ACIDENTE DE VIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL
PRESTAÇÕES SOCIAIS
REEMBOLSO
Sumário

I – Nos casos em que a indemnização por acidente de viação tenha de ser feita por recurso à equidade, e para que não se confunda equidade com a subjetividade do julgador, devemos ater-nos a uma aplicação mais ou menos uniforme do direito (art.º 8º nº 3 do CC), ponderando as mais recentes decisões jurisprudenciais de casos idênticos, como forma de reduzir a margem subjetividade do julgador, na procura da justiça relativa.
II - As prestações pagas aos lesados no âmbito do sistema de segurança social, e dentro dos montantes previstos na lei que regulamenta esse sistema, estão excluídas da garantia do FGA.

Texto Integral

Apelação nº 2120/20.6T8PNF.P1

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I – Resenha histórica do processo
1. AA e BB instauraram ação de responsabilidade civil contra CC, Fundo de Garantia Automóvel e Gabinete Português de Carta Verde, por acidente de viação que vitimou fatalmente DD (respetivamente marido e pai das Autoras), sinistro esse causado pelo Réu CC.
Os demais Réus foram demandados pelo facto de o referido CC não ter transferido para qualquer companhia de seguros a responsabilidade civil decorrente de acidentes, podendo ser o caso de existir seguro em Inglaterra, onde o veículo se encontrava registado.
Pediram a sua condenação solidária a pagar-lhes € 588.245,00, acrescida de juros legais desde a citação até efetivo pagamento.
Foi ainda admitida a intervenção principal, associados às Autoras, dos seguintes intervenientes:
1) EE, por si e em representação dos filhos FF e GG, pelos danos relativos a outra vítima mortal do mesmo sinistro, HH, pedindo um total de € 336.979,68, acrescida de juros moratórios.
2) II, pedindo um total de € 78.920,20, acrescida de juros moratórios.
3) JJ, pedindo € 240.967,69, acrescida de juros moratórios.
4) KK, pedindo um total de € 5.615,80, acrescida de juros moratórios.
5) Centro Hospitalar ..., EPE (Centro Hospitalar ...), reclamando € 2.983,59, acrescida de juros moratórios.
6) O Instituto de Solidariedade Social, IP (ISS) interveio no processo reclamando o reembolso dos valores pagos às Autoras em razão do falecimento do beneficiário DD, acrescida de juros moratórios.
Em ação que veio a ser apensada, LL pediu a quantia total de € 7.862,04, acrescida de juros moratórios.
Todos os Réus contestaram.

