CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO
FORMA ESCRITA
CONTRATO DE EXPEDIÇÃO
MANDATO
ACTUAÇÃO DO TRANSITÁRIO POR CONTA DO EXPEDIDOR
REGIME APLICÁVEL
Sumário

I – O contrato de expedição ou contrato de trânsito envolve a concretização das operações de transporte, funcionando o transitário como um intermediário entre o expedidor e o transportador, assumindo-se como um prestador de serviços.
II – O contrato de expedição, em sentido estrito, é um mandato, pelo qual o transitário se obriga a celebrar um contrato de transporte por conta do expedidor-mandante, que pode ser com ou sem representação.
III - Se o transitário agir por conta do expedidor, mas em nome próprio, o regime aplicável será o que emerge do artigo 266º e seguintes do Código Comercial (comissão) e dos artigos 1180º a 1184º do Código Civil.
IV – O contrato de transporte marítimo está sujeito à forma escrita, consubstanciada num escrito particular denominado conhecimento de embarque ou conhecimento de carga, que, emitido e entregue pelo transportador ao carregador, constitui um título representativo da mercadoria nele descrita e desempenha uma tríplice função: serve de recibo de entrega ao transportador de uma determinada mercadoria nele descrita; prova o contrato de transporte firmado entre carregador e transportador e respectivas condições; e representa a mercadoria nele descrita, sendo negociável e transmissível, de acordo com o regime geral dos títulos de crédito.
V - O contrato de transporte é independente das relações subjacentes entre o carregador e o destinatário; todavia existe uma complementaridade funcional entre o contrato de transporte e a relação que lhe subjaz, sendo, as mais das vezes, um meio necessário de execução de uma compra e venda internacional.
VI – O fornecimento dos contentores traduzirá sempre um aluguer, que durante o estrito período de deslocação da mercadoria - tempo decorrido desde que as mercadorias são carregadas a bordo do navio até ao momento em que são descarregadas – estará incorporado no regime do transporte marítimo, encontrando-se diluído no preço acordado.
VII – Estando em causa uma modalidade de transporte pago pelo carregador, na ausência da estipulação de uma qualquer cláusula que responsabilize o carregador pelo pagamento das despesas subsequentes ao desembarque e advenientes da demora da libertação dos contentores, o custo de demurrage/detentione storage deve ser suportado pelo consignatário.

Texto Integral

Acordam as Juízas na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
OREY COMÉRCIO E NAVEGAÇÃO, S.A., com à Rua …, Lisboa, pessoa colectiva … intentou contra ECO-MODUS, LDA. e Hoahg Ming Phat, Import Export Co.Ltd, ambas com domicílio na Avenida … Alcabideche, Cascais a presente acção declarativa de condenação, com processo comum formulando o seguinte pedido:
a) A condenação das rés no pagamento à autora do montante de USD 306 449,87, correspondente a 259.131,00€, acrescido dos respectivos juros de mora que se vencerem a partir da citação e vincendos até efectivo e integral pagamento.
Alega, para tanto, o seguinte:
--> No âmbito da actividade de agente de navegação e transitária a que se dedica a autora, a ré Eco-Modus, Lda., que se dedica à actividade de comércio por grosso de desperdícios de materiais, compra e venda e sua importação e exportação, solicitou-lhe, em 4 de Janeiro de 2018, que promovesse o transporte marítimo de 10 contentores com resíduos de plástico do porto de Sines para o porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI, no Vietname, solicitando 14 dias de free time, no que respeita a demoras e imobilizações destes no destino;
--> A Autora enviou os detalhes da reserva, em 11 de Janeiro de 2018, e a mercadoria foi acondicionada nos 10 contentores identificados fornecidos pela companhia transportadora, a MSC-Mediterranean Shipping Company[1], tendo a ré enviado as instruções para o preenchimento do B/L;
--> Na sequência dessas instruções, a autora promoveu junto da MSC o transporte marítimo solicitado pela ré Eco-Modus, a quem transmitiu as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque, emitido em 22 de Janeiro de 2018;
--> Os contentores com a mercadoria foram embarcados no navio Maersk Essex que saiu do porto de Sines em 26 de Janeiro de 2018, com destino ao porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI, no Vietname, ao abrigo do referido conhecimento de embarque nr. MSKUKQ 296259;
--> A ré Eco-Modus solicitou à autora, por diversas vezes, a mudança do destino final da sua mercadoria e do consignatário, com a correcção do conhecimento de embarque, o que foi diligenciado pela autora, tendo ainda solicitado a emissão do Telex Release, para que a mercadoria pudesse ser entregue ao consignatário sem a apresentação do Conhecimento de Embarque MSKUKQ 296259, o que foi emitido pela MSC;
--> Em 16 de Julho de 2018, a ré Eco-Modus solicitou nova rectificação do Conhecimento de Embarque quanto ao consignatário, tendo a autora pedido essa correcção à MSC, que informou que só o poderia alterar desde que lhe fosse fornecida a Licença de Importação para a mercadoria em questão, o que foi enviado pela ré;
--> Entretanto, a MSC foi notificando a autora do valor das imobilizações e parqueamento dos 10 contentores no terminal do porto de Haiphong, a quem solicitou o urgente levantamento dos contentores;
--> Por troca de correspondência (mensagens de correio electrónico entre 29 de Outubro e 6 de Novembro de 2019), a autora foi dando conta às rés de que seriam responsáveis pelos valores referentes à imobilização e ao parqueamento dos contentores, que nunca foram levantados no destino;
--> A MSC informou a autora, em 21 de Fevereiro de 2020, que o consignatário se encontrava sob investigação policial e aduaneira, razão pela qual a mercadoria teria de ser destruída e deu conta dos custos, enviando uma carta a solicitar o pagamento dos valores atinentes a destruição da mercadoria, imobilização dos contentores, armazenagem, reparação de contentores e limpeza;
--> As rés, antes de exportarem a mercadoria, deveriam ter apurado a existência de restrições, pelo que lhes é imputável o pagamento dos valores em causa, devendo ser responsabilizadas pelos valores que a autora vier a ter de suportar.
A ré Eco-Modus, Lda. deduziu contestação excepcionando a caducidade do direito da autora invocando o art.º 3º, n.º 6 da Convenção de Bruxelas - Convenção Internacional para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimentos, assinada em Bruxelas a 25 de Agosto de 1924[2], de modo que a acção de indemnização deveria ser proposta no prazo de um ano a contar da entrega da mercadoria; mais suscitou a falta de causa de pedir, referindo que contratou a autora, na qualidade de transitária para realizar o transporte marítimo de 10 contentores, para o que esta contratou com a MSC, que efectuou o transporte e procedeu à sua entrega aos compradores, pelo que os destinatários tomaram posse da carga, com a entrega do bill of lading endossado, pelo que era a autora quem detinha a gestão comercial do transporte, sendo que a não retirada da mercadoria pelo comprador não vincula a ré, refutando assim a sua responsabilidade pelo pagamento das despesas associadas aos contentores no porto de destino (cf. Ref. Elect. 141471).
Por requerimento de 8 de Janeiro de 2021 a autora desistiu do pedido relativamente à ré Hoahg Ming Phat, Import Export Co.Ltd, desistência homologada por decisão proferida em 15 de Janeiro de 2021, sendo ainda a autora convidada a se pronunciar sobre as excepções deduzidas na contestação (cf. Ref. Elect. 142353 e 460434).
A autora pronunciou-se, por requerimento de 28 de Abril de 2021, posteriormente admitido, referindo não ser, no caso, transportadora marítima, não sendo aplicável o art.º 6º, n.º 3 da Convenção de Bruxelas, cujo prazo de caducidade se reporta apenas a perdas ou danos na mercadoria, que não é o caso, pois que se refere a despesas decorrentes da execução dos contratos de transporte marítimo; por outro lado, a ré aceitou que foi quem solicitou à autora que os contentores fossem entregues sem a apresentação do original dos Conhecimentos de Embarque e actuou como expedidora e dona da mercadoria, sendo esses os factos concretos que justificam o pedido, pelo que não se verifica falta de causa de pedir (cf. Ref. Elect. 144578).
Em 28 de Abril de 2021 a autora apresentou um articulado superveniente em que reduziu o pedido para o valor de 186.765,14€, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, alegando, muito em síntese, que a MSC lhe concedeu o prazo de 10 dias para proceder ao pagamento dos montantes atinentes às despesas com os contentores no porto de destino e destruição de mercadoria e, conforme advertência que já lhe tinha feito, comunicou que a cotação para o negócio de transporte de papel com outro cliente seu, para 2020, ficava dependente da resolução desta questão, que não ocorreu, pelo que a autora perdeu esse negócio, com a consequente perda de facturação no valor de 151.765,14€, o que é imputável à ré, levando a que a autora tivesse de acordar com a MSC no pagamento de um valor, que foi fixado em 35.000,00 €, atinente à imobilização, armazenagem, reparação e limpeza dos contentores e destruição da mercadoria (cf. Ref. Elect. 144583).
A ré foi notificada para se pronunciar sobre o articulado superveniente, o que fez, por requerimento de 7 de Junho de 2021, sustentando que estava em causa um novo pedido e uma nova causa de pedir, que não é admissível, refutando, no mais, que os custos da imobilização dos contentores lhe sejam imputáveis (cf. Ref. Elect. 145609).
Em 15 de Junho de 2021, iniciada a audiência prévia, a autora foi convidada a pronunciar-se sobre a sua legitimidade processual, prosseguindo em nova data (1 de Outubro de 2021), tendo sido efectuado o saneamento dos autos, julgada improcedente a excepção de falta de causa de pedir, admitidos o articulado superveniente e redução do pedido e apreciada a excepção de caducidade do direito invocado pela autora, julgada improcedente. Foi fixado o objecto do litígio e foram enunciados os temas da prova, sem reclamação (cf. Ref. Elect. 476448 e 487205).
Realizada a audiência de julgamento, em 12 de Dezembro de 2022 foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré Eco-Modus, Lda. do pedido deduzido (cf. Ref. Elect. 513000).
Inconformada com esta decisão, dela veio a autora interpor o presente recurso, cuja motivação conclui do seguinte modo (cf. Ref. Elect. 159568):
I- Foi dado como provado pelo douto Tribunal “a quo” sob o nº 40 o seguinte: “Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe o rápido levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos, argumentando que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. já não lhe estava a aceitar novos transportes.”
II- Para dar este facto como provado, o douto Tribunal “a quo”, apenas se baseou na troca de correspondência havida entre a R. ECO-MODUS e o seu cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. e constante do documento 38 junto com a Petição Inicial.
III- Como resulta daquela troca de correspondência acima transcrita, a solicitação que a R. ECO-MODUS fez à sua cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., foi apenas que a informasse sobre o estado relativo ao levantamento de vários contentores, inicialmente 32 contentores, que se encontravam parqueados em portos do Vietnam, entre os quais se encontravam os 10 contentores referidos nos autos.
IV- A R. ECO-MODUS nunca pediu o rápido levantamento dos aludidos contentores.
V- Até porque, quatro meses após a chegada da mercadoria ao porto de HaiPhong, solicitou à Autora nova rectificação do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 no sentido de nele constar como consignatário a companhia Trinh Nghien, tendo o Sr. T... como contacto no destino.
VI- Apenas existe de uma nota, constante do e-mail de 22 de Maio de 2018, primeiro e-mail enviado pela R. ECO-MODUS ao seu cliente Hoahg Ming 54 Phat, Import Export Co. Ltd., é que a R. ECO-MODUS necessitava de uma carta urgente de autorização da MSC Vietnam dizendo que poderiam carregar.
VII- Naquele momento, em 22 de Maio de 2018, a MSC não estaria a permitir a R. EcoModus colocar quaisquer reservas por causa de tantos contentores não levantados no Vietnam.
VIII- Em mais nenhum e-mail posterior esta nota volta a aparecer nem resulta da prova testemunhal efectuada no decorrer da audiência de julgamento que a transportadora marítima, a identificada MSC-MEDITERRANEAN SHIPPING COMPANY, alguma vez não estava a aceitar transportes à R. ECO-MODUS.
IX- o que deveria ter ficado provado era apenas o seguinte:
“Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe que a informasse sobre o estado relativo ao levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos.”
X- Foi dado como provado, pelo douto Tribunal “a quo” sob o nº 41 o seguinte: “Em resposta, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. comprometeu-se sempre a levantar todos os contentores nos dias seguintes aos da expedição dos e-mails que ia remetendo à Ré Eco-Modus.”
XI- O douto Tribunal “a quo”, para dar como provado o facto da forma como deu, socorreu-se da troca de correspondência constante do documento nr 38 junto pela ora APELANTE à sua Petição Inicial.
XII- Daquele correspondência, e acima transcrita, não resulta qualquer comprometimento da Hoahg Ming Phat, Import Export Co.Ltd de sempre levantar todos os contentores nos dias seguintes aos da expedição dos e-mails que ia remetendo à R. ECO-MODUS.
XIII- O que resulta daquela correspondência é apenas a informação sobre os contentores que já estavam levantados e sobre os que iriam ser levantados.
XIV- Deste modo, o que deveria ter ficado provado era apenas o seguinte:
“Em resposta, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. dava nota sobre o estado de levantamento dos contentores da Ré Eco-Modus, informando-a das respectivas datas de levantamento.”
XV- Foi dado como provado, pelo douto Tribunal “a quo” sob o nr 52 o seguinte: “A Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. – directamente ou por intermédio da Ré Eco-Modus – sempre prometeu à Autora o levantamento dos referidos dez contentores.”
XVI- Analisando toda a documentação existente nos autos, não resulta qualquer promessa directa ou indirecta daquela cliente da R. ECO-MODUS à ora APELANTE de qualquer levantamento de contentores.
XVII- A troca de correspondência constante do documento nr 38 junto com a P.I. a acima transcrita, é apenas trocada entre a R. ECO-MODUS e a sua cliente Hoagh Ming Phat, Import Export Co. Ltd. não aparecendo na mesma, nem em cópia, a ora APELANTE.
XVIII- E o e-mail datado de 14 de Outubro de 2019, que como documento 19 a ora apelante juntou à sua P.I., enviado pelo senhor T... da Hoagh Ming Phat, Import Export Co. Ltd. à R. ECO-MODUS mencionado na douta sentença a fls 22, apenas tem a A. em cópia, na pessoa do seu gerente e do seu funcionário senhor FL.
XIX- Não resultando daquele e-mail qualquer promessa de levantamento dos contentores.
XX- Do e-mail datado de 29 de Outubro de 2019, referido na sentença ora em crise a fls 22- junto à P.I. pela ora apelante a fls 5 do documento nr 40- e dirigido pela ora apelante ao senhor T... da Hoagh Ming Phat, Import Export Co.Ltd resulta, apenas, a pergunta por parte do colaborador da ora apelante, senhor FL, ao senhor T… da Hoagh Ming Phat, Import Export Co.Ltd. se tem notícias.
XXI- Respondendo o senhor T..., por e-mail datado de 31 de Outubro de 2019 - junto à P.I. pela ora apelante a fls. 4 do documento 40- que não tinha quaisquer notícias.
XXII- E do e-mail de 5 de Novembro de 2019, mais de um ano e meio após a chegada da mercadoria, junto pela ora apelante à sua P.I. a fls 1 do documento nr 40, dirigido pela R. ECO-MODUS àquela APELANTE resulta apenas que aquela ECO-MODUS a mesma iria falar com o senhor T... no dia seguinte e que o mesmo a tinha informado que iria à MSC Vietnam novamente.
XXIII- Tal facto jamais poderá ser dado como provado.
XXIV- Deu o douto Tribunal “a quo” como não provado o seguinte facto:” Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS, para poderem ser transportados para a China.
XXV- Como motivação para considerar tal facto como não provado vem o douto Tribunal “a quo” refere, na douta sentença a fls. 24 que o mesmo se suportou em documento que não reflecte a realidade que se pretendia assentar.
XXVI- Este facto alegado pela ora APELANTE no artigo 5º da sua P.I. foi aceite, sem reservas, pela R. ECO-MODUS, no artigo 12º da sua Contestação, no qual expressamente afirma ser verdade a matéria vertida nos artigos 1º a 42º da P.I.
XXVII- A R. ECO-MODUS confirmou por e-mails datados de 10 e 11 de Janeiro de 2018, as datas que já tinha transmitido à APELANTE para os cinco contentores por e-mail datado de 10 de Janeiro.
XXVIII- Este mesmo facto já consta do elenco dos factos dados como provados pelo douto Tribunal “a quo” como facto nr 5.
XXIX- Pelo que jamais poderia ser dado como não provado.
XXX- Deu o douto Tribunal “a quo” como não provados o seguinte facto: “Por e-mail datado de 4 de Julho de 2018, a Autora responsabilizou a Ré Eco-Modus pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e solicitou o urgente levantamento dos referidos módulos de carga.”
XXXI- Se a ora APELANTE não tivesse querido responsabilizar a R. ECO-MODUS pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259, não teria alertado esta do montante das referidas paralisações e imobilizações existente àquela data.
XXXII- O referido e-mail, não pode de forma nenhuma ser visto isoladamente como o fez o douto Tribunal “a quo”.
XXXIII- A ora apelante em 20 de Julho de 2018-vidé doc. nr 31 junto com a P.I.- informa a R. ECO-MODUS que a transportadora, a identificada MSC-MEDITERRANEAN SHIPPING COMPANY, a estava a responsabilizar pelas paralisações e storages dos contentores no valor de USD 40.000,00, àquela data.
XXXIV- a R. ECO-MODUS, sentindo-se responsabilizada, nessa mesma data, envia um e-mail, acima transcrito, para o seu cliente com cópia à sua contabilidade, informando-o que a identificada MSC -MEDITERRANEAN SHIPPING COMPANY o está (entenda-se cliente) a responsabilizar por esse mesmo pagamento.
XXXV- Se não se entendesse que a apelante tinha responsabilizado a R. ECO-MODUS, esta não teria nenhuma necessidade de afirmar que a companhia transportadora a identificada MSC -MEDITERRANEAN SHIPPING COMPANY, estava a responsabilizar o seu cliente, quando manifestamente não o fez.
XXXVI- Deve, assim, ser aditado à matéria de facto dada como provada o seguinte facto:
“Por e-mail datado de 4 de Julho de 2018, a Autora responsabilizou a Ré Eco-Modus pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e solicitou o urgente levantamento dos referidos módulos de carga.”
XXXVII- O douto Tribunal “a quo” como não provado, o facto constante da alínea c) dos factos não provados: “Os dez contentores, por razões imputáveis à Ré Eco-Modus, nunca foram levantados no destino.”
XXXVIII- Deu, ainda como não provado, o douto Tribunal “a quo”, o facto constante da alínea d) dos factos não provados: “Os dez contentores, por razões alheias à Autora, nunca foram levantados no destino”
XXXIX- No entender do douto Tribunal “a quo” este facto resultou não provado por ter natureza conclusiva e assumir uma feição valorativa a respeito da responsabilidade pelo não levantamento dos contentores no porto de destino.
XL- Estes factos deveriam constar da matéria provada.
XLI- A não ser assim verifica-se uma manifesta contradição entre estes factos não provados e o facto provado sob o nr 51. 58
XLII- Facto esse, aceite pela R. ECO-MODUS claramente evidencia que esta e o seu cliente, antes de terem contratado à Autora a promoção do transporte da referida mercadoria, não cuidaram de saber se o consignatário/destinatário podia proceder ao desalfandegamento da carga em apreço (plastic scrap).
XLIII- O que se veio a verificar efectivamente e que levou à destruição da mercadoria, conforme resulta do facto provado nr. 49.
XLIV- Por isso mesmo, tais factos devem constar da matéria de facto provado exactamente com os mesmos termos, ou seja:
“Os dez contentores, por razões imputáveis à Ré Eco-Modus, nunca foram levantados no destino.”
E:
“Os dez contentores, por razões alheias à Autora, nunca foram levantados no destino”
XLV- Deu o douto Tribunal “a quo” como não provado, os seguintes factos constantes das alíneas f) g) h), j) e k)) dos factos não provados:
“f) Em face da não resolução da situação por parte da Eco-Modus, a MSC-Mediterranean Shipping Company, S.A. não revalidou a cotação relativa ao negócio de papel (Navigator) à Autora.”
“g) Tendo a Autora perdido o negócio de transporte de papel para o mercado do médio oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A.”
h) Negócio esse que representou para a Autora uma facturação de €151.765,14 em 2019.
j) Valor este que não facturou em 2020 ao seu cliente The Navigator Company, S.A. pelo facto de não poder embarcar a mercadoria desta sociedade para aquele mercado.
k) Para que que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixasse de bloquear os embarques da Autora para o médio oriente, as partes ajustaram o acordo referido nos factos provados n.ºs 57-60.
XLVI- A R. ECO-MODUS, não impugnou qualquer um destes factos nem os documentos que os suportavam.
XLVII- Por outro lado, o douto Tribunal “a quo” não valorou devidamente, o depoimento de parte que acima se transcreveu de minuto 00:14:17 a minuto 00:15:38 e de minutos 00:31:37 a 00:31:40.
XLVIII- Resulta do seu depoimento e pode mesmo inferir-se do mesmo que o negócio do papel (Navigator) para mercado do Médio Oriente se realizou sem a intervenção da ora apelante tendo, inclusivamente, a parte identificado o seu concorrente com quem o negócio passou a fazer-se.
XLVIX- Ao contrário do que consta da Sentença a pág. 26, não se trata de outros negócios ajustados entre apelante e a MSC- Mediterranean Shipping Company mas apenas do negócio de transporte de Papel para o Médio-Oriente.
L- A MSC-Mediterranean Shipping Company, apoiou a ora apelante naquele negócio durante o ano de 2019.
LI- Mas a verdade é que a ora apelante, devido à não resolução relativa ao levantamento dos contentores, deixou de ter o apoio da MSC- Mediterranean Shipping Company, em 2020, tendo perdido o negócio a partir daí.
LII- foi afirmado pela apelante, e que resulta do depoimento de parte, que deixou, em 2020, de ter o negócio de transporte de papel que mantinha apenas com a Navigator com apoio da MSC- Mediterranean Shipping Company a preços competitivos, o qual passou a ser efectuado por outro Transitário, a VENDASP, com aquele mesmo apoio da MSC-Mediterranean Shipping Company.
LIII- Também o facto não provado constante da alínea g), isto é, que o negócio do papel representou para a Autora uma facturação de €151.765,14 em 2019, deveria, ao invés, ter sido dado como provado.
LIV- Este facto, não impugnado pela R. ECO-MODUS, não só resulta do documento que, sob o nº 2 foi junto ao articulado superveniente, como também do próprio depoimento de parte requerido pela ora apelante e acima transcrito de minutos 00:14:30 a minutos 00:14.40
LV- Deverá ser dado como provado, o facto constante da alínea j).
LVI- A apelante, pelo menos até à data do depoimento do seu gerente ao minuto 00:14:40 e acima transcrito, não tinha facturado qualquer valor decorre daquele mesmo depoimento.
LVII- devem ser aditados aos factos dados como provados os seguintes:
= Em face da não resolução da situação por parte da Eco-Modus, a MSC-Mediterranean Shipping Company, S.A. não revalidou a cotação relativa ao negócio de papel (Navigator) à Autora.”
= Tendo a Autora perdido o negócio de transporte de papel para o mercado do médio oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A.”
= Negócio esse que representou para a Autora uma facturação de €151.765,14 em 2019.
= Valor este que não facturou em 2020 ao seu cliente The Navigator Company, S.A. pelo facto de não poder embarcar a mercadoria desta sociedade para aquele mercado.
= Para que que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixasse de bloquear os embarques da Autora para o médio oriente, as partes ajustaram o acordo referido nos factos provados n.ºs 57-60.
LVIII- Consta do artigo 39º da sua Petição Inicial: “Imobilizações e parqueamento pelas quais as RR. são totalmente responsáveis e pelas quais, desde logo, a A. as responsabilizou, solicitando o urgente levantamento dos contentores como decorre, entre outros, do e-mail datado de 4 de Julho de 2018, cuja cópia se junta sob o nr 37 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.”
LIX- Este facto foi integralmente aceite pela R. ECO-MODUS na sua contestação, concretamente no artigo 12º desta peça processual, onde expressamente se afirma: “É verdade a matéria vertida nos artigos 1º a 42º da Petição Inicial.” – Negrito nosso-.
LX- Deverá, por isso, ser acrescentado o seguinte facto à matéria provada: “A R. é totalmente responsável pelas imobilizações e parqueamento dos contentores e pelas quais, desde logo, a A. a responsabilizou, solicitando o urgente levantamento dos mesmos.”
LXI- O douto Tribunal “a quo” cuidando, na douta sentença ora em crise, questões meramente acessórias, não se preocupou com o objecto do litígio aqui em causa.
LXII- Na verdade, o objecto de litígio consiste em determinar se a R. ECO-MODUS é responsável pelos danos alegadamente sofridos pela ora apelante em consequência do não levantamento no destino da mercadoria que fez transportar em nome e por conta daquela e, em caso afirmativo, a medida de tal responsabilidade.
LXIII- Ora, nunca esteve em causa, e apenas se alegou por uma questão de sequência lógica, qualquer problema com a emissão de documentação do transporte.
LXIV- O que está verdadeiramente em causa são os danos sofridos pela apelante consubstanciados nas imobilizações e paralisações e da perda de negócio para o mercado do médio oriente no que respeita ao seu cliente Navigator e se, por tais danos, aquele R. ECO-MODUS é ou não responsável.
LXV- Para tomar a decisão que tomou, baseou-se o douto Tribunal “a quo” em três conclusões que têm por base pressupostos errados.
LXVI- Primeira conclusão: “Sendo as despesas de demurrage/detention e storage um acessório do frete e tendo a Ré satisfeito a retribuição devida ao transportador marítimo por via do pagamento que efectuou à Autora, não se descortina em que medida é que a primeira pode ser responsável pela satisfação dos sobreditos custos quando estes ocorreram no destino por facto que não lhe é imputável, pois autorizou atempadamente o levantamento da mercadoria ao respectivo consignatário no instante em que deu instruções ao transitário que gizou a operação de deslocação da carga para que este diligenciasse junto do transportador marítimo pela emissão o competente telex release, o qual foi emitido.
LXVII- Esqueceu-se o douto Tribunal, que resulta do facto provado sob o nr. 51 que a R. ECO-MODUS, antes de ter contratado com a apelante a promoção do transporte, não cuidou de saber se o destinatário poderia proceder ao desalfandegamento da mercadoria.
