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CONTRAORDENAÇÃO
DECISÃO ADMINISTRATIVA
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRRECORRIBILIDADE
EXCEPÇÕES
Sumário
I – No direito das contraordenações vigora o princípio da irrecorribilidade das decisões judiciais, só sendo recorríveis as decisões cuja impugnação esteja expressamente prevista. II – Daí decorre que apenas é admissível recurso para melhoria da aplicação do direito ou promoção da uniformização da jurisprudência quando a decisão recorrida for sentença, mas já não quando se tratar de mero despacho proferido ao abrigo do artigo 64º do RGOC.
Texto Integral
Processo n.º 2728/22.5T9AVR.P1
Despacho:
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I. No processo nº 2728/22.5T9AVR, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo Local Criminal de Aveiro - Juiz 2, AA impugnou judicialmente a decisão da Câmara Municipal ... que a condenou pela prática da contraordenação prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 71.º do Código da Estrada, na coima de 45 €.
Por despacho proferido ao abrigo do n.º 2 do artigo 64º do RGCO, em 13.01.2023, o tribunal aquo julgou improcedente a impugnação e manteve a decisão da decisão da Câmara Municipal ....
Não se conformando com esta decisão, a recorrente interpôs recurso para este Tribunal da Relação em que conclui pela prescrição, requerendo ao abrigo do disposto no artigo 72º, n.º 3 do RGCO a admissão do recurso com fundamento em que se afigura manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito e à promoção da uniformidade da jurisprudência.
Foi proferido despacho a remeter os autos para este Tribunal da Relação para ser proferida decisão sobre a sua aceitação, nos termos do artigo 73º, n.º 2 do RGCO.
O Ministério Público respondeu ao recurso propugnando por que seja proferida decisão sumária de rejeição do recurso.
Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da rejeição ou improcedência do recurso.
Foi cumprido o artigo 417º, n.º 2 do CPP.
II. Questão prévia: da admissibilidade do recurso.
Sobre a admissibilidade de recurso no processo contraordenacional dispõe o artigo 73º do RGCO, sob a epígrafe ‘Decisõesjudiciasqueadmitemrecurso’, o seguinte:
«1-Poderecorrer-separaaRelaçãodasentençaoudodespachojudicialproferidosnostermosdoartigo64.ºquando: a)Foraplicadaaoarguidoumacoimasuperiora(euro)249,40;b)Acondenaçãodoarguidoabrangersançõesacessórias; c)Oarguidoforabsolvidoouoprocessoforarquivadoemcasosemqueaautoridadeadministrativatenhaaplicadoumacoimasuperiora(euro)249,40ouemquetalcoimatenhasidoreclamadapeloMinistérioPúblico; d)Aimpugnaçãojudicialforrejeitada; e)Otribunaldecidiratravésdedespachonãoobstanteorecorrenteseteropostoatal. 2-Paraalémdoscasosenunciadosnonúmeroanterior,poderáarelação,arequerimentodoarguidooudoMinistérioPúblico,aceitarorecursodasentençaquandotalseafiguremanifestamentenecessárioàmelhoriadaaplicaçãododireitoouàpromoçãodauniformidadedajurisprudência. 3-Seasentençaouodespachorecorridosãorelativosaváriasinfracçõesouaváriosarguidoseseapenasquantoaalgumadasinfracçõesouaalgumdosarguidosseverificamospressupostosnecessários,orecursosubirácomesseslimites.»
No direito das contraordenações vigora o princípio da irrecorribilidade das decisões judiciais, só sendo recorríveis as decisões cuja impugnação esteja expressamente prevista[1].
Da comparação do n.º 1 com o n.º 2 do artigo 73º resulta que apenas é admissível recurso para melhoria da aplicação do direito ou promoção da uniformização da jurisprudência quando a decisão recorrida for sentença, mas já não quando se tratar de mero despacho proferido ao abrigo do artigo 64º do RGOC.
Com efeito, o legislador previu expressamente no n.º 1 do artigo 73º a possibilidade de recurso da sentença ou do despachojudicial proferido nos termos do artigo 64.º, n.º 2, enquanto no n.º 2 do artigo 73º apenas refere a aceitação do recurso da sentença.
A decisão por sentença tem lugar quando houver lugar a audiência e por despacho quando o juiz não considere necessária a audiência e o Ministério Público e o arguido não se oponham.
Impera aqui uma razão de simplicidade, celeridade e eficiência processual que preside ao processo contraordenacional, não se justificando em casos mais simples impor o peso da audiência de julgamento, bastando a decisão por despacho.
O processo contraordenacional deve correr em termos simples e rápidos e da decisão judicial só nos casos mais graves poderá haver recurso para o Tribunal da Relação[2].
Daí que se compreendam as restrições que o artigo 73º impôs em matéria de admissibilidade de recurso da decisão judicial que conheceu da impugnação da decisão da autoridade administrativa. Quanto menos importante a causa ou mais simples a decisão menor a possibilidade de recurso para o Tribunal da Relação.
E foi por isso que o legislador não previu no n.º 2 a possibilidade de recurso extraordinário para as decisões proferidas por despacho judicial, contrariamente ao que fez para as sentenças. Se o legislador quisesse que ambas as decisões tivessem recurso extraordinário teria deixado tal intenção expressa como o fez no n.º 1 do artigo 73º, em que especificou e diferenciou entre as modalidades de decisão final: sentença e despacho.
Concluímos assim que o recurso do artigo 73º, n.º 2 do RGCO só pode ser interposto de sentença, não sendo admissível do despacho judicial do artigo 64º, n.º 2 do RGOC[3].
Ora, no caso dos autos a decisão judicial final proferida foi o despacho do artigo 64º, n.º 2 do RGOC, pelo que não é admissível o recurso extraordinário para melhoria da aplicação do direito ou de promoção da uniformidade da jurisprudência previsto no artigo 73º, n.º 2 do RGCO e, em consequência, é de indeferir o requerimento de aceitação do recurso formulado pela arguida AA, com a consequente retirada do mesmo.
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III. Decisão.
Pelo exposto, decide-se:
a) Indeferir, ao abrigo do disposto nos artigos 72º, n.º 3 e 74º, n.º 3, do RGCO, o requerimento de aceitação do recurso formulado pela arguida, com a consequente retirada do mesmo.
b) Condenar a recorrente em 3 (três) UC de taxa de justiça – art. 93º, n.º 3, do RGCO e Tabela III, anexa ao Regulamento das Custas Processuais – sem prejuízo do apoio judiciário.
Notifique.
Porto, 23 de março de 2023
William Themudo Gilman
___________________ [1] Cfr. Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, UC, 2011, p. 298. [2] Cfr. Jorge de Figuereiredo Dias, O movimento de descriminalização e o ilícito de mera ordenação social, in Jornadas de direito criminal, CEJ, p. 335. [3] Cfr. Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, UC, 2011, p. 304; António Beça Pereira, Regime Geral das Contra-Ordenações, 12ª ed., 2017, p.226.