2. Realizada audiência de discussão e julgamento, foi considerada a seguinte matéria de facto:

«FACTOS PROVADOS
A) No dia 23 de fevereiro de 2019, decorreu um evento de convívio e angariação de fundos na sede do A..., sito no Largo ..., em ..., Paredes;
B) Diante do edifício da sede do A..., uma antiga escola primária, fica um largo que permite o acesso a quatro vias públicas, todas elas abertas ao trânsito e que são, considerando o sentido dos pontos do relógio, as seguintes
– à esquerda, considerando quem sai do portão da referida sede, a Rua ..., via de dois sentidos de trânsito e que é o caminho mais curto para a freguesia ...;
– quase em frente ligeiramente à sua esquerda, considerando quem sai do portão da referida sede, a Rua ..., via de sentido único em direção à sede do A..., tendo, no seu final e considerando o sentido de marcha regulamentar que aí se deveria obedecer, um sinal de sentido proibido (sinal C1 do Regulamento de Sinalização de Trânsito), sendo uma via com 4 metros de largura, para além de, no lado esquerdo considerando quem circula em direção à sede do A..., espaço para estacionamento de veículo ao longo da via;
– praticamente em frente do portão do edifício da sede do Clube, a Rua ..., com dois sentidos de trânsito; e
– à direita do edifício, vista de quem sai do edifício, a Rua ..., que não tem saída;
C) Cerca das 12.30 horas, na companhia de MM, seu filho menor de 11 anos de idade, de NN e de OO, o arguido, conduzindo o veículo automóvel Audi ... de matrícula .... OJA, deslocou-se para o aludido convívio e aí almoçou;
D) Durante e após o almoço, o arguido ingeriu diversas bebidas alcoólicas e, a dada altura e por motivos concretamente não apurados, desentendeu-se com PP, sem que tenha havido quaisquer agressões;
E) Cerca das 16.30 horas, já alcoolizado, o arguido decidiu retirar-se do local, na companhia do seu filho MM, NN, OO e de QQ;
F) Já no exterior das instalações da sede do referido A..., o arguido abeirou-se de RR e, sem qualquer motivo que o justificasse e sem que nada o fizesse prever, desferiu-lhe duas bofetadas;
G) Vendo o que estava a suceder e visando defender o seu amigo RR, PP tentou afastar o arguido, empurrando-o;
H) Então, ato contínuo, o arguido desferiu um murro na face de PP e, de imediato, atirou-se a ele, caindo os dois;
I) Então, várias pessoas que se encontravam no local, separaram o arguido de SS, tendo TT agarrado o arguido e afastou-o do local; J) Em consequência do descrito, o arguido sofreu pequenas escoriações e hematomas na cabeça, braços e mãos, sem limitações à mobilização ativa ou passiva;
K) Após, solicitaram ao arguido que se ausentasse do local, uma vez que só arranjava problemas;
L) Então, o arguido disse num tom de voz sério, “Vou foder esta merda toda”, “Vamos! Vamos que vou resolver isto à minha maneira!” e “Vós já ides ver!”
M) O arguido dirigiu-se para o veículo automóvel de marca Audi ..., com a matrícula inglesa .... OJA, com o volante à direita, que se encontrava estacionado nas imediações do A..., mais concretamente na Rua ..., com a frente direcionada no sentido oposto ao da sede do A..., porquanto tinha a frente virada no sentido da freguesia ..., onde então residia;
N) Decidiu então o arguido que, conduzindo o referido veículo e atropelando todos os que conseguisse e que se encontrassem nas imediações do referido A..., iria matar quem quer que se encontrasse no seu caminho, como vingança do que sucedeu;
O) No referido veículo, pelo arguido conduzido, seguia no lugar do passageiro, à frente, o seu filho menor de 11 anos de idade, MM;
P) Na concretização dos seus intentos, o arguido, com uma taxa de alcoolemia de 1,885 g/l de sangue, colocou o veículo em funcionamento e, ainda na Rua ..., inverteu o sentido da marcha, direcionando-o para o Largo ..., onde ainda se encontravam várias pessoas;
Q) Então, imprimindo ao veículo grande velocidade, o arguido conduziu-o em direção às pessoas que se encontravam nas proximidades da sede do A..., junto aos passeios e veículos estacionados na Rua ... e no Largo ... onde confluem as Ruas ..., Rua ..., Rua ... e Rua ...;
R) Sempre imprimindo maior velocidade ao mesmo, ao chegar próximo do Largo ..., ainda na Rua ... e próximo da confluência com a Rua ..., o arguido dirigiu o veículo que conduzia contra um grupo de pessoas que, apeados, ali se encontrava, com o propósito de as atropelar e de lhes tirar a vida;
S) Então, nesse momento, alertados pelo barulho do motor e pelos gritos de alguns dos presentes várias pessoas se desviaram, tendo o arguido colhido KK que, então, se encontrava apeado, em cima da sua bicicleta parada e que não teve tempo de se refugiar da investida do arguido, sendo projetado no ar até cair;
T) De seguida, continuando a imprimir grande velocidade, o arguido, visando atingir mais pessoas, guinou súbita e inesperadamente o volante do veículo, dirigindo-o para um grupo de pessoas que se encontrava apeada na confluência da Rua ... com a Rua ..., junto ao passeio e sem impedir o trânsito na via pública, então atingindo DD, HH, JJ e II, sendo que alguns voaram e ficaram prostrados no solo, gravemente feridos;
U) Após, podendo seguir pela Rua ... que se encontrava desimpedida, o arguido encetou a fuga pela Rua ..., seguindo em contramão a alta velocidade;
V) Por sua vez, na Rua ..., fazia a sua marcha, em direção ao Largo ..., o veículo automóvel de matrícula ..-GP-.., marca Peugeot, modelo ..., cor cinzenta, conduzido por UU e, como passageira, VV;
W) Vendo o veículo Audi ..., com a matrícula inglesa .... OJA conduzido pelo arguido a circular em contramão e no sentido oposto ao seu, UU imobilizou o veículo;
X) Não obstante saber que seguia em contramão, vendo o Peugeot de matrícula ..-GP-.. à sua frente, o arguido tirou o pé do acelerador e tentou passar com o Audi ... de matrícula .... OJA que conduzia pelo lado esquerdo do veículo conduzido pelo UU, tendo então embatido na parte frontal esquerda do mesmo;
Y) Como não conseguiu passar, o arguido fez marcha-atrás com o veículo que conduzia e, de seguida, sempre em contramão, voltou a acelerar o Audi ... de matrícula .... OJA na direção do veículo Peugeot ..., de matrícula ..-GP-.., onde ainda se encontravam no seu interior UU e VV, tendo desta vez embatido no lado esquerdo do guarda-lamas;
Z) Como, mais uma vez, não o conseguiu fazer passar, o arguido voltou a fazer marcha-atrás de forma agressiva cerca de 20 m, até embater, com a traseira do Audi ... que conduzia, na traseira do lado esquerdo do veículo da marca Mercedes, matrícula ..-..-TF, que se encontrava estacionado do lado esquerdo, em cima do passeio, do lado esquerdo considerando o sentido de marcha prosseguido pelo arguido;
AA) Depois, o arguido voltou a arrancar em direção ao veículo Peugeot ..., de matrícula ..- GP-.., passando pelo lado esquerdo deste último veículo;
BB) Ao passar pelo mesmo nos termos descritos em Y), o arguido fez embater o veículo que conduzia nas portas laterais esquerdas do Peugeot ... de matrícula ..-GT-.. e, ainda, na parte lateral direita do veículo BMW, de matrícula ..-EM-.. que se encontrava estacionado do lado esquerdo da estrada, atendo o sentido de marcha regulamentar naquela Rua ..., e com a frente virada para esse sentido;
CC) Entretanto, entre o segundo e o terceiro embate no Peugeot ... de matrícula ..-GT-.., UU e VV saíram do referido veículo, tendo o arguido passado próximo do local onde se encontrava o UU, mas sem direcionar o veículo a este último e sem o atingir;
DD) Após passar entre o Peugeot ... de matrícula ..-GP-.. e BMW de matrícula ..-EM-.., embatendo em ambos, o arguido fez embater o Audi ... que conduzia no veículo Mercedes, de matrícula ..-ET-.. que se encontrava estacionado no lugar destinado ao estacionamento sito na parte esquerda da Rua (considerando o sentido de trânsito regulamentar) e, ainda, no lado esquerdo do veículo Citroën ..., de matrícula ..-..-RO, propriedade de WW que, então, o conduzia na Rua ..., no sentido regulamentar e que se encontrava atrás do Peugeut ...;
EE) O arguido, que após o descrito foi perseguido por alguns populares — que chegaram a aproximar-se do veículo automóvel, mas sem o atingir — prosseguiu a fuga, abandonando o veículo que conduzia na Rua ..., no meio da via de trânsito, junto a um estabelecimento comercial sito no n.º ... dessa artéria, a cerca de 240 m do Largo ..., seguindo depois apeado;
FF) Cerca das 16.50 horas desse dia 23 de fevereiro, o arguido apresentou-se no Posto Territorial da Guarda Nacional Republicana ...;
GG) Com a conduta descrita, o arguido causou a RR dores e desconforto;
HH) Com a conduta descrita, o arguido causou a PP dores e desconforto, para além de pequena hemorragia;
II) Com a conduta descrita o arguido causou a KK vários hematomas e escoriações ligeiras por várias partes do corpo, para além de traumatismo/hematoma no ombro e contusão no punho;
JJ) Em consequência da conduta do arguido, KK sentiu ainda dores e desconforto, sendo assistido no Centro Hospitalar ... ainda nesse dia 23 de fevereiro de 2019, pelas 17.35 horas;
KK) Além disso, a conduta do arguido causou danos na bicicleta e no equipamento de KK;
LL) Em consequência da conduta do arguido descrita, DD sofreu várias lesões, designadamente:
– traumatismo crânio-encefálico — fratura diastásica na sutura lambóide na sua metade esquerda, prolongando-se para o osso parietal esquerdo, fratura na metade esquerda de todo o andar posterior no plano sagital — com edema, hemorragia cerebral difusa e hematomas;
– fratura na inserção posterior da 9.ª e 10.º costelas;
– fratura da 5.ª costela ao nível do arco anterior;
– escoriações no tórax e abdómen;
– escoriações na nádega direita;
– múltiplas escoriações nos membros superiores direito e esquerdo; e
– múltiplas escoriações nos membros inferiores direito e esquerdo, lesões estas, principalmente as traumáticas crâneo-meningo-encefálicas e torácicas, que causaram a sua morte;
MM) Logo no local, onde foi assistido, DD teve paragem cardiorrespiratória, atividade esta recuperada ao fim de 16 minutos de assistência, sendo entubado e mostrando a pontuação 3 da Escala de Glasgow;
NN) Foi depois transportado ao Hospital ..., no Porto, onde deu entrada pelas 18.16 horas desse dia 23 de fevereiro, em coma, com a pontuação 3 da Escala de Glasgow, midríase fixa bilateral e ausência de reflexos corneanos;
OO) Nessa instituição hospitalar, DD foi sujeito a exames de diagnóstico, designadamente tomografia computorizada crânio-encefálica que revelou:
– hipodensidade difusa do parênquima encefálico infra e supratentorial, tronco cerebral inclusive, sem diferenciação substância cinzenta/branca, condicionando apagamento global de sulcos e cisternas e redução global da amplitude ventricular, traduzindo edema cerebral difuso em contexto de paragem cárdio-respiratória;
– hematoma subdural hemisférico esquerdo com 9 mm de espessura máxima na convexidade frontal, moldando o parênquima e VL ipsialteral e desviando contralateralmente a linha média em 7 mm;
– sangue intraventricular no VL esquerdo, decantado posteriormente nos cornos temporais bilateralmente e no IV ventrículo;
– HSA sulcal frontoparietal na alta convexidade bilateralmente, de predomínio esquerdo, na convexidade temporal esquerda e na cisterna interpeduncular;
– pequenas contusões hemorrágicas nos pólos temporais bilateralmente;
– lâmina hemáticas milimétricas nos polos temporais e interhemisféricas; e
– fratura linear e alinhada da escama parietal esquerda, que intersecta e condiciona a diastase da sutura parieto-occipital ipsilateral
PP) Considerando o seu estado, designadamente neurológico, após análise da equipa médica de emergência e de Neurocirurgia, considerou-se que o DD não teria qualquer benefício em intervenção por Neurocirurgia e, após evolução em choque refractário não responsivo à fluidoterapia agressiva e com necessidade de doses crescentes de noradrenalina, foi declarado o seu óbito às 23.35 horas;
QQ) Em consequência da conduta do arguido descrita, HH sofreu várias lesões, designadamente:
– várias fraturas cranianas — designadamente nas regiões frontal e parieto-temporoesfenoidal esquerdas (prolongando-se à base do andar médio e às paredes lateral e posterior da câmara esfenoidal esquerda), e da escama temporal e da parede lateral da câmara esfenoidal direitas, acompanhadas de diástase da sutura coronal — com hematomas epicranianos associados, hematoma subdural agudo frontal lateral à esquerda (com espessura máxima de 1cm), hematoma extradural agudo da fossa média (com espessura máxima de 2.5cm) e alargamento do espaço pericerebral adjacente a ambos, pelo efeito de massa e/ou higroma subdural, condicionando moldagem da superfície hemisférica adjacente, moldagem moderada do sistema ventricular, desvio para a direita das estruturas da linha média em cerca de 4mm e insinuação medial do uncus esquerdo, que parece moldar discretamente o pedúnculo cerebral; à direita, Hematoma subdural agudo fronto-temporal, edema difuso, contribuindo para um apagamento dos sulcos corticais, bilateralmente;
– escoriações no nariz e na mandíbula esquerda;
– contusão pulmonar direita;
– escoriações no abdómen;
– equimoses nos membros superiores direito e esquerdo; e
– equimoses nos membros inferiores direito e esquerdo, lesões estas, principalmente as traumáticas crâneo-meningo-encefálicas, que causaram a sua morte;
RR) Logo no local, HH foi assistido por equipa de Viatura Médica de Emergência e Recuperação, sendo entubado e mostrando a pontuação 3 da Escala de Glasgow;
SS) Foi depois transportado para o Hospital 1..., no Porto, onde deu entrada, sedado e ventilado, pelas 18.20 horas, sendo depois sujeito a exames de diagnóstico, designadamente tomografia computorizada crânio-encefálica e toráxica;
TT) Nesse estabelecimento hospitalar, HH foi levado para o bloco operatório de urgência e sujeito a craniectomia descompressiva fronto-temporo-parietal esquerda com aspiração do hematoma extradural direito e do hematoma subdural direito;
UU) Já após a intervenção cirúrgica referida, perante a anisocoria com midríase direita, foi sujeito a nova tomografia computadorizada, revelando hematoma extradural frontal direito, pelo que foi novamente levado ao bloco operatório e submetido a craniotomia frontal direita com aspiração de múltiplos pontos de origem no seio longitudinal);
VV) Nesta intervenção cirúrgica, HH apresentou instabilidade hemodinâmica com paragem cardíaca, sendo submetido a manobras de suporte avançado de vida durante 25 minutos, mas sem sucesso, sendo o seu óbito declarado pelas 2.30 horas do dia 24 de fevereiro de 2019;
WW) Em consequência da conduta do arguido descrita, JJ sofreu escoriações em diversas partes do corpo e fratura da tíbia e perónio esquerdos, sendo assistido no Centro Hospitalar ..., sendo submetido a correção cirúrgica no dia 24 de fevereiro e ficado internado até ao dia 26 de fevereiro;
XX) Desde essa data, tem sido submetido a várias sessões de fisioterapia, mantendo edema generalizado do tornozelo, rigidez da tibiotársica; cicatriz com 18 cm vertical na região lateral da perna (1/3 distal); cicatriz com 7 cm transversal na região distal e anterior da perna, com marcha claudicante;
ZZ) Em consequência da conduta do arguido descrita, II sofreu diversas lesões, designadamente:
– escoriações dispersas pela hemiface direita, mão direita e membro inferior direito;
– derrame articular e rotura distal do ligamento colateral medial com retração proximal do ligamento e extrusão do corpo do menisco medial, no joelho direito;
– fratura por impactação na transição de faceta lateral da tróclea do fémur para o côndilo femoral lateral, no joelho direito; e
– fratura sem desvio da margem do ligamento da cabeça do perónio, no joelho direito; e
– rotura dos ligamentos cruzados joelho direito (rotura do ligamento anterior, rotura do ligamento posterior, do complexo ligamentar medial, raiz posterior e rotura da radiaria do menisco interno;
AAA) Foi assistido no Centro Hospitalar ..., sendo sujeito a radiografia;
BBB) Tem sido sujeito a diversos exames de diagnóstico, nomeadamente radiografia, tomografia computorizada e ressonâncias magnéticas em ainda fisioterapia;
CCC) Pelo menos até 11 de junho de 2019, II fazia-se deslocar com o auxílio de canadianas;
DDD) II apresenta as seguintes sequelas:
– na face, duas cicatrizes na região frontal uma com dois centímetros supra-ciliar direita e outra com dois centímetros na região frontal direita;
– no membro superior direito, lesão abrasiva de 7x5 na região posterior do ombro, cicatriz discreta com 1 cm em F1 de D1;
– no membro superior esquerdo, cicatriz com 3 cm de comprimento na face posteromedial do cotovelo; duas cicatrizes com 1 cm de diâmetro nas articulações IFP de D2 e de D3;
– no membro inferior esquerdo, cicatriz de 3x2 cm na face antero medial do joelho, edema do joelho, com dor à mobilização ativa;
EEE) Em consequência da descrita conduta, o arguido causou danos no veículo automóvel BMW de matrícula ..-EM-.., propriedade de LL;
FFF) Com as condutas descritas, o arguido pretendia, e conseguiu, atingir a integridade física e a saúde de RR e PP, o que previamente representou e quis;
GGG) O arguido sabia que havia consumido bebidas alcoólicas e que isso tinha influência nas condições de segurança da condução de veículos automóveis;
HHH) O arguido estava ainda ciente que, ao conduzir do modo descrito, designadamente conduzindo em estado de embriaguez, imprimindo uma velocidade excessiva para o local, seguindo em contramão e não respeitando o sinal de sentido proibido (sinal C1), violava as mais básicas regras de circulação rodoviária, o que representou, quis e conseguiu;
III) Sabia ainda que a sua conduta de conduzir não estando em condições de o fazer em segurança por estar em estado de embriaguez e de conduzir em violação das regras estradais nos termos que se assinalaram, criaria, como efetivamente criou e quis criar, o perigo de atropelar os demais utentes da via, nomeadamente as pessoas que se encontravam na via pública e, ainda, a pessoa que transportava, causando-lhes lesões na integridade física ou mesmo a morte, o que, sem prejuízo das lesões causadas a KK, JJ e II e da morte de DD e HH, só não sucedeu por sorte, e de, além disso, atingir bens patrimoniais de valor elevado, designadamente os veículos que se encontravam a circular ou estacionados na via pública;
LLL) Ao conduzir o veículo nos moldes descritos, nomeadamente dirigindo-o contra as pessoas que encontrasse na via pública e que conseguisse atingir atropelando-as, o arguido, animado de sentimentos de vingança e sem qualquer motivo que o justificasse, agiu com o propósito de lhes tirar a vida, o que representou, quis e conseguiu relativamente a DD e HH, só não o conseguindo em relação a KK, JJ e II por razões alheias à sua vontade;
MMM) O arguido sabia que conduzia um veículo automóvel e que o mesmo, quando dirigido ao corpo de pessoas a grande velocidade, é suscetível de ser particularmente letal, assim melhor assegurando o êxito das suas intenções.
NNN) O arguido atuou, ainda, com o propósito, conseguido, de danificar os veículos automóveis identificados em EEE), estando ciente que tais bens não lhe pertenciam e que agia contra a vontade e em prejuízo dos respetivos proprietários;
OOO) O arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, ciente do caráter ilícito e reprovável das suas condutas, sabedor que as mesmas eram, como ainda são, proibidas e punidas por lei;
PPP) Com base no falecimento do beneficiário DD, NISS n. 0 ..., em consequência do acidente a que dizem respeito os autos, foram requeridas no ISS,I.P/Centro Nacional de Pensões, pela viúva, AA, as respetivas prestações por morte- despesas de funeral e pensões de sobrevivência, as quais foram deferidas.
QQQ) Em consequência o ISS, IP/CNP pagou a AA a título de subsídio por morte, o montante de EUR: 1.307,28 (mil trezentos e sete euros e vinte e oito cêntimos). (Doc. 1).
