O despacho sobre a forma de prestação da caução, necessária para a atribuição de efeito suspensivo do recurso de apelação, deve considerar-se como uma decisão interlocutória que recai exclusivamente sobre a relação processual no sentido do art. 671.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
I. — RELATÓRIO
1. AA intentou a presente execução contra BB, apresentando como título executivo o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães no apenso de atribuição de casa de morada de família.
2. Em 31 de Maio de 2021, foi proferido o seguinte despacho:
“Notifique-se a Requerente para, no prazo de 10 dias, carrear para os autos certidão do Acórdão proferido pelo TRG, com nota de trânsito em julgado.”
3. Em 14 de Junho de 2021, a Exequente explicou que a decisão tinha sido objecto de recurso, a que fora atribuído efeito meramente devolutivo.
4. Em 21 de Junho de 2021, foi proferido o seguinte despacho:
“Aferindo-.se que o recurso aduzido no apenso G foi admitido com efeito devolutivo, determina-se o prosseguimento da execução.”
5. BB veio opor-se à execução intentada por AA, deduzindo embargos, em que alegou:
I. — que o acórdão transitado em julgado não o condenou na entrega do imóvel, tendo-se limitado a atribuir a casa de morada de família à exequente até à partilha;
II. — que residia na casa de morada de família, que o acórdão transitado em julgado tinha atribuído à Exequente.
6. O Tribunal de 1.ª instância julgou totalmente improcedente os embargos de executado.
7. Inconformado, o Executado / Embargante BB interpôs recurso de apelação.
8. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
1ª - O executado/embargado mui respeitosamente requer a SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO, dado que a decisão em causa se cinge à entrega da casa de habitação do mesmo, de sua propriedade – art.º 647º n.º 3 al. b) do C. P. Civil – bem como atendendo ao facto da execução da decisão causar ao mesmo prejuízo considerável, declarando desde já que pretende prestar caução, - art.º 647º n.º 4 do mesmo diploma legal - indicando para garantia de tal caução o direito e ação a metade do imóvel de sua propriedade, sito na Rua Dr. ... n.º 9 em ..., inscrito na matriz predial urbana da Freguesia e Concelho ... sob o artigo 2.821.
2ª - Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual decidiu julgar totalmente improcedentes os embargos de executado, e em consequência, ordenou o prosseguimento dos autos de execução, com vista a efetivar-se a atribuição da casa de morada de família à exequente.
3ª - Está inconformado o executado!
4ª - Como é dos autos, o executado, alegou, além do mais, que estamos perante uma situação de falta de título executivo;
5ª - Porém, o Tribunal, entendeu, no que se não concede, que inexistiam os fundamentos invocados pelo executado/embargante, tendo julgado os embargos improcedentes;
6ª - Nos termos do artigo 10º n.º 5 do C.P.C., toda a execução tem por base um título, pelo qual se determina o fim e os limites da ação executiva, e segundo o artigo 703º do mesmo diploma legal, são títulos executivos as sentenças condenatórias, as quais, de acordo com os artigos 628º e 647º do C. P. Civil, só são títulos executivos quando não sejam suscetíveis de recurso ordinário ou de reclamação ou quando a apelação tenha efeito meramente devolutivo, o que significa que a instância executiva se inicia pela propositura da execução e é no requerimento executivo que a parte tem de definir: - Quer os fundamentos da execução; - Quer a exequibilidade do título. Elementos que são oponíveis ao exequente desde o momento da propositura da execução e apenas a partir da citação são oponíveis ao executado – vide artigos 259º e 206º do Código de Processo Civil;
7ª - Preceitua o artigo 704º do Código de Processo Civil, no seu número 1, que “a sentença só constitui título executivo depois do trânsito em julgado, salvo se o recurso contra ela interposto tiver efeito meramente devolutivo”;
8ª - Assim, a regra é que só é exequível a sentença condenatória transitada em julgado, a qual conhece apenas uma exceção que é a sentença condenatória pendente de recurso com efeito meramente devolutivo;
9ª - O executado/embargante quando interpôs recurso do Douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, e isto em 08.01.2021, requereu que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo;
10ª - Assim é que foi tal recurso admitido pelo Tribunal da Relação e subiram os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o qual, pela Decisão Singular proferida em 25.05.2021 decidiu não conhecer do recurso interposto;
11ª - Desta decisão singular o ora recorrente, em 07.06.2021 reclamou para a Conferência ao abrigo do preceituado no n.º 3 do art.º 652º do C. P. Civil, tendo sido proferido Acórdão em Conferência em 07.07.2021, o qual, decidiu não conhecer do objeto do recurso;
12ª - Isto posto, aquando da propositura da ação executiva em 04.05.2021 não havia, ainda, transitado em julgado o Douto Acórdão, dado como título executivo, aliás diga-se em prol do rigor e da verdade, que a exequente intenta a ação executiva, 21 dias antes da prolação da Decisão singular,
13ª - E como se disse já, de acordo com o art.º 704º n.º 1 do C. P. Civil a regra é só ser exequível a sentença condenatória transitada em julgado, a qual apenas conhece uma exceção que é a sentença condenatória pendente de recurso com efeito meramente devolutivo;
14ª - Ora, estava pendente um recurso, ao qual foi peticionado o efeito suspensivo, logo a exequente deveria ter aguardado pelo despacho sobre a atribuição do efeito do recurso,
15ª - O qual teria de ser sempre proferido pelo Tribunal superior, neste caso o Supremo Tribunal de Justiça.
