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AMPLIAÇÃO DO PEDIDO
APELAÇÃO AUTÓNOMA
PRESCRIÇÃO
EXCEPÇÃO PEREMPTÓRIA
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
Sumário
1 - O requerimento onde é pedida a ampliação do pedido constituiu um articulado para efeitos de recorribilidade autónoma nos termos do artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC. 2 - Não se enquadra nos pressupostos da ampliação do pedido a alegação da exceção de prescrição que podia e devia ter sido articulada em sede de petição de embargos, porquanto a prescrição é uma exceção perentória, que carece de ser invocada como meio de defesa em sede e no momento temporal próprio, sob pena de preclusão da sua invocação. (Sumário elaborado pela Relatora)
Texto Integral
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora
I – RELATÓRIO
AA e BB, executados na execução ordinária (Agente de Execução) para pagamento de quantia certa, contra si intentada por CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A., em 28-09-2020, deduziram embargos de executado alegando a nulidade da citação, a inexequibilidade do(s) título(s) executivo(s), a nulidade do título por violação do dever geral de informação em contrato de adesão e a inexigibilidade da quantia exequenda por falta de resolução e da impugnação da liquidação (aqui incluindo a alegação da prescrição dos juros), concluindo pela extinção da execução, sem prejuízo da sua imediata suspensão.
A Exequente/Embargada contestou ou embargos, concluindo pela improcedência dos mesmos.
Em 07-11-2022, os Embargantes vieram «Ampliar o Pedido para que, para além da prescrição de juros, seja também conhecida a prescrição do capital e comissões, nos termos do Artº 265, 731.º, 732, 734 do CPC e 310 e), d) e g) do C. Civil (…).», concluindo a final: «Pelo exposto, nos termos do Acórdão n.º 6/2022 de 30-6-2022 in Diário da República n.º 184/2022, Série I de 2022-09-22, páginas 5-15, deverá ser admitida a ampliação do pedido de prescrição e serem declarados prescritos além dos juros, também ser reconhecida a prescrição do capital e das comissões peticionadas, extinguindo-se a execução na sua totalidade.»
A Embarga pronunciou-se sobre o requerimento supra referido como consta do seu requerimento de 18-11-2022, defendendo a aplicação ao caso do prazo de prescrição ordinário de 20 anos, sendo exigível à data da execução o capital peticionando, remetendo, ademais, para o alegado na contestação dos embargos.
Na audiência prévia realizada em 08-11-2022, foi apreciado o requerimento dos Embargantes nos seguintes termos:
«Ref. ª 6839078, de 07-11-2022: Salvo o devido respeito, pensamos que não está em causa uma ampliação do pedido, mas antes a alegação de um meio de defesa que não foi invocado na petição. Sendo que a questão que se coloca é a de saber se este novo meio de defesa podia ser invocado pelos executados depois de deduzidos os embargos. Vejamos. Como se refere no acórdão da RL de 05.03.2020, proc. n.º 21927/15.0T8LSB-A.L1-2, disponível em www.dgsi.pt, “A dívida de juros, tal como todas as prestações que constituem o correspetivo do gozo de coisas fungíveis, (o que ocorre também na mora, já que o decurso do tempo sem a disponibilização do capital beneficia o devedor e prejudica o credor), detém certa autonomia em relação à dívida de capital que corresponde à prestação obrigacional do contrato celebrado, pelo que cada uma dessas dívidas, com alguma independência entre si está sujeita também a prescrição própria[9].”. Com a dedução da oposição à execução por embargos, ficou precludido o direito de os executados deduzirem as exceções que ali não alegaram, pelo que a alegação da prescrição viola o princípio da preclusão do direito de aqueles invocarem matéria de exceção (vide Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, CPC Anotado, vol. 3, pág. 323). É certo que a jurisprudência dominante, em face do disposto no n.º 2 do art. 573º do CPC, tem vindo a reconhecer que podem ser apreciadas as exceções de conhecimento oficioso, sem que a sua invocação esteja sujeita ao princípio da preclusão, como sucede com quase todas as exceções dilatórias (art. 578º) e com grande parte das exceções perentórias (art. 579º), o pode sempre ter lugar até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados - cf. arts.726º, n.º 2, b) e c), e 734º do CPC. Porém, como a prescrição constitui uma exceção perentória que não é do conhecimento oficioso (art. 303º do CC), o princípio da preclusão não pode deixar de funcionar, não podendo os executados invocar agora uma exceção que não alegaram nos embargos. E ponto é que nada obstava a que a prescrição agora invocada tivesse sido logo alegada na petição, tal como sucedeu com a prescrição do crédito de juros. Afigura-se-nos, por isso, que não estamos perante um meio de defesa superveniente, nos termos do n.º 2 do art. 573º do CPC, norma que abrange quer os casos em que o facto em que eles se baseiam se verifica supervenientemente (superveniência objetiva), quer aqueles em que esse facto é anterior à contestação, mas só posteriormente é conhecido pelo demandado (superveniência subjetiva) – cf. acórdão do STJ de 11.03.2021, proc. n.º 1299/17.9T8LRA.C1.S1, in www.dgsi.pt Pelo que vem de ser exposto, julgando precludido o direito de os embargantes alegarem a exceção da prescrição do crédito de capital e das comissões peticionadas, indefiro o requerido.»
