ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
DIREITO DE REGRESSO DA SEGURADORA
PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
CITAÇÃO
Sumário


I - É de três anos o prazo de prescrição do exercício do direito de regresso pela seguradora relativamente ao pagamento da indemnização por ela satisfeita ao lesado de acidente de viação, por força do contrato de seguro celebrado com o lesante.
II - O dies a quo da contagem do prazo de prescrição previsto no art. 498º, nº 2, corresponde ao do pagamento, pois é a partir desse momento que o direito poderá ser exercido (art. 306º, nº 1, do CC).
III - Pode, no entanto, autonomizar-se o pagamento de cada parcela, desde que se esteja perante danos normativamente diferenciados, como é entendimento jurisprudencial reiterado.
IV - No caso vertente, a autora, para pagamento das quantias indemnizatórias que acordou com o lesado, contratou a favor deste um seguro de vida, cujo prémio importou o pagamento da quantia de € 500.000,00 em 01.06.2012, pelo que pelo menos nessa data tomou conhecimento do direito que lhe competia, podendo livremente exercê-lo, e de acordo com o referido entendimento jurisprudencial, «o último ato de pagamento que integre um mesmo núcleo indemnizatório juridicamente diferenciado de outros valores indemnizatórios», é precisamente aquele que importou o pagamento do prémio de seguro.
V - Nos termos do art. 323º, nº 2, do CC, se a citação (ou notificação) se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, têm-se a prescrição por interrompida logo que decorram cinco dias.
VI - A conduta do requerente só não exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação, sendo que a expressão «causa não imputável ao requerente», usada no art. 323º, nº 2, do CC, deve ser interpretada em termos de causalidade objetiva, só excluindo a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação
VII - No caso em apreço, não podendo a autora deixar de saber que a morada da residência do réu era aquela em que foi notificado no âmbito de uma notificação judicial avulsa anterior, e não na morada que a autora aí havia indicado, tinha a mesma de instaurar a ação indicando a morada onde o réu foi notificado e não a que indicou na notificação judicial avulsa.
VIII - Neste contexto, o comportamento da autora foi causa adequada do retardamento da citação, ou seja, da efetivação da citação muito para além dos cinco dias previstos no nº 2 do art. 323º do CC.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral


Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
Fidelidade - Companhia de Seguros, S.A. instaurou, em 10.07.2015, a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra AA, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 890.855,38, acrescida de juros de mora à taxa legal, até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, ter direito de regresso sobre o réu pelos montantes pagos a coberto de um contrato de seguro por responsabilidade civil automóvel, atenta a circunstância de o sinistro em apreço ter sido causado pelo réu que conduzia com excesso de álcool no sangue e consumo de estupefacientes.
Em 01.07.2016 foi proferida sentença que, face à ausência de contestação, considerou confessados os factos articulados pela autora na petição inicial e julgou a ação procedente, condenando o réu a pagar à autora a quantia de € 890.855,38, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
A autora deu à execução a sentença proferida[1].
O réu deduziu embargos invocando, além do mais, a falta de citação, tendo a oposição à execução sido julgada improcedente por sentença proferida em 04.07.2018.
Inconformado, o réu apelou do assim decidido, tendo este Tribunal da Relação de Évora, por acórdão de 06.12.2018, revogado a sentença, julgando procedente a oposição à execução e extinta esta.
Foi a vez da autora interpor recurso de revista, mas sem êxito, pois o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido em 06.06.2019, negou a revista e confirmou o acórdão recorrido.
Baixados os autos à 1ª instância, foi proferido despacho em 11.11.2019 a declarar renovada a instância e a determinar a citação do réu, requerida pela autora em 31.10.2019.
O réu contestou, negando que conduzisse com álcool no sangue em quantidade superior ao legalmente permitido ou sob a influência de produtos estupefacientes, e defendendo que o acidente se deveu à interceção com um veículo sem iluminação, que assustou o réu, pessoa inexperiente, com carta de condução há dois meses, que acabou por perder o controlo do veículo.
Mais invocou a prescrição do direito da autora, desde a interrupção ocorrida pela notificação judicial avulsa concretizada em 19.07.2012, isto quer se atenda ao prazo de três anos a que alude o nº 1 do art. 498º do CC, quer se tenha em consideração o prazo de cinco anos previsto no nº 3 do mesmo preceito, com referência ao crime de ofensa à integridade física, nos termos dos artigos 118.º, n.º 1, al. c) e 143.º do Código Penal, uma vez que a autora não requereu a citação urgente, e a razão da citação não ter sido realizada no prazo de cinco dias após instauração da ação ser-lhe imputável, por ter indicado uma morada que sabia não corresponder à do réu.
A autora respondeu à matéria de exceção, sustentando que o prazo de prescrição aplicável, de cinco anos, só começa a correr após o último pagamento efetuado ao lesado, nos termos do art. 498º, nº 2, do CC, pelo que estando a autora a liquidar pensão vitalícia ao lesado do acidente, a prescrição só ocorrerá com o decesso deste.
Mais aduziu a autora que a falta de citação nos cinco dias posteriores à instauração da ação não lhe é imputável, uma vez que não houve qualquer inércia da sua parte e a indicação de morada errada não se poder enquadrar na disposição legal em causa, uma vez que não tem obrigação de conhecer a morada correta, e pese embora o réu tivesse recebido a notificação judicial avulsa noutra morada, a autora não tinha como saber, à data da petição, qual a atual morada do réu, acrescendo que não tendo a missiva postal de citação vindo devolvida, criou na autora a legítima expectativa de que a citação era válida.
Com a concordância das partes foi dispensada a realização da audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção dilatória inominada “da não renovação da instância” e relegou para decisão final o conhecimento da exceção de prescrição do direito da autora, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, com reclamação de ambas as partes, a da autora totalmente procedente e a do réu totalmente improcedente.
Realizada a audiência de julgamento[2], foi proferida sentença que, julgando verificada a prescrição do direito da autora, julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu o réu do pedido.
Inconformada, a autora apelou do assim decidido, finalizando a respetiva alegação com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem:
«1. A presente ação apenas improcedeu por ter sido considerado prescrito o direito de regresso da recorrente, com o que esta não se conforma.
2. O prazo de prescrição foi atempadamente interrompido no dia 16.07.2015, por força do disposto no Artº 323 nº 2 CPC, que salvo o devido respeito o douto tribunal não interpretou corretamente.
3. A douta sentença recorrida ao julgar prescrito o direito da recorrente violou o disposto nos números 1, 2 e 3 do Artº 323º CPC, impondo-se a sua substituição por douto Acórdão que julgue validamente interrompida a prescrição e procedente a ação.