RRR) Pagou ainda, à viúva, pensões de sobrevivência no total de C: 4.962,76 (quatro mil novecentos e sessenta e dois euros e setenta e seis cêntimos) no período de 2019-03 a 2021-02, sendo o valor mensal da pensão atribuída atual de €: 183,27 (cento e oitenta e três euros e vinte e sete cêntimos). Até 07.2022 pagou-lhe 8.884,16 EUR, conforme certidão junta com a ampliação do pedido por requerimento de 11.07.2022.
SSS) No período supra referido, pagou pensões de sobrevivência à filha do beneficiário, BB, o montante de €: 1.747,68 (mil setecentos e quarenta e sete euros e sessenta e oito cêntimos), sendo o valor mensal da pensão atribuída atual de €: 77,36 (setenta sete euros e trinta e seis cêntimos). Até 07.2022 pagou-lhe 3.374,88 EUR, conforme certidão junta com a ampliação do pedido por requerimento de 11.07.2022.
TTT) O falecido DD não deixou testamento, nem qualquer disposição de última vontade, encontrava-se à data da morte no estado de casado com a A. AA e deixou como únicas e universais herdeiras, além da mencionada A., a sua única filha, BB, aqui também A..
UUU) As quais se acham já habilitadas como únicas sucessoras do falecido DD, conforme Procedimento Simplificado de Habilitação de Herdeiros n.º ..., lavrado em 09/04/2019 na Conservatória do Registo Civil de Paredes e arquivado no processo n.º ..., maço 3 do ano de 2019 – cfr. doc. n.º 1 com a petição inicial
VVV) O DD nasceu em .../.../1982.
WWW) A A. BB nasceu em .../.../2014.
XXX) À data da sua morte a vítima HH tinha 31 anos de idade e tinha dois filhos, FF (8 anos de idade) e GG (6 anos).
YYY) Em resultado das lesões sofridas no sinistro o A II sofreu:
1) Rotura distal do ligamento colateral medial. Extrusão do corpo do menisco medial. Fratura por impactação na transição da faceta lateral da tróclea do fémur para o côndilo femoral lateral. Fratura sem desvio da margem do ligamento da cabeça do perónio.
2) Extrusão do corpo do menisco interno, sem indícios de laceração. Espessamento do LCP e do LCA, com possível rotura intersticial. Abaulamento do colateral interno, com rotura completa na inserção distal. .. Espessamento ligamento lateral externo. Derrame articular. Hipersinal extenso no côndilo femoral externo. Edema medular do prato tibial externo.
ZZZ) O A II apresenta as seguintes lesões:
1) Membro inferior direito: Na face interna do terço distal da coxa, cicatriz oblíqua para baixo e para trás, com 2 cm de comprimento. Na face interna do joelho, cicatrizvertical, com 15 cm de comprimento. Na face anterior do joelho, sobre a rótula, cicatriz vertical, com 6 cm de comprimento. Na face externa do terço distal da coxa, cicatriz vertical, com 2 cm de comprimento. Atrofia de 1 cm (49 cm vs 50cm). Flexão limitada a 120º (vs 140º). Extensão completa e simétrica. Aumento de temperatura do joelho. Dor à palpação da face interna e da cabeça do perónio.
2) Marcada instabilidade ligamentar interna, anterior e posterior. Na face interna do terço proximal da tíbia, cicatriz vertical, com 4 cm de comprimento.
AAAA) A data da consolidação médico-legal das lesões do A II é fixável em 12/05/2021.
BBBB) O Período de Défice Funcional Temporário Total é fixável num período de 10 dias.
CCCC) O Período de Défice Funcional Temporário Parcial é fixável num período 1165 dias.
DDDD) O Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total é fixável num período total de 1175 dias.
EEEE) Quantum Doloris fixável no grau 5/7.
FFFF) Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixável em 16 pontos, sendo de admitir a existência de Dano Futuro.
GGGG) As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, sendo no entanto compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional
HHHH) Dano Estético Permanente fixável no grau 3 /7.
IIII) Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 4 /7.
JJJJ) Ajudas técnicas permanentes: ajudas medicamentosas.
LLLL) Em resultado das lesões sofridas no sinistro o A JJ:
1) A 06/04/2021, por apresentar pseudartrose não infetada, foi realizada EMOS, osteotomiaosteotomia do perónio, descorticação do foco de pseudartrose, interposição de enxerto autólogo local, rimagem e reencavilhamento com cavilha T2 Stryker, que decorreu sem intercorrências.
2) Realizou tratamentos fisiátricos de 10/04/2019 a 12/01/2020, com alta funcionalmente bem nas AVD, mas com défice articular e muscular.
3) Reiniciou tratamento após ter sido novamente operado. Com boa evolução até à última consulta a 09/11/2021, apresentando marcha com ligeira claudicação, atrofia da coxa, dificuldade em subir e descer escadas e dificuldade nos agachamentos.
MMMM) Em resultado do acidente o A JJ tem as seguintes lesões:
- Membro inferior esquerdo: Atrofia da coxa de 2,5 cm. Atrofia da perna de 2 cm. Perímetro bimaleolar aumentado em 3 cm, principalmente por deformidade óssea da extremidade distal da tíbia.
- Cicatriz na face anterior do joelho, à esquerda da rótula, vertical, com 6 cm de comprimento. - Cicatriz na face lateral da metade distal da perna, vertical, hiperpigmentada, com 17 cm de comprimento.
- Cicatriz na face anterior do terço distal da perna, vertical, hiperpigmentada, com 9 cm comprimento.
- Flexão do joelho limitada a 110º. Extensão completa.
- Dorsiflexão limitada a 10º. Flexão plantar limitada a 10º.
NNNN) A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 13/05/2022.
OOOO) O Período de Défice Funcional Temporário Total é fixável num período de 8 dias.
PPPP) O Período de Défice Funcional Temporário Parcial é fixável num período 1168 dias.
QQQQ) O Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total é fixável num período total de 973 dias.
RRRR) Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial fixável num período total de 203 dias.
SSSS) Quantum Doloris fixável no grau 5/7.
TTTT) As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares.
UUUU) Dano Estético Permanente fixável no grau 4 /7.
ZZZZ) Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 4 /7.
AAAAA) Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 10 pontos.
BBBBB) O Hospital interveniente é uma instituição hospitalar integrada no Sistema Nacional de Saúde (SNS).
CCCCC) Nas datas constantes das faturas juntas para instruir o pedido respectivo, sob documentos n.o 1 e n.º 2, que se consideram integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos, o ora Interveniente prestou a JJ tratamentos médicos, melhor descritos naqueles documentos.
DDDDD) A referida assistência foi motivada pelo facto do assistido se ter dirigido ao Serviço de Urgência, na sequência de um acidente de viação/atropelamento ocorrido no dia 23 de fevereiro de 2019, cuja responsabilidade se discute nos presentes autos.
EEEEE) Na sequência de tal acidente, o sinistrado/utente foi assistido nas instalações e pelo pessoal especializado do Hospital ora Interveniente, nos Serviços de Urgência e Consulta Externa.
FFFFF) O custo da assistência hospitalar foi de € 2.035,51 (dois mil e trinta e cinco euros e cinquenta e um cêntimos).
GGGGG) Também nas datas constantes da fatura junta sob doc nº 3 com o pedido, o ora Interveniente prestou a KK tratamentos médicos, conforme melhor se alcança pela análise do referido documento, que se considera integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
HHHHH) A referida assistência foi motivada pelo facto do assistido se ter dirigido ao Serviço de Urgência deste hospital, na sequência de um acidente de viação/atropelamento ocorrido no dia 23 de fevereiro de 2019, cuja responsabilidade se discute nos presentes autos.
IIIII) Com efeito, na sequência de tal acidente sinistrado/utente foi assistido nas instalações e pelo pessoal especializado do Hospital, ora Interveniente, nos Serviços de Urgência e Consulta Externa.
JJJJJ) O custo da assistência hospitalar foi de € 100,15 (cem euros e quinze cêntimos).
KKKKK) Nas datas constantes das faturas, o Interveniente Centro Hospitalar ..., EPE prestou a II tratamentos médicos, conforme melhor se alcança pela análise dos documentos n.o 4 e n.º 5, juntos pelo demandante, que se consideram integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.
LLLLL) A referida assistência foi motivada pelo facto do assistido se ter dirigido ao Serviço de Urgência deste hospital, na sequência de um acidente de viação/atropelamento ocorrido no dia 23 de fevereiro de 2019, cuja responsabilidade se discute nos presentes autos.
MMMMM) Com efeito, na sequência de tal acidente sinistrado/utente foi assistido nas instalações e pelo pessoal especializado do Hospital, ora Interveniente, nos Serviços de Urgência e Consulta Externa.
NNNNN) O custo da assistência hospitalar foi de € 724,86 (setecentos e vinte e quatro euros e oitenta e seis cêntimos).
OOOOO) Por força da acção voluntária e directa do 1º Réu, que direccionou o veículo que conduzia na direcção do veículo do Autor LL, provocou no mesmo danos ao nível da porta da frente, porta traseira, guarda – lamas traseiro, farolim traseiro, jante e para- choques, cujo custo da reparação ascende a 3.631,02€ (três mil seiscentos e trinta e um euros e dois cêntimos), em conformidade com o relatório de avaliação sob o Doc. 2 com a petição dos autos apensos.
PPPPP) Tendo sido esse o valor que o Autor efectivamente suportou, conforme a factura-recibo ali junta como Doc. 3.
QQQQ) A atitude do co-Réu causou ao Autor abalo psíquico, tendo ficado perturbado, pela violência dos acontecimentos.
RRRRR) O veículo .... OJA à data do evento tinha sido abatido no Reino Unido, com licença expirada em 31/12/2016.
SSSSS) O veículo estava permanente, continua ou ininterruptamente em Portugal desde há mais de um ano com relação à data do sinistro, sendo habitualmente conduzido pela mulher do 1º Réu, esta residente habitualmente em Portugal, nas suas deslocações diárias.
TTTTT) Em Portugal, como em Inglaterra, o veículo .... OJA não tinha seguro válido e eficaz.
UUUUU) Ao menos na ocasião em que foi embatido/atropelado, o falecido DD sofreu dores físicas decorrentes das lesões que sofreu.
VVVVV) A A. AA e o falecido DD formavam um casal normalmente unido e feliz, nutrindo reciprocamente amor conjugal.
XXXXX) A A BB amava o seu pai e era por ele amada, sendo que ele se preocupava com o seu futuro e educação e sente-se afectada sem a presença, apoio e carinho que o progenitor antes lhe proporcionava.
ZZZZZ) O falecido DD dedicava à mulher e à filha ao menos parte do seu tempo disponível, dando-lhes carinho e afeto, retribuído pelas AA.
AAAAAA) O trágico decesso do marido causou dor, sofrimento e desgosto às AA. AA e BB, o qual se manteve e manterá por muito tempo, sendo que as AA ainda se comovem quando se fala no acidente que vitimou o seu ente querido.
BBBBBB) As AA. AA e BB tiveram, em consequência da morte do seu marido e pai, dificuldade em dormir e descansar, insónias frequentes e sentimentos de revolta, tristeza e impotência.
CCCCCC) O DD trabalhava por conta, ao serviço e sob as ordens da sociedade B..., Lda., ao abrigo de contrato de trabalho, tendo a categoria profissional de operador de pantógrafo – cfr. docs. n.ºs 5, 6 e 7 com a pretensão respectiva.
DDDDDD) E auferia, à data do acidente, a retribuição mensal base de 600,00€ x 14meses, acrescida de subsídio de alimentação no valor mensal de 99,44€.
EEEEEE) Em virtude do atropelamento, ficaram destruídos e ou desapareceram a roupa e bens que o falecido DD possuía e usava, em quantidade, qualidades e preço não concretamente apurados.
FFFFFF) As despesas suportadas pela A. AA com o funeral de DD, flores e celebração litúrgica, ascenderam ao total de 1.964,50€.
GGGGGG) O falecido HH à data do sinistro vivia com a Autora EE como se de marido e mulher se tratassem.
HHHHHH) O HH era uma pessoa normalmente saudável, alegre, interessada pela vida, um pai normalmente extremoso.
IIIIII) HH trabalhava na empresa "C...", NIF ... onde possuía a categoria profissional de Servente, auferindo mensalmente a retribuição de €631,89 (Seiscentos e trinta e um euros e oitenta e nove cêntimos), sendo no momento da ocorrência dos factos a única fonte de rendimento do seu agregado familiar, mulher e filhos.
JJJJJJ) Gozava de normal saúde, era normalmente enérgico e trabalhador, sendo este o único sustento da sua família, composto pela sua mulher e filhos.
LLLLLL) Era ligado à sua família, sendo dedicado e carinhoso para com os seus filhos, passeando com os mesmos, acompanhando-os nas atividades escolares e nas atividades de lazer que estes frequentavam. De igual modo com a sua mulher, sendo boa a ligação afectiva entre todos. Conviviam diariamente na residência de família e aí tomavam as suas refeições e também dormiam.
MMMMMMM) O menor Autor GG tem uma perturbação do espectro autista, com evolução positiva ou favorável, conforme documento junto sob o número 40 à petição respectiva.
OOOOOO) Ao menos no momento em que foi colhido pelo automóvel o HH sentiu dor.
PPPPPP) Os filhos e companheira da vítima HH ficaram abalados, tristes e desanimados com a morte daquele, tendo algumas dificuldades na realização das tarefas quotidianas no período temporal mais próximo do sinistro, chegando a ter acompanhamento psicológico. Sentiram e ainda sentem dor, sofrimento e angústia pela morte do falecido e seu desaparecimento dos seus quotidianos.
QQQQQQ) Como consequência direta e necessária do atropelamento ficaram destruídos e ou desapareceram roupa e bens que a vítima HH usava/trazia, em quantidade, qualidades e preço não concretamente apurados.
RRRRRR) O custo do funeral de HH ascendeu a 1975 euros (mil, novecentos e setenta e cinco euros), nos termos do documento sob o número 43 junto com o respectivo pedido, frente e verso.
SSSSSS) O A II jogava, antes do sinistro, habitualmente futebol com os amigos.
TTTTTT) A II exercia atividade profissional na empresa D... Lda com a categoria de montador de móveis de 2ª, auferindo uma retribuição mensal líquida de 693,40, nos termos do documento 12 junto com a respectiva petição.
UUUUUU) Durante o lapso de tempo referido em DDDD) apenas recebeu o subsídio de doença respectivo.
VVVVVV) As roupas que o A. II usava ficaram inutilizadas por se encontrarem rasgadas e danificadas, em quantidade, qualidade e preços concretamente não apurados.
XXXXXX) O A II despendeu a quantia de 53,65 euros em medicação relativa aos tratamentos, mormente para as dores, em consequência das lesões sofridas com o sinistro, conforme documentos sob 14 a 18 com a petição respectiva.
ZZZZZZ) O A JJ antes do sinistro andava habitualmente de bicicleta.
AAAAAAA) E era o A JJ era bombeiro voluntário em ....
BBBBBBB) O A JJ realizava durante o período de ITA e ao menos em parte do período de ITP marcha com amparo de uma muleta. No período de ITA necessitou de ajuda para a realização das tarefas básicas da vida quotidiana.
CCCCCCC) Foi-lhe necessário, para tratamento das lesões sofridas, comprar os seguintes medicamentos: enoxaparina, naproxeno e tramadol, resultando num gasto de 31,42€ (trinta e um euros e quarenta e dois cêntimos), conforme documento 9 junto com a sua pretensão.
DDDDDDD) No período de tempo referido em QQQQ) deixou de receber ao menos o valor de 3.349,96€, de diferença entre o salário que recebia na ocasião do sinistro, o salário mínimo nacional, e o subsídio de doença que lhe foi pago nesse lapso temporal.
EEEEEEE) A reparação dos danos da bicicleta do A KK, que era uma bicicleta de BTT, ascende ao valor de dois mil, trezentos e três euros, nos termos do documento n.º 1 junto com a respectiva pretensão.
FFFFFFF) O A KK teve danos na sua roupa, ficando a mesma toda rasgada, e foram destruídos os seguintes equipamentos que trazia consigo na ocasião, um tablet de marca BQ que levava consigo para o orientar em GPS, o qual partiu totalmente e um smartphone de marca Samsung, que levava para estabelecer ligações telefónicas, cuja substituição por equipamento novo importará na quantia de € 812,80 (oitocentos e doze euros e oitenta cêntimos) – cfr doc. 2, 3 e 4 com o seu pedido.
GGGGGGG) II Nasceu a .../.../1981.
HHHHHHH) JJ nasceu a .../.../1974.
FACTOS NÃO PROVADOS
1. O Autor LL sofreu forte abalo psíquico/psicológico, por ver o seu veículo ser propositadamente danificado;
2. O mesmo Autor sempre que conduzia o veículo em causa revivia toda a situação traumática, até que tomou a decisão de colocar o veículo à venda para tentar conseguir ultrapassar a situação violenta em que se viu inesperadamente envolvido;
3. O veículo .... OJA estava matriculado à data dos eventos no Reino Unido;
4. O veículo .... OJA tinha estacionamento habitual em Inglaterra;
5. A mais do provado sob UUUUU), o falecido DD sofreu dores morais atrozes decorrentes da angústia da separação dos seus entes queridos e do medo da morte que sentia e sentiu dores físicas durante o período de sobrevida, ou, pelo menos, em parte dele, decorrentes das lesões de que padecia;
6. A mais do provado sob VVVVV) e ss. a morte do marido e pai das AA, DD é insuperável e as AA perderam o gosto pela vida;
7. A morte do pai afetará negativamente os seus (da A. BB) adequados crescimento e desenvolvimento;
8. O falecido DD usava/trazia na ocasião do atropelamento, tendo sido aqueles exactamente que ficaram destruídos ou desapareceram: um telemóvel Samsung ..., no valor de 300,00€, umas calças Guess, no valor de 120,00€, uma t-shirt Tiffosi, no valor de 25,00€, um relógio Police, no valor de 250,00€, uma aliança de casamento, em ouro, no valor de 500,00€, e umas sapatilhas NC, no valor de 85,00€, tudo no valor global de 1.280,00€;
9. Também no espaço temporal que mediou até ao seu falecimento o HH passou por inimaginável dor, sofrimento e angústia;
10.O menor GG é autista;
11.A mais do provado em PPPPPP) a mulher e filhos do falecido HH vivem atormentados, sorumbáticos e depressivos, não tendo ainda hoje vontade de estudar, fazer as suas atividades, bem como sair de casa.
12.Desde a sua morte que se encontram em depressão, de tal forma que são acompanhados desde essa data até ao momento por um psicrólogo, no caso dos menores pela Dra XX no Hospital 2..., e a sua companheira EE pela Dra YY em consultas particulares;
13. Após o falecimento do HH, a esposa e filhos vivem com os pais deste que ajudam no seu sustento;
14.O falecido HH usava/trazia na ocasião do atropelamento, tendo sido aqueles exactamente que ficaram destruídos ou desapareceram aquando da ocorrência roupa e equipamentos que totalizam o valor de 495 euros: um telemóvel Samsung no valor de 250,00 euros; umas calças de ganga marca Lois, no valor de 50,00 euros; uma camisola da Zara, no valor de 15,00 euros; um casaco marca Zara, no vaor de 60,00 euros; um relógio swatch no valor de 55.00 euros; um par de sapatilhas Nike no valor de 65,00 euros;
15.Para além ou para lá do período temporal assente em DDDD) o II manteve incapacidade absoluta para o exercício de outra actividade profissional compatível com a sua preparação académica e experiência profissional anterior;
16.A roupa do A. II destruída ou danificada ascendia ao valor de 140,00, sapatilhas Nike (60,00 euros), calças tiffosi (50,00 euros) e camisola tiffosi (30,00 euros);
17.O A. II pagou a factura relativa aos tratamentos hospitalares junta à sua petição como doc. 13;
18.Durante o período de ITA o valor do subsídio de doença do A. II era de 400 EUR mensais;
19.O A II ficou devastado emocionalmente, uma vez que só não morreu porque o seu amigo ZZ o arrastou pois, caso a viatura que o Réu conduzia lhe tivesse passado por cima novamente, tem consciência de que não resistiria aos ferimentos provocados;
20.O A JJ fazia passeios e caminhadas antes do sinistro;
21.A mais do provado em BBBBBBB) o A. JJ no período de ITP também necessitava do auxílio constante do irmão e da cunhada para necessidades básicas da vida quotidiana;
22.O A. JJ lembra com frequência da angústia e do desespero dos momentos que precederam o acidente, quando viu o Réu avançar contra si, com a viatura que conduzia.»

