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CONTRA-ORDENAÇÃO AMBIENTAL
DERRAME DE ÓLEOS USADOS NO SOLO
GARANTIA FINANCEIRA
NEGLIGÊNCIA
Sumário
I - No tipo contraordenacional de “descarga de óleos usados no solo” previsto nos artigos 5º, al. b), e 25º, n.ºs 1, al. a), e 4, do Decreto-Lei 153/2003, na redação do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/0, a expressão “solo” tem de ser interpretada no seu sentido ecológico -como algo poroso que possa alimentar árvores de fruto, vida ou deixar escoar para veios de água o que nele é vertido- e não como sinónimo de “pavimento”, sobretudo se for impermeável, como é o caso de um pavimento de asfalto de cimento, material que em regra não permite a passagem dos óleos ou dos seus resíduos até ao solo, no sentido referido. II - Não tendo havido derrame de óleos usados no solo, com o sentido apontado, não se mostram preenchidos os elementos objetivos do tipo contraordenacional mencionado. III - Considerar que “uma descarga de óleos usados nas águas residuais da rede de esgotos” mostra-se contida no conceito de “descarga de óleos usados no solo”, no sentido ecológico referido, consubstancia uma interpretação extensiva e viola o princípio da legalidade previsto no art.º 2º, do RGCO, e dentro deste o da tipicidade. IV - Quando a “falta de constituição de garantia financeira” (aludida no tipo contraordenacional p. e p. nos artigos 22º e 26º, n.º 1, al. f), do Decreto- Lei n.º 147/2008, e no artigo 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006) é motivada por desconhecimento da obrigação legal de a constituir, tal erro só exclui o dolo, continuando a conduta a ser punível a título de negligência se o erro for censurável. V - É de exigir a uma sociedade instalada há décadas num certo ramo e que, no exercício regular da sua atividade, procede ao manuseio de produtos químicos perigosos, com fortes exigências legais no que respeita ao manuseamento, armazenamento, separação, contenção e destino de tais produtos, que se mantenha atualizada relativamente às exigências legais relacionadas com esses produtos potencialmente lesivos do ambiente. Consequentemente, é censurável o desconhecimento por parte desta sociedade da obrigação legal de constituir uma garantia financeira destinada a acautelar a necessidade de compensar eventuais futuros danos ambientais decorrentes da atividade de utilização de produtos com forte potencialidade de lesão do meio ambiente, tanto mais quando a imposição legal da constituição dessa garantia existe desde 2010 (por força do artigo 34º, do Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29.07).
Texto Integral
Acordaram, em conferência, os Juízes Desembargadores da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
Em processo de contraordenação a sociedade “A, Lda.” foi condenada, por decisão administrativa proferida pela Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, pela prática de:
- Uma contraordenação ambiental muito grave, pela violação das proibições estabelecidas no artigo 5.º, al. b), e 25º, nº 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 153/2003, e 22º, nº 4, al. b), da Lei 50/2006, na coima de € 24.000,00;
- Uma contraordenação ambiental muito grave, pela inexistência de garantia financeira obrigatória válida e em vigor, quando a sua constituição seja exigível nos termos do artigo 22º, do Decreto-Lei nº 147/2008, de 29 de julho, p.e p. pelo n.º 1 do artigo 22º, e alínea f), do n.º 1, do artigo 26º, do Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de julho, e do artigo 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006, na coima de €24.000,00; e
- Uma contraordenação ambiental grave, pelo não cumprimento da obrigação de reunir, manter disponível e disponibilizar a informação, nos termos do artigo 36º, do Regulamento (CE) n.º 1907/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, e alínea u), do n.º 2, do artigo 11º, do Decreto-Lei nº 293/2009, de 13 de outubro, na coima de €12.000,00.
- Em cúmulo jurídico, na coima única de €50.000,00.
*
Por sentença datada de 13.12.2022, proferida no âmbito de processo de impugnação judicial da referida decisão administrativa, decidiu-se:
- Condenar a arguida pela prática, em 04.01.2017, da contraordenação ambiental muito grave do artigo 5º, al. b), e 25º, n.º 1, al. a), do D. Lei 153/2003, na coima parcelar de €15.000,00;
- Condenar a arguida pela prática, em 04.01.2017, da contraordenação ambiental muito grave dos artigos 22º e 26º, n.º 1, al. f), do Decreto- Lei 147/2008, e do artigo 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006, na coima parcelar de €13.000,00; e
- Condenar a arguida pela prática, em 04.01.2017, de uma contraordenação ambiental grave do artigo 11º, n.º 2, al. u), do Decreto-Lei 293/2009, e 22º, n.º 3, al. b), da Lei 50/2006, e do artigo 36º, do Regulamento CE 1907/2006, na coima parcelar de € 6.500,00.
- Em cúmulo, condenar a arguida na coima única de €22.500,00, nos termos do artigo 27º, da Lei 50/2006.
* Recurso da decisão
Inconformada, a “A, Lda.” interpôs recurso da decisão judicial, tendo extraído da sua motivação as seguintes CONCLUSÕES (que transcrevemos): 1. O presente recurso tem como objeto a matéria de direito da sentença proferida nos presentes autos, a qual condenou a arguida numa coima única de €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros), nos termos do artigo 27º da Lei 50/2006. 2. Salvo o devido respeito por opinião contrária, tal solução apresenta-se no mínimo violadora dos mais elementares princípios de direito. 3. O tribunal a quo deu, designadamente, como provado que: - Que no dia 04/01/2017, pelas 09h35m, a Policia de Segurança Ambiental de Lisboa realizou uma ação de fiscalização a oficina auto, no local sito Rua ...Amadora, da responsabilidade de A, Lda, NIPC ..., com morada na Rua ...Amadora. - Encontrava-se no local, o Srº B, o qual se apresentou na qualidade de sócio gerente da exploradora do espaço, acompanhando a ação em referência, tendo sido verificado que no interior da referida oficina se encontravam resíduos ali produzidos, classificados pela Lista Europeia de Resíduos ( LER ), publicada pela decisão 2014/955/EU, da Comissão, de 18 de Dezembro, que inequivocamente demonstram a atividade desenvolvida. - A arguida desenvolve a sua atividade naquele espaço, há cerca de trinta anos, e a deposição dos resíduos é executada no interior das instalações, numa divisão para o efeito e apesar da existência de alguns recipientes para a realização da separação de resíduos, nomeadamente óleos usados e pastilhas de travão ( LER 160112), essa ação era realizada com algumas deficiências, existindo misturas e derrames. - O armazenamento de óleo usado é realizado em dois recipientes de 200 litros, sendo que, um destes se encontrava sob uma bacia de retenção ao lado de um outro com óleo lubrificante novo, realçando-se que o análogo se encontrava diretamente no asfalto de cimento daquele estabelecimento, destacando-se o seu topo coberto pelo resíduo em questão, com escorrimentos e respetivos derrames no pavimento em questão. - Nesta zona de acondicionamento de resíduos , utilizada para a deposição de óleos usados e filtros de óleos e embalagens contaminadas, foi detetado que havia sido derramado resíduos de óleos usados, o qual havia inequivocamente escorrido para um ralo conectado à rede de esgotos/drenagem da edificação. - Acerca das medidas adotadas para minimização e contenção deste tipo de situação, a arguida possuía um pó/areia absorvente, próprios para o efeito. - A arguida possuía ainda um separador de hidrocarbonetos destinado a evitar a contaminação das águas ou do solo. - No seguimento da verificação das instalações físicas e demais condições de acondicionamento de resíduos, foram consultadas várias guias de acompanhamento de resíduos(GAR). - A empresa em questão encontra-se registada no SILIAmb- Sistema Integrado de Licenciamento do Ambiente, com o código APA00342823, tendo sido apresentado o MIRR- Mapa Integrado de Registo de Resíduos referente a 2015. - Considerando o exercício de uma atividade económica passível de causar danos ambientais ou ameaça, impede a obrigatoriedade de adotar garantias financeiras que permitam assumir a responsabilidade ambiental inerente daquela atividade. Assim foi solicitado comprovativo de garantia financeira de responsabilidade ambiental ( seguro ambiental, garantia bancária, fundos ambientais ou fundos próprios, tendo o visado informado desconhecer tal obrigação). - Ainda no decurso da ação de fiscalização, foram solicitadas as fichas de segurança (FDS), tendo a arguida informado que estas nunca tinham sido disponibilizadas pelos seus fornecedores. 4. A Recorrente não tem quaisquer antecedentes contraordenacionais, corrigiu todas as situações verificadas no momento da fiscalização, tem uma situação económica modesta. 5. Também não provocou nenhum dano ambiental, ao ecossistema e meio ambiente, nem obteve qualquer vantagem económica com a situação. 6. Aliás das três contraordenações em que a Arguida foi condenada, esta considera que a referente a contraordenação ambiental muito grave prevista no artigo 5º , al. b) e 25º, nº 1 , al. a) do Decreto-Lei 153/2003, não a praticou, entendendo com todo o respeito, que o Tribunal não interpretou devidamente a legislação aplicável ao caso concreto. 7. Entende a arguida que foram violados os artigos 2º, alíneas b) e c), 5º, alínea b), 6º, nº 1, 7º, nº1, 8º, nº 2, 9º, nº 1, 13º, nº 1 e 17, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 153/2003, que foram interpretados no sentido de que a Recorrente integra o conceito de operador de gestão de óleos usados, e que é aplicável ao caso subjudicie a norma do artigo 5º, alínea b) do Decreto- Lei nº 153/2003, quando a mesma não corresponde à verdade, a arguida faz a manutenção/reparação de veículos automóveis, e não a operação de gestão de óleos usados. 8. De igual modo, considera a arguida que o conceito de “ solo”, vertido no artº 5º, al. b), do Decreto- Lei nº 153/2003, de 11 de Julho, na redação dada pelo Decreto- Lei nº 73/2011, de 17 de Junho e no art.º 49º, nº 3, al. b) do Decreto -Lei nº 152-D/2017, de 11 de dezembro vai no sentido ecológico uma vez que estamos a tratar de ilícito ambiental. 9. Sendo o “ solo” que tinha o óleo derramado um material de construção- cimento- não estamos perante um ilícito contra o ambiente e, o solo, é aqui entendido como um dos componentes naturais do ambiente, como resulta da Lei de Bases do Ambiente- Artº 6º, da Lei nº 11/87, de 7 de Abril e agora artº 10º, da Lei nº 19/2014, de 14 de Abril. 10. Pelo que não estamos perante um facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima porque nos falta um dos elementos que dá origem à prática do ilícito. 11. Mas mesmo que tivesse existido um derrame de grandes dimensões, o que não foi o caso, o facto de a arguida possuidor um separador de hidrocarbonetos, evitaria qualquer risco de dano ambiental, equipamento cujo fim é mesmo esse. 12. Considera assim a arguida, que relativamente à primeira contraordenação, em que foi condenada pelo Tribunal, deve a mesma ser absolvida. 13. Quanto à condenação da arguida da prática da contraordenação ambiental muito grave, pela violação dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do Decreto -Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006, está provado nos autos que há erro sobre a ilicitude, pelo que a mesma deve ser absolvida. 14. Em relação à condenação da arguida pela prática de uma contraordenação ambiental grave, artº 11º, nº 2, al. u) do Decreto-Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006, considera esta que não praticou nenhum ilícito, e que existe uma violação do art.º 32, nº 1 da CRP, pois esta nunca foi notificada para entregar as fichas de segurança. Aliás o art.º 36º do regulamento CE 1907/2006, refere que as fichas devem ser disponibilizadas “sem demora”. 15. E o que se considera “sem demora”? Um mês, uma semana? O regulamento não exige que seja de imediato, pelo que para garantia da defesa, esta deveria ter sido notificada para entrega da documentação, pelo que neste caso a arguida considera que também deve ser absolvida. Nestes termos e nos demais de direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso, absolvendo a Recorrente Fazendo-se assim a habitual e necessária justiça.