4. De todo o modo e sem conceder, não obstante a frustração da citação não prejudicar a anterior e atempada interrupção da prescrição, não se aceita que tal frustração se possa considerar imputável à recorrente, conforme entendeu o douto Tribunal a quo.
5. O direito de regresso que a recorrente aqui invoca é um direito novo, previsto no Artº 27º nº 1 c) do DL291/2007 de 21/8, que nasce com o cumprimento da obrigação, que se traduz no pagamento ao lesado e que conforme dispõe o nº 3 do Artº 498º C.Cv “prescreve no prazo de 3 anos, a contar do cumprimento (…)”,
6. Dado que a recorrente se obrigou ao pagamento de pensão mensal e vitalícia, a obrigação ainda não está integralmente cumprida, termos em que em bom rigor não iniciou ainda a contagem do prazo de prescrição.
7. Tal entendimento tem suporte em diversa jurisprudência, incluindo do Supremo tribunal de Justiça, no sentido de prazo da prescrição, para efeitos do disposto no art. 498.º, n.º 2, do CC, conta-se a partir do último pagamento realizado, seja no caso da indemnização ser paga por parcelas a um lesado, seja a diversos lesados em ocasiões diferentes. Estando, pois, a prescrição reportada ao cumprimento da obrigação de indemnização, por efeito do mesmo evento, é indiferente a autonomia que possa ser atribuída a qualquer uma das parcelas integrantes da indemnização"
8. Assim, em bom rigor, a prescrição do direito da recorrente só começará a correr a partir da morte do lesado BB, o que não ocorreu até à data, termos em que se impõe a revogação da douta sentença recorrida no que toca à prescrição.
9. Não obstante ter alegado a celebração de seguro consigo mesma no montante de € 500.000,00 para garantia de pagamento das pensões não torna ininteligível o pedido da recorrente, bem sabendo o douto tribunal que o direito de regresso nasce da entrega de cada uma das prestações ao lesado e não da constituição de tal garantia;
10. Ainda que o pedido suscitasse qualquer duvida, nos termos do Artº 5º nº 2 a) e b) CPC, concatenada a prova documental, documento 174 junto com a petição inicial, dos documentos junto pela recorrente por requerimento de 2/11/2022 e os depoimentos das testemunhas CC e DD, cujos depoimentos estão registados através do sistema de gravação digital, respetivamente entre as 15:41 e as 16:17 (minuto 00.22.30 a 00.26.39) e entre as 14:35 e as 15:20 (minuto 00.26.40 a 00.28.16), na sessão de julgamento do dia 3-11-2022, deveria ter sido diferente a mais clara a decisão da matéria de facto, cuja alteração se requer por forma a que os pontos e 60. e 61. da matéria de facto provada, tenham diferente redação e bem assim ser aditado um facto provado, por forma a refletir com clareza os termos do acordo celebrado entre a recorrente e o lesado, nos seguintes termos que importam à apreciação da questão da prescrição:
60. Para garantia do pagamento das quantias aludidas nos pontos 58.2, 58.3 e 58.4, a Autora contratou consigo mesma um seguro de vida “Rendas Vitalícias”, titulado pela apólice ...67, cujo prémio importou o pagamento da quantia de € 500.000,00 em 01 de junho de 2012.
60ºA A indemnização acordada entre a Autora e o lesado BB, relativa a assistência vitalícia, do dano biológico e do dano patrimonial futuro, consiste no pagamento pela A. ao lesado de pensão mensal, atualizável e vitalícia, fixada inicialmente em € 937,84/mês, que por força das atualizações nesta data atinge a quantia mensal de €1131,03.
60º B A primeira pensão foi paga em maio de 2012
61. Desde maio de 2012 até outubro de 2022, as pensões mensais vencidas e pagas pela Autora ao BB pensões, ascendem ao valor de € 138.101,93.
11. Com a alteração da matéria de facto nos termos supra explanados e tal como se disse supra, fica claro que a recorrente se obrigou perante o lesado, não ao pagamento de um prémio de seguro, que aquele não recebeu, mas antes ao pagamento de pensão que se vence e será paga vitaliciamente, e que apenas com o recebimento pelo lesado se renova mensal o sucessivamente o direito de regresso da recorrente, que como se disse, só pode ser exercido após pagamento ao lesado, por isso claramente o direito não prescreveu.
12. Termos em que a douta sentença recorrida deve ser substituída por douto acórdão que admita a alteração da matéria de facto nos termos ora requeridos, também neste ponto julgando procedente este recurso.
13. Ainda que assim não se entenda, o que não se concede, da conduta do Recorrido resultaram factos suscetíveis de integrar um crime de ofensas à integridade física, p.p. no Art.º 143 C.P. com pena de prisão até 3 anos. É consabido que os crimes com penas iguais ou superiores a 1 ano e inferiores a 5 anos, prescrevem no prazo de 5 anos, conforme decorre do Artº 118º nº 1 c) do C.P., beneficiando a Recorrente desse prazo, nos termos do disposto no nº3 do Artº 498º do C.Cv.
14. Salvo o devido respeito, afigura-se que o douto tribunal terá indevidamente aplicado o disposto no art.º 307º do C.Cv, que não terá cabimento nos autos.
Em qualquer caso, tratando-se de prestações periódicas, conforme decorre do. o prazo de prescrição corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga. Ora parece resultar inequívoco nos autos que a recorrente cumpre pontualmente os pagamentos a que se entra vinculada, termos em que ainda não teria começado a correr o prazo de prescrição.
15. Termos em que a apelação deverá merecer provimento, sendo revogada a douta sentença recorrida e substituída por douto Acórdão que condene a recorrida no pedido, assim se fazendo, JUSTIÇA!»

O réu contra-alegou, defendendo a rejeição do recurso por o mesmo ser extemporâneo e, a não ser assim entendido, a manutenção da sentença recorrida[3].

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões essenciais a decidir, atenta a sua precedência lógica, consubstanciam-se em saber:
- se deve ser alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto nos pontos indicados pela recorrente;
- se prescreveu o direito de regresso da autora, o que desdobra nas seguintes sub questões: i) prazo de prescrição aplicável; ii) início/reinício da sua contagem [dies a quo]; e iii) fim do prazo [dies ad quem].
- no caso de resposta negativa à precedente questão, se a autora tem direito a ser ressarcida pelo réu na quantia peticionada, a título de responsabilidade civil, por via do direito de regresso.

III – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos[4]:
1. Por notificação judicial avulsa, junta à petição inicial como documento n.º 177 [correspondendo a folhas 312 e seguintes dos autos físicos], e aqui dada por reproduzida, o Autor indicou como morada ao Réu, a Rua ..., São Teotónio.
