CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
DIMINUIÇÃO DA RETRIBUIÇÃO
ALTERAÇÃO ANORMAL DAS CIRCUNSTÂNCIAS
NEXO DE CAUSALIDADE
IMPOSSIBILIDADE DO CUMPRIMENTO
IMPOSSIBILIDADE OBJETIVA
ACEITAÇÃO TÁCITA
RECURSO
OBJETO DO RECURSO
CONCLUSÕES DA MOTIVAÇÃO
PODERES DE COGNIÇÃO
Sumário


I. Destinando-se os recursos a apreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, devem as partes, nas suas alegações, conter-se no que foi decidido, sucedendo que o nosso modelo é de reponderação, visando o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame no sentido da repetição da instância no tribunal de recurso.
II. Para que as consequências que a crise de 2008 provocou fossem consideradas, num caso como o dos autos, seria necessário, num juízo de causalidade adequada, demonstrar factualmente que elas acarretaram a impossibilidade de cumprir as obrigações a que a Ré se encontrava adstrita, de modo que se pudesse concluir que a imposição da satisfação das prestações ao A. constituía um sacrifício contrário aos ditames da boa fé (que deve regular a execução dos contratos), ou seja, impunha-se a demonstração da correlação directa entre a indicada crise e a situação concreta da Recorrida, em termos de ter sido tal crise a tornar impossível ou excessivamente oneroso o cumprimento da sua obrigação para com o Autor.
III. Não se provando que o A. tenha aceitado a redução da retribuição, após a modificação do contrato, que alterou o seu desenho de molde a não o deixar dependente do número de horas leccionadas ou do número de alunos, não podia essa redução ser unilateralmente levada a efeito pela Ré.

Texto Integral


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I



AA veio intentar acção declarativa com processo comum contra COFAC – COOPERATIVA DE FORMAÇÃO E ANIMAÇÃO, CRL, pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe as retribuições satisfeitas pelo serviço de docência e o valor acordado de 2.500,00€, no montante de 36.182,61€, acrescido de juros de mora, contados desde a data do vencimento de cada uma das prestações até integral pagamento.

Alegou que:

No âmbito da actividade da R., que explora um estabelecimento de ensino superior privado, o A. celebrou um contrato que as partes denominaram de “Contrato de Docência em Regime de Tempo Integral”, em 2008, passando a leccionar as disciplinas que a R. lhe atribuía, fazendo avaliação de conhecimentos, prestando assistência aos alunos, orientando teses e estágios, participando nos órgãos de gestão da Universidade e representando a mesma em diversos eventos de âmbito académico.

A R. pagava, por cada hora lectiva, o valor de 25.50€, até 12h lectivas semanais, e o valor de 30,00€ a partir de 12h lectivas semanais.

Esta retribuição era paga mensalmente, catorze vezes por ano, incluindo o período em que a Universidade estava encerrada para férias e em que o A. não prestava serviço.

Após a obtenção, em 01-07-2010, do grau académico de Doutor, celebrou, em 01-10-2010, com a R. um aditamento ao contrato, ficando estabelecido que o A. passaria a auferir a quantia de 2.500,00€, sujeita aos devidos descontos.

A partir de Fevereiro de 2012, a R., sem consentimento do A. e sem qualquer comunicação, operou a redução do valor da retribuição, tendo passado a pagar-lhe o valor mensal de 2.250,00€, em Março de 2013, 2.137,50€ e, em Novembro de 2014, pelos serviços prestados em Outubro, 280,80€, e o mesmo montante em Dezembro, relativamente a Novembro.

O A. resolveu o contrato por carta recebida em 13-01-2015, não prestando mais trabalho.


A R. contestou, alegando que:

A carga horária lectiva foi sempre acordada, distribuída e fixada por semestre lectivo entre o docente, aqui A, e a direcção/secretariado dos órgãos académicos.

Essa carga horária podia ser aumentada ou diminuída ou até excluída, com a correspondência dos honorários do A, sendo estes em função do número de horas lectivas efetivamente leccionadas por aquele.

Face à sua alteração da categoria académica, estando já em tempo integral, passou a receber, a título de honorários, 2.500,00€ mensais.

Acontece que, a partir do ano lectivo de 2012/2013, perante a severa redução de candidatos, entendeu-se proceder à redistribuição do serviço docente a todos os docentes vinculados à R., independentemente do figurino contratual, reduzindo os custos para se manter em funcionamento, pelo que, perante a falta de liquidez em Outubro de 2014, foi impelida a voltar à equação de antes da assinatura do documento complementar de 2010, o que foi tacitamente aceite pelo A, reconhecendo tão-só ser devedora de 5.221,60€ líquidos.

Concluiu que as alterações produzidas no vínculo contratual se deveram a razões de ordem económico-financeira, justificando-se como um caso de força maior, inexistindo causa objectiva para a resolução do contrato.


Teve lugar audiência prévia, com prolação de despacho saneador, identificação do objecto do litígio e selecção de temas da prova.

Prosseguindo os autos, realizou-se a audiência de discussão e julgamento e proferiu-se sentença, na qual se julgou a acção parcialmente procedente, condenando-se a Ré no pagamento de cinco mil duzentos e vinte um euros e sessenta cêntimos, que a Ré confessa.


Inconformado, recorreu o A. para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde foi prolatado acórdão que julgou procedente a apelação, revogando a sentença sob recurso e condenando a Apelada a pagar ao Apelante as diferenças entre o montante mensal satisfeito a partir de fevereiro de 2012, e a quantia mensal estabelecida de 2.500,00€, paga 14 vezes por ano, acrescidas dos juros de mora legais, contados desde cada prestação devida, até integral pagamento.


Irresignada, a R. interpôs recurso de revista, concluindo as suas alegações pela seguinte forma:

«1. O Acórdão recorrido está, salvo o devido respeito, que é muito, eivado de erros na apreciação do mérito da causa, na parte em que determina que a Ré não tinha o direito a renegociar a contraprestação percebida pelo Autor no contrato de docência.

2. A R., aqui Recorrente, não pode conformar-se com a decisão de mérito proferida a coberto do Acórdão em apreço, quer no tocante à decisão sobre a matéria de facto (parcial), mas principalmente no tocante à decisão de direito.

3. Ademais, a qualificação de uma determinada prestação como subsídio de férias, subsídio de natal, pressupõe a existência de um contrato de trabalho, não podendo tais expressões ser levadas à matéria assente - Acórdão da Relação de Coimbra de 26-03-2015 publicado no www.dgsi.pt.

4. É ilegal, assim, o ponto 13 da matéria de facto assente decidida pelo Tribunal da Relação no Acórdão ora recorrido, onde constam as expressões “subsídio de férias” e “subsídio de natal”, impondo-se, assim, a eliminação oficiosa da matéria assente, revogando-se a decisão recorrida, também nesta parte.

5. Não obstante, entende a R., ora Recorrente, que a conclusão jurídica extraída pelo Tribunal a quo quanto aos reajustes remuneratórios e renegociação operada pela Ré, decorrente da crise financeira e económica que assolou Portugal e, em particular a Ré como entidade instituidora de um estabelecimento de ensino superior privado, não está em conformidade com a Lei.

6. A questão decidenda subsume-se a aferir se tem o Autor direito ao pagamento pela Ré, aqui Recorrente, da quantia que corresponde ao diferencial entre o valor que lhe foi efectivamente pago a título de contraprestação pelo serviço docente, deste de Fevereiro de 2012 até à cessação do contrato, em Janeiro de 2015.

7. Isto é, se a Ré e o Autor, no âmbito de um contrato de prestação de serviços de docência, subjugado ao direito civil, poderiam operar alterações ao contrato e poderiam renegociar o contrato caso as circunstâncias que conduziram à celebração do negócio se alterassem. E, antecipa-se, a resposta apenas pode ser positiva!

8. Tanto o Autor como a Ré, aqui Recorrente, poderiam e concretizaram, a todo o tempo, renegociar elementos do contrato, e consequentemente denunciá-lo, nos termos convencionados no documento escrito.

9. Ora é consabido, como salienta o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-05-2017, que não obstante expressar o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo que o regime da contratação do pessoal docente para ministrar ensino nos estabelecimentos de ensino superior particular ou cooperativa “consta de diploma próprio e que o diploma mencionado estabelece o regime do contrato do trabalho dos docentes, bem como as condições em que se poderá recorrer ao contrato de trabalho”, tal diploma não existe, ainda, razão porque prima face serão tais contrato regulados pela lei geral laboral, ou seja, pelo Código do Trabalho, ou pelas normas do contrato de prestação de serviço constantes do Código Civil.

10. Também é ponto assente que ao invés do que se verifica com o pessoal docente do ensino superior público, cujas carreiras se mostram há muito – desde a aprovação do Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Novembro – reguladas em diploma/estatuto, já a situação/carreiras do pessoal docente nas instituições privadas de ensino superior não foram, ainda, - apesar das repetidas promessas do legislador – objecto de regulamentação própria/específica.

11. Manifesto é, portanto, que em relação à forma de contratação e em sede de regulamentação das carreiras dos professores do ensino superior privado e cooperativo, há muito que existe um vazio legislativo.

12. Não obstante, e precisamente em razão da ausência, ainda, de regulamentação própria/específica aplicável directamente, maior relevância assume em sede de fixação do conteúdo dos contratos de docência dos professores do ensino superior privado e cooperativo, o princípio da liberdade contratual/ou da autonomia privada, e o qual confere às partes a faculdade de fixarem livremente o conteúdo dos contratos, celebrarem contratos diferentes, de incluírem nestes as cláusulas que lhes aprouver e de, ao longo da relação contratual, renegociarem o contrato outorgado.

13. Esta prerrogativa reconhece-o a autoridade do Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 22 de Setembro de 2010, ao concluir que “a contratação de docentes do enino superior particular ou cooperativo opera-se num contexto de liberdade contratual (art.º 405.º do CC), podendo a instituição de ensino e o docente recorrer ao modelo de contratação que melhor se ajuste aos seus interesses.

14. Reconhecendo, inclusivamente, que, atentos os fins da Universidade e as características do exercício da docência no ensino superior privado, o contrato de prestação de prestação de serviço (flexível) é o que se mostra mais ajustado – vide, entre muitos outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-10-2011, publicado em www.dgsi.pt.

15. Com efeito, perante o que acabou de se expor, equivale dizer que, ao Autor e à Ré, e em sede de livre conformação do conteúdo do contrato que outorgaram e concretizaram, não estava de todo vedado socorrem-se de cláusulas atípicas especificamente concebidas apenas para a relação obrigacional estabelecida, nem tão pouco lhes estava vedado alterarem, na sua génese, algum elemento do contrato, nomeadamente a contraprestação a receber pelo Autor.

16. Provou-se terem as partes - certamente tendo presente aquele vazio legal - definido e auto-regulado, contratualmente (no contexto da liberdade contratual aqui prevalecente).

17. Ora, daquelas cláusulas contratuais não se extrai, por forma alguma, qualquer horário mínimo, e muito menos, qualquer retribuição mínima, na medida em que – conforme ficou demonstrado no facto 30 da matéria de facto dada como assente – a carga horária lectiva podia ser aumentada ou reduzida e, no limite, até excluída, de semestre para semestre!

