POSSE
ATOS INTEGRADORES DA POSSE
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
INDEMNIZAÇÃO
Sumário

I - Os actos de posse podem ser praticados por um representante.
II - Quando este posteriormente se arrogue a qualidade de possuidor terá de demonstrar não apenas os actos correntes de administração e detenção, mas a prática de actos como verdadeiro e novo proprietário.
III - Não cumpre esse requisito a actividade de uma filha que sempre geriu o património do seu avô e pais, com os quais viveu na casa construída num terreno doado a estes.
IV - Age como litigante de má fé, a parte que deturpa factos pessoais por si conhecidos, pretende obter um resultado que sabe ser ilegítimo, e tenta demonstrar a existência de meios financeiros juntando documentos referentes à sua filha.
V - A sanção deve ser fixada, preponderantemente, tendo em conta o grau da violação dos deveres de probidade, o valor da acção e o benefício que se pretendia obter.
VI - A indemnização requerida pela parte pressupõe a demonstração dos requisitos gerais, nomeadamente a existência de um dano efectivo cujo montante pode apenas ser liquidado em momento ulterior.
VII - Não pode ser relegado para ulterior liquidação essa indemnização, porque, por um lado existe um procedimento legal específico e por outro não se demonstrou sequer a existência de qualquer dano concreto causado pela conduta processual da parte.
VIII - O pedido de indemnização relativo às despesas de patrocínio depende, pelo menos, da sua concreta formulação mesmo sem alegação e demonstração dos respectivos montantes.

Texto Integral

Processo: 2372/21.4T8VNG.P1


Sumário:
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I - Relatório:
AA, divorciada, residente na Rua ..., em ..., Vila Nova de Gaia, intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra BB e mulher CC, residentes na Rua ..., ..., em ..., Vila Nova de Gaia, pedindo que: - sejam os Réus condenados “1 - A reconhecer que a Autora é dona e titular do direito de propriedade dos seguintes prédios: a) - Prédio de cave, R/c, quintal e logradouro, sendo a Cave constituída por 1 casa de banho, 1 despensa e 1 garagem. O R/c por 5 divisões assoalhadas, 1 cozinha, 4 casas de banho e 2 vestíbulos, inscrito na matriz predial urbana sob o artº ...92 da União de Freguesia ... e ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...03 – freguesia ...; b) – Prédio rústico – inscrito na matriz predial sob o artº ...57, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...51 – freguesia ...; c) – Prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artº ...59, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...51 – freguesia .... Por os ter adquirido por usucapião. (…)
Para o efeito alega, que por escritura pública celebrada a 18-01-1994, DD e mulher EE, venderam à Ré um terreno que identifica; que os Réus comunicaram a FF e GG a realização da escritura e que “agora a minha filha vai cá construir”, referindo-se à Autora; que a referida compra e venda foi distratada por escritura pública celebrada no dia 09.06.1998; que sempre foi vontade dos avós da Autora que o prédio objeto da compra e venda se destinasse a construção de uma habitação pela mesma; que por escritura pública de celebrada no dia 07.05.1999 os avós da Autora doaram aos seus pais imóveis que identifica; que apesar de os prédios terem sido doados pelos avós da autora à sua mãe, aqueles manifestaram sempre a vontade que se destinassem à construção da habitação da Autora; que esta construiu uma habitação nos imóveis; que o artigo rústico da freguesia ... inscrito na matriz sob o nº ...66 deu origem ao artigo urbano inscrito na matriz da mesma freguesia sob o nº ... (Terreno para Construção) e este veio a dar origem ao artigo urbano da mesma freguesia inscrito sob o nº ...56, constando da própria caderneta predial, que o artigo 4056 corresponde ao atual artigo matricial ...92; que este prédio foi inscrito na matriz em 2003; que a Autora requereu em 1999 à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e foi-lhe deferida a licença de construção e de utilização a favor do imóvel; que foi a Autora quem requereu à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia a atribuição do número de polícia, a ligação de ramais ao coletor à berma de águas pluviais, a ligação da rede elétrica ao imóvel e a licença de acesso de veículos a garagens; que todo o processo de construção foi sempre acompanhado pelos Réus e cumpriu a vontade dos avós; que desde 1994 a Autora é a legitima dona e possuidora do imóvel que identifica; que ainda construiu uma piscina, anexos de apoio à piscina e de lazer, bem como, um espigueiro e furo de água, que ocupam os prédios rústicos inscritos na matriz predial sob o artigos ...57 (anteriormente ...) e ...59º (anteriormente ...).
Mais alega que após a doação efetuada pelos avós da Autora aos seus pais, estes obrigaram-se verbalmente de lhe transmitir a propriedade dos três prédios (…)
Os réus, regularmente citados, contestaram impugnando a matéria de facto alegada pela autora. Pediram a condenação da Autora como litigante de má-fé, com condenação em multa e indemnização.
Alegaram que as relações entre Autora e Réus se degradaram em meados de 2018 em virtude de os Réus terem solicitado à Autora esclarecimentos sobre os atos de administração que vinha fazendo do património dos pais; que desde então, este e outros processos judiciais têm sido sucessivamente despoletados pela Autora contra os seus pais; que a mesma já foi condenada como litigante de má-fé, em sentença proferida em processo que identificam e no qual a Autora veio requerer o acompanhamento da sua mãe, alegando que mesma se encontrava totalmente incapaz, de gerir a sua vida e os seus bens; que os prédios em causa foram doados à Ré; que nunca os pais da Ré manifestaram vontade de doar tais prédios à Autora; que os prédios integram processo de partilha, que identificam, no qual a Ré é cabeça de casal.
Foi saneada e instruída a causa, e após procedeu-se a julgamento.
O Tribunal proferiu sentença, nos termos da qual foi julgada a ação totalmente improcedente por não provada; - procedente o pedido de condenação da Autora, AA, como litigante de má-fé e, em consequência, condenar a mesma na multa de 10 (dez) UC, bem como no pagamento de uma indemnização aos Réus, até ao limite máximo de €20.000,00, a liquidar em execução de sentença
Inconformada veio a apelante interpor recurso, o qual foi admitido, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo – artigos 644º/1/a), 645º/1/a), e 647º/1do Código de Processo Civil.
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2. Foram apresentadas as seguintes conclusões, cujo restante teor se dá por reproduzido
1ª.- O julgamento da matéria de facto não foi o mais correcto, tendo em consideração a abundante prova documental junta com a petição inicial e que que foi junta já no decurso da audiência de julgamento, a prova testemunhal mais relevante e a inacreditável postura processual dos RR., no âmbito da sua defesa.
2ª.- Na verdade, a propósito do Facto Provado n.º 3, a matéria a dar-se como provada deve ser a seguinte: -Por carta remetida pelos Réus, estes comunicaram a FF e GG que “foi feita a escritura no 7º Cartório do Porto em 1994” (…) “agora a minha filha vai cá construir”. (documento n.º 3 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido). Igualmente, deve ser considerado como provado que Nessa mesma carta, os Réus deram conhecimento aos destinatários da obra que se iria realizar.
3ª.- A letra e as assinaturas constantes do documento em que se estriba o facto nº 3 (dado como provado) têm que considerar-se como verdadeiras, porque jamais foram efetivamente impugnadas pelos Recorridos.
4ª.- Basta olhar para a carta (verificando as similitudes dos “C’s” e dos “O’s”) para se perceber que ela foi escrita à mão pela Ré CC e assinada, no final, por ambos os demandados.
5ª.- Aliás, ninguém –além dos RR.- teria interesse em enviar esta carta aos seus destinatários.
6ª.- De resto, em sede de Audiência Final (na sessão de 12.09.2022), quando a Mmª Juiz a quo perguntou: “O senhor (R. BB)), a determinada altura não comunicou a outros familiares que a sua filha ia construir?... não comunicou… que a sua filha ia construir lá no prédio?”, o Recorrido disse: “… não me recordo de nada disso…”.
7ª.- Assim, o “não confirmo”, nem “desminto”, apenas “não me lembro de nada”, só pode permitir concluir que esta carta foi assinada pelo Réu, a não ser que se acredite em “amnésias selectivas”.
8ª.- Idêntica postura assumiu a Ré. Quando o assunto lhe foi questionado, respondeu: “senhora doutora juiz eu não me lembro de assinar nada disso, digo sinceramente”.
9ª.- A postura defensional dos Recorridos é perfeitamente inacreditável, correspondendo a um intencional esquecimento de um facto que lhe é desfavorável e, portanto, os seus depoimentos sobre a questão são uma perfeita mentira.
10ª.- É por isso que não se percebe como é que a Mma. Juiz, na fundamentação do julgamento da matéria de facto, possa ter dito que não ficou com a convicção segura de que a carta tenha sido redigida pelos réus, na medida em que a “ingenuidade” tem limites.
11ª.- Por outro lado, os factos dados como provados nos pontos 27. e 28. dizem respeito ao Processo Judicial de Inventário nº 4895/07.9TBVNG, que pendera no Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia e no qual a Recorrida CC era cabeça de casal.
12ª.- E há um equívoco manifesto por parte da Mmª Juiz a quo acerca do que se passou nesse processo de Inventário.
13ª.- É que aquilo que resulta da Acta de Conferência de Interessados, junta a estes autos em 11.10.2022 (como doc. nº 1), é que a, então, cabeça de casal (e ora Recorrida), na qualidade de interessada e donatária, escolheu (e não adjudicou, propriamente), para preenchimento da sua quota na herança, entre outras, a verba nº 10 da Relação de Bens de folhas 968 ss. (que não consta, mas deviam constar, dos presentes autos).