2. No âmbito da notificação judicial avulsa aludida, o Réu foi notificado, em 19 de julho de 2012, na Rua ..., São Teotónio, tendo o Agente de Execução feito constar o seguinte: Esta diligência havia sido tentada pelas 11:30 h na morada indicada na notificação, desatualizada, sendo hoje: Rua ....
3. A petição inicial da presente ação foi apresentada no dia 11 de julho de 2015, tendo o Autor indicado, como morada ao Réu, a Rua ..., São Teotónio.
4. A missiva postal para citação do Réu foi recebida, em 02 de setembro de 2015, na morada indicada na petição e por EE.
5. O Réu não residia na morada indicada na petição.
6. Foi proferida sentença nos presentes autos que condenou o Réu no pagamento peticionado pela Autora.
7. A Autora, como exequente, instaurou por apenso aos autos execução contra o Réu, fundada na sentença proferida.
8. O Réu, como executado, foi citado na execução apensa aos autos no dia 07 de novembro de 2017.
9. O Réu deduziu oposição à execução, com fundamento na falta de citação na ação declarativa, julgada procedente por acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 06 de dezembro de 2018, confirmado por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 06 de junho de 2019, aqui dados por reproduzidos.
10. Por requerimento de 31 de outubro de 2019, aqui dado por reproduzido, a Autora requereu nos presentes autos nova citação do Réu.
11. Por despacho datado de 11 de novembro de 2019, aqui dado por reproduzido, foi declarada renovada a instância declarativa e anulado todo o processado posterior à falta de citação do Réu e determinada a citação.
12. O Réu foi citado em 06 de março de 2020, na Rua ..., São Teotónio.
13. A Império-Bonança – Companhia de Seguros, S.A., foi incorporada, por fusão, na Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, S.A.
14. No mesmo ato, a Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, S.A. alterou a sua denominação para Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A.
15. A responsabilidade civil emergente de acidentes causados pelo veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca “Audi”, modelo “A4 Diesel 1.9 TDI SPOR”, com a matrícula ..-..-QV, encontrava-se, em 15 de setembro de 2009, transferida para a Autora a coberto da apólice n º ...62.
16. No dia 15 de setembro de 2009, cerca das 02h00m, na Rua 25 de Abril, junto às bombas da CEPSA e ao supermercado Intermarché, na freguesia de São Teotónio, Concelho de Odemira, Distrito de Beja, ocorreu um acidente de viação, que envolveu o veículo QV, conduzido pelo Réu.
17. O local onde ocorreu o acidente situa-se no interior de uma localidade, sendo a velocidade máxima permitida de 50 km/h.
18. Naquele troço a via configura uma reta, tem a largura de 6,60m e dispõe de dois sentidos de trânsito com uma hemi-faixa de rodagem para cada sentido.
19. A via tem boa visibilidade.
20. O tempo estava bom e o piso encontrava-se seco e em bom estado de conservação.
21. O veículo QV circulava pela Av.ª 25 de Abril do sentido Largo do Rato/ centro de São Teotónio.
22. Naquele troço, a Avenida é ladeado por habitações e pelos dois estabelecimentos comerciais já referidos, a gasolineira “CEPSA” e o supermercado “Intermarché”, confinantes entre si, e que se localizam do lado direito da via atento o sentido de marcha do QV.
23. Atento o mesmo sentido de trânsito, a CEPSA antecede o supermercado.
24. Os dois estabelecimentos estão separados por um muro, pertença da gasolineira, que se situa entre o limite da área desta e o acesso ao parque de estacionamento do supermercado.
25. O veículo QV circulava na Rua 25 de Abril, sentido Largo do Rato/centro de São Teotónio.
26. E pretendia virar à direita a seguir à CEPSA, a fim de ingressar no estacionamento do Intermarché.
27. Porém, ao efetuar a manobra, subitamente e sem que nada o fizesse prever, o Réu perdeu o domínio do veículo QV.
28. Que entrou em despiste e já desgovernado ingressou na entrada do estacionamento do Intermarché.
29. Face à total ausência do controlo do veículo pelo Réu, foi embater violentamente com a sua lateral frente direita no muro da CEPSA que separa os dois estabelecimentos.
30. Após o embate, o veículo QV foi projetado cerca de 1,70m para a rua da qual provinha, onde acabou por se imobilizar, sensivelmente sobre o limite direito da via e o início do parque de estacionamento, com a frente direcionado para o centro de São Teotónio e a traseira para o Largo do Rato.
31. O Réu conduzia sendo portador de 30ng/ml da substância de 11-nor-9-carboxi-D9-tetrahidrocanabinal.
32. O Réu conduzia sendo portador de uma taxa de álcool no sangue de 0,16 g/l.
33. O Réu conduzia sem se encontrar na posse de todas as suas faculdades mentais e psíquicas, estando a sua capacidade de concentração e reação afetadas pela influência do estupefaciente que tinha consumido, o que foi causa do acidente.
34. Emergente do acidente, correu no extinto Juízo de Competência Genérica de Odemira, o processo sumaríssimo com o nº 26/10.6GGODM em que o ora Réu, foi condenado por sentença já transitado em julgado, como autor material de um crime de condução de veículo sob a influência de estupefaciente ou substâncias psicotrópicas, nos termos da sentença junta sob o requerimento datado de 28 de abril de 2016 [ref.ª 22506768; correspondente a folhas 341 e seguintes dos autos físicos], aqui dada por reproduzida.
35. No QV, além do Réu, era transportado, na frente, à direita do condutor, na zona de maior impacto, BB.
36. Com efeito, em consequência direta e necessária do acidente, BB ficou em estado de coma, tendo sofrido entre outras lesões, traumatismo crânio-encefálico grave – score 4, fratura do externo com contusão pulmonar, múltiplas fraturas dos membros e face.
37. Em virtude das lesões supra descritas, BB ficou portador de sequelas graves, nomeadamente, tetraparésia rígido- espática de predomínio direito, deslocando-se em cadeira de rodas, afasia e fonação com disartria grave, que o impede de comunicar verbalmente.
38. Tais lesões determinaram uma incapacidade permanente geral de 90 pontos, com total dependência de terceiros, dano estético de 6 pontos em 7, prejuízo de afirmação pessoal de 5 pontos em 5.
39. Após o acidente, BB foi transportado por helicóptero do INEM para o Centro Hospitalar Lisboa Central, E.P.E. onde esteve internado até 2 de outubro de 2009, data em que foi transferido para Hospital Central da área da sua residência, Hospital Central Litoral Alentejano, onde esteve internado até 09 de dezembro de 2009.
