elementos necessários, a anulação da decisão de facto para suprimento de tais vícios ou ampliação da decisão de facto nos termos do artigo 662º nº 2 al. c) do CPC.
Estes últimos vícios não estão, como tal, sujeitos aos requisitos impugnativos prescritos no artigo 640º nº 1 do CPC “osquaissócondicionamaadmissibilidadedaimpugnaçãocomfundamentoemerrodejulgamentodosjuízosprobatóriosconcretamenteformulados”.
Requisitos impugnativos de admissibilidade da impugnação da decisão de facto com base em erro de julgamento que encontram o seu fundamento na garantia da “adequadainteligibilidadedoobjetoealcanceteleológicodapretensãorecursória,deformaaproporcionarocontraditórioesclarecidodacontraparteeacircunscreveroperímetrodoexercíciodopoderdecogniçãopelotribunalderecurso”.[1]
2- Na reapreciação da matéria de facto – vide nº 1 do artigo 662º do CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuserdiversa decisão.
Cabendo ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis.
Sem prejuízo de e quanto aos factos não objeto de impugnação, dever o tribunal de recurso sanar mesmo oficiosamente e quando para tal tenha todos os elementos, vícios de deficiência, obscuridade ou contradição da factualidade enunciada, tal como decorre do disposto no artigo 662º n.º 2 al. c) do CPC.
Assim e sem prejuízo das situações de conhecimento oficioso que impõem ao tribunal da Relação, perante a violação de normas imperativas, proceder a modificações na matéria de facto, estão estas dependentes da iniciativa da parte interessada tal como resulta deste citado artigo 640º do CPC.
Motivo por que e tal como refere António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, em anotação ao artigo 662º do CPC, p. 238 “àRelaçãonãoéexigidoque,demotupróprio,seconfrontecomageneralidadedosmeiosdeprovaqueestãosujeitosàlivreapreciaçãoeque,aoabrigodesseprincípio,foramvaloradospelotribunalde1ªinstância,paradelesextrair,comodesetratassedeumnovojulgamento,umadecisãointeiramentenova.Pelocontrário,asmodificaçõesaoperardevemrespeitaremprimeirolugaroqueorecorrente,noexercíciodoseudireitodeimpugnaçãodadecisãodefacto,indicounasrespetivasalegaçõesqueservemparacircunscreveroobjetodorecurso.Assimodeterminaoprincípiododispositivo(…)”.
Sobre a parte interessada na alteração da decisão de facto recai, portanto, o ónus de alegação e especificação dos concretos pontos de facto que pretende ver reapreciados; dos concretos meios de prova que impõem tal alteração e da decisão que a seu ver sobre os mesmos deve recair, sob pena de rejeição do recurso.
Tendo presente que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; relatórios periciais; depoimentos das testemunhas e declarações de parte [vide art.os 341º. a 396º. do Código Civil (C.C.) e 607.º, n.os 4 e 5 e ainda 466.º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) do C.P.C.], cabe ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis. Fazendo ainda [vide António S. Geraldes in ob. cit., em anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência]:
- uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova;
- ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância);
- levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável).
Por fim de realçar que embora não exigida na formação da convicção do julgador uma certeza absoluta, por via de regra não alcançável, quanto à ocorrência dos factos que aprecia, é necessário que da análise conjugada da prova produzida e da compatibilização da matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência (vide artigo 607º nº 4 do CPC) se forme no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade os factos em análise ocorreram.
Neste contexto e na dúvida acerca da realidade de um facto ou da repartição do ónus da prova, resolvendo o tribunal a mesma contra a parte à qual o facto aproveita, tal como decorre do disposto nos artigos 414º do CPC e 346º do C.C.. iii- Na medida em que os recursos visam, por via da modificação de decisão antes proferida reapreciar a pretensão dos recorrentes por forma a validar o juízo de existência ou inexistência do direito reclamado, temos de concluir que a reapreciação da matéria de facto está limitada ao efeito útil que da mesma possa provir para os autos, em função do objeto processual delineado pelas partes e assim já antes submetido a apreciação pelo tribunal a quo [vide neste sentido Acs. do TRG de 12/07/2016, nº de processo 59/12.8TBPCR.G1; e de 11/07/2017 nº de processo 5527/16.0T8GMR.G1 ambos in www.dgsi.pt/jtrg]. iv- Pelos mesmos motivos, temos igualmente de concluir que as questões novas antes não suscitadas nem apreciadas pelo tribunal a quo nos termos do artigo 608º nº 2 do CPC, não podem pelo tribunal de recurso ser consideradas, salvo se de conhecimento oficioso [vide, entre outros, Ac. TRC de 14/01/14, nº de processo 154/12.3TBMGR.C1; Ac. TRP de 16/10/2017, nº de processo 379/16.2T8PVZ.P1; Ac. TRG de 08/11/2018 nº de processo 212/16.5T8PTL.G1; Ac. TRP de 10/02/2020, nº de processo 22441/16.1T8PRT-A.P1, todos in www.dgsi.pt].
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Na medida em que ambos os recorrentes impugnam a decisão de facto, analisaremos a observância dos ónus de impugnação e especificação separadamente, em relação a cada um dos recursos interpostos, tendo presentes os considerandos supra.
E na medida em que seja admitida a impugnação aduzida, será apreciada a mesma igualmente de forma autónoma, mas seguida (já que a apreciação terá necessária influência na aplicação do direito).
Dorecursodaré“A...”.
Impugnaçãodadecisãodefacto.
Analisadas as conclusões do recurso da ré, bem como do corpo alegatório é possível das primeiras extrair quais os pontos da decisão de facto objeto de recurso, bem como a decisão que no seu entender deveria ter sido proferida.
Impugna a recorrente em concreto: i- a redação dada ao ponto57dosfactosprovados, em relação ao qual pugna seja a mesma alterada por forma a no seu proémio e onde consta: “57-Nodecursodessaaveriguação,queaqueleGabineteterminouem24deabrilde2017,edoutrasdiligênciasrealizadasposteriormentepelaré,foielaboradoumdocumentoondeconstaeseescreveuoseguinte:”
passe a constar:
- "57)Nodecursodessaaveriguação,queaqueleGabineteterminouem24deabrilde2017,edoutrasdiligênciasrealizadasposteriormentepelaré,foiapuradooseguinte:" [vide conclusões 2 a 7]:
Alega para tanto a recorrente que a sua defesa assentou essencialmente no que lhe foi possível apurar na averiguação que solicitou ao Gabinete de Peritagens denominado “B...” e assim no trabalho desenvolvido pelo perito averiguador e testemunha DD, cujo depoimento “foiprestadonasegundasessãodejulgamentorealizadaem15/12/2021dominuto00.00.01a02.10.17”.
Matéria que mais argumenta, se encontra “alegadanacontestação,imensosdosseusdocumentosforamjuntoscomessearticuladoeoprópriorelatóriodeaveriguaçãofoijuntoaosautos,arequerimentodoautor,apresentadonareferidasessãode15/12.”
Tendo o tribunal, «paraaprovadosváriosfactosquecontémo“facto57”, se apoiado “norelatórioelaboradoeapedidodaR.,juntoemsededeaudiênciadediscussãoejulgamento,intituladoRelatóriodeAveriguação...”–cfr.fundamentaçãodamatériadefactoparaarespostaconjuntaaosfactos56e57».
Mais tendo alegado que o tribunal a quo ponderou o depoimento do referido perito averiguador e testemunha DD.
Depoimento em relação ao qual a recorrente se limitou a indicar a referência da sua gravação pelo total período indicado de mais duas horas sem qualquer outra indicação ou referência quanto ao em concreto constante desse mesmo depoimento.
Claramente pretende a recorrente transformar o que foi a reprodução por parte do tribunal do teor do relatório elaborado numa multiplicidade de factos provados que na decisão recorrida não constam enquanto tal. Nomeadamente no que concerne à questão da existência dos airbags de passageiro e condutor. Questão que na fundamentação da decisão de facto o tribunal a quo, de forma clara e expressa, afirma não ter sido produzida prova cabal sobre tal assunto, incluindo menção ao depoimento da testemunha DD, sobre cujo depoimento afirma “prestavaserviçoparaaRealPeritosapedidodaR.A...,aqualtemtodointeresseemseeximiraopagamentodaindemnização”.
Após concluindo o tribunal a quo “Emsuma,hámuitasdúvidassobreaexistênciaounãodosairbagsequaiséqueexistiamounão.”
Da fundamentação da decisão de facto resulta pois claro não ter o tribunal a quo formado convicção positiva quanto à veracidade dos factos relatados no relatório que reproduziu.
E assim sendo, se era intenção da recorrente transformar todos os elementos constantes do relatório e reproduzidos no ponto 57 dos factos provados em matéria factual provada, teria que ter alegado e concretizado a prova que lhe permitiria obter tal alteração da decisão de facto.
E entendendo-se que o fez com o recurso ao depoimento da testemunha DD [e outra prova não foi sequer mencionada] impunha-se que justificasse tal alteração de forma concreta, observando nomeadamente o disposto no artigo 640º nº 2 al. a), indicando com exatidão as passagens do seu depoimento que imporiam decisão diversa.
O que não observou e é fundamento de imediata rejeição do recurso na respetiva parte. Concluindo, rejeita-se com fundamento no disposto no artigo 640º nº 2 al. a)e pela não observância do neste exigido quanto à prova produzida a reapreciaçãodeste ponto factual 57, cujo sentido é o da mera reprodução do teor do relatório aque se reporta.
ii- em segundo lugar pugna a recorrente pela alteração dos seguintes pontos factuais:“factosprovadosn.º13,14,79,85,86,87,91,92,93,96,97,98e110,eos factosnãoprovadosdasals.d)ee)” cujas alterações indica na conclusão 28 e que relaciona com a questão das declarações inexatas no contrato de seguro, nomeadamente sobre quem era o condutor habitual da viatura.
Convocou para tanto os depoimentos da própria interveniente BB; da testemunha DD e da testemunha EE, observando quanto aos mesmos o exigido no nº 2 al. a) do artigo 640º do CPC.