* Resposta do Ministério Público
O Ministério Público respondeu ao recurso no sentido da sua improcedência, nos seguintes termos (que transcrevemos): Vem o Ministério Público, nos termos do disposto no art.º 413.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, responder à motivação do recurso interposto, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos. I - Do objecto e dos fundamentos do Recurso: Por sentença proferida em 13.12.2022, foi decidido não dar provimento parcial ao recurso de contraordenação apresentado pela Impugnante; e decidiu-se: A) Condenar a arguida A, Lda, pela prática em 4.01.2017 da contraordenação ambiental muito grave do artigo 5º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do D. Lei 153/2003, na coima parcelar de €15.000,00 (quinze mil euros); B) Condenar a arguida A, Lda, pela prática em 4.01.2017 da contraordenação ambiental muito grave dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do D. Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006, na coima parcelar de € 13.000,00 (treze mil euros); C) Condenar a arguida A, Lda, pela prática em 4.01.2017 de uma contraordenação ambiental grave do artigo 11º, nº 2, al. u) do D. Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006, na coima parcelar de €6.500,00 (seis mil e quinhentos euros); D) Condenar a arguida A, Lda, na coima única de €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros), nos termos do artigo 27º da Lei 50/2006. A impugnante recorreu desta decisão, no que respeita à matéria de direito, alegando, em súmula (das conclusões): - que não estão preenchidos os elementos do tipo legal que dão origem à prática do ilícito; pois que, o conceito de “solo” não é aplicável in casu; e bem assim refere que a arguida faz a manutenção/reparação de veículos automóveis, e não a operação de gestão de óleos usados. - existir erro sobre a ilicitude quanto à condenação da arguida da prática da contraordenação ambiental muito grave, pela violação dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do Decreto-Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº4, al. b) da Lei 50/2006, razão pela qual devia ser absolvida; - inexistir a violação do art.º 11º, nº 2, al. u) do Decreto-Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006, pois nunca foi notificada para entregar as fichas de segurança e para além disso o art.º 36º do regulamento CE 1907/2006, refere que as fichas devem ser disponibilizadas “sem demora”, não estipulando um prazo. Ora, O Ministério Público, diverge da opinião do recorrente considerando ser correcta e fundamentada a douta decisão proferida, não merecendo a mesma qualquer reparo e não assistindo qualquer razão à recorrente/impugante. Senão, veja-se: II- Contra-motivação: A recorrente não coloca em crise a matéria de facto dada como provada, apenas discorda da interpretação que é feita da mesma e do direito aplicável. E escalpelizando os seus argumentos: i) que não estão preenchidos os elementos do tipo legal que dão origem à prática do ilícito; pois que, o conceito de “solo” não é aplicável in casu; e bem assim refere que a arguida faz a manutenção/reparação de veículos automóveis, e não a operação de gestão de óleos usados. Talqualmente é referido em sede de sentença provado que ficaram os factos constantes dos artigos 5.º a 15.º, 23; ao atuar do modo descrito, incorreu a impugnante na prática do ilícito previsto nos termos do art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 153/2003, de 11/07, alterado pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/06, o que constitui contraordenação ambiental muito grave, punível nos termos da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, alterada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de agosto, e retificada pela Declaração de Retificação n.º 70/2009, de 1 de outubro. Pois que, efectivamente, procedeu mesmo a impugnante à descarga directa dos resíduos para a rede de esgotos. Mostrando-se verificados todos os elementos do tipo. Mais, sobre o conceito de solo vertido no art.º 5.º, al. b) do Decreto-Lei n.º 153/2003, de 11 de julho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de junho e no art.º 49º, n.º 3) al. b) do Decreto-Lei n.º 152-D/2017) de 11 de Dezembro, não há dúvidas que este é interpretado no sentido ecológico uma vez que estamos a tratar de ilícito ambiental, não fazendo sentido a alegação da recorrente. ii) existir erro sobre a ilicitude quanto à condenação da arguida da prática da contraordenação ambiental muito grave, pela violação dos artigos 22º e 26º, nº1, al. f) do Decreto -Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº4, al. b) da Lei 50/2006, razão pela qual devia ser absolvida; Não existe qualquer menção a um erro sobre a ilicitude, na decisão ora recorrida. Existe sim é uma menção a uma completa incúria sobre as responsabilidades ambientais; o que não afasta o preenchimento da contraordenação imputada, pois que a sua imputação subjectiva sempre será a título negligente; talqualmente resulta da douta sentença ora recorrida. iii) inexistir a violação do artº 11º, nº 2, al. u) do Decreto-Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006, pois nunca foi notificada para entregar as fichas de segurança e para além disso o art.º 36º do regulamento CE 1907/2006, refere que as fichas devem ser disponibilizadas “sem demora”, não estipulando um prazo. Conforme resulta da matéria de facto, ficou não provado que: A recorrente dispunha das fichas de segurança solicitadas e apenas não foi possível localizá-las de imediato por o gerente se encontrar sozinho, sem que lhe tivesse sido dada a oportunidade de apresentar tais documentos em momento ulterior. E provado que: Ainda no decurso da ação de fiscalização, foi detectado no interior das instalações, várias embalagens contendo produtos/substâncias perigosas, identificáveis através dos respetivos pictogramas de perigo apresentados na sua rotulagem, as quais são utilizadas/manuseadas pelos funcionários diariamente e no âmbito profissional, pelo que, foram solicitadas as devidas fichas de dados de segurança (FDS), que lhe permitam tomas as medidas necessárias para protegerem a saúde e o ambiente e garantir a segurança no local de trabalho, tendo o Sr. Binformado não possuir nenhuma nas suas instalações, alegando nunca terem sido disponibilizadas pelos seus fornecedores, nem tão pouco as solicitado. Sendo assim evidente, que a recorrente não dispunha das informações devidas relativas às fichas de dados de segurança dos produtos e substâncias perigosas que utilizava e que detinha no seu estabelecimento, incorrendo na prática de uma contraordenação grave do artigo 11º, nº 2, al. u) do D. Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006. Ademais, resultando dos autos que a mesma nem sequer conservava a informação exigível, não teria que ser instada ao efeito (de algo que não tinha sequer), já que, o que lhe era exigível era que tivesse disponibilizando essas fichas quando lhe foi solicitado, o que não fez. III – Conclusão: Entendemos assim que deve a decisão recorrida ser integralmente confirmada, face ao enquadramento factual nela vertido e à realizada valoração e análise crítica da prova, fazendo o devido enquadramento jurídico e correcta aplicação do direito. Vossas Excelências, porém, decidirão como for de JUSTIÇA!