LXVIII- Esta é a questão que origina todas as despesas de imobilização e estacionamento dos contentores.
LXIX- A emissão do telex release, muito realçada na douta sentença ora em crise, é completamente irrelevante.
LXX- Na verdade, o pedido de emissão do aludido telex release foi solicitado pela R. ECO-MODUS em 19 de Março de 2018, isto é um dia após a chegada da mercadoria ao destino sendo certo que 4 meses depois a mesma R. ECO-MODUS voltou a pedir a mudança de destinatário daquela mesma mercadoria.
LXX- A emissão deste telex release em nome de um destinatário que, em face dos subsequentes pedidos de alterações promovidas pela R. ECO-MODUS junto da apelante e transmitidas por esta ao transportador marítimo a identificada MSC-Mediterranean Shipping Company deixou de o ser, tornou aquele documento completamente ineficaz.
LXXI- Ainda que assim se não entendesse, continuaria a ser completamente irrelevante, a emissão do referido telex release.
LXXII- O não levantamento da mercadoria e a sua destruição deveu-se ao facto de antes de ser contratado o transporte à ora apelante não cuidou de saber, ela e o seu cliente se o destinatário poderia proceder ao desalfandegamento da mercadoria.
LXXIII- Este é o cerne da questão.
LXXIV- Bem sabendo o douto Tribunal “a quo” ser este o cerne da questão, vem com uma conclusão completamente peregrina e inexequível para qualquer transitário ou transportador marítimo.
LXXV- Conclui assim o douto Tribunal “a quo”: A Ré foi assessorada no transporte dos autos pela Autora, a qual se dedica à actividade transitária. Ora, desempenhando profissionalmente um labor técnico-burocrático que consiste a título principal na planificação, controlo, coordenação e direcção das operações necessárias à execução das formalidades e trâmites exigidos na expedição, recepção e circulação de mercadorias, cabia à Autora usar da diligência devida para que a carga expedida pelo seu cliente pudesse ser entregue no porto de destino, prevenindo assim que a Ré – sociedade que a contratou – pudesse sofrer as consequências nocivas decorrentes de qualquer vicissitude ocorrida no transporte que pudesse afectá-la patrimonialmente.”
LXXVI- Conforme decorre da matéria de facto dada como provada, foi a R. ECO-MODUS quem forneceu à apelante todos os dados para a realização do transporte marítimo promovido pela mesma junto da transportadora marítima, a identificada MSC- Mediterranean Shipping Company, nomeadamente local de carga, porto de destino, e destinatário da mercadoria, pagou o frete e solicitou o denominado “Free Time” no destino de 14 dias, que lhe foi concedido.
LXXVII- A obrigação da apelante junto da R. ECO-MODUS foi apenas a de promover um transporte de mercadorias entre Portugal e o Vietname nos exactos termos transmitidos pela mesma R. e igualmente a disponibilização dos meios necessários para o efeito, nomeadamente os contentores.
LXXXVIII- É manifestamente descabido e inexigível que se impunha ao Transitário ou ao Transportador que, tenha de conhecer as restrições existentes, no país de destino de uma determinada mercadoria, ou se um determinado destinatário está impedido de receber mercadoria por parte das autoridades desse País.
LXXIX- Não cabendo tal obrigação no âmbito das obrigações do Transitário previstas no artigo 1º do Decreto-Lei 255/99.
LXXX- Os contentores não puderam ser levantados “porquanto o respectivo destinatário não podia resgatá-los, pois estava sob investigação por parte da Alfândega e Polícia Vietnamitas”.
LXXXI- O próprio Tribunal “a quo” no facto 51 que deu como provado, imputou tal responsabilidade à R. ECO-MODUS e ao seu cliente.
LXXXII- E não à ora apelante.
LXXXIII- Conclui o douto Tribunal “a quo” como segue: “Finalmente, ficou por demonstrar que a Autora (e a Ré), nos termos do concreto contrato de transporte marítimo ajustado com a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. era responsável pelo pagamento das despesas de demurrage/detention e storage motivadas pelo não levantamento atempado dos contentores ajuizados no porto de destino. Logo, a quantia exigida a esse título não é devida, o mesmo sucedendo, consequentemente, com a importância reclamada a título de lucros cessantes, até porque estes quedaram por demonstrar.
LXXXIV- Não faz sentido nenhum a ora apelante quando fez o booking para o transporte dos 10 contentores de acordo com as instruções da R. ECO-MODUS tenha expressamente referido, aliás na sequência do pedido daquela, que a mesma tinha 14 dias de “free time” no destino, conforme decorre dos documentos nrs 3, 9 e 25 juntos com a P.I.
LXXXV- Isto só pode significar que ultrapassado aquele “free time” a responsabilidade pelas despesas decorrentes do não levantamento dos contentores no destino aquela R. ECO-MODUS assumia a responsabilidade pelas mesmas.
LXXXVI- Seguindo a tese do douto Tribunal, a R. ECO-MODUS seria sempre, em última instância, a responsável pelas despesas quer de imobilização de contentores quer pelas despesas de armazenamento.
LXXXVII- Na verdade, e considerando, como considera o douto Tribunal, que apos o período de “free time”, concedido pelos transportadores marítimos, em que se mostra transcendido o transporte marítimo propriamente dito, se aplicam autonomamente, as regras da locação, a decisão teria de ser sempre uma decisão de condenação da R. ECO-MODUS.
LXXXVIII- Quem pediu os contentores foi a ora apelante, em nome e por conta da R. ECO-MODUS a quem os mesmos foram disponibilizados para que esta neles acondicionasse a sua mercadoria.
LXXXIX- Foi igualmente a ora apelante que, em nome e por conta da R. ECO-MODUS, pagou ao transportador marítimo, a identificada MSC-Mediterranean Shipping Company o frete correspondente ao transporte marítimo, tendo-o recebido daquela R. ECO-MODUS.
XC- Foi a apelante que pediu, em nome e por conta da R. ECO-MODUS os contentores e o transporte marítimo da mercadoria neles acondicionada e tendo pago o respectivo frete, é esta apelante necessariamente a locatária no contrato de locação dos aludidos contentores perante o transportador marítimo e sublocadora perante a ECO-MODUS, esta na qualidade Expedidor. Não nos podemos esquecer que a quem foram imputadas as imobilizações e demais despesas ocorridas no porto de destino pelo transportador marítimo, foi à aqui apelante.
XCI- Como se refere na douta sentença, o art.º 13.º do DL n.º 255/99 prevê a possibilidade de as empresas transitárias celebrarem contratos com terceiros em nome próprio, por conta do expedidor ou do dono da mercadoria. E o art.º 15.º do mesmo diploma, epigrafado de «Responsabilidade das empresas transitárias», adianta no seu n.º 1 que estas respondem perante o seu cliente pelo incumprimento das suas obrigações, bem como pelas obrigações contraídas por terceiros com quem hajam contratado, sem prejuízo do direito de regresso. Paralelamente, o art.º 367.º do CCom consente expressamente que o transportador actue tanto por si e seus empregados e instrumentos, como por ou através de empresa, companhia ou pessoas diversas - caso em que, de acordo com o seu § Único, «o transportador que primitivamente contratou com o expedidor conserva para com este a sua originária qualidade» e assume a de expedidor para com a empresa, companhia ou pessoa com quem depois ajustou o transporte.
XCII- A apelante é, perante a transportador marítimo, a identificada MSC-Mediterranean Shipping Company, a responsável pelas imobilizações e demais despesas no destino, tendo um verdadeiro e próprio direito de das mesmas ser ressarcida pela R. ECO-MODUS, já que é ela e consequentemente esta ECO-MODUS a parte, caso se entenda, como entende o douto Tribunal, estarmos perante um contrato de locação autónomo, no período que transcende o transporte marítimo.
XCIII- Isto mesmo constitui a nossa recente Jurisprudência, veja-se entre outros Acórdão da Relação de Lisboa, datado de 23 de Fevereiro de 2021, onde se refere, no respectivo sumário, o seguinte: “No âmbito de um contrato de transporte de mercadorias por mar, sendo a mercadoria transportada em contentores, fica o expedidor obrigado a assegurar a libertação dos contentores logo que o destinatário receba ou rejeite a mercadoria no porto de destino.”
XCIV- Nunca houve qualquer aceitação da mercadoria por parte do destinatário da mesma.
XCV- O que houve, isso sim, foi uma declaração de interesse do mesmo na mercadoria. Nada mais.
XCVI- Por tudo o exposto, mal andou o douto Tribunal “a quo” ao ter decidido como decidiu.
Termina pugnando pela procedência do recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.
A ré/recorrida contra-alegou sustentando a manutenção da decisão impugnada e suscitando a verificação de abuso de direito por parte da autora/apelante ao deduzir a presente pretensão, depois de ter afirmado que nem ela, nem a ré, eram responsáveis pelo pagamento dos custos da imobilização dos contentores (cf. Ref. Elect. 160333).
*
II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos dos art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil[3] é pelas conclusões do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. De notar, também, que o tribunal de recurso deve desatender as conclusões que não encontrem correspondência com a motivação - cf. António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2016, 3ª edição, pág. 95.
Assim, perante as conclusões da alegação da autora/recorrente há que apreciar as seguintes questões:
a) A impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
b) A responsabilidade pelo pagamento dos valores atinentes à demurrage/detention, storage, destruição da mercadoria e limpeza de contentores;
c) O direito da autora a obter uma indemnização pelos valores que deixou de auferir na sequência dos eventos que culminaram na cobrança dos custos referidos em b);
d) O abuso de direito.
Colhidos que se mostram os vistos, cumpre apreciar e decidir.
*
III - FUNDAMENTAÇÃO
3.1. – FUNDAMENTOS DE FACTO
A sentença sob recurso considerou como provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de agente de navegação e transitária, estando inscrita como agente de navegação no IPTM – Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, I.P. com o n.º NA-005 e sendo detentora do alvará n.º 900634 emitido pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P. para o exercício da actividade transitária.
2. A Ré Eco-Modus, Lda. e a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. são sociedades comerciais que se dedicam à actividade de comércio por grosso de desperdícios de materiais, compra e venda e importação e exportação dos mesmos.
3. No âmbito daquela sua actividade a Ré Eco-Modus solicitou, inicialmente, à Autora que promovesse o transporte marítimo de dez contentores com resíduos de plástico do porto de Sines para o porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI, no Vietname.
4. Em 4 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou à Autora cinco contentores para carregar desperdício de plástico com destino a Ho Chi Mingh-CAT LAI e pediu 14 dias de free time no que respeita às demoras e imobilizações dos mesmos no destino.
5. Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS para poderem ser transportados para o Vietname.
6. Em 11 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus comunicou à Autora as datas nas quais os restantes cinco contentores deveriam ser carregados no seu fornecedor SAICANATUR para poderem ser transportados para o seu destino final.
7. Em 11 de Janeiro de 2018 a Autora enviou à Ré Eco-Modus um e-mail no qual lhe transmitiu, reconfirmando os e-mails por esta enviados, os detalhes disponíveis da reserva feita por aquela Ré nos seguintes termos:
«De: JM [mailto: ...@orey-shipping.com]
Enviada: quinta-feira, 11 de Janeiro de 2018 15:59
Para: IC
Cc: FL; '08 14/ 08 to 05/'; ...@Eco-Modus.eu
Assunto: RE: IR02550 + IR02551 Boooking request / 0201860025
Boa tarde IC,
Note pfv. detalhes disponíveis da reserva:
FCL – 10X40’HC
BKG: 083LI0250491 ETD LISBOA: 19/JAN
p/ rail
ETD SINES: 25/JAN
VESSEL/VOY: “MAERSK ESSEX”; v. 752W T/S PORT: SINGAPORE
ETA HOCHIMINH – CAT LAI: 07/MAR
IR02550 - 15/01/2018 - Local de carga:
1º cnt: 09h00 / JDT - Frielas
2º cnt: 10h00 / JDT – Frielas
3º cnt: 11h00 / JDT - Frielas
4º cnt: 09h00 / AS SMS – Seixal
5º cnt: 10h00 / AS SMS - Seixal
IR02551 - 16/01/2018 – Local de carga:
1º cnt: 09h00 / SAICANATUR – Alcochete
2º cnt: 09h30 / SAICANATUR – Alcochete
3º cnt: 10h00 / SAICANATUR – Alcochete
4º cnt: 10h30 / SAICANATUR - Alcochete
5º cnt: 11h00 / SAICANATUR - Alcochete
TRANSPORTADOR TERRESTRE: ALB/MSC TRANSPORTADOR MARITIMO: MSC
Transportes para enchimentos marcados como solicitado. Enviem pfv. docs. para despacho.
Obg.
M.Cmpts,
JS»
8. A mercadoria foi acondicionada pela Ré Eco-Modus nos contentores MSCU 7917744, TTNU 9026663, TGHU 6164462, MSCU 7199610, TGHU 8997880, TCLU 5703344, TTNU 9567760, MSCU 7019088, TCNU 2022107 e DRYU 9348073, fornecidos pela MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedido da Autora, tendo tais módulos de carga sido selados também pela Ré.
9. A Ré Eco-Modus, por e-mail datado de 12 de Janeiro de 2018, enviou à Autora as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque.
10. Em 16 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus tornou a enviar à Autora as referidas instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque.
11. Na sequência das instruções da Ré Eco-Modus, a Autora promoveu junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. o transporte marítimo que aquela lhe solicitou.
12. A Autora transmitiu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal e de acordo com o que lhe fora comunicado pela Ré Eco-Modus, as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque em 19 de Janeiro de 2018.
13. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, emitiu em 22 de Janeiro de 2018, de acordo com as instruções da Ré Eco-Modus e transmitidas pela Autora, o conhecimento de embarque relativo ao solicitado transporte.
14. Os dez contentores com a mercadoria expedida pela Ré Eco-Modus para a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. foram embarcados no navio MAERSK ESSEX, que saiu do porto de Sines em 26 de Janeiro de 2018 com destino ao porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI no Vietname, ao abrigo daquele referido conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
15. Em 31 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou por e-mail à Autora para mudar o consignatário e destino final da sua mercadoria de Ho Chi Mingh-CAT LAI para Haiphong, também no Vietname.
16. A Ré Eco-Modus enviou então, no mesmo e-mail, novas instruções para correcção do conhecimento de embarque.
17. Em face desta solicitação a Autora enviou, naquela mesma data, um e-mail para o agente da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedir a rectificação do conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
18. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. enviou naquela mesma data o draft do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 já com as correcções solicitadas pela Ré Eco-Modus à Autora.
19. A Autora, por sua vez, em 7 de Fevereiro de 2018, enviou tal draft à Ré Eco-Modus para confirmação desta.
20. Entretanto, em 28 de Fevereiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou novamente à Autora a alteração do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e de um outro, o MSCUKQ318475, relativamente à entidade consignatária e parte a notificar, que passaria a ser a sociedade PMai Industry Environment Company Limited.
21. Na sequência do solicitado pela Ré Eco-Modus, a Autora em 1 de Março de 2018, enviou um e-mail para o agente da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedir a rectificação do conhecimento de embarque.
22. Tendo a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente, enviado à Autora em 2 de Março de 2018 o draft dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475, rectificados de acordo com as instruções da Ré Eco-Modus apenas quanto ao consignatário.
23. A Autora, por sua vez e naquela mesma data, enviou à Ré Eco-Modus o aludido draft para confirmação desta.
24. Em 6 de Março de 2018, e dado que a “Notify Party” não coincidia com o “Consignee”, a Ré Eco-Modus solicitou à Autora uma nova rectificação dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475.
25. A Autora, na sequência destas instruções, solicitou naquela mesma data ao agente de navegação da transportadora marítima, a identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., a rectificação dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475.
26. Tendo enviado à Ré Eco-Modus também naquela data o draft dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475, já com as alterações pretendidas e solicitadas por aquela Ré.
27. Tendo a Ré Eco-Modus confirmado a alteração ao referido conhecimento de embarque MSKUKQ296259 em 19 de Março de 2018 por e-mail da mesma data.
28. Ainda naquele e-mail a Ré Eco-Modus solicitou à Autora a emissão do telex release de forma a que a mercadoria pudesse ser entregue ao consignatário sem a apresentação do aludido conhecimento de embarque MSKUKQ296259, pois neste ainda figurava o antigo consignatário e não a PMai Industry Environment Company Limited.
29. Nessa mesma data, e na sequência do e-mail da Ré Eco-Modus, a Autora indagou junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. pela correcção do draft do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 corrigido de acordo com as instruções daquela Ré e solicitou a emissão do telex release.
30. Tendo a identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, emitido o referido telex release.
31. O navio MAERSK ESSEX, que transportou os contentores com a mercadoria expedida pela Ré Eco-Modus para a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., chegou ao porto de Haiphong em 18 de Março de 2018, tendo os dez módulos de carga sido descarregados para o respectivo terminal nessa data.
32. A Ré Eco-Modus, por e-mail de 16 de Julho de 2018, solicitou à Autora nova rectificação do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 no sentido de nele constar como consignatário a companhia Trinh Nghien, tendo o Sr. T... como contacto no destino.
33. Na mesma data, a Autora – na sequência do que lhe foi solicitado pela Ré Eco-Modus –, pediu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A que corrigisse o aludido conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
34. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. transmitiu à Autora que só poderia alterar o conhecimento de embarque MSKUKQ296259 desde que lhe fosse fornecida a licença de importação para a mercadoria em questão.
35. Nesse sentido, a Autora, em 20 de Julho de 2018, solicitou à Ré Eco-Modus a referida licença de importação.
36. Em 23 de Julho de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora a aludida licença de importação.
37. A Autora, nessa mesma data, remeteu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a identificada licença de importação, tendo então adiantado que tanto ela como a Ré Eco-Modus não eram responsáveis pelo pagamento das paralisações dos contentores abrangidos pelo conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
38. Entretanto, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. notificou a Autora – por missivas datadas de 10 de Maio de 2018 e 2 de Julho de 2018 – do valor das imobilizações e parqueamento dos dez contentores no terminal do porto de Haiphong.
39. Por e-mail de 4 de Julho de 2018, a Autora comunicou à Ré Eco-Modus que «(…) após a resolução dos 13 contentores, continuamos com um problema com o MSKUKQ296259 favor note em anexo carta recebida da MSC. Notar que o valor já vai em USD 37.149,00 de demurrage/USD 3180,00 de storage. Necessitamos que verifiquem esta situação com urgência. Aguardo vossa informação (…)».
40. Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe o rápido levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos, argumentando que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. já não lhe estava a aceitar novos transportes.
41. Em resposta, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. comprometeu-se sempre a levantar todos os contentores nos dias seguintes aos da expedição dos e-mails que ia remetendo à Ré Eco-Modus.
42. Em 14 de Outubro de 2019, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., através do senhor T…, em e-mail dirigido à Ré Eco-Modus, informou que ia tomar conta dos contentores e levantá-los a breve trecho.
43. A Autora, entre 29 de Outubro de 2019 e 6 de Novembro de 2019, insistiu junta da Ré Eco-Modus e da Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. na rápida solução para o levantamento dos contentores tendo então salientado que os respectivos custos de imobilização e parqueamento estavam a aumentar diariamente.
44. A Ré Eco-Modus, por e-mail de 5 de Novembro de 2019, comunicou à Autora que iria falar com T… no dia seguinte e que este lhe garantiu que pretendia deslocar-se novamente à MSC Vietnam e insistiu não querer abandonar a mercadoria.
45. Os dez contentores do bill of lading MSKUKQ296259 nunca foram levantados no destino, seja pela Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., seja por qualquer outro destinatário designado pela Ré.
46. Em 21 de Fevereiro de 2020, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. remeteu um e-mail à Autora no qual a informou que o consignatário se encontrava sob investigação por parte da Alfândega e Polícia Vietnamitas, razão pela qual a mercadoria teria de ser destruída, para além de que lhe comunicou os custos de imobilização (USD 257 414) e parqueamento (USD 21 000) dos ditos contentores e da destruição da mercadoria (USD 2800/contentor).
47. Em 23 de Março de 2020, na sequência do e-mail enviado pela Autora à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., esta, nessa mesma data esta, através do seu agente, informou que a mercadoria já tinha sido destruída e os contentores devolvidos ao parque.
48. Em 15 de Setembro de 2020 a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. enviou para a Autora uma carta na qual a responsabilizou pelo pagamento dos seguintes valores:
- Destruição da mercadoria: USD 28 000
- Imobilização dos contentores: USD 252 131
- Armazenagem: USD 21 630
- Reparação de contentores: USD 4616,61
- Limpeza: USD 72,26.
49. Na missiva em apreço, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. concedeu à Autora o prazo de 10 dias para proceder ao respectivo pagamento sob pena de iniciarem o respectivo procedimento judicial, tendo ainda referido que «[n]o âmbito do contrato de transporte ao abrigo do conhecimento de embarque MSCUKQ296259, celebrado entre a MSC e a Orey Comércio e Navegação, S.A., foram transportados de Portugal para o Vietname, 10 contentores que descarregaram em Haiphong no dia 18/03/2018. As Autoridades Vietnamitas impõem certas restrições para o tipo de mercadoria transportada (plastic scrap), sendo que, no caso em apreço, o Consignatário ficou impossibilitado de proceder ao respectivo desalfandegamento. Perante esta situação e, por forma a obter a libertação dos contentores, a MSC viu-se forçada a proceder à destruição da carga. Assim, a mercadoria foi destruída nos dias 18 e 19 de Março de 2020 e, até ao dia 21, todos os contentores retornaram vazios. Desde a data em que os contentores descarregaram cheios no Terminal de Haiphong, até ao dia em que foram restituídos vazios, foram geradas as seguintes despesas (…). Considerando que a Orey contratou o serviço de transporte à MSC, responsabilizamos V. Exas. por todas as despesas incorridas com o presente processo. Sendo certo que, os termos e condições dos transportes efectuados pela MSC, são há muito conhecidos e estabelecidos. A MSC preza a resolução de conflitos através dos meios extrajudiciais, pelo que, interpelamos V. Exas. a procederam ao pagamento do montante total de $ 306'449.97 (…)».
50. Tendo a referida MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. transmitido, ainda, oralmente à Autora que não lhe aceitaria mais colocações de transportes marítimos para aquele mercado do Médio-Oriente até que fosse ressarcida de tais custos.
51. A Ré Eco-Modus e a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., antes de terem contratado à Autora a promoção do transporte da referida mercadoria, não cuidaram de saber se o consignatário/destinatário podia proceder ao desalfandegamento da carga em apreço (plastic scrap).
52. A Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. – directamente ou por intermédio da Ré Eco-Modus – sempre prometeu à Autora o levantamento dos referidos dez contentores.
53. Por e-mail datado de 20 de Dezembro de 2019, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, comunicou à Autora para considerar a cotação para o negócio de Papel (Navigator) para 2020 para o trade em questão e com a validade até 31 de Dezembro de 2020.
54. No mesmo e-mail, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. informou, ainda a Autora que tal cotação ficava «(…) pendente da resolução da situação pendente com a Eco-Modus durante o mês de Janeiro caso contrário a mesma não será revalidada».
55. Sendo que, àquela data, o valor do parqueamento e imobilização dos contentores atingia um montante cifrado entre USD 3810 e USD 37 149 e USD 21 000 e USD 257 414, respectivamente.
56. A alegada “situação pendente com a Eco-Modus” não se resolveu.
57. A Autora, após negociações diversas com a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., conseguiu chegar, com a mesma, em 20 de Novembro de 2020, a um acordo final de transacção.
58. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. reduziu o valor da imobilização, armazenagem, reparação e limpeza dos contentores e destruição da mercadoria no montante de €259.130,94 para o montante total de €35.000.
59. Tendo a Autora aceitado pagar à identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. o referido valor da seguinte forma:
- Na data da assinatura de tal acordo, isto é, em 30 de Novembro de 2020, o montante de €12.500;
- Em 31 de Março de 2021, o montante de €10.000;
- E em 30 de Junho de 2021 o montante de €12.500.
60. Pelo referido acordo de transacção, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. declarou ainda que com o último pagamento acima referido considerava-se totalmente paga e indemnizada a propósito dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSCUKQ296259 e afirmou sub-rogar a Autora nos seus direitos contra terceiros, nomeadamente, contra a Ré Eco-Modus, emitindo em 30 de Junho de 2021 o instrumento de sub-rogação.
61. A Autora entregou à MSC – Mediterranean Shipping Company as sobreditas importâncias de €12.500, €10.000 e €12.500 nos dias 12-10-2020, 03-03-2021 e 30-04-2021, respectivamente.
*
O Tribunal recorrido deu como não provados os seguintes factos:
a) Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS, para poderem ser transportados para a China.
b) Por e-mail datado de 4 de Julho de 2018, a Autora responsabilizou a Ré Eco-Modus pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e solicitou o urgente levantamento dos referidos módulos de carga.
c) Os dez contentores, por razões imputáveis à Ré Eco-Modus, nunca foram levantados no destino.
d) Os dez contentores, por razões alheias à Autora, nunca foram levantados no destino.
e) A Ré Eco-Modus sempre prometeu à Autora proceder ao levantamento dos referidos dez contentores.
f) Em face da não resolução da situação por parte da Eco-Modus, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. não revalidou a cotação relativa ao negócio de papel (Navigator) à Autora.
g) Tendo a Autora perdido o negócio de transporte de papel para o mercado do médio oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A..
h) Negócio esse que representou para a Autora uma facturação de €151.765,14 em 2019.
i) A Autora deixou de lucrar com tal negócio, em 2020 e pelo menos, €151.765,14.
j) Valor este que não facturou em 2020 ao seu cliente The Navigator Company, S.A. pelo facto de não poder embarcar a mercadoria desta sociedade para aquele mercado.
k) Para que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixasse de bloquear os embarques da Autora para o médio oriente, as partes ajustaram o acordo referido nos factos provados n.ºs 57-60.
l) A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. entregou os contentores deslocados ao respectivo destinatário no porto de destino.
m) O bill of lading foi entregue ao destinatário, endossado pela Ré.
*
3.2. – APRECIAÇÃO DO MÉRITO DO RECURSO
3.2.1. Da Impugnação da Matéria de Facto
Dispõe o art.º 640º do CPC:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. […]”
Em sede de impugnação da decisão sobre a matéria de facto o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões.