40. Pela assistência prestada a BB e pelo serviço de transporte para o Hospital da sua área de residência, a Autora pagou ao Centro Hospitalar Lisboa Central, E.P.E. a quantia de € 31.015,23.
41. Pela assistência médica que foi prestada no Hospital Central Litoral Alentejano, a Autora pagou a quantia de € 4.503,67.
42. Em 9 de Dezembro de 2009, BB foi transferido para a Unidade Local de Saúde Baixo Alentejo, onde esteve internado até 17 de maio de 2010.
43. Pela assistência prestada a BB, a Autora pagou à Unidade Local de Saúde Baixo Alentejo a quantia de € 18.116,94.
44. Naquela Unidade Local foram prescritas ajudas técnicas, nomeadamente uma cadeira de rodas com espaldar alto, costas reclináveis, suporte extensível para os membros inferiores, um tabuleiro e uma almofada anti-escara, pela aquisição das quais a Autora pagou à Unidade Local de Saúde Baixo Alentejo a quantia de € 1.914,04.
45. Em 18 de maio de 2010, BB foi admitido no Centro de Medicina de Reabilitação Alcoitão, onde esteve internado até 26 de novembro de 2010.
46. Posteriormente, a 31 de janeiro de 2011, BB foi readmitido no Centro de Medicina de Reabilitação Alcoitão, onde foi assistido até 24 de fevereiro de 2012.
47. Após alta, BB continuou a beneficiar de acompanhamento clínico daquele Centro, em regime de consultas externas.
48. Pela assistência médica e medicamentosa prestada naqueles períodos a BB, a Autora pagou ao Centro de Medicina de Reabilitação Alcoitão a quantia de € 184.071,02.
49. Com a aquisição de ajudas técnicas prescritas pelo Centro de Alcoitão, entre outras, cadeira de banho com rodas, andarilho, dispositivo para abotoar, bastão de caminhada, tala de posicionamento de punho e mão direita, tala de posicionamento punho e dedos e tabuleiro para ajustar a cadeira, a Autora pagou àquele Centro a quantia de € 1.118,14.
50. Entre 13 de outubro de 2010 e 24 de abril de 2012, para receber tratamentos e fazer exames, o BB necessitou de ser transportado por diversas vezes em ambulância e táxi, quer entre os vários hospitais, quer entre a sua residência e o Centro de Medicina de Reabilitação Alcoitão e vice versa, pelo que, a Autora a esse título pagou à Zombitaxis e à Junta de Freguesia de São Teotónio a quantia de € 14.118,50.
51. A Autora, com vista adaptar a residência de BB às suas necessidades e a conferir-lhe tanto quanto possível independência e autonomia no seu dia a dia, realizou, as seguintes obras: instalação de rede de água e esgotos; rebaixamento da altura das janelas; instalação de caixilharia de correr com estores elétricos; colocação de manípulos nas janelas e portas; adaptação da casa de banho ao uso da cadeira de banho com rodízios; redimensionamento das ombreiras de forma a permitir acesso por cadeira de rodas; instalação de portas de correr, por forma a facilitar a abertura; lavatório amovível; base de duche ao nível do pavimento e barras de apoio; aplicação de pavimentos cerâmicos antiderrapantes, lisos e sem inclinações acentuadas; colocação dos móveis de cozinha à altura da cadeira de rodas; instalação de elevador de acesso ao primeiro andar, onde fica a casa dos pais; rampa de acesso da rua ao interior da habitação e à casa dos pais.
52. As obras supra aludidas importaram para a Autora a liquidação da quantia de € 51.183,00.
53. A Autora suportou o custo das ajudas técnicas imprescindíveis a que o BB pudesse permanecer em casa, nomeadamente aquisição da cama articulada com elevador e colchão e o sistema GRID, através do qual comunica, com o que a Autora despendeu a quantia total de € 2.591,09.
54. Durante o período de 27 de novembro de 2010 a 30 de janeiro de 2011, BB, por estar completamente dependente para as tarefas da vida diária, foi assistido em casa, tendo a Autora, pelo auxílio de terceira pessoa, pago a quantia de € 800,00.
55. A Autora ainda reembolsou BB por algumas despesas por este efetuadas, nomeadamente com o pagamento de taxas moderadoras, transporte, aquisição de medicamentos e fraldas, que totalizaram a quantia de € 250,00.
56. Por solicitação de BB e para assegurar a sua subsistência, a Autora fez-lhe um adiantamento em numerário, no montante de € 1.000,00.
57. Em função da sua incapacidade, BB necessitará para o resto da sua vida de fisioterapia e apoio terapêutico e psicológico, consultas de especialidade, ajuda medicamentosa, substituição e manutenção periódica das ajudas técnicas e apoio de terceira em pessoa em casa.
58. Em 10 de maio de 2012, a Autora e BB chegaram a acordo quanto ao valor da indemnização que lhe era devida para reparação dos danos emergentes do acidente, nos seguintes valores:
58.1 A título de danos não patrimoniais a quantia de € 80.000,00.
58.2 A título de assistência vitalícia futura a quantia de € 79.290,66.
58.3 A título de dano biológico a quantia de € 198.992,70.
58.4 A título de dano patrimonial futuro a quantia de € 144.638,58.
59. A quantia aludida no ponto 58.1 foi paga ao lesado quando da celebração do acordo.
60. Para pagamento das quantias aludidas nos pontos 58.2, 58.3 e 58.4, a Autora contratou a favor de BB um seguro de vida “Rendas Vitalícias”, titulado pela apólice ...67, cujo prémio importou o pagamento da quantia de € 500.000,00 em 01 de junho de 2012.
61. BB já auferiu, nos termos do seguro contratado aludido no ponto anterior, as pensões mensais constantes no documento junto sob o requerimento datado de 02 de novembro de 2022 [ref.ª 43743631; correspondente a folhas 829 e seguintes dos autos físicos], aqui dado por reproduzido, ascendendo, de junho de 2012 a outubro de 2022 ao valor de € 138.101,93.
62. Também o Réu sofreu ferimentos em consequência direta e necessária do acidente descrito nos autos, tendo sido imediatamente assistido no Hospital Central Litoral Alentejano.