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O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
* Parecer do Ministério Público junto da Relação
Subidos os autos a este Tribunal da Relação, ao abrigo do disposto no art.º 416°, do CPP, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto juntou o seguinte PARECER (que transcrevemos): A sociedade comercial A, Lda., inconformada com a decisão administrativa proferida pela Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território que a condenou pela prática de, e citamos: a) Uma contraordenação ambiental muito grave, consubstanciada na violação das proibições estabelecidas e p.p. nos artigos 5.º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 153/2003 de 11 de julho; b) Uma contraordenação ambiental muito grave, consubstanciada na inexistência de garantia financeira obrigatória válida e em vigor, p.p. pelos artigos 22º e 26.º, n.º 1, alínea f) do Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de julho. c) Uma contraordenação ambiental grave, fundada no não cumprimento da obrigação de reunir, manter disponível e disponibilizar informação nos termos do artigo 36.º do Regulamento (CE) nº 1907/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, p.p. pelo artigo 22.º, n.º 2, alínea u) do DL n.º 293/2009. Veio a interpor recurso da referida decisão para o Tribunal Judicial da Amadora, Comarca de Lisboa Oeste. A decisão sobre tal recurso viria a ser proferida em 13 de dezembro de 2022, ali se decidindo confirmar a condenação da sociedade arguida pela prática das três contraordenações que lhe eram imputadas pela autoridade administrativa tendo sido, contudo, reduzido o montante das coimas aplicadas por cada uma delas, agora fixadas em 15.000, 13.000 e 6.500€, respetivamente, sendo fixado, em cúmulo jurídico, a coima única de 22.500€. É de tal decisão que vem interposto o presente recurso pela sociedade arguida. No que concerne à verificação da primeira infração imputada, assinale-se que a condenação se operou por força do facto provado identificado sob o n.º 5, e não em face da verificação de derrames de óleos usados no cimento do chão da oficina pertencente à sociedade arguida. Admitindo-se perfeitamente que se tratou de um mero acidente, e ponderada a quantidade de matéria poluente que foi vertida na rede de esgotos. de que se faz aliás eco a decisão recorrida, ter- se-ia por mais adequada a condenação da arguida numa coima correspondente ao mínimo legal. No que concerne à segunda infração imputada, a condenação operou-se por força da conjugação dos factos provados sob os n.ºs 16, 17 e 18. Ora, mesmo que se sufrague a tese do recorrente de que os factos assim descritos configuram um erro sobre a ilicitude do facto em que incorreu o responsável pela pessoa coletiva – cf. Conclusão 13.ª –, é evidente que esse erro não exclui a ilicitude da conduta omissiva prosseguida. Ao invés, e não podendo deixar de reputar tal erro como censurável, dado que o agente estava obrigado a conhecer a existência da obrigação em causa por força do exercício da sua atividade profissional, a verificação desse erro implica somente a punição do agente com uma pena que pode ser especialmente atenuada, nos termos do n.º 2, do artigo 9.º, do DL n.º 433/82 de 27 de outubro. Termos em que a coima em concreto aplicada, não merece, neste particular, qualquer censura, ponderados os valores mínimos e máximos para ela fixados. No que concerne à terceira infração pela qual a arguida foi condenada, não subscrevemos o teor das conclusões 14.ª e 15.ª da motivação de recurso. A norma regulamentar exige que a apresentação das fichas relativas aos dados de segurança dos produtos e substâncias perigosas que eram utilizados e que se detinham na oficina da sociedade arguida, a pedido dos inspetores, seja realizada sem demora o que, não sendo necessariamente equivalente a de imediato sublinha, de forma que se tem por clara, o carácter de urgência com que as mesmas devem ser facultadas aqueles. Salvo o devido respeito por diferente opinião, subscreve-se o entendimento que a expressão utilizada na norma regulamentar em questão não se compadece com a possibilidade de o cumprimento da referida obrigação poder vir a ocorrer em momento ulterior à realização da ação inspetiva, incumbindo ainda aos inspetores fixar o prazo em que a mesma deve ser cumprida. Se assim fosse a norma di-lo-ia expressamente, e não o faz. Nestes termos, a interpretação oferecida pelo recorrente não nos merece dever merecer acolhimento, não sendo também passível de censura o montante da coima correspondente que foi fixado na decisão recorrida. Termos em que acompanhando o teor da resposta oferecida pelo Exa. Colega na 1.ª Instância, se entenda que o recurso não merece provimento, à exceção da circunstância atrás assinalada que poderia justificar a aplicação de uma coima correspondente ao mínimo legal no que diz respeito à primeira das contraordenações em que a sociedade arguida foi condenada.
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Cumprido o disposto no art.º 417º, n.º 2, do CPP, não foi apresentada resposta.
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Após exame preliminar e colhidos os Vistos, realizou-se a conferência, cumprindo agora apreciar e decidir, nos termos resultantes do labor da conferência.
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II. FUNDAMENTAÇÃO A delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sendo essas que balizam os limites do poder cognitivo do tribunal superior, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como ocorre por exemplo com os vícios previstos nos artigos 410º, n.º 2, ou 379º, n.º 1, ambos do CPP (cfr. art.ºs 412º, n.º 1, e 417º, n.º 3, ambos do CPP).
Posto isto, passamos a delimitar o thema decidendum, que o mesmo é dizer a elencar as questões colocadas à apreciação deste tribunal, pela ordem em que foram invocadas:
1. Quanto à contraordenação de “descarga de óleos usados no solo” prevista nos artigos 5º, al. b), e 25º, n.ºs 1, al. a), e 4 do Decreto-Lei 153/2003, na redação do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/06, saber se a sociedade “A, Lda.” deve ser absolvida, por os factos dados como provados (e assentes) não preencherem os elementos objetivos .
2. Relativamente à contraordenação de “falta de constituição de garantia financeira”, prevista nos artigos 22º e 26º, n.º 1, al. f), do Decreto- Lei n.º 147/2008 e do artigo 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006, saber se a sociedade “A, Lda.” deve ser absolvida, por se verificar uma situação de erro sobre a ilicitude não censurável.
3. No que concerne à contraordenação de “falta das informações devidas relativas às fichas de dados de segurança dos produtos e substâncias perigosas que utilizava e que detinha no seu estabelecimento”, prevista nos artigos 11º, n.º 2, al. u), do Decreto-Lei n.º 293/2009, 22º, n.º 3, al. b), da Lei 50/2006, e 36º do Regulamento CE 1907/2006, saber se os direitos de defesa da sociedade “A, Lda.” foram violados, por falta de concessão de um prazo para a apresentação das referidas fichas de dados.