Acrescentando ser de desvalorizar os depoimentos das testemunhas da interveniente BB que vieram atestar ser esta quem conduzia o Jaguar, sem que quanto a estas tenha feito em concreto qualquer referência às concretas passagens da gravação.
De qualquer modo, entendem-se observados os ónus de impugnação e especificação quanto a estes pontos factuais [aos quais respeitam as conclusões 8 a 28]; iii- em terceiro lugar impugnou a recorrente os pontosfactuaisprovados“83,84,88,89,90,94,95,100,102,103,104e109,” cujas alterações indica na conclusão 44 e que relaciona com as alegadas razões da interveniente BB para adquirir a viatura [vide conclusões 29 a 44].
Convocou para tanto os depoimentos do interveniente CC bem como das testemunhas FF e HH - estas duas últimas quanto à situação financeira da BB, sem que quanto ao depoimento destas testemunhas tenha observado o disposto no artigo 640º nº 2 al. a) do CPC neste conspecto.
Convocou ainda o teor dos docs. juntos pela interveniente em 27/04/2018 para sobre estes tecer considerações desvalorizando o seu teor e a este ponto associado tendo convocado o depoimento da testemunha FF mencionando o minuto em que este afirmou ter a interveniente Fernanda outros veículos.
Com as condicionantes acima notada, quanto à convocação dos depoimentos das testemunhas FF e HH, será reapreciada a impugnação da decisão de facto; iv- em quarto lugar identificou a recorrente como “quartaalteraçãoaquidefendidarelativamenteàdecisãodefacto,temavercomacirculaçãodoveículoacidentadosemairbagsemfuncionamento,comoconhecimentodointervenienteCC.”- [a este ponto respeitam as conclusões 45 a 54].
Para este efeito convoca o recorrente [vide corpo alegatório] a matéria que “resultouprovada(…)extraídadofacto57”.
Após teceu considerações sobre a análise que o tribunal a quo efetuou sobre a questão dos airbags – análise em que o tribunal a quo analisou a credibilidade da testemunha DD para justificar a sua convicção – e sobre a qual a recorrente expressa o seu desacordo.
Para concluir (no corpo alegatório) reiterando que pelos motivos que aponta defendeu a alteração da redação dada ao ponto 57 dos factos provados – ponto cuja reapreciação foi rejeitada pelos motivos supra expostos.
Uma vez mais a recorrente não identifica qualquer trecho da gravação do depoimento da testemunha DD que convocou em observância do exigido pelo artigo 640º nº 2 al. a).
Convoca ainda prova documental cujo valor probatório é de livre apreciação e que como tal e dissociada da análise da prova testemunhal produzida e gravada não impõe decisão diversa fundada nomeadamente em violação de regras de direito probatório material (o que seria então caso de conhecimento oficioso).
A recorrente limita-se na verdade a reiterar, com os mesmos fundamentos, que seja dado como provado o que na sua perspetiva deveria constar como provado em 57 dos factos provados [o que se depreende do corpo alegatório].
Mas, mais uma vez, não observa o exigido pelo artigo 640º nº 2 al. a) do CPC, o que é motivo de rejeição da reapreciação pretendida.
Acresce que nas conclusões a recorrente tão pouco observa o exigido pelo artigo 640º nº 1 al. a) porquanto destas não resulta com clareza qual o ponto impugnado [apenas percetível no corpo alegatório] o que também seria fundamento da rejeição assinalada. Em conclusão, rejeita-se a reapreciação da factualidade mencionada em 4ºlugar, por não observados os ónus de impugnação e especificação nomeadamenteprevistos nos artigos 640º nº 1 al. a) e 640º nº 2 al. a). v- em quinto lugar impugnou a recorrente os pontosfactuaisnãoprovadosconstantesdasals.f)ep), cujas alterações indica na conclusão 64 e que relaciona com o não uso do cinto de segurança [vide conclusões 55 a 64].
Convocou para tanto o depoimento da testemunha KK associado a prova documental.
Consideram-se observados os ónus de impugnação e especificação sobre este ponto factual, pelo que será reapreciada esta matéria em conformidade. vi- em sexto lugar pugnou a recorrente pelo aditamento aos factos provados da existência de um acordo celebrado no âmbito de uma segunda providência cautelar apensa a estes autos como apenso D e valor recebido pelo autor ao abrigo de tal factualidade [à primeira providência respeita o apenso B descrito em 73 a 75 dos factos provados].
Convocou ainda o depoimento da testemunha MM [fazendo referência ao trecho da gravação] que confirmou o pagamento das duas quantias de € 6.000,00 perfazendo um total de € 12.000,00 ao abrigo dos acordos celebrados em tais procedimentos.
A matéria em causa por omissão, está validamente impugnada e será reapreciada em conformidade [vide conclusões 65 a 73];
vii- em sétimo e último lugar, questionou ainda a recorrente a redação dada aos pontos provados 42 e 55.
Propondo um esclarecimento da redação do ponto 42 por referência ao que consta provado em 40), associando os pontos 40 a 42 num só ponto factual, nos termos por si propostos.
Mais pugnando pela eliminação do último segmento do ponto 55 dos factos provados por conclusivo.
A redação destes pontos factuais será analisada na perspetiva invocada pela recorrente, ou seja, de em causa estar uma deficiência ou imprecisão [vide conclusões 74 a 79].
*
Consigna-se ter-se procedido à audição de toda a prova gravada. * Apreciando. a)daalteraçãodospontosfactuais“n.º13,14,79,85,86,87,91,92,93,96,97,98e110,eosfactosnãoprovadosdasals.d)ee)”.
Fundou a recorrente a alteração pugnada nos depoimentos das testemunhas DD, EE e da própria interveniente BB.
Os pontos factuais provados 13 e 14 e 97 e 98 respeitam à utilização do PI no concreto dia e momento da ocorrência do acidente pelo seu condutor CC. E na verdade são entre si contraditórios.
Em 13 e 14 foi julgado provado que o veículo naquelas circunstâncias de tempo e lugar era conduzido pelo CC por conta e no interesse da sua proprietária (13) que lho havia cedido por conta e no interesse da mesma (14).
E em 97, 98 e 110 foi julgado provado que a proprietária do veículo BB ficou perturbada quando soube do acidente ocorrido na medida em que no dia do acidente o CC estava a usar o veículo para fins pessoais, em contravenção às suas indicações, que (de acordo com os anteriores factos provados) lhe havia sido entregue para ser experimentado por um potencial interessado na aquisição da viatura.
Os demais pontos aqui impugnados respeitam precisamente ao motivo porque o PI estava na detenção do CC, nomeadamente aquando do acidente.
Começaremos por estes pontos.
E para tanto convocamos aqui os depoimentos das testemunhas FF, funcionário da interveniente Fernanda há 23 anos no escritório de contabilidade desta; GG, cozinheira e amiga da mesma interveniente e com quem chegou a trabalhar; HH, contabilista na empresa da interveniente há 20 anos; II, amigo da interveniente há mais de 30 anos e com quem costuma conviver, nomeadamente saindo junto com a sua esposa e o marido da primeira (os dois casais portanto) em convívio; e mesmo TT adquirente da viatura em causa à BB, após a ocorrência do sinistro.
Todas as testemunhas – com exceção da última que apenas confirmou ter comprado à Fernanda a viatura PI a quem pagou o valor acordado – confirmaram ter visto a BB com o veículo em questão, apresentando-se como sua dona e com ele circulando, manifestando até agrado na sua compra. Explicaram também que esta é uma mulher de negócios que quando vê uma boa oportunidade de ganhar dinheiro avança. Tendo sido nesse contexto que a testemunha HH referiu até que a compra do PI surgiu por parecer à interveniente um bom negócio. Igualmente tendo confirmado ter já conhecido à BB outros veículos, nomeadamente da marca BMW, Mercedes, Audi e VW – este um golf azul.
Testemunhas que depuseram com coerência, justificando pela larga relação com a interveniente, seja laboral seja de amizade, o conhecimento do caráter da mesma e a aquisição e utilização da viatura em causa.
Depoimentos que se compatibilizam com o que a própria afirmou, de ter decidido comprar o carro por gostar dele e lhe parecer um bom negócio, numa altura em que o CC referiu querer vender o carro por estar a precisar de dinheiro. Tal como se compatibiliza com a afirmação de entretanto ter decidido vender o carro – a testemunha GG mencionou que a BB chegou a estacionar o carro à frente do seu restaurante em Matosinhos H..., tendo dito entretanto que achava o carro muito comprido e por isso não gostava de o conduzir – e ao falar com o CC ter aceite que o mesmo tentasse encontrar comprador para o carro, permitindo que ele ganhasse algum dinheiro acima do valor que para si estabelecera de € 22.000,00.
Contexto em que lhe entregava o carro quando o mesmo dizia ter interessados que queriam ver o carro.
A versão assim apresentada, associada ao facto de a interveniente ter sido descrita como uma empresária séria e com condição económica desafogada; ao registo do carro em seu nome logo após a sua aquisição e a celebração do contrato de seguro também em conformidade conferem credibilidade aos factos julgados provados 85, 86, 87 e 91. Quantoaosfactosprovados92e93, não foi na verdade clarificado seja pelas testemunhas seja pela depoente BB, os dias ou por quanto tempo o veículo era entregue ao CC, pelo que estes factos devem transitar paraos factos não provados. Quantoaosfactosprovados96,97e98, igualmente não foi feita prova da exata data e momento em que o carro foi entregue ao CC, sem prejuízo de ter a BB afirmado a perturbação pelo conhecimento do acidente, bem como pela utilização do veículo fora do contexto em que fora entregue ao CC. O que aliás é um sentimento conforme às regras da experiência.
Nesta medida é de manter a redação dos pontos 97 e 98 dos factos provados. E igualmente o provadoem110)dosfactosprovados que é uma consequência do antes já apreciado.
No entanto o ponto96impõeumaretificação porquanto se desconhece a data em que fora entregue a viatura ao CC para os fins previstos e assim a ligação do ponto 95 ao 96 dos factos provados tem de ser eliminada.
Motivo por que se alteraaredaçãodadaaoponto96dosfactosprovados,paradomesmopassaraconstarapenas: “96-OCClevouocarronoâmbitodoacordomencionadoem90parauminteressadooexperimentareunicamenteparaessefim”.