63. Pela assistência prestada ao Réu, a Autora pagou a quantia de € 171,75.
64. O Réu tem carta de condução desde 15 de julho de 2009.

E foram considerados não provados os seguintes factos:
a) Que pela assistência prestada a BB, a Autora pagou à Unidade Local de Saúde Baixo Alentejo a quantia de € 18.149,18.
b) Que o Réu conduzisse a velocidade superior a 50 km/h.
c) Que o Réu conduzisse sendo portador de uma taxa de álcool no sangue superior a 0,50 g/l.
d) Que o Réu, quando passava junto à cepsa, apercebeu-se da existência de um veículo sem iluminação e, assustando-se, bateu de imediato com a roda traseira do lado direito no passeio, fugindo para o centro da faixa de rodagem, atenta a sua pouca experiência, e com o susto guinou e acelerou, involuntariamente, o veículo para a sua direita, vindo embater estrondosamente no muro da cepsa, na entrada do parque do Intermarché.

Da alteração da matéria de facto
Como resulta do artigo 662º, nº 1, do CPC, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se os factos tidos como assentes e a prova produzida impuserem decisão diversa.
Do processo constam os elementos em que se baseou a decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto: prova documental e depoimentos das testemunhas registados em suporte digital.
Considerando o corpo das alegações e as suas conclusões, pode dizer-se que a recorrente cumpriu formalmente os ónus impostos pelo artigo 640º, nº 1, do CPC, já que especificou os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados, indicou os elementos probatórios que conduziriam à alteração daqueles pontos nos termos por ela propugnados, referiu a decisão que no seu entender deveria sobre eles ter sido proferida e também não deixou de indicar as passagens da gravação em que funda o seu recurso, transcrevendo mesmo essas passagens no corpo das alegações, pelo que nada obsta ao conhecimento do recurso na parte atinente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
No que respeita à questão da alteração da matéria de facto face à incorreta avaliação da prova produzida, cabe a esta Relação, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 662º do CPC, e enquanto tribunal de 2ª instância, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Foi auditado o suporte áudio e, concomitantemente, ponderada a convicção criada no espírito do Sr. Juiz a quo, o qual tem a seu favor o importante princípio da imediação da prova, que não pode ser descurado, sendo esse contacto direto com a prova testemunhal que melhor possibilita ao julgador a perceção da frontalidade, da lucidez, do rigor da informação transmitida e da firmeza dos depoimentos prestados, levando-o ao convencimento quanto à veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recaíram as provas.
Infere-se das alegações/conclusões da recorrente, que esta discorda da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo relativamente aos pontos 60 e 61 dos factos provados.
No ponto 60 está dado como provado que «[p]ara pagamento das quantias aludidas nos pontos 58.2, 58.3 e 58.4, a Autora contratou a favor de BB um seguro de vida “Rendas Vitalícias”, titulado pela apólice ...67, cujo prémio importou o pagamento da quantia de € 500.000,00 em 01 de junho de 2012».
E no ponto 61 deu-se como provado que «BB já auferiu, nos termos do seguro contratado aludido no ponto anterior, as pensões mensais constantes no documento junto sob o requerimento datado de 02 de novembro de 2022 [ref.ª 43743631; correspondente a folhas 829 e seguintes dos autos físicos], aqui dado por reproduzido, ascendendo, de junho de 2012 a outubro de 2022 ao valor de € 138.101,93».
Na sentença recorrida fundamentou-se a decisão de facto quanto aos aludidos pontos nos seguintes termos:
«Relativamente aos pontos 58, 59 e 60, atendeu-se ao acordo junto à petição como documento n.º 174 [correspondendo a folhas 308 dos autos físicos], e à contabilização interna desses valores pela Autora como resulta da página 62 e 63 do documento n.º 173 [correspondendo a folhas 300-verso e 301].
Relativamente ao ponto 61, tomou-se em consideração o documento junto sob o requerimento datado de 02 de novembro de 2022 [ref.ª 43743631; correspondendo a folhas 829 e seguintes dos autos físicos], que, pese embora seja um documento interno da Autora, não o olvidamos, vem corroborado pelo depoimento de DD que confirmou estar o irmão a receber mensalmente a pensão como acordado.»
Sustenta a recorrente que «concatenada a prova documental, documento 174 junto com a petição inicial, dos documentos junto pela recorrente por requerimento de 2/11/2022 e os depoimentos das testemunhas CC e DD, cujos depoimentos estão registados através do sistema de gravação digital, respetivamente entre as 15:41 e as 16:17 (minuto 00.22.30 a 00.26.39) e entre as 14:35 e as 15:20 (minuto 00.26.40 a 00.28.16), na sessão de julgamento do dia 3-11-2022, deveria ter sido diferente a mais clara a decisão da matéria de facto», propondo a seguinte redação para os pontos da matéria de facto impugnados:
«60. Para garantia do pagamento das quantias aludidas nos pontos 58.2, 58.3 e 58.4, a Autora contratou consigo mesma um seguro de vida “Rendas Vitalícias”, titulado pela apólice ...67, cujo prémio importou o pagamento da quantia de € 500.000,00 em 01 de junho de 2012.
60ºA A indemnização acordada entre a Autora e o lesado BB, relativa a assistência vitalícia, do dano biológico e do dano patrimonial futuro, consiste no pagamento pela A. ao lesado de pensão mensal, atualizável e vitalícia, fixada inicialmente em € 937,84/mês, que por força das atualizações nesta data atinge a quantia mensal de €1131,03.
60º B A primeira pensão foi paga em maio de 2012
61. Desde maio de 2012 até outubro de 2022, as pensões mensais vencidas e pagas pela Autora ao BB pensões, ascendem ao valor de € 138.101,93.»
A redação proposta pela recorrente para o ponto 60 em pouco difere da redação existente, não se justificando alterar aquele ponto para precisar que «a autora contratou consigo mesma um seguro de vida “Rendas Vitalícias”», quando isso decorre da redação atual e foi assim que foi alegado no art. 76º da petição inicial.
O aditamento de um ponto 60-A e de um ponto 60-B, assim como a nova redação pretendida para o ponto 61 revelam-se desnecessários, pois tudo o que é relevante está já contemplado na redação atual do ponto 61, onde, aliás, se deu como reproduzido o teor do documento junto com o requerimento datado de 02.11.2023 [fls. 829 e ss. dos autos físicos e ref.ª Citius 43743631], do qual também se retira que a pensão fixada inicialmente em € 937,84/mês, por força das atualizações, ascende nesta data a € 1.131,03/mês, e ainda, ao invés do que entende a recorrente, que a primeira pensão mensal se venceu em junho, o que não se confunde com a data da emissão do respetivo recibo.
Mantém-se, pois, intocados os pontos 60 e 61 dos factos provados.

Da prescrição
A análise desta questão desdobra-se, como se disse supra, na consideração dos seguintes aspetos: i) prazo de prescrição aplicável; ii) início/reinício da sua contagem [dies a quo]; e iii) fim do prazo [dies ad quem].