16ª - Pelo que, ao assim não ter procedido, é manifesta a falta de exequibilidade da sentença,
17ª - A Douta sentença ora sujeita à preclara apreciação de Vªs Exªs, violou direta e ou indiretamente o preceituado nos artigos 10º n.º 5, 628º, 647º, 703º e 704º, entre outros do C. P. Civil e seus basilares princípios, o que a torna nula e de nenhum efeito, devendo ser substituída por outra que decida nos termos preditos.
Nestes termos, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vªs Exªs, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente por provado, e consequentemente revogar-se a Douta decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, com o que se fará plena e reparadora JUSTIÇA
9. A Exequente / Embarganda contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
10. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:
Um. A decisão que se executou foi proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães;
Dois. O recurso dela interposto para o Supremo Tribunal de Justiça tinha efeito meramente devolutivo.
Três. Mas já foi proferida decisão pelo Supremo Tribunal de Justiça a qual já transitou em julgado;
Quatro. O apelante litiga com clara má fé, tentando unicamente impedir a entrega do imóvel à sua mulher e ao seu filho.
Cinco. Mantendo-os a viver numa casa sem condições, humilhando-os.
Nestes termos e nos melhores de direito que Vªs Ex.ªs mais doutamente suprirão, negando provimento ao presente recurso, mantendo a decisão recorrida e condenando o recorrente como litigante de má fé, farão a esperada JUSTIÇA!
11. No requerimento de interposição de recurso o Executado / Embargante requereu que lhe fosse atribuído efeito suspensivo, mediante a prestação de caução.
12. Indicou para garantia de tal caução o direito a metade do imóvel de sua propriedade, sito na Rua Dr. ....
13. A Exequente / Embarganda opôs-se à possibilidade de atribuir efeito suspensivo ao recurso
14. Foi proferido despacho em que se entendeu que, “tendo em conta que em causa está o local de residência do executado considera-se razoável a consideração de que a imediata exequibilidade da decisão lhe traria prejuízo considerável” e que “se considera adequado fixar o valor da caução em montante equivalente ao valor da causa” e em que se concluiu que,
“[p]elo exposto, deverá o recorrente, em 15 dias, prestar caução no valor de € 30.000,01 em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”.
15. Inconformado, o Executado / Embargante interpôs recurso de apelação do despacho relativo à atribuição de efeito suspensivo ao recurso, mediante a prestação de caução.
16. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
1ª - Vem o presente recurso interposto da Douta decisão, referência, 7092307, proferida nos autos em epígrafe, através da qual, entendeu o Tribunal “a quo” que a caução prestada pelo executado, não se mostra suficiente nem adequada ao caso vertente, e
2ª - Nessa senda, notificou o mesmo (executado), para em 15 dias prestar caução no valor de € 30.000,01 em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor;
3ª - O ora recorrente, e como é dos autos, nas suas alegações de recurso referência ...84, requereu que ao mesmo fosse fixado efeito suspensivo, porquanto a execução da decisão em causa se cinge à entrega da casa de morada de família dos mesmos, de sua propriedade, bem como, atendendo ao facto de a execução da decisão lhe causa prejuízo considerável, tendo-se oferecido para prestar caução,
4ª - A qual, insidia sobre o direito e ação a metade do imóvel de sua propriedade, sito na Rua Dr. ..., n.º 9, na ..., Freguesia e Concelho ..., inscrito na matriz predial urbana da Freguesia e Concelho ... sob o artigo 2.821;
5ª - O Tribunal “a quo” e pelo Douto despacho a que supra se fez referência, e de que ora se recorre, entendeu, no que se não concede, salvo melhor juízo, que a caução prestada pelo executado, que como se disse já, foi o direito e ação a metade do imóvel de sua propriedade, identificado nos autos, o qual tem um valor patrimonial de € 73.030,00 é superior ao valor fixado à oposição à execução de € 30.000,01,
6ª - E como tal, decidiu que era adequado fixar o valor da caução em montante equivalente ao valor da causa, no que se não concede.
7ª - Perante a impossibilidade da prestação de caução pelas formas previstas no art.º 623º do C.C., o executado, e ao abrigo do preceituado no artigo 624º nº 1 do CC, ofereceu-se para que a mesma fosse prestada através do já referido direito e ação a metade do imóvel de sua propriedade,
8ª - Sito na Rua Dr. ..., n.º 9, na ..., Freguesia e Concelho ..., inscrito na matriz predial urbana da Freguesia e Concelho ... sob o artigo 2.821, de acordo com o referido normativo (624º n.º 1 do C. C.) pelo que estamos perante uma garantia real.