3. Com base em tal factualidade, o Tribunal de 1ª instância decidiu julgar a ação parcialmente procedente, por provada e, em consequência, condenar os Réus Fundo de Garantia Automóvel (FGA) e CC a pagarem: [1]
1. Às AA. AA e BB,
● - 20.000 EUR, a título de indemnização do dano não patrimonial sofrido pela própria vítima antes de morrer;
● - 130.000 EUR, a título de indemnização pelo dano da morte respectiva;
● - 40.000 EUR à A. BB e 25.000 EUR à A. AA, a título de dano não patrimonial pela morte do seu pai e marido, respectivamente;
● 220.000 EUR, a título de perda dos rendimentos com que o sinistrado contribuía para a economia familiar;
● - 300 EUR, bens do sinistrado destruídos no acidente;
● - 657,52 EUR (assim reduzida a quantia inicialmente pedida de 1964,50 EUR) a título de despesas de funeral suportadas e não compensadas pelo subsídio recebido da SS.
2. Ao ISS, IP, CNP, a quantia global de 13.566,32 EUR;
3. A LL a quantia de 3.631,02 EUR;
4. A EE, viúva e seus filhos FF e GG.
● - 56.792,68 EUR pelo dano da morte do seu marido e pai;
● - 5.000 EUR, pelos danos não patrimoniais da vítima antes de morrer;
● - 25.000 EUR a A. FF, pelo dano da morte do seu pai;
● -40.000 EUR pelo mesmo dano, desta feita pelo filho GG e 22.717 a companheira EE;
● - 300 EUR, bens destruídos aquando do sinistro;
● - 1975 EUR de despesas de funeral.
● - 180.000 EUR, a título de perda dos rendimentos com que o sinistrado contribuía para a economia familiar.
5. A II:
● - 3.800 EUR, a título de perdas salariais relativas à diferença entre o valor do subsídio de doença que auferiu durante o período de incapacidade absoluta para o trabalho e o respectivo salário mensal;
● - os danos futuros, a liquidar ulteriormente, emergentes dos factos provados sob FFFF), GGGG) e JJJJ), em função do já apurado rendimento mensal, aqui incluída a possibilidade de agravamento da incapacidade e a necessidade de ajudas medicamentosas;
● - 60.000 EUR a título de dano moral padecido em função das lesões sofridas e tratamentos implicados;
● - 193 EUR.
6. A JJ:
● - 50.000 EUR a título de dano não patrimonial, padecido em função das lesões sofridas e tratamentos implicados;
● - 3.349,96 EUR, a título de perdas salariais relativas à diferença entre o valor do subsídio de doença que auferiu durante o período de incapacidade absoluta para o trabalho e o respectivo salário mensal;
● - 31,42 EUR de despesas medicamentosas;
● - 36.000 EUR, a título de dano emergente do défice funcional da integridade físico psíquica do qual ficou a padecer.
7. Ao Centro Hospitalar ..., EPE, 2.860,52 EUR.
8. A KK, 5.615,80 EUR;
Absolvendo-os das demais quantias peticionadas.
Cada uma e todas as quantias referidas é acrescida de juros, à taxa legal das obrigações civis, vencidos desde a citação/dedução do pedido e vincendos até integral e efectivo pagamento.
Absolvo o GPCV das pretensões contra si deduzidas.»