18. Mesmo o documento complementar acordado entre as partes em que se previu um valor certo, sempre seria a termo e condicionado/acoplado à vigência do Contrato de Docência outorgado.

19. E quando o valor ali definido foi subtraído, o Autor aceitou tacitamente a sua redução, através de comportamentos concludentes – continuou a leccionar desde 2012 a 2015 – até à cessação do contrato. Vide facto provado 70!

20. Aquele Contrato de prestação de serviços atípico previa uma vigência pré-determinada e, nessa medida, é, portanto, inequívoco que as partes contraentes quiseram que tal contrato – tal como o documento complementar - ficasse sujeito a um termo certo.

21. Ora, in casu, atentas as especificidades da docência e as circunstâncias concretas do caso, impõe-se solução diversa daquela que foi dada pelo Tribunal da Relação de Lisboa!

22. Porquanto, ao recusar-se a impossibilidade de renegociar o contrato e reajustar alguns pontos do negócio jurídico celebrado entre as Partes, como faz o Acórdão recorrido, o docente, aqui Autor, estaria vinculado perante a R., com um vínculo definitivo, o que, como se provou, não estava!

23. Aliás, a Ré, caso obtivesse a indicação do órgão académico competente no sentido de dispensar o serviço docente, o Autor deixaria de perceber qualquer valor, mesmo quando recebia um valor fixo.

24. Dito de outro modo, a prevalecer tal solução, R. estaria obrigada a considerar o Autor integrado no quadro de docentes efectivos da U..., o que não pode suceder, até porque se encontra em manifesta contradição com o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra no Processo n.º 3749/15.0T8VIS.C1, decisão já transitada em julgado.

25. Portanto, desde logo pelas imediatas consequências práticas que dali resultariam, não se mostra aceitável que tal conclusão possa prevalecer.

26. Mas, além disso, outras razões existem para afastar tal solução erradamente adoptada no Acórdão recorrido.

27. Nomeadamente, no que toca à fórmula remuneratória contratualmente desenhada, a qual reporta à impossibilidade de a R. controlar uma variável que é, semestralmente, decisiva e determinante, ao nível da atribuição de serviço docente: a inscrição de alunos (o número de alunos inscritos nas disciplinas em cada semestre).

28. Como poderia a R. comprometer-se, ad eterno, a garantir ao docente uma retribuição certa, quando não domina aquela variável?

29. É esta e não outra a “mecânica” contratualmente fixada ab initio e que foi sendo executada ao longo dos diversos anos, e que o Autor nunca colocou em crise. – vide facto 30 a 38, 43 e 48

30. A interpretação seguida pelo Tribunal recorrido quanto aos reflexos retributivos num contrato de docência, com a fórmula remuneratória supra explicitada, celebrado ao abrigo da liberdade contratual – não se mostra compatível com o nosso programa constitucional.

31. Trata-se, portanto, de clara interpretação inconstitucional, que aqui fica expressamente invocada para todos os efeitos legais.

32. Ademais, também é relevante dada a natureza e as qualificações dos intervenientes (instituição de ensino e docente universitário).

33. In casu, sendo o Autor docente do ensino superior e a R. uma cooperativa de ensino, nada permite concluir que as partes se tivessem equivocado quanto ao tipo de contrato por eles  pretendido, quanto às cláusulas que nele pretenderam inserir e ao modo como executaram o vínculo obrigacional.

34. Também se releva o facto que o Autor desde a primeira renegociação contratual, máxime perante a redução da contraprestação percebida, nada tenha feito, nomeadamente a cessação do contrato através da denúncia contratual.

35. Sublinhe-se: a Ré operou a redução pelas razões alegadas em 2012 e o Autor apenas cessou o contrato em 2015.

36. Ou seja, o Autor aceitou, ainda que tacitamente, nos termos do art.º 217.º do Código Civil, os reajustes remuneratórios operados pela Ré.

37. Mais uma vez sublinhamos: o nível cultural e de conhecimentos inerentes às qualificações do docente – Doutor - e a natureza da R, que seguramente não desconheciam as implicações jurídicas decorrentes de um contrato de prestação de serviços, bem como não se afigura possível ignorar os instrumentos que o Autor tinha à sua disposição – nomeadamente assessoria jurídica – para perante uma proposta de renegociação contratual, não aceitar, concludentemente a mesma, e cessar o contrato. – o que não aconteceu!

38. E foi nesta premissa que o contrato de docência foi executado ao longo dos anos entre as partes!

39. A este propósito, certo é que o Tribunal a quo andou muito mal ao não ter dado a devida relevância às declarações negociais das partes vertidas no contrato de docência dos autos, mas também aquelas que demonstraram, com elevada segurança jurídica e factual, que o Autor e Ré ajustaram e renegociaram, à luz da liberdade contratual, o contrato de docência convencionado.

40. Ora, desse acordo escrito importa destacar, desde logo, a própria denominação atribuída e o teor de determinadas cláusulas.

41. Mais foi acordado que como contrapartida dos serviços prestados, seria paga retribuição mensal ilíquida, de acordo com a tabela em vigor para cada ano lectivo (cláusula 4ª), não tendo sido acordado qualquer salário ou retribuição fixa e pré-determinada, à excepção do período em que vigou o documento complementar.

42. Documento complementar que se subsumia, sublinhe-se, a um aditamento, manifestamente lateral, ao Contrato de Docência outorgado.

43. Tanto mais que não foi alegado, nem demonstrado, que, quer aquando da respectiva celebração, quer durante a sua execução, o docente tenha alguma vez colocado qualquer óbice, questão ou dúvida quanto aos termos essenciais da minuta contratual e ao modo como foram sendo concretizados os termos do contrato ao longo da sua execução.

44. Acresce que, o facto de não ter sido contratualizado qualquer salário ou retribuição certa – à excepção do período em que vigorou o documento complementar -, tendo antes o docente sido contratado com uma formula retributiva determinada em função das aulas efectivamente leccionadas – conforme resulta do contrato, e ficou provado – sendo que a atribuição dessas aulas dependia do número de alunos inscritos.

45. Esta é, com o devido respeito, a única interpretação compatível com a própria natureza das coisas.

46. Na realidade, quer no público, quer no privado, depende sempre e inquestionavelmente do número de turmas que abrem em cada ano lectivo e, por sua vez, este o número de turmas depende do número de alunos que também em cada ano se inscrevem no curso ou cursos da Faculdade onde o docente lecciona.

47. Tome-se o seguinte exemplo: se, no limite, num determinado ano, um curso não tivesse alunos inscritos, nem turmas para abrir nesse curso e o docente leccionasse somente nesse curso, não havendo qualquer outro horário disponível, como poderia a Instituição pagar a esse docente? O objecto para o qual tinha sido contratado inexistia.

48. Os factos apurados, quer quanto à génese da relação, quer quanto à execução do contrato, mostram uma clara partilha do risco entre a docente e a R., pois a contraprestação paga ao docente sempre esteve dependente da carga horária atribuída e aceite pelo docente, e variável de semestre para semestre, em função dos valores hora tabelados, e das horas lectivas efectivamente leccionadas, sendo que, por sua vez, tal carga horária do docente.

49. E partilharam esse risco durante a crise económico-financeira que a Ré experienciou, quando aceitou, ainda que tacitamente, as reduções pontuais na contraprestação acordada.

50. O Autor, por experienciar, principalmente em sala de aula, o declínio do número de alunos no estabelecimento de ensino da Ré, lidou em primeira mão a referida crise sócio financeira e aceitou a redução dos seus honorários.

51. No caso vertente, a verdade é que os factos alegados e que se mostram provados, concernentes à prática contratual, não logram afastar-se, no essencial, daquilo que foi formalizado e concretizado, antes pelo contrário, acabaram por confirmar inequivocamente a vontade e os termos da estipulação contratual, no sentido do desenvolvimento de uma relação de prestação de serviços atípica, em que era concretizável este reajuste remuneratório, tanto para um valor superior, como aconteceu, ou para um valor inferior. Vide a matéria de facto dada como provada.

52. O que resulta do contrato é, por um lado, que o docente se comprometeu a exercer o serviço acordado com os órgãos académicos competentes e, por outro, que a R. se comprometeu a pagar-lhe tal serviço, contando que fosse efectivamente realizado: caso o docente e os órgãos académicos não acordassem, para qualquer semestre ou ano lectivo a atribuição de serviço docente, ou o mesmo não aceitasse a proposta, a R. não tinha que lhe pagar qualquer prestação monetária.

53. Não tem assim razão o Autor, nem o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa ao decidir pela reposição de valores remuneratórios fundada, aparentemente, num princípio de irredutibilidade salarial que não existe nos contratos de prestação de serviços docente. E, como ficou provado, não existiu na relação jurídica entre as Partes.

54. Estando, in casu, afastada a questão contrato de trabalho vs contrato de prestação de serviços decididas para as partes, porque dirimida no âmbito da acção que correu os seus termos no Tribunal de Trabalho ..., com subida para o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, improcedendo e resolvendo, em definitivo, no sentido de não ser reconhecido o vínculo jurídico laboral, não faz nenhum sentido, com o devido respeito, considerar-se que a Ré, aqui Recorrente, estava obrigada a liquidar ao Autor uma remuneração mensal certa, porquanto, como ficou provado, poderia, caso o Autor não tivesse serviço docente atribuído, ser excluída a remuneração. – vide facto provado 30.

55. Ou seja, o contratualizado e executado entre as partes permitia a possibilidade de não haver serviço atribuído – e convém não olvidar a já invocada autonomia dos órgãos académicos - e, inerentemente, não haver retribuição.

56. Além disso, a atribuição de serviço docente, sendo feita primeiramente segundo critérios de natureza cientifico-pedagógica, está também condicionada ao número de alunos inscritos e, no caso concreto, à própria disponibilidade do docente.

57. Reitera-se que quanto maior fosse o número de alunos inscritos, mais turmas abririam, mais acentuada seria a distribuição de serviço, caso fosse aceite pelo docente, e, em consequência, maior é a contraprestação monetária a perceber por este, e vice-versa, como aliás, sempre aconteceu.

58. Com efeito, o que os factos mostram é: inexistência de salário em sentido laboral típico; partilha do risco; possibilidade de horário zero/retribuição zero;

59. O modelo remuneratório acordado e executado entre as partes, já atrás suficientemente examinado (considerações que por razões de economia argumentativa aqui nos limitamos a considerar reproduzidas), permite, com naturalidade, atenta a filosofia contratual, que na vigência do contrato, ocorram situações de horário zero/retribuição zero e, ainda, a redução da contraprestação a perceber, porventura, o número de alunos fosse diminuto.

60. O quadro fáctico provado, acima especificado, destacamos a partilha do risco da actividade e a possibilidade de não existir retribuição.

61. Errou, assim, o Tribunal a quo na aplicação do direito aos factos, mostrando-se prático-normativa inadequada, e desconforme ao direito e à justiça, a solução adoptada no Acórdão recorrido.

62. Em geral, resultou demonstrado que o contrato em causa tem por objecto a prestação de serviço/actividade docente em estabelecimento de ensino superior privado que, como já se afirmou atrás, é reconhecido, sem excepção, que, a contratação para efectivação de tal serviço/actividade docente, opera num contexto de liberdade contratual.