9ª - Entende o Recorrente, salvo devido respeito e melhor opinião, que o ínsito na Douta Decisão de que ora se recorre está em manifesta contradição com a lei, que permite a prestação de caução por meio de qualquer garantia real ou pessoal, devendo, por isso, o Tribunal aceitar a caução proposta, e consequentemente ter admitido o recurso interposto com efeito suspensivo;
10ª - Porém, tal não sucedeu, no que não se pode de forma alguma conceder; 11ª - É certo que o valor patrimonial do imóvel é de € 73.030,00 o que a dividir por dois, dado que o mesmo é propriedade de exequente e executado na proporção de metade, dá a cada um o valor de € 36.515,00 ou seja, excedendo o valor da causa, apenas e só em € 6.514,99;
12ª - A este propósito, invoca o Tribunal recorrido, no Douto despacho ora em recurso um Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no âmbito do processo n.º 515/14.3TBLRA-B.L1-2, segundo o qual, defendido é que “O valor da caução a prestar para fixação de efeito suspensivo à apelação de sentença condenatória em quantia a liquidar deve corresponder ao valor do pedido, por ser esse o limite da condenação e liquidação”
13ª - Salvo melhor juízo, tal Douto acórdão, refere-se ao concreto facto de a caução oferecida ser em montante inferior ao do valor da causa, não se tendo pronunciado quanto à factualidade de a caução prestada ser em valor superior;
14ª - Salvo devido respeito, e melhor opinião, entende o ora recorrente que a caução por si oferecida, pese embora em valor superior ao atribuído à causa, se mostra suficiente e idónea, pelo que, se requer seja aquele Douto despacho revogado e substituído por outro, que declare prestada a referida caução,
15ª - E consequentemente ser o recurso interposto admitido como de apelação, com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo, em conformidade com o preceituado nos artigos 627º, 629º, n.º 1, 631º n.º 1, 638º n.º 1, 639º n.º 1, 644º, 645º e 647º nº 2 e 4 entre outros, todos do C. P. Civil, e seus basilares princípios, o que se requer.
17. A Exequente / Embarganda contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
18. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:
Um. Carece de razão o recorrente;
Dois. Sobre o caso sub judice já foram proferidas 5 decisões.
Três. Não se conseguem executar pelos vários expedientes dilatórios que o recorrente vem lançando mão;
Quatro. A recorrida vive de empréstimo numa casa arrendada, sem condições, sem casa de banho sequer;
Cinco. Estando a casa de morada de família vazia.
Seis. Não deve ser atribuído efeito suspensivo ao presente recurso, mas somente efeito devolutivo, o que se requer.
Nestes termos e nos melhores de direito que Vªs Ex.ªs mais doutamente suprirão, não dando provimento ao presente recurso, mantendo a decisão recorrida farão a esperada JUSTIÇA.”
19. O Tribunal da Relação julgou improcedentes as apelações, confirmando os despachos recorridos, e condenou o Exequente / Embargante como litigante de má-fé, em multa que fixou em 3 UCs.
20. Inconformado, o Exequente / Embargante interpôs recurso de revista.
21. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
1ª - Vem o presente recurso interposto do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães que julgou improcedente o recurso interposto, mantendo a decisão recorrida, e bem assim condenou o recorrente como litigante de má-fé na multa que fixaram em 3 Unidades de Conta.
2ª - O presente recurso de revista, vem intentado no seu regime normal (relativamente à condenação como litigante de má-fé – artigo 542º n.º 3 do CPC) e excecional, por violação das normas de direito – artigos 671º, 672º n.º 1 alíneas a), b) e c), 674º n.º 1 alíneas a), b) e c), 615º n.º 1 al. d) ex vi do art.º 666º todos do Código de Processo Civil e seus basilares princípios e/ou quando assim se não entenda, por Erro de Julgamento, ou seja, num error in judicando, por erro sob o objeto da prova, por erro na seleção dessa matéria, quer por erro na valoração ou aferição das provas produzidas, passível de ser superado nos termos do art.º 607º n.º 2 – 2ª parte aplicável aos Acórdãos dos Tribunais superiores, por via dos artigos 663º n.º 2 e 679º do C. P. Civil e seus basilares princípios;
3ª - O recorrente não se conforma com o Douto Acórdão proferido; O mesmo, no seu modesto entender, merece censura em várias vertentes, devendo, a final, ser declarado nulo, por violação da Lei e/ou erro de julgamento, como adiante especificaremos;
4ª - O recorrente interpôs recurso e requereu, além do mais, que o mesmo tivesse efeito suspensivo, porquanto estávamos perante a entrega da casa de morada de família do mesmo, de sua propriedade, bem como, atendendo ao facto de a execução da decisão lhe causar prejuízo considerável, tendo declarado que pretendia dar de garantia de tal caução o direito e ação a metade do referido imóvel;
5ª - O Tribunal, e por Douto despacho referência ...07, entendeu que a caução prestada não se mostrava suficiente nem adequada ao caso em apreço, pois, o valor adequado era de € 30.000,01, e dado que a casa de morada de família, tinha o valor patrimonial de € 73.030,00 a metade era de € 36.515,00 considerou tal valor superior, e assim, determinou que a caução fosse prestada no valor de € 30.000,01 em dinheiro ou garantia bancária no mesmo valor;
6ª - Inconformado o ora recorrente, interpôs recurso de tal decisão, o qual foi admitido por Douto despacho referência ...47;
7ª - O Tribunal da Relação de Guimarães no Douto Acórdão de que ora se recorre, e no que respeito diz à caução, entendeu, no que se não concede, que a caução oferecida pelo recorrente não tinha idoneidade, porquanto e pese embora a quota-parte de coisa ou direito comum seja suscetível de hipoteca, ainda assim entendeu que não foi esse o meio oferecido, nem tão pouco que tenha sido essa a vontade manifestada pelo recorrente em que fosse constituída hipoteca;
8ª - Tal não corresponde à verdade, porquanto naturalmente que era essa a intenção do ora recorrente, ou seja, que fosse constituída a referida hipoteca, aliás, qualquer homem médio colocado perante a situação, concluiria, como não poderia deixar de concluir, que a mesma seria prestada por hipoteca, o que é do senso comum e do normal do acontecer;
9ª - Caso o Tribunal assim o não entendesse, ou seja, que era essa a pretensão do ora recorrente, no que se não concede, sempre e ao abrigo do preceituado no art.º 6º, em conjugação com o preceituado no art.º 639º n.º 3, entre outros, do C.P. Civil, poderia/devia,ter convidado o ora recorrente, a vir esclarecer como pretendia que fosse prestada a caução, e isto, atendendo ao disposto no n.º 1 do art.º 6º do CPC, em conjugação com o preceituado no art.º 547º do mesmo diploma legal;
10ª - Conforme refere Teixeira de Sousa “a gestão processual visa diminuir os custos, o tempo e a complexidade do procedimento. Tal gestão pressupõe um juiz empenhado na resolução célere e justa da causa, e traduz-se um aspeto instrumental – a adequação formal (cf. art. 547º). O dever de gestão processual procura ajudar a solucionar a “equação processual”: uma decisão justa do processo com os menores custos, a maior celeridade e a menor complexidade que forem possíveis do caso concreto.”