4. Inconformado com tal decisão, dela apelou o FGA [2], formulando as seguintes CONCLUSÕES:
«a) O montante indemnizatório atribuído a título da perda do direito à vida da vítima DD foi excessivamente fixado pelo tribunal recorrido, devendo ser reduzido de €130.000,00 para €80.000,00;
b) O montante indemnizatório atribuído título de danos morais próprios sofridos pela autora BB, filha de DD deve ser reduzido de €40.000,00 para €30.000,00;
c) O montante indemnizatório a atribuir a título de dano emergente do défice funcional da integridade físico psíquica de que ficou a padecer o autor JJ deve ser reduzido de € 36.000,00 para € 20.000,00;
d) O montante indemnizatório a atribuir ao autor JJ a título de danos não patrimoniais deve ser reduzido de € 50.000,00€ para € 15.000,00;
e) A intervenção ressarcitória do FGA é excluída na medida em que concorra com a previsão ressarcitória da Segurança Social com origem no mesmo facto – o acidente de viação;
f) Ao montante devido nos termos da lei da Segurança Social, a instituição respetiva deve efetuar a prestação devida e, posteriormente, terá direito de reembolso pelo montante previsto na respetiva lei, mas apenas na medida em que a amplitude da sua intervenção tenha sido determinada pelo mecanismo previsto no artigo 51.º n.º 3 do DL 291/2007, de 21 de agosto;
g) O FGA está excluído do conjunto de entidades obrigadas a reembolsar a Segurança Social, devendo assim revogar-se a sentença recorrida na parte em que condena o FGA ao pagamento do pedido de reembolso apresentado pelo ISS, IP, CNP, das prestações sociais pagas às autoras AA e BB, em razão do falecimento do beneficiário DD, a título de subsídio por morte e pensão de sobrevivência.
h) O Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 496.º, 562.º 564.º n.º 2 e 566.º, todos do Código Civil, bem como o artigo 51.º n.º 3 e 4 do DL 291/2007, de 21 de agosto.
Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. muito doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente ser a sentença recorrida revogada, sendo substituída por outra que contemple as conclusões atrás aduzidas, tudo com as legais consequências. Decidindo deste modo, farão V. Exas. um ato da mais elementar JUSTIÇA!»