14ª.- E, nessa mesma Acta de Conferência de Interessados, diz-se ainda que o valor de tal verba nº 10 haveria de ser o valor atribuído à verba nº 5 do Relatório pericial de folhas 940 do processo de inventário.
15ª.- Sucede que tal verba nº 10 da Relação de Bens (e nº 5 do Relatório Pericial) era um terreno, embora natureza urbana, conforme resulta do doc. nº 1 junto com a contestação. Era o terreno que os pais da Recorrida lhe tinham doado.
16ª.- Mas, nesse mesmo processo de partilha, ocorreu algo que é de uma importância extrema: -na decorrência de um requerimento de uma outra interessada (através do qual esta pugnou no sentido de que a casa edificada fosse relacionada como bem a partilhar e pediu que a Cabeça de Casal esclarecesse o motivo de tal casa estar inscrita a favor da Recorrente nas Finanças, a Recorrida, em 04.10.2010, respondeu, através da sua mandatária: - … O terreno rústico foi cedido à sua única filha para ali construir a casa desta. Toda a construção foi feita pela filha, no interesse desta e à custa desta, licenciada em seu nome e projectada para si, sendo, por isso, titularidade desta.
17ª.- Mais adiante, na tramitação do processo de inventário, em 02.11.2010, a propósito do mesmo tema, a, então, cabeça de casal CC, respondendo a um pedido de esclarecimento formulado por um mandatário de outro interessado, acrescentou: “a edificação do prédio ora inscrito na matriz urbana sob o artigo ...74 é pertença de AA…”.
18ª.- Tais elementos foram demonstrados nos autos (em 15.09.2022), por certidão judicial, cuja junção foi determinada pela Mmª Juiz a quo.
19ª.- No decurso da Audiência Final, os Recorridos não foram confrontados (mas, deviam ter sido) com o teor dos documentos anteriormente ditos e, sobretudo, com os factos que eles evidenciavam, porque os seus depoimentos pessoais já haviam terminado. Nada impedia que fossem reiniciados para o efeito…
20ª.- Em todo o caso, sempre se dirá que, para os Recorridos: a) nos idos de 90, quando escreveram a carta junta com a petição inicial (doc. 3), era a filha que iria construir a casa que foi edificada; b) Em 2007 e depois disso, na pendência do processo judicial de partilha, a casa havia já sido construída pela filha, à custa da filha e no interesse da filha, sendo, portanto, dela c) Porém, nos presentes autos, a Recorrida toma uma posição diametralmente oposta e afirma que a casa foi construída por si, com o seu dinheiro, não sendo, portanto, a casa da filha.
21ª.- Esta absoluta inversão de postura não pode deixar de merecer o total descrédito.
22ª.- Sucede que os factos narrados nos documentos emergentes do processo judicial de partilha não foram dados como provados, nem foram dados como não provados.
23ª.- Por outro lado, na fundamentação do julgamento da matéria de facto, a Sra. Juiz do processo disse que o requerimento com os ditos documentos, só por si, não demonstra o aí alegado e tem de ser analisado no contexto existente à data em que foi elaborado, sendo que à data as relações familiares eram boas…
24ª.- Ainda acrescentou a Sra. Juiz do processo que não podia deixar de ter-se em conta o contexto em que aquelas declarações haviam sido feitas: -num processo de inventário em que a existência de construção aumentaria o valor do bem que a Ré queria que lhe fosse adjudicado e, consequentemente, aumentaria o valor de tornas a pagar.
25ª.- As considerações da Srª Juiz do processo tiveram como base, apenas, o seu imaginário e representam que ela ache muito natural que se minta nos processos judiciais, que se prejudiquem outros interessados nos inventário, etc. Agora, já não terá sido pura “ingenuidade”.
26ª.- Com um simples parágrafo apenas, a Mmª Juiz fez “desaparecer” a certidão judicial que demonstrava o que a Recorrida tinha dito no âmbito do processo judicial de partilha, a propósito da titularidade da propriedade da casa construída.
27ª.- A Mmª Juiz a quo esqueceu-se que o art. 46º do CPC prescreve que as afirmações e confissões expressas de factos, feitas pelo mandatário, vinculam a parte, salvo se foram rectificadas ou retiradas…
28ª.- Ora, aquelas declarações da Recorrida, feitas pela sua mandatária no processo judicial de inventário, jamais foram rectificadas ou retiradas e jamais poderão sê-lo, porque esse processo de inventário findou há muito. Portanto, valem como verdadeiras.
29ª.- Não se desconhece o art. 355º.3 do CC. Mas, a prova documental junta em 12.09.2022 tem um valor imenso para o julgamento da matéria de facto na presente lide, face ao chamado “valor extraprocessual das provas”, consagrado no art. 421º do CPC.
30ª.- Toda a atitude comportamental por parte dos Recorridos, desde 1998, passando pelos anos que durou o inventário e até as, agora, partes, se zangarem, permite concluir que, sobre este tema, na presente lide, os Réus mentiram.
31ª.- A aceitação da tese dos RR. não condiz com o processo de licenciamento de obras (assinado e autorizado a favor da Recorrente), com os documentos relativos à instalação de saneamento, água e luz, serviços estes sempre atribuídos à demandante AA.
32ª.- Relativamente à prova documental junta a 12.09.2022, se era para não dar qualquer relevância a esses documentos e aos factos que eles evidenciavam, não se percebe com que objectivo é que a Srª Juiz do processo determinou a junção da certidão judicial respectiva (na sessão de 12.09.2022) ?
33ª.- É que uma leitura menos atenta do art. 421º do CPC pode-nos levar a concluir que só os depoimentos e arbitramentos produzidos num processo Ora, o que aconteceu nos autos foi exactamente o que a doutrina e a jurisprudência ensinam: -perante uma importantíssima prova documental, de origem judicial, ter sido junta aos autos, a Mm.ª Juiz advertiu para que fosse junta a certidão respectiva. E assim se fez.
36ª.- Relativamente aos depoimentos testemunhais isentos (não familiares, nem outros), dir-se-á que, essencialmente, as testemunhas HH e II (Eng.º) depuseram, com clarividência, de forma a dar total consistência à pretensão da Recorrente, conforme se alcança das transcrições juntas, para as quais se remete.
37ª.- Face a todo o exposto, à abundante prova documental, à prova testemunhal e à manifesta incredibilidade da postura processual dos Recorridos, entende a Recorrente que o julgamento da matéria de facto deve ser alterado da seguinte forma (…):
40ª Constitui jurisprudência pacifica que, no nosso ordenamento jurídico o registo predial tem natureza declarativa e não constitutiva – por não dar nem tirar direitos, destinando-se o mesmo a dar publicidade à situação jurídica dos prédios tendo em vista a segurança do comércio imobiliário – artº 1º do CRgP.
41ª A presunção constante do artº 7º do CRgP – de que o direito existe e pertence ao titular inscrito – é uma presunção iuris tantum, ilidível por prova em contrario nos termos do artº 350º nº 2 do CC;
42ª. Prova aquela que a Recorrente carreou para estes autos de forma abundante. Aliás, não será muito fácil encontrar quem disponha em arquivo documentos como aqueles que a Recorrente fez juntar aos presentes autos, especialmente os 51 documentos juntos aos autos (Refª 43276114 de 16- 09-2022), sem descura, claro está, todos os documentos juntos com a petição inicial.
43ª Valendo a usucapião por si, como forma de aquisição originária que é, não pode a mesma ser prejudicada pelas eventuais inscrições registais e daí que não impeça o reconhecimento da propriedade da Recorrente, com fundamento na usucapião, sobre o imóvel em litígio o facto do os Recorrentes o terem registado – artº 5º nºs 1 e 2 do CrgP.
44º Tendo-se provado que a recorrente exerce a posse sobre o mencionado prédio, comportando-se como sua proprietária, durante mais de vinte anos, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, onde mantém a sua residência é o bastante para demonstrar o corpus e o animus caraterizares da figura da usucapião.
45ª Atos materiais praticados pela Recorrente que são os atos que integram o corpus, que exprimem o poder de facto; atos que são normalmente materiais e físicos, mas não necessariamente, uma vez que, para o corpus basta que a coisa esteja na esfera de disponibilidade fática.
46ª A atuação da Recorrente é reiterada e ininterrupta, contínua.
47ª Existindo ainda publicidade ao obter consenso público no círculo social em que é exercido o domínio.
48ª Tem ainda de se discordar da condenação da Recorrente como litigante de má-fé.
49ª A condenação da Recorrente como litigância de má-fé permite perceber o claro erro de julgamento que com este recurso se pretende corrigir. Pois, os recursos têm por finalidade corrigir os erros cometidos pelo Tribunal de primeira instância.
50ª Contrariamente ao entendimento da Mmª Juiz a Recorrente deduz pretensão cujo fundamento assenta na prova que não foi devidamente apreciada e ponderada, conforme resulta, designadamente das alegações supra em sede impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto com reapreciação da prova gravada,
51ª A Recorrente alega e demonstra através de prova abundante, ser titular do direito que peticiona;
52ª Alega e prova a Recorrente que efetuou pagamentos diversos com dinheiro seu, proveniente essencialmente do seu trabalho, da realização que fez com a venda de uma fração autónoma onde residiu antes de se transferir para a habitação que construiu e é objeto destes autos, bem assim, do apoio que recebeu diretamente do seu avô.