No mais, foi proferido despacho saneador tabelar.
Foi ainda definido o objeto do litígio, enunciados os temas da prova, apreciado o pedido de aditamento do rol de testemunhas dos Embargantes e desigando dia para a audiência de discussão e julgamento.
Foi relegado para final o conhecimento da exceção de prescrição do crédito de juros.
Inconformados, apelaram os Embargantes interpondo apelação autónoma do despacho que apreciou o requerimento em que ampliaram o pedido, bem como do «(…) despacho saneador ao não conhecer oficiosamente do não cumprimento ou integração dos executados no regime de PERSI, depois de indeferir a ampliação do pedido e o não conhecimento da prescrição.»
Por despacho proferido em 27-01-2023, foi admitido o recurso do despacho que indeferiu o requerimento dos Embargantes onde pedem a ampliação do pedido, alegando a prescrição do capital e das comissões peticionadas, como apelação em separado, com subida imediata e efeito meramente devolutivo e, simultaneamente, não admitiu o recurso interposto do despacho saneador, por ter sido entendido que o mesmo não é passível de recurso.
Os Embargante apresentaram as seguintes CONCLUSÕES (que apenas se transcrevem em relação ao recurso admitido):
«1. O despacho recorrido de 18-11-22 é proferido em ata na audiência prévia e portanto integra a previsão do Art° 644 do CPC n° 1 b) que prescreve que cabe recurso do despacho saneador, neste caso da decisão que não conheceu da prescrição, sem pôr termo ao processo, decidiu do mérito da causa, e absolveu da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos.
2. Deve ser admitida a subida imediata do recurso pois verifica-se também a aplicabilidade das alíneas 2 d) e h) do Art° 644 do CPC ao despacho impugnado, uma vez que os requerimentos de 7/11 e 16/11, devem considerar-se articulados e meios de prova, para os efeitos da citada disposição legal.
3. A impossibilidade de subida do presente recurso nesta fase torna-o inútil, uma vez que a prescrição evitaria o julgamento, no sentido do máximo aproveitamento do processo para a solução definitiva do concreto litígio que opõe as partes.
4. A decisão de 18-11-22 em recurso incorre em erro de julgamento com preterição dos fundamentos legalmente exigidos para a admissibilidade de ampliação do pedido, incorrendo ainda em incongruência entre a fundamentação e a decisão tomada a final e em omissão de pronúncia.
5. A decisão impugnada, limitou-se a contornar a analise dos fundamentos legalmente exigidos para a admissibilidade de ampliação do pedido, e deslocou a questão para a preclusão e para a impossibilidade do conhecimento oficioso.
(…)
7. É admissível nos presentes Embargos, o pedido ampliado de prescrição do capital e comissões sendo uma "consequência" natural e "desenvolvimento" logico do pedido primitivo, ou seja, pediu-se a prescrição dos juros, e em face da evolução Jurisprudência Uniformizada nos últimos dois anos, impõe-se a ampliação de tal pedido, para agora ser conhecida também a prescrição do capital, não sendo admissível o concurso de duas prescrições com prazos distintos sobre as mesmas prestações compósitas, funcionando uma em relação aos juros e outra em relação ao capital.
8. Em face do teor do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n° 6/2022 de 30-6-22, proferido em julgamento ampliado de Revista no processo 1736/19.8T8AGDB onde a Caixa Geral de Depósitos SA também foi interveniente, justifica-se a ampliação do pedido para que seja conhecida a prescrição, não só dos juros peticionados, mas também o capital e comissões, peticionados pela Embargada com base num escrito "contrato de mútuo" junto com o requerimento executivo.