5. Contra-alegaram AA, BB e JJ, sustentando a improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO
6. Apreciando o mérito do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art.º 615º nº 1 al. d) e e), ex vi do art.º 666º, 635º nº 4 e 639º nº 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC).

6.1. Se o montante indemnizatório atribuído a título da perda do direito à vida da vítima DD deve ser reduzido de €130.000,00 para €80.000,00
Como é sabido, e decorre da sua especial natureza, quanto a danos morais não se pode falar propriamente em indemnização — cujo objetivo é preencher uma lacuna verificada no património do lesado — mas antes em reparação, isto é, trata-se de, através da atribuição de um valor adequado, proporcionar um determinado grau de satisfação que minore ou faça esquecer as dores, sofrimentos e incómodos em que se incorreu.
Ou, se se quiser, tem tal indemnização uma natureza mista uma vez que, visando essencialmente compensar os danos sofridos, não deixa de ter um caráter de reprovação da conduta do agente.
Por isso, para além da gravidade dos danos, na sua fixação deve ter-se em conta o grau de culpa do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias, tudo numa ponderação de acordo com as regras do senso prático, da justa medida das coisas, em criteriosa ponderação das realidades da vida: art.º 495º, 496º, nº 3 e 497º, todos do Código Civil (CC).
Neste âmbito, dado que por natureza tais danos são impossíveis de quantificação monetária, o art.º 496º nº 3 CC determina que a respetiva fixação seja feita com recurso à equidade.
Obstando a que não se confunda equidade com a subjetividade do julgador, devemos ater-nos a uma aplicação mais ou menos uniforme do direito (art.º 8º nº 3 do CC), como forma de reduzir a margem subjetividade do julgador, na procura da justiça relativa em casos de sempre difícil decisão quanto à fixação de um montante indemnizatório para danos que, por sua natureza, sempre seriam incomensuráveis e de muito difícil avaliação global.
Na verdade, «(…) - não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um estrito critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá, em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial e injustificado, dos critérios ou padrões que generalizadamente se entende deverem ser adoptados, numa jurisprudência evolutiva e actualística, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da necessidade adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade.
Deste modo, mais do que discutir e reconstruir a substância do casuístico juízo de equidade que esteve na base da fixação (…) do valor indemnizatório arbitrado, em articulação incindível com a especificidade irrepetível do caso concreto, plasmada nas particularidades singulares da matéria de facto fixada, importa essencialmente verificar, num recurso de revista, se os critérios seguidos e que estão na base de tais valores indemnizatórios são passíveis de ser generalizados para todos os casos análogos – muito em particular, se os valores arbitrados se harmonizam com os critérios ou padrões que, numa jurisprudência actualista, devem sendo seguidos em situações análogas ou equiparáveis – (…)». [3]
Sobre o tema, permitimo-nos transcrever aqui a resenha jurisprudencial do STJ efetuada num acórdão de 08/06/2021, no processo nº 2261/17.7T8PNF.P1.S1, Relatora Maria João Vaz Tomé:
«- segundo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de setembro de 2020 (Rijo Ferreira), proc, n.º 9/14.7T8CPV.P2.S1, “(…) VIII - Não é de censurar a fixação em € 54.000,00 e € 16.000,00 a indemnização pela perda do direito à vida e demais danos morais pela morte de indivíduo com 75 anos que foi sujeito a várias hospitalizações durante 1 mês e a 3 meses de tratamento ambulatório, não recuperou a marcha, viveu os últimos 4 meses de vida entre a cama e a cadeira de rodas dependendo de terceiros quando antes era pessoa autónoma, daí decorrendo afectação funcional, do bem-estar físico e psíquico, da autonomia pessoal e liberdade ambulatória, da capacidade de afirmação pessoal, da imagem perante os outros e si próprio, e o inerente sofrimento físico e psíquico”[28];
- conforme o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de maio de 2019 (Pinto de Almeida), proc. n.º 1580/16.4T8AVR.S1, “(…) II - Provando-se que a vítima, à data da morte, tinha 72 anos, era uma pessoa activa, gozava de boa saúde, era sociável e alegre, dedicava-se a uma agricultura para consumo familiar, sendo estimado e considerado no meio onde vivia, fazendo parte de uma tuna, e era bom marido, pai e avô, deverá ser fixado em € 70 000,00 o montante (anteriormente fixado em € 60 000,00) pela perda do direito à vida. (…)”;
- no acórdão de 19 de dezembro de 2018 (Távora Victor), proc. n.º 1178/16.7T8VRL.L1, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu que “(…) III - Na fixação da indemnização decorrente da perda do direito à vida pesam as circunstâncias de cada caso, sendo que, no caso de uma vítima de 61 anos de idade, estimada e inserida no meio em que vivia e susceptível de ganhar o seu sustento, mostra-se adequado fixar a indemnização a título do dano morte no montante de € 60.000,00.
- segundo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de junho de 2018 (Salreta Pereira), proc. n.º 370/12.8TBOFR.C1.S2, “(…) II - Os valores de € 65.000 e de € 30.000 fixados a título de indemnização pelo dano morte e pelos danos não patrimoniais sofridos por cada um dos filhos da vítima, estão em consonância com os critérios praticados pelo STJ. (…)” - no caso apreciado por este acórdão, a vítima tinha, à data da morte, 44 anos de idade;
- conforme o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de março de 2018 (Tomé Gomes), proc. n.º 209/13.7TBTMR.E1.S1, “I - Resultando dos factos provados que: (i) o atropelamento do peão, ocorrido em 31-12-2011, pelas 19h40m, teve lugar no momento em que o veículo transpunha o eixo médio da faixa de rodagem para passar a circular no corredor mais à esquerda; (ii) que o veículo circulava com a luz dos médios ligados; (iii) que o troço da via antecedente ao local do embate se estendia numa reta de, pelo menos, 200 metros; (iv) que a travessia do peão se processou no campo visual do referido condutor a uma distância de 30 metros; (v) que a estrada, nessa zona, era marginada por habitações; (vi) que o veículo seguia a cerca de 80km/hora; (vii) que o peão empreendeu a travessia numa estrada nacional e (viii) que podia alcançar a aproximação de veículos, é de concluir que tanto o condutor do veículo como o peão violaram as normas estradais, contribuindo ambos para a produção acidente. II - O condutor do veículo, porque seguia a cerca de 80km/hora quando as circunstâncias enunciadas em I, designadamente o facto de ser previsível a travessia de peões à hora em referência (19h40m), lhe impunham que moderasse especialmente a velocidade, de modo a permitir a execução de manobra de desvio ou de paragem ante a eventual travessia de peões, dentro da zona de visualização de que dispunha (arts. 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, al. c), ambos do CEst). III - O peão porque empreendeu a travessia numa estrada nacional e podendo alcançar a aproximação de veículos, fê-lo sem se assegurar de que podia realizar essa travessia em segurança, violando o disposto no art. 101.º, n.º 1, do CEst. IV - Face aos descritos factos, é adequado distribuir as responsabilidades concorrentes do condutor do veículo e do peão para a produção do acidente na proporção de 60% para o primeiro e de 40% para o segundo, uma vez que, estando aquele habilitado para o exercício da condução automóvel, requer-se dele um maior nível de exigência e um maior domínio das circunstâncias envolventes, mormente da distância visualizável que dispõe à sua frente para poder suster a marcha em caso de um previsível surgimento de peões na via. V - No que toca à indemnização pelo dano morte, tendo em conta que o peão contava então com 79 anos de idade, era saudável, ativo e jovial, ocupando-se no cultivo da terra e noutras atividades agrícolas, bem como que a jurisprudência tem oscilado entre os € 50.000 e os € 80.000, é ajustado um valor na ordem dos € 65.000, o qual, atendendo à quota de responsabilidade de 60% imputada ao condutor do veículo, fica reduzido a € 39.000. (…)”.».
Para além deste, podemos ainda citar outros arestos, mais atualizados, todos do STJ:
Acórdão de 11/02/2021, processo 625/18.8T8AGH.L1.S1, Relator Abrantes Geraldes, vítima com 7 anos de idade, onde se refere:
«Destaca-se para o caso a apreciação que foi feita no Ac. do STJ, de 3-11-16, 6/15, no qual foi considerado que a quantia de € 100.000,00 constituía um valor equitativo, nele se fazendo uma resenha de outros acórdãos anteriores nos termos que se reproduzem:
“Consolidou-se, assim, na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça o entendimento de que o dano pela perda do direito à vida, direito absoluto e do qual emergem todos os outros direitos, situa-se, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50.000,00 e € 80.000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a € 100.000,00 (cf., entre outros, os Acs. do STJ, de 10-5-12 (451/06), de 12-9-13 (1/12), de 24-9-13 (294/07), de 19-12-14 (1229/10), de 9-9-14 (121/10), de 11-2-15 (6301/13), de 12-3-15 (185/13), de 12-3-15 (1369/13), de 30-4-15 (1380/13), de 18-6-15 (2567/09) e de 16-9-16 (492/10), todos acessíveis através de www.dgsi.pt”.»
Acórdão de 03/03/2021, proferido no processo 3710/18.2T8FAR.E1.S1, Relatora Maria do Rosário Morgado, atribui-se € 80.000,00 a uma vítima com 33 anos de idade.
Acórdão de 10/11/2022, processo 239/20.2T8VRL.G1.S1, Relatora Maria da Graça Trigo, mantiveram-se os € 70.000,00 fixados pela Relação a uma vítima com 63 anos.
Acórdão de 27/09/2022, processo 253/17.5T8PRT-A.P1.S1, Relator Isaías Pádua, mantiveram-se os € 95.000,oo fixados em 1ª instância (a Relação havia reduzido para 85 mil) a uma vítima com 41 anos de idade.
Acórdão de 15/09/2022, processo 2374/20.8T8PNF.P1.S1, Relatora Fátima Gomes, mantiveram-se os € 85.000,00 fixados pela Relação (a 1ª instância havia fixado 130 mil), a uma vítima com 33 anos e 2 filhos menores.
Acórdão de 13/05/2021, processo nº 10157/16.3T8LRS.L1.S1 – vítima com “45 anos de idade e um bom relacionamento com o seu único filho”, o STJ manteve os € 80.000,00 atribuídos pela Relação.
Acórdão de 19/02/2014 (processo 1229/10.9TAPDL.L1.S1) – atribuiu-se € 100.000,00 numa situação de uma vítima de 49 anos, “um profissional de nível superior e de reconhecido mérito como também um pai e um marido extremoso”, gozando de excelente saúde.
Acórdão de 11/02/2015 (processo 6301/13.0TBMTS.S1) – estava em causa um jovem adulto de 31 anos, tendo-se a indemnização cifrado em € 70 000,00.
Acórdão de 30/04/2015 (processo 1380/13.3T2AVR.C1.S1) – sendo a vítima um jovem de 19 anos de idade, o STJ manteve os € 80.000,00 fixados pela Relação.
Acórdão de 18/06/2015 (processo 2567/09.9TBABF.E1.S1) – “vítima com 20 anos, solteiro, vivia com os pais e uma irmã, tinha começado a trabalhar recentemente como motorista, se encontrava numa fase pujante da vida e que foi embatido na sua faixa de rodagem por um veículo que se pôs de imediato em fuga, é adequado o montante indemnizatório de € 80.000, pela perda do direito à vida, tal como fixado pela Relação”.
No caso, a vítima DD tinha 36 anos de idade, casado e com uma filha de 5 anos, numa vivência harmoniosa, trabalhador. Desconhecendo-se outras circunstâncias da sua vida, sabe-se, contudo, do alto grau de culpa do lesante (dirigindo o seu automóvel deliberadamente contra as pessoas que se encontravam na via pública, que nenhum mal lhe tinham causado, e atropelando-as).
Nestas circunstâncias, entendemos adequado fixar em € 100.000,00 a indemnização atribuída a título da perda do direito à vida de DD.