53ª. Nem a errada decisão proferida sobre a matéria de facto e a sua motivação pode justificar a decisão de condenação da recorrente como litigante de má-fé.
54ª A má-fé substancial verifica-se quando a atuação da parte se reconduz às práticas aludidas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 542º, do CPC, enquanto a má-fé instrumental se encontra prevista nas als. c) e d) do mesmo artigo; 55ª Em qualquer dessas situações nos encontramos perante uma intenção maliciosa ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que, aproximando-a da atuação dolosa, justifica um elevado grau de reprovação e idêntica reação punitiva, que não pode ser imputada à Recorrente.
56ª. A condenação como litigante de má-fé assenta num juízo de censura sobre um comportamento que se revela desconforme com um processo justo e leal, que constitui uma emanação do princípio do Estado de Direito.
57ª A conduta do agente deve apresentar-se como contrária a um padrão de conformidade da ação pessoal do sujeito processual com o dever de agir de acordo com a juridicidade e a lei. "A má fé processual (...) é toda a atividade desonesta, cavilosa, proteladora (para cansar o adversário) unilateral ou bilateral, verificada no exercício do direito de ação, quando desenvolvida com a intenção de prejudicar outrem, quer ela respeite ao mérito da causa (lide caluniosa, fraudulenta, etc.) quer às medidas instrumentais, desde que seja ilícita, isto é violadora das normais gerais e especificas da conduta processual, tendentes a criar as condições favoráveis a uma boa e justa decisão do pleito"
58ª Ora, a Recorrente não manteve qualquer conduta que a permita integrar na litigância de má-fé.
59ª Tem assim, também, de ser revogada a decisão de condenação da Recorrente como litigante de má-fé.
60ª A sentença recorrida faz errada interpretação e aplicação do disposto nos artºs 5º e 7º do CRgP, 350º nº 2, 1251, 1252º, 1256º, 1261º, 1263º b), 1287º, 1293º ala), 1297º , 1330º, 1302 e 1316º do Código Civil e 542º do Código de Processo Civil.
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2.2. Os apelados contra-alegaram, nos seguintes termos:
1. A Recorrente estabelece convenientemente, diga-se, uma confusão, sendo cega perante a matéria não provada e total falta de prova, recusando-se a aceitar que não vingou a sua tese!
2. Antes de mais o Tribunal tentou perceber num primeiro momento, atenta a complexidade desta lamentável situação, qual a razão que levou a que se deteriorassem as relações familiares entre as Partes, relações essas que eram saudáveis e muito próximas;
3. Este momento de “viragem” na relação entre as Partes mostrou-se crucial para entender o declínio e rutura das relações entre as Partes neste processo, designadamente entre Autora/Recorrente e Ré/Recorrida (Mãe e filha) pois nas palavras de várias testemunhas ao longo do Processo eram “unha e carne”;
4. Tanto quanto foi possível apurar tudo correu bem até meados de 2018 e que o desentendimento entre Autora/Recorrente e Ré/Recorrida deveu-se ao facto daquela se recusar a prestar contas aos seus Pais, da gestão que vinha fazendo do seu património;
5. Esta situação coincidiu também com início da relação da Autora/Recorrente com o seu atual companheiro, o qual foi viver com a Autora/Recorrente na casa dos Réus/Recorridos, objeto dos presentes Autos;
6. Salienta-se que coincide com o corte de relações entre as Partes, o desencadear pela Autora/Recorrente dos processos de maior acompanhado contra os seus Pais, nos quais alegou que os mesmos se encontravam incapazes de gerir a sua vida e os seus bens;
7. Estas declarações foram também efetuadas pela Recorrente noutros Processos que intentou contra os seus Pais, tendo afirmado em 2018 que o Réu/Recorrido “ é doente mental” e a Ré/Recorrida, sua Mãe “está em início de estado demencial”;
8. Naturalmente, em nenhum destes Processo veio a proceder a intenção da Autora/Recorrente, tendo sido esta inclusive condenada como litigante de má-fé no Processo despoletado contra a aqui Ré/Recorrida, sua Mãe, conforme certidão das respetivas decisões que se encontram juntas ao Processo;
9. Esta questão, tal como foi evidenciado na própria Sentença é de extrema importância pois evidencia o carácter e a postura processual da Autora/Recorrente para com os seus Pais, o que contribuiu para a sua condenação como litigante de má-fé;
10. Ficou claro que antes da rutura de relações a Autora/Recorrente auxiliava os seus Pais na gestão do património que lhes havia sido doado, o que foi reforçado pelas testemunhas com conhecimento direto sobre os factos (JJ – sobrinho da Ré e primo da A.; KK – neta dos Réus e filha da A. e LL – prima da Ré), bem foi igualmente assumido, de forma inequívoca pela própria Autora/Recorrente em sede das suas declarações de parte, quando confrontada com o doc. nº 4 junto com a contestação (1:08:12 -1:11:09) que geria o património dos seus Pais e também do seu Avô, confirmando que sabia não agir em nome próprio;
11. Foi aliás no âmbito desse poder de gestão, que conferido à Autora/Recorrente inicialmente pelo seu Avô e mais tarde pelos seus Pais que terá efetuado diversos pagamentos no âmbito da construção;
12. Ficou claro ao longo das várias sessões de julgamento que a Autora/Recorrente, até ao corte das relações familiares, sempre geriu o património dos seus Pais, bem sabendo a Autora/Recorrente que o património era dos seus Pais e que agia em nome destes. E geriu apenas para ajudar os seus Pais, porque estes não estariam habituados a gerir um património tão vasto e atenta a idade avançada, mas nunca porque os seus Pais estariam incapazes, como falsamente alegou;
13. De salientar que a Autora/Recorrente é filha única dos Réus/Recorridos, o que justifica que estes permitissem que gerisse todos os seus assuntos;
14. No que respeita à intenção do Pai da Ré/Recorrida e avô da Autora/Recorrente, que se mostra como questão decisória neste Processo, o que pode então concluir-se perante a matéria apurada em sede de julgamento? A resposta foi unânime quando ouvidas as várias testemunhas com conhecimento direto sobre os factos, além dos depoimentos dos próprios Réus/Recorridos – tendo ficado provado que a intenção do Pai da Ré/Recorrida foi num primeiro momento doar os seus prédios a cada um dos filhos e, posteriormente, após quezílias familiares, doar todo o seu património à sua filha – Ré/Recorrida neste Processo;
15. Nunca os Pais da Ré/Recorrida tiveram qualquer intenção de doar o seu património à sua neta, aqui Autora/Recorrente;
16. Esta tese da Autora/Recorrente quanto à intenção dos seus avós também não convence porquanto se fosse essa a verdadeira intenção dos seus avós, de doar-lhe si, estes poderiam efetivamente tê-lo feito...;
17. No que concerne ao Processo de Licenciamento e à intervenção da Autora/Recorrente neste âmbito, ficou devidamente esclarecido que a Autora/Recorrente sempre agiu em nome e representação da Ré/Recorrida, sua Mãe, pois não é credível que o licenciamento pudesse ser aprovado em nome de alguém que não estivesse munido de título válido;
18. Salienta-se a este respeito que à data em que se iniciou o processo de licenciamento a certidão predial estava em nome dos Réus/Recorridos, pelo que apenas munida de procuração, ou qualquer outro título, seria possível à Autora/Recorrente solicitar a emissão do licenciamento em seu nome;
19. Acresce que em sede de declarações de parte a Autora/Recorrente não soube esclarecer se detinha ou não uma Procuração da sua Mãe chegando mesmo a referir que “ a Mãe sempre autorizou”;
20. Saliente-se o teor do doc. 4 junto com a contestação do qual decorre que já em 2002 a Autora/Recorrente havia intervindo junto do serviço de finanças como gestora de negócios;
21. No que respeita, por sua vez, à capacidade financeira para levar a cabo a construção da casa objeto dos Autos, salienta-se que esta é uma prova que se faz documentalmente e não com prova testemunhal ou por declarações, como é natural...