9. Os requerimentos dos Embargantes apresentados em 7/11/22 e 16/11/22, visaram uma ampliação parcial de um dos pedidos formulados na petição inicial de embargos, a prescrição de juros, sem implicar qualquer alteração dos pressupostos de facto.
10. No caso dos autos, desde a dedução dos Embargos em 2020 até 2022, a Jurisprudência Uniformizadora evoluiu no sentido de que, nos termos das alíneas d) e e) do art° 310° do CC, prescrevem no prazo de cinco anos os juros convencionais ou legais ainda que ilíquidos e as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros pelo que não faz agora sentido analisar somente a prescrição dos juros que é o caso do mútuo junto com o requerimento executivo.
11. A decisão recorrida viola a Jurisprudência do recente Acórdão de 8/11/22 do Supremo Tribunal de Justiça, que respaldando-se no AUJ n° 6/22, afastou qualquer dúvida sobre a possibilidade de ampliação do pedido como aquele que é deduzido no caso dos autos, nessa jurisprudência afirma-se que não podia ser outra a solução de prescrição total do crédito, pois que seria, no mínimo, estranho, o concurso de duas prescrições com prazos distintos sobre as mesmas prestações compósitas, funcionando uma em relação aos juros e outra em relação ao capital.
12. Em face da Jurisprudência supra citada se constata o desacerto da decisão recorrida ao ignorar a ampliação do pedido e ao deslocar a questão para o conhecimento oficioso.
13. Pelo exposto, deve ser permitida a ampliação do pedido de prescrição para abranger o capital, pois constata-se que o pedido de prescrição do capital de €23.934,27, não foi formulado logo na petição inicial de Embargos, mas é um desenvolvimento do pedido de prescrição de juros e a Jurisprudência e as entidades bancárias defendiam ser aplicável o prazo prescricional de 20 anos para o capital e comissões, como resulta da Jurisprudência invocada na contestação da exequente.
14. A decisão recorrida deve ser revogada, pois releva em face do Acórdão n° 6/2022 de 30-06-2022 o princípio da economia processual que se invocou, pois estamos em sede de audiência prévia e despacho saneador e não se põe em causa um mínimo de estabilidade na relação jurídica processual em que assenta o conflito e que motiva a concreta reclamação da tutela jurisdicional.
15. Deve ser revogada a decisão recorrida e ser admitida a ampliação do pedido, porque não se está a suscitar de qualquer situação de facto nova, que represente uma verdadeira surpresa, completamente inesperada para a Embargada e relativamente à qual não pudesse legitimamente estar a contar.
16. O art° 298°, n° 1 do Código Civil, estipula que estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição, para os credores não acumularem excessivamente os seus créditos, e para proteger o devedor contra a acumulação da sua dívida.
17. Os Embargantes, na qualidade de fiadores, têm o direito de arguir a prescrição do capital e comissões e ampliar o pedido de prescrição de juros, para que seja extinta na totalidade, a presente execução, nos termos dos Art° 265 do CPC e 304° e 310, b) e) d) e g) do C.Civil.
18. A ampliação do pedido deveria ter sido admitida pois actualmente não tem cabimento legal o concurso de duas prescrições com prazos distintos sobre as mesmas prestações compósitas, funcionando uma em relação aos juros e outra em relação ao capital.
(…)».
A Embargante respondeu ao recurso defendendo, para além do mais, que a decisão que se pronunciou sobre o pedido em que é deduzida a exceção perentória da prescrição em momento posterior ao da oposição em sede de embargos, não é recorrível, porquanto: (i) o requerimento não consubstancia um articulado nos termos da lei processual civil; (ii) não visa apresentar um meio de prova relacionado com os temas de prova; (iii) não se enquadra nos pressupostos legais da dedução de articulado superveniente; e (iv) nem a retenção do recurso o torna absolutamente inútil.
II- FUNDAMENTAÇÃO
A- Objeto do Recurso
Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), no caso, impõe-se apreciar:
Questão prévia: da recorribilidade do despacho proferido sobre o requerimento onde é peticionada a ampliação do pedido;
- Sendo o recurso admitido: se estão verificados os pressupostos da requerida ampliação do pedido.