63. Isto porque, as características próprias do serviço/actividade em causa impõem um tratamento normativo diferenciado.

64. Aliás, as características da actividade docência reclamam um regime normativo diferenciado e que, desde logo, deverá integrar regras diferenciadas.

65. Ora, pelas razões que atrás abundantemente sublinhámos, ao contrato de docência têm que se atentar para as especificidades próprias desta área da actividade económica.

66. No caso, é reconhecido que a atribuição de serviço docente depende do número de alunos inscritos em cada ano lectivo, o que configura uma variável que a entidade instituidora não pode controlar.

67. Além disso, também deve considerar-se que a entidade instituidora do estabelecimento de ensino – no caso a aqui Ré – não tem, nem pode ter, qualquer intervenção ao nível científico e pedagógico, não podendo, nomeadamente, imiscuir-se na fixação do serviço docente, que constituiu uma atribuição exclusiva dos órgãos académicos no quadro da sua autonomia.

68. A entidade instituidora tem o dever legal de garantir a sustentabilidade económica e financeira do estabelecimento de ensino, assegurando receitas e controlando as despesas.

69. Num cenário como o traçado e dado como provado – de grave crise económica - não se vislumbra possível a aplicação cega das normas civis, nomeadamente pacta sunt servanda, mas sim da aceitação tácita, nos termos do art.º 217.º do CC, pelo Autor no reajuste remuneratório operado pela Ré. – o que aqui fica expressamente invocado para todos os efeitos legais.

70. Ou seja, as partes celebram um acordo tendo em conta a situação de facto existente no momento da sua celebração.

71. No entanto, num momento posterior, existiu uma alteração dessa situação de facto.

72. Nos termos do contrato de prestação de serviços de docência, dada a autonomia das partes – art.º 405.º do CC – as partes podiam e executaram alterações aos documentos contratuais.

73. Tal premissa é válida quando a Ré se encontrava com boa “saúde” financeira, mas também quando foi atingida pela crise sócio-económica, o que conduziu a mudanças substanciais extraordinárias e imprevisíveis no seio da entidade instituída.

74. Isto por que, o regime a aplicar tem de consentir alguma flexibilidade de modo a integrar/compatibilizar as limitações legais impostas a uma entidade instituidora – supra mencionada -, limitações essas que a generalidade das empresas não conhecem.

75. Donde, terá de se admitir como legalmente possível o reajustamento pontual da retribuição em função daquelas variantes que não são controláveis pela entidade instituidora, nomeadamente o número de alunos.

76. Será, pois, de admitir reajustamento da contraprestação e de renegociação do contrato e, por isso, mal andou o Tribunal a quo.

77. A decisão da Ré escudou-se na realidade existente à data (em 2012 e anos seguintes) – vide prova provada – na grave crise sócio-económico-financeira que a Ré experienciou e que o Autor, conhecedor da realidade, aceitou as reduções operadas.

78. Aliás, aplicou a redução salarial a todos os docentes e trabalhadores, decorrente da súbita eclosão da crise.

79. E foi esta a filosofia subjacente ao modelo remuneratório acordado: pagamento em função do valor hora lectivo, sendo o valor hora lectivo fixo em tabela aprovada pela entidade instituidora, no caso a Ré, a qual pôde proceder a revisões remuneratórias para cada ano lectivo.

80. Este foi o modelo remuneratório que as partes efectivamente acordaram, pelo que terão de se considerar lícitos os reajustes remuneratórios feitos pela Ré e aceites pelo Autor ao longo da execução do contrato.

81. Destarte, munido dos ensinamentos acabados de aduzir, em traços largos, e descendo aos factos provados, não restaria alternativa ao Tribunal a quo em considerar como legais os reajustes remuneratórios e renegociação do contrato.

82. Entre o Autor e Ré, tal como tinha sucedido no início do contrato, operou-se a renegociações contratuais. Renegociações contratuais que o Autor acedeu porque continuou a prestar serviço docente à Ré.

83. Ora, como é bem de ver, é pacificamente aceite que num determinado negócio jurídico deve tomar-se em conta a intencionalidade das partes extraída das respectivas declarações negociais e, bem assim, nos contratos duradouros ou de execução continuada, o modo concreto como as partes deram vida ao negócio.

84. Quanto à intencionalidade das partes importa atentar no que dispõe o artigo 236.º n.º 1 do Código Civil (CC): a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder, razoavelmente contar com ele.

85. Como afirmam Pires de Lima e Antunes Varela, no seu Código Civil Anotado em comentário ao supra citado artigo, consagra-se assim uma doutrina objectivista da interpretação, em que o objectivismo é, no entanto, temperado por uma salutar restrição de inspiração subjectivista.

86. Todavia, nos contratos consensuais e de execução duradoura, como o é um contrato tendo por objecto a docência, não deve relevar tanto a intencionalidade das partes vertida nas respectivas declarações negociais, mas sim a forma, o modo, como aquelas concretizaram (rectius: executaram) o negócio jurídico.

87. Com efeito, nunca é demais sublinhar que o comportamento do Autor – assim a prova dada como provada o demonstra – foi no sentido de aceitar as reduções à contraprestação. – o primeiro reajuste deu-se em 2012 e apenas em 2015 denunciou o contrato de docência.

88. Com efeito, nesta tipologia contratual, seria imperativo que o Tribunal a quo apreciasse o modo como, em concreto, no plano da respectiva execução, o negócio foi materializado pelas partes.

89. E aqui, o Autor aceitou tacitamente as reduções remuneratórias.

90. Por outro lado, importa ainda acrescentar que não podem ser olvidadas as especificidades próprias da actividade desenvolvida - a actividade docente - bem como as impostas pela configuração legal dada às entidades envolvidas, emergente das normas que têm regulado o ensino superior privado em Portugal.

91. O negócio jurídico em crise há-de ser escrutinado em conformidade não só com as regras gerais atrás enunciadas – aplicáveis a qualquer negócio jurídico -, mas também de harmonia com os princípios e normas que regem o ensino superior privado e o próprio serviço de docência.

92. O ensino superior privado e cooperativo, desde o surgimento da primeira universidade privada, tem sido regulado através de diversos diplomas legais, que vão desde o 1.º Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 271/89, de 19 de Agosto ao abrigo da Lei de Bases do Sistema Educativo, por sua vez aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro; Passando pelo 2.º Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo (EESPC), aprovado pelo Decreto -Lei n.º 16/94, de 22 de Janeiro (alterado, por ratificação, pela Lei n.º 37/94, de 11 de Novembro, pelo Decreto -Lei n.º 94/99, de 23 de Março, e pelo Decreto -Lei n.º 74/2006, de 24 de Março); e, mais recentemente, pelo RJIES.

93. Não esquecendo outros diplomas legais, tais como a Lei n.º 7/79, de 19 de Março que aprovou as Bases Gerais do Ensino Particular e Cooperativo ou a Lei n.º 65/79, de 04 de Outubro, sobre a Liberdade de Ensino.

94. Todos eles dando cumprimento aos mandamentos constitucionais sobre a Liberdade de criação cultural (art.º 42.º da Constituição – CRP), sobre a Liberdade de aprender e ensinar (art.º 43.º, CRP), sobre educação, cultura e ciência (art.º 73.º, CRP), sobre ensino (art.º 74.º, CRP), sobre o ensino público, particular e cooperativo (art. 75.º, CRP), sobre a Universidade e acesso ao ensino superior (art.º 76.º, CRP) e sobre participação democrática no ensino (artigo 77.º, CRP).

95. Deste conjunto normativo podem ser extraídas duas ideias nucleares e estruturantes do subsistema de ensino superior particular e cooperativo.

96. Primeira: de que ensino superior particular e cooperativo emerge de uma estrutura organizacional e institucional bicéfala, face à necessária co-existência de duas entidades: a entidade instituidora e a entidade instituída (o estabelecimento de ensino); Àquela atribui-se competência para gerir o respectivo estabelecimento de ensino nos domínios administrativo, económico e financeiro; A esta cabem os domínios pedagógicos, científicos e culturais.

97. A segunda ideia, relacionada com a primeira, corresponde ao princípio da autonomia pedagógica, científica e cultural do estabelecimento de ensino face à entidade instituidora; princípio este decorrente do constitucional Princípio da Autonomia das Universidades consagrado no artigo 76.º n.º 2 da nossa Lei maior8.~

98. E é assim que, neste quadro, é dever da entidade instituidora dotar os estabelecimentos de ensino de um estatuto que defina os seus objectivos e estrutura orgânica, bem como o seu projecto científico, cultural e pedagógico, estatuto esse que permita o exercício do ensino com plena autonomia científica, pedagógica e cultural; tal como é dever da entidade instituidora dotar o estabelecimento de ensino de instalações e equipamentos adequados à prossecução dos seus objectivos e do seu projecto educativo.

99. Por sua vez, importa reter que, as universidades, entes juridicamente despersonalizados, são centros de criação, transmissão e difusão da cultura, da ciência e da tecnologia, que, através da articulação do estudo, da docência e da investigação, se integram na vida em sociedade (vide o artigo 1.º n.º 1 da Lei da Autonomia das Universidades, aprovada pela Lei n.º 108/88, de 25 de Setembro9, o artigo 6.º n.º 2 do EESPC, ou artigo 6.º do RJIES).

100. Têm como fins a formação humana, cultural, científica e técnica; a realização de investigação fundamental e aplicada; a prestação de serviços à comunidade, numa perspectiva de valorização recíproca; o intercâmbio cultural, científico e técnico com congéneres nacionais e estrangeiras; a contribuição, no seu âmbito de actividade, para a cooperação internacional e para a aproximação entre os povos, com especial destaque para os países de expressão oficial português e países europeus (vide, por exemplo, o artigo 1.º n.º 2 da Lei da Autonomia das Universidades).

101. As universidades privadas figuram-se, de facto, como centros da supra aludida criação, transmissão e difusão da cultura, da ciência e da tecnologia, mas, na base de uma autorização para o exercício de uma actividade que é originariamente do Estado e, portanto, por lei, restrita aos particulares – o funcionamento de cursos e concessão de graus académicos.

102. E, no que ao caso importa, o estabelecimento de ensino, figurando como entidade despersonalizada de interesse público, encontra-se sujeito, em vários aspectos, a um regime específico desenhado pelo Direito Administrativo: o seu carácter cultural, a sua organização como serviço aberto ao público, as prestações individuais de ensino aos estudantes, a intransmissibilidade, a qualquer título, das autorizações de funcionamento dos cursos.

103. E esse interesse público pode ser objecto de reconhecimento, bastando para tal que a entidade instituidora o requeira e sejam cumpridos os requisitos de que depende, nos termos legais, tal reconhecimento.

104. Este reconhecimento de interesse público, por seu turno, constitui conditio sine qua non da integração do estabelecimento de ensino no sistema educativo e confere à entidade instituidora o gozo dos direitos e faculdades concedidos legalmente às pessoas colectivas de utilidade pública relativamente às actividades conexas com a criação e o funcionamento desse estabelecimento, nomeadamente os previstos no Decreto-lei n.º 469/77, de 07 de Novembro.

105. Os estabelecimentos de ensino são, assim, entes juridicamente despersonalizados. Mas, daqui não resulta que não sejam entes jurídicos, muito pelo contrário.