22. Não consta do Processo qualquer prova da Autora/Recorrente nesse sentido, apesar da abundante prova documental que a mesma juntou ao Processo;
23. É de relevar que Autora/Recorrente poderia ter demonstrado os seus rendimentos de forma simples, sem necessidade de juntar ao Processo mais de 50 documentos, através de contas da sua titularidade ou de contas provisionadas por si, unicamente com rendimentos seus, mas a Autora/Recorrente nunca o fez, apenas tendo junto ao Processo comprovativos de contas em que era titular juntamente com a sua mãe, constando aliás a Ré/Recorrida como 1º titular; cheques dessa mesma conta, entre outros documentos que em nada comprovam a capacidade económica da Autora/Recorrente;
24. Mais ainda, o facto de Autora/Recorrente ter comprovado que efetuou diversos pagamentos no âmbito do Processo de licenciamento, não significa que os mesmos tenham sido efetuados com capitais próprios;
25. Tal como bem decorre da Sentença os documentos juntos pela Autora/Recorrente não logram provar que esta teria capacidade para construir uma casa que, naquela altura, custou cerca de €250.000,00, antes demonstrando que a Autora/Recorrente mantinha efetivamente o controlo sobre o património dos Pais, confirmando a versão dos Réus/Recorridos;
26. A Autora/Recorrente não logrou fazer prova, documental, dos seus rendimentos, bem como em sede das suas declarações de parte, a Autora/Recorrente não logrou convencer o Tribunal de que tivesse capacidade económica que lhe permitisse levar a construção da casa objeto deste processo;
27. Relevância ainda a este respeito assume o teor do documento junto pelos Reus/Recorridos e relativo à acusação proferida no Processo nº 7106/19.0T9VNG da 3ª secção do DIAP de Vila Nova de Gaia, da qual resulta a acusação da Autora/Recorrente pelo crime de burla por ter indicado o IBAN do Réu/Recorrido, seu Pai, sem a autorização deste, uma vez mais evidenciando o caráter e postura processual da Autora/Recorrente;
28. Ademais, ficou provado em sede de audiência de julgamento que quem levou a cabo a construção da casa foi o Pai da Ré/Recorrida;
29. A Autora/Recorrente não logrou igualmente provar, nem de longe nem de perto, os elementos necessários para que a usucapião se verifique;
30. Tais requisitos implicam a reunião numa mesma pessoa do domínio de facto e de direito e ainda uma total inércia por parte do titular do direito, neste caso implicaria uma total inércia dos Réus/Recorridos;
31. Recorde-se que ficou mais do que provado que as Partes coabitaram até meados de 2019, tendo os Réus/Recorridos abandonado a sua habitação na sequência dos Processos de maior acompanhado despoletados pela Autora/Recorrente;
32. Ao que acresce a NJA que os Réus/Recorridos remeteram à Autora/Recorrente, em 03/02/2021, para solicitar precisamente a entrega do seu imóvel;
33. Não se verificam, portanto, os requisitos necessários quanto à posse e quanto ao necessário decurso de tempo, os quais se mostram inexistente neste caso concreto;
34. Os requisitos para verificação da usucapião são obrigatórios, encontram-se definidos no art. 1287º do Código Civil e neste caso, conclui-se pela sua inexistência;
35. Recorda-se ainda que a usucapião justifica-se por questões de estabilidade e segurança jurídicas e, neste caso, as motivações da Autora/Recorrente são outras... tentando apenas de forma inusitada reivindicar para si o que sabe não lhe pertencer e o que apenas seria para si aquando da morte dos seus Pais;
36. No que respeita à postura processual da Autora/Recorrente e perante toda a factualidade dada como provada, é certo que a Autora Recorrente agiu deliberadamente e de má-fé, deturpando propositadamente a verdade dos factos para tentar convencer o Tribunal;
37. É indiscutível que a Autora/Recorrente atuou, bem sabendo a falta de fundamento da sua pretensão;
38. Assim sendo, a Autora/Recorrente agiu com dolo e contra os seus Pais! O que não poderia passar incólume aos olhos do Tribunal;
39. A conduta da Autora/Recorrente integra-se indiscutivelmente no âmbito do disposto no nº 2 do art. 542º do CPC, postura esta que causou grande angústia e tristeza aos seus Pais.
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3. Questões a decidir
1. Apreciar o recurso da matéria de facto;
2. Apurar se a decisão deve ser alterada;
3. Determinar se deve manter-se ou ser alterada a decisão sobre a litigância de má fé

4. Do Recurso da matéria de facto
Diz a apelante que: Facto Provado n.º 3, a matéria a dar-se como provada deve ser a seguinte: -Por carta remetida pelos Réus, estes comunicaram a FF e GG que “foi feita a escritura no 7º Cartório do Porto em 1994” (…) “agora a minha filha vai cá construir”. (documento n.º 3 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido). Igualmente, deve ser considerado como provado que Nessa mesma carta, os Réus deram conhecimento aos destinatários da obra que se iria realizar.
O fundamento para essa alteração é que “ A letra e as assinaturas constantes do documento em que se estriba o facto nº 3 (dado como provado) têm que considerar-se como verdadeiras, porque jamais foram efetivamente impugnadas pelos Recorridos”.
Vejamos
Decorre do art. 607.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, que o principio da livre apreciação da prova não abrange os factos que só podem ser provados por documento, e bem assim, aqueles que estejam plenamente provados por acordo ou confissão.
Confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (artº 352º do CC).
A confissão judicial é efectuada de forma expressa, tácita ou ficta.
In casu estamos perante uma, alegada forma de admissão ficta de factos, que ocorre quando a parte não impugnada ou não contesta determinada factualidade alegada, neste caso, pelo autor.
O art. 574 nº1 CPC exige que o réu tome posição definida perante os factos articulados na petição.
Ora, no art. 6º, da sua contestação foi dito “Os Réus desde já impugnam, sem exceção, toda a matéria de facto vertida na P.I., bem como todos os documentos juntos com a mesma, designadamente os documentos números 2 e 3”.
Deste modo, é evidente que os RR assumiram uma impugnação clara, directa e frontal do teor do documento nº 3.
Mas, o certo é que não impugnaram a assinatura que consta do mesmo.
Nestes termos é aplicável o disposto no art, 534º, do CC que dispõe “1. Consideram-se reconhecidas a letra e a assinatura de um documento particular quando não sejam expressamente impugnadas pela parte contra quem o documento é produzido. 2. O impugnante pode arguir a falsidade ou pode limitar-se a contestar a veracidade da letra e da assinatura ou a declarar, quando uma e outra lhe não sejam imputadas, que as não aceita como verdadeiras”.
Isto porque este documento possui assinatura dos RR, pelo que se trata de um facto pessoal subsumível ao art. 534º, do CC, o qual aliás já faz parte integral dos factos provados.
Pelo que o documento em causa apesar de reconhecido não é, por si só, suficiente para alterar a matéria de facto nesta parte, já que note-se todo o seu teor foi e está integralmente reproduzido.
Note-se aliás que o depoimento de parte teve, quanto a ambos os RR, a seguinte confissão “A única matéria que obteve confissão foi a do art. 9º da P.I., tendo a Ré confessado que a relação com a filha era muito boa até data que não sabe precisar, mas que se situa mais ou menos há 4 anos
Logo, terá de improceder esta parte do recurso sobre a matéria de facto, pois o teor do documento já está integralmente provado.
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Em segundo lugar diz que “devem ser alterados os pontos 27. e 28 que dizem respeito ao Processo Judicial de Inventário nº 4895/07.9TBVNG, que pendera no Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia e no qual a Recorrida CC era cabeça de casal.
Alega, como fundamento que isso decorre do teor do processo.
Importa frisar que nos termos do Art. 355º, CC: 1. A confissão pode ser judicial ou extrajudicial. 2. Confissão judicial é a feita em juízo, competente ou não, mesmo quando arbitral, e ainda que o processo seja de jurisdição voluntária. 3. A confissão feita num processo só vale como judicial nesse processo; a realizada em qualquer procedimento preliminar ou incidental só vale como confissão judicial na acção correspondente. 4. Confissão extrajudicial é a feita por algum modo diferente da confissão judicial”.
Ou seja, decorre desta norma que a eventual confissão, efectuada noutro processo judicial assume, perante o actual, a natureza de confissão extra-judicial.
Por isso, nos termos do art. 358º, nº2, do CC “A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena”.
Nos termos do art. 376, do CC: “os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que sejam contrários aos interesses do declarante; mas a declaração é indivisível, nos termos prescritos para a prova por confissão”.
Ora, analisando as declarações efectuadas nesse processo vemos que as mesmas têm por objecto a construção do imóvel, para efeitos de inventário e não a titularidade do terreno onde este foi construído.
Depois, teremos de frisar que esta norma visou consagrar apenas uma presunção ilidível.
Segundo Vaz Serra[1] “a regra do nº 2 do art. 376º constitui uma presunção fundada na regra de experiência de quem afirma factos contrários aos seus interesses o faz por saber que são verdadeiros; essa regra não tem, contudo, valor absoluto, pois pode acontecer que alguém afirme factos contrários aos seus interesses apesar de eles não serem verdadeiros e que essa afirmação seja divergente da sua vontade por que se ache inquinada de algum vício de consentimento: o facto declarado no documento considera-se verdadeiro embora o não seja, por aplicação das regras da confissão podendo, porém, o declarante, de acordo com as regras desta, valer-se dos respetivos meios de impugnação”.
In casu, resultam elementos dos autos que comprovam que a autora e os RR viviam na mesma casa, como um agregado familiar, sendo que a casa foi construída num terreno doado aos RR e que estes “participavam nas despesas: o pai pagava a luz e a autora a net e canais de televisão”[2]. Sendo que o valor dessa construção (pelo menos 250 mil euros segundo depoimento de parte da autora), é manifestamente superior aos rendimentos propaladas da autora.
Nessa medida, note-se que por apelo (apenas) às declarações de parte da apelante, podemos concluir com clareza que:
Afinal, o seu avô não fez qualquer doação a si, mas sim à sua mãe (minuto 7, 8 e 9) que “nunca se opôs” à construção. E que essa doação foi feita após “consulta à advogada”, e que “seriam os pais na qualidade de proprietários que iriam emitir os recibos”, sendo as rendas geridas pelo seu avô até à morte deste.
Ou seja, neste depoimento temos de acreditar que um homem rico e esclarecido, após consulta a um advogado, teve a intenção de doar-lhe um vasto imóvel, mas para tal formalizou a mesma em nome dos seus pais.
Depois, esta admite até que algumas das artes da construção podiam ter posto o nome do seu avô na facturação (refere o vidraceiro, por exemplo)[3] mas que foi ela que pagou toda a construção.
Quanto ao licenciamento admite que o fez “da forma habitual já que tratava das diligências burocráticas”. Face a uma pergunta do tribunal (minuto 20 e 21), esclareceu, que sempre disse que ia construir uma casa num terreno doado à mãe sem necessidade de nenhuma outra burocracia. Confrontada com o documento na qual esta rectificou o pedido de licenciamento através da junção de uma procuração da sua mãe, diz (afinal) que a sua mãe sempre autorizou essa construção.