* A Decisão Recorrida:
A decisão recorrida tem o seguinte teor (que se transcreve parcialmente, nas partes mais relevantes): I- Relatório: A, Lda, com sede Rua ...Funcheira, inconformada com a decisão administrativa proferida pela Inspecção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território que a condenou pela prática de: - Uma contraordenação ambiental muito grave, a violação das proibições estabelecidas no artigo 5.º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 153/2003 e 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006, na coima de €24.000,00; - Uma contraordenação ambiental muito grave, a inexistência de garantia financeira obrigatória válida e em vigor, quando a sua constituição seja exigível nos termos do artigo 22º do Decreto-Lei nº 147 /2008, de 29 de julho, p.p. pelo nº 1 do artigo 22º e alínea f) do nº 1 do artigo 26º do Decreto-Lei n.2 147 /2008, de 29 de julho e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006, na coima de € 24.000,00; - Uma contraordenação ambiental grave, o não cumprimento da obrigação de reunir, manter disponível e disponibilizar a informação, nos termos do artigo 36º do Regulamento (CE) nº 1907/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, e alínea u) do nº 2 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 293/2009, de 13 de outubro, na coima de €12.000,00. E em cúmulo jurídico na coima única de €50.000,00. Da mesma veio interpor recurso (…) II- Fundamentação: Com relevo à boa decisão da causa, são os seguintes os factos que o tribunal dá como A) Provados: 1º No dia 04/01/2017, das 09h35m, a Polícia de Segurança Ambiental de Lisboa realizou uma acção de fiscalização a oficina auto, no local sito Rua ...Amadora, da responsabilidade de A, Lda. (doravante, Arguida), NIPC 502462957, com morada na Rua ...Amadora. 2º O estabelecimento em causa, encontrava-se aberto ao público, desenvolvendo a atividade de manutenção e reparação de veículos automóveis (CEA 45200), encontrando-se na altura a aguardar ou em reparação várias viaturas. 3º Encontrava-se no local, o Sr. B, o qual se apresentou na qualidade de sócio gerente da exploradora do espaço, acompanhando a acção em referência, tendo sido verificado que no interior da referida oficina se encontravam resíduos ali produzidos, classificados pela Lista Europeia de Resíduos (LER), publicada pela Decisão 2014/955/EU, da Comissão, de 18 de dezembro, que inequívocamente demonstram a actividade desenvolvida. 4º Porquanto ao desenvolvimento da actividade naquele espaço, o explorador referiu encontrar-se ali há cerca de trinta anos. 5º A deposição dos resíduos é executada no interior das instalações, numa divisão para o efeito e apesar da existência de alguns recipientes para a realização da separação de resíduos, nomeadamente óleos usados e pastilhas de travão (LER 160112), essa ação era realizada com algumas deficiências, existindo misturas e derrames. 6º O armazenamento de óleo usado é realizado em dois recipientes de 200 litros, sendo que, um destes se encontrava sob uma bacia de retenção ao lado de um outro com óleo lubrificante novo, realçando-se que o análogo se encontrava colocado diretamente no asfalto de cimento daquele estabelecimento, destacando-se o seu topo coberto pelo resíduo em questão, com escorrimentos e respectivos derrames no pavimento em questão. 7º Encontravam-se ainda em cima da bacia de retenção e caídos no pavimento, várias embalagens de plástico contaminado {LER 150110*}, os quais apesar de resíduos perigosos, não tinham local adequado para a sua contentorização. 8º Nesta zona de acondicionamento de resíduos, utilizada para a deposição de óleos usados e filtros de óleos e embalagens contaminadas, foi detectado que havia sido derramado resíduos de óleos usados, o qual havia inequivocamente escorrido para um ralo conectado à rede de esgotos/drenagem da edificação. 9º Acerca das medidas adotadas para minimização e contenção deste tipo de situação, a arguida possuía um pó/areia absorvente, próprios para o efeito. 10º A arguida possuía ainda um separador de hidrocarbonetos destinado a evitar a contaminação das águas ou do solo. 11º Numa outra parte daquele local, encontrava-se um amontoado de resíduos, compostos por plástico contaminado com óleo usado/liquido anticongelante (proteção de carter de motor, tubos em plástico do sistema de refrigeração), amortecedores (L~R 160121 *) e metal ferroso, sem qualquer contenção. 12º Também ali se encontravam motores sem qualquer tipo de descontaminação, colocados sobre uma palete de madeira, sem qualquer outra contenção adequada. 13º Verifica-se a existência de um local de armazenagem preliminar, especialmente de resíduos perigosos, nas condições mencionadas anteriormente, conjugando-se com a ausência de manuseamento e de procedimentos adequados, no sentido de minimizar e precaver qualquer tipo de dano para o ambiente nem para a saúde humana e de forma a evitar a possibilidade de derrame, incêndio e explosão. 14º Os recipientes verificados/apresentados, não dispunham, de qualquer identificação/rotulação com o tipo de resíduo, para melhor reconhecimento. 15º No seguimento da verificação das instalações físicas e demais condições de acondicionamento de resíduos, foram consultadas várias guias de acompanhamento de resíduos (GAR). 16º A empresa em questão encontrava-se registada no SILIAmb - Sistema Integrado de Licenciamento do Ambiente, com o código APA00342823, tendo sido apresentado o MIRR - Mapa Integrado de Registo de Resíduos referente a 2015. 17º Considerando o exercício de uma actividade económica passível de causar danos ambientais ou ameaça, impende a obrigatoriedade de adoptar garantias financeiras que permitam assumir a responsabilidade ambiental inerente daquela actividade. Assim foi solicitado comprovativo de garantia financeira de responsabilidade ambiental (seguro ambiental; garantia bancária; fundos ambientais ou fundos próprios, tendo o visado informado desconhecer tal obrigação). 18º Verifica-se que desde a aplicabilidade da obrigatoriedade em menção, a empresa exploradora não promoveu à realização de qualquer garantia. 19º Ainda no decurso da ação de fiscalização, foi detectado no interior das instalações, várias embalagens contendo produtos/substâncias perigosas, identificáveis através dos respetivos pictogramas de perigo apresentados na sua rotulagem, as quais são utilizadas/manuseadas pelos funcionários diariamente e no âmbito profissional, pelo que, foram solicitadas as devidas fichas de dados de segurança (FDS), que lhe permitam tomas as medidas necessárias para protegerem a saúde e o ambiente e garantir a segurança no local de trabalho, tendo o Sr. B informado não possuir nenhuma nas suas instalações, alegando nunca terem sido disponibilizadas pelos seus fornecedores, nem tão pouco as solicitado. 20º Considerando que naquele local é vendido aos clientes, óleos lubrificantes novos, aquando da realização de renovações/mudanças de óleos nas viaturas automóveis, no estabelecimento, tanto na entrada principal, assim como na zona de receção (locais acessíveis ao público em geral), apesar de se encontrarem afixados alguns avisos informativos, a ausência de algum aposto de forma visível, que informasse os clientes sobre os métodos adotados para a recolha de óleos usados. 21º No interior do espaço, oficina e zona de parqueamento também não existia qualquer aviso alusivo a essa obrigação. 22º Questionado acerca da sua inexistência, o Sr. B corroborou a sua ausência efetiva, não indicando qualquer outro local onde tal informação pudesse encontrar-se, acrescentando que logo que possível iria colmatar essa falta. 23º A Arguida não desenvolveu os esforços necessários, como produtora de resíduos, a fim de garantir o seu correcto armazenamento preliminar, evitando efeitos graves sobre o ambiente, devendo efetuar desde logo a sua separação por fluxos e fileiras, acondicionando-os corretamente em recipientes adequados e estanques, evitando derrames e a contaminação por outros resíduos perigosos, tendo em consideração a sua valorização. 24º A Arguida exerce conduta regulada por lei, pelo que tinha obrigação de conhecer e cumprir com o ali prescrito para o exercício da mesma, in casu o Decreto-Lei n.º 153/2003, de 11 de julho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de junho, o Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de julho. e o Regulamento (CE) n.º 1907 /2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro, conjugado com o Decreto-Lei n.º 293/2009, de 13 de outubro. 25º Não o tendo feito, não agiu com a diligência necessária e de que era capaz, não resultando dos autos elementos que retirem ilicitude aos factos ou censurabilidade à sua conduta. 26º Actualmente a empresa arguida possui nos seus quadros de pessoal um trabalhador. 27º Não lhe são conhecidas outras infracçãos ambientais desde a visita inspectiva. 28º Nos últimos três anos fiscais a sociedade arguida apresentou sempre resultados líquidos de exercício negativos, sendo no último no valor de: – €35,434,26 e um volume de negócios de €20.344,66. 29º A recorrente tem ainda dívidas à Segurança Social no valor de cerca de €5.500. B) Factos não provados: Não resultaram provados os demais factos constantes da impugnação e os que se mostram em contradição com os supra dados como provados. Assim, com relevo para a causa, não se provou, designadamente que: - A recorrente dispunha das fichas de segurança solicitadas e apenas não foi possível localizá-las de imediato por o gerente se encontrar sozinha, sem que lhe tivesse sido dada a oportunidade de apresentar tais documentos em momento ulterior. C) Motivação: (…) III- O Direito: Da contra-ordenação ambiental muito grave do artigo 5º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do D. Lei 153/2003: Estabelece o art.º 5.º do Decreto-Lei n." 153/2003, de 11/07, alterado pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/06, na sua alínea b), que: "Sem prejuízo do cumprimento de outras disposições legais aplicáveis, é expressamente proibido: (…) Qualquer depósito e ou descarga de óleos usados no solo, assim como qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados". Nos termos do art.º 25.º do mesmo diploma legal, "constitui contraordenação ambiental muito grave, punível nos termos da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, alterada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de agosto, e retificada pela Declaração de Retificação n.º 70/2009, de 1 de outubro, a prática dos seguintes atas: (…) A violação das proibições estabelecidas no artigo 5.º, n.º 1, alínea a). Nos termos do n.º 4, "a tentativa e a negligência são puníveis". Por seu turno, dispõe o art.º 21.º da Lei n.º 50/2006, de 29/08, na redação do Decreto-Lei n.º 42-A/2016, de 12/08, aplicável, que "para determinação da coima aplicável e tendo em conta a relevância dos direitos e interesses violados, as contraordenações classificam-se em leves, graves e muito graves". Nos termos do art.º 22.º do mesmo diploma, "a cada escalão classificativo de gravidade das contraordenações corresponde uma coima variável consoante seja aplicada a uma pessoa singular ou coletiva e em função do grau de culpa, salvo o disposto no artigo seguinte" - n.º 1 -, sendo que, "às contraordenações muito graves correspondem as seguintes coimas: (…) Se praticadas por pessoas coletivas, de (euro) 24.000 a (euro) 144.000 em caso de negligência e de (euro) 240.000 a (euro) 5.000.000 em caso de dolo - n.