11ª - Ao proferir o Acórdão que proferiu e de que ora se recorre, o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, olvidou, salvo devido respeito, o dever de gestão processual, plasmado nos artigos 6º, nº 1 e 547º, do CPC., violando assim, os direitos e interesses do executado, ora recorrente,
12ª - Assim, tal Douto Acórdão violou o poder/dever que lhe é imposto por lei, porque, e tendo feito aplicação daqueles preceitos, o recorrente acederia ao convite e diria ao Tribunal a forma como seria prestada a caução, pelo que, ao não o ter feito, tal aresto é nulo, por violação da lei, nulidade que aqui se invoca para devidos e legais efeitos.
13ª- Decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães condenar o ora recorrente como litigante de má-fé na multa que fixou em 3 UCs, sendo que a este propósito, é referido no Douto Acórdão que o recorrente levantou em sede de recurso questão que já havia sido tratada anteriormente, fazendo tábua rasa de todo o ocorrido e aproveitando para pedir o efeito suspensivo do recurso;
14ª - A litigância de má-fé, prevista no artigo 542º do C. P. Civil, não se basta com a dedução de pretensão/oposição sem fundamento, ou com a afirmação de factos de forma distinta, sendo ainda exigível a atuação dolosa, ou com negligência grave, da parte, ou seja, é necessário que a parte conheça a falta de fundamento da sua pretensão – Neste sentido veja-se Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, prolatado em 18.02.2015, no âmbito do processo n.º 1120/11.1TBPFR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt
15ª - Pelo que, a litigância de má-fé envolve um juízo de censura assente na violação dos elementares deveres de probidade, cooperação e de boa-fé entre as partes, veja-se Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido em 28.05.2019, no âmbito do processo n.º 3303/11.5TBLRA-A.C1, disponível em www.dgsi.pt
16ª-Isto posto, a conduta processual do recorrente é desprovida de qualquer atuação dolosa, ou gravemente negligente, não sendo possível formular um qualquer juízo de censura sobre o mesmo.
17ª - É certo que o fundamento legal invocado pelo recorrente padece de erro, mas nunca se poderá estar perante uma atuação dolosa ou gravemente negligente, pois que o recorrente tem direito a interpretar as normas jurídicas que entende serem aplicáveis ao caso, ainda que de forma errónea, e o mesmo fundamentou o recurso então interposto, de facto e de direito, pelo que, in casu, não poderá concluir-se que este conhecia a alegada falta de fundamento da sua pretensão, como é também defendido no Douto Aresto proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 18.02.2015, no âmbito do processo n.º 1120/11.1TBPFR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt
18ª - O recorrente estava legitimamente convicto dos fundamentos legais que entendeu serem aplicáveis ao caso, tendo-se empenhado diligentemente na elaboração do recurso de apelação, ainda que se considere que a interpretação dos preceitos normativos com base nos quais o recorrente fundou a sua pretensão não sejam aplicáveis ao caso concreto, daí nunca se poderá concluir pela atuação dolosa ou gravemente negligente do recorrente - vide a contrario sensu o preceituado n.º 2 do art.º 542.º CPC.
19ª - O recorrente limitou-se a interpretar e aplicar a lei de forma diferente do Tribunal, sustentando a sua posição com base nos argumentos que, de facto e de direito, considerou aplicáveis in casu,
20ª - Pois que, o recorrente tem direito a atuar em juízo, obtendo em prazo razoável, uma decisão de mérito que aprecie a sua pretensão e a defesa dos seus direitos e interesses a qual não poderá ser confundida com litigância de má-fé, artigo 2.º do C. P. C. e artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
21ª - A interpretação e aplicação dos preceitos normativos em causa, ainda que feita de forma errónea, não equivalerá a uma conduta dolosa ou gravemente negligente do recorrente, ou, sequer, a um expediente dilatório alegadamente utilizado por forma a prejudicar a recorrida.
22ª - Pois que, o recorrente nunca atuou com a consciência da ilicitude do seu comportamento, nem demonstrou a intenção de conseguir um objetivo ilegítimo ou ilegal, pelo que, não é possível formular um juízo de censurabilidade sobre a sua atuação. Neste sentido veja-se o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 28.05.2019, prolatado no âmbito do processo n.º 3303/11.5TBLRA-A.C1, disponível em www.dgsi.pt
23ª - É seu entendimento, salvo melhor juízo, que não se encontram preenchidos, no caso dos presentes autos, os requisitos do n.º 2, do artigo 542.º do CPC e, por tal efeito, nunca poderia a conduta do recorrente ser integradora do conceito jurídico da litigância de má-fé.