Consequentemente asals.d)ee)dosfactosnãoprovados devem manter-se nos factos não provados, porquanto não foi produzida prova cabal que imponha decisão diversa.
O assim decidido, impõe ainda a alteraçãodaredaçãodadaaospontos13e14dosfactosprovados, porquanto nas circunstâncias de tempo e lugar em que ocorreu o acidente o CC conduzia o veículo para além das ordens, instruções ou autorização que a sua proprietária lhe dera[2].
Impondo assim a alteração destes pontos factuais por forma a se compatibilizarem com o que está julgado provado em 90, 91 e 96 a 98, passandoaconstarcomonãoprovadooponto13dosfactosprovados.
Epassandooponto14dosfactosprovadosateraseguinteredação: ”14)Oveículo“PI”haviasidocedidoaoseucondutornousoepoderesdedisposição dasuaproprietáriaparaosfinsindicadosem96)enoâmbitodoacordomencionadoem90)e91)dosfactosprovados.”
A recorrente pretendendo afastar a credibilidade destas testemunhas convocadas igualmente pelo tribunal a quo, convocou o depoimento das suas testemunhas DD e EE.
Estas testemunhas respetivamente perito da “B...” autor do relatório apresentado à R. e EE, profissional de seguros vieram em suma sustentar a versão da R., baseada no mencionado relatório aludido no ponto 57 dos factos provados. Na base das suspeitas está a apontada existência de 3 acidentes em que o condutor foi o CC.
Ocorre que no primeiro acidente este era efetivamente o proprietário do veículo e como tal nada de estranho há a apontar ser o mesmo o condutor da viatura à data do 1º acidente.
Nos 2º e 3º acidentes, ocorridos quando a interveniente Fernanda é já a proprietária da viatura, apresentou a mesma uma explicação julgada válida e que mereceu credibilidade para a condução da viatura por parte do CC.
Sendo que e quanto ao 2º acidente o mencionado CC alegou não ter tido no mesmo responsabilidade, questão que, diga-se na verdade, não releva para as suspeitas da R. seguradora quanto à falsidade de declarações que imputou à interveniente Fernanda. Fundada apenas no interesse do CC em obter um seguro mais barato para o veículo que continuaria a ser seu. Para o que teriam de comum acordo simulado uma venda e declarado falsamente ser o condutor habitual da viatura não o CC, mas antes a BB.
Como o tribunal a quo explicou, não se mostrou verosímil esta versão no contexto atrás já analisado, atendendo a que a nenhuma razão plausível foi apresentada para que a interveniente BB aceitasse participar em tal
esquema.
A que acresce o também exigido pagamento ao CC do valor que a este pagara pela viatura.
Por último de referir que o apontado desconhecimento por parte da BB de que a viatura em causa era de caixa automática não assume o relevo que a recorrente lhe pretende dar.
Sendo certo que inicialmente a recorrente afirmou ser o carro de mudanças manuais, a seguir e quando confrontada, corrigiu-o dizendo admitir o engano, o que justificou com o tempo já decorrido. Note-se que a viatura esteve na sua propriedade menos de um ano e foi por ela vendida já em 2016.
Sendo que conforme as suas testemunhas atestaram, foi proprietária de muitas outras viaturas. Neste contexto o erro, admitido, não afasta a demais argumentação acima já enunciada.
Em suma, para além das retificações ordenadas, nenhuma censura merece o juízo formulado pelo tribunal a quo quanto ao afastamento da versão apresentada pela R. recorrente; b)daalteraçãodospontosfactuais“83,84,88,89,90,94,95,100,102,103,104e109”.
Fundou a recorrente a alteração pugnada nos depoimentos do chamado CC e das testemunhas FF e HH.
Estas duas quanto à situação económica da BB, mas sem que tenha observado o disposto no artigo 640º nº 2 al. a).
Convocou ainda o teor dos documentos oferecidos com o requerimento de 27/04/2018 para os desvalorizar, bem como o depoimento da testemunha FF, para fazer notar que o mesmo mencionou ter a interveniente BB outros veículos.
Estes pontos factuais respeitam aos termos em que a aquisição da viatura foi negociada, bem como depois acordada a venda através do CC. Ainda os termos em que foi acordado o pagamento do valor do veículo após o sinistro à BB.
Alega a recorrente que os documentos oferecidos pela BB em 27/04/2018 demonstram, não o pagamento acordado entre a BB e o CC na sequência do estado em que o carro ficou após o sinistro (nos termos apurados em 100 a 104 dos factos provados) mas antes a existência de um empréstimo feito pela primeira ao segundo em que o carro serviu de garantia.
O que fundamenta precisamente na situação económica desafogada confirmada pelas testemunhas desta interveniente.
Salvo o devido respeito, nenhuma testemunha levantou sequer tal hipótese, muito menos sobre esta matéria foi produzida qualquer prova.
Ao invés, e como acima já notámos, por ser a BB uma mulher com apetência para o negócio, aceitou nos termos da prova que foi produzida adquirir o PI por um valor que entendeu apetecível e quando decidiu vender o mesmo, visou obter lucro com essa mesma venda.
Mais e quando viu o seu investimento destruído, como consequência do acidente ocorrido, pediu ao CC o pagamento do valor que havia investido – os mencionados € 19.000,00 que este pagou em prestações de mil euros, acrescido do valor da venda do veículo a que o CC acrescentou o remanescente para perfazer 3.000,00.
Isto foi o que precisamente afirmou CC no seu depoimento; corroborado pelo depoimento da BB que mencionou que o valor da venda foi “dois mil e muito” a que o CC acrescentou o restante para perfazer logo 3 mil euros. E está suportado quanto ao pagamento do valor acordado de € 19.000,00 nos documentos oferecidos com o requerimento de 27/04/2018, os quais correspondem a extratos da conta bancária da BB onde se identificam 13 transferências bancárias com a identificação expressa de CC ou CC o que perfaz € 13.000,00 (em jan/fev/março/maio/junho/agosto/set./outubro/nov e dez. de 2017 e jan/fev. e março de 2018).
A estes depósitos acresce o depósito de € 1.000,00 efetuado em novembro de 2016 conforme o demonstra o doc. 8 junto com este requerimento e que encontra confirmação no extrato oferecido pela interveniente com a mesma data e valor, mas com a identificação de DEP NUM/CHQ (…); sendo que no mês seguinte de dezembro de 2016 aparece igual depósito e com igual descrição o que se repete no mês de julho de 2017.
Pela cadência e valores em causa nestes dois últimos depósitos merece credibilidade a afirmação da BB de que a conta evidencia esses depósitos em consonância com a afirmação do CC de que tudo pagou.
No total, estes depósitos e transferências perfazem 16 mil euros, que se acrescidos aos iniciais € 3.000,00 provenientes da venda efetuada à testemunha TT que a confirmou [a declaração de venda encontra-se junta a fls. 365 a 367 como docs. 9 e 10, constando o valor de € 2.800,00 e não 2.700,00] e o demais acrescido pelo CC), perfazem os declarados € 19.000,00.
De referir que a testemunha TT mencionou que comprou à Fernanda o veículo a quem pagou o valor declarado de € 2.800,00 não sabendo já pormenores nomeadamente se pagou em numerário ou cheque. O que implica, em função desta prova a alteração da redação dada aos pontos 102 e 103, nos termos que infra se indica.
Em suma a prova produzida e que foi analisada pelo tribunal a quo conferem credibilidade à versão apurada e constante dos factos provados 83, 84, 88, 89, 90, 94, 100 e 104 a qual não merece qualquer censura.
De igual modo não merece censura a redação conferida ao ponto 109 dos factos provados.
A BB assim o afirmou e não se mostra credível que a mesma aceitasse adquirir uma viatura para com a mesma circular se soubesse que esta não oferecia garantias de segurança.
Quanto ao facto 95 o mesmo merece uma precisão: não foi produzida prova clara sobre a data em que apareceu um interessado para pagar o carro a pronto.
Nomeadamente se foi em agosto.
Como tal o ponto95dosfactosprovadospassaráateraseguinteredação:
“95 - Em data não apurada, surgiu um interessado para pagar a pronto o carro”.
Por outro lado, e quantoaospontos102e103,emfunçãodaprovadocumentalanalisadaedepoimentosprestadoseacimajáreferidos,osmesmospassarãoateraseguinteredação:
“102) Assim o carro foi vendido como salvado pelo valor de € 2.800,00 pagos pela testemunha TT”
“103) Tendo o CC acrescentado € 200,00 e assim considerado como pago a primeira prestação de € 3.000,00”.
Termos em que improcede a impugnação deduzida, sem prejuízo das alterações ordenadas. c)daalteraçãodospontosfactuaisf)ep)dosfactosnãoprovados.
Em causa a não utilização de cinto de segurança por parte do Autor no momento do acidente.
Alega o recorrente que houve adulteração dos relatórios completos de episódio de urgência respeitantes (no que ora releva), ao autor AA.
Para tanto invoca a certidão que no apenso C foi junta pelo CH ... da qual foi eliminada a menção para o autor de “Sem cinto de segurança”.
Mais alegando que o verdadeiro relatório é o que está junto com a certidão emitida em 15/12/2020 pelo DIAP e junta a estes autos (vide doc. de fls. 532 e segs.).
Analisados os autos e documentação oferecida constata-se o seguinte:
- junto com a p.i. o autor oferece entre outros documentos uma nota de alta do “INT FISIATRIA / HSA” datada de 11/01/2017 onde consta entre o mais e na descrição da história da doença atual
“(…)
Foi vítima de acidente de viação com politraumatismo grave no dia 04/09/2016 (ianolugardopassageirodeumcarro,semcintodesegurança[3]e sem disparo de airbag) …” (doc. 4 fls. 35 do processo físico);
- no relatório de alta da Misericórdia ..., datado de 17/05/2017 - doc. 5 junto a fls. 38 e segs. do processo físico, é de novo feita referência na história da doença atual “vítima de acidente de viação com politraumatismo grave no dia 04/09/2016 (lugardopassageirodecarro,semcintodesegurança[4]nem airbag).