º 4, alínea b). Da conjugação das disposições transcritas, flui que constituem elementos objetivos da contraordenação ora em apreço, cujo cometimento vem imputado à arguida/recorrente: a) depósito e ou descarga; b) de óleos usados; c) no solo, e/ou, d) qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados. No que concerne ao elemento subjectivo do tipo, pode o ilícito ser praticado a título doloso ou negligente. Revertendo à factualidade cujo apuramento se logrou (e sendo por demais evidente a não subsunção daquela à modalidade da conduta reportada a qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados, posto que a arguida não efetua operações de gestão de resíduos, apenas o seu armazenamento), patenteia-se ter havido descarga de óleos usados no solo. Dos factos apurados resulta a existência de umas manchas (pingos, escorrências) de óleo sobre o pavimento em cimento junto a um bidon, sendo certo que como decidido já pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 26 de junho de 2019 (disponível em www.dgsi.pt.processo n.º 5053/18.2T8LRS.L1-3). "o conceito de solo vertido no art. 5.º, al. b) do Decreto-Lei n.º 153/2003, de 11 de julho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de junho e no art.º 49º, n.º 3) al. b) do Decreto-Lei n.º 152-D/2017) de 11 de Dezembro vai no sentido ecológico uma vez que estamos a tratar de ilícito ambiental. O solo é um corpo de material não consolidado que cobre a superfície terrestre e é o resultado da erosão ou decomposição de rochas por meio calor, ação de seres vivos) tais como bactérias e fungos. Para um engenheiro agrónomo o solo é a camada na qual se pode desenvolver vida vegetal e animal. Para um engenheiro civil sob o ponto de vista da mecânica dos solos) solo é um corpo possível de ser escavado) sendo utilizado dessa forma como suporte para construções ou material de construção. Para um biólogo (através da ecologia e da pedologia) o solo interfere com o ciclo bioquímico dos nutrientes minerais e determina os diferentes ecossistemas e habitats dos seres vivos. Para o legislador há de ser algo poroso que possa alimentar árvores de fruto, vida ou deixar escoar para veios de água o que nele é vertido. Sendo o "solo" que tinha o óleo derramado um material de construção – cimento não estamos perante um ilícito contra o ambiente e, o solo, é aqui entendido como um dos componentes naturais do ambiente, como resulta da Lei de Bases do Ambiente - art.º 6.º da Lei n.º 11/87, de 7 de Abril e agora do art.º 1.º da Lei n.º 19/2014, de 14 de Abril”. No entanto, apurou-se ainda que ocorreu uma descarga directa para a rede de esgotos pelo que não podem haver dúvidas quanto à afectação do ambiente nos limites compreendidos na norma em apreço, mesmo que a recorrente dispusesse naquela zona de um separador de hidrocarbonetos, já que a conduta contra-ordenacional sem tem como preenchida com a descarga de óleo usado. Assim, temos que a arguida, por incúria, violou as obrigações que lhe incumbiam enquanto produtora de resíduos perigosos, como o são os óleos usados. Nesta conformidade, é mister concluir, ante a materialidade fáctica apurada, que a mesma é subsumível, aos elementos objectivos do tipo contraordenacional imputado à arguida, pelo que assertiva foi a decisão administrativa. Da contra-ordençação ambiental muito grave dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do D. Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006. Exercendo a arguida uma actividade que utiliza e armazena substâncias perigosas (anexo III do D. Lei 147/2008) impunha-se que tivesse constituído uma garantia financeira destinada a assumir a responsabilidade ambiental, seja através de seguro, de garantias bancárias, da participação em fundos ambientais ou mediante a constituição de fundos próprios reservados para o efeito. Pese embora o argumento ora trazido aos autos, ainda que não demonstrado, certo é que o gerente da arguida desconhecia sequer tal obrigação legal como se apurou. Por isso também se mostra preenchida a contra-ordenação ambiental imputada. Por fim, A arguida não dispunha das informações devidas relativas às fichas de dados de segurança dos produtos e substâncias perigosas que utilizava e que detinha no seu estabelecimento, pelo que incorreu na prática de uma contraordenação grave do artigo 11º, nº 2, al. u) do D. Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006. A arguida desconhecia novamente tal obrigação legal, algo que não justifica a sua conduta, sendo que não conservava a informação exigível nem a apresentou ulteriormente, não tendo de ser instada ao efeito, já que a teria de manter disponibilizando a informação quando a mesma é solicitada, o que não cumpriu. Do exposto resulta que a decisão administrativa, condenando a arguida pela prática das contra-ordenações ambientais descritas, a título de negligência, é de manter. Vejamos agora a razoabilidade das coimas parcelares aplicadas e da coima única aplicada, atentos os critérios que para o efeito certamente se ponderaram. Importa cuidar e prevenir a preservação do ambiente, que é património de toda a comunidade, não apenas pela via sancionatória, mas também através de medidas pedagógicas, o que nem sempre sucede, aliás terá sito a pensar nas mesmas que o legislador introduziu a possibilidade de suspensão total ou parcial da aplicação da coima (artigo 20ºA da Lei 50/2006), algo que nem foi ponderado pela decisão administrativa, que optou por punir condutas com mais de cinco anos, de forma severa, desajustada, desproporcional (mesmo a atender à moldura do cúmulo das coimas) e insensata considerando os efeitos que uma coima no valor de € 50.000,00 teriam numa empresa das dimensões da da arguida, desatendendo-se à sua estrutura e capacidade económica. Nos termos do 2º artigo da Lei-quadro das contra-ordenações ambientais – Lei nº 50/06, dispõe-se que as contra-ordenações ambientais são reguladas pelo disposto naquela lei e, subsidiariamente, pelo regime geral das contra-ordenações. Por seu turno no artigo 20º da citada Lei, prescreve-se que: 1 - A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa do agente, da sua situação económica e dos benefícios obtidos com a prática do facto. 2—Na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a conduta anterior e posterior do agente e as exigências de prevenção. (..) Tal como decorre do texto legal – art.º 18º, n.º1, do RGCC –, na determinação da medida da coima, haverá também que considerar a gravidade da contra-ordenação. Quanto ao critério gravidade da contra-ordenação, como expressivamente refere Carneluti a propósito da aplicação e da adequação da pena ( - El Problema de La Pena (1947), 76.), mais não significa que o seguinte: «que um delito se considere mais ou menos grave não quer dizer outra coisa a não ser que deve ser mais ou menos gravemente punido, e vice-versa», o que se justifica a partir da constatação de que, em regra, existe uma relação directa entre a gravidade do facto e a quantificação da anti-socialidade, para além de que toda e qualquer sanção só cumpre eficazmente as suas finalidades de orientação de condutas e de eliminação das infracções, quando há proporcionalidade entre a gravidade do facto e a sanção. Por outro lado e como atrás se deixou consignado, a gravidade da contra-ordenação tout court depende do bem ou interesse que tutela e do benefício retirado e do resultado ou prejuízo causado pelo agente. No caso sub judicio estamos perante contra-ordenações punidas na forma negligente, uma qualificada como grave e duas como muito graves. Como é sabido, em matéria de ambiente, são prementes as necessidades de prevenção, dada a frequência e gravidade das violações à lei e das lesões produzidas, com destaque para as provocadas no mercado dos resíduos em que a sua gestão adequada contribui para a preservação dos recursos naturais, quer ao nível da Prevenção, quer através da Reciclagem e Valorização, além de outros instrumentos jurídicos específicos, constituindo simultaneamente o reflexo da importância deste sector, encarado nas suas vertentes, ambiental e como sector de actividade económica, e dos desafios que se colocam aos responsáveis pela execução das políticas e a todos os intervenientes na cadeia de gestão, desde a Administração Pública, passando pelos operadores económicos até aos cidadãos, em geral, enquanto produtores de resíduos e agentes indispensáveis da prossecução destas políticas. A necessidade de garantir a recolha de toda a informação relevante sobre o «ciclo de vida» dos resíduos determina a obrigatoriedade de realização de um registo de um conjunto de dados relativos à sua produção e gestão. Por outro lado, não resulta dos autos que a recorrida tenha sido já condenada pela prática de contra-ordenações ambientais. Decorreram quase seis anos desde as infracções, mantendo o agente boa conduta. Assim, considera o tribunal, contrariamente ao sustentado pela decisão administrativa, que, os apontados factores anteriores e posteriores aos factos e o tempo decorrido, apontam para uma imagem global de ilicitude e culpa diminuídas e de reduzida necessidade punitiva. Daí que se à data já não faria sentido suspender a aplicação da coima, afigura-se ser de atenuar especialmente a coima, o que implica a redução a metade quer nos limites mínimos, quer máximos, das molduras abstractas aplicáveis – artigo 23º-A, nºs 1 e 2, al. b) e 23º B da lei 50/2006 e 72º do CP. Assim, as contra-ordenações muito graves passam a ter uma moldura da coima entre €12.000,00 a €72.000,00 e a grave, uma moldura abstracta de €6.000,00 a €36,000,00. Tudo visto, reputa-se adequado, atento o grau de culpa da arguida e bem assim a sua situação económica e os demais factores do artigo 20º, nºs 1 e 2 da Lei 50/2006, fixar as coimas parcelares nos seguintes termos: Pela prática da contraordenação ambiental muito grave do artigo 5º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do D. Lei 153/2003 a coima parcelar de €15.000,00; Pela prática da contraordenação ambiental muito grave dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do D. Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006, a coima parcelar de €13.000,00; Pela prática da contraordenação ambiental grave do artigo 11º, nº 2, al. u) do D. Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006, a coima parcelar de €6.500,00. Em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 27º da Lei 50/2006, fixo a coima única em €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros). V- Decisão: Pelo exposto decido: A) Condenar a arguida A, Lda, pela prática em 4.01.2017 da contraordenação ambiental muito grave do artigo 5º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do D. Lei 153/2003, na coima parcelar de €15.000,00 (quinze mil euros); B) Condenar a arguida A, Lda, pela prática em 4.01.2017 da contraordenação ambiental muito grave dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do D. Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006, na coima parcelar de €13.000,00 (treze mil euros); C) Condenar a arguida A, Lda, pela prática em 4.01.2017 de uma contraordenação ambiental grave do artigo 11º, nº 2, al. u) do D. Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006, na coima parcelar de €6.500,00 (seis mil e quinhentos euros); D) Condenar a arguida A, Lda, na coima única de € 22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros), nos termos do artigo 27º da Lei 50/2006. (…)
* Da análise dos fundamentos do recurso:
1. Quanto à contraordenação de “descarga de óleos usados no solo” prevista nos artigos 5º, al. b), e 25º, n.ºs 1, al. a), e 4 do Decreto-Lei 153/2003, na redação do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/06, saber se a sociedade “A, Lda.” deve ser absolvida, por os factos dados como provados (e assentes) não preencherem os elementos objetivos.