6.2. Se o montante indemnizatório atribuído título de danos morais próprios sofridos pela autora BB, filha de DD deve ser reduzido de €40.000,00 para €30.000,00
Relevando aqui a mesma argumentação no tocante à fixação indemnizatória por equidade, temos os seguintes dados jurisprudenciais:
No já referido acórdão de 15/09/2022, processo 2374/20.8T8PNF.P1.S1, manteve-se o valor de € 25.000,00 para cada um dos filhos da vítima, de 04 e 13 anos.
No acórdão de 25/02/2021, processo 4086/18.3T8FAR.E1.S1, Relatora Rosa Tching, atribuiu-se a esse título € 35.000,00.
No acórdão de 27/09/2022, processo 253/17.5T8PRT-A.P1.S1, Isaías Pádua, fixou-se em € 40.000,00 os danos não patrimoniais de um filho com 11 anos de idade.
No caso, releva o intenso dolo do lesante, já referido; no tocante à filha lesada, a BB tinha 5 anos de idade, mais se tendo provado que se sente afetada sem a presença/apoio e carinho do pai, cujo trágico decesso lhe causou dor, sofrimento e desgosto, que se manterá por muito tempo, e que, em consequência da morte do seu pai, sente dificuldade em dormir e descansar, insónias frequentes e sentimentos de revolta, tristeza e impotência.
Nestas circunstâncias, atenta a média de fixação jurisprudencial para casos idênticos, entendemos mais ponderado fixar em € 35.000,00 a indemnização atribuída a título de danos morais próprios sofridos pela autora BB, pelo decesso do pai DD.

6.3. Se o montante indemnizatório a atribuir a título de dano emergente do défice funcional da integridade físico psíquica de que ficou a padecer o autor JJ deve ser reduzido de € 36.000,00 para € 20.000,00
Segundo Teresa Magalhães [4], o dano corporal pode ser visto numa tripla perspetiva: as sequelas lesionais, «as consequências orgânicas permanentes na estrutura anatómica ou funcional de um órgão, correspondente a um estado relativamente estabilizado da lesão (ex: cicatriz cutânea, ausência de perna e pé por amputação; anquilose de um cotovelo)»; as sequelas funcionais, «compreendem a alteração das capacidades físicas ou mentais (voluntárias ou involuntárias), características de um ser humano, tendo em conta a sua idade, sexo e raça (ex: dificuldade de se deslocar em terreno plano, impossibilidade de procriar)» e as sequelas situacionais (handicaps), «representam a dificuldade ou impossibilidade de efectuar certos gestos necessários à participação na vida em sociedade (actividades da vida quotidiana, da vida afectiva e social e da vida profissional ou de formação)».
Estamos, portanto, perante um dano corporal que vai ter consequências e reflexos na futura capacidade patrimonial do Autor na medida em que lhe coarta o exercício da sua profissão habitual (art.º 564º nº 2 do CC).
Sendo já certo o dano biológico, as suas repercussões, porque projetadas no futuro, não passam de projeções ou previsões, pelo que a fixação do montante indemnizatório não pode ser feita nos mesmos moldes que para os danos patrimoniais, de mais fácil demonstração.
Impõe-se então aos Tribunais o dever de julgar, mais uma vez, segundo critérios de equidade: art.º 566º nº 3 do CC.
Provado ficou que o Autor ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo que as sequelas apresentadas são compatíveis com o exercício da sua atividade profissional habitual (marceneiro), mas implicam esforços suplementares.
Fazendo um juízo de prognose quanto ao futuro do Autor, tendo ele na altura 48 anos, está numa idade onde normalmente se começa a sentir o peso da idade, tornando-se o trabalho mais custoso mesmo numa situação normal. Fácil é de perspetivar ser expetável que a limitação dos 10% de que ficou a padecer rapidamente se agravará, como é próprio do avançar da idade.
Acresce que, enquanto dano autónomo, repercutido nas diversas funções/aptidões do ser humano, na valoração do dano biológico deve atender-se à esperança média de vida. [5] nesta medida, o Autor JJ terá de viver com o custo das suas limitações durante cerca de 30 anos.
Nessa medida, entendemos que o valor arbitrado foi equilibrado, pelo que improcede o recurso nesta parte.

6.4. Se o montante indemnizatório a atribuir ao autor JJ a título de danos não patrimoniais deve ser reduzido de € 50.000,00€ para € 15.000,00
Com relevância neste âmbito, ficou provado que lhe foi fixado um quantum doloris de 5 pontos numa escala máxima de 7, um dano estético de 4, repercussão nas atividades desportivas e de lazer de 4, foi sujeito a 2 cirurgias e fisioterapia (esta durante cerca de 9 meses) e só 3 anos depois lhe foi considerada a consolidação médico-legal das lesões. Ainda, como referido na sentença, a impossibilidade de manter a atividade de bombeiro voluntário.
Toda essa situação constitui facto notório da ocorrência de dores, desgostos e transtornos inerentes às limitações.
No acórdão de 25/05/2017, processo 868/10.2TBALR.E1.S1, Relator Lopes do Rego, atribuíram-se € 50.000,00 pelos nanos não patrimoniais de um jovem com 19 anos de idade.
No acórdão de 11/05/2022, processo 33/14.0T8MCN.P1.S1, Relatora Maria Clara Sottomayor, entendeu-se « Uma indemnização de 60.000,00 euros é adequada para compensar os danos não patrimoniais sofridos por um jovem de 17 anos, que esteve 48 dias internado, sofreu quatro cirurgias, das quais três na zona da cabeça, padeceu de um quantum doloris de 6/7, um dano estético de 4/7, um índice de repercussão permanente nas atividades desportivas de 4/7 e DFTP (Défice Funcional Temporário Parcial) de 1984 dias.»
No acórdão de 13/09/2022, processo 19190/18.0T8PRT.P1.S1, Relatora Maria João Vaz Tomé, fixou-se tais danos em € 40.000,00 a uma jovem vítima de atropelamento, dores de grau 5, dano estético de 4 e necessidade de esforços suplementares enquanto estudante de enfermagem.
Ponderadas essas situações, também aqui é de entender que o valor arbitrado foi equilibrado, pelo que improcede o recurso nesta parte.