106. Esta conclusão avulta, desde logo, do já aflorado reconhecimento de interesse público que, sem prejuízo dos direitos e obrigações a ele inerentes serem exercidos pela entidade instituidora, é atribuído ao próprio estabelecimento de ensino (vide o art.º 33.º, RJIES).

107. Também as circunstâncias de a entidade instituída estar dotada de estatutos próprios (aprovados pelo Ministério da Tutela e publicados em Diário da República), como também já tivemos ensejo de verificar, e de ter “voz própria”, na medida em que se lhe reconhecia uma estrutura orgânica interna totalmente autónoma da estrutura organizatória da entidade instituidora, abonam em favor da referida tese.

108. A entidade instituída, o estabelecimento de ensino é, pois, uma entidade jurídica dotada de autonomia perante a entidade instituidora.

109. Logo, em síntese intercalar, é visível a intenção do legislador em estabelecer uma inequívoca separação entre entidade instituidora e estabelecimentos de ensino instituídos, sendo que estes estabelecimentos, embora juridicamente despersonalizados, são entes jurídicos.

110. Ora, é com base nestas premissas que deve ser considerada a relação jurídica de serviço docente no ensino superior.

111. No caso concreto, os factos revelam, com suficiente densidade e especificidade, qual foi a vontade das partes na génese da relação: celebrar um contrato não laboral, em que a renegociação e ajustes ao contrato eram possíveis e foram executados e aceites pelas partes.

112. Coloque-se, ainda, a situação inversa: o docente decide não leccionar num determinado ano lectivo, mas informa que não pretende se desvincular contratualmente da Ré. A Ré, por outro lado, nada diz.

113. Ora, perante aquela hipótese, poderia a Ré rescindir o contrato com o Autor ou aceitar que este não leccione no ano lectivo. E a aceitação tanto poderia ser tácita como expressa.

114. Ademais, voltando à remuneração, os factos mostram ainda que a retribuição não é, neste contrato, um elemento essencial, podendo, porventura, faltar.

115. O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu, acertadamente, nesse sentido no Processo n.º 3749/15.0T8VIS.C1.

116. A remuneração paga variava consoante a carga horária atribuída ao docente, que a carga horária poderia ser aumentada, reduzida ou excluída por iniciativa unilateral da instituição universitária, com o consequente aumento, redução ou exclusão da sua remuneração.

117. Ainda, referindo aquele Venerando Tribunal que as partes não pretenderam vincular-se a um número mínimo de horas lectivas.

118. Ora, a matéria provada evidencia à saciedade que, na relação em crise, a retribuição não era, geneticamente, elemento essencial, pois podia, no limite faltar, bastando recordar o modelo remuneratório acordado no início da relação contratual.

119. A minuta contratual foi aceite pelo A. sem reserva ou objecções – vide matéria provada – em que se fixou que como contrapartida dos serviços efectivamente prestados, o docente seria retribuído mensalmente pelo número de horas de serviço atribuídas, multiplicando-se o valor/hora, fixado por tabela para o ano lectivo, pelo número de horas semanais e esse produto por quatro.

120. Sendo de realçar que ambas as partes são perfeitamente conhecedoras, desde início, de todos os aspectos essenciais do contrato, nomeadamente, a exclusão de subordinação jurídica, a remuneração incerta e variável, a vigência pré-determinada, a ausência de obrigação por parte da R. de atribuição de serviço docente e a ausência de estipulação de qualquer horário mínimo obrigatório.

121. Assim, a inexistindo serviço docente para atribuir, em determinados anos, tendo em consideração a diminuição de alunos, a não abertura de cursos entre outros circunstancialismos que são frequentes e sucederam durante o período em crise nos autos.

122. E, como não se ignora, o ensino superior público e privado, em especial este último, experienciou, como ficou provado, um progressivo decréscimo na frequência de alunos, e que se fez sentir, em primeira linha, nas instituições de ensino superior privado como o atesta a prova provada.

123. E, naturalmente, com um menor número de alunos inscritos constituem-se menos turmas e, naturalmente, decai a receita do estabelecimento de ensino. existindo menos horas lectivas para distribuir pelo corpo docente. O que ficou provado!!

124. Estas circunstâncias, pela sua inexorabilidade, impuseram contratualmente um regime remuneratório variável, que o A. aceitou durante a relação contratual, sem reservas. Factos provados 36 e 38 da matéria provada

125. Mesmo a redução do valor fixo em 10% o Autor aceitou, tacitamente, a renegociação e reajuste ao modelo remuneratório.

126. O comportamento do Autor foi concludente e inequívoco nessa aceitação, pois não cessou o contrato de docência e continuou a leccionar para entidade instituída pela Ré.

127. Ficou provado que a redução operada pela Ré foi em 2012 e o Autor, apenas em 2015, cessou o contrato de docência.

128. Ou seja, um hiato temporal em que o Autor poderia, caso não aceitasse a renegociação do contrato, cessá-lo, mas não o fez.

129. O sentido normal da declaração tácita da aceitação pode resultar da aplicação da regra objectiva consagrada no art.º 236.º, n.º 1, do Código Civil.

130. As propostas negociais apresentadas pela Ré, no sentido de reduzir as contraprestações convencionadas foram aceites pelo autor, porque ficou demonstrado que o Autor continuou a leccionar, demonstrando que aceitava o reajuste remuneratório, nos termos do art.º 234.º do Código Civil.

131. Errou, por isso, o Venerando Tribunal ao quo ao não reconhecer a aceitação tácita do autor ao reajustamento remuneratório do autor.

132. Como é pacífico na doutrina, para a perfeição do negócio jurídico, decorrente do acordo de vontades, é necessária a aceitação da proposta pela parte contrária, que, para além de ser declarada de forma expressa, pode obter-se tacitamente. – o que aconteceu nos presentes autos.

133. Na verdade, a aceitação, como declaração negocial, tanto pode ser expressa, quando se concretiza mediante palavras, escritos ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade, como tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, revelam a aceitação art.º 217.º, n.º 1, do CC.

134. E o Autor, na relação jurídica que estabeleceu com a Ré, prosseguiu com objecto para o qual tinha sido contratado, mesmo após os reajustes remuneratórios.

135. Esta era “engrenagem” do contrato de docência, dado que a referida contraprestação paga nunca foi uma retribuição no sentido laboralista do termo.

136. Erra o Tribunal ao quo ao determinar que a Ré, aqui Recorrente, restaure créditos que apenas se podem reconhecer num quadro laboral e de redução salarial ilícita não convocável para o caso que se apresenta., violando, assim, a Lei.

137. Num modelo retributivo como o acordado pelas partes na presente situação, a consequência querida e praticada só pode ser seguinte: de molde a assegurar a subsistência da entidade instituidora, aqui Ré- COFAC, após os reajustes remuneratórios em percentagem, foi necessário retroceder ao modelo inicial em que o docente era pago em função da componente lectiva (aulas e avaliações).

138. Como aliás aconteceu com muitas das empresas do País, em consequência da grave crise económico-financeira.

139. A renegociação do contrato foi essencial de molde a acomodar o impacto da referida crise e o Autor, por ter essa noção, aceitou essa oscilação remuneratório. Vide matéria de facto provada.

140. Tanto a Ré como o Autor poderiam ter resolvido o acordo, mas, o recurso à renegociação do contrato era o que melhor se coadunava com as necessidades, à data, das partes, pelo que se aquela solução se encontra adequada e legítima.

141. A Ré procurou mitigar a falta de receitas, decorrente do decréscimo do número de alunos no estabelecimento de ensino que era titular.

142. A renegociação contratual permitia que a Ré não resolvesse o contrato de docência com o autor, o que permitia manter o equilíbrio contratual.

143. Não se logra, pois, vislumbrar qualquer possibilidade de se considerar este modelo de pagamento como integrante do conceito quantia certa paga com determinada periodicidade. Este conceito está umbilicalmente correlacionado ao Direito do Trabalho e, como já se viu, a relação obrigacional que uniu as partes não era de trabalho.

144. As quantias que a R. se comprometeu a pagar ao docente, em dois momentos contratuais, e este aceitou, embora apuradas e pagas mensalmente, dependeram do número de aulas efectivamente leccionadas (em função do programa semestral), do tipo de aulas prestadas (em função da dimensão da turma), daí derivando, inevitavelmente, quantitativos mensais e semestrais variáveis.

145. A R., enquanto entidade instituidora, nunca poderia contratualizar a obrigação de garantir ao autor um número mínimo de horas lectivas, sob pena de se imiscuir ilicitamente na autonomia científica e pedagógica do estabelecimento de ensino.

146. E o que deriva da prova provada é que após a renegociação contratual operada pela Ré, em 2012, o Autor continuou a leccionar, cessando apenas o contrato em 2015.

147. No terceiro momento do contrato, aquele em que a Ré reverteu o modelo remuneratório para o inicialmente acordado, o montante a receber pelo Autor dependia, sempre, do número de aulas efectivamente leccionadas.

148. Só isto basta para anular o argumento (indevidamente convocado pelo Tribunal recorrido) para manter inalterado o valor de 2.500,00€ ilíquidos que o Autor, num contexto favorável em que a Ré se encontrava, recebeu.

149. Fazendo ainda notar que, sendo tal valor hora variável em função da concreta composição da turma (número de alunos), também por aí se verifica a variabilidade da retribuição dentro do próprio mês.

150. Sendo que, por sua vez, tal carga horária do docente, dependia, como resulta das regras da experiência, não só mas também, do número de alunos inscritos, argumento que em particular também é válido quando num segundo momento da relação é convencionado entre as partes, através de um documento complementar, um valor fixo.

151. Há, portanto, no Acórdão recorrido, também nesta perspectiva, erro de julgamento na matéria de direito, que aqui fica expressamente invocado.

152. Há, também, erro de julgamento por parte do Tribunal recorrido quando conclui que a Ré deve pagar ao Autor o valor diferencial decorrente dessas variações remuneratórias, devendo, por isso, ser revogado e substituída a decisão por outra que absolva a Ré deste pedido.

153. Há erro de julgamento quando o Tribunal recorrido conclui nesse valor diferencial, olvidando as esquecendo as especificidades do Contrato de Docência, enquanto contrato de prestação de serviços.

154. Há erro de julgamento quando o Tribunal recorrido, mesmo perante a prova provada – artigos 11,12,13, 30 a 48 - conclui pela obrigatoriedade da Ré em pagar uma remuneração fixa ao Autor.

155. A matéria provada evidencia à saciedade que, na relação em crise, a retribuição não era, geneticamente, elemento essencial, pois podia, no limite, faltar - pontos 30, 31, 32, 33, 34, 35, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 47, 48 da matéria assente.

156. Ficou provado que o Autor apenas seria pago em contrapartida dos serviços prestados.

157. Nessa conformidade, resulta também provado que os pagamentos ao A. foram oscilando em função das horas lectivas acordadas, horas estas que foram umas vezes aumentando, outras vezes diminuindo e, por consequência, também ia aumentando e diminuindo o valor mensal percebido pelo autor. – cfr. pontos 30, 31, 34, 35, 36 e 37 da matéria de facto dada como assente.

158. Ademais, o Tribunal a quo errou ao não eliminar o ponto 13 que dá como assente determinadas prestações como subsídio de férias e de natal, quando, tais pontos, integram, inequivocamente, matéria de direito, devendo, por isso, ter sido excluídos da matéria de facto, ou pelo menos excluídas os conceitos jurídico-laborais neles inclusos. – o que Tribunal a quo não fez!