Cumpre assim começar por assentar qual o prazo de prescrição aplicável in casu.
O direito de regresso da autora/recorrente funda-se no art. 27º, nº 1, al. c), do Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, aprovado pelo DL 291/2007, de 21 de agosto, no qual se dispõe: «Satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de regresso (…) contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos.»
O prazo para o exercício do direito de regresso encontra-se diretamente previsto no nº 2 do art. 498º do Código Civil[5]: «Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.»
Defende a recorrente que seja aplicado ao caso o alargamento do nº 3 do mesmo preceito: «Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável». Alega que da conduta do recorrido resultaram factos suscetíveis de integrar um crime de ofensas à integridade física, p.p. no art. 143º do Cód. Penal, com pena de prisão até 3 anos, o qual prescreve no prazo de 5 anos, como decorre do art. 118º, nº 1, al. c) do mesmo Código, pelo que beneficia desse prazo, nos termos do disposto no nº 3 do art. 498º do CC.
O problema do eventual alargamento do prazo de prescrição tem sido resolvido, de forma reiterada, em sentido negativo pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça[6].
É a seguinte, em síntese, a argumentação aduzida para se recusar o alargamento do prazo por aplicação do nº 3 do art. 498º do CC: (i) O direito de regresso da seguradora é um direito novo, distinto do direito de indemnização do lesado, estando o prazo de prescrição daquele direito expressamente previsto no nº 2, do art. 498º, do CC, pelo que o seu eventual alargamento nunca se poderia admitir por aplicação automática do regime de prescrição do direito do lesado, antes exigiria encontrar justificação autónoma; (ii) Ora, na ação de regresso «não está já em causa, em termos diretos e imediatos, a responsabilidade civil extracontratual derivada do facto voluntário, culposo, ilícito, causal e lesivo, que, em rigor, já estará definida mas antes um segundo momento, subsequente à definição, em concreto, da dita responsabilidade, não se vislumbrando necessidade ou motivo, quer em termos fácticos como jurídicos, para proceder a tal ampliação do prazo»[7]; (iii) Em última análise, sendo o direito da seguradora um direito novo, que não corresponde a uma situação de responsabilidade civil extracontratual, não se verifica a ratio legis do art. 498º, nº 3, do CC. Com efeito, «[a] razão de ser da introdução do preceito do nº 3 em causa visou alargar o prazo de prescrição do lesado quando o facto lesante constituía crime de gravidade acentuada que leve a que o prazo de prescrição do crime seja superior aos três anos fixados no nº 1. É que se não pode esquecer a existência do princípio da adesão da dedução da indemnização civil no processo criminal e se o prazo de prescrição criminal ainda não decorreu, se não compreenderia que se extinguisse o direito à indemnização civil – conexa com o crime - e ainda estivesse a decorrer o prazo para a prescrição penal operar, onde o legislador entendeu dever ser deduzido o pedido de indemnização civil – dentro de certas limitações constantes das normas penais»[8] explicação que, ainda que inserida em caso relativo ao direito do FGA, sub-rogado no direito do lesado, é válida em termos gerais.
Ora, esta razão não concorre quando se está perante o exercício do direito de regresso. Neste caso, e dado que a obrigação já foi cumprida no confronto do lesado, não vale o argumento de que desde que o facto ilícito pode ser discutido em sede penal deve também poder ser apreciado no âmbito da atuação da respetiva responsabilidade civil. Nenhuma razão existe, pois, para se lhe aplicar um alargamento do prazo que pressupõe justamente que a medida dessa responsabilidade possa ser ainda discutida em sede penal por mais tempo.
Assim, como bem decidiu a sentença recorrida, é aplicável in casu o prazo prescricional de 3 anos.

Problema diverso é o da determinação do dies a quo da contagem do prazo de prescrição de três anos. Alega a recorrente o seguinte: «Dado que a recorrente se obrigou ao pagamento de pensão mensal e vitalícia, a obrigação ainda não está integralmente cumprida, termos em que em bom rigor não iniciou ainda a contagem do prazo de prescrição.»; «(…), em bom rigor, a prescrição do direito da recorrente só começará a correr a partir da morte do lesado BB, o que não ocorreu até à data, (…)»
Dispõe o nº 2 do art. 498º, do CC, que «[p]rescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis». A letra da lei não permite resolver, sem mais, as situações frequentes e complexas em que, relativamente aos danos resultantes de um mesmo sinistro, existe uma sucessão de atos de pagamento efetuados pela seguradora.
Nestes casos, várias interpretações são possíveis: por um lado, entender-se que o prazo de prescrição se conta a partir de cada ato de pagamento, atomisticamente considerado; por outro lado, considerar-se que o prazo se conta apenas a partir do último ato de pagamento. Defendendo-se, porém, que o último ato de pagamento correspondente ao cumprimento pelo titular do direito de regresso é o último ato de pagamento que integre um mesmo núcleo indemnizatório juridicamente diferenciado de outros valores indemnizatórios. Foi esta a orientação acolhida no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07.04.2011[9], cuja conclusão aqui se cita: «Em suma: se não parece aceitável a autonomização do início de prazos prescricionais, aplicáveis ao direito de regresso da seguradora, em função de circunstâncias puramente aleatórias, ligadas apenas ao momento em que foi adiantada determinada verba pela seguradora, já poderá ser justificável tal autonomização quando ela tenha subjacente um critério funcional, ligado à natureza da indemnização e ao tipo de bens jurídicos lesados, com o consequente ónus de a seguradora exercitar o direito de regresso referentemente a cada núcleo indemnizatório autónomo e juridicamente diferenciado, de modo a não diferir excessivamente o contraditório com o demandado, relativamente à causalidade e dinâmica do acidente, em função da pendência do apuramento e liquidação de outros núcleos indemnizatórios, claramente cindíveis do primeiro.»[10]
Neste aresto indica-se expressamente ter-se partido da posição assumida no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.11.2010[11], em cujo sumário se concluiu: «Relativamente ao mesmo sinistrado e ressalvados os casos de indemnização sob a forma de renda, o prazo prescricional da seguradora para exercer o direito de regresso relativamente a indemnização que pagou, faseadamente, no âmbito do seguro obrigatório automóvel, começa a contar-se da data em que foi efectuado o último pagamento».
A sentença recorrida tratou a questão nos seguintes termos:
«(…), poder-se-ia discutir se a prescrição corre sobre cada um dos pagamentos, desde o último ou sobre o pagamento de cada «núcleo indemnizatório» como grupo aglomerante de tipos de danos autonomizáveis em si.