Fundando-se a impugnação em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados (existem três tipos de meios de prova: os que constam do próprio processo – documentos ou confissões reduzidas a escrito -; os que nele ficaram registados por escrito – depoimentos antecipadamente prestados ou prestados por carta, mas que não foi possível gravar -; os que foram oralmente produzidos perante o tribunal ou por carta e que ficaram gravados em sistema áudio ou vídeo), o recorrente deve especificar, na motivação, aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos.
O recorrente deve consignar, na motivação do recurso, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que se integra no ónus de alegação e destinada a evitar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente.
De notar que a imposição da síntese final exerce a função de confrontar o recorrido com o ónus de contra-alegação, no exercício do contraditório, evitando a formação de dúvidas sobre o que realmente pretende o recorrente – cf. António Abrantes Geraldes, op. cit., pág. 142, nota 228.
O vertido no art.º 640º do CPC torna possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação e um ónus secundário, que visa não tanto fundamentar e delimitar o recurso, mas possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida – cf. acórdão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-10-2015, processo n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1[4].
A recorrente impugna os factos provados sob os pontos 40., 41. e 52., propondo a decisão que pretende que recaia sobre os factos neles vertidos e os factos considerados não provados sob as alíneas a) a d), f) a h), j) e k), que considera que deveriam ter sido dados como provados, aduzindo ainda a pretensão de ser aditado o facto alegado no artigo 39º da petição inicial.
Ora, como se retira do acima expendido, os requisitos do ónus impugnatório cingem-se à especificação dos pontos de facto impugnados, dos concretos meios de prova convocados, da decisão que, no entender do recorrente, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, com expressa indicação das passagens dos depoimentos gravados em que se funda o recurso (cf. alínea a) do n.º 2 do art.º 640º do CPC).
Em face do conteúdo das alegações e conclusões da recorrente deve reconhecer-se que esta cumpriu o ónus impugnatório e respectivos requisitos que sobre si impendia, impondo-se, assim, reapreciar os factos que foram objecto da sua impugnação.
Há que analisar os documentos existentes nos autos e os depoimentos prestados em audiência, indicados pela recorrente a propósito dos pontos impugnados, em confronto com a restante prova produzida, para verificar se tal factualidade deveria merecer decisão em consonância com o preconizado pela apelante, ou se, ao invés, aquela não merece censura, atenta a fundamentação aduzida pelo Tribunal a quo.
Ponto 40. dos Factos Provados
O Tribunal a quo julgou provado o seguinte facto:
“40. Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe o rápido levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos, argumentando que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. já não lhe estava a aceitar novos transportes.”
E fundamentou a sua convicção nos seguintes termos:
“Os factos provados n.ºs 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43 e 44 fundaram-se na admissão por acordo da realidade vertida nos art.ºs 31.º a 42.º da petição inicial, atenta a afirmação contida no art.º 12.º da contestação, embora sujeita à contextualização decorrente do teor dos documentos de fls. […] 34 anverso – 44 verso [e-mails trocados entre 22-05-2018 e 30-08-2018, 14-10-2019 e 29-10-2019 e 05-11-2018 entre Autora, Ré, MSC – Mediterranean Shipping Company e Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd nos termos dos quais a segunda solicitou à quarta o rápido levantamento dos contentores ajuizados, a quarta comprometeu-se a resgatar os ditos módulos de carga a breve trecho, a primeira insistiu junto da segunda e da quarta pela retirada urgente das unidades em apreço e salientou que a conta de estadias estava a engrossar diariamente e a segunda comunicou à primeira que a quarta não pretendia abandonar a carga, sendo que a terceira foi sendo mantida a par das comunicações em apreço (nelas figurando por diversas vezes a testemunha DM e que nas expedidas/remetidas pela primeira intervieram o legal representante da Autora e/ou a testemunha FL)], das declarações de parte do legal representante da Autora e dos depoimentos das testemunhas FL, IC, JS e DM”
A autora/apelante sustenta que este facto não podia ser dado como provado, invocando o conteúdo da troca de correspondência a que se alude na decisão, de onde decorre que a solicitação efectuada pela ré à sua cliente foi apenas que a informasse sobre o estado de vários contentores, parqueados em portos do Vietname, entre os quais os 10 aqui em causa e não que procedesse ao seu rápido levantamento, até porque, como resulta do ponto 32., em 16 de Julho de 2018, a ré solicitou nova rectificação do conhecimento de embarque quanto ao consignatário; mais refere que apenas na mensagem de correio electrónico enviada pela ré ao cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, em 22 de Maio de 2018, é mencionado, em nota, que aquela necessitava de uma carta urgente de autorização da MSC Vietname dizendo que poderiam carregar, porque nessa data a MSC não estaria a permitir quaisquer reservas por causa de tantos contentores não levantados no Vietname, sendo que isso não foi referido em nenhuma outra mensagem de correio electrónico, nem foi mencionado pelas testemunhas, remetendo para as mensagens de 7 e 25 de Junho de 2018 e 22, 23, 24, 28 e 29 de Agosto de 2018, concluindo que deveria ser dado como provado o seguinte: “Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe que a informasse sobre o estado relativo ao levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos.”
A ré/recorrida pugna pela manutenção da redacção do ponto 40. remetendo para o conteúdo do documento n.º 38 junto com a petição inicial, de onde resulta o envio de dezassete comunicações da ré à cliente Hoahg Ming Phat insistindo no levantamento dos contentores, para além do que o argumento mencionado consta do teor da mensagem de 22 de Maio de 2018; refere ainda que da mensagem de 18 de Março de 2018, enviada pela ré à autora, e retira que esta não tinha actualizado o destinatário da mercadoria, o que causou dificuldades no seu levantamento, que lhe são imputáveis, o que é suportado pelo depoimento das testemunhas FL, IC e JS
O facto vertido no ponto 40. do elenco da matéria de facto provada emerge, conforme se pode descortinar do teor das peças processuais, do alegado pela autora no artigo 40º da sua petição inicial, com a seguinte redacção: “Aliás, na sequência de tais e-mails, a R. ECOMODUS, junto da R. HOAHG MING PAHT, IMPORT EXPORT CO.LTD, ao que parece, também importadora da mercadoria, no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, indaga sobre a situação de vários contentores parqueados naquele terminal e solicita o seu rápido levantamento, conforme decorre da troca de correspondência que ora se junta sob o nr 38 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.”
Daqui decorre que é a própria autora, ora apelante, quem afirma, desde logo, face ao conteúdo daquela troca de correspondência, que a ré terá solicitado ao seu cliente o “rápido levantamento” dos vários contentores parqueados no terminal do porto de Haiphong, afirmação contra a qual ora se vem insurgir.
De todo o modo, cumpre analisar o conteúdo da troca de correspondência em que o Tribunal recorrido se louvou para dar como provado o vertido no ponto impugnado e que emerge do conteúdo do documento n.º 38 junto com a petição inicial[5], podendo constatar-se a seguinte troca de correspondência
--> Mensagem de correio electrónico de 22 de Maio de 2018 às 17:09 enviada pela colaboradora IC para AM, da Eco-Modus e para a sua cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear Sir
We just have been informed that at the moment that you have 32 containers from EcoModus stopped in Vietnam terminal ports.
Please check complete list:
IRO 2510 -2xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
IRO 2518- 5xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
IRO 2521-5xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
IRO 2550-10xcnts-PMai-MSC
IRO 2560-1xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-MSC
IRO 2610-2xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-Cosco
IRO 2614-7xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
And arriving very soon you have 14 more containers from EcoModus
IRO 2615-5xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-MSC –ETA HAIPHONG 26/05/2018
IRO 2624-2xcnts-Trinh Nghien Jcs Company- MSC –ETA HAIPHONG 26/05/2018
IRO 2634-5xcnts-MaiT-MSC-ETA CAT LAI 26/05/2018
Note: We need to have an authorization letter urgently from MSC Vietnam saying that we can load. Because at this moment MSC is not giving EcoModus any bookings because of so many containers unpicked at Vietnam…”[6]
--> Mensagem de correio electrónico de 23 de Maio de 2018 às 09:41 enviada pela cliente à colaboradora da ré IC:
“Dear Madam,
We will pick up the containers as follow:
IR02510 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => will pick up in this week
IR02518 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => was picked up
IR02521 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => was picked up
IR02550 -10x cnts - PMai - MSC => will pick up in Thursday this week
IR02560 - 1x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC => will pick up in Thursday this week
IR02610 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - Cosco => will pick up in Thursday this week
IR02614 - 7x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC => will pick up in Thursday this week
IR02615 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 => We checked ETA
HAIPHONG: 03/06/2018
IR02624 - 4x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 => We checked ETA
HAIPHONG: 03/06/2018
IR02634 - 5x cnts - MaiT - MSC - ETA CAT LAI 26/05/2018 => => We checked ETA HAIPHONG: 23/05/2018
Hope to hear you soon…”[7][8]
--> Mensagem de correio electrónico de 23 de Maio de 2018 às 09:41 enviada pela cliente à colaboradora da ré, IC:
“Dear Madam,
Sorry has a mistake, we resend info pick up the containers as follow:
IR02510 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => will pick up in this week
IR02518 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => was picked up
IR02521 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => was picked up
IR02550 - 10x cnts - PMai - MSC => will pick up in Thursday this week
IR02560 - 1x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC => will pick up in Thursday this week IR02610 - 2x
cnts - Trinh Nghien Jcs Company - Cosco => will pick up in Thursday this week IR02614 - 7x cnts - Trinh
Nghien Jcs Company - MSC => will pick up in Thursday this week
IR02615 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 => We checked ETA HAIPHONG: 03/06/2018
IR02624 - 4x cias - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 —> We checked ETA HAIPHONG: 03/06/2018
IR02634 - Sx cnts - MaiT MSC - ETA CAT LAI 26/05/2018 => => We checked ETA CAT LAI: 23/05/2018
Hope to hear you soon…”[9]
--> Mensagem de correio electrónico de 7 de Junho de 2018, enviada às 12:26 pela ré à sua cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear All
Please update us about loads in Vietnam waiting to be picked up. We need confirmed dates as the last ones were not the real ones. I’ve checked in the system and all containers mentioned are still stocked in the port.
Please answer us about:
Containers in Haiphong Ports
IRO2550+IRO 2551-10xcnts-PMai-MSC
IRO2615-5xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
IRO2624-4xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
Containers in Cat Lai Port – 17X40’HC
IRO2510-2xcnts-Tring Nghien Jcs Company-K-Line
IRO2560-1xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
IRO2610-2xcnts-Tring Nghien Jcs Company-Cosco
IRO2614-7xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
IRO2634-5xcnts-MaiT-MSC-
Awaiting your earliest reply…”[10]
--> Mensagem de correio electrónico de 25 de Junho de 2018, enviada às 15:42 por AM, da ré à cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear Madam
Pls see as follow:
Containers in Haiphong Port- 19x40’HC
IRO2550+IRO2551-10Xcnts-Phung Mai-MSC=»Wednesday next week
IRO 2615- 5Xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC=» Mr T... will payment 70% balance on Tuesday or Wednesday next week
IRO2624- 4Xcnts - Tring Nghien Jcs Company-MSC=» Wednesday next week 18
Containers in Cat Lai Port- 17X40’HC :
IRO2510-2Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- K-Line=»Thursday next week
IRO2560-1Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- MSC=»Thursday next week
IRO2610-2Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- Cosco=»Thursday next week
IRO2614-7Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- MSC=»Wednesday next week
IRO2634-5Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- MSC=»Wednesday next week
Pls revised BL of IRO2615&IRO2624 and check mail we requested revised today.
Hope to hear you soon…”[11].
--> Mensagem de correio electrónico de 22 de Agosto de 2018, enviada às 13:21 pela colaboradora da ré, IC, à cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear T...
We are sending a resume of all the contracts which we are waiting an update from your side.
Please note that a solution is needed urgently since some of this containers have been at destination port for a quite long time now.
We have all the shipping lines and forwarders pushing us for an answer about when are this containers being cleared.
Please update each contract bellow accordingly:
Client: Mr K…
Material: PS Yogurt
• lR02384 —1 x cnt — BL 592710013772
• IR02562—1 x cnt—BL62768
• IR02564—3 x cnt — EL MSCU0T735328
• IR02574 —1 x cnt — BL 592810002152
Client: Mr T...
Material: PS Yogurt 20
IR02510 —2 x cnt — BL KKLULEH174806
lR02560 —1 x cnt — BL MSCUKQ318004
IR02590 —2 x cnt — BL C0SU4515845630
1R02610 —2 x cnt — BL C0SU4515864820
Material: LDPE FILM
lR02550 + lR02551 — l0x cnt — Rb MSCUKQ2962S9
lR02561- 5x cnt — BL MSCUKQ318475
IR02565—5 x cnt — BL MSCUKQ322OB9
IR02614 —7x cnt — BL MSCUKQ3633P7
lR02615 —5 x cnt — BL MSCUKQ385425
lR02624 —4 x cnt — BL MSCUKQ386225
IR02634-5 x cnt — BL MSCUJKQ386241
Material: PP BB
IR02663 —2 x cnt — BL YMLUR570011703
IR02664 —2 x cnt — BL YMLUJR570011812
TOTAL Nº CNTS: 58
Waiting for your earliest reply and update about all files.
Many Thanks”[12]
--> Mensagem de correio electrónico de 23 de Agosto de 2018, enviada às 12:38 pela colaboradora da ré, IC, à cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear T…,
Waiting for your reply.
Mr. K… is asking us now to change consignee of one BL. Is that correct? Which one and pls send me all the correct consignee information so I can request the change urgently.”[13]
--> Mensagem de correio electrónico de 24 de Agosto de 2018, enviada às 14:17 pela colaboradora da ré, IC, à cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear T…,
We really need your update and solution for all bellow contracts. It’s very urgente.”[14]
--> Mensagem de correio electrónico de 28 de Agosto de 2018, enviada às 11:42 pela colaboradora da ré, IC, à cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear T...,
Thank you for your update. IR02610 is finished and out.
I’m updating list below. We still have many contracts/containers at the port and we need a reply from you about each one of them.
Please reply asap about yours and Mr K… containers:
Client: Mr K…
Material: PS Yogurt
lR02384-1 x cnt-BL 592710013772
IR02562-1 x cnt-BL62768
lR02564-3 x cnt-BL MSCU0T735328
lR02574-1 x cnt-BL 592810002152
Client: Mr T…
Material: PS Yogurt
lR02510-2 x cnt-BL KKLULEH174806
IR02560-1 x cnt-BL MSCUKQ318004
IR02590-2 x cnt-BL C0SUJ451584563024
MateriaL LDPE FILM
IR02550+IR02551-10 x cnt-BL MSCUKQ296259
IR02561-5 x cnt-BL MSCUKQ318475
IR02565-5 x cnt-BL MSCUKQ322O89
1R02614-7 x cnt-BL MSCUKQ363307
IR02615-5 x cnt-BL MSCUKQ385425
IR02624-4 x cnt-BL MSCUKQ386225
IR02634-5 x cnt-BL MSCUKQ386241
Material: PP BB
IR02663-2 x cnt-BL YMLUR570011703
IR02664-2 x cnt-BL YMLUR570011812
TOTAL Nº CNTS: 56 ….”[15]
--> Mensagem de correio electrónico de 29 de Agosto de 2018, enviada às 10:24 PM pela colaboradora da ré, IC, à cliente Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd.:
“Dear T…,
We still don’t have any reply from you regarding our contracts situation. This is very urgent and is very stressful not getting and reply from you.
Two days ago you sent email saying that IR02510 was going to be picked up that day (28/08/2018) but we have checked today and is still at the port.
Please give us some update urgently.
TOTAL Nº CNTS: 56
Many Thanks….”[16]
Da leitura das mensagens supra transcritas verifica-se, ao contrário do que sustenta a apelante, que não só a ré solicitava informação sobre o estado dos diversos contentores depositados em terminais de portos no Vietname, como manifestava a urgência na solução dessas diversas situações. Aliás, como se referiu, a própria autora mencionou que era pretensão da ré o rápido levantamento destes contentores, como se pode verificar das listagens constantes das mensagens de correio electrónico de 22 e 23 de Maio, 7 e 25 de Junho de 2018, onde se alude aos contentores IR02550 e IR02551 referidos em 7.. Além disso, para além da nota apontada pela recorrente constante da mensagem de 22 de Maio de 2018 – onde expressamente se refere que a MSC não está a aceitar reservas relativamente à Eco-Modus devido à quantidade de contentores não recolhidos no Vietname -, menciona posteriormente, na mensagem de 22 de Agosto de 2018, que as companhias de navegação e transitários estão a pressionar no sentido da recolha da mercadoria existente nos contentores depositados nos terminais, sendo sucessivamente referida a urgência na solução desta questão.
Por outro lado, certo é que esta insistência por parte da ré junto do seu cliente não foi, de facto, abordada pelas testemunhas, até porque, sendo funcionárias da autora e da MSC, não terão tido conhecimento da troca de correspondência em causa (nela não figurando como estando em conhecimento), mas não deixaram de mencionar - em concreto, as testemunhas FL, gestor comercial na empresa autora, desde há cerca de 15 anos, sendo quem fazia a gestão do cliente Eco-Modus, Lda., a nível comercial e JS, também funcionário da autora, há cerca de 10 anos, então na área operacional -, que se verificou a dificuldade de levantamento da mercadoria no destino, que os contentores permaneciam no terminal e que a MSC os estava a pressionar para a solução da questão, o que transmitiram à aqui ré.
Assim, quanto a esse segmento do ponto 40. nada há a alterar.
No que diz respeito ao argumento utilizado de que a MSC não estava a aceitar novos transportes, ainda que não tenha sido mencionado em toda a correspondência trocada, não deixou de ser expressamente referido na mensagem de 22 de Maio de 2018, pelo que se procederá à introdução dessa especificação na redacção do ponto 40., que passará a ser a seguinte:
“40. Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe o rápido levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos, referindo, designadamente na mensagem de 22 de Maio de 2018, que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. já não lhe estava a aceitar novos transportes.”
Ponto 41. dos Factos Provados
O Tribunal recorrido deu como provado o seguinte:
“41. Em resposta, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. comprometeu-se sempre a levantar todos os contentores nos dias seguintes aos da expedição dos e-mails que ia remetendo à Ré Eco-Modus.”
Este facto encontra-se fundamentado do modo constante da passagem da decisão recorrida supra transcrita.
A apelante entende que não poderia ter sido dado como provado com a redacção nele vertida, porquanto não resulta da correspondência (documento n.º 38 junto com a petição inicial), que a cliente se tenha comprometido a levantar todos os contentores nos dias seguintes ao da expedição das mensagens de correio electrónico, mas apenas que esta prestava informação sobre os contentores já levantados e os que iriam ser levantados, remetendo para o conteúdo das mensagens de 23 de Maio, 25 de Junho e 22, 23, 24 e 30 de Agosto de 2018, pelo que a redacção deste ponto deveria ser a seguinte: “Em resposta, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. dava nota sobre o estado de levantamento dos contentores da ré Eco-Modus, informando-a das respectivas datas de levantamento.”
Relativamente ao conteúdo deste ponto 41., embora a sua redacção possa dar azo a uma interpretação dissonante, depreende-se que o Tribunal terá querido afirmar que a Hoahg Ming Phat, Ltd. foi respondendo às mensagens de correio electrónico que lhe eram dirigidas pela ré e referidas em 40., assegurando que iria levantar os contentores.
No entanto, como refere a apelante, como se pode retirar designadamente do conteúdo das mensagens de 23 de Maio de 2018 e 25 de Junho de 2018 acima reproduzidas, a cliente da ré foi referindo, relativamente aos diversos contentores estacionados no terminal do porto, que alguns teriam sido já levantados, outros seriam levantados durante aquela semana e identificava, designadamente, dias concretos da semana em que a recolha sucederia, referindo, quanto a outros, como data para o levantamento, a próxima quinta dessa semana (que, aliás, seria o dia 24 de Maio de 2023, ou seja, o dia seguinte, embora esta referência não se reporte aos contentores em questão nestes autos), mas verificando-se que em 25 de Junho estes concretos contentores (referidos em 7.) ainda se encontravam por recolher, indicando-se uma data próxima (quarta-feira da semana seguinte), assim como em 22 e 28 de Agosto de 2018 estavam, estes e outros, por recolher.
Parece que aquilo que se pretendeu dar como provado é que a cliente nunca quais abandonar os contentores e sempre assegurou que os iria levantar (como resulta, aliás, dos pontos 42. e 44.), o que, de facto, se pode retirar do conteúdo das mensagens em questão.
Assim, a redacção do ponto 41. passará a ser a seguinte:
41. Em resposta a tais mensagens, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. comunicava que iria proceder ao levantamento dos contentores, indicando, para o efeito, os dias seguintes às mensagens enviadas, designadamente, quanto aos contentores identificados em 7..
Ponto 52. dos Factos Provados
O Tribunal recorrido deu como provado o seguinte:
“52. A Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. – directamente ou por intermédio da Ré Eco-Modus – sempre prometeu à Autora o levantamento dos referidos dez contentores.”
O que fundamentou do seguinte modo:
“Os factos provados n.ºs 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51 e 52 fundaram-se na admissão por acordo da realidade vertida nos art.ºS 31.º a 42.º da petição inicial à luz da não impugnação dos factos em apreço que se retira a contrario sensu da afirmação contida no art. 51.º da contestação, enquadrada pelos documentos de fls. 45 anverso (e-mail remetido em 21-02-2020 pela testemunha DM ao legal representante da Autora e à testemunha FL, informando-os de que o consignatário se encontrava sob investigação por parte da Alfândega e Polícia Vietnamitas, razão pela qual a mercadoria teria de ser destruída, para além de que lhe comunicou os custos de imobilização e parqueamento dos contentores em apreço e da destruição da carga), 46 anverso (e-mail remetido pela MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. ao legal representante da Autora e à testemunha FL, dando conta de que a mercadoria foi destruída e os contentores devolvidos ao parque), 46 verso – 47 anverso (missiva datada de 15-09-2020 remetida pela testemunha DM à Autora na qual a primeira responsabilizou a segunda pelas despesas de destruição da mercadoria e imobilização, armazenagem, reparação e limpeza dos contentores abrangidos pelo bill of lading MSKUKQ296259, tendo computado tais gastos em USD 306 449,97 e solicitado o respectivo pagamento no prazo de dez dias) e 34 anverso – 44 verso [e-mails trocados entre 22-05-2018 e 30-08-2018, 14-10-2019 e 29-10-2019 e 05-11-2018 entre Autora, Ré, MSC – Mediterranean Shipping Company e Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd nos termos dos quais a segunda solicitou à quarta o rápido levantamento dos contentores ajuizados, a quarta comprometeu-se a resgatar os ditos módulos de carga a breve trecho, a primeira insistiu junto da segunda e da quarta pela retirada urgente das unidades em apreço e salientou que a conta de estadias estava a engrossar diariamente e a segunda comunicou à primeira que a quarta não pretendia abandonar a carga, sendo que a terceira foi sendo mantida a par das comunicações em apreço (nelas figurando por diversas vezes a testemunha DM e que nas expedidas/remetidas pela primeira intervieram o legal representante da Autora e/ou a testemunha FL)], bem como pelas declarações de parte do legal representante da Autora e os depoimentos das testemunhas FL, JS e DM.”
Relativamente a este ponto, entende a apelante que a documentação junta não permite afirmar que a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd lhe tenha prometido o que quer que seja quanto ao levantamento dos contentores, pois estão em causa mensagens trocadas apenas entre a recorrida e aquela sua cliente, não figurando a recorrente em qualquer delas como destinatária ou em cópia, para além de do seu conteúdo não se extrair qualquer promessa de levantamento; na mensagem de 14 de Outubro de 2019 (documento n.º 19 junto com a petição inicial) enviada pelo senhor T…, da Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. à ré, a autora figura em cópia, na pessoa do seu gerente e do seu funcionário FL, mas dela não resulta qualquer promessa de levantamento dos contentores, mas apenas que os levantaria em breve; assim como da mensagem de 29 de Outubro de 2019 (documento n.º 40), dirigida pela recorrente ao senhor T…, nada aponta no sentido afirmado; da mensagem de 5 de Novembro de 2019, dirigida pela ré à autora, apenas se extrai que a primeira iria falar com o senhor T… no dia seguinte e que este a tinha informado que iria à MSC Vietname novamente, dizendo que não queria abandonar a mercadoria. Conclui que tal facto deve ser dado como não provado.
A recorrida refere que não se mostra junto aos autos um qualquer documento atinente a uma mensagem de 31 de Outubro de 2019, como documento nº 40, figurando porém o documento n.º 39, que é uma mensagem de 14 de Outubro de 2019, em que a cliente da ré a informa que tomará conta dos contentores, que serão levantados brevemente, o que também resulta do conteúdo do documento n.º 38 e do depoimento das testemunhas DM, FL e JS.
A troca de mensagens constante do documento n.º 38 junto com a petição inicial e que acima se mostram transcritas e foram já analisadas permite verificar que a cliente da ré, através do senhor T…, foi sempre indicando, entre Maio e Agosto de 2018, que pretendia levantar todos os contentores, incluindo os aqui em discussão, informando sucessivas datas para o efeito, mas sem que haja notícia sobre se o seu conteúdo foi transmitido à autora.
De todo o modo, é possível verificar no documento n.º 39 junto com a petição inicial[17] o envio, em 9 de Outubro de 2019, de uma mensagem de correio electrónico da ré para a autora e para a MSC, com conhecimento também à cliente daquela, informando que esta não quer abandonar os contentores, a que o senhor T... responde, por mensagem de 14 de Outubro de 2019, com conhecimento à autora e à MSC, com o seguinte teor: “all container hai phong I will take care so pick up out soon. I being discuss money with government. Will pick up soon”[18]
Por sua vez, no documento n.º 40[19] consta uma mensagem de 29 de Outubro de 2019, de FL, funcionário da autora, para o seu gerente e para o senhor T..., com conhecimento à ré, solicitando novidades, a que o referido T... responde, em 31 de Outubro de 2019, às 01.08, dizendo não existirem novidades, ao que o gerente da autora reage, nessa mesma data, às 09:02, afirmando não ser essa uma resposta aceitável, insistindo na necessidade de um acordo e solução para a situação dos custos que continuam a aumentar, e cuja responsabilidade imputa à ré e à empresa do senhor T....