Impõe-se realçar que a matéria de facto dada como provada está definitivamente assente, desde logo porque a mesma não pode ser impugnada, por força do disposto no art.º 75º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações (aprovado pelo Decreto-Lei 433/82, de 27.10), segundo o qual se o contrário não resultar deste diploma, a 2ª instância apenas conhecerá da matéria de direito…, funcionando o Tribunal da Relação como tribunal de revista.
Com especial relevo, no que à imputação objetiva dos factos respeita, deu-se como provado: 3º (…) tendo sido verificado que no interior da referida oficina se encontravam resíduos ali produzidos, classificados pela Lista Europeia de Resíduos (LER), publicada pela Decisão 2014/955/EU, da Comissão, de 18 de dezembro, que inequivocamente demonstram a actividade desenvolvida. 5º A deposição dos resíduos é executada no interior das instalações, numa divisão para o efeito e apesar da existência de alguns recipientes para a realização da separação de resíduos, nomeadamente óleos usados e pastilhas de travão (LER 160112), essa ação era realizada com algumas deficiências, existindo misturas e derrames. 6º O armazenamento de óleo usado é realizado em dois recipientes de 200 litros, sendo que, um destes se encontrava sob uma bacia de retenção ao lado de um outro com óleo lubrificante novo, realçando-se que o análogo se encontrava colocado diretamente no asfalto de cimento daquele estabelecimento, destacando-se o seu topo coberto pelo resíduo em questão, com escorrimentos e respectivos derrames no pavimento em questão. 8º (…) foi detectado que havia sido derramado resíduos de óleos usados, o qual havia inequivocamente escorrido para um ralo conectado à rede de esgotos/drenagem da edificação. 9º Acerca das medidas adotadas para minimização e contenção deste tipo de situação, a arguida possuía um pó/areia absorvente, próprios para o efeito. 10º A arguida possuía ainda um separador de hidrocarbonetos destinado a evitar a contaminação das águas ou do solo.
E refere-se na decisão recorrida, em sede de fundamentação de direito: Da contra-ordenação ambiental muito grave do artigo 5º, al. b) e 25º, nº 1, al. a) do D. Lei 153/2003: Estabelece o art.º 5.º do Decreto-Lei n." 153/2003, de 11/07, alterado pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/06, na sua alínea b), que: "Sem prejuízo do cumprimento de outras disposições legais aplicáveis, é expressamente proibido: (…) al. b) Qualquer depósito e ou descarga de óleos usados no solo, assim como qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados". Nos termos do art.º 25.º do mesmo diploma legal, "constitui contraordenação ambiental muito grave, punível nos termos da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, alterada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de agosto, e retificada pela Declaração de Retificação n.º 70/2009, de 1 de outubro, a prática dos seguintes atas: (…) A violação das proibições estabelecidas no artigo 5.º, n.º 1, alínea a). Nos termos do n.º 4, "a tentativa e a negligência são puníveis". (…) Da conjugação das disposições transcritas, flui que constituem elementos objetivos da contraordenação ora em apreço, cujo cometimento vem imputado à arguida/recorrente: a) depósito e ou descarga; b) de óleos usados; c) no solo, e/ou, d) qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados. (…) Revertendo à factualidade cujo apuramento se logrou (e sendo por demais evidente a não subsunção daquela à modalidade da conduta reportada a qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados, posto que a arguida não efetua operações de gestão de resíduos, apenas o seu armazenamento), patenteia-se ter havido descarga de óleos usados no solo. Dos factos apurados resulta a existência de umas manchas (pingos, escorrências) de óleo sobre o pavimento em cimento junto a um bidon, sendo certo que como decidido já pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 26 de junho de 2019 (disponível em www.dgsi.pt processo n.º 5053/18.2T8LRS.Ll-3). "o conceito de solo vertido no art.º 5.º, al. b) do Decreto-Lei n.º 153/2003, de 11 de julho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de junho e no art.º 49º, n.º 3) al. b) do Decreto-Lei n.º 152-D/2017) de 11 de Dezembro vai no sentido ecológico uma vez que estamos a tratar de ilícito ambiental. O solo é um corpo de material não consolidado que cobre a superfície terrestre e é o resultado da erosão ou decomposição de rochas por meio calor, ação de seres vivos) tais como bactérias e fungos. Para um engenheiro agrónomo o solo é a camada na qual se pode desenvolver vida vegetal e animal. Para um engenheiro civil sob o ponto de vista da mecânica dos solos) solo é um corpo possível de ser escavado) sendo utilizado dessa forma como suporte para construções ou material de construção. Para um biólogo (através da ecologia e da pedologia) o solo interfere com o ciclo bioquímico dos nutrientes minerais e determina os diferentes ecossistemas e habitats dos seres vivos. Para o legislador há de ser algo poroso que possa alimentar árvores de fruto, vida ou deixar escoar para veios de água o que nele é vertido. Sendo o "solo" que tinha o óleo derramado um material de construção – cimento não estamos perante um ilícito contra o ambiente e, o solo, é aqui entendido como um dos componentes naturais do ambiente, como resulta da Lei de Bases do Ambiente - art.º 6.º da Lei n.º 11/87, de 7 de Abril e agora do art.º 1.º da Lei n.º 19/2014, de 14 de Abril”. No entanto, apurou-se ainda que ocorreu uma descarga directa para a rede de esgotos pelo que não podem haver dúvidas quanto à afectação do ambiente nos limites compreendidos na norma em apreço, mesmo que a recorrente dispusesse naquela zona de um separador de hidrocarbonetos, já que a conduta contra-ordenacional sem tem como preenchida com a descarga de óleo usado. Assim, temos que a arguida, por incúria, violou as obrigações que lhe incumbiam enquanto produtora de resíduos perigosos, como o são os óleos usados. Nesta conformidade, é mister concluir, ante a materialidade fáctica apurada, que a mesma é subsumível, aos elementos objectivos do tipo contraordenacional imputado à arguida, pelo que assertiva foi a decisão administrativa.
Entendemos que a razão está do lado da Recorrente.
De facto, os factos dados como provados não permitem o preenchimento dos elementos objetivos da contraordenação imputada prevista na alínea b), do art.º 5º, do Decreto-Lei 153/2003, de 11 de julho, desde logo por não estar comprovada a existência de derrame de óleos usados e/ou dos seus resíduos no solo -este entendido no termo ecológico-, mas antes na rede de esgotos/nas águas residuais, o que não faz parte do tipo objetivo da concreta contraordenação imputada.
Se não vejamos.
O Decreto-Lei 153/2003, de 11 de julho, referente ao “ Regime Jurídico da Gestão de Óleos Usados”, dispõe, no seu art.º 5º, epigrafado “proibições”, al. b), que é proibido qualquer depósito e ou descarga de óleos usados no solo, assim como qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados, norma cuja violação é cominada como uma contraordenação ambiental muito grave (art.º 25º, do mesmo diploma legal).
A decisão recorrida afastou a aplicabilidade do trecho do dispositivo “assim como qualquer descarga não controlada de resíduos resultantes das operações de gestão de óleos usados”,por a arguida não efetuar operações de gestão de resíduos, apenas o seu armazenamento.
Mais considerou patentear-se “ter havido descarga de óleos usados no solo”, remetendo para o trechoonde se proíbe “qualquer depósito e ou descarga de óleos usados no solo”.
De seguida a decisão recorrida dá nota de que a expressão “solo” tem de ser interpretada no seu sentido ecológico -como algo poroso que possa alimentar árvores de fruto, vida, ou deixar escoar para veios de água o que nele é vertido (o que nos parece demasiado óbvio e quanto a esta parte não parece haver dissensos entre a Recorrente, o Ministério Púbico e a decisão recorrida)- e não como sinónimo de “chão”, e muito menos de “pavimento”, ademais impermeável, sendo que o pavimento da oficina da Recorrente era em asfalto de cimento, material que não permite a passagem dos óleos ou dos seus resíduos até ao solo, este no sentido referido.
Conclui a decisão recorrida, embora implicitamente, que não houve derrame de óleos usados no “solo”, com o sentido que lhe foi dado.
Porém, logo de seguida refere “que ocorreu uma descarga directa para a rede de esgotos pelo que não podem haver dúvidas quanto à afectação do ambiente nos limites compreendidos na norma em apreço, mesmo que a recorrente dispusesse naquela zona de um separador de hidrocarbonetos, já que a conduta contra-ordenacional sem tem como preenchida com a descarga de óleo usado”.
Dando, assim, “um salto” da “descarga “no solo” para uma descarga “nas águas residuais da rede de esgotos” e considerando verificar-se (ainda) a afetação do ambiente nos limites compreendidos na norma em apreço.
Porém, a sociedade arguida foi acusada de fazer descarga no “solo”, e não descarga “nas águas”.
E a citada alínea b), do art.º 5, tem como elemento objetivo da contraordenação a descarga “no solo”, e não a descarga “nas águas”.