159. Prestações que pressupõem a existência de um contrato de trabalho, que é precisamente o que se já se discutiu no Processo n. 3749/15.0T8VIS.C1.

160. Assim, tudo visto, mesmo no quadro fáctico fixado, o Tribunal a quo cometeu erro de julgamento na aplicação do direito aos factos.

161. Todos aqueles elementos fácticos que entendemos provados, considerados globalmente, só permitem concluir pela legitimidade em reajustar pontualmente a remuneração a pagar ao Autor, reajustes aceites tacitamente pelo Autor, nos termos dos art.º 217.º e 234.º, ambos do Código Civil.

162. A aceitação, para a obtenção do acordo de vontades, podia e foi manifestada tacitamente, nos termos do n.º 1 do art.º 217.º do CC.

163. Circunstancialismo que foi alegado na Contestação e inexistiu pronúncia. – nulidade por omissão que fica expressamente invocada para todos os efeitos legais.

164. Porquanto, em conclusão, não se vislumbra possível a aplicação do salário fixo neste domínio de actividade (ensino superior privado), dado que (i) é reconhecido que a atribuição de serviço docente depende do número de alunos inscritos em cada ano lectivo - o que configura uma variável que a entidade instituidora não pode controlar; (ii) a entidade instituidora do estabelecimento de ensino – no caso a aqui Ré – não tem, nem pode ter, qualquer intervenção ao nível científico e pedagógico, não podendo, nomeadamente, imiscuir-se na fixação do serviço docente, que constituiu um atribuição exclusiva dos órgãos académicos no quadro da sua autonomia; e (iii) a entidade instituidora tem o dever legal de garantir a sustentabilidade económica e financeira do estabelecimento de ensino, assegurando receitas e controlando as despesas.

165. Isto por que, a regime a aplicar tem de consentir alguma flexibilidade de modo a integrar/compatibilizar estas limitações legais impostas a uma entidade instituidora de um estabelecimento de ensino, limitações essas que a generalidade das empresas não conhece.

166. Ou seja, terá de se admitir como legalmente possível o reajustamento pontual da retribuição em função daquelas variantes que não são controláveis pela entidade instituidora, nomeadamente o número de alunos, no caso a Ré, a qual poderá proceder a revisões para cada ano lectivo.

167. Por todas estas razões, não podem, também a este propósito, prevalecer as conclusões do Tribunal a quo.

Termos em que deverá ser o presente ser julgado procedente, e ser o revogado o Acórdão recorrido e substituído por outro que, considerando as ilegalidades suscitadas, declare a legalidade, nos termos do contrato de prestação de serviços de docência, dos reajustes remuneratórios operados durante a relação contratual entre Autor e Ré, absolvendo a Ré, por consequência, do demais peticionado pelo Autor.»


Contra-alegou o A., concluindo o seguinte:

«V.I - Das questões novas e impossibilidade de apreciação do recurso

1) Nos presentes autos o Autor alega o incumprimento do contrato de prestação de serviço docente celebrado com a Ré e, concretamente, da obrigação do pagamento de 2.500,00€ mensais acrescidos do subsídio de férias e subsídio de Natal, decorrente do aditamento ao contrato celebrado em 01/10/2010;

2) Todas as decisões anteriormente proferidas versaram sobre a alegada alteração das circunstâncias, com base nas quais a Ré alegadamente procedeu à alteração unilateral do contrato celebrado com o Autor, nomeadamente:

• A sentença do Tribunal Judicial da Comarca ... entendeu que da factualidade alegada e provada pela Ré resultava demonstrada a excepção perentória, decorrente da alteração das circunstâncias, nos termos do art. 437º do CC e, com base em tal excepção, julgou improcedente o pedido na parte não confessada pela Ré;

• O recurso interposto pelo Autor para o Tribunal da Relação de Lisboa, o mesmo assentou exclusivamente na questão da alteração das circunstâncias;

• A resposta apresentada pela Ré a tal recurso também assentou apenas nesta questão da alteração das circunstâncias, não tendo procedido à

• ampliação do objecto do recurso de forma a ver qualquer outra questão apreciada pelo Tribunal da Relação de Lisboa; e

• • O Acórdão recorrido versou apenas sobre a aplicação aos factos da alteração das circunstâncias prevista no art. 437º do CC.


3) No recurso a que ora se responde a Ré assenta a sua pretensão de alterar a decisão recorrida em questões novas (nomeadamente um direito a alterar unilateralmente o contrato de prestação de serviços e uma alegada aceitação tácita), nunca mencionando no seu recurso e respectivas conclusões qualquer fundamento relacionado com a alteração das circunstâncias;

4) Assentando o recurso em questões novas, por força do disposto no art. 674º do CPC, a presente revista não tem objecto que este Supremo Tribunal possa apreciar, devendo por isso o recurso ser indeferido por falta de objecto.


V.II – Da alteração da matéria de facto

5) Nas conclusões 3 e 4 insurge-se a Ré contra o julgamento do ponto 13 da factualidade provada, alegando que o facto de este ponto da factualidade conter as expressões “subsídio de Natal”, “subsídio de férias” corresponde a um qualificativo jurídico das prestações que endente ser inadmissível;

6) Contudo, no ponto 13 da factualidade não é feita qualquer qualificação das prestações pagas ao Autor, mas sim referido que uma das prestações era paga no mesmo momento em que é feito o pagamento do subsídio de Natal e outra no mesmo momento em que é feito o pagamento do subsídio de férias;

7) Daqui resulta que não há qualquer erro ou ilegalidade no julgamento da factualidade, pelo que deverão improceder as conclusões 3 e 4 mantendo-se a factualidade;


V.III – Do Direito

V.III.I – Da legislação que regula o ensino superior privado

8) Alega a Ré que o vazio legislativo que existe na carreira dos docentes do ensino superior privado decorrente do disposto no art. 53º do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES - Lei 62/2007) implica que o contrato em causa nos autos seja configurado como um “contrato de prestação de serviços flexível”;

9) Ora, a referida qualificação do contrato em causa nos autos não resulta de qualquer norma ou princípio jurídico pelo que devem tais conclusões ser indeferidas;


V.III.II – Da legislação que regula o ensino superior privado

10) Alegou a Ré uma série de argumentos que, supostamente lhe conferiam um direito a alterar o contrato e não pagar o valor acordado com o Autor;

11) Nomeadamente alega que:

• Que o contrato estava sujeito a um termo (conclusão 20);

• Que a Ré não se podia vincular a garantir uma retribuição certa (conclusão 28);

• Que não foi contratualizada qualquer retribuição certa “com exceção do período em que vigorou o documento complementar” (conclusão 44);

• Que havia uma partilha de risco com o Autor (conclusão 49, 60 );

• Que o Autor aceitou a redução dos seus honorários (conclusão 50, 77); e

• Inexistência do princípio da irredutibilidade salarial nos contratos de prestação de serviços (conclusão 53).

12) Nenhum destes argumentos tem qualquer condição de procedência e de levar à alteração do Acórdão recorrido;


V.III.III – Da alteração ao contrato

13) Tratando-se o contrato em causa nos autos de um contrato de prestação de serviços consensual, é-lhe apenas aplicável o disposto nos arts. 1154º e segs. do CC, não existindo qualquer especificidade do contrato que permita a uma das partes, unilateralmente, proceder à alteração do contrato;

14) Por força do art. 217º e segs. e 437º e segs. do CC apenas pode ser alterado:

• Pela vontade de ambas as partes; ou

• Através da modificação do contrato por alteração das circunstâncias (o que, conforme resulta do Acórdão recorrido não se verificou).

15) Não tendo o Autor emitido qualquer declaração de vontade que tenha procedido à alteração da declaração constante do aditamento ao contrato celebrado no dia 01/10/2010 (pontos 17 e 20 a 23 da factualidade provada) e que fixou um valor fixo para a contraprestação pelo trabalho prestado pelo Autor nunca se poderia considerar que houve uma alteração ao contrato celebrado;

16) A isto acresce que os inócuos e falaciosos argumentos invocados pela Ré não têm qualquer possibilidade de procedência. Veja-se que:

• Apesar de o contrato estar sujeito a termo, estava prevista a sua renovação automática, sendo que a Ré nunca manifestou a sua oposição à renovação (sendo de notar que o aditamento de 01/10/2010 e as clausulas nele inseridas não estavam sujeitas a qualquer termo);

• Não há qualquer impedimento legal à Ré celebrar contratos com retribuição certa;

• Não há qualquer partilha de risco com o Autor, na medida em que foi acordado um valor fixo para a prestação do trabalho do Autor (ponto 17 da factualidade provada) e não qualquer espécie de parceria; e

• Tratando-se de um contrato de prestação de serviços não está o mesmo sujeito ao princípio da irredutibilidade salarial, mas, nos termos alegados, a sua alteração depende da vontade das partes.

17) A tudo isto acresce que, não foi alegado e muito menos provado que o Autor não tenha prestado o trabalho acordado;

18) Face ao supra exposto, não havendo qualquer fundamento legal que imponha a alteração da decisão recorrida, terá o recurso de ser julgado improcedente.


V.III.IV - Da alegada aceitação tácita por parte do Autor


19) Sem prescindir da já invocada inadmissibilidade dos argumentos, alega a Ré que as alterações à remuneração do Autor foram tacitamente aceites por este (por exemplo conclusões 19 e 34 a 37), o que não está demonstrado nos autos;


Da inexistência de acordo tácito

20) A aceitação tácita da modificação do contrato é um facto modificativo do direito invocado pelo Autor pelo que, por força do disposto no art. 342º, nº 2 do CC, a Ré tinha o ónus de alegar e provar os factos constitutivos de tal aceitação tácita;

21) Dos articulados e consequentemente da factualidade provada resulta que a Ré não alegou qualquer facto constitutivo da declaração tácita do Autor, na medida em que não alegou qualquer atitude concreta do Autor de onde retiram a aceitação e não alegou de que forma a conduta do Autor moldou a sua própria conduta no sentido da referida aceitação;

22) Face ao supra exposto verifica-se que a suposta aceitação tácita foi alegada de forma totalmente conclusiva e sem factos demonstrativos da mesma, pelo que será de indeferir as conclusões relacionadas com a suposta aceitação tácita;

23) Por outro lado, da factualidade provada, nomeadamente do ponto 24 da factualidade provada e dos docs. 106 e 107 juntos com a petição inicial, resultam factos demonstrativos de que o Autor não aceitou a alteração contratual operada unilateralmente pela Ré na medida em que perante os cortes o Autor apresentou reclamações junto dos Serviços Administrativos da Ré, o que também deverá levar ao indeferimento de tais conclusões;


Da inexistência dos requisitos legais do acordo tácito

24) Por força do disposto no art. 224º e 232º do CC, para haver uma alteração do contrato por aceitação tácita do Autor teria que haver uma proposta de alteração do contrato por parte da Ré;

25) Proposta esta que, conforme decorre da factualidade provada nunca ocorreu, tendo-se a Ré limitado a não pagar os valores acordados (pontos 20 23 da factualidade provada);

26) Esse corte unilateral não configura uma proposta contratual porquanto, conforme decorre do art. 232º do CC e é entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência, uma proposta contratual tem de reunir os seguintes requisitos:

• Tem que ser completa e precisa;

• Firme; e

• Formalmente adequada.