6.5. Se deve revogar-se a sentença na parte em que condena o FGA ao pagamento do pedido de reembolso apresentado pelo ISS, IP, CNP, das prestações sociais pagas às autoras AA e BB, em razão do falecimento do beneficiário DD, a título de subsídio por morte e pensão de sobrevivência.
Em primeiro lugar, afigura-se-nos que o ISS, IP nem deveria ter sido admitido nos presentes autos.
Na verdade, cremos resultar claro da leitura do Decreto-Lei nº 59/89, de 22 de fevereiro [6] ¯ regime da intervenção da segurança social no reembolso de prestações em processos judiciais ¯, que o mesmo só é aplicável no caso de sinistros dos quais tenham resultado “incapacidade temporária ou definitiva para o exercício da atividade profissional ou morte”.
Ou seja, quando o responsável direto é um terceiro, a Segurança Social pode solicitar o reembolso nos processos cíveis ou penais, mas apenas:
● das prestações que pagou a título de incapacidade temporária/definitiva para o trabalho, ou morte;
● e apenas no tocante ao beneficiário direto (trabalhador).
Neste caso, as prestações foram pagas às herdeiras do beneficiário e têm natureza distinta das prestações por incapacidade temporária/definitiva para o trabalho, ou morte, prestações estas exclusivamente relacionadas com o trabalho do beneficiário.
Perante a Segurança Social há que distinguir as prestações que integram direito do beneficiário (direto) daquelas que constituem direito dos seus herdeiros.
Depois, como decorre do art.º 47º nº 1 e 52º nº 2 do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto (regime do sistema de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, RSORCA) a função do FGA é garantística e não de responsável civil; tanto assim que, enquanto o responsável civil tem a obrigação de indemnizar todos os danos (art.º 483º e 562º ss do CC), o FGA apenas indemniza os danos referidos no art.º 49º.
E, nos termos do art.º 51º do RSORCA:
3 - Quando, por virtude de acidente previsto nos artigos 48.º e 49.º, o lesado tenha direito a prestações ao abrigo do sistema de proteção da segurança social, o Fundo só garante a reparação dos danos na parte em que estes ultrapassem aquelas prestações.
4 - As entidades que satisfaçam os pagamentos previstos nos números anteriores têm direito de regresso contra o responsável civil do acidente e sobre quem impenda a obrigação de segurar, que respondem solidariamente.
5 - O lesado pelo acidente previsto nos artigos 48.º e 49.º não pode cumular as indemnizações a que tenha direito a título de responsabilidade civil automóvel e de beneficiário de prestações indemnizatórias ao abrigo de seguro de pessoas transportadas.
Portanto, nos termos deste preceito, o FGA só garante os danos que excedam os montantes pagos pelas prestações do ISS (nº 3); por seu turno, o ISS (ou outro sistema de segurança social) tem direito de regresso. [7]
Esta nos parece a interpretação mais consentânea.
Na verdade, o art.º 51º tem a epígrafe “limites especiais à responsabilidade do Fundo” e aparece depois da definição do âmbito geográfico e material da função garantística do FGA contra o responsável civil do acidente e sobre quem impenda a obrigação de segurar, que respondem solidariamente.
Ora, o FGA não é responsável civil; como se disse, tem apenas função garantística. Daí que a expressão “sobre quem impenda a obrigação de segurar” (nº 4) deve ser entendida como reportada às Seguradoras, e não ao FGA, a quem não é cometida legalmente qualquer “obrigação” de segurar.
Tal como na fiança, o responsável subsidiário só é chamado depois do devedor principal e na medida em que este não cumpriu a obrigação de pagamento; aqui, o FGA só é acionado para o pagamento da indemnização na medida em que o responsável pelo acidente é desconhecido ou não outorgou o seguro obrigatório. Mas há ainda que acautelar as hipóteses de acidentes com abandono de sinistrado, em que o FGA pode ser chamado em primeira linha a garantir a indemnização, mas havendo hipótese de se vir depois a apurar a identificação do causador do acidente e este ter seguro obrigatório contratado.
A obrigação será sempre do causador do acidente e daí que, satisfeita a indemnização, o FGA fica sub-rogado nos direitos do lesado (art.º 54º nº 1 RSORCA).
Acresce que o FGA tem, tal como o ISS, uma natureza de proteção social [8], como resulta de garantir a proteção às vítimas de acidentes de viação que, de outro modo, não seriam protegidas, seja por desconhecimento da identidade do causador do sinistro, seja por este não beneficiar de seguro válido e eficaz.
Concluindo: as prestações pagas aos lesados no âmbito do sistema de segurança social, e dentro dos montantes previstos na lei que regulamenta esse sistema, estão excluídas da garantia do FGA.
No sentido que aqui decidimos podem ver-se os acórdãos desta Relação do Porto, de 06/12/2016, processo nº 11354/14.1T8PRT.P1, relator Rui Moreira, e o de 16/12/2015, processo nº 21/14.6TBSTS-A.P1, relator Alberto Ruço; em sentido contrário, e também desta Relação, acórdão de 26/02/2013, processo nº 1913/09.0TBSTS.P1, relator M. Pinto dos Santos, e demais jurisprudência aí citada.

7. Sumariando (art.º 663º nº 7 do CPC)
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III. DECISÃO
8. Pelo que fica exposto, no parcial provimento do recurso, acorda-se nesta secção cível da Relação do Porto em revogar parcialmente a sentença recorrida nos seguintes termos:
i. O montante indemnizatório atribuído a título da perda do direito à vida da vítima DD fixa-se agora em € 100.000,00 (cem mil euros).
ii. O montante indemnizatório atribuído título de danos morais próprios sofridos pela autora BB, filha de DD, fixa-se agora em € 35.000,00 (trinta e cinco mil euros).
iii. Revoga-se a condenação do Fundo de Garantia Automóvel quanto ao pedido de reembolso apresentado pelo ISS, IP, CNP, relativo às prestações sociais pagas às autoras AA e BB, em razão do falecimento do beneficiário DD, a título de subsídio por morte e pensão de sobrevivência.
Em tudo o mais se mantém o decidido em 1ª instância.
Custas do recurso na proporção do decaimento.

Porto, 04 de maio de 2023
Isabel Silva
João Venade
Paulo Duarte Teixeira [com voto de vencido, infra:
Quanto aos montantes indemnizatórios, importa esclarecer que os montantes são superiores aos fixados em danos semelhantes, conforme decisão do mesmo coletivo e relator, no Ac da RP de 13.10.22 83/20.9T8PVZ.P1 (Isabel Silva): montante do dano morte em 90 mil euros, numa vítima com 24 anos de idade. Face aos factos concretos, considero equitativa esse aumento das indemnizações, cuja excepcionalidade assim justifico.
Quanto às despesas do funeral, não podemos subscrever a decisão.
Em primeiro lugar, porque a actual posição maioritária vai precisamente no sentido contrário conforme: Acs da RC de 22.1.2012, nº 34/04.6GBCGA.C1 (Olga Maurício); Ac da RC de 10.1.2006, nº 3693/05 (Ferreira de Barros) Ac da RL de 7.1.2019, 726/16.7T8CSC.L1-6 (Eduardo Petersen), que cita vários outros arestos concordantes. Ac do STJ de 10.7.06, nº 06B1835 (Oliveira Barros), e de Acórdão do STJ de 3 de Março de 2005, Processo 05A019. Depois, porque o sentido literal do art.495º, do CPC incluiu esse, montante, conforme decidiu o citado Ac do STJ, de 10.7.2006: “O subsídio de funeral pago pelo Centro Nacional de Pensões constitui prestação a coberto do art.495º, nº1º, C.Civ., tem a natureza de indemnização de um dano, e representa verba exigível ao lesante pelos titulares do direito à indemnização, pelo que há lugar à subrogação prevista no art.16º da Lei nº28/84, de 14/8”.
Por fim, o efeito da decisão é fazer suportar uma consequência do evento danosa em toda a comunidade e não, caso exista seguro válido, na entidade que recebeu uma remuneração precisamente para assumir esse dano, tal como o FGA, que é financiado apenas pelos produtores do risco de circulação. Ora, in casu essa entidade pode vir a obter o pagamento desse montante do lesante que recorde-se usou o veículo como arma causando a morte ao jovem em causa. Ou seja, o efeito da decisão beneficia o lesante. Acresce que, o dano concreto existe nesta data apenas devido a essa conduta ilícita, sendo que, se esta não tivesse ocorrido, e mesmo que caso essa prestação ainda exista só seria devida na data da provável/natural do óbito (esperança de vida). Deste modo, a antecipação dessa prestação implicaria sempre um dano patrimonial ressarcível.]
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[1] O aqui referido contém já as retificações de que a sentença foi objeto.
[2] Consigna-se ter existido um outro recurso, da iniciativa do sinistrado II, que não foi admitido «por não respeitar o critério legal da sucumbência, porquanto o respetivo decaimento é bem inferior a metade da alçada deste tribunal.», decisão que transitou em julgado.
[3] Acórdão do STJ, de 21.01.2016 (processo 1021/11.3TBABT.E1.S1, Relator: Lopes do Rego), disponível em www.gde.mj.pt, sítio a ter em conta nos demais arestos que vierem a ser citados sem outra menção de origem.
[4] “Estudo Tridimensional do Dano Corporal: Lesão, Função e Situação (Sua Aplicação Médico-Legal)”, Almedina, 1998, pág. 177 e seguintes e, especialmente, pág. 217 ss.
[5] Acórdãos do STJ, de 31.03.2004 (processo 04B497, Relator: Ferreira Girão) e de 14.09.2010 (processo 267/06.0TBVCD.P1.S1, Relator: Sousa Leite).
[6] Diploma invocado na sua petição inicial pelo Instituto da Segurança Social, IP, Centro Nacional de Pensões.
[7] E não um direito de sub-rogação, como é o caso do FGA.
Como refere Antunes Varela, «É que, embora haja certa afinidade substancial nas suas raízes, a sub-rogação e o direito de regresso constituem, no sistema legal português, realidades jurídicas distintas e, em determinado aspecto, mesmo opostas.
A sub-rogação, sendo uma forma de transmissão das obrigações, coloca o sub-rogado na titularidade do mesmo direito de crédito (conquanto limitado pelos termos do cumprimento) que pertencia ao credor primitivo. O direito de regresso é um direito nascido ex novo na titularidade daquele que extinguiu (no todo ou em parte) a relação creditória anterior ou daquele à custa de quem a relação foi considerada extinta. (…)
O direito de regresso, no caso da solidariedade passiva, é uma espécie de direito de reintegração (ou de direito à restituição) concedido por lei a quem, sendo devedor perante o accipiens da prestação, cumpre, todavia, para além do que lhe competia no plano das relações internas.»
[8] Filipe Albuquerque Matos considera-o um “organismo com uma vocação eminentemente social”, in “Estudos dedicados ao Professor Doutor Luís Carvalho Fernandes”, vol. I, 2011.