Em nova mensagem de 5 de Novembro de 2019, dirigida pela autora à ré, aquela insiste na necessidade de solução deste problema, devendo o T... chegar a um acordo com a MSC no destino, dando conta que a situação está a prejudicar a autora na fase de concursos e tenders em que precisam do apoio da MSC, a que a ré responde (AM), nessa data, referindo que iria falar com o T..., que insiste em não querer abandonar a carga.
Daqui se extrai que, independentemente de se qualificar como “promessa”[20], a cliente da ré, Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, seja perante a própria ré, seja através desta perante a autora, afirmou diversas vezes que iria proceder ao levantamento da carga (10 contentores), tendo sido reportada a informação de que o destinatário não a queria abandonar, que estava a tentar proceder ao levantamento, e foi indicando datas para o efeito, mas esse levantamento não chegou a ter lugar (como resulta dos factos vertidos nos pontos 45. a 47.).
Por sua vez, a testemunha FL referiu que estiveram sempre em contacto com a ré, dando-lhe conta de todas as missivas da MSC a informar do que se passava no destino, tendo recebido daquela a informação que o cliente não ia abandonar a carga e que o assunto iria ser resolvido, ou seja, foi assegurado perante a ré e, através desta, perante a autora, a manutenção de interesse na carga (cf. minuto 4.00 e seguintes do seu depoimento).
Também a testemunha DM, funcionário da MSC Portugal, disse que os contentores chegaram ao destino, onde ficaram muito tempo por levantar, “sempre com indicações por parte do consignatário no Vietname e aqui na origem por parte da ré, que os contentores seriam levantados e a mercadoria levantada”, mas acabou por ser destruída, por imposição das autoridades locais, acrescentando que numa reunião entre a autora, a ré e a MSC, a segunda indicou que o senhor T..., da parte do consignatário, tinha interesse em levantar os contentores e que a situação seria resolvida, o que este confirmou através de uma chamada telefónica, efectuada em voz alta (cf. minutos 3.00 e 7:28 e seguintes do seu depoimento).
Daqui decorre que, ao contrário do que parece pretender a apelante, foi demonstrado que a cliente da ré sempre foi assegurando que os contentores seriam levantados.
Contudo, para melhor esclarecimento do ponto, a sua redacção passará a ser a seguinte:
52. A Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., por intermédio da ré Eco-Modus, foi assegurando à autora que procederia ao levantamento dos referidos dez contentores.
Da alínea a) dos Factos Não Provados
O Tribunal recorrido deu como não provado o seguinte:
“a) Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS, para poderem ser transportados para a China.”
Que fundamentou do seguinte modo:
“Os factos não provados nas als. a) e b) resultaram assim porquanto os mesmos suportaram-se em documentos que não reflectem a realidade que se pretendia assentar: o primeiro e-mail que a Ré remeteu à Autora com a data de carregamento dos contentores a carregar nos fornecedores JDT e AS SMS remonta a 04-01-2018 (fls. 10) […]”
A autora/recorrente insurge-se contra o facto assim dado como não provado, desde logo porque alega que este foi aceite, sem reservas, pela ré, no artigo 12º da sua contestação e porque esta confirmou, por mensagens de 10 e 11 de Janeiro de 2018, as datas que já tinha transmitido à apelante para os cinco contentores.
A ré/recorrida refere que a data dos carregamentos dos contentores dos fornecedores JDT e AS SMS remonta a 4 de Janeiro de 2018.
Atente-se que sob os pontos 4. a 6. ficou provado o seguinte:
4. Em 4 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou à Autora cinco contentores para carregar desperdício de plástico com destino a Ho Chi Mingh-CAT LAI e pediu 14 dias de free time no que respeita à demoras e imobilizações dos mesmos no destino.
5. Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS para poderem ser transportados para o Vietname.
6. Em 11 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus comunicou à Autora as datas nas quais os restantes cinco contentores deveriam ser carregados no seu fornecedor SAICANATUR para poderem ser transportados para o seu destino final.
Conforme resulta da fundamentação da decisão de facto, aquilo que o tribunal recorrido quis verter como matéria não provada é que não foi em 10 de Janeiro de 2018 que a ré comunicou as datas em que os primeiros contentores seriam carregados junto daqueles fornecedores, porquanto tal já havia sido comunicado em 4 de Janeiro de 2018, conforme resulta do documento n.º 3 junto com a petição inicial[21], o que, porém, confirmou a 10 de Janeiro de 2018.
Aliás, note-se que no ponto 5. ficou provado, precisamente, essa indicação de datas para os primeiros cinco contentores, com destino ao Vietname, que não à China (conforme, crê-se que por lapso, foi referido no artigo 5º da petição inicial).
Assim, o facto manter-se-á inalterado apenas porque, no confronto com o ponto 5. dos factos provados, aquilo que dele se extrai é que não foram comunicadas datas, para carregamento dos primeiros cinco contentores, com destino à China.
Alínea b) dos Factos Não Provados
O Tribunal recorrido deu como não provado o seguinte:
“b) Por e-mail datado de 4 de Julho de 2018, a Autora responsabilizou a Ré Eco-Modus pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e solicitou o urgente levantamento dos referidos módulos de carga.”
Com a seguinte fundamentação:
“Os factos não provados nas als. a) e b) resultaram assim porquanto os mesmos suportaram-se em documentos que não reflectem a realidade que se pretendia assentar: […] o e-mail de 04-07-2018 (fls. 33 verso) é omisso relativamente a qualquer responsabilização da Ré pelo pagamento da conta de estadias e depósito dos módulos transportados ao abrigo do bill of lading MSKUKQ296259 ou interpelação para o seu levantamento urgente. Aliás, a dita responsabilização é desmentida pelo e-mail que a Autora remeteu à MSC – Mediterranean Shipping Company no dia 23-07-2018 (de fls. 32 anverso, em data posterior ao de 04-07-2018), já que nele a primeira refere expressamente que à Ré não podem ser imputados os custos das paralisações dos contentores, sendo que a testemunha FL não conseguiu explicar de modo convincente por que razão a sua empresa mudou de opinião, a ponto de ter intentado a presente acção.”
Considera a recorrente que o Tribunal recorrido não efectuou uma correcta interpretação das mensagens de correio electrónico, em concreto, a mensagem de 23 de Julho de 2018, de que não resulta que a autora não tenha querido responsabilizar a ré pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores, pois que a alertou precisamente para os montantes em dívida, para além de dever ser conjugada com a de 20 de Julho de 2018, onde informa a ré que a transportadora, a MSC, a estava a responsabilizar pelas paralisações e storages dos contentores e, nessa sequência, a ré informa o cliente que a MSC o está a responsabilizar por esse pagamento, sendo que se não pretendesse responsabilizar a ré, esta não teria sentido necessidade de alertar o cliente para esse facto.
Pretende que seja aditado aos factos provados o seguinte: “Por e-mail datado de 4 de Julho de 2018, a Autora responsabilizou a Ré Eco-Modus pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e solicitou o urgente levantamento dos referidos módulos de carga.”
A recorrida sustenta que a apelante indicou expressamente, na mensagem de 23 de Julho de 2018, que os custos não podiam ser imputados à ré, o que não foi sequer explicado cabalmente pela testemunha FL; não existiu uma qualquer forma de responsabilização da Eco-Modus, que nunca reconheceu qualquer responsabilidade na paralisação dos contentores, que recaía inteiramente sobre a apelante.
Na sua petição inicial a autora alegou que, face à demora no levantamento dos contentores, foi sendo notificada pela MSC para o custo da estadia diária no terminal do porto e que disso foi dando conta à ré, tendo afirmado, no artigo 39º do seu articulado inicial, que por essas imobilizações e parqueamentos “as rés são totalmente responsáveis e pelos quais, desde logo, a A. as responsabilizou, solicitando o urgente levantamento dos contentores, conforme decorre, entre outros, do e-mail datado de 4 de Julho de 2018”.
Com efeito, na mensagem de correio electrónico que a autora (FL) dirigiu à ré (AM, IC), com data de 4 de Julho de 2018, refere aquela o seguinte: “Após a resolução dos 13 contentores, Continuamos com um problema com o MSCUKQ296259 favor note em anexo carta recebida da MSC. Notar que o valor já vai em USD 37.149,00 de demurrage/USD 3180,00 de Storage. Necessitamos que verifiquem esta situação com urgência.[22]
Consta também a missiva da MSC dirigida à autora, com data de 2 de Julho de 2018, em que a informa dos valores das despesas que aumentam diariamente, sendo então USD 37,149.00 relativos a imobilização e USD 3,180.00 relativos a armazenagem.
Em 20 de Julho de 2018, às 14:08, FL (funcionário da autora) enviou uma mensagem de correio electrónico à ré, sob o assunto IR02550 + IR02551, dando conta do seguinte: “Necessito que me envie a licença de importação do consignee para enviarmos para a Linha. Notar que a MSC está a responsabilizar-nos das paralisações e storage destes contentores no destino neste momento o valor é de 40.000 USD. Aguardo vossa informação” (documento n.º 31[23]) e nessa mesma data, a ré dirige uma mensagem ao seu cliente, com o seguinte conteúdo: “Shipping line is asking for all the valid licenses for this new consignee and they also stated that you have a bill of 40.000 usd at destiny regarding this contract number”.[24]
Em 23 de Julho de 2018, às 09:00, a ré reencaminha para a autora uma mensagem do cliente, contendo a nova licença e pedindo a revisão do BL quanto aos contentores em referência (documento n.º 32[25]).
Em 23 de Julho de 2018, às 10:53, a autora dirige à MSC, uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “Envio Licenças de importação do Consignee para vossa confirmação, notar que o consignee já esta em contacto com a MSC no destino. Note que o Orey não é responsável pelas paralisações destes contentores, a Ecomodus também não o é. A mercadoria está paga ao shipper. Favor enviar o Draft corrigido para que os contentores possam ser levantados…” (documento n.º 34[26]).
Não obstante na mensagem que dirige ao seu cliente, em 20 de Julho de 2018, a ré refira que a transportadora (MSC) dá conta que a Hoahg Ming Phat tem uma dívida referente a estes contentores, certo é que daí não decorre que a própria ré, a Eco-Modus, tivesse entendido que era responsável pelos custos da imobilização e do armazenamento ou sequer que a autora a estivesse a responsabilizar por isso, pelo que se depreende que se terá limitado a transmitir ao cliente os custos que a transportadora estava a cobrar com a estadia dos contentores e sua ocupação.
Por outro lado, na mensagem de 4 de Julho de 2018, a autora informa sobre o montante dos custos de demurrage e storage a essa data e pede que essa situação seja verificada com urgência, mas isso, por si só, não significa que esteja a responsabilizar a própria ré pelo seu pagamento e, posteriormente, na mensagem de 20 de Julho de 2018, refere apenas que a MSC a está a responsabilizar a si, ou seja, à autora, pelo pagamento desses custos.
Finalmente, em 23 de Julho de 2018, a autora envia à MSC a licença de importação e informa apenas que a própria e a ré Eco-Modus não são responsáveis pelas paralisações dos contentores.
Da conjugação destas mensagens não se pode retirar, tal como entendeu o tribunal recorrido, que a autora tenha comunicado à ré que a responsabilizava pelo pagamento dessas quantias, mas apenas que solicitou junto desta a promoção de diligências para resolver a situação dos contentores e da cobrança de valores diários pela sua permanência no terminal.
De igual modo, a testemunha FL, quando indagado sobre as mensagens de 4, 20 e 23 de Julho de 2018, não forneceu, efectivamente, qualquer esclarecimento adicional relativamente àquilo que nelas quis transmitir e menos ainda no sentido de a autora ter querido imputar à ré a responsabilidade pelo pagamento de tais custos, limitando-se a dizer que o que escreveu foi que nem a autora, nem a ré eram responsáveis por estes custos (cf. minuto 16:10 e seguintes do seu depoimento).
Assim, não se vislumbram razões para divergir da convicção formulada pelo Tribunal recorrido, mantendo-se inalterada alínea b) dos factos não provados.
Alíneas c) e d) dos Factos Não Provados
O Tribunal a quo deu como não provado o seguinte:
“c) Os dez contentores, por razões imputáveis à Ré Eco-Modus, nunca foram levantados no destino.
d) Os dez contentores, por razões alheias à Autora, nunca foram levantados no destino.”
Que fundamentou do seguinte modo:
“Os factos não provados nas als. c) e d) resultaram assim por terem natureza conclusiva e assumirem uma feição valorativa a respeito da responsabilidade pelo não levantamento dos contentores no porto de destino.”
Entende a apelante que estes factos deveriam constar dos factos provados, por, se assim não for existir contradição com o ponto 51. dos factos provados, onde se refere que a ré e a cliente não cuidaram de saber se o destinatário podia proceder ao desalfandegamento da carga.
A ré/apelada refuta tal pretensão referindo que a licença de importação foi obtida, pelo que não se lhe pode apontar falta de diligência, sendo que o risco de demurrage corria por conta da apelante, como decorre da interpelação para pagamento que a MSC lhe dirigiu.
O Tribunal recorrido fez inscrever tais enunciados na matéria de facto não provada referindo tratar-se de afirmações de natureza conclusiva, contendo um juízo de valor.
Tal como decorre do relatório supra, o presente litígio radica no apuramento sobre se o montante peticionado pela autora a título de custos que suportou com demurrage, storage, destruição de mercadoria e limpeza dos contentores deve ser suportado pela ré, expedidora da mercadoria, por não ter logrado, por si ou através do seu cliente (consignatário), proceder ao levantamento da carga em devido tempo, imputando-lhe essa responsabilidade no contexto do contrato que com ela celebrou.
Ora, afirmar, como se pretende, que os dez contentores nunca foram levantados por razões que são imputáveis à ré ou por razões que são alheias à autora, implica efectuar um juízo valorativo sobre a conduta das partes, que pode ser determinante para o juízo jurídico-subsuntivo essencial a efectuar e determinante para o desfecho da acção.
Nesta sede, aquilo que há que avaliar não é se ocorreu ou não um concreto facto, ou seja, sindicar a convicção formada pelo tribunal com base nas provas produzidas e de livre apreciação, mas avaliar se a matéria considerada como um facto provado reflecte, indevidamente, uma apreciação de direito por envolver uma “qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei, ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica” – cf. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil, Lex, 1997, pág. 312; cf. acórdão do Supremo Tribunal de 28-09-2017, processo n.º 659/12.6TVLSB.L1-S1[27].
Neste ponto, a jurisprudência tem entendido dever actuar o mecanismo anteriormente previsto no artigo 646º, n.º 4 do Código de Processo Civil revisto, que se mantém na nossa ordem jurídica, apesar de não figurar expressamente na lei processual vigente, posto que o art.º 607º, n.º 4 do actual CPC determina que devem constar da fundamentação da sentença os factos – e apenas os factos – julgados provados e não provados, o que significa que deve ser suprimida toda a matéria deles constante susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, conforme vem sendo aceite, engloba, por analogia, juízos de valor ou conclusivos – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-05-2012, processo n.º 240/10.4TTLMG.P1.S1 acima referido[28]; no mesmo sentido, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23-09-2009, processo n.º 238/06.7TTBGR.S1 e de 7-05-2009, processo n.º 08S3441.
Como é sabido, nem sempre é fácil distinguir entre o que é matéria de facto e matéria de direito, sendo, contudo, consensual, na doutrina e na jurisprudência, que, para efeitos processuais, tudo o que respeita ao apuramento de ocorrências da vida real é questão de facto e é questão de direito tudo o que diz respeito à interpretação e aplicação da lei.
A este propósito, refere-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7-05-2009, processo n.º 08S3441:
“No âmbito da matéria de facto, processualmente relevante, inserem-se todos os acontecimentos concretos da vida, reais ou hipotéticos, que sirvam de pressuposto às normas legais aplicáveis: os acontecimentos externos (realidades do mundo exterior) e os acontecimentos internos (realidades psíquicas ou emocionais do indivíduo), sendo indiferente que o respectivo conhecimento se atinja directamente pelos sentidos ou se alcance através das regras da experiência (juízos empíricos) […]
No mesmo âmbito da matéria de facto, como realidades susceptíveis de averiguação e demonstração, se incluem os juízos qualificativos de fenómenos naturais ou provocados por pessoas, desde que, envolvendo embora uma apreciação segundo as regras da experiência, não decorram da interpretação e aplicação de regras de direito e não contenham, em si, uma valoração jurídica que, de algum modo, represente o sentido da solução final do litígio.”[29]
Assim, a matéria de facto não pode conter qualquer apreciação de direito, seja qualquer valoração segundo a interpretação ou a aplicação da lei, ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica, devendo as questões de direito que constarem da selecção da matéria de facto considerar-se não escritas.
A proposição será conclusiva se exprimir uma valoração jurídico-subsuntiva essencial, caso em que deverá, por essa razão, ser expurgada.
As expressões “por razões imputáveis à ré” e “por razões alheias à autora” corporizam em si uma valoração sobre a conduta de uma e outra das partes, no contexto factual em discussão, contribuindo, por si só, para uma possível consequência jurídica que, ao invés de ser aferida em sede de apreciação jurídica da causa, resulta, de modo imediato, dos factos inscritos ou não inscritos como provados.
Assim, está em causa um juízo de valor que constitui uma conclusão que deverá ser retirada a partir de factos concretos objecto de alegação e prova que se integrem no thema decidendum, e que não deve figurar no elenco factual da decisão.
Como tal, improcede a pretensão da apelante de fazer transitar para os factos provados o vertido nas alíneas c) e d) dos factos não provados.
Alíneas f), g), h), j) e k) dos Factos Não Provados
O Tribunal recorrido deu como não provado o seguinte:
“f) Em face da não resolução da situação por parte da Eco-Modus, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. não revalidou a cotação relativa ao negócio de papel (Navigator) à Autora.
g) Tendo a Autora perdido o negócio de transporte de papel para o mercado do Médio-oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A..
h) Negócio esse que representou para a Autora uma facturação de € 151 765,14 em 2019.
j) Valor este que não facturou em 2020 ao seu cliente The Navigator Company, S.A. pelo facto de não poder embarcar a mercadoria desta sociedade para aquele mercado.
k) Para que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixasse de bloquear os embarques da Autora para o médio oriente, as partes ajustaram o acordo referido nos factos provados n.ºs 57-60.”
O que fundamentou da seguinte forma:
“Os factos não provados nas als. f), g), h), i), j) e k) fundaram-se nos documentos de fls. 86 anverso [e-mail remetido em 20-12-2019 pela MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. à Autora e no qual a primeira comunicou à segunda que “o negócio de Papel (Navigator) para 2020” ficava dependente da resolução da situação relativa à Ré durante o mês de Janeiro sob pena de não ser revalidada], 86 verso (extracto emitido pela Autora no qual consta a referência a diversas facturas alegadamente emitidas em 2019 em nome da The Navigator Company, S.A., bem como a alusão à MSC – Mediterranean Shipping Company), em toda a outra correspondência trocada entre a Autora e a MSC – Mediterranean Shipping Company e o acordo de transacção celebrado entre ambas, de fls. 87-88, bem como nas declarações do legal representante da Autora e no depoimento da testemunha DM.
O legal representante da Autora referiu que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., por causa dos contentores expedidos pela Ré e não levantados no destino pelo consignatário, “não revalidou a cotação relativa ao negócio de papel (Navigator) à Autora” no ano de 2020. Adiantou que nesse ano a Autora acabou por perder o negócio de transporte de papel para o mercado do médio oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A. há bastante tempo.
Sucede que o legal representante da Autora não convenceu.
Por um lado, a não revalidação da cotação referida no e-mail de fls. 86 anverso significa apenas que o preço “orçamentado” pela MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. para a realização dos transportes em apreço seria outro, daqui não se podendo inferir que eles não se realizaram efectivamente com a intervenção da Autora.
Por outro lado, se se exceptuar o sobredito e-mail de fls. 86 anverso, toda a demais correspondência trocada entre Autora e a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. e até o próprio “acordo de transacção” são omissos relativamente às consequências da situação criada em torno do transporte titulado pelo bill of lading MSKUKQ296259 sobre os outros negócios ajustados entre as partes (designadamente, para o médio oriente), inferindo-se daqui que elas foram nulas e que o relacionamento comercial das partes prosseguiu normalmente, embora com – pelo menos – um problema por resolver. Aliás, tanto foi assim que os contentores dos autos descarregaram no porto de destino em Março de 2018 e não foi por isso que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixou de negociar com a Autora os transportes “de papel” para durante todo o ano de 2019 (quando a conta de imobilização, e armazenagem já era bem significativa), a fazer fé no mencionado e-mail de fls. 86 anverso!
Mais, a não aceitação de mais cotações de transportes marítimos para o médio oriente, transmitida oralmente pela MSC – Mediterranean Shipping Company à Autora, ocorreu em data posterior a 15-09-2020, conforme logicamente se deduz dos factos provados n.ºs 48 e 49, o que apenas reforça a conclusão acima extractada de que a situação dos autos não se reflectiu nos outros negócios que as duas tinham ajustado uma com a outra.
Finalmente, a testemunha DM salientou que, embora não trabalhasse na área comercial da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., limitou-se a asseverar basicamente que apenas houve uma pressão por banda da sua empresa para resolver amigavelmente a situação e sem que tal se tivesse reflectivo no panorama global dos negócios celebrados com a Autora.
Não obstante, e mesmo que se tivesse dado como assente a perda do mencionado “negócio do papel”, certo é que a Autora jamais teria sofrido uma quebra de receita de, pelo menos, €151.765,14, a ter-se como verdadeiro o teor do extracto de fls. 86 verso, pois este refere-se antes a valores de facturação e não de lucro (que no caso seria constituído pela margem ganha em cada um dos fretes contratados).”
A recorrente insurge-se contra o assim decidido, considerando que tais factos deveriam ter sido dados como provados, pois que foram alegados no seu articulado superveniente e não impugnados pela ré, tal como não foram impugnados os documentos que os suportam; mais invoca o depoimento do seu legal representante, do qual resulta que o negócio do papel (com a The Navigator Company) para o mercado do Médio Oriente ocorreu sem a intervenção da autora, que nunca voltou a ganhar este negócio (cf. minuto 00:14:17 a 00:31.40 do seu depoimento); refere também que o único negócio em causa era o atinente ao transporte de papel para o Médio Oriente, sendo que durante o ano de 2019 o negócio se manteve, porquanto nesse período se mantinham as conversações para resolução da questão dos contentores, nem se podendo retirar dos factos descritos em 48. e 49. qualquer outra conclusão; quanto à facturação efectuada em 2019 com o negócio do transporte de papel, trata-se de facto não impugnado e resulta do documento nº 2 junto com o articulado superveniente e do depoimento de parte do legal representante da autora, que confirmou nada ter sido facturado em 2020, quanto a esse negócio, o que corresponde a uma quebra de receita, com a consequente perda de margem de lucro.
Pugna, assim, para que sejam aditados os seguintes factos à matéria provada:
. Em face da não resolução da situação por parte da Eco-Modus, a MSC-Mediterranean Shipping Company, S.A. não revalidou a cotação relativa ao negócio de papel (Navigator) à Autora.”
. Tendo a Autora perdido o negócio de transporte de papel para o mercado do médio oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A.”
. Negócio esse que representou para a Autora uma facturação de € 151 765,14 em 2019.
. Valor este que não facturou em 2020 ao seu cliente The Navigator Company, S.A. pelo facto de não poder embarcar a mercadoria desta sociedade para aquele mercado.
. Para que que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixasse de bloquear os embarques da Autora para o médio oriente, as partes ajustaram o acordo referido nos factos provados n.ºs 57-60.
A ré/recorrida pugnou no sentido da manutenção dos factos como não provados referindo ser desconhecida a facturação invocada pela apelante, para além do que, em resposta ao articulado superveniente, a ré impugnou a sua responsabilidade quanto aos lucros cessantes invocados pela autora, aderindo, no mais, à argumentação expendida pelo tribunal recorrido.
No que concerne à invocada admissão dos factos alegados pela autora no seu articulado superveniente por parte da ré, cumpre notar que, efectivamente, na resposta apresentada em 7 de Junho de 2021, esta se concentrou em pugnar pela não admissibilidade do articulado e alteração da causa de pedir e pedido nele vertida, não deixando, porém, de impugnar tudo quanto é peticionado a título de quantias que despendeu com o custo das despesas que foram cobradas pela MSC e com os valores que a autora teria deixado de auferir por não ter conseguido manter o negócio de transporte de papel para o Médio Oriente, reiterando a ré, no respectivo artigo 14º, tudo quanto alegou nos artigos 12º a 52º da contestação, de onde se pode retirar uma genérica impugnação dos concretos valores indicados pela recorrente e sua origem, pelo que não se podem dar tais factos como provados em virtude de uma qualquer admissão (cf. art.ºs 588º, n.º 4, 587º, n.º 1 e 574º, n.º 2 do CPC).
No que concerne ao facto vertido na alínea f) dos factos não provados não se acompanha a argumentação expendida pelo Tribunal recorrido, porquanto é evidente que aquilo que está em causa, nesta alínea, é apenas saber se a MSC revalidou ou não a cotação relativa ao negócio de papel.
Certo é que o documento n.º 1 – mensagem de correio electrónico enviada pela MSC para a autora, em 20 de Dezembro de 2019[30] - junto com o articulado superveniente, não assevera que a cotação não tenha sido revalidada, porquanto dele apenas se retira a informação de que a cotação para esse negócio do papel (atinente à cliente The Navigator Company), para 2020, seria a indicada, mas ficaria pendente da resolução da situação com a Eco-Modus, durante o mês de Janeiro, caso contrário não seria revalidada (a mencionada cotação).
Sabe-se, como decorre dos factos provados, que a questão com a Eco-Modus não ficou resolvida em Janeiro de 2020, pois que em Setembro de 2020 (cf. pontos 48. e 49 dos factos provados), a MSC ainda estava a solicitar à autora o pagamento dos valores decorrentes das despesas com os contentores, sendo que o pagamento ocorreu em Novembro de 2020 e em Março e Junho de 2021, embora o acordo tenha sido alcançado em 20 de Novembro de 2020 (cf. pontos 57. e 59.).
Ao contrário daquele que foi o entendimento do senhor juiz a quo, crê-se que a prova produzida é bastante para concluir que a cotação não foi revalidada para aquele negócio concreto e que foi esse negócio – e não outros – que a autora deixou de poder assegurar, o que se extrai com segurança das declarações do seu legal representante,
Nos termos do art.º 466º, n.º 3 do CPC, o Tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se estas constituírem confissão.