Ou seja, com base no seu depoimento concluimos que o terreno foi doado aos pais da autora, que esta sempre soube dessa situação e que, afinal, até o licenciamento foi formalizado em nome da sua mãe e não no seu.
Acresce que os documentos juntos pela autora comprovam essa versão da realidade.
Desde logo os comprovativos da subscrição dos certificados de aforro demonstram que estes eram insuficientes para custear as obras da casa (cujas obras se iniciaram em 1999), que incluíram a construção de uns anexos e piscina. Note-se que o custo global será, pelo menos de 250 mil euros (declarações desta). Ora, para comprovar esse financiamento foram juntos apenas comprovativos de certificados de aforro, e aludido a actividades e investimentos (minuto 22 e seguintes) que não foram comprovadas documentalmente.
Ou seja, usando como meios de prova apenas os aduzidos pela Autora, obtemos a certeza de que a relação familiar da autora e réus sofreu uma mutação abrupta após 2018 e que a casa foi construída num terreno doado/vendido aos RR sendo que “naturalmente tive ajuda do meu avô numa parte não significativa (minuto 47). Sendo que “sabia que o terreno era propriedade do meu avô e foi doado à minha mãe” (52 m).
Contra esta conclusão os depoimentos testemunhais são inócuos.
O Sr. Eng II diz ter sido o responsável pela construção do projecto da parte de betão da moradia que realizou desde o inicio tendo “reunido com a autora e um empreiteiro. Diz que este fez a parte de estruturas e de trolha e os restantes foram adjudicados pela autora. Acrescenta que o avô da autora acompanhava a obra frequentemente.
A Sra. MM (nome que consta da gravação), colega da autora e amiga próxima, descreveu a casa, dizendo que sempre a identificou como sendo da autora, que segundo ela a construiu. Diz que “a ideia que tem sobre a propriedade da casa é da AA”, porque ela tratava de tudo na construção e a mãe uma vez disse que tinha sido boa ideia construir naquela local”. Quanto às despesas diz que “obviamente foi a AA que suportava a casa”. Mas, após não conseguiu concretizar o montante desses extras e “nunca a viu a pagar uma despesa de construção”, mas que ela é “muito organizada e tem tudo muito direitinho”. Finalizando que “tudo o que sabe é aquilo que ela lhe disse”, admitindo que “ela geria o património dos pais (…) e geria as obras nas casas arrendadas”. Sendo que aproximadamente o custo de construção seria de “350 mil euros” e que uma professora ganharia cerca de 1500 euros líquidos mensais.
Por último, oficiosamente ouvidos os restantes depoimentos, teremos de notar que a ex-empregada da autora (NN), que diz estar zangada com a ré diz que o avô da autora ajudou na construção e que sempre ouviu dizer que a casa era da autora, mesmo por parte da ré. E que, por exemplo, a Sra. OO, diz que o que se dizia em ... é que “a AA ia construir casa no terreno dado pelo avô”. Ou seja, estes depoimentos testemunhais não põem em causa a origem total dos meios de pagamento da construção da casa e ou a propriedade do terreno onde esta se implantou, sendo inteiramente possível, plausível e congruente que parte significativa do custo de construção tenha sido suportado pelo avó e pais da autora, tanto mais que o muro (sra. HH) e o vidraceiro (AA), foram por certo pagos por este e, afinal, esta sempre administrou o património dos RR.
Note-se que a filha da autora depôs no dia 16.9., dizendo que a razão da zanga familiar foi um pedido de prestação de contas da sua avó à sua mãe, pelos gastos excessivos desta após o inicio de uma nova relação. Sendo que quem suportava os gastos era a sua avó e que esta descobriu que a A. comprou um apartamento em ... com o dinheiro que lhe estava confiado e que, em resumo, a casa foi paga pelo seu bisavô e mantida pelos rendimentos dos seus avós (RR), que pagaram a piscina que foi inaugurada e oferecida no seu aniversário de vinte anos. O depoimento desta testemunha (que reconhece estar de relações cortadas com a sua mãe) é não apenas preciso, mas emotivo, confirmando que, por exemplo, afinal os certificados de aforro juntos para comprovar rendimentos da autora são seus, e que ascendem a cerca de 4 mil euros actualmente.
Acresce que, a testemunha Sra. EE, também de forma emotiva, diz saber a razão da doação (beneficiar a ré filha depois de uma acção intentada pelos outros herdeiros), e não compreender a razão desta acção, porque todo o património dos RR era gerido pela autora.
Por fim, teremos de dizer que a critica da autora à constatação do tribunal a quo sobre a facilidade de mentiras em processos judiciais parece omitir a sua própria versão da realidade que começa por defender que uma doação a si é simulada através de escrituras efectuadas pelo seu avô.
Assim sendo, podemos concluir que o juízo valorativo do tribunal a quo é racional e congruente com os meios de prova produzidos e não merece censura mas sim um elogio de conformidade.
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5. Fundamentação de Facto
a) – Factos Provados:
1. Por escritura pública celebrada a 18.01.1994 no 7º Cartório Notarial do Porto, DD e mulher EE, declararam vender a CC casada com BB um prédio rústico, composto por terreno, sito no lugar ..., inscrito na matriz predial sob o artigo ...66 da freguesia .... (documento junto aos autos a 03.12.2021, que se dá por reproduzido).
2. Por carta registada DD e mulher EE comunicaram a FF e GG a venda referida em 1. (documento nº 2 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)
3. De documento escrito consta que os Réus comunicaram a FF e GG, que “foi feita a escritura no 7º Cartório do Porto em 1994 (…) “agora a minha filha vai cá construir.”. (documento nº 3 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
4. A Autora é filha dos Réus. (assento de nascimento junto com o requerimento de 03.12.2021, que se dá por reproduzido).
5. Por escritura pública celebrada a 09.06.1998 DD e mulher EE, declararam que distratam a venda efetuada na escritura referida em 1.. (documento nº 4 junto com a petição
inicial, que se dá por reproduzido).
6. Por escritura pública de celebrada no dia sete de maio de 1999, no Cartório Notarial de Espinho, DD e mulher EE doaram a CC casada com BB, entre outros, os seguintes imóveis: - “Prédio misto, composto por casa de habitação, e terreno lavradio junto, sito no lugar ... ou ..., da dita freguesia ..., com as áreas coberta de cinquenta e sete metros quadrados, páteo com quarenta e oito metros quadrados e descoberta de cento e vinte metros quadrados e o terreno de lavradio, com a área de dois mil oitocentos e cinquenta metros quadrados, inscrito na matriz sob os artigos ...9, urbano e ...67 e ...68 rústicos, com o valor tributável global de 284.340$00, descrito na Conservatória sob o número mil oitocentos e cinquenta e um e registado a seu favor pela inscrição G-um e a que atribuem o valor de TREZENTOS CONTOS.” “Prédio rústico de cultura, com a área de mil quatrocentos e cinquenta metros quadrados, sito no mesmo lugar ..., da mesma freguesia ..., a confinar a norte estrada, sul PP e outro, nascente vala de rega, poente QQ, inscrito na matriz sob o artigo ...66 com o valor tributável de 7.887$00, descrito na mesma Conservatória sob o número dois mil e três registado a seu favor, pela inscrição G-dois e a que atribuem o valor de CEM CONTOS;”. (documento junto aos autos a 29.03.2021, que se dá por reproduzido)
7. A relação entre a Autora e os Réus foi muito boa até ao ano de 2018.
8. Encontra-se de relações cortadas desde meados de 2018.
9. Nos prédios doados à Ré mulher foi construído um “Prédio de cave, R/c, quintal e logradouro, sendo a Cave constituída por 1 casa de banho, 1 despensa e 1 garagem. O R/c por 5 divisões assoalhadas, 1 cozinha, 4 casas de banho e 2 vestíbulos.” conforme consta da caderneta predial – doc. nº 6 e inscrição predial”. (documentos nºs 6 e 7 juntos com a petição inicial, que se dão por reproduzidos).
10. O imóvel inscrito na matriz sob o artigo ...92 encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...03 a favor dos Réus. (documento nº 7 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
11. O artigo rústico da freguesia ... inscrito na matriz sob o nº ...66 deu origem ao artigo urbano inscrito na matriz da mesma freguesia sob o nº ... e este veio a dar origem ao artigo urbano também da mesma freguesia inscrito sob o nº ...56, que corresponde ao atual artigo matricial ...92. (documentos nºs 6 e 8 juntos com a petição inicial, que se dão por reproduzidos).
12. A Autora requereu em 1999 à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e foi deferida a licença de construção e de utilização de terreno na Rua ..., em ..., Vila Nova de Gaia. (documento nº 11 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)
13. A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, por comunicação dirigida à Autora em 29.01.200, informa da atribuição do “número de polícia na Rua ..., ao edifício correspondente ao processo de obras particulares nº 362/99, na Freguesia de ... deste Concelho”, tendo sido atribuído o nº ...5. (documento nº 13 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
14. A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, por comunicação dirigida à Autora em 02.02.2005, solicita o pagamento da taxa referente a “Três ramais de ligação ao coletor à berma de águas pluviais com 1,50M (cada) de extensão (diâmetro 90MM). (documento nº 14 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
15. A Autora requereu a ligação da rede elétrica ao imóvel. (documento nº 15 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
16. A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, por comunicação dirigida a proprietário do imóvel, em 30.07.2007, solicita o pagamento da taxa referente a “acesso a habitação na Rua ..., ... junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
17. A 3ª Repartição de Finanças de Vila Nova de Gaia procedeu à avaliação do imóvel e atribuiu-lhe o valor patrimonial de €126.360,00. (documento nº 18 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido)
18. Foi construída uma piscina, anexos de apoio à piscina e de lazer, um espigueiro e furo de água, que ocupam os prédios descritos em 6.