27) Conforme decorre da factualidade provada (pontos 20 a 23 da factualidade provada), em nenhuma das três alterações que a Ré unilateralmente fez ao contrato apresentou qualquer proposta ao Autor e muito menos que cumpra os requisitos exigidos pelo art. 232º do CC;

28) Por outro lado, nos termos do art. 217º, nº 1 do CC, a declaração tácita ocorre quando a manifestação da vontade decorre de factos que, com toda a probabilidade a revelam;

29) O facto de o Autor ter continuado a prestação quando não lhe foi pago o valor acordado não constitui qualquer declaração tácita;

30) As condições concretas em que o Autor se encontrava não permitem com toda a probabilidade determinar que o Autor aceitou as alterações unilaterais ao contrato:

• O Autor pensava que estava a coberto de um contrato de trabalho (conforme demonstra a existência do processo anterior instaurado no Tribunal do Trabalho com base nos mesmos factos);

• Não tinha qualquer proposta concreta;

• Era o seu único rendimento (ponto 25 da factualidade provada);

31) Face ao supra exposto, serão de indeferir as conclusões em que a Ré peticiona a verificação de uma aceitação tácita das alterações contratuais por parte do Autor.


Pelo exposto,

Deve o recurso ser julgado improcedente mantendo-se o Acórdão recorrido.»


*


Sendo o objecto dos recursos definido pelas conclusões de quem recorre, para além do que for de conhecimento oficioso, importará, in casu, saber se tem sustentação no contrato celebrado entre as partes a redução da retribuição a que se procedeu, com aceitação, ainda que tácita, do A. e visto o modo como a crise económico-financeira afectou a Ré.

O A. chamou a atenção para o facto de a sentença proferida na 1ª Instância se ter centrado na excepção peremptória decorrente da alteração das circunstâncias, nos termos do art. 437º do CC, julgando, pela procedência dessa excepção, improcedente o pedido na parte não confessada pela Ré, e ainda para o facto de o recurso interposto pelo Autor para o Tribunal da Relação de Lisboa ter assentado exclusivamente nessa questão da alteração das circunstâncias, sem que a Ré, na sua resposta a tal recurso, tenha ampliado o objecto do recurso, de forma a ver qualquer outra questão apreciada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, e ter o Acórdão recorrido versado apenas sobre a mesma problemática, tendo em conta os factos apurados.

Entende, assim, que, assentando em questões novas (possibilidade de a R. alterar a retribuição e aceitação tácita por parte do A.), o recurso carece de objecto que possa ser apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Na verdade, destinando-se os recursos a apreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, devem as partes conter-se no que foi decidido. Conforme refere Abrantes Geraldes, o nosso modelo é de «reponderação, que visa o controlo da decisão recorrida, e não o modelo de reexame no sentido da repetição da instância no tribunal de recurso» (Recursos em Processo Civil, 6ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, p. 140).

Na sentença proferida na 1ª Instância, referiu-se, a abrir, em sede de direito, estar-se perante um contrato de prestação de serviços de docência; que resulta dos pontos de facto 15 e 16 que Ré acordou com o Autor, a partir de Outubro de 2010, o pagamento de uma retribuição de 2.500,00€ mensais pelos serviços de docência prestados, a ser paga 14 vezes por ano; que, sendo o contrato de prestação de serviços um contrato consensual, não pode o mesmo ser alterado pela vontade unilateral de uma das partes; que, conforme resulta dos factos provados, a Ré não pagou ao Autor as retribuições que se havia comprometido a pagar pela prestação dos serviços de docência; que o contrato celebrado entre Autor e Ré é oneroso, tendo a retribuição sido ajustada entre as partes (artigo 1158º, nº 2, ex vi artigo 1156º do CC) e que, tal como se verifica pelos factos alegados, os pagamentos efectuados pela Ré nem sempre cumpriram o que foi acordado com o Autor. Abordar-se-ia, depois, acrescentados outros considerandos sobre os princípios dos contratos, a questão da modificação do contrato por alteração das circunstâncias, ao abrigo do disposto no art. 437º do C Civil, ponderando-se, sobre o caso concreto, o seguinte:

«Ora, ficou provado que, diante de um panorama que evidenciava uma severa redução de candidatos a partir do ano lectivo 2012/2013, entendeu a Reitora da U..., conjuntamente com a Direcção da COFAC, no âmbito das competências assinaladas e em consonância com os Directores das Faculdades que integram a Universidade e outras instituições de ensino superior do denominado “Grupo ...”, pugnar pela redistribuição do serviço docente a todos os docentes vinculados à R, independentemente do figurino contratual, reduzir percentualmente os montantes pagos a títulos de honorários ao A, de molde a evitar a desvinculação definitiva de alguns professores e, com esta medida, suavizar o prejuízo a todos causado pela grave crise económica e social que assolou o país, pois, à data dos factos, a R tinha forçosamente, sob pena de fechar portas, que reduzir custos para se manter em funcionamento, e que todos os docentes das instituições de ensino que constituem o designado “Grupo ...”, incluindo o A, estavam cientes da grave situação económico-financeira em que se encontrava a R.

Ora, a grave, inesperada e incontornável crise económica que se veio a verificar desde 2008, não era, obviamente, antecipável; tanto que não o foi pela generalidade economistas e pelo sistema financeiro internacional – Acórdão da Relação de Lisboa de 14.06.2012 in www.dgsi.pt.

Assim, verificam-se os pressupostos da alteração contratual, por alteração anormal das circunstâncias, por factos que atingiram todas as pessoas singulares e colectivas.»


Na definição do objecto do recurso, o Tribunal da Relação considerou estar em causa saber «se como pretende a Recorrente, devem ser dados como não provados os pontos 63.º a 66.º da decisão sobre a matéria de facto, bem como não verificada a alteração das circunstâncias, nos termos do art.º 437, do CC, e caso assim não se entenda, alterar a condenação realizada, tendo em conta a confissão da Recorrida e o pedido formulado de condenação em juros de mora

Na concreta apreciação que levou a cabo, centrada na questão da alteração das circunstâncias, na qual radicou a decisão (absolutória) da 1ª instância, o Tribunal a quo não deixou de apreciar os termos do contrato, no que interessava à dilucidação da problemática  que lhe era colocada e de ter em conta a questão do consentimento (ou da falta dele) relativamente à redução realizada. É nesses limites que se deve operar o conhecimento por parte deste Supremo Tribunal, não se podendo dizer, de qualquer modo, que o recurso careça de objecto.



II


No acórdão recorrido, consideraram-se provados e não provados os seguintes factos:

a) Factos provados

1. A Ré é uma cooperativa que se dedica a explorar estabelecimentos de ensino e formação profissional.

2. No âmbito desta sua atividade a Ré explora um estabelecimento de ensino superior privado denominado Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (U...).

3. Em 29/09/2008, o Autor celebrou com a Ré um contrato que denominaram de “Contrato de Docência em Regime de Tempo Integral” conforme doc. 3 junto e se dá como reproduzido.

4. Neste contrato a Ré “admit[iu] o Autor ao seu serviço”, “para exercer funções de docente do Ensino Superior, atribuindo-lhe a categoria académica de Assistente para exercer as suas funções em regime de Tempo Integral de molde a preencher os requisitos predefinidos pelo Ministério de tutela” (cláusula 1a).

5. Por sua vez, o Autor obrigou-se a prestar o trabalho correspondente a tal função, nos termos determinados pelos “órgãos académicos competentes” e a “contribuir para a gestão democrática da universidade”.

6. Em 01/03/2009, a pedido da Ré, o Autor subscreveu um contrato, de conteúdo em tudo idêntico ao contrato referido nos artigos anteriores, conforme doc. 4 junto e se dá como reproduzido.

7. Tal como se obrigou o Autor desde 29/09/2008 sempre prestou o seu serviço para a Ré, nos termos contratados, lecionando as disciplinas que esta lhe atribuiu, fazendo a avaliação de conhecimentos, prestando assistência aos alunos, orientando teses e estágios, participando nos órgãos de gestão da Universidade e representando a mesma em diversos eventos do âmbito académico.

8. Durante a prestação do serviço o Autor esteve disponível para lecionar as disciplinas que, de acordo com a sua formação, a Ré lhe foi atribuindo.

9. Assim, durante a vigência dos contratos o Autor lecionou as seguintes disciplinas:

• Cálculo I;

• Cálculo II;

• Álgebra Linear;

• Introdução à Investigação Operacional.

(Tudo isto conforme doc.5 junto e se dá como reproduzido).

10. Tendo lecionado todas as aulas programadas pelos órgãos académicos da U... sem que lhe tenha sido marcada nenhuma falta.

11. De acordo com o acordado na celebração do contrato referido, a Ré pagava ao Autor, por cada hora letiva, o valor de 25,50€ até 12h letivas semanais e o valor de 20,00€ a partir das 12h letivas semanais.

12. Tendo em conta tal valor e o horário atribuído, a Ré pagava ao Autor uma retribuição correspondente a: 4 x N.º de horas letivas x Valor/h.

13. ° Esta retribuição era paga mensalmente, 14 vezes por ano, no mesmo momento temporal em que são recebidos os subsídios de férias e de Natal, incluindo os meses em que a U... se encontrava encerrada para férias e em que o Autor não prestava qualquer serviço.

14. O Autor, em julho de 2010, obteve o grau de Doutor através do Curso de Doutoramento em ... ministrado pela Universidade ....

15. Após a obtenção deste título académico, a Professora Doutora BB, Coordenadora da Área Científica da ... da U..., em 13/09/2010, enviou uma carta ao Professor Doutor CC, Administrador da U....

16. Nesta carta, a Professora Doutora BB, face às qualidades científico-pedagógicas do Autor, propunha a alteração da categoria profissional do Autor para Professor Auxiliar em regime de tempo integral, com um vencimento de 2.500,00€ mensais.

17. Em 01/10/2010, o Autor celebrou com a Ré um aditamento aos contratos referidos no qual foi acordado que o Autor passaria a auferir a quantia de 2.500,00€ mensais, sujeita aos devidos descontos legais.