B- De Facto
Os factos e ocorrência processuais relevantes para o conhecimento do recurso consta do antecedente Relatório.
C- De Direito
1. Questão prévia: da recorribilidade do despacho proferido sobre o requerimento onde é peticionada a ampliação do pedido
Por razões de economia processual, justifica-se que seja nesta sede feita a apreciação da questão suscitada pela Apelada da admissibilidade do recurso, porquanto a mesma é manifestamente improcedente.
Como consta do requerimento dos Embargantes apresentado nos autos em 07-11-2022, deduzem um pedido de ampliação do pedido em ordem a que também seja conhecida a prescrição do capital e das comissões (a prescrição dos juros tinha sido invocada na petição dos embargos), ao abrigo dos artigos 265.º, 731.º, 732.º e 734.º do CPC, culminando o dito requerimento com o correspondente pedido de admissão da ampliação do pedido e a extinção da execução na sua totalidade por procedência da alegada exceção de prescrição.
Independentemente da admissibilidade do que foi peticionado por via do requerimento apresentado, ou seja, se é admissível a ampliação do pedido nos termos em que foi formulado, a questão prévia em apreciação é se, sendo o requerimento qualificado desse modo, como o foi pelos Embargantes e pelo Tribunal a quo, o despacho interlocutório que incidiu sobre o mesmo é ou não autónoma e imediatamente recorrível ao abrigo do artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC, ex vi do artigo 853.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do CPC, tendo em conta que o recurso foi admitido precisamente ao abrigo do referido artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC.
Estipula o artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC, que «Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância: (…) d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova;».
O normativo reporta-se a articulados ou meio de prova, sendo que, no caso presente, por os Embargantes nenhum meio de prova terem requerido, o que está em causa é o segmento referente à admissão ou rejeição de articulado.
Os articulados encontram-se definidos na norma geral inserta no artigo 147.º do CPC, estipulando o n.º 1 que «Os articulados sãoas peças em que as partes expõem os fundamentos da ação e da defesa e formulam os pedidos correspondentes.»
O conceito de articulado é caraterizado pela função que desempenha no processo. A dedução por artigos, obrigatória quando haja mandatário constituído (cfr. n.º 2 do preceito), embora esteja na origem do termo, na atualidade a definição de articulado não atende à forma que revestem as peças, mas sim ao fim a que se destinam.
A finalidade pressuposta à noção de articulado é a de servir para expor os fundamentos da ação ou da defesa, formulando-se no mesmo o(s) pedido(s) correspondente(s).
Como refere o Prof. Alberto dos Reis, «Podemos, pois, condensar a função dos articulados nesta fórmula: os articulados servem para introduzir a lide no processo, para estabelecer os termos exactos do litígio entre o autor e o réu».[1]
Os embargos de executado, deduzidos por apenso a uma execução, têm natureza declarativa, pelo que são articulados, entre outros, a petição de embargos (artigo 728.º do CPC), a contestação/oposição (artigo 732.º, n.º 2 do CPC), bem como os articulados supervenientes previstos em sede de processo comum, tramitação que os embargos prosseguem após a contestação oposição (parte final do n.º 2 do citado artigo 732.º do CPC).
A ampliação do pedido prevista nos artigos 264.º e 265.º do CPC operacionaliza-se por meio de requerimento e visa introduzir uma modificação objetiva da instância constituindo uma exceção ao princípio da estabilidade da instância consagrado no artigo 260.º do CPC, sendo um acrescento, um aumento do pedido primitivo e apenas pode ser requerida pelo autor.
Atenta a finalidade desse requerimento o mesmo comunga das caraterísticas que o legislador menciona na definição de articulado no artigo 147.º do CPC, ou seja, corresponde ao meio processual através do qual a parte, deduz por artigos (i.e., articula), a sua pretensão e o pedido correspondente.
Consequentemente, a não admissão ou indeferimento por o mesmo não ser admissível, significa a rejeição de um articulado para os termos e efeitos do artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC.
Nestes termos, é admissível a interposição de recurso autónomo do despacho impugnado, improcedendo, assim, a questão prévia suscitada pela Apelada.