19. A piscina, os anexos, o espigueiro e furo de água, são complementos da habitação.
20. As obras nos imóveis ascenderam a mais de €250.000,00.
21. A Autora reside de forma permanente no imóvel desde a data da sua construção, onde se encontra a sua morada de família.
22. Os Réus residiram de forma permanente no imóvel desde a data da sua construção e até janeiro de 2019, onde se encontrava a sua morada de família.
23. O Imposto Municipal Sobre Imóveis (IMI), referente ao ano de 2009 a 2019 foi emitido em nome da Autora. (documento nº 23 junto com a petição inicial e documento nº 10 junto com requerimento de 16.09.2022, que se dão por reproduzidos)
24. Dos prédios inscritos na matriz sob os artigos ...59 e ...57 consta como titular a Ré mulher. (documentos nº 19 e 20 juntos com a petição inicial, que se dão por reproduzidos)
25. Os imóveis inscritos na matriz sob os artigos ...9, ...57 e ...68 encontram-se inscritos na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...51 a favor dos Réus. (documento nº 22 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido).
26. A Autora foi condenada como litigante de má-fé, por sentença proferida em 1ª instância em 13.11.2019, confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 14.05.2020, no âmbito do Processo que correu termos sob o nº 5527/18.5T8VNG, no Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 1 no qual a Autora, veio requerer “a interdição” da sua mãe, aqui Ré, alegando que mesma se encontrava incapaz, de gerir a sua vida e os seus bens. (cf. certidão junta com o requerimento de 18.05.2021, que se dá por reproduzida)
27. Os prédios objeto de doação à Ré mulher integram a relação de bens no Processo de Partilha que corre os seus termos sob o nº 4895/07.9TBVNG, no Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 1 e no qual a Ré CC é cabeça de casal. (cf. documento nº 1 junto com a contestação e certidão junta a 11.10.09.2022, que se dão por reproduzidos)
28. Em tal processo, a Ré adjudicou para si, entre outras, as verbas que correspondem aos prédios objeto da presente ação. (cf. documento junto a 03.12.2021 e certidão junta a 11.10.2022, que se dão por reproduzidos)
29. A Autora, desde a data a que remonta a construção da casa auxiliou os seus pais no processo administrativo/burocrático de licenciamento e construção.
30. Toda a parte burocrática inerente à construção da casa foi feita com ajuda da Autora e do seu marido, entretanto já falecido, fruto da confiança que os seus pais depositaram na mesma.
31. A Autora atuou sempre em representação da sua mãe.
32. O custo da construção do imóvel foi suportado pelos Réus e pai da Ré.
33. Quando Autora efetuou diligências junto da Câmara Municipal não atuava em nome próprio, mas em nome e representação da sua mãe.
34. Em consequência de requerimento apresentado pela Ré mulher, a Diretora Municipal de Urbanismo e Ambiente, por certidão emitida em 03.05.2021, certifica que “relativamente ao edifício sito na Rua ..., (…) licenciado ao abrigo do processo nº ...9, foi emitido o alvará de utilização nº ...2, em nome de AA, na qualidade de mandatária de CC”. (cf. documento nº 3 junto com a contestação, que se dá por reproduzido)
35. A Ré mulher requereu junto da Direção de Finanças do Porto a alteração da inscrição matricial efetuada em nome da Autora. (cf. documento nº 4 junto com a contestação, que se dá por reproduzido)
36. A Autora sempre viveu com os seus pais, na casa destes, os quais suportavam as despesas de água, energia e telecomunicações.
37. A partir de meados de 2018, a relações entre as partes degradaram-se, vendo-se os Réus obrigados a mudar de residência, o que veio a ocorrer em janeiro de 2019.
38. Encontra-se pendente processo crime que corre termos sob o nº 671/18.1GBVNG, no Tribunal de Instrução Criminal do Porto, Juiz 2, no âmbito do qual foi proferida acusação contra Autora e Réus, sendo a Ré mulher acusada de 4 crimes de ofensa à integridade física, 1 de ameaça agravada e 1 de abuso de confiança agravado, o Réu de 2 crimes de ofensa à integridade física e 1 de abuso de confiança agravado e a de Autora 5 crimes de ofensa à integridade física, 1 de ameaça agravada. (cf. certidão junta a 09.06.2021, que se dá por reproduzida)
39. Os Réus interpelaram a Autora, em 15.12.2020, mediante Notificação Judicial Avulsa, para que esta procedesse à entrega do imóvel, livre e devoluto de pessoas e bens. (cf. documento nº 5 junto com a contestação,
que se dá por reproduzido)
40. Do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº ...51 foi desanexado o prédio urbano descrito na mesma Conservatória sob o nº ...03, da freguesia ....
41. O prédio descrito sob o nº ...51 corresponde ao imóvel sito na Rua ..., em ..., propriedade dos Réus, correspondente a uma casa de um pavimento, com quintal e páteo e terreno. (cf. documento nº 22 junto com a petição inicial) .[4]
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6. Motivação Jurídica
1. Da aquisição originária
Face aos factos provados é evidente a inexistência de uma posse juridicamente relevante, a qual, recordemos foi alegada como a concreta causa de pedir da autora.
A posse, tal como nos aparece definida no art. 1251º do C.C., traduz-se no exercício de poderes de facto sobre uma coisa nos termos do direito real correspondente a esse exercício [5].
Deste modo, para que exista uma situação possessória e não apenas uma mera detenção é necessário que existam dois elementos fundamentais: o corpus, entendido como o exercício de poderes de facto sobre uma coisa; e o animus possessório que se traduz na intenção da agir sobre ela como se fosse titular de um direito real, e que se terá de inferir do modo de actuação relativamente à coisa[6].
No presente caso, não se apurou que a autora tenha construído e adquirido o imóvel à vista de toda a gente sem intenção de prejudicar ninguém.
Aliás, na perspetiva possessória, que aqui interessa, o essencial é a detenção realizada.
Por este prisma e conforme dispõem os arts. 1263º, al. b), e 1264º, ambos do C.C., o fundamental para o inicio de uma situação possessória é o efectivo empossamento mediante a entrega material da coisa ou através da manutenção da detenção agora em nome do novo proprietário.
Neste sentido o Prof. Henrique Mesquita[7] afirma: "não basta para adquirir posse que se exerçam poderes jurídicos sobre a coisa, só o exercício de poderes materiais é susceptível de traduzir a existência de uma situação de facto ". E, se dúvidas houvesse, o Prof. Manuel Rodrigues [8] esclarece " a aquisição da posse só pode existir quando o adquirente obtiver a possibilidade de exercer um direito possessório sobre o objecto, não bastando, por isso, só o acto jurídico que importa a transferência do direito susceptível de posse, exige-se o estabelecimento de uma relação material".
Por tudo isso, podemos então concluir que a autora não logrou demonstrar qualquer acto efectivo de posse sobre o imóvel e que esse contacto empírico com a coisa e corresponde a um poder fáctico juridicamente relevante, exercido com animus sibi habendi, de boa fé, publica e pacificamente.
Importa por último referir que, de acordo com o art. 1252º, do C.C., "a posse tanto pode ser exercida pessoalmente como por intermédio de outrem", sendo considerados meros detentores "os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiários do direito"., art. 1253º, al. a), do C.C.
Ora, resulta demonstrado que “A Autora atuou sempre em representação da sua mãe”, pelo que os actos materiais provados demonstram apenas o seu exercício em nome desta e não em nome próprio com um verdadeiro animus de proprietário. Nestas situações exige-se uma inversão do título de posse real e inequívoca que demonstre uma clara distinção entre os actos de mera administração daqueles que foram já praticados com intenção de domínio.
Nestes termos o Ac da RG de 21.9.17, nº 35/15.9T8MTR.G1 (Helena Melo), numa situação semelhante, considerou que” provados actos materiais sobre a coisa, desde há mais de 20 e 30 anos, primeiramente pelo seu pai e actualmente por si, tendo provado que era o seu pai e actualmente a apelante que vigiavam o prédio e que deste retiravam todas as utilidades do prédio: água, lenhas, pasto, e estrumes para os seus animais domésticos, bem como todas as demais utilidades do prédio, há que presumir o animus, porquanto esta presunção não foi ilidida, incumbindo aos RR provar uma situação de mera tolerância”.
Porque, existe uma diferença relevante entre actos de posse e os actos de mera tolerância, que são aqueles que levam a que o agente (detentor) possa beneficiar de certas vantagens que um direito comporta, tendo por base a mera permissão do seu dono.
E, no caso, também não podemos esquecer que, se duvidas houvesse (e tal não resulta da factualidade provada) sempre teríamos de considerar que os RR gozam de uma presunção de detenção nos termos de um direito real, pois, o art. 1252º, nº2, do C.C., preceitua "em caso de duvida presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto".
Explicitando esta norma o Prof. Manuel Rodrigues [9] esclarece "desta disposição resulta que o animus em princípio existe, e é quem contesta a sua existência que há-de provar que assim não é".
Esta presunção de que à detenção material corresponde uma intencionalidade possessória, justifica-se, segundo Pires de Lima e Antunes Varela [10] "porque é difícil, fazer a prova da posse em nome próprio, que não seja coincidente com a prova do direito aparente, cabendo, portanto àquele que se arroga a posse provar que o detentor não é possuidor".