O valor probatório a conferir às declarações de parte tem sido objecto de interpretações divergentes na doutrina e na jurisprudência, que conferem uma maior ou menor preponderância em função do momento em que são prestadas, da assistência ou não da parte à audiência de julgamento, da corroboração ou não dos factos que delas emergem por outros meios de prova.
Acompanha-se, neste aspecto, a posição do Prof. Miguel Teixeira de Sousa quando refere, in Para que serve afinal a prova por declarações de parte?[31]:
“Não se ignora, como é evidente, que a prova por declarações de parte merece uma especial ponderação pelo tribunal, dado que é a própria parte que depõe em juízo sobre factos que, em princípio, lhe são favoráveis. Isto é, no entanto, coisa completamente diferente de se entender que, à partida e independentemente de qualquer valoração específica em função das circunstâncias do caso concreto, a prova por declarações de parte não pode ter um valor probatório próprio. […] a não atribuição de um valor probatório próprio à prova por declarações de parte é contraditória com a faculdade, resultante da conjugação do disposto no art.º 466.º, n.º 2, CPC com o estabelecido no art.º 452.º, n.º 1, CPC, de o juiz ordenar oficiosamente essa prova. Se o tribunal tem o poder de ouvir as partes sobre, por exemplo, um aspecto das negociações de um contrato, isso só pode querer significar que o tribunal tem o poder de avaliar, para efeitos probatórios, as declarações que as partes venham a produzir (ou mesmo, como é claro, a declaração que só uma delas venha a produzir, pela recusa de depoimento ou por um depoimento evasivo da outra). Qualquer outra interpretação diminuiria a relevância ou retiraria mesmo qualquer justificação para os poderes oficiosos atribuídos ao tribunal pelos referidos preceitos. Do exposto resulta que nada justifica a desqualificação, à partida, do valor probatório da prova por declarações de parte. Esta prova tem o valor probatório que, em função do caso, for justificado atribuir segundo a prudente convicção do juiz. […] Se é certo que se impõe apreciar a prova por declarações de parte sem ilusões ingénuas, também é verdade que não há que, à partida, desqualificar o valor probatório dessa prova. Em suma: a prova por declarações de parte tem, sem quaisquer apriorismos, o valor probatório que lhe deva ser reconhecido pela prudente convicção do juiz; nem mais, nem menos, pode ainda precisar-se.”
No sentido de uma posição ampla e permissiva sobre a potencialidade das declarações de parte na formação da convicção do juiz pronuncia-se também, Luís Filipe Pires de Sousa, in As Declarações de Parte. Uma Síntese, pág. 33 e seguintes[32], sustentando que a credibilidade das declarações tem de ser aferida em concreto e não em observância de máximas abstractas pré-constituídas, sob pena de se esvaziar a utilidade e potencialidade deste meio de prova.
Ainda de acordo com este autor, os critérios de valoração das declarações de parte hão-de coincidir essencialmente com os parâmetros de valoração da prova testemunhal, havendo apenas que hierarquizá-los diversamente. Nada obsta, contudo, que as declarações de parte constituam o único arrimo para dar certo facto como provado desde que logrem alcançar o standard de prova exigível para o concreto litígio em apreciação.
Neste mesmo sentido se pronuncia Rui Pinto referindo defender “a normalização do valor probatório das declarações de parte: são um meio de prova que, como outro qualquer, pode suportar, só por si, uma decisão sobre um facto, em função dos resultados obtidos em sede de livre apreciação da prova (cf. artigo 607º n.º 5).” – cf. Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 2018, pág. 680; no mesmo sentido, ao que se depreende, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4-06-2015, processo n.º 3852/09.5TJVNF.G1.S1.[33]
As declarações de parte assumirão especial relevo quando apenas as partes tiveram intervenção nos factos que integram os temas de prova, como sucede no caso.
Ora, o declarante MO., gerente da autora, foi muito claro ao mencionar, a partir do minuto 11:30 do seu depoimento, que a situação decorrente da permanência dos contentores aqui em discussão, levou a que a MSC tivesse deixado de lhes dar apoio naquela linha, ou seja, no transporte para o Médio Oriente, de modo que isso afectou o negócio de transporte de papel.
Explicou que o tráfego de papel para vários países do Médio Oriente dependia de ano para ano, podendo representar entre 80 a 100 contentores por ano, o que equivaleria a cerca de 150 mil euros de fretes marítimos, acrescentando que, nesse ano (2020), a autora perdeu a margem de lucro correspondente (que, porém, não concretizou). A perda desse negócio significa, conforme referiu, que a MSC passou a dar apoio a outro transitário (que identificou como sendo a Vanesp, S. A.), para aquele negócio específico das cargas para o Médio Oriente daquele cliente da autora (a The Navigator Company).
O declarante não referiu, em momento algum, que tenha perdido outros negócios por esta razão ou que a MSC tenha deixado de efectuar preços competitivos para outras linhas, resumindo esta situação ao traço do Médio Oriente, para o negócio do transporte de papel, sendo este o negócio perdido, o que se teria mantido nos anos seguintes (cf. minuto 14:00 e 15:18 seguintes do seu depoimento) e explicando, mais à frente, minuto 30.57: “O lane onde a MSC tirou o apoio foi o do Médio Oriente; houve outros lanes em que a MSC manteve o acordo; no Médio Oriente o line manager naquela altura, era a pessoa de Geneva – os responsáveis estão divididos por tráfegos: América do Norte, Médio Oriente, etc. -, a pessoa que fazia o tráfego do Vietname era a mesma do Médio Oriente e disse que “ou isto se resolve ou não há preços para ninguém”.
Afigura-se, assim, que o transporte de papel para o Médio Oriente do cliente da autora não se realizou com a intervenção desta, face à perda de preços competitivos que até então lhe eram assegurados pela MSC, não obstante, como referiu o declarante, terem tentado obter junto de outras transportadoras uma cotação, que, porém, não se revelou competitiva.
Neste sentido, aliás, depôs também a testemunha FL, que, ainda que genericamente, confirmou que existiu o acordo com a MSC (referido em 57. e 58.) porque esta rejeitou o contrato para o Médio Oriente quanto a um outro cliente da autora (The Navigator Company), o que confirma as declarações do legal representante da recorrente.
Note-se que não se trata de afirmar que a MSC deixou de dar qualquer apoio à autora ou que tenha retirado os preços competitivos noutras linhas e para outros destinos, ou que a autora tenha deixado de trabalhar com esta transportadora – que não deixou -, mas apenas de constatar que, na sequência dessa questão pendente com os contentores no Vietname, no ano de 2020, a autora não conseguiu manter a cotação que a MSC lhe conferia para o traço do Médio Oriente.
Assim, a alínea f) dos factos não provados deve ser eliminada e deve passar a constar da matéria de facto provada o seguinte ponto:
62. Porque os contentores nunca foram levantados, conforme referido em 45., estando em dívida os valores referidos em 48., a MSC não revalidou, para o ano de 2020, a cotação para o negócio de transporte de papel da autora em relação ao cliente The Navigator Company.
Já no que concerne aos factos vertidos nas alíneas g), h), j) e k) não se acompanha a argumentação recursória, devendo manter-se tais factos como não provados.
Com efeito, não obstante se saber que a cotação para o ano de 2020 não foi revalidada, tal não significa que o negócio tenha sido totalmente perdido, ainda que o legal representante da autora o tenha mencionado, mas sem cabal concretização quanto aos anos posteriores.
Por outro lado, o documento n.º 2 junto com o articulado superveniente constitui um mero extracto, cuja origem nem se mostra identificada, onde consta uma listagem de facturas, com datas do ano de 2019 e valores indicados, como sendo reportadas ao cliente The Navigator Company, tendo como transportadora a MSC, mas que cuja entidade emitente não é sequer identificada no documento, nem se mostrando corroborada pela apresentação das mencionadas facturas ou qualquer outro elemento contabilístico que atestasse os valores nela inscritos, pelo que se torna inviável afirmar que a autora efectuou essa facturação, relativamente a esse negócio, no ano de 2019, e menos ainda que a efectuaria relativamente ao ano de 2020, não tendo sido sequer indicada a margem de lucro que dali retiraria.
Finalmente, no que diz respeito à finalidade do acordo referido em 57., não se pode afirmar que visou apenas assegurar os embarques para o Médio Oriente, tendo sido referido que as relações comerciais entre a autora e a MSC eram relevantes e se mantinham já há algum tempo, pelo que a manutenção dessa relação comercial pode, por si só, ter determinado a adesão a esse acordo, e não apenas pelo motivo de assegurar esses embarques que, aliás, conforme referiu o legal representante da autora, mesmo após o acordo, não terão sido renovados.
Assim, procede apenas parcialmente, nesta sede, a impugnação da matéria de facto quanto à alínea f) dos factos não provados, mantendo-se inalterada quanto às demais alíneas.
Artigo 39º da petição inicial
Pretende ainda a apelante, com base no que alegou no artigo 39º da petição inicial – “Imobilizações e parqueamento pelos quais as RR. são totalmente responsáveis e pelos quais, desde logo, a A. as responsabilizou, solicitando o urgente levantamento dos contentores, conforme decorre, entre outros, do e-mail datado de 4 de Julho de 2018, cuja cópia ora se junta sob o nr 37 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.” – e que refere ter sido admitido pela ré na sua contestação, que seja aditado aos factos provados o seguinte: “A ré é totalmente responsável pelas imobilizações e parqueamento dos contentores e pelas quais, desde logo, a autora a responsabilizou, solicitando o urgente levantamento dos mesmos.”
Resulta já de quanto acima se analisou relativamente à impugnação do facto vertido na alínea b) dos factos não provados, que o envio da mensagem de 4 de Julho de 2018, em que a autora comunica à ré os valores que a MSC estava a cobrar relativamente à estadia dos contentores não poderia ter o alcance de responsabilizar aquela, por sua vez, pelo respectivo pagamento.
Por outro lado, a circunstância de a ré ter admitido o facto alegado no artigo 39º da contestação, sabendo-se que refutou expressamente qualquer responsabilidade pelo pagamento dos custos atinentes a demurrage, storage, destruição de mercadoria e limpeza de contentores, apenas pode significar que aceitou que a mensagem de 4 de Julho de 2018, com o conteúdo que consta do documento n.º 37 junto com a petição inicial, lhe foi dirigida pela autora.
Acresce que, tal como acima se mencionou relativamente ao vertido nas alíneas c) e d) dos factos não provados, não cabe incluir no elenco da matéria de facto afirmações conclusivas ou juízos de valor que devem ser retirados dos factos reais apurados, pelo que não é possível incluir nos factos provados ser a ré responsável pela imobilização e parqueamento dos contentores, o que, por si só, teria a virtualidade de conduzir à solução jurídica do litígio.
Improcede, assim, também neste segmento, a impugnação da matéria de facto.
*
Considerando as alterações introduzidas à matéria de facto, os factos provados e não provados a considerar são os seguintes (procedendo-se à integração do facto aditado com o aditamento de uma letra para manter a sequência numérica):
1. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de agente de navegação e transitária, estando inscrita como agente de navegação no IPTM – Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, I.P. com o n.º NA-005 e sendo detentora do alvará n.º 900634 emitido pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P. para o exercício da actividade transitária.
2. A Ré Eco-Modus, Lda. e a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. são sociedades comerciais que se dedicam à actividade de comércio por grosso de desperdícios de materiais, compra e venda e importação e exportação dos mesmos.
3. No âmbito daquela sua actividade a Ré Eco-Modus solicitou, inicialmente, à Autora que promovesse o transporte marítimo de dez contentores com resíduos de plástico do porto de Sines para o porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI, no Vietname.
4. Em 4 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou à Autora cinco contentores para carregar desperdício de plástico com destino a Ho Chi Mingh-CAT LAI e pediu 14 dias de free time no que respeita às demoras e imobilizações dos mesmos no destino.
5. Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS para poderem ser transportados para o Vietname.
6. Em 11 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus comunicou à Autora as datas nas quais os restantes cinco contentores deveriam ser carregados no seu fornecedor SAICANATUR para poderem ser transportados para o seu destino final.
7. Em 11 de Janeiro de 2018 a Autora enviou à Ré Eco-Modus um e-mail no qual lhe transmitiu, reconfirmando os e-mails por esta enviados, os detalhes disponíveis da reserva feita por aquela Ré nos seguintes termos:
«De: JM [mailto: ...@orey-shipping.com]
Enviada: quinta-feira, 11 de Janeiro de 2018 15:59
Para: IC
Cc: FL; '08 14/ 08 to 05/'; ...@Eco-Modus.eu
Assunto: RE: IR02550 + IR02551 Boooking request / 0201860025
Boa tarde IC,
Note pfv. detalhes disponíveis da reserva:
FCL – 10X40’HC
BKG: 083LI0250491 ETD LISBOA: 19/JAN
p/ rail
ETD SINES: 25/JAN
VESSEL/VOY: “MAERSK ESSEX”; v. 752W T/S PORT: SINGAPORE
ETA HOCHIMINH – CAT LAI: 07/MAR
IR02550 - 15/01/2018 - Local de carga:
1º cnt: 09h00 / JDT - Frielas
2º cnt: 10h00 / JDT – Frielas
3º cnt: 11h00 / JDT - Frielas
4º cnt: 09h00 / AS SMS – Seixal
5º cnt: 10h00 / AS SMS - Seixal
IR02551 - 16/01/2018 – Local de carga:
1º cnt: 09h00 / SAICANATUR – Alcochete
2º cnt: 09h30 / SAICANATUR – Alcochete
3º cnt: 10h00 / SAICANATUR – Alcochete
4º cnt: 10h30 / SAICANATUR - Alcochete
5º cnt: 11h00 / SAICANATUR - Alcochete
TRANSPORTADOR TERRESTRE: ALB/MSC TRANSPORTADOR MARITIMO: MSC
Transportes para enchimentos marcados como solicitado. Enviem pfv. docs. para despacho.
Obg.
M.Cmpts,
JS»
8. A mercadoria foi acondicionada pela Ré Eco-Modus nos contentores MSCU 7917744, TTNU 9026663, TGHU 6164462, MSCU 7199610, TGHU 8997880, TCLU 5703344, TTNU 9567760, MSCU 7019088, TCNU 2022107 e DRYU 9348073, fornecidos pela MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedido da Autora, tendo tais módulos de carga sido selados também pela Ré.
9. A Ré Eco-Modus, por e-mail datado de 12 de Janeiro de 2018, enviou à Autora as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque.
10. Em 16 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus tornou a enviar à Autora as referidas instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque.
11. Na sequência das instruções da Ré Eco-Modus, a Autora promoveu junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. o transporte marítimo que aquela lhe solicitou.
12. A Autora transmitiu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal e de acordo com o que lhe fora comunicado pela Ré Eco-Modus, as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque em 19 de Janeiro de 2018.
13. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, emitiu em 22 de Janeiro de 2018, de acordo com as instruções da Ré Eco-Modus e transmitidas pela Autora, o conhecimento de embarque relativo ao solicitado transporte.
14. Os dez contentores com a mercadoria expedida pela Ré Eco-Modus para a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. foram embarcados no navio MAERSK ESSEX, que saiu do porto de Sines em 26 de Janeiro de 2018 com destino ao porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI no Vietname, ao abrigo daquele referido conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
15. Em 31 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou por e-mail à Autora para mudar o consignatário e destino final da sua mercadoria de Ho Chi Mingh-CAT LAI para Haiphong, também no Vietname.
16. A Ré Eco-Modus enviou então, no mesmo e-mail, novas instruções para correcção do conhecimento de embarque.
17. Em face desta solicitação a Autora enviou, naquela mesma data, um e-mail para o agente da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedir a rectificação do conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
18. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. enviou naquela mesma data o draft do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 já com as correcções solicitadas pela Ré Eco-Modus à Autora.
19. A Autora, por sua vez, em 7 de Fevereiro de 2018, enviou tal draft à Ré Eco-Modus para confirmação desta.
20. Entretanto, em 28 de Fevereiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou novamente à Autora a alteração do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e de um outro, o MSCUKQ318475, relativamente à entidade consignatária e parte a notificar, que passaria a ser a sociedade PMai Industry Environment Company Limited.
21. Na sequência do solicitado pela Ré Eco-Modus, a Autora em 1 de Março de 2018, enviou um e-mail para o agente da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedir a rectificação do conhecimento de embarque.
22. Tendo a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente, enviado à Autora em 2 de Março de 2018 o draft dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475, rectificados de acordo com as instruções da Ré Eco-Modus apenas quanto ao consignatário.
23. A Autora, por sua vez e naquela mesma data, enviou à Ré Eco-Modus o aludido draft para confirmação desta.
24. Em 6 de Março de 2018, e dado que a “Notify Party” não coincidia com o “Consignee”, a Ré Eco-Modus solicitou à Autora uma nova rectificação dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475.
25. A Autora, na sequência destas instruções, solicitou naquela mesma data ao agente de navegação da transportadora marítima, a identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., a rectificação dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475.
26. Tendo enviado à Ré Eco-Modus também naquela data o draft dos conhecimentos de embarque MSKUKQ296259 e MSCUKQ318475, já com as alterações pretendidas e solicitadas por aquela Ré.
27. Tendo a Ré Eco-Modus confirmado a alteração ao referido conhecimento de embarque MSKUKQ296259 em 19 de Março de 2018 por e-mail da mesma data.
28. Ainda naquele e-mail a Ré Eco-Modus solicitou à Autora a emissão do telex release de forma a que a mercadoria pudesse ser entregue ao consignatário sem a apresentação do aludido conhecimento de embarque MSKUKQ296259, pois neste ainda figurava o antigo consignatário e não a PMai Industry Environment Company Limited.
29. Nessa mesma data, e na sequência do e-mail da Ré Eco-Modus, a Autora indagou junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. pela correcção do draft do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 corrigido de acordo com as instruções daquela Ré e solicitou a emissão do telex release.
30. Tendo a identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, emitido o referido telex release.
31. O navio MAERSK ESSEX, que transportou os contentores com a mercadoria expedida pela Ré Eco-Modus para a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., chegou ao porto de Haiphong em 18 de Março de 2018, tendo os dez módulos de carga sido descarregados para o respectivo terminal nessa data.
32. A Ré Eco-Modus, por e-mail de 16 de Julho de 2018, solicitou à Autora nova rectificação do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 no sentido de nele constar como consignatário a companhia Trinh Nghien, tendo o Sr. T... como contacto no destino.
33. Na mesma data, a Autora – na sequência do que lhe foi solicitado pela Ré Eco-Modus –, pediu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A que corrigisse o aludido conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
34. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. transmitiu à Autora que só poderia alterar o conhecimento de embarque MSKUKQ296259 desde que lhe fosse fornecida a licença de importação para a mercadoria em questão.
35. Nesse sentido, a Autora, em 20 de Julho de 2018, solicitou à Ré Eco-Modus a referida licença de importação.
36. Em 23 de Julho de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora a aludida licença de importação.
37. A Autora, nessa mesma data, remeteu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a identificada licença de importação, tendo então adiantado que tanto ela como a Ré Eco-Modus não eram responsáveis pelo pagamento das paralisações dos contentores abrangidos pelo conhecimento de embarque MSKUKQ296259.
38. Entretanto, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. notificou a Autora – por missivas datadas de 10 de Maio de 2018 e 2 de Julho de 2018 – do valor das imobilizações e parqueamento dos dez contentores no terminal do porto de Haiphong.
39. Por e-mail de 4 de Julho de 2018, a Autora comunicou à Ré Eco-Modus que «(…) após a resolução dos 13 contentores, continuamos com um problema com o MSKUKQ296259 favor note em anexo carta recebida da MSC. Notar que o valor já vai em USD 37.149,00 de demurrage/USD 3180,00 de storage. Necessitamos que verifiquem esta situação com urgência. Aguardo vossa informação (…)».
40. Entretanto, e no período compreendido entre 22 de Maio de 2018 e 30 de Agosto de 2018, a Ré Eco-Modus interpelou a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd, destinatária final da mercadoria, e solicitou-lhe o rápido levantamento dos contentores em apreço e de outros igualmente por si remetidos, referindo, designadamente na mensagem de 22 de Maio de 2018, que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. já não lhe estava a aceitar novos transportes.
41. Em resposta a tais mensagens, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. comunicava que iria proceder ao levantamento dos contentores, indicando, para o efeito, os dias seguintes às mensagens enviadas, designadamente, quanto aos contentores identificados em 7..
42. Em 14 de Outubro de 2019, a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., através do senhor T…, em e-mail dirigido à Ré Eco-Modus, informou que ia tomar conta dos contentores e levantá-los a breve trecho.
43. A Autora, entre 29 de Outubro de 2019 e 6 de Novembro de 2019, insistiu junta da Ré Eco-Modus e da Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. na rápida solução para o levantamento dos contentores tendo então salientado que os respectivos custos de imobilização e parqueamento estavam a aumentar diariamente.
44. A Ré Eco-Modus, por e-mail de 5 de Novembro de 2019, comunicou à Autora que iria falar com T… no dia seguinte e que este lhe garantiu que pretendia deslocar-se novamente à MSC Vietnam e insistiu não querer abandonar a mercadoria.
45. Os dez contentores do bill of lading MSKUKQ296259 nunca foram levantados no destino, seja pela Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., seja por qualquer outro destinatário designado pela Ré.
46. Em 21 de Fevereiro de 2020, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. remeteu um e-mail à Autora no qual a informou que o consignatário se encontrava sob investigação por parte da Alfândega e Polícia Vietnamitas, razão pela qual a mercadoria teria de ser destruída, para além de que lhe comunicou os custos de imobilização (USD 257 414) e parqueamento (USD 21 000) dos ditos contentores e da destruição da mercadoria (USD 2800/contentor).
47. Em 23 de Março de 2020, na sequência do e-mail enviado pela Autora à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., esta, nessa mesma data esta, através do seu agente, informou que a mercadoria já tinha sido destruída e os contentores devolvidos ao parque.
48. Em 15 de Setembro de 2020 a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. enviou para a Autora uma carta na qual a responsabilizou pelo pagamento dos seguintes valores:
- Destruição da mercadoria: USD 28 000
- Imobilização dos contentores: USD 252 131
- Armazenagem: USD 21 630
- Reparação de contentores: USD 4616,61
- Limpeza: USD 72,26.
49. Na missiva em apreço, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. concedeu à Autora o prazo de 10 dias para proceder ao respectivo pagamento sob pena de iniciarem o respectivo procedimento judicial, tendo ainda referido que «[n]o âmbito do contrato de transporte ao abrigo do conhecimento de embarque MSCUKQ296259, celebrado entre a MSC e a Orey Comércio e Navegação, S.A., foram transportados de Portugal para o Vietname, 10 contentores que descarregaram em Haiphong no dia 18/03/2018. As Autoridades Vietnamitas impõem certas restrições para o tipo de mercadoria transportada (plastic scrap), sendo que, no caso em apreço, o Consignatário ficou impossibilitado de proceder ao respectivo desalfandegamento. Perante esta situação e, por forma a obter a libertação dos contentores, a MSC viu-se forçada a proceder à destruição da carga. Assim, a mercadoria foi destruída nos dias 18 e 19 de Março de 2020 e, até ao dia 21, todos os contentores retornaram vazios. Desde a data em que os contentores descarregaram cheios no Terminal de Haiphong, até ao dia em que foram restituídos vazios, foram geradas as seguintes despesas (…). Considerando que a Orey contratou o serviço de transporte à MSC, responsabilizamos V. Exas. por todas as despesas incorridas com o presente processo. Sendo certo que, os termos e condições dos transportes efectuados pela MSC, são há muito conhecidos e estabelecidos. A MSC preza a resolução de conflitos através dos meios extrajudiciais, pelo que, interpelamos V. Exas. a procederam ao pagamento do montante total de $ 306'449.97 (…)».
50. Tendo a referida MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. transmitido, ainda, oralmente à Autora que não lhe aceitaria mais colocações de transportes marítimos para aquele mercado do Médio-Oriente até que fosse ressarcida de tais custos.
51. A Ré Eco-Modus e a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., antes de terem contratado à Autora a promoção do transporte da referida mercadoria, não cuidaram de saber se o consignatário/destinatário podia proceder ao desalfandegamento da carga em apreço (plastic scrap).
52. A Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., por intermédio da ré Eco-Modus, foi assegurando à autora que procederia ao levantamento dos referidos dez contentores.
53. Por e-mail datado de 20 de Dezembro de 2019, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, comunicou à Autora para considerar a cotação para o negócio de Papel (Navigator) para 2020 para o trade em questão e com a validade até 31 de Dezembro de 2020.
54. No mesmo e-mail, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. informou, ainda a Autora que tal cotação ficava «(…) pendente da resolução da situação pendente com a Eco-Modus durante o mês de Janeiro caso contrário a mesma não será revalidada».
55. Sendo que, àquela data, o valor do parqueamento e imobilização dos contentores atingia um montante cifrado entre USD 3810 e USD 37 149 e USD 21 000 e USD 257 414, respectivamente.
56. A alegada “situação pendente com a Eco-Modus” não se resolveu.
56.- A Porque os contentores nunca foram levantados, conforme referido em 45., estando em dívida os valores referidos em 48., a MSC não revalidou, para o ano de 2020, a cotação para o negócio de transporte de papel da autora em relação ao cliente The Navigator Company.
57. A Autora, após negociações diversas com a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., conseguiu chegar, com a mesma, em 20 de Novembro de 2020, a um acordo final de transacção.
58. A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. reduziu o valor da imobilização, armazenagem, reparação e limpeza dos contentores e destruição da mercadoria no montante de € 259 130,94 para o montante total de € 35 000.
59. Tendo a Autora aceitado pagar à identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. o referido valor da seguinte forma:
- Na data da assinatura de tal acordo, isto é, em 30 de Novembro de 2020, o montante de € 12 500;
- Em 31 de Março de 2021, o montante de € 10 000;
- E em 30 de Junho de 2021 o montante de € 12 500.
60. Pelo referido acordo de transacção, a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. declarou ainda que com o último pagamento acima referido considerava-se totalmente paga e indemnizada a propósito dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSCUKQ296259 e afirmou sub-rogar a Autora nos seus direitos contra terceiros, nomeadamente, contra a Ré Eco-Modus, emitindo em 30 de Junho de 2021 o instrumento de sub-rogação.