Dito de outro modo, o que a norma pune é a descarga “no solo”, no seu sentido ecológico mencionado, e não a “descarga na rede de esgotos”, que o mesmo é dizer nos sistemas de drenagem das águas residuais.
Ou seja, a decisão recorrida puniu a Recorrente por uma conduta objetiva que não consta na previsão do dispositivo legal aplicado.
A decisão recorrida fez uma interpretação extensiva do normativo legal aplicado, o que não é permitido pelo art.º 2º, do Regime Geral das Contraordenações (RGCO), que consagra o princípio da legalidade, e dentro deste o da tipicidade, e onde se estabelece que “ só será punido como contraordenação o facto descrito e declarado passível de coima por lei anterior ao momento da sua prática”, em resultado do que uma norma incriminadora de uma contraordenação não admite interpretações extensivas, nem tão pouco por analogia, devendo a punibilidade estar delimitada por um quadro que, embora passível de interpretação, não pode exorbitar os sentidos literais possíveis.
Ora, “o solo”, no seu sentido ecológico, não pode ser entendido como “águas residuais” ou “rede de esgotos”.
Ao interpretar “solo” como “águas residuais” a decisão recorrida ofendeu o princípio da tipicidade, nos termos sobreditos, por ter realizado uma interpretação extensiva, que a lei veda também em matéria contraordenacional.
É certo que o mesmo art.º 5º, desta feita na alínea a), também se proíbe a descarga de óleos usados nos sistemas de drenagem, individuais ou coletivos, de águas residuais.
Porém, por um lado, não foi esta a conduta típica imputada à arguida, quer na decisão administrativa, quer na decisão recorrida.
Por outro lado, dos factos dados como provados, para além dos derrames de óleos usados no pavimento de asfalto de cimento da oficina, consta apenas em 8º da materialidade provada a verificação de derrame de resíduos de óleos usados que haviam escorrido para um ralo conectado à rede de esgotos/drenagem da edificação, sendo que dos pontos 9º e 10º desses mesmos factos consta que a arguida possuía pó/areia absorvente e um separador de hidrocarbonetos destinados a evitar a contaminação das águas.
A função de um separador de hidrocarbonetos é a remoção dos referidos hidrocarbonetos existentes nos óleos usados das águas contaminadas, resultando desse processo, que a água passa a ficar descontaminada.
Existem vários tipos de separadores de hidrocarbonetos, admitindo-se que possam ter eficácia também distinta.
Ora, no caso em apreço nada se apurou quanto à potencialidade de o dito separador ter permitido reter os resíduos de óleos usados que escorreram para o sistema de esgotos superficial, não podendo ser afirmado, como o foi na decisão recorrida, por constituir mera especulação, que o separador de hidrocarbonetos não consegue reter a 100% os produtos contaminantes.
Como quer que seja, como já se afirmou, nunca a arguida foi confrontada com a possibilidade desta imputação contraordenacional e de dela se defender.
Nesta sequência, impõe-se absolver a Recorrente da imputação da prática da contraordenação ambiental de “descarga de óleos usados no solo” prevista nos artigos 5º, al. b), e 25º, n.ºs 1, al. a), e 4 do Decreto-Lei 153/2003, na redação do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17/06. Termos em que procede o recurso, neste segmento.
2. Relativamente à contraordenação de “falta de constituição de garantia financeira”, prevista nos artigos 22º e 26º, n.º 1, al. f), do Decreto- Lei n.º 147/2008 e do artigo 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006, saber se a sociedade “A, Lda.” deve ser absolvida, por se verificar uma situação de erro sobre a ilicitude não censurável.
Considera a Recorrente que, ao desconhecer a exigência legal de constituição da garantia financeira, agiu em erro sobre a ilicitude, em razão do que deverá ser absolvida.
Com particular interesse, a propósito desta contraordenação deu-se como provado: 3º (…) tendo sido verificado que no interior da referida oficina se encontravam resíduos ali produzidos, classificados pela Lista Europeia de Resíduos (LER), publicada pela Decisão 2014/955/EU, da Comissão, de 18 de dezembro, que inequívocamente demonstram a actividade desenvolvida. 16º A empresa em questão encontrava-se registada no SILIAmb - Sistema Integrado de Licenciamento do Ambiente, com o código APA00342823, tendo sido apresentado o MIRR - Mapa Integrado de Registo de Resíduos referente a 2015. 17º Considerando o exercício de uma actividade económica passível de causar danos ambientais ou ameaça, impende a obrigatoriedade de adoptar garantias financeiras que permitam assumir a responsabilidade ambiental inerente daquela actividade. Assim foi solicitado comprovativo de garantia financeira de responsabilidade ambiental (seguro ambiental; garantia bancária; fundos ambientais ou fundos próprios, tendo o visado informado desconhecer tal obrigação). 18º Verifica-se que desde a aplicabilidade da obrigatoriedade em menção, a empresa exploradora não promoveu à realização de qualquer garantia. 24º A Arguida exerce conduta regulada por lei, pelo que tinha obrigação de conhecer e cumprir com o ali prescrito para o exercício da mesma, in casu o Decreto-Lei n.º 153/2003, de 11 de julho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de junho, o Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de julho. e o Regulamento (CE) n.º 1907 /2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro, conjugado com o Decreto-Lei n.º 293/2009, de 13 de outubro. 25º Não o tendo feito, não agiu com a diligência necessária e de que era capaz, não resultando dos autos elementos que retirem ilicitude aos factos ou censurabilidade à sua conduta.
Na decisão recorrida, em sede de fundamentação de direito, consta, quanto a esta contraordenação: Da contra-ordençação ambiental muito grave dos artigos 22º e 26º, nº 1, al. f) do D. Lei 147/2008 e do artigo 22º, nº 4, al. b) da Lei 50/2006. Exercendo a arguida uma actividade que utiliza e armazena substâncias perigosas (anexo III do D. Lei 147/2008) impunha-se que tivesse constituído uma garantia financeira destinada a assumir a responsabilidade ambiental, seja através de seguro, de garantias bancárias, da participação em fundos ambientais ou mediante a constituição de fundos próprios reservados para o efeito. Pese embora o argumento ora trazido aos autos, ainda que não demonstrado, certo é que o gerente da arguida desconhecia sequer tal obrigação legal como se apurou. Por isso também se mostra preenchida a contra-ordenação ambiental imputada.
A Recorrente não põe em causa que tivesse a obrigação legal de constituir a garantia financeira, exigível por aplicação dos art.ºs 22º e 26º, n.º 1, al. f), do Decreto-Lei 147/2008, de 29.07 (Regime Jurídico da Responsabilidade por Danos Ambientais) e do artigo 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006, de 29.08 (Lei Quadro das Contraordenações), dos quais resulta, entre o mais, essa obrigação legal para os operadores que exerçam as atividades ocupacionais enumeradas no anexo iii, entre as quais consta a utilização e/ou armazenamento de substâncias perigosas como tais classificadas pela Lista Europeia de Resíduos (LER) - ponto 7 do anexo -.
Também não põe em causa que o incumprimento de tal obrigação constitua a contraordenação aludida na decisão recorrida, nem tão pouco a coima ou a sua medida.
A única questão por si suscitada é o enquadramento da sua conduta omissiva, por desconhecimento da exigência legal, na figura do erro sobre a ilicitude não censurável, prevista no art.º 9º, do RGCO.
Adiantamos não assistir, nesta parte, razão à Recorrente.
Vejamos.
Dispõe o art.º 8º, do RGCO, epigrafado “dolo e negligência”, que: 1 - Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência. 2 - O erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição, ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente, exclui o dolo. 3 - Fica ressalvada a punibilidade da negligência nos termos gerais.
Por seu turno, estatui o art.º 9º, do mesmo diploma legal, epigrafado “erro sobre a ilicitude” que: 1 - Age sem culpa quem atua sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável. 2 - Se o erro lhe for censurável, a coima pode ser especialmente atenuada.
A absolvição da Recorrente desta concreta contraordenação implicaria, nos termos conjugados dos art.ºs 8º e 9º, do RGCO, que a sua ação omissiva de não constituição da garantia financeira motivada por desconhecimento da obrigação legal -o que constitui um erro por ignorância de uma imposição legislativa- não lhe fosse imputável a título de dolo, nem de negligência, o que só ocorreria se o erro não lhe fosse censurável.
Dito de outro modo, só existe um erro sobre a ilicitude com a potencialidade de excluir totalmente a culpa quando a conduta exigível legalmente não foi levada a cabo por erro não censurável.
Na verdade, existindo erro sobre a proibição nos termos previstos no art.º 8º, n.º 2, do RGCO, existirá erro sobre a consciência da ilicitude, porém tal erro - diz a lei - só excluirá o dolo, continuando a conduta a ser punível a título de negligência (desde que esta punição esteja prevista), conforme se dispõe no número 3º do preceito legal.
Tal culpa só se terá por totalmente excluída nas circunstâncias previstas no art.º 9º, n.º 1, do RGCO, i.e., quando a atuação sem a consciência da ilicitude teve lugar por erro não censurável do agente.
Essa falta de censurabilidade do erro do agente sobre a ilicitude tem de resultar necessariamente de factos constantes da materialidade provada.