Ora, in casu resulta provado (além do mais) que “Os Réus residiram de forma permanente no imóvel desde a data da sua construção e até janeiro de 2019, onde se encontrava a sua morada de família”.
Deste modo, encontrando-se provado que os RR sempre usaram a casa como sua habitação essa detenção seria presumidamente exercida com um animus possidendi.
Logo, improcede a causa de pedir concreta alegada pela autora.
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2. Da acessão
Poder-se-ia ainda, em abstracto, aplicar aos autos o instituto da acessão, previsto no art. 1343 do C. Civil.
O art. 1343 encontra-se inserido na secção III, no domínio da acessão, na sub secção III – acessão industrial imobiliária – como forma de aquisição da propriedade.
Dispõe o art. 1316º, do CC que "quando na construção de um edifício em terreno próprio se ocupe, de boa-fé, uma parcela de terreno alheio, o construtor pode adquirir a propriedade do terreno ocupado...."
Ora, in casu está demonstrado que o custo dessa construção foi suportada pelos RR e não pela autora, o que afasta desde logo este instituto.
Depois, quanto ao requisito Boa fé não existem factos provados relativos ao mesmo. Segundo o Sr. Cons. Quirino Soares (in Acessão e Benfeitorias, CJ, Acórdão do STJ, Tomo, I, 1996, pág. 1): “Dizer-se que age de boa fé, para efeitos de acessão (…), ou o que interveio debaixo de autorização do dono do terreno, é, pois, o mesmo que dizer que assim age (de boa fé) aquele que ignorava, ao intervir em terreno alheio, que lesava o direito de terceiro”.
In casu, face aos factos provados a AA nunca poderiam desconhecer de que o terreno era alheio porque sabia da doação do mesmo aos seus pais.
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3. Da condenação como litigante de má fé
A responsabilidade processual remonta, pelo menos, ao direito romano na época do império[11].
Nas Ordenações Filipinas (LXVII/Livro III) existia também uma distinção entre a justa causa de litigar, e as situações em que “E no caso, em que o vencido foi em culpa sómente de fazer demanda, que não devêra, sem outra malicia, será condenado nas custas singelas. E sendo achado em malicia, será condenado nas custas em dobro, ou desdobro, segundo a malicia em que for achado. E porque acerca disto se não pode dar certa regra, ficará em arbítrio do Julgador. E em todo o caso, onde o vencido he condenado nas custas em dobro, ou em tresdobro, e não lhe forem achados bens, em que se faça execução, será preso, até que as pague da cadeia, porque a dita condenação procedeo de malicia, que he havida por maleficio”.
Mas, na visão liberal (típica do século XIX), o processo era um mero confronto privativo entre as partes, e por isso não eram impostas quaisquer exigências de correção e lealdade. O juiz não tinha, também, qualquer atividade instrutória e só podia usar os elementos arrolados pelas partes, que assim conservavam uma “total” disponibilidade sobre o objeto e decurso da própria relação jurídica processual.
Nessa concepção a acção processual, era limitada apenas por normas imperativas que sancionassem a sua conduta como crime, pelos deveres deontológicos dos mandatários e pela sua “honra, moral e correcção”.
Depois, já no séc. XX a sanção das condutas integradoras de má fé foi admitida, mas de forma restrita, limitada a situações dolosas e, quanto às pessoas coletivas, a situações nas quais o outorgante da procuração tivesse agido dolosamente.
Actualmente essas restrições terminaram, pois, o art., 542º, do CPC alargou o conceito de má fé a actos cometidos através de negligência grave[12].
Isto, porque “a má fé processual é um vicio que não afecta apenas a parte directamente atingida, mas toda a sociedade, na medida em que “desvia o processo da sua função, esgotando recursos que, de outro modo, seriam canalizados para o julgamento de ações judiciais fundadas”.[13]
Acresce que, qualquer contraente, no cumprimento da sua obrigação está obrigado a agir de forma leal e com boa fé nos termos do art.762º, nº2, do CC, dever esse que foi processualmente transposto pelo art. 8º, do CPC.
A má fé processual é assim um desvio negativo ao padrão de comportamento devido e imposto aos litigantes, os quais além de actuarem de boa fé estão impedidos (art. 542º, nº2, do CPC) de:
a) deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) alterar a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) praticar omissão grave do dever de cooperação;
d) fazer do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.

Ora, in casu a apelante, quando intentou a presente acção sabia que:
a) o terreno onde a casa foi construída foi doado pelo seu avô à sua mãe
b) o seu avô custeou a totalidade ou parte da construção dessa casa
c) a manutenção da mesma foi suportada pelos seus pais.
d) agiu como representante destes administrando os seus bens, incluindo o processo de construção dessa moradia.
Logo, é seguro que deduziu uma pretensão que sabia ser injustificada.
Acresce que, no seu articulado, “alterou a verdade dos factos”, omitindo ou adulterando factos pessoais que não podia ignorar.
Nesta medida, por exemplo, ocultou que a licença de construção (art. 15 da p.i) foi deferida em representação da Ré. A autora também afirma um facto pessoal que comprovadamente não existe (art. 26 da pi).
Acresce que a autora juntou ao processo vários documentos visando comprovar meios financeiros para suportar o custo de construção da casa. Dizendo que “eram destinados a provar que, ao longo dos anos em que ocorreu a construção do prédio objeto da presente ação, a Autor obteve rendimentos que aplicou nesta”.
Ora, esses documentos afinal estão em nome da sua filha e dizem respeito a certificados de aforro da mesma (documentos juntos em 3.12.21) que segundo depoimento desta dizem respeito à actual quantia de 4 mil euros e derivam de prendas que lhe foram oferecidas.
É, pois, evidente que a autora tentou “impedir a descoberta da verdade”.
Deste modo, parece seguro que a apelante preencheu todas as modalidades típicas do instituto da má fé.[14]

3.1. Do padrão e grau de diligência aferido
O padrão será, o previsto na lei geral, do agente medianamente cuidoso e sagaz, colocado naquela situação concreta (art. 487º, nº 2 do CC).
Acrescenta Paula Costa e Silva[15] que «A parte pratica um ato desconforme e provocador de um dano num bem juridicamente protegido porque, antes de agir, devia ter observado os deveres de indagação que sobre ela impendiam; o desconhecimento quando à falta de fundamentação é-lhe imputável, sendo censurável». E mais adiante “A generalidade das pessoas ou todas as pessoas, pertencentes à categoria social e intelectual da parte real, colocadas naquela situação em concreto, ter-se-iam abstido de litigar, uma vez que, cumprindo os seus deveres de indagação, teriam concluído não terem, quer a pretensão, quer a defesa, fundamento. Só um sujeito extraordinariamente desleixado age como agiu a parte”.
Acresce que, “o legislador deixou ainda clara a desnecessidade, quanto à prova, da consciência da ilicitude do comportamento e da intenção de conseguir objectivos ilegítimos (actuação dolosa), bastando que seja possível formular um juízo de censurabilidade.” [16]
Como vimos, neste caso, essa censura é evidente, tanto mais que, recorde-se, a parte estava patrocinada por mandatário, esta é já a terceira acção intentada contra os RR devido à mesma querela familiar, o que demonstra de forma evidente que não se tratou de um lapso mas uma intenção, uma e outra vez reiterada.
Note-se aliás que situações análogas foram apreciadas pela nossa jurisprudência e doutrina[17] concluindo-se que:
- Ao instaurar a acção executiva a recorrente actuou, pelo menos, com negligência grave, deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar [n.º 2 al.a), do art.º 456.º], já que lhe era exigível, como a qualquer pessoa de média diligência, que nas circunstâncias em concreto tivesse, no mínimo, sérias dúvidas quando ao direito que pretendia exercer através dessa acção.[18]
- A parte deduz pretensão, cuja falta de fundamento não devia ignorar, quando negligencia o dever de indagação quanto à existência de fundamento suficiente para a pretensão que deduz, atuando com desleixo. Para este efeito, basta a demonstração de que era exigível à parte a consciencialização da falta de fundamento da pretensão[19]
- O autor litiga de má fé se instaura uma acção de reivindicação tendo por objecto um prédio que sabe estar arrendado ao Réu, recebendo o autor a respectiva renda mensal.[20]

É certo que este juízo deve ser cauteloso, até para evitar uma limitação do direito de acção dos cidadãos e empresas (art. 20º, da CRP).
Mas, neste caso, estamos perante uma flagrante ocultação de realidades materiais e familiares que qualquer cidadão médio prudente teria evitado, pelo menos, através da menção simples, franca e honesta daquilo que afinal admite nas suas declarações, ou seja, que os pais pagavam parte das despesas e que o seu avô suportou e dirigiu, pelo menos, parte das obras.
Ou seja, não estamos aqui perante qualquer contingência do resultado da produção de prova, mas perante a ocultação de factos revelados, pelo menos parcialmente, nas próprias declarações e documentos juntos pela própria parte.
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3.2. Do montante da sanção
O valor fixado pelo tribunal a quo foi de 10 ucs.
O limite legal é entre o montante da multa por litigância de má-fé entre 2 a 100 UC (art. 27º, nº 3 do RCP).
Tendo em conta esse limite legal teremos de atender, conforme salienta Abrantes Geraldes[21] que a fixação não pode ser arbitrária, mas deve atender à maior ou menor intensidade da culpa revelada pelo agente; à sua condição económica, às consequências processuais do acto gerador de má fé e, à necessidade sancionatória e preventiva de evitar comportamentos semelhantes.