2. Do conhecimento do mérito do recurso: da verificação dos pressupostos da requerida ampliação do pedido
Entendeu o Tribunal a quo que o requerimento apresentado não podia ser qualificado juridicamente como uma ampliação do pedido, mas antes um meio de defesa (exceção perentória de prescrição), que não foi invocado na oposição por embargos e, não sendo de conhecimento oficioso, aplica-se-lhe o princípio da preclusão, não podendo os Embargantes deduzirem agora uma exceção que não alegaram nos embargos.
Acrescentando que nada obstava a que a exceção tivesse logo sido alegada na dedução dos embargos tal como sucedeu com a prescrição do crédito de juros. Desse modo, concluiu que não se está perante um meio de defesa superveniente objetiva ou subjetiva, nos termos do n.º 2 do artigo 573.º do CPC, razão pela qual indeferiu o requerimento em apreciação.
Os Apelantes contrapõem, em suma, que a decisão não analisou os fundamentos da ampliação do pedido e deslocou a análise para a preclusão e para a impossibilidade de conhecimento oficioso da prescrição.
Ademais, defendem, que estão preenchidos os pressupostos da ampliação do pedido inicial de prescrição de juros em relação ao capital e comissões, configurando-se tal como um desenvolvimento daquele pedido inicial, ancorado na evolução da jurisprudência acolhida no AUJ n.º 6/22, de 30-06-2022.
Vejamos, então, se lhes assiste razão.
Os Embargantes na petição de embargos, apresentada em juízo em 28-09-2020, invocaram a exceção de prescrição dos juros, alegando concretamente no artigo 57.º que a Embargada «(…) vem pedir 10 anos de juros, face ao disposto no Artº 310 do C. Civil, pelo que fica desde já alegada a prescrição da quantia exequenda, nessa parte.»
Ao longo do demais articulado, os Embargantes não alegaram a prescrição do capital e comissões, pelo que temos como assente que não foi invocada a prescrição dessas componentes da dívida exequenda.
Com decorre do artigo 728.º do CPC, os executados podem opor-se à execução mediante embargos, assumindo essa oposição a natureza equivalente à petição inicial da ação declarativa, pelo que as exceções que pretendam deduzir contra a pretensão executiva, devem ser alegadas naquela peça processual, sob pena de preclusão do direito de invocação de matéria excetiva.
Como refere RUI PINTO[2], «(…) a necessidade de segurança jurídica e a autorresponsabilidade do executado justificam que a petição de oposição se reja pelo princípio da concentração da defesa, previsto no artigo 573º nº 1: toda a defesa do executado deve ser deduzida na oposição à execução.»
Acrescentando, ainda, que do n.º 2 do artigo 728.º do CPC, decorre que «(…) esgotada a oportunidade processual dada pelo nº 1 [dedução de oposição no prazo de 20 dias a contar da citação], apenas se admite matéria superveniente, conquanto seja matéria dos artigos 729º a 731º e não outra; a contrario não pode o opoente trazer factos, impugnações e exceções, perentórias e dilatórias, cuja alegação omitira. Não vale, pois, na oposição à execução, a ressalva final do n.º 2 do artigo 573º que admite que na ação declarativa, mesmo depois da contestação, a parte passiva possa alegar exceções de conhecimento oficioso, ainda que não alegadas e não supervenientes.».
Significa este regime que não tendo sido deduzida a exceção de prescrição do capital e comissões na petição de embargos ficou precludido o direito dos Embargantes virem posteriormente invocar aquela exceção.
Acresce que não sendo a mesma de conhecimento oficioso, como decorre dos artigos 576.º, n.ºs 1 e 3, 579.º do CPC e artigo 303.º do Código Civil, também o Tribunal a quo estava impedido de a apreciar.
Nestes termos, se pronunciou o despacho recorrido sem que mereça qualquer censura quanto ao assim decidido.
Dizem os apelantes que, desse modo, se contornou a questão da dedução de ampliação do pedido e a análise dos respetivos pressupostos.
Ora, tendo a exceção sido alegada em momento processual incompatível com a tramitação dos embargos, afigura-se-nos inquestionável a desnecessidade de aferição dos pressupostos formais da dedução da ampliação do pedido quando, substancialmente, está vedada aos Embargantes a dedução de tal exceção. Não ocorrendo, assim, qualquer omissão de pronúncia ou incongruência por parte do tribunal recorrido.
De qualquer modo, sempre se dirá que, mesmo que hipoteticamente pudesse ser invocada a exceção de prescrição através do mecanismo da ampliação do pedido, a mesma sempre estaria votada ao insucesso.