Assim e destes documentos importa apenas realçar que o autor juntou aos autos documentos onde constava já a menção à inexistência de cinto de segurança.
O que se refere apenas para que fique claro que a imputação invocada pela recorrente em nada tem a ver com o autor.
Aliás e de acordo com a certidão junta pela recorrente aos autos em 06/01/2021, resulta que o próprio CH ... apresentou queixa crime pela adulteração de registos clínicos que nada tem a ver com os intervenientes nos autos.
Assim e no que releva para os autos é claro que no “Relatório completo de episódio de urgência” – M25, com a menção de data de admissão às 11.41 de 04/09/2016, elaborado pelo CH ..., consta na p. 1 do mesmo, no fim e sobre a indicação de “sala de emergência”
“Homem de 23 anos, vitima de acidente de viação (carro) ia no lugar de passageiro da frente, semcintodesegurança, sem disparo de airbags. Ficou encarcerado cerca de 1 hora.
(…)”.
Para a recorrente e na sua perspetiva tanto basta para que se julgue provado que o autor efetivamente circulava sem cinto de segurança.
Afirma esta “não bastaria o facto da informação estar lá aposta”. Salvo o devido respeito, não assiste razão à recorrente.
O relatório da urgência é nesta parte elaborado com base nas informações que o seu autor recebe.
Se essas informações são corretas, o mesmo desconhece. Não faz como tal prova plena a menção no relatório da urgência a tal realidade.
Precisamente por isso é necessária produzir prova sobre este facto e o ónus da sua demonstração recaía sobre a recorrente, tal como o tribunal a quo deu nota.
Dito isto, a recorrente convocou ainda em abono da sua pretensão o depoimento da testemunha KK. Médico do INEM que assistiu o A. no local e o acompanhou às urgências onde transmitiu as primeiras informações.
Em conformidade com o que – reconheceu – é preenchido o relatório inicial das urgências.
Esclareceu que a menção à existência ou não de cinto de segurança, bem como disparo de airbags é um parâmetro que analisam, porquanto é orientativo do tipo de lesões que podem estar em causa.
Dito isto afirmou não se recordar se o autor tinha ou não cinto de segurança; esclareceu que não foram a primeira equipa a chegar ao local, estando inclusive no local civis; a vítima (autor) teve de ser desencarcerado o que demorou; quando viu a vítima já não tem cinto, porque está desencarcerado e nessa medida afirmou não poder confirmar a informação de que o autor circulava sem cinto, à altura do acidente.
Acrescentou que as lesões que normalmente se associam a quem circula sem cinto são ao nível da articulação coxofemoral que tanto quanto se recorda não existiam (e efetivamente não constam identificadas) e traumatismo crânio encefálico – esse sim presente.
Mais disse que quem circula com cinto, normalmente é mais favorável apresentar traumatismos torácicos que o autor também apresentava.
E questionado se o autor apresentaria abrasão na pele do cinto afirmou não se recordar. Ainda que admitindo que se tivesse visto o transmitiria.
Atendendo às múltiplas e graves sequelas que o autor apresentava, afigura-se-nos que a menção a uma abrasão seria no caso pouco relevante.
Por outro lado, igualmente reconheceu ser possível levar cinto e ocorrer traumatismo craniano, da mesma forma que pode não haver cinto e ocorrer traumatismo torácico.
Esclarecendo que funcionam por probabilidades e em função do que verificam, estão mais atentos a uns ou outros sinais.
Valem estes considerandos para concluir que a recorrente não fez prova cabal de que o autor circulava sem cinto, já que o depoimento não foi seguro quanto a tal realidade.
Implicando, na ausência de outra prova e perante a identificação de lesões que permitem justificar a existência de cinto (dentro da regra das probabilidades mencionada pela testemunha – vide lesões torácicas associadas à ausência de lesões a nível da articulação coxofemoral) não merecer censura o julgamento do tribunal a quo quanto a este ponto, o qual não evidencia erro de julgamento que imponha decisão diversa.
Como acima deixamos assinalado, embora não exigida na formação da convicção do julgador uma certeza absoluta, por via de regra não alcançável, quanto à ocorrência dos factos que aprecia, é necessário que da análise conjugada da prova produzida e da compatibilização da matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência (vide artigo 607º nº 4 do CPC) se forme no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade os factos em análise ocorreram.
Sendo esta convicção que pelos motivos expostos não foi criada.
Termos em que se mantém a redação das als. f) e p) dos factos não provados. d)doaditamentoaosautosdaexistênciadeumacordocelebradonoâmbitodaprovidênciacautelarquecorreuseustermossoboapensoD.
Assiste toda a razão à recorrente nesta questão.
Os autos e seus apensos evidenciam a celebração do acordo.
O seu pagamento foi confirmado pela testemunha MM no seu depoimento, sem que tal tenha sido questionado.
Quanto ao ponto 42, alega a recorrente tão só que este facto está absolutamente limitado no tempo e reporta-se à alta hospitalar dada ao autor em maio de 2017, como decorre do facto 40. Pretendendo assim uma associação do ponto 40 em que ocorreu a alta hospitalar à necessidade de terceira pessoa.
Não assiste razão à recorrente na ilação que apresenta. Em causa estão momentos temporais diferentes.
O ponto 40 [sobre o qual infra nos pronunciaremos, por ser objeto do recurso do autor] e 41 relatam o momento da alta e a indicação para tratamento ambulatório [extraídos do alegado em 50º e 51º da p.i.].
O ponto 42 relata o momento presente. É o que resulta da sua redação, extraído por sua vez do alegado em 54º e 55º da p.i.
Se a recorrente entendia que o decidido neste ponto não estava conforme à prova produzida, deveria ter impugnado o mesmo em conformidade.
Não o fez, limitando-se a fazer uma interpretação que não tem suporte factual.
Termos em que se indefere a impugnação quanto a este ponto.
Em segundo lugar, pugnou a recorrente pela alteração da redação conferida ao ponto 55 dos factos provados.
O qual tem o seguinte teor: 55)AproprietáriadoJaguar,transferiuparaaRéaresponsabilidadecivilemergentedasuacirculação,atravésdeadequadocontratodesegurotituladopelaapólice ...,plenamenteválidaeeficazàqueladata,”
Pugna a recorrente pela eliminação do último segmento por ser conclusivo.
Embora esta seja uma fórmula habitual e consensual, atendendo a que a recorrente efetivamente questionou a validade do seguro – sendo a si que incumbia fazer a prova dos elementos que permitiriam concluir pela não validade ou vigência do seguro à data do sinistro – entende-se assistir razão na crítica apontada, por se tratar de matéria conclusiva o último segmento. Termosemquesedecideeliminaroúltimosegmentodesteponto55dosfactosprovadosqueassimpassaateraseguinteredação: “55)AproprietáriadoJaguar,transferiuparaaRéaresponsabilidadecivilemergentedasuacirculação,atravésdeadequadocontratodesegurotituladopelaapólice ...”.
* *
DorecursodoautorAA.Impugnaçãodadecisãodefacto.
Analisadas as conclusões do recurso do autor, bem como do corpo alegatório é possível das primeiras extrair quais os pontos da decisão de facto objeto de recurso, bem como a decisão que no seu entender deveria ter sido proferida.
Impugna o recorrente em concreto: i- os factos provados 11 e 48.
O recorrente pugna pela alteração da sua redação.
Invoca para a alteração do ponto 11º a existência de uma fotografia retirada do Google maps com referência ao ano de 2015.
E quanto ao ponto 48 invoca o relatório do “Dr. SS” (inserto nos autos físicos a fls. 587 v/588) - em causa o documento oferecido pelo recorrente autor com o seu requerimento 08/11/2011, intitulado “Relatório Pericial de Avaliação do Dano Corporal”. Documento este subscrito por “SS” que se identifica como “Especialista em Neurocirurgia / Perito de Medicina Legal / Ex-Perito contratado do INML / Perito de Avaliação do Dano Corporal”.
Mais convoca o depoimento das testemunhas OO; UU; QQ e declarações da Sra. Perita RR. Indicando as passagens da gravação que transcreveu e entendeu pertinentes.
Entendem-se observados os ónus de impugnação e especificação quanto a estes pontos factuais [aos quais respeitam as conclusões 1ª a 9ª]; ii- em segundo lugar impugnou o recorrente os pontosfactuais40e42,bemcomoaal.c)dosfactosnãoprovados.
Peticionou a retificação do ponto 40, para evitar uma associação errada aos pontos 41 e 42. E a retificação do ponto 42 para esclarecimento de que o mesmo se reporta ao momento atual / da decisão.
Convoca o depoimento das mesmas testemunhas antes identificadas.
As retificações/alterações serão alvo de apreciação, considerando-se cumpridos os ónus impugnatórios. [vide conclusões 10ª e 11ª] iii- em terceiro lugar pugnou o recorrente pela introdução nos factos provados do por si alegado em 80º a 83º da p.i., com fundamento nos mesmos depoimentos testemunhais que convocou, identificando os trechos da gravação, conjugando quanto ao ponto 83º o que consta dos relatórios médicos.
Apreciando. i-Factosprovados11e48.
Para o facto 11, em causa a velocidade permitida no local do acidente ao momento da sua ocorrência, invoca o recorrente o teor da fotografia que alega ter sido retirada do Google maps com referência ao ano de 2015.
Ora não só o acidente foi em 2016, como a existência da mencionada fotografia só por si não implica a veracidade da alteração ora pretendida, pois não faz prova plena do facto em causa.
Termos em que se julga improcedente esta pretendida alteração do ponto 11 [de que a al. a) dos factos não provados seria o contraponto].