18. A Ré não cumpriu a obrigação de pagar ao Autor a retribuição acordada.

19. Verifica-se então que, desde a supra referida alteração ao contrato, a Ré pagou ao Autor os seguintes montantes:

Valor pago Documento
2010Out2.224,00 € 18
Nov.2.224,00 € 19
Dez3.052,00 € 20
Sub. férias 714,00 € 21 e 22
Sub. Natal 1.611,85 € 23


2011
Jan 2.500,00 € 24
Fev. 2.500,00 € 25
Mar 2.500,00 € 26
Abr. 2.500,00 € 27
Maio 2.500,00 € 28
Jun. 2.500,00 € 29
Jul 2.500,00 € 30
Ago 2.500,00 € 31
Set 2.500,00 € 32
Out 2.500,00 € 33
Nov. 2.500,00 € 34
Dez 2.500,00 € 35
Sub. Férias 2.500,00 € 33
Sub. Natal 1.135,01 € 24
2012Jan2.500,00€36
Fev. 1.250,00 € 37
Mar 1.250,00 € 38
Abr.4.250,00 €39
Mai. 2.250,00 € 40
Jun. 2.297,04 € 41
Jul 2.250,00€ 42
Ago 2.250,00 € 43
Set 2.250,00 € 44
Out 2.250,00 € 45
Nov. 2.250,00 € 46
Dez 2.250,00 € 47
Sub. Férias 2.350,00 € 38
Sub. Natal 2.500,00 € 47
2013

Jan 2.250,00 € 48
Fev. 2.250,00 € 49
Mar 1.912,50 €50
Abr. 1.912,50 € 51
Maio 1.912,50 € 52
Jun. 2.812,50 € 53
Jul 2.137,50 € 54
Ago 2.137,50 € 55
Set 2.137,50 € 56
Out 2.137,50 € 57
Nov. 2.137,50 € 58
Dez 2.137,50 € 59
Sub. Férias 0,00 €
Sub. Natal 0,00 €
2014Jan 2.137,50 €
60
Fev. 1.425,00 €
61
Mar 1.425,00 €
62
Abr. 1.425,00 €
63
Mai 1.425,00 €
64
Jun. 1.425,00 €
65
Jul 1.425,00 €
66
Ago 1.425,00 €
67
Set 1.425,00 €
68
Out 280,00 €
69
Nov. 280,00 €
**
Dez 280,00 €
**
Sub. Férias 0,00 €
**
Sub. Natal 0,00 €
20. A partir de fevereiro de 2012, a Ré, sem o consentimento do Autor e sem qualquer tipo de comunicação, operou uma redução no valor da retribuição acordada, tendo-lhe passado a pagar o montante de 2.250,00€.

21. A partir de março de 2013, a Ré, sem o consentimento do Autor e sem qualquer tipo de comunicação, operou uma nova redução ao valor da retribuição acordada, tendo-lhe passado a pagar o montante de 2.137,50€.

22. Para além da falta de pagamento de outras prestações retributivas, em novembro de 2014, a título de remuneração pelos serviços prestados em outubro de 2014, a Ré apenas entregou ao Autor o montante de 280,80€.

23. Em dezembro de 2014, a título de retribuição pelos serviços prestados em novembro de 2014, a Ré apenas entregou ao Autor o montante de 280,80€.

24. No entanto, mesmo após várias insistências do Autor junto dos serviços de pessoal, a Ré não pagou o remanescente da retribuição contratada e em dívida.

25. Não podendo sustentar tal situação, uma vez que a sua subsistência dependia da retribuição que auferia, o Autor, em janeiro de 2015, invocando o art. 394.º, n.º 1, nº 2, a) e n.º5 e 395.º, n.º 1 do CT, tendo em conta que sempre entendeu estar perante um contrato de trabalho, passando a configura-lo como “prestação de serviços de docência” apenas após a decisão proferida no Tribunal de Trabalho, resolveu o “contrato de trabalho” por carta registada com aviso de receção.

26. Carta esta que foi recebida em 13/01/2015 e que não teve qualquer resposta por parte da Ré.

27. Em conformidade com o que declarou na referida carta, desde a receção da mesma, deixou o Autor de prestar qualquer trabalho para a Ré, sendo que esta não pagou qualquer das quantias em falta.

28. A carga horária letiva foi sempre acordada, distribuída e fixada por semestre letivo entre o docente, aqui A, e a direção/secretariado dos órgãos académicos.

29. A R. COFAC não tinha qualquer tipo de intervenção nesta tarefa estritamente académica.

30. Desde o início do contrato em 29/09/2008 até outubro de 2010, tal carga horária para cada semestre letivo podia, como aliás aconteceu, ser aumentada, reduzida ou até excluída e, em consequência, respetivamente aumentados, reduzidos ou excluídos os honorários do A.

31. Tais oscilações da carga horária letiva tiveram reflexo na contraprestação percebida pelo A.

32. E a tais oscilações o A nunca instou a Ré sobre o sucedido.

33. Caso o órgão académico não atribuísse, por qualquer motivo, qualquer hora letiva, não percebia, nesse semestre letivo, qualquer prestação pecuniária a título de honorários.

34. As partes (R., por um lado, e A., por outro) não acordaram, nem executaram em momento algum da prestação contratual aqui em crise, qualquer horário mínimo, dentro do qual o docente teria, obrigatoriamente, de prestar serviço à R. ou manter-se disponível, ao contrário do que é alegado no art.º 13 da pi.

35. O percurso do A na instituição, a sua carga horária semanal não permaneceu fixa.

36. E a estas vicissitudes contratuais respondeu o A sem reserva e sem questionar a natureza jurídica e o alcance do modelo da avença acordada.

37. Estaria o A, assim, sujeito a critérios científicos e pedagógicos moldados em função da afluência de alunos e dos desígnios educativo e, por conseguinte, variável de ano para ano.

38. Estas circunstâncias, pela sua inexorabilidade, impuseram contratualmente um regime remuneratório variável - a título de honorários - consoante o número de horas efetivamente prestado, que o A sempre aceitou sem reservas, conforme se atesta no quadro sinóptico que aqui se reproduz:


Mês/AnoValor ilíquido [1]
Outubro/20081.341,35€
Novembro/2008 1.837,32€
Dezembro/2008 1.091,99€
Janeiro/2009 2.664,60€
Fevereiro/2009 1.737,97€
Março/2009 1.801,88€
Abril/2009 1.864,00€
Maio/2009 1.926,13€
Junho/2009 1.864,00€
Julho/2009 1.864,00€
Agosto/2009 3.527,50€
Setembro/2009 1.763,75€
Outubro/2009 816,00€
Novembro/2009 816,00€
Dezembro/2009 816,00€
Janeiro/2010 2.427,85€
Fevereiro/2010 816,00€
Março/2010 612,00€
Abril/2010 612,00€
Maio/2010 612,00€
Junho/2010 612,00€
Julho/2010 612,00€
Agosto/2010 1.195,70€
Setembro/2010 946,30€


39. O serviço acordado com o A, de 2008 a outubro de 2010, foi pago em função de um resultado mensal: o número de horas letivas efetivamente lecionadas pelo A. em cada mês.

40. A contraprestação devida pelo serviço prestado foi sempre apurada mensalmente em função do valor/hora tabelado e com referência à carga horária acordada e às aulas efetivamente lecionadas em cada mês, ou seja, um resultado mensal!

41.O A., sempre que não lecionasse, não lhe eram pagas as aulas não lecionadas, sem prejuízo de as poder compensar. - o que aconteceu!

42. Não era, pois, uma contraprestação certa, porquanto oscilava em função da carga horária letiva acordada pelo A no seio dos órgãos académicos e do número de horas efetivamente lecionadas.

43. Tal oscilação sempre foi conhecida do A e nunca, durante o período de colaboração, sobre ela levantou qualquer tipo de questão junto da R.

44. Pois, sempre soube os termos em que acordou ser pago pelo serviço prestado.

45.Quanto mais serviço letivo fosse atribuído (horas letivas), maior seria o valor a receber pelo A., e, vice-versa.

46. Tal avença foi liquidada em prestações mensais, às quais sempre acresceram duas frações suplementares (13.a e 14.a frações), totalizando 14 prestações anuais, caso o A, tivesse serviço docente atribuído nos dois semestres.

47. O valor de tais frações (13.a e 14.a) fora apurado, durante o referido temporal, proporcionalmente em função do serviço prestado pelo A. no ano letivo.

48. Em momento algum o A levantou qualquer impedimento às oscilações remuneratórias.

49. Com a referida alteração de categoria académica, o A que já estava em tempo integral, propôs-se à Direção da R que o A recebesse a título de honorários, mensalmente, a quantia pecuniária de 2.500,00€.

50. O A, que tinha sido auscultado previamente a esta alteração, aceitou livremente o documento contratual.

51. Nos primeiros meses após a alteração contratual foi liquidando os valores contratualizados, pese embora pontuais atrasos e incorreções dos serviços.

52. Mesmo que a R não liquidasse o montante convencionado, fazia-o no mês subsequente, através de acertos.

53. Quanto maior fosse o número de alunos inscritos, mais turmas abririam, mais acentuada seria a distribuição de serviço, caso fosse aceite pelo docente, e, em consequência, maior seria a contraprestação monetária a perceber por este, e vice-versa, como aliás, aconteceu.

54. Devido ao aumento do endividamento público dos países do sul da Europa, em particular Portugal, Grécia e Espanha, e depois da crise europeia se agravar com o resgate à Grécia no início de 2010, foi necessária ajuda financeira (FMI) e diversos planos de recuperação austeros a aplicar aos países devedores.

55. O ensino superior público e privado, em especial este último, experienciou um acentuado decréscimo na frequência de alunos.

56. Todo o ensino superior, em especial e para o que nos interessa a R, foi alvo de um fenómeno atípico de natureza económico- social e que se fez sentir, em primeira linha, nas instituições de ensino superior privado.

57. O número de alunos inscritos no 1.° Ciclo de estudos da U..., como o atesta o quadro sinóptico que infra se reproduz, revelou um acentuado decréscimo em apenas 3 anos letivos:


(figura A - N.º total de alunos inscritos nas licenciaturas da U...)

Anos
letivos
2009/2010
2010/2011
2011/2012
2012/2013
2013/2014
2014/2015
Nº de alunos10589 10450 9355 7445 5996 5589

58. Em apenas 3 anos letivos a U... perdeu, apenas no tocante a alunos inscritos nas licenciaturas, aproximadamente, 3200 alunos.

59. No que concerne em específico ao número de alunos no 1.º e 3.º Ciclos de Estudos, respetivamente Licenciatura e Doutoramento em ..., ciclos em que o A lecionou, verifica-se nos quadros infra - figura B e C - um número reduzido de alunos inscritos na U...:


(figura B - Evolução do n.º de alunos inscritos na Licenciatura em ... da U... - incluindo pré-bolonha)

Ano lectivo2009/2010 2010/2011 2011/2012 2012/2013 2013/2014 2014/2015
Matemática1415161286
Bolonha Matemática
(Pré-Bolonha)
11 4 1 0 0 0

(figura C - Evolução do n.º de alunos inscritos no Doutoramento em ... da U...)

2009/20102010/2011 2011/2012 2012/2013 2013/2014 2014/2015
142212

60. Também por ser deveras elucidativo, veja-se o decréscimo do número total de alunos inscritos na U... (incluindo cet's3, licenciaturas, mestrados e doutoramentos):


(figura D - Evolução do n.° total de alunos inscritos no 1.°, 2.° e 3.° Ciclo de estudos da U...)

Anos
letivos
2009/2010 2010/2011 2011/2012 2012/2013 2013/2014 2014/2015
Nº de alunos
13013 13273 12183 9711 7971 7599

61. Diante de um panorama que evidenciava uma severa redução de candidatos a partir do ano letivo 2012/2013, entendeu a Reitora da U..., conjuntamente com a Direção da COFAC, no âmbito das competências assinaladas e em consonância com os Diretores das Faculdades que integram a Universidade e outras instituições de ensino superior do denominado “Grupo ...”, pugnar pela redistribuição do serviço docente a todos os docentes vinculados à R, independentemente do figurino contratual

62. Reduzir percentualmente os montantes pagos a títulos de honorários ao A. de molde a evitar a desvinculação definitiva de alguns professores e, com esta medida, suavizar o prejuízo a todos causado pela grave crise económica e social que assolou o país.