61. A Autora entregou à MSC – Mediterranean Shipping Company as sobreditas importâncias de € 12 500, € 10 000 e € 12 500 nos dias 12-10-2020, 03-03-2021 e 30-04-2021, respectivamente.
*
O Tribunal recorrido deu como não provados os seguintes factos:
a) Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS, para poderem ser transportados para a China.
b) Por e-mail datado de 4 de Julho de 2018, a Autora responsabilizou a Ré Eco-Modus pelo pagamento do valor correspondente à imobilização e parqueamento dos contentores transportados ao abrigo do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 e solicitou o urgente levantamento dos referidos módulos de carga.
c) Os dez contentores, por razões imputáveis à Ré Eco-Modus, nunca foram levantados no destino.
d) Os dez contentores, por razões alheias à Autora, nunca foram levantados no destino.
e) A Ré Eco-Modus sempre prometeu à Autora proceder ao levantamento dos referidos dez contentores.
f) Eliminada.
g) Tendo a Autora perdido o negócio de transporte de papel para o mercado do médio oriente que mantinha com a The Navigator Company, S.A..
h) Negócio esse que representou para a Autora uma facturação de € 151 765,14 em 2019.
i) A Autora deixou de lucrar com tal negócio, em 2020 e pelo menos, € 151 765,14.
j) Valor este que não facturou em 2020 ao seu cliente The Navigator Company, S.A. pelo facto de não poder embarcar a mercadoria desta sociedade para aquele mercado.
k) Para que a MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. deixasse de bloquear os embarques da Autora para o médio oriente, as partes ajustaram o acordo referido nos factos provados n.os 57-60.
l) A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. entregou os contentores deslocados ao respectivo destinatário no porto de destino.
m) O bill of lading foi entregue ao destinatário, endossado pela Ré.
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3.2.2. Da responsabilidade pelo pagamento dos valores atinentes à demurrage/detention, storage, destruição da mercadoria e limpeza de contentores
A sentença recorrida absolveu a ré do pedido deduzido pela autora com a seguinte ordem de razões:
--> Entre a autora e a ré Eco-Modus foi celebrado um contrato de expedição ou trânsito, isto é, um contrato em que a primeira, enquanto transitário, se obrigou perante a segunda (o expedidor) a prestar-lhe certos serviços (que podem ser materiais ou jurídicos) referentes a um contrato de transporte, pois que a ré solicitou a promoção do transporte marítimo de dez contentores com resíduos de plástico, do porto de Sines para o porto de Ho Chi Mingh- CAT LAI, no Vietname, indicando as datas do respectivo carregamento, tendo a autora efectuado a reserva, com os detalhes solicitados, procedendo a ré ao acondicionamento da mercadoria nos contentores, fornecidos pela MSC a pedido da autora, tendo a MSC comunicado os dados para o preenchimento do conhecimento de embarque, sendo os contentores embarcados no navio Maersk Essex, tendo ocorrido, entretanto, modificação do consignatário e do destino final, a pedido da ré; o navio chegou ao porto de Haiphong a 18 de Março de 2018; a ré solicitou à autora a emissão do telex release para que a mercadoria pudesse ser entregue ao consignatário sem apresentação do conhecimento de embarque, que foi emitido pela MSC; os contentores foram descarregados para o terminal;
=> No âmbito do contrato de expedição a autora está obrigada a prestar a actividade transitária e a ré, como interessada na carga, está sujeita às obrigações de lealdade e de cooperação, de fornecer os meios necessários à execução do contrato de expedição, pagar a retribuição e reembolsar o transitário das despesas;
=> A autora disponibilizou os contentores necessários para acondicionar a carga, diligenciou pelo transporte até ao porto de Sines, providenciou junto da MSC pelo transporte marítimo até ao porto vietnamita e diligenciou pela emissão do telex release, cumprindo a prestação a que se obrigou perante a ré;
=> No valor do frete marítimo foi considerada a retribuição devida pela fruição dos contentores, que se repercutiu na retribuição da expedição;
=> Quando o transportador coloca à disposição do interessado na carga um contentor – concessão sempre remunerada, apesar de poder ser englobada no frete –, tal sucede em suporte de outra operação mais vasta, que é o transporte de mercadorias, pelo que, na lógica do transportador, a locação do contentor é uma prestação acessória (o objecto principal é a deslocação da mercadoria) e indispensável ao transporte (o transporte marítimo impõe em larga medida a utilização do contentor, sobretudo quando realizado em navio porta-contentores);
=> O aprovisionamento de contentores é, porém, independente da operação de transporte, pois que começa antes do embarque e termina despois do desembarque da mercadoria, daí que o fornecimento do contentor esteja sujeito ao regime do transporte marítimo apenas enquanto a deslocação da mercadoria estiver sob a regulamentação injuntiva do transporte marítimo; nos períodos que estão para além ou aquém do transporte marítimo propriamente dito, aplica-se as regras da locação;
=> Após o desembarque, os contentores são transportados para a zona de parqueamento e ficam a aguardar o seu levantamento, sendo que tal armazenagem se reconduz à figura do depósito (cf. art.º 403º e seguintes do Código Comercial e 1185º do Código Civil), sendo depositário o transportador e depositante o interessado na carga;
=> Os atrasos no levantamento dos contentores e sua restituição ao transportador oneram o interessado na carga relapso com o pagamento dos custos de imobilização/retenção e armazenagem, pois que ele dispõe da dilação fixada no contrato de transporte para permitir o desembaraço aduaneiro das mercadorias; uma vez ultrapassado esse período, o transportador passa a exigir uma quantia diária pré-estabelecida pelo aluguer do contentor, de modo a compensar o tempo de inactividade deste módulo devido a demora no levantamento (demurrage) ou atraso na devolução do módulo (detention), assim como o terminal debita uma quantia diária pré-estabelecida ao transportador marítimo, que repercutirá no interessado na carga (storage);
=> Assim, pago o frete na origem pelo carregador, colocada a mercadoria à disposição do consignatário, este deve suportar os custos de demurrage/detention e storage; se o frete for a pagar no destinatário e este aceitar a carga, devem os custos ser suportados pelo carregador e consignatário; se o destinatário recusar ou não reclamar a carga, os custos serão por conta do carregador, independentemente de o frete ter sido pago ou não na origem,
=> No caso, o frete foi pago na origem, constando do conhecimento de embargue “freight prepaid”, pelo que, sendo as despesas em causa um acessório do frete, não há solidariedade entre a ré e o destinatário, pois que a ré pagou o frete, por via da autora e, chegada a mercadoria, tudo fez para que fosse entregue ao destinatário; o negócio que levou à exportação foi sujeito ao Incoterms®CIF, cabendo ao importador o desembaraço da mercadoria no destino;
=> A ré não agiu sozinha na expedição da mercadoria, foi assessorada pela autora, que foi quem tratou de todos os aspectos necessários à exportação da carga, incumbindo-lhe apurar e informar a ré sobre se a mercadoria a exportar podia ser expedida sem mais para o país de destino, o que a autora não demonstrou ter feito (a mercadoria não foi levantada porque o consignatário ficou impossibilitado de proceder ao seu desalfandegamento), mas integra uma das facetas da prestação típica do transitário;
=> A autora não fez prova de que nos termos do contrato de transporte a ré era responsável pelo pagamento das quantias devidas a título de demurrage/detention e storage, não exibiu uma qualquer merchant clause, pelo que não existe solidariedade legal ou convencional quanto ao pagamento de tais quantias, não sendo por esta devida qualquer quantia.
A autora apelante insurge-se contra a solução jurídica encontrada pela 1ª instância argumentando o seguinte:
--> ficou provado no ponto 51. que a ré, antes de ter contratado com a apelante a promoção do transporte, não cuidou de saber se o consignatário podia proceder ao desalfandegamento da carga, para além de se ter referido na decisão que a autora efectuou a prestação a que se vinculou perante a ré;
--> o que a ré lhe pediu foi que procedesse à realização do transporte marítimo, para o que lhe forneceu todos os dados, como o local de carga, porto de destino, destinatário, pagou o frete e solicitou o free time no destino de 14 dias, pelo que a sua obrigação era a de promover o transporte, nesses exactos termos, com disponibilização dos meios necessários para o efeito, nomeadamente os contentores, não lhe sendo exigível conhecer as restrições existentes no país de destino quanto à entrada de uma determinada mercadoria ou se o destinatário está impedido de a receber, nem esta figura entre as obrigações do transitário decorrentes do DL 255/99, de 7 de Julho;
--> se a ré solicitou os 14 dias de free time no destino isso só pode significar que, ultrapassado esse período, a ré era responsável pelas despesas decorrentes do não levantamento dos contentores;
--> mesmo considerando que se aplicam, posteriormente a esse período, as regras da locação, sempre a ré seria responsável, porquanto foi em nome e por conta dela que a autora pediu os contentores à MSC.
A apelada, por sua vez, sustenta que nenhuma responsabilidade tem pelo facto de a mercadoria não poder dar entrada no Vietname, para além do que o importador sempre assegurou que procederia ao seu levantamento, como decorre do ponto 52.; os contentores não foram objecto de um contrato autónomo de locação, pelo que o preço do uso ou locação dos contentores estava incluído no montante do frete pago; a autora não demonstrou a causa legal da existência da pretendida solidariedade entre a ré e o destinatário quanto à obrigação de pagamento das quantias reclamadas; a apelante reconheceu que nem ela nem a apelada eram responsáveis por esse pagamento, pelo que ao pretender responsabilizar agora a ré age em abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
Resulta da factualidade provada que a autora e a ré acordaram entre si a promoção, pela primeira, do transporte marítimo de dez contentores, desde o porto de Sines para o porto Ho Chi Mingh-CAT LAI (depois modificado para Haiphong[34]), no Vietname, que aquela, na sequência de instruções da Eco-Modus, promoveu junto da MSC o transporte marítimo solicitado, tendo a última emitido o conhecimento de embarque MSKUK296259, conforme as instruções da ré, transmitidas pela autora – cf. pontos 3., 7., 11. e 13. dos factos provados.
O Tribunal a quo qualificou o contrato dos autos como contrato de expedição, para o que teceu as seguintes considerações:
“[…] os serviços prestados pela Autora redundam em plúrimas operações diversas, apresentando, por isso, uma natureza multiforme que convoca naturalmente uma considerável complexidade jurídica e suscita alguma flutuação doutrinária e jurisprudencial quanto à definição do contrato que está na sua génese, a saber, o de trânsito ou expedição.
A superação de tais dificuldades tem passado pela distinção de duas acepções do contrato de trânsito ou expedição.
Assim, e em sentido estrito, o contrato de expedição é um mandato, nos termos do qual o transitário se obriga a celebrar um contrato de transporte, em nome próprio ou do expedidor-mandante, por conta deste. Este mandato pode abranger, para além deste núcleo, a prática dos actos acessórios indispensáveis à sua consecução (art.ºs. 1159.º, n.º 2, do CC e 233.º, in fine, do CCom). Ademais, pode ser com ou sem representação. Assim, se o transitário, além de agir por conta do expedidor, também actuar em nome deste com poderes delegados através do competente instrumento jurídico (procuração), estar-se-á perante um mandato representativo e a sua posição jurídica decorrerá das regras ordinárias do mandato com representação (art.ºs 231.º e ss. do CCom e 1157.º e ss., 1178.º, 1179.º e 258.º e ss. do CC). Tal significa que nesta situação o contrato de transporte celebrado com o transitário em nome do expedidor produzirá efeitos na esfera deste, caso aquele tenha actuado nos limites dos poderes que lhe foram conferidos. Actuando o transitário por conta do expedidor, mas em nome próprio, há que recorrer à disciplina decorrente dos art.ºs 266.º e ss. do CCom (em especial, o art.º 269.º do CCom) e 1180.º a 1184.º do CC (em particular, o art.º 1183.º do CC).
Mas mesmo quando há ausência de poderes de representação, ainda assim o mandatário é responsável perante o mandante se houver deficiência no cumprimento do mandato.
Em sentido amplo, o contrato de trânsito é um contrato de prestação de serviço, que pode abranger:
- A prática de operações materiais, designadamente, grupagem de mercadoria, coordenação e articulação de diferentes transportes, controlo da mercadoria, consolidação e desconsolidação da carga, embalagem, carregamento, descarregamento e estiva; ou
- A prática de actos jurídicos (celebração de um contrato de depósito ou de seguro da mercadoria deslocada), ligados a um contrato de transporte.
Na justaposição das duas acepções é possível definir a expedição ou o trânsito como sendo o contrato pelo qual uma parte (o transitário) se obriga perante a outra (o expedidor) a prestar-lhe certos serviços (que tanto podem ser actos materiais como jurídicos), referentes a um contrato de transporte, e também a celebrar um ou mais contratos de transporte em nome e representação do cliente.
Para além do contrato de expedição ou trânsito, as empresas transitárias podem celebrar e executar materialmente contratos de transporte, quer directamente, quer com recurso a terceiros. Com efeito, o art.º 13.º do DL n.º 255/99 prevê a possibilidade de as empresas transitárias celebrarem contratos com terceiros em nome próprio, por conta do expedidor ou do dono da mercadoria. E o art.º 15.º do mesmo diploma, epigrafado de «Responsabilidade das empresas transitárias», adianta no seu n.º 1 que estas respondem perante o seu cliente pelo incumprimento das suas obrigações, bem como pelas obrigações contraídas por terceiros com quem hajam contratado, sem prejuízo do direito de regresso. Paralelamente, o art.º 367.º do CCom consente expressamente que o transportador actue tanto por si e seus empregados e instrumentos, como por ou através de empresa, companhia ou pessoas diversas - caso em que, de acordo com o seu § Único, «o transportador que primitivamente contratou com o expedidor conserva para com este a sua originária qualidade» e assume a de expedidor para com a empresa, companhia ou pessoa com quem depois ajustou o transporte.
O facto de um mesmo sujeito – o transitário – se dedicar ao exercício de duas actividades conceitualmente distintas e autónomas não perturba a disciplina jurídica de cada uma delas: a actividade do transitário mantém-se sujeita às regras acima enunciadas; a actividade do transportador permanece regida pelas disposições pertinentes do Código Comercial (art.ºs 366.º e ss. do CCom), da demais legislação extravagante de direito interno e das convenções internacionais.
*
1.3. O contrato de trânsito ou expedição celebrado entre Autora e Ré Eco-Modus.
No caso vertente, a matéria de facto apurada – e acima evidenciada – manifesta a celebração entre as partes de um contrato de expedição.
Efectivamente, está assente que a Autora é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de transitário (facto provado n.º 1). Por seu turno, a Ré Eco-Modus é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de comércio por grosso de desperdícios materiais, compra e venda e importação dos mesmos (facto provado n.º 2).
No exercício dessa sua actividade comercial, a Ré Eco-Modus solicitou, inicialmente, à Autora que promovesse o transporte marítimo de dez contentores com resíduos de plástico do porto de Sines para o porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI, no Vietname (facto provado n.º 3).
Em 4 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus solicitou à Autora cinco contentores para carregar desperdício de plástico com destino a Ho Chi Mingh-CAT LAI e pediu 14 dias de free time no que respeita à demoras e imobilizações dos mesmos no destino (facto provado n.º 4).
Em 10 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus enviou à Autora as datas nas quais aqueles primeiros cinco contentores deveriam ser carregados nos seus fornecedores JDT e AS SMS para poderem ser transportados para o Vietname (facto provado n.º 5).
Em 11 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus comunicou à Autora as datas nas quais os restantes cinco contentores deveriam ser carregados no seu fornecedor SAICANATUR para poderem ser transportados para o seu destino final (facto provado n.º 6).
Em 11 de Janeiro de 2018 a Autora enviou à Ré Eco-Modus um e-mail no qual lhe transmitiu, reconfirmando os e-mails por esta enviados, os detalhes disponíveis da reserva feita por aquela Ré (facto provado n.º 7).
A mercadoria foi acondicionada pela Ré Eco-Modus nos contentores MSCU 7917744, TTNU 9026663, TGHU 6164462, MSCU 7199610, TGHU 8997880, TCLU 5703344, TTNU 9567760, MSCU 7019088, TCNU 2022107 e DRYU 9348073, fornecidos pela MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. a pedido da Autora, tendo tais módulos de carga sido selados também pela Ré (facto provado n.º 8).
Em 12 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus, por e-mail datado de 16 de Janeiro de 2018, enviou à Autora as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque (facto provado n.º 9).
Em 16 de Janeiro de 2018, a Ré Eco-Modus tornou a enviar à Autora as referidas instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque (facto provado n.º 10).
Na sequência das instruções da Ré Eco-Modus, a Autora promoveu junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. o transporte marítimo que aquela lhe solicitou (facto provado n.º 11).
A Autora transmitiu à MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal e de acordo com o que lhe fora comunicado pela Ré Eco-Modus, as instruções para o preenchimento do conhecimento de embarque em 19 de Janeiro de 2018 (facto provado n.º 12).
A MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, emitiu em 22 de Janeiro de 2018, de acordo com as instruções da Ré Eco-Modus e transmitidas pela Autora, o conhecimento de embarque relativo ao solicitado transporte (facto provado n.º 13).
Os dez contentores com a mercadoria expedida pela Ré Eco-Modus para a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd. foram embarcados no navio MAERSK ESSEX, que saiu do porto de Sines em 26 de Janeiro de 2018 com destino ao porto de Ho Chi Mingh-CAT LAI no Vietname, ao abrigo daquele referido conhecimento de embarque MSKUKQ296259 (facto provado n.º 14). […]
[…] na sequência do e-mail da Ré Eco-Modus, a Autora indagou junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. pela correcção do draft do conhecimento de embarque MSKUKQ296259 corrigido de acordo com as instruções daquela Ré e solicitou a emissão do telex release (facto provado n.º 29).
Tendo a identificada MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A., através do seu agente em Portugal, emitido o referido telex release (facto provado n.º 30).
O navio MAERSK ESSEX, que transportou os contentores com a mercadoria expedida pela Ré Eco-Modus para a Hoahg Ming Phat, Import Export Co. Ltd., chegou ao porto de Haiphong em 18 de Março de 2018, tendo os dez módulos de carga sido descarregados para o respectivo terminal nessa data (facto provado n.º 31).
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Sendo sinalagmático, o contrato ajustado entre Autora e Ré Eco-Modus Requerida consagra, como facilmente se constata, obrigações principais recíprocas para as partes. Assim, e por um lado, o transitário presta a actividade transitária (art.ºs 1.º, n.º 2, e 13.º do DL n.º 255/99); por outro, a contraparte (habitualmente um interessado na carga – isto é, um carregador ou um consignatário/destinatário – de facto ou de direito) paga a retribuição devida (art.º 232.º do CCom).
Mas para além destas prestações capitais, é possível identificar no contrato de trânsito outras obrigações que vinculam o transitário. A saber:
- Obrigação de executar o contrato de expedição com respeito pelas instruções recebidas;
- Obrigação de informar a sua contraparte de todos os factos que possam levá-la a modificar ou revogar o negócio;
- Obrigação de comunicar a execução do contrato de expedição;
- Obrigação de prestar contas;
- Dever (eventual, caso as partes nele acordem) de guarda e custódia de mercadorias.
O interessado na carga, por seu turno, encontra-se ainda adstrito às obrigações de lealdade e de cooperação, de fornecer os meios necessários à execução do contrato de expedição (se outra coisa não for convencionada) e de reembolsar o transitário das despesas efectuadas.
*
Pois bem.
Na execução do acordo ajustado com a Ré, a Autora:
- Disponibilizou nos locais de carregamento comunicados pela Ré os contentores necessários para o acondicionamento da carga que aquela pretendia expedir para um dado porto vietnamita;
- Diligenciou pelo transporte terrestre de tais contentores até ao porto de embarque (Sines);
- Providenciou junto da MSC – Mediterranean Shipping Company, S.A. pela contratação do transporte marítimo dos referidos módulos de carga desde o porto de Sines, em Portugal, até ao porto vietnamita e destinatários que a Ré designou logo no início do relacionamento entre as partes e depois durante a execução da viagem marítima;
- Empenhou-se na emissão do telex release pelo transportador marítimo assim que a carga chegou ao porto de destino.
Ou seja, e por referência ao feixe de deveres que sobre si impendia, tudo indica que a Autora efectuou a prestação a que se vinculou perante a Ré no âmbito do contrato de expedição que as duas ajustaram entre si.”
Subscreve-se, no essencial, o entendimento do Tribunal recorrido no que concerne à qualificação jurídica do contrato celebrado entre a autora e a ré – que a apelante tão-pouco colocou em crise -, tendo presente, designadamente, a definição de actividade transitária, tal como consta do n.º 2 do art.º 1º do DL 255/99, de 7 de Julho, que regula o acesso e exercício da actividade transitária:
“A actividade transitária consiste na prestação de serviços de natureza logística e operacional que inclui o planeamento, o controlo, a coordenação e a direcção das operações relacionadas com a expedição, recepção, armazenamento e circulação de bens ou mercadorias, desenvolvendo-se nos seguintes domínios de intervenção:
a) Gestão dos fluxos de bens ou mercadorias;
b) Mediação entre expedidores e destinatários, nomeadamente através de transportadores com quem celebre os respectivos contratos de transporte;
c) Execução dos trâmites ou formalidades legalmente exigidas, inclusive no que se refere à emissão do documento de transporte unimodal ou multimodal.”
A fonteira entre o contrato de transporte e o contrato de expedição ou contrato de trânsito nem sempre é de fácil destrinça, sendo seguro que o segundo envolve a concretização das operações de transporte, funcionando o transitário como um intermediário entre o expedidor e o transportador, que, além disso, se assume como prestador de serviços cada vez mais numerosos e complexos – cf. Francisco Costeira da Rocha, O Contrato de Transporte de Mercadorias – Contributo para o Estudo da Posição Jurídica do Destinatário no Contrato de Transporte de Mercadorias, pág. 77.
Como se consignou na passagem da decisão transcrita, o contrato de expedição, em sentido estrito, configura um mandato, que pode ser com ou sem representação, pelo que esta não é um elemento típico da figura; não existindo representação tratar-se-á de uma situação regulada pelo regime geral do mandato.
Para que se trate de mandato representativo o mandante (no caso, o expedidor), terá de conceder ao mandatário (o transitário) uma procuração, o que, na generalidade dos casos, não sucede, porquanto o expedidor, por regra, dirige-se ao transitário solicitando a realização do transporte visado, sem atentar se confere ou não poderes representativos.
Como refere Francisco Costeira da Rocha, no contrato de trânsito, o transitário assume a obrigação de celebrar um contrato de transporte, com um transportador, em nome próprio ou do expedidor, mas sempre por conta deste, pelo que o fundamental é o mandato, não a ausência de poderes representativos – cf. op. cit., pág. 82.
Se o transitário agir por conta do expedidor e em nome deste, com poderes representativos (procuração), tratar-se-á de um mandatado representativo (cf. art.º 231º e seguintes do Código Comercial e 1157º e seguintes do Código Civil), de modo que o contrato de transporte celebrado em nome do expedidor produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último, desde que o transitário actue dentro dos limites dos poderes que lhe foram conferidos.
Se o transitário agir por conta do expedidor, mas em nome próprio, o regime aplicável será o que emerge do art.º 266º e seguintes do Código Comercial (comissão) e 1180º a 1184º do Código Civil (o mandatário não responde pelo cumprimento das obrigações contraídas pela pessoa com quem contratou, salvo estipulação em contrário, sem prejuízo da sua responsabilidade pelo deficiente cumprimento do mandato).
Não obstante a dificuldade da destrinça, sobremaneira em virtude do facto de muitas vezes o transitário ultrapassar o limite de intermediário e agir como transportador, aquele não deixa de ser um encarregado do comitente (o expedidor) para a celebração do contrato de transporte, pelo que não assume a responsabilidade pessoal pela execução deste. Ele não celebra um contrato de transporte com o expedidor, mas um contrato de mandato, pelo qual se obriga a celebrar, por conta deste, um contrato de transporte. O conteúdo destes contratos é distinto, pois que no contrato de mandato a obrigação do transitário é celebrar um contrato de transporte e no contrato de transporte, a obrigação do transportador é a de deslocar pessoas ou mercadorias.
Transcorrida a matéria de facto provada é evidente que a autora se obrigou a promover o transporte marítimo de dez contentores com resíduos plásticos, com destino a um porto no Vietname, tendo a autora procedido à respectiva reserva (booking) junto da transportadora MSC, que forneceu o navio e os contentores para o efeito.
Nada se apurou, nesse âmbito, quanto às condições estabelecidas para a vigência da relação contratual entre a autora e a ré, pelo que a primeira, ao abrigo do mandato que corporiza o contrato de expedição ou trânsito, se obrigou, nos termos gerais, a efectuar o transporte solicitado, por conta da ré, mas sem poderes de representação (ou pelo menos, sem que tenha sido demonstrada a conferência de tais poderes pela ré), o que significa que o contrato de transporte posteriormente celebrado com a MSC produziu, inicialmente, os seus efeitos entre esta e a autora – cf. Duarte Lynce Faria, in O Transporte Marítimo de Mercadorias[35], pág. 70 – “[…] “expedidor” deverá ser entendido como a parte que contrata com um “transportador” (que, acrescentamos nós, pode ser um transitário a contratar em nome próprio) e esta obriga-se a transportar as mercadorias, independentemente de efectuar ele próprio o transporte”; actuando o transitário por conta do expedidor, mas sem representação, o art.º 1181º, n.º 2 do Código Civil ex vi art.º 267º do Código Comercial, permite que o mandante (expedidor) se possa substituir ao mandatário (transitário) no exercício dos respectivos direitos; o contrato de expedição é um mandato, pelo qual o transitário se obriga a celebrar um contrato de transporte por conta do expedidor-mandante – cf. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-05-2001, processo n.º 0130568.
Ora, no contexto do contrato de expedição que celebrou com a ré, a autora veio a celebrar com a MSC, por conta daquela, o contrato de transporte marítimo, nas condições e com os detalhes solicitados pela primeira, designadamente no que concerne ao número de contentores a transportar, mercadoria, local de embarque, porto de destino, número de dias de free time (período durante o qual os contentores permanecem no destino até serem levantados pelo destinatário, sem cobrança de quantias adicionais), tendo a transportadora preenchido o conhecimento de embarque com base nas instruções que lhe foram transmitidas pela autora e tal como lhe foram comunicadas pela ré. O navio Maersk Essex transportou os contentores com a mercadoria para o destinatário e chegou ao porto de Haiphong em 18 de Março de 2018, data em que os dez módulos de carga foram descarregados para o respectivo terminal.