Impugna em seguida o recorrente o ponto 48 dos factos provados – cuja redação aqui se reproduz [introduzindo a negrito as partes que o recorrente pugna sejam alteradas]:
“48)Deacordocomorelatóriomédico-legalesuasconclusões: Adatadaconsolidaçãomédico-legaldaslesõeséfixávelem25/03/2019;PeríododeDéficeFuncionalTemporárioTotalnumperíodode256dias;PeríododeDéficeFuncionalTemporárioParcialde677dias; PeríododeRepercussãoTemporárianaAtividadeProfissionalTotalde933dias;QuantumDolorisnograu6/7;DéficeFuncionalPermanentedaIntegridadeFísico-Psíquicade61pontos; Assequelassão,emtermosdeRepercussãoPermanentenaAtividadeProfissional,impeditivasdoexercíciodaatividadeprofissionalhabitual,cortadordecarnesverdes,podendoser,noentanto,compatíveiscomoutrasprofissõesdaáreadasuapreparaçãotécnicoprofissional,quenãoexijamaexecuçãodetarefascomplexas; Danoestéticopermanentenograu4/7; RepercussãoPermanentenasatividadesdesportivasedelazernograu3/7;Repercussãopermanentenaatividadesexualnograu4/7; Ajudastécnicaspermanentes,medicamentosas,tratamentosmédicos,ajudastécnicas,ajudadeterceirapessoa.”
Pugnando que ao mesmo seja conferida uma nova redação, do seguinte teor: “48)Deacordocomorelatóriomédico-legalesuasconclusões:Adatada consolidaçãomédico-legaldaslesõeséfixávelem25/03/2019;PeríododeDéficeFuncionalTemporárioTotalnumperíodode256dias;PeríododeDéficeFuncionalTemporárioParcialde677dias;PeríododeRepercussãoTemporárianaAtividadeProfissionalTotalde933dias;QuantumDolorisnograu6/7;DéficeFuncionalPermanentedaIntegridadeFísico-Psíquicade61pontos;Assequelassão,emtermosdeRepercussãoPermanentenaAtividadeProfissional,impeditivasdoexercíciodetodaequalquerprofissãoexcetoemempregosdefavor,IPSSou,eventualmente,organismosdoestadonecessitando,sempre,desupervisãoe incentivo;Danoestéticopermanentenograu4/7;RepercussãoPermanentenasatividadesdesportivasedelazernograu4/7;Repercussãopermanentenaatividadesexualnograu4/7;Ajudastécnicaspermanentes,medicamentosas,tratamentosmédicos,ajudastécnicas,ajudadeterceirapessoa.”
Como se percebe, o desacordo do recorrente respeita de um lado ao grau de repercussão nas atividades desportivas e de lazer, cujo grau foi fixado em 3/7 e o recorrente pugna seja fixado antes em 4/7.
De outro lado à repercussão permanente na atividade profissional, que defende deverá ser considerada para toda e qualquer profissão excetuando “empregosdefavor,IPSSou,eventualmente,organismosdoestadonecessitando,sempre,desupervisãoeincentivo” ao invés do julgado provado pelo tribunal a quo, de acordo com o relatório do INML que considerou serem as sequelas impeditivas do exercício do atividade profissional habitual, podendo no entanto ser compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional que não exijam atividades complexas.
O grande suporte da alteração pretendida pelo recorrente é o relatório que fez juntar aos autos em 08/11/2021, datado de 02/11/2021 e subscrito pelo Dr. SS. Juntamente com o pedido de ampliação do pedido formulado pelo recorrente.
Relatório que a R. A... e o interveniente FGA impugnaram em sede de exercício do contraditório na medida em que seja contraditório com relatório final da perícia médico-legal.
O autor do relatório em causa não foi ouvido em audiência.
As testemunhas OO e UU mãe e irmã do autor vieram em suma dizer que seu filho/irmão está totalmente incapaz para o exercício de qualquer profissão. De fazer seja o que for.
Mas este seu depoimento para além de evidenciar incapacidade de distanciamento pela sua proximidade com o lesado, foi até contrariado pelo depoimento da testemunha QQ, o qual mencionou que o A. chegou a ajudar numa casa de frutas carregando e descarregando caixas, pelo que lhe pagavam 5 euros por dia [desconhece-se por quantas horas]. Não tendo continuado pelas dificuldades em chegar ao local de trabalho, pois era distante e não ia sem companhia.
Pelo que se tem de concluir, no caminho seguido pelo relatório do INML, pela capacidade para exercer funções simples.
De modo algum se pretende menorizar as limitações e dificuldades notórias de que o A. ficou a padecer, tanto que a Sra. Perita que elaborou o relatório do INML concluiu estar o mesmo totalmente incapacitado para o exercício da sua atividadeprofissional habitual.
Apenas concluiu igualmente que essa incapacidade não era para toda e qualquer profissão pelo que e aproveitando os seus conhecimentos adquiridos naquela profissão poderia exercer outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnico-profissional, acrescentando ainda, que não exijam execução detarefas complexas.
E isso mesmo reafirmou nos seus esclarecimentos. Quando questionada que outras atividades poderia fazer dentro da sua área-profissional reconheceu não ser da área laboral e assim não conseguir identificar outras tarefas concretas dentro da mesma área profissional. Esclarecendo que avaliou a perda do autor, ou seja, do que deixou de poder fazer. E tal não retira credibilidade ao seu depoimento, nem tão pouco às suas conclusões.
Note-se aliás que as partes quando notificadas do relatório pericial nenhum esclarecimento pediram sobre o mesmo, assim aceitando o seu teor.
E o que é afirmado é que o autor poderá exercer outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnico profissional, não que seja exatamente ou necessariamente na mesma área. Anotando ainda a limitação de serem tarefas que não exijam execução complexa.
Ou seja, as conclusões do relatório nesta parte não merecem censura.
E a alteração pretendida, baseada substancialmente no teor do outro relatório oferecido, mas cujo teor foi impugnado e não foi sequer sustentado em sede de audiência de julgamento pelo seu autor, não merece procedência.
No que se inclui a alteração também pretendida quanto ao grau de afetação para as atividades desportivas e de lazer, por não feita prova cabal de que deverá ser tal de grau superior ao confirmado pela Sra. Perita nos seus esclarecimentos.
Em suma, improcede a pretendida alteração quanto ao ponto 48 dos factos provados. ii-Factosprovados40e42,bemcomoaal.c)dosfactosnãoprovados. Peticionou o recorrente a retificação do ponto 40, para evitar uma associação
errada aos pontos 41 e 42.
Para tanto peticionando que seja introduzido neste ponto o quadro por si indicado em 50º da p.i., de onde provém este ponto factual.
É evidente que o ponto 40, na sua redação se encontra incompleto porquanto remete para um quadro que no mesmo não consta.
Padece este ponto factual de um manifesto lapso que importa retificar.
Como resulta da fundamentação da decisão de facto, este ponto factual foi julgado provado com base no teor do doc. 5.
Doc 5 do qual se retira o quadro que o autor reproduziu no artigo 50º da p.i. e do qual se resultou provado o facto em questão.
Como tal o ponto 40 dos factos provados passará a ter a seguinte redação: “40) Aquando da alta (maio de 2017) era o seguinte o seu quadro:
Medida de Independência Funcional (MIF)
ENTRADA (<72H)
OBJETIVO
ALTA (<48H)
Autocuidados
Alimentação
6
7
7
Higiene pessoal
5
7
5
Banho
5
7
5
Vestir metade superior
5
7
5
Vestir metade inferior
5
7
5
Utilização da sanita
5
7
5
Controlo de esfíncteres
Bexiga
5
6
7
Intestino
1
6
6
Transferências
Leito/Cadeira/CR
4
7
7
Sanita
4
7
5
Banheira/Duche
4
7
5
locomoção
Marcha/CR ( M )
4
6
5
Escadas
4
6
6
TOTAL MOTOR (91)
51
87
73
Comunicação
Compreensão
6
6
6
Expressão
6
6
6
Consciência do mundo exterior
Interação Social
4
6
5
Resolução dos problemas
3
5
4
Memória
2
5
2
TOTAL COGNITIVO (35)
21
28
23
TOTAL (126)
72
115
96
Em segundo lugar o recorrente pugnou pela alteração da redação do ponto 42, para esclarecimento de que o mesmo se reporta ao momento atual / da decisão.
Tal como acima já deixámos enunciado a propósito da impugnação da recorrente R., não há dúvidas que o ponto 42) dos factos provados se reporta à situação atual do autor.
Pelo que e por desnecessário, nada há a alterar. Quantoàal.c)dosfactosnãoprovados.
Por inerência da improcedência da alteração do ponto 48 dos factos provados e pelos motivos nele expostos, improcede a alteração pretendida desta al. que representa o contraponto do que o recorrente pretendia ver alterado no ponto 48 dos factos provados. iii- em terceiro lugar pugnou o recorrente pela introdução nos factos provados do por si alegado em 80º a 83º da p.i., com fundamento nos mesmos depoimentos testemunhais que convocou, identificando os trechos da gravação, conjugando quanto ao ponto 83º o que consta dos relatórios médicos.
Ora no que a estes pontos factuais respeita, está em causa a seguinte alegação: “80 Sendoquepretendiaseguiracarreiramilitar.81 AliásaquandodavindaàEuropa,acimareferida,oAutortinhacomoobjetivodeslocar-seàsededaLegiãoFrancesaparaverificarosrequisitosecondiçõesdeingressonamesma, 82 Poisesseeraoseusonhoeprojetodevida,83 Projetoquejamaissepoderáconcretizarporforçadosinistroemapreçonospresentesautos.”
Justifica o recorrente esta alteração com fundamento na indemnização dos danos patrimoniais futuros que alega, em conformidade com o assim alegado, implicará ser considerado no seu cálculo o rendimento que ali viria a auferir de € 1.200,00 mensais.
Salvo o devido respeito desta ambição ou sonho não resulta que o A. viesse a ter condições de ingressar na mencionada Legião Estrangeira.
Muito menos quanto viria a auferir em tal caso.
Pelo que se revela inócuo para os autos a introdução nos factos provados de tal factualidade.
Pelo que assim se julga improcedente esta pretensão.
Procede assim parcialmente a impugnação apresentada, nos termos acima assinalados.
No mais se mantendo a decisão de facto.
*
*
Dodireito.
A impugnação em sede de direito será reapreciada em conjunto, quanto às pretensões dos recorrentes A. e R. A..., na medida em que em causa estejam os valores indemnizatórios arbitrados.
No recurso da R. A... questionou a mesma em primeiro lugar o decidido quanto à validade do seguro fundado em declarações inexatas.