Ora, na situação em apreço não só não consta dos factos provados nenhum elemento que nos permita chegar a essa conclusão, como até acontece o inverso, ou seja, dos factos provados, concretamente dos pontos 24º e 25º, extrai-se que a Recorrente tinha o dever de conhecer a imposição legal de constituição de garantia financeira destinada a acautelar a necessidade de liquidar futuros e eventuais danos ambientais decorrentes da atividade de utilização de produtos com forte potencialidade de lesão do ambiente, o que só não ocorreu por não ter agido com a diligência necessária e de que era capaz, tanto mais que a Recorrente laborava no mesmo ramo há 30 anos e que a imposição legal da constituição da garantia financeira existia desde 2010 (por força do artigo 34º, do Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29.07), sendo exigível a uma empresa instalada há décadas no ramo, que manuseia produtos químicos perigosos, sejam novos, sejam usados, com fortes exigências legais no que respeita ao manuseamento, armazenamento, separação, contenção e destino de tais produtos, que se mantenha atualizada relativamente às exigências legais relacionadas com esses produtos químicos perigosos e potencialmente lesivos do ambiente.
Tendo a Recorrente atuado sem a consciência da ilicitude da sua omissão relevante, dada a ignorância de uma imposição legal, mas por erro censurável, a punição da contraordenação em causa a título de negligência, que está prevista legalmente, mostra-se adequada.
Não existe, consequentemente, o invocado erro sobre a ilicitude excludente da culpa. Improcede, pois, o recurso interposto neste segmento.
3. No que concerne à contraordenação de “falta das informações devidas relativas às fichas de dados de segurança dos produtos e substâncias perigosas que utilizava e que detinha no seu estabelecimento”, prevista nos artigos 11º, n.º 2, al. u), do Decreto-Lei n.º 293/2009, 22º, n.º 3, al. b), da Lei 50/2006, e 36º do Regulamento CE 1907/2006, saber se os direitos de defesa da sociedade “A, Lda.” foram violados, por falta de concessão de um prazo para a apresentação das referidas fichas de dados.
A Recorrente, quanto a esta concreta e última contraordenação, considera ter sido violado o seu direito de defesa, porque não lhe ter sido concedido um prazo razoável para apresentar as ditas fichas de dados de segurança.
Relativamente a esta contraordenação deu-se como provado: 19º Ainda no decurso da ação de fiscalização, foi detectado no interior das instalações, várias embalagens contendo produtos/substâncias perigosas, identificáveis através dos respetivos pictogramas de perigo apresentados na sua rotulagem, as quais são utilizadas/manuseadas pelos funcionários diariamente e no âmbito profissional, pelo que, foram solicitadas as devidas fichas de dados de segurança (FDS), que lhe permitam tomar as medidas necessárias para protegerem a saúde e o ambiente e garantir a segurança no local de trabalho, tendo o Sr. Binformado não possuir nenhuma nas suas instalações, alegando nunca terem sido disponibilizadas pelos seus fornecedores, nem tão pouco as solicitado.
E como não provado: - A recorrente dispunha das fichas de segurança solicitadas e apenas não foi possível localizá-las de imediato por o gerente se encontrar sozinha, sem que lhe tivesse sido dada a oportunidade de apresentar tais documentos em momento ulterior.
Em sede de fundamentação de direito consta na decisão recorrida: A arguida não dispunha das informações devidas relativas às fichas de dados de segurança dos produtos e substâncias perigosas que utilizava e que detinha no seu estabelecimento, pelo que incorreu na prática de uma contraordenação grave do artigo 11º, nº 2, al. u) do D. Lei 293/2009 e 22º, nº 3, al. b) da Lei 50/2006 e do artigo 36º do Regulamento CE 1907/2006. A arguida desconhecia novamente tal obrigação legal, algo que não justifica a sua conduta, sendo que não conservava a informação exigível nem a apresentou ulteriormente, não tendo de ser instada ao efeito, já que a teria de manter disponibilizando a informação quando a mesma é solicitada, o que não cumpriu. Do exposto resulta que a decisão administrativa, condenando a arguida pela prática das contra-ordenações ambientais descritas, a título de negligência, é de manter.
A Recorrente não põe em causa que tivesse a obrigação legal de dispor das ditas fichas de dados de segurança (FDS) das substâncias perigosas utilizadas/manuseadas na oficina, comportamento exigível por aplicação dos art.ºs 11º, nº 2, al. u), do Decreto- Lei 293/2009, de 13.10 (referente ao Registo, Avaliação, Autorização e Restrição dos Produtos Químicos -REACH-), 22º, n.º 3, al. b), da Lei 50/2006, de 29.08 (Lei Quadro das Contraordenações Ambientais) e 36º do Regulamento CE 1907/2006,que impõem, entre o mais, a obrigação legal de reunir e manter disponível a informação referente a essas substâncias perigosas.
Também não põe em causa que o incumprimento de tal obrigação constitua a contraordenação aludida na decisão recorrida, nem tão pouco a coima prevista e a concretamente aplicada.
A única questão por si suscitada é o facto de os agentes fiscalizadores não lhe terem concedido um prazo razoável para apresentar as tais fichas de dados de segurança.
Escuda-se no facto de no artigo 36º, n.º 1, do Regulamento (CE) n.º 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, (relativo ao Registo, Avaliação, Autorização e Restrição de Substâncias Químicas -REACH-), sob a epígrafe “obrigação de conservar a informação”, constar que essa informação deve ser prestada “sem demora”, expressão que diz não ser sinónima de imediatamente, pelo que a arguida deveria ter sido notificada para, num prazo razoável, apresentar as fichas de dados de segurança.
Dispõe o art.º 36º, n.º 1, do Regulamento (CE) n.º 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, que cada fabricante, importador, utilizador a jusante e distribuidor deve reunir e manter disponíveis todas as informações exigidas para dar cumprimento às obrigações que lhe incumbem por força do presente regulamento durante, pelo menos, dez anos após a data em que fabricou, importou, forneceu ou utilizou pela última vez a substância ou preparação. Esse fabricante, importador, utilizador a jusante ou distribuidor apresenta ou disponibiliza estas informações sem demora, mediante pedido, a qualquer autoridade competente do Estado-Membro em que se encontra estabelecido ou à Agência, sem prejuízo do disposto nos Títulos II e V.
Mesmo a interpretar-se o termo “sem demora” com alguma benignidade e amplitude, no caso em concreto, considerando a materialidade dada como não provada e como provada, não se impunha tal notificação.
Na verdade, o que se mostra assente é que a sociedade não dispunha das fichas de dados de segurança dos produtos químicos perigosos por si utilizados no normal decorrer da sua atividade de reparação de automóveis, tendo o gerente alegado que nunca as mesmas lhe foram disponibilizadas pelos fornecedores e que também nunca as solicitou, ou seja, em suma, que tais fichas não existiam e que nunca tinham existido.
Ora, face a tal materialidade não fazia sentido os agentes fiscalizadores notificarem a sociedade arguida para, decorridos uns dias, apresentarem umas fichas de dados de segurança que o gerente assumiu como inexistentes.
É certo que a Recorrente, na sua defesa, ainda ensaiou uma tese alternativa, segundo a qual teria as fichas de dados de segurança, mas no momento em que lhe foi pedida a sua exibição não conseguiu localizá-las. Tal versão foi, no entanto, dada como não provada.
De resto, a Recorrente teve oportunidade para exibir as ditas fichas, até na fase de impugnação judicial da decisão administrativa, coisa que nunca fez.
Em resumo, não foi preterido nenhum direito de defesa da Recorrente. Termos em que improcede o recurso neste segmento.
Considerando a absolvição da Recorrente na primeira das contraordenações, impõe-se desfazer o cúmulo da coima única aplicada e operar novo cúmulo.
As coimas parcelares subsistentes são de:
- €13.000,00, pela prática da contraordenação ambiental muito grave dos artigos 22º, e 26º, n.º 1, al. f), do Decreto-Lei n.º 147/2008 e do art.º 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006; e
- €6.500,00, pela prática da contraordenação ambiental grave do artigo 11º, n.º 2, al. u), do Decreto-Lei 293/2009, 22º, n.º 3, al. b), da Lei 50/2006, e 36º do Regulamento CE 1907/2006.
Em cúmulo jurídico, nos termos do art.º 27º, da Lei 50/2006, e seguindo de perto todos os critérios constantes da decisão recorrida, que nos escusamos de repetir, fixa-se a coima única em €15.000,00 (quinze mil euros).
III – Dispositivo
Pelo exposto, acordam os juízes da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em conceder parcial provimento ao recurso interposto pela Recorrente “A, Lda.” e:
- Absolver a mesma da contraordenação ambiental muito grave, pela violação das proibições estabelecidas no artigo 5.º, al. b), e 25º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 153/2003, e 22º, n.º 4, al. b), da Lei 50/2006;
- Negar provimento ao recurso quanto às duas restantes contraordenações imputadas à Recorrente; e
- Relativamente às duas contraordenações imputadas e subsistentes, fixar a coima única em €15.000,00 (quinze mil euros).
Sem custas, considerando a procedência parcial do recurso.
Notifique e D.N.
Lisboa, 27 de abril de 2023
Madalena Augusta Parreiral Caldeira
António Bráulio Alves Martins
Maria do Carlos Duarte do Vale Calheiros