A caracterização do contrato de transporte marítimo e seus intervenientes mostra-se cabalmente descrita na decisão recorrida, para onde, no essencial, se remete, não se deixando de realçar, tal como no acórdão desta Relação de 23 de Fevereiro de 2021, processo n.º 115187/17.9YIPRT.L1[36], o seguinte:
“O contrato de transporte é um contrato comercial típico, previsto e regulado nos art.ºs 366º ss. do Código Comercial (exceto no tocante ao transporte rodoviário de mercadorias, atualmente regulado pelo DL nº 293/2003, de 04-10, que expressamente derrogou o Código Comercial), mediante o qual uma parte (o transportador) se obriga perante outra (o expedidor) a transportar determinada pessoa ou mercadoria de um lugar para outro, mediante contrapartida em dinheiro.
Na execução da prestação a que está obrigado, pode o transportador socorrer-se de outros intervenientes, v.g. os seus funcionários, ou entidades subcontratadas (art.º 367º do CCom).
Por outro lado, sobretudo no caso do transporte marítimo de mercadorias, é muito frequente a intervenção de uma terceira entidade, que não intervém na negociação nem na outorga do contrato de transporte, mas com importante intervenção na fase final da sua execução: o destinatário.
A qualificação tipológica deste tipo contratual não tem sido consensual, sustentando entre nós MENEZES CORDEIRO[37] que se trata de um contrato bilateral a favor de terceiro, e argumentando FRANCISCO COSTEIRA DA ROCHA[38] que se trata de um contrato trilateral assíncrono.
Como refere FRANCISCO COSTEIRA DA ROCHA[39], “(…) o contrato de transporte é um contrato triangular. (…) O contrato celebrado entre carregador e transportador não pode atingir o seu escopo sem a intervenção do destinatário, sem que o destinatário adira ao contrato. Por esta razão se afirma que o contrato de transporte nasce bilateral, mas potencialmente trilateral. (…)
O destinatário não é parte desde o início, porém desde o início existe a expectativa de que intervirá como parte. O contrato de transporte apresenta-se como um contrato inicialmente bilateral (celebrado entre carregador e transportador), aberto à adesão do destinatário; é celebrado na expectativa da adesão in itinere do destinatário. (…)”.
Esta tese, denominada da trilateralidade assíncrona, tem sido sustentada na jurisprudência nacional (em detrimento de outra tese que qualifica este contrato como um contrato bilateral a favor de terceiro) – cfr., entre outros, os acs. RL 22-06-2010 (Roque Nogueira), p. 1/08.0TNLSB.L1-7; RL 23-11-2011 (Teresa Albuquerque), p. 5849/04.2YXLSB.L1-2; RL 03-05-2012 (Aguiar Pereira), p. 43/09.9TNLSB.L1-6, RC 16-12-2015 (Manuel Capelo), p. 2308/13.6TJCBR.C1, RL 19-10-2017 (Ondina Carmo Alves), p. 79/12.2TNLSB.L1-2, e RL 15-12-2020 (Diogo Ravara), p. 175/17.0TNLSB.L1-7.
De qualquer modo, a doutrina vem salientando que a prestação típica do contrato de transporte de mercadorias se reconduz a uma obrigação de resultado, a saber, a deslocação dos bens do ponto de origem para um ponto de destino, com a inerente obrigação que impende sobre o transportador de entregar esse bens, íntegros, ao seu destinatário[40].
Tal entendimento foi igualmente manifestado no ac. RL 17-02-2005 (Granja da Fonseca), p. 837/2005-6.
Numa perspetiva mais abrangente, o conjunto das posições jurídicas dos três intervenientes neste tipo de contrato foi lapidarmente enunciada no já identificado ac. RL 19-10-2017 (Ondina Carmo Alves), p. 79/12.2TNLSB.L1-2 nos seguintes termos:
“São direitos do expedidor:
a)- A operação de deslocação da mercadoria de um local para outro, se proceda no tempo convencionado,
b)- Ter a disposição das mercadorias (artigo 380º, do Código Comercial), já que, em qualquer momento da execução do contrato, o expedidor pode dar novas ordens para o transportador, alterando o que, inicialmente, foi convencionado.
c)- A entrega das mercadorias seja feita ao destinatário no mesmo estado em que foram recebidas pelo transportador.
d)-Poder demandar contra o transportador em caso de incumprimento obrigacional, decorrente de perda ou avaria das mercadorias ou por atraso no cumprimento da prestação.
(…) deveres do carregador/expedidor:
a)- Entregar a mercadoria para o transportador no local convencionado.
b)- Efectuar o pagamento pela contraprestação do serviço (remuneração do transportador).
c)- Responsabilidade do transportador, mediante a descrição e individualização das mercadorias objecto do transporte, pelos danos resultantes de omissões ou incorreções sobre os elementos necessários à descrição das mercadorias e seus defeitos não declarados na embalagem e acondicionamento adequado das coisas a transportar, nos termos do artigo 4º do Decreto Lei 352/86 e também do artigo 3º, nº 5, da Convenção de Bruxelas.
(…) direitos do transportador:
a)- Recebimento da remuneração pela prestação do serviço de transporte (artigo 1º do Decreto Lei 352/86).
b)- Recebimento da mercadoria, objecto do contrato de transporte (artigo 3º, nº 3, da Convenção de Bruxelas).
c)- Apresentação de reserva no conhecimento de carga sobre o estado da mercadoria recebida (artigo 376º do Código Comercial e artigo 3º, nº 6, da Convenção de Bruxelas).
d)- Retenção da mercadoria enquanto não efetuado o pagamento do frete (artigo 390º do Código Comercial).
e)- Poder escolher o trajecto de deslocamento que melhor lhe seja conveniente, salvo estipulação em contrário.
(…) obrigações do transportador:
a)- Providenciar o deslocamento das mercadorias objecto do contrato de transporte de um lugar para outro, de forma incólume, no local e no tempo convencionado (artigos 383º a 385º do Código Comercial e artigo 4º, nº 1, da Convenção de Bruxelas), visto que é obrigação do transportador receber a mercadoria e entregá-la ao destinatário. Essa entrega pode ser: i) a bordo (compete ao destinatário as operações de descarga); ii) no cais (compete ao transportador descarregar a mercadoria); iii) no domicílio do destinatário (o transportador deve fazer as operações terrestres necessárias – descarga para o cais e subsequente transporte até o domicílio do destinatário).
b)- Emitir o conhecimento de transporte nos termos legais ou convencionados (artigo 369º do Código Comercial). Além de emitir o conhecimento, o transportador também tem a obrigação de verificar a exactidão das indicações que nele são apostas relativamente às mercadorias, em relação àquelas que, em razão da natureza e do acondicionamento das mercadorias e diante da modalidade técnica das operações de carga, seja possível o controle prévio pelo transportador (cfr. MÁRIO RAPOSO, Sobre o contrato de transporte de mercadorias por mar, Boletim do Ministério da Justiça (BMJ) 376, 1988, 36).
c)- Dever de informação que, em geral, resulta da boa fé na execução dos contratos (artigo 762º, nº. 2 do Código Civil). Na hipótese do transporte não se poder realizar ou estiver extraordinariamente em atraso, por caso fortuito ou força maior, deve o transportador avisar imediatamente o expedidor, podendo este rescindir unilateralmente o contrato, reembolsando o transportador pelo frete proporcional (artigo 379º, do Código Comercial) e restituindo a guia de transporte. O ónus da prova de que houve força maior é do transportador (artigo 383º do Código Comercial).
d)- Responsabilização pelas perdas e avarias das mercadorias e atrasos no cumprimento do contrato de transporte (artigos 377º, 383º e 384º do Código Comercial e artigos 3º e 5º da Convenção de Bruxelas).
(…) direitos do destinatário:
a)- Receber a entrega da mercadoria transportada, quando dispõe do título necessário, cabendo ao transportador fazer a prova dessa entrega (artigos 387º e 388º do Código Comercial). A entrega da mercadoria, para efeitos jurídicos, ocorre no momento em que o destinatário aceita a mercadoria transportada e entrega a declaração de recepção ao transportador, liberando-o, a partir daí, de qualquer risco sobre o objeto transportado.
b)- Verificar o estado da mercadoria transportada antes de seu recebimento (artigo 385º do Código Comercial).
c)- Disposição da mercadoria, como o expedidor, de forma alternativa (artigo 380º, § 2º do Código Comercial).
d)- Exigir a entrega da mercadoria transportada ou ressarcimento dos danos ocasionados por inadimplemento contratual (artigo 389º do Código Comercial).
(…) deveres do destinatário:
a)- Recebimento da mercadoria.
b)- Pagamento do preço, sendo o contrato de transporte um contrato bilateral entre o expedidor e o transportador, a questão que surge é a da possibilidade de ser cobrado o valor do frete ao destinatário e, se possível, em que condições.””
O contrato de transporte marítimo é regulado pela Convenção de Bruxelas, tornada direito interno pelo DL n.º 37748, de 1 de Fevereiro de 1950 e, subsidiariamente, pelo DL n.º 352/86, de 21 de Outubro, cujo art.º 1º estipula que “Contrato de transporte de mercadorias por mar é aquele em que uma das partes se obriga em relação à outra a transportar determinada mercadoria, de um porto para porto diverso, mediante uma retribuição pecuniária, denominada «frete»”.
Tal contrato está sujeito à forma escrita, consubstanciada num escrito particular denominado conhecimento de embarque ou conhecimento de carga (bill of lading, connaissement, Konossement, polizza di carico) – art.º 3º do referido diploma legal.
O conhecimento de carga ou bill of lading é central neste tipo de contrato, pois uma vez emitido e entregue pelo transportador ao carregador constitui um título representativo da mercadoria nele descrita - podendo ser nominativo, à ordem e ao portador - e é transmissível de acordo com o regime geral dos títulos de crédito – cf. art.ºs 3.° e 11.° do DL n.º 352/86, de 21 de Outubro.
O conhecimento de embarque ou de carga desempenha uma tríplice função: serve de recibo de entrega ao transportador de uma determinada mercadoria nele descrita; prova o contrato de transporte firmado entre carregador e transportador e respectivas condições; e representa a mercadoria nele descrita, sendo negociável e transmissível, de acordo com o regime geral dos títulos de crédito.
O carregador é a pessoa que celebra o contrato de transporte com o transportador, podendo, porém, socorrer-se de representantes e de auxiliares, seja para a celebração do contrato, seja para a entrega das mercadorias ao transportador, sem, por essa razão, perder o seu estatuto no contrato. Detém o direito de disposição sobre as mercadorias, independentemente da sua titularidade ou da relação subjacente ao contrato de transporte estabelecida entre o carregador e o destinatário, e o direito a que se proceda à deslocação destas. Em contrapartida, por regra, tem a obrigação de pagamento do preço do transporte.
O transportador é a pessoa que contratualmente assume a obrigação de deslocar a mercadoria (transportador contratual, que pode ou não coincidir com o transportador real).
O destinatário é a pessoa a quem deve ser entregue a mercadoria transportada, o que lhe confere a qualidade de interveniente principal no contrato de transporte.
A mercadoria entregue ao transportador só será entregue a quem se apresentar como destinatário contra o respectivo documento de transporte de que seja portador.
O contrato de transporte direcciona-se, precisamente, à entrega da mercadoria ao destinatário. Com efeito, tal contrato tem como causa ou está funcionalmente dirigido à entrega da mercadoria transportada ao destinatário, sendo, contudo, independente da relação jurídica que motiva a entrega.
Por regra, o contrato de transporte é independente das relações subjacentes entre o carregador e o destinatário, não podendo o transportador fazer apelo à relação subjacente entre estes últimos, nem estes possuem a faculdade inversa.
No entanto, há que realçar a existência de uma complementaridade funcional entre o contrato de transporte a relação que lhe subjaz, sendo que, por regra, um contrato de transporte é sequente a um contrato de compra e venda, no âmbito do qual as partes estipulam diversos aspectos, entre os quais, a obrigação de celebrar o contrato de transporte e pagar o respectivo preço – cf. Jorge Sinde Monteiro, Venda CIF, Contrato de Transporte Marítimo e Seguro de Carga; sobre a qualidade de “Segurado”, anotação ao acórdão do STJ de 22 de Junho de 2012, pp. 119[41] - “A compra e venda constitui o substrato ou fio condutor da teia de relações que se desenvolve à volta do transporte marítimo. Por seu turno, o transporte desempenha uma função instrumental indispensável para a execução da transacção internacional.”
Assim, quando estão em causa contratos internacionais – como é o caso – as partes recorrem muitas vezes aos denominados INCOTERMS®[42], ou seja, cláusulas contratuais de compra e venda que são identificadas por sigla, cujo conteúdo é definido pela Câmara de Comércio Internacional[43] e que dispõem sobre a entrega das mercadorias, a transferência dos riscos, repartição de custos e formalidades de documentação relativas à passagem das fronteiras.
Os termos comerciais constituem regras de interpretação e têm uma função de identificação de uma denominação comum e uma função de harmonização, ou seja, as partes ao se lhes referirem levam a que automaticamente todas as cláusulas que determinam as obrigações características sejam incorporadas no seu contrato, sendo que tal harmonização diz respeito apenas a algumas obrigações típicas do vendedor e do comprador, as que têm que ver com a entrega da mercadoria.
No contexto da venda internacional, o uso de “certas fórmulas consagradas” tem o significado directo e inequívoco de uma remissão para os Incoterms® – cf. Jorge Sinde Monteiro, op. cit., pp. 110-112.[44]
Porém, tratando-se de cláusulas de um contrato celebrado entre o vendedor (carregador) e o comprador (destinatário), não poderão, sem mais, vincular o transportador, embora não sejam dele totalmente cindíveis, podendo ter interesse para aferir quem deve pagar o preço do transporte e, por via disso, determinar quem pode ser responsabilizado pelas despesas complementares, designadamente aquelas que aqui estão em causa – cf. Francisco Costeira da Rocha, op. cit., pág. 161.
O contrato de compra e venda internacional de mercadorias e o contrato de transporte marítimo, sendo negócios independentes, estão naturalmente conexionados, sendo o primeiro a causa do segundo, de tal modo que algumas cláusulas daquele irão influenciar o contrato de transporte, desde logo, quanto a saber quem paga o preço deste, pelo que há que olhar à operação económica no seu conjunto.
A propósito do pagamento do preço do transporte existem duas modalidades: transporte pago (pelo carregador) e transporte a pagar. Relativamente a esta última suscitam-se dúvidas quanto a saber sobre quem recai a responsabilidade do pagamento.
Com efeito, se o preço do transporte deve ser pago depois da execução do transporte, será dele devedor o carregador, o destinatário ou ambos? O obrigado inicial há-de ser o carregador, tendo em conta que, inicialmente, o contrato de transporte é bilateral. No entanto, prosseguindo o contrato e dando-se a adesão do destinatário, o transportador poderá, a partir desse momento, exigir também dele o preço do transporte. Nesse caso, o carregador e o destinatário serão solidariamente responsáveis pelo pagamento do preço – cf. Francisco Costeira da Rocha, op. cit., pág. 175.
E é assim, independentemente de convenção das partes, porquanto nos termos do art.º 390º do Código Comercial, o transportador não é obrigado a fazer a entrega dos objectos transportados ao destinatário enquanto este não cumprir aquilo a que for obrigado, isto é, se não pagar o preço do transporte, a armazenagem e demais despesas acessórias devidas ao transportador ou a soma do reembolso[45], quando a expedição for feita com este encargo.
Importa recentrar a questão que cumpre dilucidar e que tem que ver, em concreto, com as despesas atinentes a demurrage/detention e storage e, bem assim, destruição da mercadoria e limpeza dos contentores – apurou-se que a autora proporcionou à ré a fruição dos dez contentores fornecidos pelo transportador marítimo, onde foi acomodada a carga, o que há-de ter sido considerado no preço do transporte; para além disso o transportador assegurou a sua utilização/ocupação no porto de destino e a sua armazenagem desde o desembarque até à destruição da carga, tendo cobrado a retribuição devida à autora[46] –, para aferir, no caso, sobre quem recaía o dever de pagar o preço do transporte e sobre quem deve recair a obrigação de pagar tais despesas.
Sobre a relação entre o fornecimento dos contentores, sua utilização e ocupação e o contrato de transporte, a sentença impugnada discorreu de maneira certeira e fundamentada, nos seguintes termos:
“A cedência temporária das unidades de carga utilizadas no transporte marítimo de mercadorias mediante o pagamento de uma retribuição é indiscutivelmente um aluguer. Porém, ela motiva a questão de saber se corresponde a uma obrigação acessória do transportador-armador ou antes a uma verdadeira locação de bens móveis. A interrogação é pertinente, pois se se tratar de uma prestação ancilar a responsabilidade do transportador marítimo e dos interessados da carga repousará a título principal no regime decorrente da Convenção de Bruxelas de 1924 e do DL n.º 352/86; se consistir numa obrigação principal, aplicar-se-lhe-á a disciplina do direito (comercial/civil) comum. […]
[…] parece inegável que nem todo o transporte marítimo é contentorizado e que os interessados na carga (carregador ou destinatário) até podem alugar um módulo de transporte a um terceiro tendo em vista a deslocação das mercadorias.
Porém, quando o transportador coloca à disposição do interessado na carga um contentor, essa concessão – que é sempre remunerada, não obstante poder ser englobada no frete – surge em suporte de uma outra operação mais vasta, que é justamente a do transporte das mercadorias. Na verdade, e salvo casos muito pontuais, é inconcebível que o transportador ceda um contentor ao seu cliente sem considerar transportá-lo. Por isso, na lógica do transportador, a locação do contentor é uma prestação acessória e indispensável ao transporte. Acessória, pois o objecto principal do contrato é antes de mais a deslocação da mercadoria. Indispensável, dado que a normalização (ou estandardização) do transporte marítimo impõe em larga medida a utilização do contentor como um meio/objecto necessário à consolidação das mercadorias e que a sua utilização não pode ser evitada a partir do momento em que o transporte foi reservado para um navio porta-contentores integral.
Ainda assim, o aprovisionamento de contentores pelo transportador marítimo não deixa de ser totalmente independente da operação de transporte propriamente dita, pois a duração de tal cedência começa bem antes das operações de embarque e estende-se para além do desembarque da mercadoria. Numa outra significação, pode dizer-se que o fornecimento de módulos de carga extravasa os marcos temporais que delimitam a deslocação marítima dos mesmos. Neste contexto, parece indiscutível que a locação dos contentores e o seu transporte procedem de dois contratos distintos, não obstante o primeiro poder estar formalizado no documento que substancia o segundo (conhecimento de embarque ou instrumento equivalente) e o aluguer diluir-se no frete.
Em suma, a cedência de contentores pelo transportador marítimo redunda num contrato de locação, acessório mas autónomo. Esta qualificação tem reflexos importantes no regime de tal negócio.
O primeiro é o de que o fornecimento do contentor sujeita-se unicamente ao regime do transporte marítimo durante o arco temporal abrangido pela disciplina imperativa deste contrato. Ou seja, enquanto a deslocação da mercadoria estiver sob a pala da regulamentação injuntiva do transporte marítimo, as regras da locação passaram para um plano secundário, não se aplicando prioritariamente à cedência do contentor, valendo aqui a máxima de que o acessório deve seguir o principal. Isto significa, designadamente, a existência de uma presunção de responsabilidade do transportador pela avaria/danificação/destruição do contentor locado durante a deslocação marítima da carga (art.ºs 2.º, 3.º, § 1.º, 2.º e 8.º, e 4.º da Convenção de Bruxelas), a qual apenas é passível de ser afastada mediante a demonstração de um dos casos legalmente exceptuados, e a possibilidade de o mesmo poder limitar a sua responsabilidade (art.º 4.º, § 5.º, da mesma Convenção).
O segundo traduz-se na aplicação das regras da locação aos períodos que transcendem o transporte marítimo propriamente dito e que este jamais quis regular, daqui decorrendo o carácter autónomo do aluguer de contentores. Por isso, desde que a colocação à disposição de um contentor seja considerada na sua vertente de fornecimento de um bem para além do seu aspecto de acessório do transporte, é o regime próprio da locação que autonomamente que deve ser considerado.
[…]
Uma vez desembarcados, os contentores são transportados para a zona terrestre do porto – habitualmente designada de parque – através de veículos internos (os quais podem ser camiões convencionais ou veículos automatizados), sendo residuais os casos em que a sua descarga directa acaba por acontecer.
Chegados ao parque, os contentores são armazenados e empilhados numa acção denominada de «parqueamento» e ficam a aguardar o seu levantamento. […]
A armazenagem dos contentores na área de parqueamento reconduz-se à figura típica do depósito, pois o módulo de transporte é desembarcado e entregue ao terminal para que este o guarde e entregue quando lhe for exigido (art.ºs 403.º e ss. do CCom e 1185.º e ss. do CC). Note-se que tal depósito tem como partes o transportador (depositário) e o interessado na carga (depositante). O facto de a actividade material de custódia ser levada a cabo pelo terminal apenas dá azo a um subdepósito (no qual o transportador surge com a veste de depositante e o operador portuário com a de depositário) e sem que tenha qualquer reflexo na definição dos direitos e deveres das partes do depósito principal. […]
Os atrasos no levantamento dos contentores e na sua restituição ao transportador, relativamente aos tempos acordados, oneram o interessado na carga relapso no pagamento dos custos de imobilização/retenção e armazenagem, respectivamente, ambos consagrados pelas partes do contrato de transporte ajustado. […]
Os armadores «de frete contentorizado» passaram, assim, a cobrar toda a utilização da unidade de transporte para além do tempo acordado, exigindo dos interessados na carga o pagamento de uma importância para o levantamento e/ou restituição tardia(s) do contentor que foi utilizado na deslocação marítima das suas mercadorias.
A equiparação entre as sobre-estadias do navio e as «sobre-demoras» do contentor deve ser tida como normal, pois ambas se referem a uma realidade comum: o atraso na devolução do bem disponibilizado por uma parte à outra com o propósito de transportar uma carga determinada.
Porém, tal não significa que sobre-estadias e «sobre-demoras» estejam sujeitas ao mesmo regime jurídico, pois, como se viu, a disponibilização do contentor por banda do transportador marítimo radica numa verdadeira locação e engendra ainda um depósito.
A locação é sempre onerosa: o aluguer do contentor, incluído dissimuladamente no frete, garante a retribuição do gozo da unidade de transporte desde o seu levantamento na origem até ao termo do decurso do período que habitualmente o transportador marítimo concede no destino aos interessados na carga para, após o desembarque, lhe devolverem o contentor. Esta dilação no destino (apelidada na gíria de free time) visa fundamentalmente permitir o desembaraço aduaneiro das mercadorias e a obtenção do meio terrestre de transporte do contentor desde o parque do terminal até ao destino final a fim de o mesmo aí ser «desovado». Mas uma vez ultrapassada, permite ao transportador-locador exigir uma quantia diária pré-estabelecida, a qual, para além de poder ser contabilizada desde o primeiro dia de free time e continuar a remunerar a fruição do contentor, tem ainda como fim recuperar uma parte do custo do tempo de inactividade do módulo de transporte e compelir à libertação rápida do mesmo para que a sua exploração seja maximizada. Tal quantia diária, que se denomina de demurrage (quando se refere ao período que antecedeu o levantamento do contentor) ou detention (caso respeite ao atraso na devolução do módulo de transporte), tem assim a natureza de um verdadeiro aluguer.
O depósito do contentor é tendencialmente gratuito para o interessado na carga, o qual dispõe de um free time para tratar do desembaraço e transporte terrestre do módulo para o destino final. Durante este período («de carência»), o contentor fica armazenado e à guarda do terminal – embora por incumbência do transportador – sem qualquer custo que não tenha já sido reflectido no frete. Uma vez ultrapassada tal dilação, o terminal debita uma quantia diária pré-estabelecida ao transportador marítimo [no âmbito do (sub)depósito que ambos ajustaram entre si], a qual pode retroagir ao momento fixado para o início do cálculo dos dias livres e depois é por aquele repercutida ao interessado na carga nos termos que ambos convencionaram livremente (no depósito que negociaram) aquando ou por causa do transporte. Tal importância é habitualmente conhecida no meio marítimo como «storage».”
No sentido da natureza jurídica da demurrage como contrato de locação associado ao transporte marítimo, mas autónomo, pronunciou-se também o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-10-2017, processo n.º 79/12.2TNLSB.L1-2, onde se explana o seguinte
“O contentor, seja qual for a modalidade de transporte utilizado (marítimo, rodoviário ou ferroviário), pode pertencer tanto ao próprio armador, o qual constitui parte ou acessório do veículo transportador, ou pode mesmo ser arrendado ou adquirido pelos próprios interessados, para serem utilizados no transporte de suas cargas.
Pertencendo ou não ao armador, é sabido que o contentor deve ser retirado, pelo destinatário (ou expedidor/destinatário) após a conclusão do transporte, devendo ser devolvido no prazo estipulado, sob pena de este incorrer no pagamento de sobrestadia (demurrage), devida justamente pelo atraso na devolução do equipamento.
A expressão “demurrage” vem a ser consagrada no ramo de comércio internacional para designar a remuneração devida ao transportador marítimo pela continuação da utilização de contentores e a não devolução desse equipamento no prazo de utilização estipulado.
Tal cobrança tem como princípio a devolução dos contentores fora do prazo contratualizado, sabendo-se que os mesmos são essenciais para a realização de novos transportes, sem os quais os armadores precisam alterar a sua logística e incorporar novos equipamentos para atender às suas solicitações, deslocando contentores vazios de outros portos ou mesmos países.
Importa, todavia, ter em consideração que os conceitos de “demurrage” e “free time” não são coincidentes.
O free time, há muito utilizado em todos os transportes marítimos de mercadorias, refere-se ao período livre para utilização do contentor pelo destinatário da carga, durante o qual não há incidência de demurrage, período de pode variar, dependendo da negociação acordada entre as partes contratantes.
É certo que a natureza jurídica da demurrage não tem sido unívoca.
Pode considerar-se que se trata de uma cláusula acessória do próprio contrato de transporte marítimo (cláusula penal), ou, ao invés, de um contrato associado ao contrato de transporte marítimo, mas autónomo, de locação.