Em causa as declarações falsas que a mesma imputou à segurada e interveniente BB quanto à declaração de ser a habitual condutora do PI. Como é evidente a sua pretensão estava nesta parte totalmente dependente
da alteração da decisão de facto que foi julgada improcedente.
Estando provado que a BB era a condutora habitual do PI durante o período em que efetivamente este esteve registado em seu nome e seguro na R., claramente improcede toda a argumentação deduzida pela recorrente e fundada nas supostas falsas declarações por referência ao previsto no artigo 25º do DL 72/2008, ao abrigo do qual pretendia ver anulado o seguro.
Pretensão que assim improcede.
Em segundo lugar peticiona a recorrente que seja considerado ter o autor contribuído para a produção dos danos, numa percentagem que indicou de 15% ao abrigo do artigo 570º do CC, fundado no por si alegado não uso de cinto de segurança.
Também esta pretensão estava claramente dependente da alteração da decisão de facto, no que respeita a este ponto factual que foi julgado não provado e assim mantido.
Motivo por que tem de improceder, sem mais esta pretensão.
Sendo que também quanto à questão dos airbags, nenhuma alteração foi produzida, sem prejuízo de como a recorrente mencionou, relevar tal para efeitos de direito de regresso, pelo que neste campo nada mais se nos oferece dizer.
Seguidamente, manifestou a recorrente o seu desacordo quanto aos valores indemnizatórios fixados ao autor seja a título de danos não patrimoniais, seja a nível do dano patrimonial futuro.
No 1º caso o tribunal a quo arbitrou o montante de € 125.000,00. Pugnando a recorrente pela fixação de tal valor em € 75.000,00, No 2º caso, arbitrou o tribunal a quo o montante de € 237.215,58.
Defendendo a recorrente que tal valor, levando em consideração o valor do salário mínimo nacional, deverá ser fixado entre os € 210.000,00 e os € 220.000,00.
O recorrente autor pugna por sua vez, igualmente pela alteração dos valores indemnizatórios arbitrados.
Defendendo que a título de danos não patrimoniais, o valor a fixar deverá ser de € 175.000,00.
E a título de dano patrimonial futuro, pugnando pela sua fixação em pelo menos € 400.000,00. Considerando para tanto e entre o mais, a esperança média de vida de 78 anos para os homens e um salário que poderia vir a auferir de € 1.200,00 mês numa carreira militar [como mencionámos a propósito da reapreciação da decisão de facto, o autor nunca alegou este salário].
Neste ponto do recurso, porque comum a ambos os recorrentes será reapreciado o decidido em conjunto.
Dosdanosnãopatrimoniais.
Sendo indiscutido o direito à sua indemnização pela gravidade dos danos apurados, resta aferir se o valor arbitrado pelo tribunal merece censura.
Para tanto recordando, o reiterado entendimento jurisprudencial de que a fixação de um quantum indemnizatório em que se recorre a juízos de equidade como é o caso do dano não patrimonial, porque assente na ponderação das circunstâncias apuradas e relevantes de cada caso concreto e não em razões estritamente normativas, apenas deverá ser alterado quando evidencie desrespeito pelas normas que justificam o recurso à equidade ou se mostre em flagrante divergência com os padrões jurisprudenciais sedimentados e aplicados em casos similares.
Assim foi decidido no Ac. do STJ de 04/06/2015, nº de processo 1166/10.7TBVCD.P1.S1; reafirmado no Ac. STJ de 22/02/2017, nº de processo 5808/12.1TBALM.L1.S1, bem como no mais recente Ac. do STJ de 15/09/2022, nº de processo 2374/20.8T8PNF.P1.S1; tal como no já antes citado Ac. do STJ de 17/12/2019, todos in www.dgsi.pt/jstj,onde se conclui (invocando ainda decisões anteriores do mesmo STJ) “Eporqueumtal«juízodeequidade»dasinstâncias,alicerçado,nãonaaplicaçãodeumestritocritérionormativo,masnaponderaçãodasparticularidadeseespecificidadesdocasoconcreto,nãointegra,embomrigor,aresoluçãodeuma«questãodedireito»,tem-sedefendido,designadamentenosAcórdãosdoSTJ,de05.11.2009(proc.381/2009.S1)de20.05.2010(proc.103/2002.L1.S1),de28.10.2010(proc.272/06.7TBMTR.P1.S1),de07.10.2010(proc.457.9TCGMR.G1.S1)ede25.05.2017(proc.868/10.2TBALR.E1.S1)[21],que«taljuízoprudencialecasuísticodasinstânciasdeverá,emprincípio,sermantido,salvoseojulgadorsenãotivercontidodentrodamargemdediscricionariedadeconsentidapelanormaquelegitimaorecursoàequidade–muitoemparticular,seocritérioadotadoseafastar,demodosubstancialeinjustificado,doscritériosoupadrõesquegeneralizadamenteseentendedeveremseradotados,numajurisprudênciaevolutivaeatualística,abalando,emconsequência,asegurançanaaplicaçãododireito,decorrentedanecessidadeadoçãodecritériosjurisprudenciaisminimamenteuniformizados,e,emúltimaanálise,oprincípiodaigualdade».
Motivo por que, prossegue o Ac. em citação, em sede de recurso visando o valor indemnizatório arbitrado, “importaessencialmenteverificar(…)seoscritériosseguidosequeestãonabasedetaisvaloresindemnizatóriossãopassíveisdesergeneralizadosparatodososcasosanálogos–muitoemparticular,seosvaloresarbitradosseharmonizamcomoscritériosoupadrõesque,numajurisprudênciaatualista,devemsendoseguidosemsituaçõesanálogasouequiparáveis–emsituaçãoemqueestamos confrontadoscomgravosasincapacidadesqueafetam,deformasensíveleirremediável,opadrãoeaqualidadedevidadelesados».”
Na ponderação da quantificação deste dano não patrimonial, levou o tribunal a quo em consideração os seguintes pontos factuais: “-ComoconsequênciadiretaenecessáriadosinistrooAutorficouencarcerado,inconsciente,politraumatizado,comhemorragiadigestiva,efisemasubcutâneodireito; -Aindanolocal,aequipadaemergênciamédicadoHospital ...,sedou-o,entubou-oecolocou-oemsuporteventilatóriomecânico. -AochegaraoHospital ...foidiagnosticadoaoAutorpolitraumacomtraumatismocranianograve,hematomaperi-orbitráriodireitocompupilaipsilateralmidriáticaenãoreativa,hemorragianasaledaorofaringeimportante. -Permaneceunoscuidadosintensivosaté23desetembrode2016,sendodepoistransferidoparaoserviçodeTCE,ondelheveioaserretiradaacânuladetraqueostomia. -A6deoutubrode2016foioAutorsubmetidoacraniotomiafrontalbilateralcomdrenagemdepneumocefaloeplastiadoandaranteriorporfistulatraumática. -Desenvolveuhematomaepiduralpóscraniotomiapeloque,a12deoutubrode2016,foinovamentesubmetidoacirurgiacomreaberturadecraniotomiaedrenagemdehematoma. -Desenvolveuduranteointernamentopneumoniadeaspiraçãobilateralepneumoniaassociadaaventilaçãoinvasiva,comisolamentopseudomonasMSSR -Osdéficescognitivosdequeficouapadecererammuitíssimosignificativos,osquaisemboratenhammelhorado,persistemnapresentedata. -QuantumDolorisnograu6/7; -DéficeFuncionalPermanentedaIntegridadeFísico-Psíquicade61pontos;-Danoestéticopermanentenograu4/7; -RepercussãoPermanentenasatividadesdesportivasedelazernograu3/7;-Repercussãopermanentenaatividadesexualnograu4/7;”
A estes elementos acrescentamos (todos extraídos dos factos provados): -nolocaldoacidenteoA.foiestabilizadopelosbombeiros,comcolarcervical,colete deextração,tubodeguedel,administraram-lheO2,aspiraram-noquatrovezes,atéentubaçãoendotraqueal,devidoahemorragiainterna,tendo-lhesidocolocadocintoaranhademodoapossibilitaroseutransporte,doc.3. -aochegaraoHSAforam-lheidentificadososseguintestraumas: a)Inúmerosfocosdecontusãohemorrágicosemambososhemisférioscerebrais.Hematomasextra-axiaiscomcercade7,2mmdeespessuramáximadeformandoos lobosadjacentes.Apagamentogeneralizadodossulcosedascisternasdabasecomasamígdalascerebelosasaafloraroplanodoburacomagno;nãosedefiniaoIIIventríloco. b)Nafacetraçosdefraturanosossosdomaciçofacial,seiosmaxilares,esfeinodal,frontais,paredesdasorbitasenosossosprópriosdonariz;fraturanavertenteposteriordocanalóticoesquerdo,naapófisezigomáticadireitaegrandeasaesfenoidedireita. c)Notórax,provávelfraturanãodescoaptadadomanúbrioexternal;fraturadeváriosarcoscostaisbilateralmenteefraturadaasadaomoplatadireita. -A21desetembrofoisubmetidoatraqueostomiacirúrgicaparaproteçãodaviaaérea. -Padeceuaindadepneumoniadeaspiração,celulitedoMSD, -A15denovembrode2016foitransferidoparaoserviçodefisiatriadoHospital ...,paratratamentofisiátricointensivo. -Àentradanesteserviço,oAutormostrava-sedesorientadonotempoenoespaçoenecessitavadeauxílioparasealimentar,vestirecuidardasuahigiene. -Naqueleserviçofez,entreoutros,terapiadafalaefisiatria. -Quantoàlesãoocular,oserviçodeoftalmologiadoHospital,deuindicaçãoparaseaguardarentre6a8mesesesódepoisavaliaraintervençãocirúrgicaaefetuar. -ÉtransferidoparaoCentro de Reabilitação ...em11dejaneirode2017,apresentandoàchegadaaestainstituição(documento5): a)Suspeitadealteraçõescognitivasmúltiplasb)Disartriaflácidaligeira, c)Discretaalteraçãonaprovadedo-narizàdireita,provavelmenteporfaltadevisão,jáqueoRequerentenãovia,nemvêcomoolhodireito,emconsequênciadosinistro; d)Caminhavamascombaixadissociaçãodascinturaseinstabilidadepélvicaàdireita,tendonecessidadederecorrerabastão, -NaqueleCentrorealizouprogramadereabilitaçãointegraleabrangente,emesquemabidiáriomultimodal(fisioterapia,terapiadafala,enfermagemdereabilitaçãoereabilitaçãocognitiva). -OAutorapresentava,entreoutros: a)Discursotendencialmenteorganizadomasporvezesdescontextualizadoecomincongruênciastemporais; b)Reconheciaqueteveumacidenteautomóvelmasnãotinha,comoaindanãotem,memóriadomesmo; c)Reconheciaasalteraçõesmotorasmasnãoasalteraçõesneuropsicológicas,nãotendoconsciênciadetaldéfice. -Reavaliadoummêsaposointernamento,verificou-sequemantinhaumfuncionamentodamemóriadetrabalhoinferior,tendoatéumaligeiradiminuição,revelandoaindaumIVPmuitoinferior. -Aquandodaaltajánãonecessitavadeauxiliaresdemarchamascareciadesupervisãopormanterdesorientaçãoespacial. -Conseguiasubirumlançodeescadassemapoionocorrimãomassemtotalsegurança, -Tinhaautonomiaparaamaiorpartedasatividadesdavidadiáriamasnecessitavaeaindanecessitadesupervisãoparaasatividadesdavidadiáriainstrumentadas. -estevetotalmenteincapacitado,noperíodocompreendidoentreadatadosinistroeadatadaalta(17/05/2017), -Aslesõessofridasprovocaram-lhedoresfísicasmuitointensas,tantonomomentodoacidente,comonodecursodostratamentos. -Eassequelasdequeficouapadecerdefinitivamentecontinuamaprovocar-lhedoresfísicas,incómodoemal-estar,queovãoacompanhardurantetodaavidae,sobretudo,provocam-lheumprofundosentimentodedesgosto. -antesdosinistro, oA.eraumjovemsaudável,fisicamentebemconstituído,dinâmicoetrabalhador;quegostavadesaircomamigos,irabares,caféseginásiosepraticaratividadesfísicas,emespecialdesportosaoarlivre. -tendonascidoem.../.../1993,peloqueàdatadoacidenteeraumjovemde23anosdeidade.