24ª - A lide ousada/temerária, ou a sustentação de teses doutrinárias controvertidas ou de interpretações legais sem grande acolhimento jurídico não configuram uma situação de litigância de má-fé. Veja-se Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido em 30.04.2009, no âmbito do processo n.º 233/08.1TBRMR-A.L1-8, disponível em www.dgsi.pt
25ª - E a defesa de teses doutrinárias e a interpretação legal, ainda que feitas de modo ilusório, não integram o conceito de litigância de má-fé – vejam-se Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 442/91 de 20.11.1991; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.07.1982, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 319, págs. 301 e ss; Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 376/91, in DR, 2.ª Série, de 02.04.1992; Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 200/94, de 01.03.1994; Abílio Neto, “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2.ª Edição Revista e Ampliada, 2014, pág. 579; Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, 2.º Vol., pág. 263.
26ª - O acórdão recorrido procedeu a uma incorreta subsunção dos factos ao direito e, em consequência interpretou e aplicou incorretamente a lei, pelo que, não poderá o recorrente ser condenado em qualquer multa ou indemnização - vide al. a), do n.º 1, do art.º 674.º CPC; a contrario sensu, n.ºs 1 e 2, do art.º 542.º CPC e art.º 543.º CPC.
27ª - E isto porque, e quando o ora recorrente interpôs recurso da decisão proferida pela 1ª instância, que julgou os embargos improcedentes, o que o mesmo referiu, foi apenas e tão só, que aquando da propositura da ação executiva por banda da ora aqui recorrida, o título não era, ainda, exequível, e tanto assim foi que, a mesma intentou a referida ação em 04.05.2021 e apenas e só em 07.07.2021 é que foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, o qual transitou em julgado em 07.09.2021;
28ª - Foi apenas e só isto que o recorrente alegou, bem como, igualmente alegou que aquando da interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, peticionou que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo, nunca por nunca referiu que a admissão do recurso tivesse sido com efeito suspensivo, e isto é a realidade do que sucedeu nos presentes autos;
29ª - Se é certo que ao recurso foi atribuído efeito meramente devolutivo, apesar de o recorrente ter peticionado o efeito suspensivo, também não é menos verdade que a recorrida, e para lançar mão da ação executiva teria que ter respeitado o preceituado no art.º 704º do C. P. Civil, o que de todo não fez;
30ª - O Douto Acórdão, ora sujeito à preclara apreciação de Vªs Exªs, salvo devido respeito e melhor opinião, violou direta e ou indiretamente o preceituado nos artigos, 623º, 624º, entre outros do Código Civil e seus basilares princípios; artigos 2º, 6º, 8º, 10º, 542º, 543º, 547º e 704º, entre outros do C. P. Civil e seus basilares princípios, o que o fere inelutavelmente de nulidade – art.º 674º n.º 1 al. c), 615º n.º 1 al. a), b) e d) ex vi do art.º 666º todos do C.P.C. e seus basilares princípios,
31ª - E/ou quando assim se não entenda erro de julgamento, passível de ser superado nos termo do art.º 607º n.º 2 – 2º parte aplicável aos Acórdãos dos Tribunais Superiores por via dos artigos 663º e 679º ambos do C.P.C. e seus basilares princípios, e artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, o que tudo aqui se invoca para devidos e legais fins.
32ª - Em face de tudo quanto vem de se expor, resulta demonstrado que a decisão recorrida é errada, por injusta e ilegal, impondo-se a sua revogação, de forma a julgar procedente a oferecida caução, formulada pelo recorrente, bem como revogada a condenação como litigante de má-fé do recorrente, com o que se fará integral justiça.
Nestes termos, nos melhores de direito e com o sempre mui Douto Suprimento de Vªs Exªs deve ser dado provimento ao presente recurso de revista, revogando o Acórdão ora em crise, substituindo-o por outro que decida nos termos preditos, com o que Vªs Exªs farão a costumada e reparadora JUSTIÇA
22. A Exequente / Embarganda contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
23. O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
24. Ora o Executado / Embargante, agora Recorrente, distingue duas decisões de que pretende recorrer:
I. — Em primeiro lugar, pretende recorrer do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães na parte em que confirmou o despacho que fazia depender o efeito suspensivo do recurso da prestação de caução 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”.
II. — Em segundo lugar, pretende recorrer do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães na parte em que condenou o Executado / Embargante como litigante de má fé.
25. Em 15 de Março de 2023, foi proferido o despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil, dando às partes a oportunidade de se pronunciarem sobre as dúvidas quanto à admissibilidade de recurso de revista da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que confirmou o despacho que fazia depender o efeito suspensivo do recurso da prestação de caução de 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”.