[…] o fornecimento de contentores, que sempre se traduzirá num aluguer, poderá considerar-se incorporado no regime do transporte marítimo durante o estrito período de deslocação da mercadoria, a que se reporta o disposto no artigo 1º, alínea e) da Convenção de Bruxelas, e artigo 23º, nº 1 do Decreto-Lei 352/86, podendo embora o período do free time se encontrar diluído no frete acordado.
Findo este prazo, o destinatário da carga passa a incorrer em sobrestadia, denominada demurrage, que se traduz, como acima se referiu, na cedência de contentores para além do aludido período, e no qual terá aplicação as regras da locação, portanto, alvo de remuneração (artigos 1022º e 1023º do C.C.). Já quanto à armazenagem será aplicável as regras do depósito, neste caso oneroso (artigos 1185º do C.C. e 403º e ss. do C.Comercial).”
Na sentença recorrida considerou-se que a ré não era responsável pelo pagamento das despesas em causa, considerando que a demurrage/detention e storage constituem um acessório do frete, pelo que, tendo o preço do transporte sido pago na origem pelo carregador, recairia sobre o destinatário o pagamento de tais custos.
Além disso, porque a ré tudo fez para que a mercadoria fosse entregue ao destinatário, não tendo a falta de levantamento ficado a dever-se a razões que lhe sejam imputáveis (não tendo averiguado se o importador poderia receber a mercadoria no destino, mas tendo se socorrido da autora para efectuar a expedição, caberia a esta informá-la sobre essa matéria e assessorá-la nesse ponto), e porque o negócio subjacente ficou sujeito ao Incoterms® CIF, pelo que caberia ao importador o desembaraço da mercadoria no destino.
Mais se referiu que a autora não provou que a ré, de acordo com o contrato de transporte, era responsável pelo pagamento das quantias em causa.
No que a este último aspecto diz respeito, cumpre notar que, efectivamente, nada se apurou quanto às cláusulas que regeram o contrato de transporte marítimo, para além de a análise do conhecimento de embarque[47] permitir apurar que o preço do transporte estava pago à partida, pelo expedidor, face à menção nele existente de Freight Prepaid[48]DTHC prepaid[49].
Certo é que a autora não deixou de alertar sistematicamente a ré para os custos na demora no levantamento da mercadoria e devolução dos contentores e, bem assim, para as quantias cobradas no porto de destino pela armazenagem dos contentores.
Note-se que o navio chegou ao porto de destino a 18 de Março de 2018 e nessa mesma data os contentores foram descarregados para o respectivo terminal – cf. ponto 31..
A MSC foi comunicando à autora o valor das imobilizações e parqueamento dos dez contentores e esta, por sua vez, comunicou à ré Eco-Modus tais montantes, solicitando urgência na solução do problema da falta de levantamento da mercadoria, que por sua vez interpelou a Hoahg Ming Phat para que diligenciasse pelo rápido levantamento dos contentores – cf. pontos 38. a 40. dos factos provados.
No entanto, os contentores nunca foram levantados no destino, seja pela Hoahg Ming Phat, ou por outro destinatário, vindo a autora a ser informada pela MSC que o consignatário estava sobre investigação por parte da Alfândega e Polícia Vietnamitas e que a mercadoria iria ser destruída, como foi responsabilizando-a pelos pagamentos valores descritos em 48. e solicitando o seu pagamento.
Está, assim, em causa a responsabilidade pela demora na libertação dos contentores cedidos pela transportadora MSC, solicitados pela autora no contexto do contrato de expedição que celebrou com a ré, ou seja, há que apurar se a ré violou uma qualquer obrigação sua de libertar os contentores cedidos no âmbito do contrato de transporte celebrado pela autora, por conta dela.
É sabido que o conhecimento de embarque faz prova do contrato de transporte firmado entre o carregador e o transportador e das respectivas condições/conteúdo – cf. Francisco Costeira da Rocha, op. cit., pág. 124; acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 5-06-2017, processo n.º 667/14.2T8MTS.P1.
Ora, a autora não alegou ou demonstrou, para além dos elementos constantes do das folhas que constituem o conhecimento de embarque e que juntou aos autos, quais as demais cláusulas que se aplicavam neste concreto contrato de transporte.
Note-se que, por regra, o contrato de transporte marítimo apresenta-se como um contrato standard (contrato de adesão), assentando sobre cláusulas contratuais gerais. Como refere Francisco Costeira da Rocha, “Não surpreende que seja assim porquanto o direito dos transportes não é, nem nunca foi, alheio à aceleração da história, nem à interpenetração entre direito e realidade social, nem à padronização negocial imposta pelo dinamismo inerente à actividade económica em geral e dos transportes em especial. Embora subsistam contratos de transporte com cláusulas especificamente negociadas, o mais frequente é o recurso a um clausulado tipo. De tal forma que, segundo alguma doutrina, a principal divisão do contrato de transporte operar-se-ia entre contratos standard e contratos negociados” – cf. O Contrato de Transporte de Mercadorias, pp. 37-38 apud acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 8-10-2009, processo n.º 47/08.9TNLSB.L1-6.
É sabido também que muitas vezes os conhecimentos de embarque contêm uma cláusula em que se faz recair sobre os diversos intervenientes uma responsabilidade solidária por todas as despesas ou danos decorrentes do contrato de transporte (definindo-se o responsável – merchant – como incluindo o afretador, o carregador, o recebedor, o expedidor, o consignatário, o titular do Conhecimento de Embarque, o proprietário da carga e qualquer pessoa com direito a posse da carga).
Sucede que a autora não fez juntar aos autos os termos e condições do conhecimento de embarque MSKUKQ296259, pelos quais se regeria o contrato de transporte em referência, pelo que não alegou ou provou que a ré, expedidora, em conformidade com as condições aplicáveis ao contrato de transporte que celebrou por conta desta, fosse responsável pelo pagamento de tais despesas.
Por outro lado, tendo o preço do transporte sido pago no porto de partida, pelo expedidor, tal está em consonância com a menção efectuada na decisão recorrida de que o negócio subjacente que justificou a celebração do contrato de transporte estaria sujeito ao Incoterms® CIF.
Com efeito Incoterm CIF - sigla que em inglês representa Cost Insurance and Freight - é o termo que define as obrigações relacionadas a Custo do seguro e do frete tendo o porto de destino nomeado. No Incoterm CIF, a responsabilidade do transporte ao porto, sua alocação no navio e os custos do frete ao porto de destino é do vendedor. Além disso, também cabe-lhe a ele o desembaraço das mercadorias no momento da exportação e o pagamento pelo seguro no transporte principal. Por sua vez, ao comprador competirão as responsabilidades de recebimento da mercadoria no porto de destino e todas as despesas de transporte e riscos a partir dali.
Na categoria C onde está incluída a sigla CIF, o vendedor deve providenciar o contrato de transporte (transporte principal pago), sem assumir riscos com a perda ou custos adicionais decorrentes de eventos posteriores à expedição. Ao contratar, o vendedor compromete-se a fornecer o transporte e o seguro, tanto quanto a mercadoria – cf. Jorge Sinde Monteiro, op. cit., pp. 116-117.
Sendo assim, tendo presente que a demurrage/detention e storage implicam custos associados ou acessórios ao transporte, mas que se regem pelas normas aplicáveis à locação e depósito, pois que o aluguer em causa apenas se deve considerar incorporado no regime do transporte marítimo e abrangido pelo preço acordado (incluindo o free time), durante o estrito período de deslocação da mercadoria – cf. art.º 1º, e) da Convenção de Bruxelas: “abrange o tempo decorrido desde que as mercadorias são carregadas a bordo do navio até ao momento em que são descarregadas” e art.º 23º, n.º 1 do DL 352/86, de 21 de Outubro -, estando o preço do transporte pago pela ré ao momento da partida (e, bem assim, os custos atinentes ao desembarque), não estando demonstrada a estipulação de uma qualquer cláusula que a responsabilizasse pelo pagamento das despesas subsequentes ao desembarque e advenientes da demora da libertação dos contentores, tem de reconhecer-se razão à decisão recorrida quando conclui que será o consignatário o responsável pelo respectivo pagamento.
De igual modo, os factos apurados não permitem imputar à ré qualquer falha na libertação dos contentores, tanto mais que, estando em causa uma venda CIF a vendedora apenas é responsável pelo desembaraço das mercadorias na exportação, recaindo sobre o comprador o dever de assegurar o recebimento da mercadoria no porto de destino, com o cumprimento das regras que ali se mostrarem aplicáveis (note-se que também não há que fazer recair sobre a autora a responsabilidade pelo apuramento das restrições existentes no país de destino à importação das mercadorias expedidas, porquanto, não obstante ser responsável, no âmbito do contrato de expedição, pelos trâmites e formalidades legalmente exigidos no trânsito das mercadorias, admitindo que a compra e venda subjacente ao contrato de transporte necessário à execução da transacção internacional esteve sujeita ao Incoterms® CIF tal significa que o desembaraço da mercadoria à chegada, sempre competiria ao comprador, para além do que não resultou provado que a destruição da mercadoria se deveu à impossibilidade legal de ingressar no país de destino, sabendo-se apenas que o destinatário estava a ser alvo de investigação – cf. pontos 46. e 49.).
Em síntese:
* Estando pago o preço do transporte pela ré, ao momento da partida da mercadoria, as questões de desalfandegamento no porto de destino competiam ao consignatário, pelo que a demora na libertação dos contentores não é imputável à ré;
* A autora não demonstrou que o contrato de transporte que celebrou com a MSC, por conta da ré, incluía uma qualquer cláusula que a responsabilizasse, enquanto expedidora/carregadora, pelo pagamento de demurrage/detention e storage;
* O fornecimento dos contentores – solicitados pela autora à MSC no contexto do contrato celebrado com a ré – e a estipulação de free time no destino estão abrangidos pelo âmbito do contrato de transporte a celebrar, sendo que o seu custo já está reflectido no preço do transporte pago pela ré, daí não decorrendo qualquer responsabilidade desta pela ultrapassagem do período fixado, recaindo sobre o comprador a obrigação de recolher a mercadoria afastando os impedimentos legais que se lhe colocassem no porto de destino.
Assim, ao contrário do propugnado pela apelante, não competia à ré pagar os custos em referência, pelo que não pode pretender fazer repercutir na esfera jurídica desta os valores que despendeu para o efeito.
Não sendo imputada à ré qualquer responsabilidade na demora da libertação dos contentores, também, como é evidente, não lhe pode ser imputada qualquer responsabilidade pelos prejuízos que a autora suportou, seja quanto às mencionadas despesas, seja quanto aos lucros cessantes que invocou.
Face à improcedência da apelação deve manter-se inalterada a decisão recorrida, resultando prejudicada a apreciação do abuso de direito que a apelada veio suscitar nas suas contra-alegações (art.º 608º, n.º 2 ex vi art.º 663º, n.º 3 do CPC).
*
Das Custas
De acordo com o disposto no art.º 527º, n.º 1 do CPC, a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito. O n.º 2 acrescenta que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Nos termos do art.º 1º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais, considera-se processo autónomo para efeitos de custas, cada recurso, desde que origine tributação própria.
A apelante decai integralmente quanto à pretensão que trouxe a juízo, pelo que as custas (na vertente de custas de parte) ficam a seu cargo.
*
IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam as juízas desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em julgar improcedente a apelação, mantendo, em consequência, a decisão recorrida.
As custas ficam a cargo da apelante.
*
Lisboa, 30 de Maio de 2023
Micaela Marisa da Silva Sousa
Cristina Silva Maximiano
Alexandra Castro Rocha
_______________________________________________________
[1] Adiante designada pela sigla MSC.
[2] Adiante designada pela expressão Convenção de Bruxelas, publicada no Diário de Governo I Série n.º. 128 de 2/6/1932.
[3] Adiante designado pela sigla CPC.
[4] Acessível na Base de Dados do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, em www.dgsi.pt, onde se encontram disponíveis todos os arestos adiante mencionados sem indicação de origem.
[5] Cf. Identificação Citius (Doc. 7) Ref. Elect. 139604.
[6] Com a seguinte tradução livre: "Caro Senhor. Fomos informados de que neste momento tem 32 contentores da EcoModus parados nos portos dos terminais do Vietname. Por favor, verifique a lista completa:
IR02510 -2xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
IR02518- 5xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
IR02521-5xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
IR02550-10xcnts-PMai-MSC
IR02560-1xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-MSC
IR02610-2xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-Cosco
IR02614-7xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-K-Line
E chegarão muito em breve mais 14 contentores de EcoModus
IR02615-5xcnts-Trinh Nghien Jcs Company-MSC -ETA HAIPHONG 26/05/2018
IR02624-2xcnts-Trinh Nghien Jcs Company- MSC -ETA HAIPHONG 26/05/2018
IRO 2634-5xcnts-MaiT-MSC-ETA CAT LAI 26/05/2018
Nota: Precisamos urgentemente de ter uma carta de autorização do MSC Vietname a dizer que podemos carregar. Porque neste momento a MSC não está a dar reservas à EcoModus por causa de tantos contentores não recolhidos no Vietname…”
[7] Com a seguinte tradução livre: “Cara Senhora
IR02510 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => será levantado esta semana
IR02518 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => foi levantado
IR02521 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => foi levantado
IR02550 -10x cnts - PMai - MSC => será levantado na quinta-feira esta semana
IR02560 - 1x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC => será levantado na quinta-feira esta semanda
IR02610 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - Cosco => será levantado na quinta-feira esta semana
IR02614 - 7x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC => será levantado na quinta-feira esta semana
IR02615 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 => Conferimos ETA
HAIPHONG: 03/06/2018
IR02624 - 4x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 => Conferimos ETA
HAIPHONG: 03/06/2018
IR02634 - 5x cnts - MaiT - MSC - ETA CAT LAI 26/05/2018 => => Conferimos ETA HAIPHONG: 23/05/2018
Espero ter notícias suas em breve…”
[8]
[9] Com a seguinte tradução livre: “Cara senhora, Desculpe, houve um erro, reenviamos as informações de recolha dos contentores da seguinte forma:
IR02510 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => será levantado esta semana
IR02518 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => foi levantado
IR02521 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - K-line => foi levantado
IR02550 - 10x cnts - PMai - MSC => será levantado na quinta-feira desta semana
IR02560 - 1x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC => será levantado na quinta-feira desta semana IR02610 - 2x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - Cosco => será levantado na quinta-feira desta semana IR02614 - 7x cnts - Trinh
Nghien Jcs Company - MSC => será levantado na quinta-feira desta semana
IR02615 - 5x cnts - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 => conferimos ETA HAIPHONG: 03/06/2018
IR02624 - 4x cias - Trinh Nghien Jcs Company - MSC - ETA HAIPHONG 26/05/2018 —> conferimos ETA HAIPHONG: 03/06/2018
IR02634 - Sx cnts - MaiT MSC - ETA CAT LAI 26/05/2018 => => conferimos ETA CAT LAI: 23/05/2018”
[10] Com a seguinte tradução livre: "Caros. Por favor actualize-nos sobre cargas no Vietname à espera de serem levantadas. Precisamos de datas confirmadas, pois as últimas não foram reais. Verifiquei no sistema e todos os contentores mencionados ainda se encontram armazenados no porto.
Por favor, responda-nos sobre:
Contentores nos portos de Haiphong
IR02550+IR02551-10xcnts-PMai-MSC
IR02615-5xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
IR02624-4xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
Contentores no Porto Cat Lai - 17X40'HC
IR02510-2xcnts-Tring Nghien Jcs Company-K-Line
IR02560-1xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
IR02610-2xcnts-Tring Nghien Jcs Company-Cosco
IR02614-7xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC-
IR02634-5xcnts-MaiT-MSC-
Aguardando a sua rápida resposta….”
[11] Com a seguinte tradução livre: "Cara Senhora. Veja como segue: Contentores em Haiphong Port- 19x40'HC
IR02550+IR02551-10Xcnts-PMai-MSC="Quarta-feira da próxima semana
IR02615- 5Xcnts-Tring Nghien Jcs Company-MSC=" O Sr. T... pagará 70% do saldo na terça-feira ou quarta-feira da próxima semana
IR02624- 4Xcnts - Tring Nghien Jcs Company-MSC=" Quarta-feira da próxima semana
Contentores em Cat Lai Port- 17X40'HC :
IR02510-2Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- K-Line="Quinta-feira da próxima semana
IR02560-1Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- MSC="Quinta-feira da próxima semana
IR02610-2Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- Cosco="Quinta-feira da próxima semana 19
IR02614-7Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- MSC="Quarta-feira da próxima semana
IR02634-5Xcnts- Trinh Nghien Jcs Company- MSC="Quarta-feira da próxima semana
Pls BL revisto de IRO2615&IRO2624 e verifique o correio que solicitámos hoje. Espero notícias em breve..."
[12] Com a seguinte tradução livre: “Caro T…. Enviamos um resumo de todos os contratos em relação aos quais aguardamos uma actualização da sua parte. Tenha presente que é necessária uma solução urgente, uma vez que alguns destes contentores já se encontram no porto de destino há bastante tempo. Temos todas as companhias de navegação e transitários a pressionar-nos para uma resposta sobre quando serão estes contentores desalfandegados. Por favor, actualize cada contrato abaixo em conformidade:
Cliente: Sr. K…
Material: Iogurte PS
lR02384 -1 x cnt - BL 592710013772
IR02562-1 x cnt-BL62768
IR02564-3 x cnt - EL MSCU0T735328
IR02574 -1 x cnt - BL 592810002152
Cliente: Sr. T...
Material: Iogurte PS
IR02510 -2 x cnt - BL KKLULEH174806
lR02560 -1 x cnt - BL MSCUKQ318004
IR02590 -2 x cnt - BL C0SU4515845630
IR02610 -2 x cnt - BL C0SU4515864820
Material: LDPE FILM
lR02550 + lR02551 – l0x cnt - Rb MSCUKQ2962S9
lR02561- 5 x cnt - BL MSCUKQ318475
IR02565-5 x cnt - BL MSCUKQ322OB9
IR02614 -7x cnt - BL MSCUKQ363307
lR02615 -5 x cnt - BL MSCUKQ385425
lR02624 -4 x cnt - BL MSCUKQ386225
IR02634-5 x cnt - BL MSCUJKQ386241 22
Material: PP BB
IR02663 -2 x cnt - BL YMLUR570011703
IR02664 -2 x cnt - BL YMLUJR570011812
TOTAL Nº CNTS: 58
Aguardando a sua pronta resposta e actualização sobre todos os ficheiros.”
[13] Com a seguinte tradução livre: "Caro T…, Aguardamos a sua resposta. O Sr. K… pede-nos agora que troquemos de destinatário num dos BL. Está correcto? Qual deles e por favor enviem-me toda a informação correcta acerca do destinatário para que eu possa pedir a mudança urgentemente.”
[14] Com a seguinte tradução livre: "Caro T..., Precisamos realmente da sua actualização e solução para todos os contratos abaixo indicados. É muito urgente.”
[15] Com a seguinte tradução livre: "Caro T..., Obrigado pela sua actualização. IR02610 está terminado e resolvido. Actualizo a lista abaixo. Ainda temos muitos contratos/contentores no porto e precisamos de uma resposta sua sobre cada um deles. Por favor, responda o mais rapidamente possível sobre o seu e sobre os contentores do Sr. K…:
Cliente: Sr. K…
Material: Iogurte PS
lR02384-1 x cnt-BL 592710013772
IR02562-1 x cnt-BL62768
lR02564-3 x cnt-BL MSCU0T735328 25
lR02574-1 x cnt-BL 592810002152
Cliente: Sr. T...
Material: Iogurte PS
lR02510-2 x cnt-BL KKLULEH1748O6
IR02560-1 x cnt-BL MSCUKQ318004
IR02590-2 x cnt-BL C0SUJ4515845630
MateriaL LDPE FILM
IR02550+IR02551-10 x cnt-BL MSCUKQ296259
IR02561-5 x cnt-BL MSCUKQ318475
IR02565-5 x cnt-BL MSCUKQ322O89
1R02614-7 x cnt-BL MSCUKQ363307
IR02615-5 x cnt-BL MSCUKQ385425
IR02624-4 x cnt-BL MSCUKQ386225
IR02634-5 x cnt-BL MSCUKQ386241
Material: PP BB
IR02663-2 x cnt-BL YMLUR570011703
IR02664-2 x cnt-BL YMLUR570011812
TOTAL Nº CNTS: 56…..”
[16] Com a seguinte tradução livre: “"Caro T..., Ainda não temos qualquer resposta da sua parte relativamente à situação dos nossos contratos. Isto é muito urgente e é muito stressante não receber qualquer resposta sua. Há dois dias, enviou um e-mail dizendo que o IR02510 ia ser recolhido nesse dia (28/08/2018), mas verificámos hoje e ainda está no porto. Por favor, dê-nos algumas actualizações urgentes. TOTAL N2 CNTS: 56…”
[17] Cf. Identificação Citius (Doc. 8) Ref. Elect. 139604.
[18] Com a seguinte tradução livre: “todos os contentores hai phong Vou tomar conta, por isso, vou levantar em breve. Estou a discutir dinheiro com o governo. Vou levantar em breve.”
[19] Cf. Identificação Citius (Doc. 8) Ref. Elect. 139604.
[20] No sentido de anunciar a outrem ou a si próprio uma acção futura ou intenção de dar, cumprir, fazer ou dizer algo – cf. https://dicionario.priberam.org/promessa.
[21] Cf. Identificação Citius (Doc. 1) Ref. Elect. 139604.
[22] Cf. Identificação Citius (Doc. 6) Ref. Elect. 139604.
[23] Cf. Identificação Citius (Doc. 6) Ref. Elect. 139604.
[24] Com a seguinte tradução livre: “A empresa de transporte solicita todas as licenças válidas para este novo consignatário e também afirmaram que você tem uma factura de 40.000 usd no destino referente a este número de contrato.”
[25] Cf. Identificação Citius (Doc. 6) Ref. Elect. 139604.
[26] Cf. Identificação Citius (Doc. 6) Ref. Elect. 139604.
[27] Acessível na Base de Dados do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP em www.dgsi.pt, onde se encontram disponíveis os arestos ainda mencionados sem indicação de origem.
[28] “[…] «[n]ão porque tal preceito, expressamente, contemple a situação de sancionar como não escrito um facto conclusivo, mas, como tem sido sustentado pela jurisprudência, porque, analogicamente, aquela disposição é de aplicar a situações em que em causa esteja um facto conclusivo, as quais, em rectas contas, se reconduzem à formulação de um juízo de valor que se deve extrair de factos concretos objecto de alegação e prova, e desde que a matéria se integre no thema decidendum»”.
[29] Não se desconhecendo, contudo, a possibilidade de se afirmarem juízos que densifiquem e concretizem uma realidade de facto, conforme se retira do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-09-2017, relatora Fernanda Isabel Pereira, processo n.º 659/12.6TVLSB.L1-S1; no mesmo sentido, o Prof. Miguel Teixeira de Sousa, sustenta que a “chamada «proibição dos factos conclusivos» não tem hoje nenhuma justificação no plano da legislação processual civil; – cf. Matéria de facto; julgamento; “factos conclusivos”, Jurisprudência (785) 6-02-2018, acessível em Blog do IPPC https://blogippc.blogspot.com/search?q=jurisprud%C3%AAncia+%28785%29. No entanto, fá-lo referindo que tal como os temas de prova “não têm de (e, aliás, nem podem, nem devem) ser enunciados fora de qualquer enquadramento jurídico, também a resposta do tribunal à prova realizada pela parte não tem de ser juridicamente asséptica ou neutra” dando como exemplo que “sob pena de se cair num inaceitável formalismo, não pode constituir motivo de censura que o tribunal, depois de considerar provados determinados factos que consubstanciam a violação de deveres de cuidado, conclua que está demonstrada a negligência da parte”, o que revela que a afirmação de factos já com certa conotação jurídico-valorativa dependerá, contudo, da prova de factos que a suportem – cf. Jurisprudência (784) 5-02-2018, no referido Blog.
[30] Cf. Ref. Elect. 144583.
[31] Entrada do Blog IPPC de 25-05-2018, disponível https://blogippc.blogspot.com/search?q=valora%C3%A7%C3%A3o+declara%C3%A7%C3%B5es+parte.
[32]Acessível
http://www.trl.mj.pt/PDF/As%20declaracoes%20de%20parte.%20Uma%20sintese.%202017.pdf.
[33] Em sentido diverso, J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 3ª edição, pág. 309 – “A apreciação que o juiz faça das declarações de parte (se estas não constituírem confissão) é livre, nos termos do n.º 3; mas, como esta liberdade não equivale a arbitrariedade, a apreciação importará, as mais das vezes, apenas, como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas […]”.
[34] A mudança de destino final foi solicitada pela Eco-Modus, conforme ponto 15. dos factos provados.
[35] In Revista do CEJ 2º Semestre 2018 Número 2.
[36] Em que a ora relatora foi segunda adjunta.
[37] “Introdução ao Direito dos Transportes”, Centro de Direito Marítimo e dos Transportes da FDUL, I Jornadas de Lisboa do Direito Marítimo, Almedina, 2008, pp. 23 ss.
[38] “O contrato de transporte de mercadorias – Contributo para o estudo da posição jurídica do destinatário no contrato de transporte de mercadorias”, Almedina, 2000
[39] Ob. cit., p. 236.
[40] Cfr. MENEZES CORDEIRO, ob. cit., p. 24
[41] In Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 141º, N.º 3971 Novembro-Dezembro 2011.
[42] Significa, literalmente, termos (“TERMS”) comerciais (“CO”) internacionais (“IN”).
[43] Um esquema com o significado das siglas pode ser consultado na página da Câmara Internacional de Comércio – Delegação em Portugal em https://www.icc-portugal.com/images/WallChart_Incoterms2020.pdf.
[44] In Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 141º, N.º 3971 Novembro-Dezembro 2011.
[45] Consiste, normalmente, no preço da mercadoria transportada.
[46] Cf. Pontos 8., 14., 31., 38., 41., 42., 44., 45., 46., 47., 48. e 49. dos factos provados.
[47] Cf. Documento n.º 10 junto com a petição inicial.
[48] Frete pré-pago.
[49] Sigla correspondente a Destination Terminal Handling Charge, ou seja, corresponde aos encargos cobrados pelo porto de chegada ou porto de descarga para elevar o contentor para dentro ou fora do navio, que, no caso, também estavam já pagos.