Os factos provados e acima elencados evidenciam a imensa gravidade das lesões sofridas pelo autor e a prolongadíssima recuperação – até à consolidação médico-legal das lesões decorreram sensivelmente dois anos e meio. Denotando o inerente sofrimento suportado quer durante a recuperação – fixado o quantum doloris no grau 6 de uma escala de 7 – quer para o resto da vida pelas dores físicas, incómodo e mal-estar que as sequelas lhe provocam e que o acompanharão para o resto da vida.
Vida de que o autor se viu subitamente subtraído de poder viver com a normalidade de um jovem da sua idade e quando ainda tinha em aberto todas as possibilidades, atendendo à sua juventude e capacidade física e dinamismo (vide fp 53).
“Nãofornecendoaleicritériosnormativosconcretosquefixemoseumontanteindemnizatórioedadaaconsabidadificuldadeemofazer,olegisladorfez,porisso,assentarasuaquantificaçãoatravés do recurso à equidade(cfr.artºs.496º,nº.4,e494º,566º,nº.3,e4º),constituindo,porém,entendimentoprevalecente,quesedeveráatenderparaoefeito,nomeadamente,aograudeculpabilidadedoresponsável,àsuasituaçãoeconómicaeàdolesado,devendoserproporcionalàgravidadedodanoetomandoemcontanasuafixaçãotodasasregrasdajustamedidadascoisasedecriteriosaponderaçãodasrealidadesdavida, esemperderdevistaapeculiaridadedequeserevesteocasoconcreto(vide,portodos,osprofs.PiresLimaeAntunesVarela,in“Ob.cit.,págs.473/474”,eAcs.doSTJde17/12/2019,proc.2224/17.2T8BRG.G1.S1,de17/12/2019,proc.480/1.TBMMV.C1.S2,de02/12/2013, proc. 1110/07.9TVLSB.L1.S1, e de 02/06/2016, proc.6244/13.8TBVNG.P1.S1,disponíveisindgsi.pt). ComoescreveMariaVeloso(in“Danosnãopatrimoniais”,Comemoraçõesdos35anosdoCódigoCivil,Vol.III,DireitoDasObrigações,pág.542”),nessecálculoanaturezaeaintensidadedaslesõesdevemservircomo“factor-basedaponderação”. Danosessesque,comoseextraidoexposto,devemsercondignamentecompensados,como,aliás,vemsendoaafirmadonestemaisaltotribunal,ecujoentendimentovem,sobretudonosúltimostempos,grassando,numaespiralcrescente,nosnossostribunais.”[5]
Levando em consideração, tal como assinalado na decisão acima citada, sem que se possa olvidar que infelizmente situações mais gravosas existem – como é o caso relatado no Ac. STJ de 21/06/2022 acima citado no qual foi atribuída uma indemnização por danos não patrimoniais de € 500.000,00 - a total ausência de culpa do autor na produção do acidente que à data do acidente era um jovem de 23 anos de idade; a sua modesta condição económica atendendo a que então não trabalhava e quando o fazia auxiliava a família, o que demonstra também a sua modesta condição económica; a imensa gravidade das lesões sofridas pelo autor que implicaram um défice funcional permanente de 61 pontos e a prolongadíssima recuperação – até à consolidação médico-legal das lesões decorreram sensivelmente dois anos e meio; o quantum doloris fixado no grau 6 de uma escala de 7 , a permanência para o resto da vida das dores físicas, incómodo e mal estar que as sequelas lhe provocam e que o acompanharão para o resto da vida, entende-se ser de arbitrar a tal título o valor de € 175.000,00 pecando por defeito o valor fixado pelo tribunal a quo em € 125.000,00.
Com efeito, não só o valor pugnado pela recorrente peca em muito por defeito, considerando os valores seguidos para casos similares[6], como também o valor arbitrado pelo tribunal a quo se nos afigura afastar dos mesmos padrões jurisprudenciais sedimentados e aplicados a casos similares[7]. Justificandoafixaçãodaindemnizaçãopelosdanosnãopatrimoniaisnopeticionadovalordorecorrentede€175.000,00.
Dodanopatrimonialfuturo.
Como já supra referido, a este título o tribunal a quo arbitrou o montante de € 237.215,58.
Defendendo a recorrente R. que tal valor, levando em consideração o valor do salário mínimo nacional, deverá ser fixado entre os € 210.000,00 e os € 220.000,00.
E defendendo o recorrente autor que tal valor deverá ser fixo em pelo menos € 400.000,00. Considerando para tanto e entre o mais, a esperança média de vida de 78 anos para os homens e um salário que poderia vir a auferir de € 1.200,00 mês numa carreira militar – carreira sobre a qual e como mencionámos a propósito da reapreciação da decisão de facto, o autor nuca alegou implicar este salário. Aliás tendo na p.i. mencionado o que seria o seu salário de € 591,00 – vide 87º da p.i.. Embora contabilizando o valor final peticionado a este título nos já mencionados € 400.000,00.
Também no apuramento deste valor há que recorrer a critérios de equidade, sendo como tal no seu cálculo aplicável as regras acima já aludidas sobre os termos em que merecem censura os valores arbitrados.
No cálculo efetuado pelo tribunal a quo, foram considerados os seguintes factos: “-OAutor,porforçadosinistro,aindaestáabsolutamenteincapazdeproveraoseusustento,necessitandodoauxíliodeterceirapessoaemespecialparasedeslocarnoexterior,nãosaindodecasasozinhoporseincapazdeseorientar. -Antesdosinistro,oAutortrabalhavanumsupermercado,nasecçãodetalho,ondeauferiaaquantiamensalde2200reais,oequivalente,sensivelmente,a€591,00. -ApesardostratamentosaquesesubmeteuoAutorficouapadecerdefinitivamente:-Déficefuncionalpermanenteaoníveldacomunicação, -Déficedecompreensão, -Dificuldadesdelocomoção, -Déficeaoníveldacompreensãodomundoexterior,-Déficesdememória, -Amnésiarelativamenteàépocaemqueocorreuosinistro, -Dificuldades/déficeaoníveldaorientaçãoespaço-temporal; -Perdadevisão -Deformidadedoolhoesquerdo. -DéficeFuncionalPermanentedaIntegridadeFísico-Psíquicade61pontos; -Assequelassão,emtermosdeRepercussãoPermanentenaAtividadeProfissional,impeditivasdoexercíciodaatividadeprofissionalhabitual,cortadordecarnesverdes,podendoser,noentanto,compatíveiscomoutrasprofissõesdaáreadasuapreparaçãotécnicoprofissional,quenãoexijamaexecuçãodetarefascomplexas; -OA.nasceuem.../.../1993.”
E conjugando o “Défice Funcional Permanente de 61 pontos de que ficou a padecer, conjugado com o vencimento auferido pelo A. (€591,00), bem como o período provável de vida ativa até aos 70 anos de idade, isto é, 47 anos de vida ativa (aquando do acidente tinha 23 anos de idade) concluiu o tribunal a quo que o A. viu a sua capacidade de ganho reduzida na proporção de 61 pontos, ou seja € 237.215,58 considerando as seguintes contas: o A. auferiria o montante total de €388.878,00 durante os 47 anos de vida ativa sem qualquer redução de capacidade de ganho (€491,00 x 14 meses = €8.274,00 x 47 anos).
Seguindo a corrente jurisprudencial que considera ser de ponderar o valor do salário médio nacional em circunstâncias em que o lesado ainda não exerceu uma atividade profissional ou quando se encontra desempregado e é ainda relativamente jovem[8], circunstancialismo que se aplica ao aqui autor; sendo o salário médio nacional à data do acidente em 2016 de € 924,09 que se arredonda para € 925,00 [vide dados indicados em pordata.pt] e tendo o autor uma esperança média de vida de mais 55 anos, encontramos um valor ficcionado de perda de rendimentos, considerada a incapacidade apurada de 61 pontos de € 434.472,50 [€925,00x14x55x0.61].