26. O Executado, agora Recorrente, BB respondeu ao despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil nos seguintes termos:
Vem referido em tal Douto despacho, além do mais, em 32ºque o recorrente não indicou o art.º 671º n.º 2 do C. P. Civil, como fundamento específico do recurso, o que não corresponde à verdade, e até facilmente se alcança, pelo constante em 21 do mesmo Douto Despacho, quando aí são transcritas as alegações do recorrente, mormente a 2ª conclusão:
“2ª - O presente recurso de revista, vem intentado no seu regime normal (relativamente à condenação como litigante de má-fé – artigo 542º n.º 3 do CPC) e excecional, por violação das normas de direito – artigos 671º, 672º n.º 1 alíneas a), b) e c), 674º n.º 1 alíneas a), b) e c), 615º n.º 1 al. d) ex vi do art.º 666º todos do Código de Processo Civil e seus basilares princípios e/ou quando assim se não entenda, por Erro de Julgamento, ou seja, num error in judicando, por erro sob o objeto da prova, por erro na seleção dessa matéria, quer por erro na valoração ou aferição das provas produzidas, passível de ser superado nos termos do art.º 607º n.º 2 – 2ª parte aplicável aos Acórdãos dos Tribunais superiores, por via dos artigos 663º n.º 2 e 679º do C. P. Civil e seus basilares princípios;”
Ora,
É certo que o apelante, por mero lapso do qual se penitencia, e de que espera relevação por parte de Vªs Exªs, não indicou, especificadamente o n.º 2 do artigo 671º, mas o certo é que, o artigo 671º foi indicado, pelo que, é seu entendimento que onde está o menos, está o mais;
Acresce que,
E dado que estávamos perante uma decisão interlocutória, naturalmente que era esse o n.º que era a aplicar, dado que, e como é da lei, é sempre admissível recurso relativamente à condenação como litigante de má-fé;
Na verdade,
É entendimento do ora recorrente, salvo melhor juízo que pese embora, possa não ter feito a abordagem mais correta dos normativos legais, o certo é que os mesmos, estão lá.
Isto Dito,
Deve o recursos interpostos serem admitidos, conhecendo-se do objeto dos mesmos, com o que Vªs Exªs, farão a já costumada e reparadora JUSTIÇA.
27. A Exequente, agora Recorrida, AA respondeu ao despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil, “mante[ndo] todo o já alegado, nomeadamente a não admissibilidade do recurso interposto”.
II. — FUNDAMENTAÇÃO
28. A admissibilidade de recurso de revista da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que confirmou o despacho que fazia depender o efeito suspensivo do recurso da prestação de caução 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”, causou-nos fundadas dúvidas, sobre as quais se pronunciaram o Recorrente e a Recorrida.
29. O Executado, agora Recorrente, fundamenta o recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que confirmou o despacho que fazia depender o efeito suspensivo do recurso da prestação de caução de 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”,
III. — nos “artigos 671º, 672º n.º 1 alíneas a), b) e c), 674º n.º 1 alíneas a), b) e c), 615º n.º 1 al. d) ex vi do art.º 666º todos do Código de Processo Civil e seus basilares princípios”
IV.— e/ou “quando assim se não entenda — Erro de Julgamento, ou seja, num error in judicando, por erro sob o objeto da prova, por erro na seleção dessa matéria, quer por erro na valoração ou aferição das provas produzidas, passível de ser superado nos termos do art.º 607º n.º 2 – 2ª parte aplicável aos Acórdãos dos Tribunais superiores, por via dos artigos 663º n.º 2 e 679º do C. P. Civil e seus basilares princípios”.
30. O recurso de revista excepcional pressupõe o preenchimento dos requisitos gerais de admissibilidade do recurso de revista, designadamente dos requisitos relacionados com o conteúdo da decisão recorrida — art. 671.º, n.º 1 —, com a alçada e com a sucumbência — art. 629.º, n.º 1 —, com a legitimidade dos recorrentes — art. 631.º — e com a tempestividade do recurso — art. 638.º do Código de Processo Civil [1].
31. Em consequência,
“[p]ara se determinar se é, no caso, de admitir a revista excepcional, deve começar por se apurar se, no caso concreto, estão preenchidos os requisitos gerais de admissibilidade da revista, rejeitando logo o recurso, sem necessidade de apreciação dos requisitos específicos, se se concluir que não se mostram verificados tais requisitos” [2].
32. O art. 671.º, n.º 1, do Código de Processo Civil dispõe que
“[c]abe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”.
33. Ora, o acórdão recorrido apreciou uma decisão interlocutória, que recaía unicamente sobre a relação processual — a decisão de fazer depender o efeito suspensivo do recurso de apelação da prestação de caução de 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”.
34. Estando em causa uma decisão interlocutória, o recurso de revista só seria admissível desde que estivessem preenchidos os pressupostos do art. 671.º, n.º 2, do Código de Processo Civil:
2. — Os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objecto de revista:
a) Nos casos em que o recurso é sempre admissível;
b) Quando estejam em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.
35. O problema está em que o Executado, agora Recorrente, não alegou e, em todo o caso, não demonstrou que estivessem preenchidos os pressupostos do art. 671.º, n.º 2, do Código de Processo Civil como fundamento específico do recurso.
36. O art. 637.º, n.º 2, do Código de Processo Civil é do seguinte teor:
O requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; quando este se traduza na invocação de um conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, o recorrente junta obrigatoriamente, sob pena de imediata rejeição, cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento.
37. O ónus de indicação do fundamento específico da recorribilidade deve ser cumprido em todos os casos em que o recorrente pretenda que o recurso seja admitido ao abrigo de uma norma excepcional— p. ex., do art.671.º, n.º 2, do Código de Processo Civil [3].
38. Ora o Executado / Embargante não indica nunca art. 671.º, n.º 2, como fundamento específico de recorribilidade; não alega nunca e não demonstra nunca que estejam preenchidos os pressupostos do art. 671.º, n.º 2 — e, em particular, não demonstra nenhuma contradição jurisprudencial que pudesse relevar para efeitos de admissibilidade do recurso.
39. Em consequência, não se tomará conhecimento do recurso interposto pelo Executado, agora Recorrente, na parte em que confirmou o despacho que fazia depender o efeito suspensivo do recurso da prestação de caução de 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”.