Senão, vejamos.
Os Embargante deduziram a exceção de prescrição ao abrigo do artigo 265.º, n.º 2, do CPC, que estipula: «O autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.»
Todavia, este preceito não se aplica ao caso, porquanto existe uma relação de autonomia entre o crédito de juros e o crédito principal como consignado no artigo 561.º do Código Civil, ao estipular que «Desde que se constitui, o crédito de juros não fica necessariamente dependente do crédito principal, podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o outro.»
É sabido que a obrigação de juros é acessória da relação jurídica estabelecida em relação ao capital e demais prestações conexas com este, podendo constituir-se e extinguir-se autonomamente, desde logo, porque se rege por regras próprias quanto à cedência e extinção, como decorre do citado artigo 561.º, mas também porque lhe são aplicáveis diferentes prazos de prescrição (artigos 309.º e 310.º, alínea d), Código Civil).
Deste modo, e como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa de 06-06-2015, «(…) perante a apontada independência, não se estranhará, por isso que os juros possam continuar a ser devidos, mesmo que prescrita a dívida de capital, podendo neste caso, exigir-se todos os anteriores de há menos de cinco anos.
Com efeito e como ensina o Professor Antunes Varela, embora a obrigação de juros pressuponha a dívida de capital e, neste aspecto, possa considerar-se uma obrigação acessória, contudo a relação de dependência entre as duas obrigações não obsta a que, uma vez constituído, o crédito de juros se autonomize. Pode, na verdade, o credor ceder, no todo ou em parte, o seu crédito de juros e conservar o crédito relativo ao capital; pode, pelo contrário, ceder a outrem o crédito do capital e manter para si, no todo ou em parte, o crédito dos juros vencidos. E é perfeitamente possível, por outro lado, que se extinga por qualquer causa o crédito principal, e persista o crédito dos juros vencidos, ou que, inversamente, se extinga este último e se mantenha íntegro o primeiro.»[3]
Decorre, assim, do regime legal acima referido, que a alegação da prescrição do capital e comissões não corresponde a uma ampliação, a um desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo baseado na alegação da prescrição do crédito de juros, donde, no caso, não tem efetivamente aplicação o disposto no artigo 265.º, n.º 2, do CPC.
No que concerne à jurisprudência uniformizadora que adveio do AUJ n.º 6/2022, de 20-06-2022, tal argumento nunca poderia suportar a ampliação do pedido nos termos requeridos, porquanto a ampliação tem sempre de se ancorar em factos, objetiva ou subjetivamente supervenientes, e não em interpretações jurisprudenciais ou doutrinais da lei em vigor à data em que as pretensões são deduzidas em juízo.
Ademais, a questão controvertida decidida pelo referido AUJ já o era à data de entrada da petição de embargos, pelo que bem poderiam os Embargantes ter deduzido a exceção de prescrição adotando uma das teses em confronto sobre a questão que veio a ser dirimida em termos uniformizadores.
Em síntese: Não se enquadra nos pressupostos da ampliação do pedido a alegação da exceção de prescrição que podia e devia ter sido articulada em sede de petição de embargos, porquanto a prescrição é uma exceção perentória, que carece de ser invocada como meio de defesa em sede e no momento temporal próprio, sob pena de preclusão da sua invocação.
Nestes termos, improcede a apelação, nenhuma censura merecendo a decisão recorrida.
3. Responsabilidade por custas
Dado o decaimento, as custas ficam a cargo dos apelantes (artigo 527.º do CPC), sendo a taxa de justiça do recurso fixada pela tabela referida no n.º 2 do artigo 6.º do RCP, encontrando-se os apelantes dispensados do seu pagamento por beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos.
III- DECISÃO
Nos termos e pelas razões expostas, acordam em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas nos termos sobreditos.
Évora, 16-03-2023
Maria Adelaide Domingos (Relatora)
José Lúcio (1.º Adjunto)
Manuel Bargado (2.º Adjunto)
__________________________________________________
[1] ALBERTO DOS REIS, Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 2.º, Coimbra Editora, 1945, p. 98.
[2] RUI PINTO, A Ação Executiva, AAFDL, 2020, Reimpressão, p. 409-410.
[3] Ac. RL, de 04-06-2015, proc. n.º 143342/14.6YIPRT.L1-8 (Sacarrão Martins), em www.dgsi.pt.