Habitualmente este valor é ajustado considerando que o capital é recebido de uma só vez, oscilando a nossa jurisprudência entre 1/3 e 1/4 desse montante, ou na redução desse montante em 10% ou 20% do capital antecipado, dependendo das circunstâncias do caso concreto.
Ocorre que no caso justifica-se introduzir um outro elemento.
O autor ficou incapaz totalmente de exercer a sua profissão habitual.
E quanto às demais, está apurado que apenas poderá exercer atividades compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional desde que não exijam execução de tarefas complexas.
Ora quando o défice funcional permanente de que o lesado fica a padecer é impeditivo da atividade profissional habitual, permitindo apenas que esse lesado exerça outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnica desde que não exijam a execução de tarefas complexas, a limitação acrescida que tal situação implica, justifica que no cálculo do dano patrimonial futuro seja devidamente ponderada tal situação, reduzindo o impacto que a habitual redução por antecipação do capital implica.
Nesta medida, considerando que o A. à data do acidente com 23 anos de idade, estava desempregado, que o salário médio nacional em tal data era de € 925,00 e que o A. ficou afetado de uma incapacidade de 61 pontos impeditiva da atividade profissional habitual, permitindo apenas que esse lesado exerça outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnica desde que não exijam a execução de tarefas complexas, entende-se adequado e recorrendo a critérios de equidade fixar o valor indemnizatório a título de dano patrimonial futuro no montante de € 400.000,00 tal como peticionado pelo autor.
Ao valor total arbitrado e que monta a € 575.000,00 há que deduzir o valor de € 12.000,00 adiantados já pela R. A... - como o evidenciam os factos provados 73) a 75) e 114) e 115) e foi peticionado pela R. A....
Termos em que se julga totalmente procedente o recurso do autor. E parcialmente procedente o recurso da R. A....
***
IV.Decisão.
Em face do exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela R. A... e totalmente procedente o recurso interposto pelo A., consequentemente e revogando parcialmente a decisão recorrida decidindo:
Condenar a R. A... a pagar ao A. a quantia global de € 575.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais futuros.
A esta quantia deduzindo o valor de € 12.000,00 já adiantados pela R., assim reduzindo o valor a pagar ao total de € 563.000,00.
No mais mantem-se o decidido pelo tribunal a quo. Custas do recurso do A. pela R. A....
Custas do recurso da R. A... também pela mesma, na proporção do decaimento.
Porto, 2023-05-08.
Fátima Andrade
Eugénia Cunha
Fernanda Almeida
__________________ [1]Cfr. Ac. STJ de 22/03/2018, nº de processo 290/12.6TCFUN.L1.S1, in www.dgsi.pt [2] Sobre o conceito de direção efetiva de um veículo e interesse na sua utilização, para efeitos do previsto no artigo 503º nº 1 do CC cfr. Ac. TRP de 09/03/2023, nº de processo 688/21.9T8PVZ.P1 in www.dgsi.ptonde assim se esclarece o que sobre este conceito se tem entendido: “Aprimeiradestina-seaabrangertodosaquelescasosemque,comousemdomíniojurídico,parecejustoimporaresponsabilidadeobjetiva,porsetratardaspessoasaquemespecialmenteincumbe,pelasituaçãodefactoemqueseencontraminvestidas,tomarasprovidênciasparaqueoveículofuncionesemcausardanoaterceiros.Sãonormalmenteoproprietário,ousufrutuário,olocatário,ocomodatário,oadquirentecomreservadepropriedade,aquelequeutilizaoveículosemautorizaçãoecontraavontadedoquetinhaarespetivadireçãoefetiva,etc.Adireçãoefetivadoveículoéopoderreal(defacto)sobreoveículo;éoelementofundamentalqueservedesuportelegalàresponsabilidadeobjetivanacirculaçãoterrestre.Temadireçãoefetivadoveículoaqueleque,defacto,gozaouusufruiasvantagensdele,eaquem,poressarazão,especialmentecabecontrolaroseufuncionamento. Asegunda---utilizaçãodoveículonoprópriointeresse---visaafastararesponsabilidadeobjetivadaquelesque,comoocomissário,utilizamoveículo,nãonoseuprópriointeresse,masemproveitoouàsordensdeoutrem.[…] Tem-seentendido,tradicionalmente,queointeressenautilizaçãotantopodeseruminteressematerialoueconómico(seautilizaçãodoveículovisasatisfazerumanecessidadesuscetíveldeavaliaçãopecuniária),comouminteressemoralouespiritual[…](comonocasodealguémemprestarocarroaoutremsóparalheseragradável),nemsequersendocasodeexigiraquiquesetratedeuminteressedignodeproteçãolegal.Podetratar-semesmodeuminteressereprovável(empréstimodoveículoparaumfimimoralouilícito):seriaumcontrassensolibertarodonodoveículodaresponsabilidadeobjetivaque,emprincípio,recaisobreodetentor,apretextodesercontrárioàleiouaosbonscostumesofimquedeterminouacedênciadoveículo. PosiçãosemelhantesegueDarioMartinsdeAlmeida[…]quandorefere:“Ocriadordoriscopodeserentãooproprietário,ousufrutuárioolocatário,ocomodatário,possuidoremnomepróprio,oadquirentecomreservadepropriedadedesdequepasseautilizaraviatura,oqueautilizasemautorizaçãooucontraavontadedaquelequedelatinhaarespetivadireçãoefetiva,ocompradorquepassouateradireçãodoveículoaindaqueocontratosejanulo,aqueleque,antesdacompradoveículo,vaiexperimentá-lo,noseuinteresseesobasuaexclusivadireção,oladrãoqueseapoderafraudulentamentedaviaturaepassaaconduzi-la,ocandidatoquefazexamedeconduçãoeenquantoofaz,oinstrutordeconduçãodeautomóveis,desdequenãosejaummerocomissário,oamigoaquem,nointeressedessaamizade,secedeoveículoparaumpasseio." MenezesLeitão[…]defendeque"direçãoefetivadoveículo"significaterumpoderdefactoouexercercontrolosobreoveículo,independentementedatitularidadeounãodealgumdireitosobreomesmo. Tudodependedorealsentidodassituações,aponderareinterpretarcasoacaso,sendoindispensávelque,emcadaumdeles,seconjuguem,cumulativamente,osdoisrequisitos:odadireçãoefetivadoveículoeodautilizaçãonoprópriointeresse;semessaverificaçãoconjuntanãoépossívelteressaspessoascomocriadorasderiscoeresponsabilizá-las,emconsequência,aoabrigodoart.º503º,nº1,doCódigoCivil.” [3] Realce nosso. [4] Realce nosso. [5] Cfr. Ac. STJ de 21/06/2022 nº de processo 1633/18.4T8GMR.G1.S1, in www.dgsi.ptonde foi apreciada uma situação de lesado com 26 anos de idade à data do acidente e que ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica compreendido entre 88 a 90 pontos - com um quadro de paraplegia com diparésia braquial abaixo de C-6, que é também designado, na nomenclatura utilizada pela Fisiatria, como de tetraplegia ASIA B, abaixo de C-6.; deslocando-se de cadeiras de rodas, desempregado à data do sinistro e com um défice temporário funcional total de 730 dias. Tendo a este sido atribuída uma indemnização por danos não patrimoniais o valor de € 500.000,00 e pelo dano patrimonial futuro € 450.000,00 considerando para o efeito e entre o mais o valor do salário médio nacional à data do acidente também em 2016 de € 925,00. [6] Veja-se que para situação em que ao lesado com 30 anos à data do acidente em que foi fixado um défice funcional permanente de 15 pontos, tendo sido atribuído ao lesado um quantum doloris de 6 numa escala de 7, um dano estético relevante de 4 em 7 e repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de 6 em 7 pontos - uma vez que, quanto a este índice, ficou privado de continuar a praticar o motociclismo, o que fazia com regularidade, participando em diversas provas, incluindo federadas e, ainda, impossibilitado de praticar desportos que também fazia, como bicicleta BTT, esqui na neve e esqui aquático, tendo ficado, ainda, condicionado no exercício da atividade desportiva de mergulho, que também praticava- a tudo acrescendo a circunstância de ter sido submetido a cinco intervenções cirúrgicas, com um pós-operatório prolongado (com uma repercussão temporária na atividade profissional total de 870 dias), de continuar a necessitar de medicamentos, consultas e tratamentos no futuro e de continuar padecer de dores, foi arbitrada uma indemnização de € 70.000 por danos não patrimoniais [cfr. Ac. STJ de 08/11/2022, nº de processo 2133/16.2T8CTB.C1.S1 in www.dgsi.pt]. Embora seja também muito relevante o dano suportado por este lesado, é notória a superior gravidade dos danos suportados e a suportar pelo aqui autor. [7] Cfr. Ac. TRC de 24/01/2023, nº de processo 2833/17.0T8CBR.C1 in www.dgsi.ptonde foi arbitrado o valor indemnizatório de danos não patrimoniais em € 150.000,00 a lesada prestes a completar 36 anos de idade aquando do acidente; permaneceu acamada durante 3 meses; utilizou cadeira de rodas durante 1 mês e meio, passando depois a apoiar-se em canadianas; realizou fisioterapia durante 1 ano; sofreu stress pós-traumático; teve um défice funcional temporário total de 210 dias (a que acresce um período de 7 dias), um défice funcional temporário parcial de 822 dias (a que acresce um período de 30 dias) e uma repercussão temporária na atividade profissional total de 1032 dias (a que acresce um período de 30 dias); apresenta um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 53 pontos, que é impeditivo do exercício da sua atividade profissional habitual, mas é compatível com outras atividades profissionais da sua área de preparação técnico-profissional, com esforços acrescidos; teve um quantum doloris de 7/7, ficou com cicatrizes que lhe conferem um dano estético de 5/7; uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de 5/7; uma repercussão na atividade sexual de 6/7 e que passou a necessitar de assistência vitalícia em termos de medicamentos e tratamentos médicos regulares. [8] Assim se decidiu e entendeu no Ac. STJ de 21/06/2022 já supra citado e que aqui seguimos de perto.