40. A admissibilidade de recurso de revista da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que condenou o Executado, agora Recorrente, como litigante de má fé, não nos suscita dúvidas:
41. O art. 542.º, n.º 3, do Código de Processo Civil determina que,
“Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má-fé” [4].
42. O acórdão recorrido condenou o Executado, agora Recorrente, como litigante de má fé, deduzindo dois argumentos para a fundamentar.
43. Em primeiro lugar, o Executado, agora Recorrente, teria deduzido pretensão cuja falta de fundamento conhecia ou devia conhecer, no sentido do art. 542.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil.
44. O Tribunal da Relação de Guimarães explica que
“[…] o Recorrente veio no recurso trazer questão que já havia sido tratada no início da execução – da existência de título executivo atenta a interposição de recurso da decisão dada à execução – e que já fora objeto de pronúncia, salientando por que razão o acórdão dado à execução era exequível em despacho que foi notificado, à data, ao executado.
A questão da exequibilidade, neste caso, encontra-se totalmente consolidada e é linear em termos de apreciação jurídica, sem que se confrontem teses em sentidos divergentes; tão pouco o Recorrente traz qualquer argumento que pudesse pôr em causa a lei há muito estabelecida sobre as regras de atribuição de exequibilidade às decisões judiciais sob recurso. O Recorrente, além de afirmar a inexequibilidade do título, omitiu factos processuais essenciais de que tinha que ter conhecimento – porque deles notificado – e cujas implicações haviam sido explanadas em decisão de que lhe foi dado conhecimento.
Assim, não é possível atribuir a dedução deste recurso, patentemente infundado de facto e direito, a qualquer convicção do Recorrente na correção da posição que nele aflora; antes pelo contrário, é manifesto que tinha que saber que estava desprovido de razão, pelo menos desde que foi notificado do despacho que explicou porque a execução iria prosseguir”.
45. Em segundo lugar, o Executado, agora Recorrente, teria incorrido em omissão de factos relevantes para a decisão, no sentido do art. 542.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil:
“é […] patente que o [Recorrente] para defender a sua posição omitiu os factos processuais de que tinha conhecimento, por ter sido quem interpôs a revista à qual foi atribuído efeito meramente devolutivo, factos estes relevantes para a decisão da causa e que por isso era obrigado a explanar, como decorre da alínea b) do nº 2 do artigo 542º do Código de Processo Civil, ao prever a punição de quem com dolo ou negligência grave tiver omitido factos relevantes para a decisão da causa”.
46. O Executado, agora Recorrente, alega que
27ª - […] quando o ora recorrente interpôs recurso da decisão proferida pela 1ª instância, que julgou os embargos improcedentes, o que o mesmo referiu, foi apenas e tão só, que aquando da propositura da ação executiva por banda da ora aqui recorrida, o título não era, ainda, exequível, e tanto assim foi que, a mesma intentou a referida ação em 04.05.2021 e apenas e só em 07.07.2021 é que foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, o qual transitou em julgado em 07.09.2021;
28ª - Foi apenas e só isto que o recorrente alegou, bem como, igualmente alegou que aquando da interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, peticionou que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo, nunca por nunca referiu que a admissão do recurso tivesse sido com efeito suspensivo, e isto é a realidade do que sucedeu nos presentes autos;
29ª - Se é certo que ao recurso foi atribuído efeito meramente devolutivo, apesar de o recorrente ter peticionado o efeito suspensivo, também não é menos verdade que a recorrida, e para lançar mão da ação executiva teria que ter respeitado o preceituado no art.º 704º do C. P. Civil, o que de todo não fez.
47. O Supremo Tribunal de Justiça tem considerado, constantemente, que “deve continuar-se a ser cauteloso, prudente e razoável na condenação por litigância de má fé, o que só deverá ocorrer quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu dolosamente ou com grave negligência, com o fito de impedir ou a entorpecer a acção da justiça” [5].