O objectivo dessa sanção é sancionar o comportamento concreto e evitar que seja retirado qualquer beneficio do mesmo.[22]
Ora, in casu teremos de atender a que o benefício que se queria obter é saliente (direito de propriedade de um imóvel no valor de, pelo menos, 250 mil euros).
Por outro lado, o valor processual indicado pela autora foi de €214.197,20. E, mais relevante, o imóvel é a casa de habitação da família.
Acresce que o grau de violação do dever de probidade foi elevado, e que a modalidade das condutas é grave e implica o preenchimento de três modalidades da mesma, na forma dolosa.
Ora, o valor fixado corresponde apenas a 0,4% do valor económico visado pela autora e por isso só pode ser considerado até escasso e nunca excessivo.
Todavia, não faz parte do objecto deste recurso o aumento desse montante.
Improcede, pois, a questão suscitada.

3.3. Da indemnização relegada para execução de sentença
Foi requerida e fixada uma indemnização a liquidar em execução de sentença quanto aos danos provocados por essa litigância.
Esta indemnização depende da existência dos seguintes elementos: (i) ilicitude; (ii) culpa; (iii) dano; e, (iv) nexo de causalidade entre o facto e dano.
Nesta medida o art. 543º, do CPC prevê que “A indemnização pode consistir: a) No reembolso das despesas a que a má-fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos; b) No reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da má-fé. 2 - O juiz opta pela indemnização que julgue mais adequada à conduta do litigante de má-fé, fixando-a sempre em quantia certa. 3 - Se não houver elementos para se fixar logo na sentença a importância da indemnização, são ouvidas as partes e fixa-se depois, com prudente arbítrio, o que parecer razoável, podendo reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e de honorários apresentadas pela parte”.
Ou seja, esta indemnização diz respeito aos danos processuais provocados pela conduta, pois, “a finalidade visada pela indemnização existente em sede de litigância de má fé não é, destarte, ressarcitória, como sucede com a responsabilidade civil mas sim meramente sancionatória e compensatória”.[23]
Ora, no seu articulado os RR/apelados alegaram apenas (art. 52) que “Situação essa que causa grande tristeza e angústia aos Réus e os coloca com um certo estado depressivo”.
Ou seja, seria esse o dano a liquidar em fase posterior.
Mas, por um lado o nº3, dessa norma instituiu uma forma específica de liquidação, que por isso assume natureza especial face à liquidação posterior da obrigação.
Depois, teremos de notar que da matéria de facto nada consta sobre esta realidade que nem sequer foi objecto de decisão (isto é essa matéria não consta dos factos provados nem dos não provados).
Nestes termos é seguro e evidente que os RR não demonstraram a existência de qualquer dano autónomo resultante da litigância com má fé da sua filha.
Acresce que, o nexo de causalidade entre a conduta processual da A. nesta acção e qualquer distúrbio psíquico dos RR não está também demonstrada, pois, recorde-se, que “Encontra-se pendente processo crime que corre termos sob o nº 671/18.1GBVNG, no Tribunal de Instrução Criminal do Porto, Juiz 2, no âmbito do qual foi proferida acusação contra Autora e Réus, sendo a Ré mulher acusada de 4 crimes de ofensa à integridade física, 1 de ameaça agravada e 1 de abuso de confiança agravado, o Réu de 2 crimes de ofensa à integridade física e 1 de abuso de confiança agravado e a de Autora 5 crimes de ofensa à integridade física, 1 de ameaça agravada. (cf. certidão junta a 09.06.2021, que se dá por reproduzida).
Deste modo, é evidente que nada pode ser fixado por equidade, nem nada pode ser relegado para ulterior liquidação, porque não ficou demonstrado qualquer dano derivado da conduta ilícita da apelante neste processo.
Ora, in casu, os RR nenhuma indemnização pediu quanto aos honorários do seu mandatário, pelo que essa indemnização não pode ser fixada, já que depende, pelo menos, da formulação de um pedido concreto.
Na verdade, qualquer das duas teses sobre esta matéria: a primeira que exige a alegação do montante suportado e a segunda que se basta com o pedido da sua atribuição, pressupõem sempre um efectivo pedido de indemnização. [24] In casu esse pedido não foi sequer formulado.
Deste modo, teremos de concluir que os apelantes limitaram o seu pedido indemnizatório a um dano psíquico que não foi demonstrado e que, nada requereram quanto ao pagamento de honorários.
Procedem, pois, nesta parte as conclusões da apelante.
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8. Deliberação
Pelo exposto este tribunal julga a presente apelação parcialmente procedente, por provada e, por via disso, confirma a decisão recorrida revogando apenas esta quanto à condenação “no pagamento de uma indemnização aos Réus, até ao limite máximo de €20.000,00, a liquidar em execução de sentença”.
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Custas a cargo de ambas as partes, na proporção do seu decaimento que se fixa em 90% para a apelante e 10% para os apelados.
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Porto em 20.4.23
Paulo Duarte Teixeira
Ana Vieira
António Carneiro da Silva
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[1] In RLJ Ano 110, pág. 85.
[2] Depoimento de parte da autora.
[3] Nesta medida note-se que o depoimento do Sr. RR, projetista da casa, que se pede para ser tratado como testemunha isenta, diz que recebeu instruções de várias pessoas (RR e avô), e que a autora foi a mais interventiva nessa fase. Ou seja, é afinal inócuo para demonstrar as ordens exclusivas da A, tanto mais que à pergunta sobre quem lhe pagou o projecto disse “sem ter certezas estou convencido que foi a Autora que lhe fez o pagamento”.
[4] Dão-se por reproduzidos, para todos os efeitos, os factos não provados constantes da sentença.
[5] Prof. Orlando de Carvalho in R.L.J., Ano 122, pg.104.
[6] cfr. por todos neste sentido subjectivista Prof. Orlando de Carvalho in RLJ, 122, 105;
[7] in Direitos Reais, pág. 126.
[8] in A Posse, pág. 202,
[9] in A Posse, Edição de 1996, pág. 338; neste sentido e por mais recentes, Acs. STJ. de 26/4/94, in ACSTJ, II, 62 e de 9/9/93 in ACSTJ, III, 44.
[10] in C.C. Anotado, III, pág. 8.
[11] Catarina Pires Cordeiro, A responsabilidade do exequente, na nova acção executiva: sentido, fundamento e limites, Revista Direito Privado, 10, Abril/maio de 2008. “Desde as leis de Herculano (1211), se pode verificar a intenção de evitar o recurso injustificado à Justiça e o abuso dos meios de processo Destacando-se, neste âmbito, vários diplomas legais. A Lei VIII concebia o pagamento de custas, divergentes consoante a qualidade da pessoa a elas obrigada, em virtude de esta vir a interpor recurso no qual volta a ser vencida; a Lei IX visava dissuadir o devedor de, sem legitimidade, obstar à penhora do seu património, decorrendo do referido bloqueio a aplicação de uma pena de multa; e a Lei XVI tinha por objeto evitar o recurso à penhora direta por quem não se encontrava na posição de fazer prova do seu crédito contra o devedor, sob pena de se constituir na obrigação de reparar os danos causados a este último, além de ser sujeito ao pagamento de uma coima”.
[12] a ampliação da negligência grave deriva já da alteração ao CPC61 pelo DL nº. 329-A/95, de 12/12.
[13] PAULA COSTA E SILVA, A Litigância de Má Fé, Coimbra Editora, 2008, p. 31 e ss;; PEDRO DE ALBUQUERQUE, Responsabilidade Processual por Litigância de Má Fé, Abuso de Direito e Responsabilidade Civil em Virtude de Actos Praticados no Processo, Almedina, 2006, p. 15 e ss; MENEZES CORDEIRO, Litigância de Má-Fé, Abuso do Direito de Acção e Culpa “In Agendo”, 3ª edição aumentada e atualizada, Almedina, 2014, p. 45 e ss.
[14] Cfr. nestes termos o Ac da RP, desta secção e coletivo, de 16.12.20, nº 7222/18.6T8VNG (Paulo Duarte Teixeira)
[15] Loc cit, 392.
[16] Cons. Abrantes Geraldes Temas da Reforma do Processo Civil, II vol., 3ª ed., pág. 341.
[17] Ac da RC de 4.3.08, nº 2072/05.2TBMGR-A.C1, (HÉLDER ROQUE). Marta Alexandra Frias Borges, Algumas Reflexões em Matéria de Litigância de Má-Fé, FDUC; 2014, disponível https://estudogeral .sib.uc.pt/bitstream/10316/28438/1/Algumas%20 reflexoes%20em%20materia%20de%20litigancia%20 de%20ma-fe.pdf.
[18] Ac da RL de 15.12.2012, nº 1071/09.0TBSTR-A.L1-6 (Jerónimo Freitas).
[19] Ac da RL de 20.12.2016, nº 1220/14.6TVLSB.L1-7 (Luís Sousa).
[20] Ac da RE de 15.11.2007, nº 1219/07-2 (Assunção Raimundo).
[21] in Temas Judiciários, vol. I, pág. 330 e segs.
[22] MENEZES CORDEIRO, cit., p. 65.
[23] Ac da RP de 6.2.2020, nº 6590/13.0TBMTS-B.P1 (Fernando Baptista).
[24] Nestes termos, entre vários Ac da RG de 11.5.2017, nº 1639/14.2 TBVCT.G2 (Maria Purificação Carvalho).