Sucede que esta abordagem, sub judice, é algo inócua ante a circunstância de, mesmo que se contasse o prazo desde a data do acidente de viação [15 de setembro de 2009] ante a notificação judicial avulsa do Réu em 19 de julho de 2012, foi o mesmo interrompido quando ainda não se havia esgotado, pelo que o único marco relevante a atender é a data da notificação judicial avulsa, que fez reiniciar o prazo [artigos 323.º, n.º 1 e 326.º, n.º 1 do C.C.].
A única questão que cumpre apreciar ainda neste ponto é a seguinte, suscitada pela Autora em sede de resposta à exceção: estando a ser liquidadas ao lesado BB, pensões mensais até o seu decesso, para ressarcimento da necessidade de assistência vitalícia, dano biológico, e dano patrimonial futuro, o prazo só se iniciará quando for paga a última prestação devida?
A resposta é negativa.
(…).
É que a Autora não peticionou nos autos o seu ressarcimento [das rendas].
Lida a petição [causa de pedir – artigo 76 da petição – e pedido – que coincide aritmeticamente com tal valor], não é admissível outra interpretação.
A Autora pediu ressarcimento pelo valor do prémio de seguro contratado a favor de BB.
Bem ou mal, não cumpre aqui tecer qualquer obiter dictum quanto a tanto [nem ao próprio acordo entre lesado e Autora de liquidação da indemnização por via de um seguro]: para os efeitos que agora se discutem – a prescrição do crédito – é um dado adquirido nos autos.
Destarte, o último pagamento a considerar, de todos, é este mesmo: a liquidação do prémio.
Na verdade, a Autora só começou a referir-se ao pagamento das rendas, quando o Réu invocou a prescrição.
É apenas nesta fase, em resposta à exceção, que surge no processo a referência ao pagamento das várias rendas, o que não tem o condão de alterar a causa de pedir a meio do processo [salvo por acordo das partes, que não houve].
Sem embargo, ainda que assim se não considerasse e, portanto, se defendesse que a Autora ao pedir o pagamento do prémio de € 500.000,00, está por alguma forma, implícita ou indiretamente, a demandar o Réu pelos vários pagamentos mensais que BB vai recebendo, a solução jurídica do pleito não se alterava, como começámos por dizer.
Porque, mesmo que se atendesse ao pagamento das rendas, o prazo de prescrição correria, sendo o direito unitário, como o é, deste a primeira prestação [artigo 307.º do C.C.].»
Afigura-se correto este entendimento. Senão vejamos.
Quando para pagamento das quantias aludidas nos pontos 58.2, 58.3 e 58.4 dos factos provados, a recorrente contratou a favor do lesado e BB um seguro de vida “Rendas Vitalícias”, cujo prémio importou o pagamento da quantia de € 500.000,00 em 01.06.2012, pelo menos nessa data tomou conhecimento do direito que lhe competia, podendo livremente exercê-lo, pois era a data em que era exigível a primeira prestação ao réu/recorrido, pelo que se impunha acionar a mesma.
Tendo em conta o entendimento jurisprudencial acima referido, «o último ato de pagamento que integre um mesmo núcleo indemnizatório juridicamente diferenciado de outros valores indemnizatórios», é precisamente aquele que importou o pagamento do prémio de seguro acima referido.
A acolher-se o entendimento da recorrente, isso significava que o último pagamento nos remeteria para a data do decesso do lesado BB, o que não pode aceitar-se pelas razões expostas.
Assim sendo, conclui-se, nas palavras da sentença recorrida, que «ante a interrupção ocorrida com a notificação judicial avulsa em 19 de julho de 2012, posterior a qualquer outro pagamento a considerar, é esta a data que marcará o (re)ínicio do prazo prescricional de três anos

O que nos leva à análise da terceira sub questão: saber se e quando ocorreu a interrupção da prescrição.
O prazo prescricional (no caso, de três anos) pode ser interrompido, designadamente com a citação nos termos do disposto no art. 323º do CC, o qual dispõe:
«1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
3. A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos números anteriores.
4. É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do ato àquele contra quem o direito pode ser exercido.»
É indiscutível que, in casu, a citação do réu ocorreu muitos anos depois da instauração da ação [pouco mais de 2 anos se ponderarmos a citação na ação executiva e quase cinco se tivermos por referência esta ação].
Na conformação da expressão «por causa não imputável ao requerente», constante do art. 323º, nº 2, do CC, tem a doutrina e a jurisprudência entendido, unanimemente, que se impõe uma interpretação em termos de causalidade objetiva, ou seja, que a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei, em qualquer termo processual, até à verificação da citação; o que é essencial para a aplicação, em seu benefício, do regime da citação em 5 dias é que a sua conduta não haja implicado qualquer violação culposa de normas procedimentais ou adjetivas, radicando nessa infração objetiva – e só nela – a preclusão do benefício emergente do referido nº 2 do art. 323º»[12].
No caso, a autora/recorrente, em obediência ao que dispõe o art. 552º, nº 1, al. a), do CPC, indicou a residência do réu como correspondendo à Rua de Santa Isabel, nº 1, São Teotónio. Esta morada é a mesma que a autora indicou na notificação judicial avulsa a que se alude no ponto 1 dos factos provados.
Sucede que no âmbito dessa notificação judicial avulsa, o réu foi notificado, em 17.09.2012, na Rua ..., São Teotónio, tendo o Agente de Execução feito constar o seguinte: «Esta diligência havia sido tentada pelas 11:30 h na morada indicada na notificação, desatualizada, sendo hoje: Rua ...» - ponto 2 dos facto provados.
Ora, não podendo a autora deixar de saber que a morada da residência do réu era esta última, tinha necessariamente de instaurar a presente ação indicando esta morada e não a que indicou na notificação judicial avulsa.
No contexto dos autos, afigura-se que o comportamento da autora foi causa adequada do retardamento da citação, ou seja, da efetivação da citação muito para além dos cinco dias previstos no nº 2 do art. 323º do CC, sabendo-se, ademais, que o que efetivamente ocorreu foi uma falta de citação do réu e não uma nulidade da citação, como se decidiu no acórdão desta Relação de 06.12.2018, confirmado por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 06.06.2019 – ponto 9 dos factos provados.
Escreveu-se a este propósito na sentença recorrida:
«Indicar morada ao Réu não pode significar simplesmente indicar qualquer morada.
É indicar a “melhor morada possível”.
É indicar, zelosamente, a morada.
Pelo menos, a última morada conhecida.
Se o autor indicar a última morda conhecida dele, atua com zelo.
Se indicar uma de várias moradas atuais conhecidas ao réu, igualmente atua.
Se indicar uma morada anteriormente conhecida porque nada lhe garante que não tenha voltado a ser a sua nova morada, não atua.