48. O acórdão recorrido chama a atenção para que a questão suscitada em 13 das 17 conclusões do recurso de apelação é a falta de título executivo:
4.º Como é dos autos, o executado, alegou, além do mais, que estamos perante uma situação de falta de título executivo;
5ª - Porém, o Tribunal, entendeu, no que se não concede, que inexistiam os fundamentos invocados pelo executado/embargante, tendo julgado os embargos improcedentes;
6ª - Nos termos do artigo 10º n.º 5 do C.P.C., toda a execução tem por base um título, pelo qual se determina o fim e os limites da ação executiva, e segundo o artigo 703º do mesmo diploma legal, são títulos executivos as sentenças condenatórias, as quais, de acordo com os artigos 628º e 647º do C. P. Civil, só são títulos executivos quando não sejam suscetíveis de recurso ordinário ou de reclamação ou quando a apelação tenha efeito meramente devolutivo, o que significa que a instância executiva se inicia pela propositura da execução e é no requerimento executivo que a parte tem de definir: - Quer os fundamentos da execução; - Quer a exequibilidade do título. Elementos que são oponíveis ao exequente desde o momento da propositura da execução e apenas a partir da citação são oponíveis ao executado – vide artigos 259º e 206º do Código de Processo Civil;
7ª - Preceitua o artigo 704º do Código de Processo Civil, no seu número 1, que “a sentença só constitui título executivo depois do trânsito em julgado, salvo se o recurso contra ela interposto tiver efeito meramente devolutivo”;
8ª - Assim, a regra é que só é exequível a sentença condenatória transitada em julgado, a qual conhece apenas uma exceção que é a sentença condenatória pendente de recurso com efeito meramente devolutivo;
9ª - O executado/embargante quando interpôs recurso do Douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, e isto em 08.01.2021, requereu que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo;
10ª - Assim é que foi tal recurso admitido pelo Tribunal da Relação e subiram os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o qual, pela Decisão Singular proferida em 25.05.2021 decidiu não conhecer do recurso interposto;
11ª - Desta decisão singular o ora recorrente, em 07.06.2021 reclamou para a Conferência ao abrigo do preceituado no n.º 3 do art.º 652º do C. P. Civil, tendo sido proferido Acórdão em Conferência em 07.07.2021, o qual, decidiu não conhecer do objeto do recurso;
12ª - Isto posto, aquando da propositura da ação executiva em 04.05.2021 não havia, ainda, transitado em julgado o Douto Acórdão, dado como título executivo, aliás diga-se em prol do rigor e da verdade, que a exequente intenta a ação executiva, 21 dias antes da prolação da Decisão singular,
13ª - E como se disse já, de acordo com o art.º 704º n.º 1 do C. P. Civil a regra é só ser exequível a sentença condenatória transitada em julgado, a qual apenas conhece uma exceção que é a sentença condenatória pendente de recurso com efeito meramente devolutivo;
14ª - Ora, estava pendente um recurso, ao qual foi peticionado o efeito suspensivo, logo a exequente deveria ter aguardado pelo despacho sobre a atribuição do efeito do recurso,
15ª - O qual teria de ser sempre proferido pelo Tribunal superior, neste caso o Supremo Tribunal de Justiça.
16ª - Pelo que, ao assim não ter procedido, é manifesta a falta de exequibilidade da sentença,
49. Ora, depois do despacho de 21 de Junho de 2021, o Executado, agora Recorrente, conhecia ou em todo o caso devia conhecer a falta de fundamento da sua pretensão — caso o conhecesse, a sua conduta processual ser-lhe-ia imputável por dolo e, caso o desconhecesse, a sua conduta processual ser-lhe-ia imputável por culpa grave.
50. O raciocínio do acórdão recorrido deve subscrever-se — só com grande dificuldade poderia sustentar-se que, depois do despacho de 21 de Junho de 2021, o Executado, agora Recorrente, ainda desconhecesse sem culpa ou com culpa leve que a alegação da falta de título executivo era um fundamento improcedente.
51. Entendendo-se, como se entende. que deve subscrever-se o raciocínio do acordo recorrido, entende-se demonstrado, “de forma manifesta e inequívoca, que [o Executado] agiu […] com grave negligência, com o fito de impedir ou entorpecer a acção da justiça”.
52. Em consequência, tomando-se conhecimento do recurso de revista da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que condenou o Executado, agora Recorrente, como litigante de má fé, deverá confirmar-se a decisão impugnada.
III. — DECISÃO
Face ao exposto,
V. — não se toma conhecimento do recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que confirmou o despacho que fazia depender o efeito suspensivo do recurso da prestação de caução de 30.000,01 euros “em dinheiro (mediante depósito à ordem dos autos) ou garantia bancária no mesmo valor”;
VI. — nega-se provimento ao recurso, na parte em que condenou o Executado, agora Recorrente, como litigante de má fé, e, nessa parte, confirma-se o acórdão recorrido.
Custas pelo Recorrente BB, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe tenha sido concedido.
Lisboa, 27 de Abril de 2023
Nuno Manuel Pinto Oliveira (Relator)
José Maria Ferreira Lopes
Manuel Pires Capelo
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[1] Cf. designadamente os acórdãos do STJ de 22 de Fevereiro de 2018 — processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1 — e de 26 de Novembro de 2019 — processo n.º 1320/17.0T8CBR.C1-A.S1.
[2] Cf. acórdão do STJ de 22 de Fevereiro de 2018 — processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1.
[3] Cf. António Santos Abrantes Geraldes / Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa, anotação ao art. 637.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. I — Parte geral e processo de declaração (artigos 1.º a 702.º), Livraria Almedina, Coimbra, 2018, pág. 764.
[4] Sobre a interpretação do art. 542.º do Código de Processo Civil, vide por todos José Alberto dos Reis, anotação ao art. 465.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. II — Artigos 406.º a 486.º, Coimbra Editora, Coimbra, 1981 (reimpressão), págs. 254-275; José Lebre de Freitas / Isabel Alexandre, anotação ao art. 542.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. II — Artigos 362.º a 626.º, 3.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2018 (reimpressão), págs. 455-462; António Santos Abrantes Geraldes / Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa, anotação ao art. 542.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. I — Parte geral e processo de declaração (artigos 1.º a 702.º), Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 593-594; Paula Costa e Silva, A litigância de má fé, Coimbra Editora, Coimbra, 2008; António Menezes Cordeiro, Litigância de má fé, abuso de direito de acção e culpa in contrahendo, 3.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2014 (reimpressão); ou Pedro de Albuquerque, Responsabilidade processual por litigância de má fé. Abuso de direito e responsabilidade civil em virtude de actos praticados no processo, Livraria Almedina, Coimbra, 2006.
[5] Cf. designadamente o acórdão do STJ de 2 de Junho de 2016 — processo n.º 1116/11.3TBVVD.G2.S1 —, cujo critério é retomado, designadamente, pelo acórdão do STJ de 13 de Setembro de 2018 — processo n.º 687/17.5T8PNF.S1.