Pois que, naturalmente, esse não pode ser o critério: a morada conhecida a alguém é sempre por reporte ao pretérito: nada garante nem ao autor nestes autos nem a qualquer outro que o réu não haja alterado ou venha a alterar a sua morada até à concretização da citação [é o exemplo dado por Morais Antunes, acima citado].
Mas isso não pode significar, então, que o autor indique uma qualquer morada, por poder, atualmente, estar o réu em qualquer lugar do mundo.
Aliás, nem o Autor acabou por praticar nos autos essa sua perspetiva, posto que, aquando da repetição da citação do Réu, indicou a Rua ... e já não a anterior Rua ..., e o seu raciocínio poderia ter sido precisamente o mesmo: desde a dedução dos embargos nada lhe garantia que o Réu não houvesse já regressado à anterior morada. O Autor não o podia saber…
Em suma: a “nova” morada pode, obviamente, já ser a “velha”, nunca se sabe com perfeito rigor. E, por isso, o autor, ao indicar morada ao réu pode enganar-se ao indicar a “nova” morada. Pode. Mas é da falibilidade humana. E daqui nenhuma censura lhe advém. Relevante é que se atue de acordo com os dados conhecidos e mais lógicos.
Se assim tiver atuado, foi com zelo.
Se não, negligentemente o foi.
Na verdade, fazemos nossas as palavras do acórdão proferido nos embargos por apenso: o embargante, desde pelo menos 19/07/2012, tinha a sua residência na Rua ..., em São Teotónio, facto que a ré não podia desconhecer em face da notificação judicial que lhe foi feita nesse local, mas na ação declarativa, enquanto citando a carta para citação não foi, endereçada para o local que na altura era sua residência, mas para outro local que correspondia ao local da sua anterior residência, e esta circunstância não pode deixar de ser decisiva para a questão em apreço.
Foi de facto decisiva, posto que a incorreta citação do Réu adveio precisamente de ter sido remetida a missiva postal para a morada errada indicada pelo Autor.
Agora, haverá alguma diferença entre ter sido a morada errada do Réu indicada por dolo ou mera negligencia para efeitos da imputabilidade da delonga na citação?
A partir do momento em que a morada errada é colocada na “engrenagem” do sistema judicial, as consequências [a sucessão prática dos acontecimentos] são perfeitamente iguais num ou noutro caso.
Portanto, para a primeira caraterística supra aludida da imputabilidade [a causa objetiva advinda de comportamento do autor] não há diferença.
A única diferença entre as situações reside no grau de censurabilidade da conduta assumida pelo autor: maior, obviamente, se este tiver dolosamente indicado morada errada; menor, caso o tenha feito por negligência.
Mas culpa haverá sempre.
E para o Réu, pessoa cujo interesse o instituto da prescrição visa tutelar, não o esqueçamos, é-lhe igual. Ainda que sob uma forma mais leve de culpa.
E é-lhe igual porque as consequências são precisamente as mesmas e não há razão legal para destrinçar o nível de censurabilidade quando a lei não o distinguiu.
Portanto, tal destrinça não poderá ser feita contra o sujeito – o Réu – beneficiado com o regime de prescrição e que em nada contribuiu para o estado de negligencia do Autor [pelo contrário, foi exposto ao agente de execução, aquando da notificação, que a morada que vinha indicada estava desatualizada].
Resumindo: na «imputabilidade» referida no artigo 323.º, n.º 2 do C.C., cabe qualquer forma de culpa, seja o dolo seja a negligência.»
Revemo-nos inteiramente nesta fundamentação da sentença recorrida, pelo que estando prescrita a obrigação, pode o réu/recorrido recusar o respetivo cumprimento – art. 304º, nº 1, do CC.
Por conseguinte, o recurso improcede, não se mostrando violadas as normas indicadas ou quaisquer outras.
Vencida no recurso, suportará a autora/recorrente as respetivas custas – artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC.

IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.

*
Évora, 11 de maio de 2023
(Acórdão assinado digitalmente no Citius)
Manuel Bargado (relator)
Albertina Pedroso (1º adjunto)
Francisco Xavier (2º adjunto)

__________________________________________________
[1] Vide apenso A.
[2] No seu decurso a autora reduziu o pedido respeitante ao valor indicado no artigo 76º da petição inicial [€ 500.000,00] para o montante de € 138.101,93.
[3] No despacho do relator de 04.05.2023, foi apreciada a questão da alegada intempestividade do recurso, concluindo-se ser o mesmo tempestivo.
[4] Mantém-se a redação e a numeração dos factos constantes da sentença.
[5] Doravante CC.
[6] Cfr. os acórdãos de 04.11.2008, proc. 08A3119, de 27.10.2009, proc. 844/07.2TBOER.L1, de 04.11.2010, proc. 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, 16.11.2010, proc. 2119/07.8TBLLE.E1.S1, de 17.11.2011, proc. 1372/10.4T2AVR.C1.S1, de 29.11.2011, proc. 1507/10.7TBPNF.P1.S1, de 06.12.2011, proc. 797/07.7TBVCD.P1.S1, de 18.10.2012, proc. 56/10.8TBCVL-A. C1.S1, de 22.09.2015, proc. 255/14.3T8SCR.L1.S1(citado na sentença recorrida) e de 19.05.2016, proc. 645/12.6TVLSB.L1.S1, consultáveis, como os demais que venham a ser citados sem outra indicação, em www.dgsi.pt; e ainda, relativamente a situações de sub-rogação legal no direito do lesado, nos acórdãos de 05.06.2012, proc. 32/09.3TBSRQ.L1.S1, de 07.05.2014, proc. 8304/11.0T2SNT-AL1.S1, e de 03.12.2015, proc. 11173/12.0TBVNG.P1.S1, este último in sumarios.stj.pt.
[7] Acórdão do STJ de 27.10.2009, cit.
[8] Acórdão do STJ de 05.06.2012, cit.
[9] Proc. 329/064TBAGN.C1.S1.
[10] No mesmo sentido, inter alia, os acórdãos do STJ de 19.05.2016, proc. 645/12.6TVLSB.L1.S1 e de 18.01.2018, proc. 1195/08.0TVLSB.E1.S1 e de 26.11.2020, proc. 2325/18-0T8VRL.G1.S1.
[11] Proc. 2564/08.1TBCB.A.C1.S1.
[12] Cfr., inter alia, os acórdãos do STJ de 20.06.2012, proc. 347/10.8TTVNG.P1.S1, de 22.09.2015, proc. 255/14.3T8SCR.L1.S1 e de 29.11.2016, proc. 448/11.5TBSSB-A.E1.S1