        […]

67. No que ao caso nos importa, em meados de abril, a Professora BB teve uma reunião com a Administração/Reitoria da U... e Direção da COFAC, onde lhe foi transmitido, dada a indisponibilidade económico-financeira da R, a percentagem a reduzir aos honorários dos docentes que faziam parte do Departamento de ....

68. Tal como aconteceu no Estado.

69. Não obstante os esforços infrutíferos em que a R tudo fez para tal não acontecer, a avença mensal que o A recebia foi minorada em 10%.

70. A Professora BB transmitiu aos docentes DD, EE, FF e ao A que seria necessário reduzir em 10% do valor acordado, dada a grave crise que assoberbava a R.»


b) Factos não provados:

1. Os citados docentes, incluindo o A, dado o circunstancialismo sui generis da conjuntura que a R atravessava, aceitaram a redução de 2.500,00€ para 2.250,00€.

2. O A demonstrou a sua anuência à alteração contratual.

3. O A sabia se não fosse uma questão de sobrevivência da R, estes cortes não se verificariam e, por isso, aceitou a redução de 10% no valor acordado.

4. Não obstante as dificuldades financeiras da R, mesmo em tempos incertos, ao longo da relação contratual, a R foi repondo os valores acordados, incluindo os valores devidos ao A.


*


Foram, pelo Tribunal a quo, considerados não escritos os seguintes factos:

63. À data dos factos, a R tinha forçosamente, sob pena de fechar portas, que reduzir custos para se manter em funcionamento.

64. Todos os docentes das instituições de ensino que constituem o designado “Grupo ...”, incluindo o A, estavam cientes da grave situação económico-financeira em que se encontrava a R..

65. Todos os docentes, incluindo o A, sabiam que a disponibilidade financeira da R, conjugada com a grave crise económica e a falta de alunos (o único meio de sustento da R), era periclitante.

66. Todos os docentes, independentemente do ciclo de estudos ou da área académica, incluindo o A, estavam cientes da grave situação económico-financeira em que se encontrava a R..



III



III.1.

A Recorrente começa por dizer que a qualificação de uma determinada prestação como subsídio de férias e subsídio de Natal pressupõe a existência de um contrato de trabalho, não podendo tais expressões ser levadas à matéria assente. Considera, por isso, ilegal o ponto 13 da matéria de facto assente decidida pelo Tribunal da Relação, no Acórdão ora recorrido, onde constam as expressões “subsídio de férias” e “subsídio de natal”, impondo-se, assim, a eliminação oficiosa dessa matéria.

Vejamos.

No ponto 12, deu-se como provado que:

«12. Tendo em conta tal valor e o horário atribuído, a Ré pagava ao Autor uma retribuição correspondente a: 4 x N.º de horas letivas x Valor/h.»

E no ponto 13 (visado pelo Recorrente):

«13. Esta retribuição era paga mensalmente, 14 vezes por ano, no mesmo momento temporal em que são recebidos os subsídios de férias e de Natal, incluindo os meses em que a U... se encontrava encerrada para férias e em que o Autor não prestava qualquer serviço.»


Para além de as expressões subsídio de férias e de subsidio de Natal serem expressões que se tornaram correntes, utilizadas na linguagem comum, que não lhes veda figurarem na matéria de facto, não assumem, in casu, o papel de caracterização do contrato em apreço, apenas se referindo que a retribuição era paga mensalmente, 14 vezes por ano, no mesmo momento temporal em que são recebidos os subsídios de férias e de Natal. Como se vê, nem sequer as duas prestações suplementares que, na situação em apreço, se verificavam, são rotuladas com tais designações, apenas se mencionando que coincidiam com o (consabido) momento em que são recebidos aqueles subsídios.

Não assiste, pois, razão à Recorrente quanto a este aspecto.


III.2.

A Recorrente revela-se inconformada com a conclusão jurídica extraída pelo Tribunal a quo quanto aos reajustes remuneratórios e renegociação operada pela Ré, decorrente da crise financeira e económica que assolou Portugal e, em particular a Ré como entidade instituidora de um estabelecimento de ensino superior privado, não está em conformidade com a Lei.

Constata que, em relação à forma de contratação e em sede de regulamentação das carreiras dos professores do ensino superior privado e cooperativo, há muito que existe um vazio legislativo, assumindo grande relevância, na fixação do conteúdo dos contratos de docência dos professores do ensino superior privado e cooperativo, o princípio da liberdade contratual/ou da autonomia privada, que confere às partes a faculdade de fixarem livremente o conteúdo dos contratos, como decorre do exarado no Ac. do STJ de 22-09-2010, Rel. Mário Pereira, Proc. 4401/04.7TTLSB.S1, publicado em www.dgsi.pt, (no qual se considerou que «a contratação de docentes do ensino superior particular ou cooperativo pode efectuar-se tanto através de um contrato de trabalho como de contrato de prestação de serviços», «podendo a instituição de ensino e o docente recorrer, tanto ao contrato de trabalho (através de um convénio em que se verifique o condicionalismo de subordinação característico do contrato individual de trabalho) como ao contrato de prestação de serviços, optando, num caso ou no outro, pelo modelo de contratação que melhor se ajuste aos seus interesses»).

Assim, ao Autor e à Ré, em sede de livre conformação do conteúdo do contrato que outorgaram e concretizaram, não estava de todo vedado socorrerem-se de cláusulas atípicas especificamente concebidas apenas para a relação obrigacional estabelecida, nem tão-pouco alterarem, na sua génese, algum elemento do contrato, nomeadamente a contraprestação a receber pelo Autor.

Observa que das cláusulas contratuais não se extrai, por forma alguma, qualquer horário mínimo, e muito menos, qualquer retribuição mínima, na medida em que a carga horária lectiva podia ser aumentada ou reduzida e, no limite, até excluída, de semestre para semestre, sendo que, quando o valor definido no contrato foi subtraído, o Autor aceitou tacitamente a sua redução, através de comportamentos concludentes, continuando  a leccionar, desde 2012 a 2015, até à cessação do contrato.

A Recorrente insiste, ao longo das conclusões, em que o A. aceitou a redução, nada tendo feito perante essa redução.

Refere que houve uma partilha do risco, entre A. e R., designadamente durante a crise económico-financeira que a R. experenciou,

Vinca que não existia salário em sentido laboral típico, com a possibilidade de horário zero – retribuição zero.

Diz ainda que, tendo a entidade instituidora o dever legal de garantir a sustentabilidade económica e financeira do estabelecimento de ensino, no cenário da grave crise económica «não se vislumbra possível a aplicação cega das normas civis, nomeadamente pacta sunt servanda, mas sim da aceitação tácita, nos termos do art.º 217.º do CC, pelo Autor no reajuste remuneratório operado pela Ré», tendo existido uma alteração da situação de facto existente no momento da celebração do contrato, resultando da crise socioeconómica, mudanças substanciais, extraordinárias e imprevisíveis, no seio da entidade instituída e sendo, por isso, de admitir reajustamento da contraprestação  e de renegociação do contrato.

Chama a atenção para o facto de se estar perante ensino superior particular e cooperativo e refere que, no caso concreto, os factos revelam, com suficiente densidade e especificidade, qual foi a vontade das partes na génese da relação: celebrar um contrato não laboral, em que a renegociação e ajustes ao contrato eram possíveis e foram executados e aceites pelas partes e ainda que a retribuição não é, neste contrato, um elemento essencial, podendo, porventura, faltar.

Assinala que:

«137. Num modelo retributivo como o acordado pelas partes na presente situação, a consequência querida e praticada só pode ser seguinte: de molde a assegurar a subsistência da entidade instituidora, aqui Ré- COFAC, após os reajustes remuneratórios em percentagem, foi necessário retroceder ao modelo inicial em que o docente era pago em função da componente lectiva (aulas e avaliações).

[…]

139. A renegociação do contrato foi essencial de molde a acomodar o impacto da referida crise e o Autor, por ter essa noção, aceitou essa oscilação remuneratório. Vide matéria de facto provada.

140. Tanto a Ré como o Autor poderiam ter resolvido o acordo, mas, o recurso à renegociação do contrato era o que melhor se coadunava com as necessidades, à data, das partes, pelo que se aquela solução se encontra adequada e legítima.»

[…]

146. E o que deriva da prova provada é que após a renegociação contratual operada pela Ré, em 2012, o Autor continuou a leccionar, cessando apenas o contrato em 2015.

147. No terceiro momento do contrato, aquele em que a Ré reverteu o modelo remuneratório para o inicialmente acordado, o montante a receber pelo Autor dependia, sempre, do número de aulas efectivamente leccionadas. »


Apreciemos.

O Tribunal a quo, conforme se referiu, tratou da questão central de alteração das circunstâncias, na qual assentou a decisão da 1ª Instância, absolutória da Ré, tendo como base legal o disposto no art. 437º do C. Civil, em cujo nº1 se dispõe:

«Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.»


No acórdão recorrido, para definição do quadro teórico aplicável, tomou-se, primacialmente, em consideração o trabalho de Nuno Pinto de Oliveira intitulado “A alteração das circunstâncias 55 anos depois”, publicado na revista “Julgar”, nº44, Maio-Agosto, 2021, Almedina, Coimbra, pp. 57 e segs..

Teve-se, desde logo, em linha de conta estar-se perante um contrato de execução duradoura, para a qual está pensada, sobretudo, a figura da alteração das circunstâncias (op. cit., p. 162).

Elencaram-se os requisitos positivos da alteração das circunstâncias:

- o de que as circunstâncias alteradas constituam a base ou o fundamento do contrato, por serem as circunstâncias  em que as partes fundaram a decisão de contratar;

– o de que a alteração das circunstâncias seja anormal ou extraordinária, imprevista ou imprevisível;

 – o de que a alteração seja exterior à parte prejudicada;

 – o de que a alteração seja a causa de uma lesão;

 – o de que a lesão seja grave.


Com requisitos negativos, apontaram-se os seguintes:

- que a alteração das circunstâncias não seja posterior à constituição em mora da parte lesada;

- que a alteração das circunstâncias, ou a lesão decorrente da mesma, não estejam cobertas pelos riscos próprios do contrato;

- que tal lesão não se mostre prevista ou regulada por disposições legais ou contratuais específicas.


No Ac. do STJ de 23-01-2014, Rel. Granja da Fonseca, Proc. 1117/10.9TVLSB.P1.S1, em www.dgsi.pt, referido no acórdão recorrido, considerou-se que:

«VII - O direito à resolução ou modificação do contrato por alteração anormal das circunstâncias pressupõe (i) que a alteração a ter por relevante diga respeito a circunstâncias em que as partes tenham fundado a decisão de contratar; (ii) que essas circunstâncias fundamentais hajam sofrido uma alteração anormal (iii) que a estabilidade do contrato envolva lesão para uma das partes (iv) que tal manutenção do contrato ou dos seus termos afecte gravemente os princípios da boa-fé (v) que a situação não se encontre abrangida pelos riscos próprios do contrato e, (vi) por último, a inexistência de mora do lesado.

VIII - Diferentemente do erro, em que a base do negócio é unilateral, respeitando exclusivamente ao errante, na alteração das circunstâncias a mesma é bilateral, respeitando simultaneamente aos dois contraentes (i.e., que se produza uma alteração anormal das circunstâncias em que ambas as partes fundaram a decisão de contratar).»


No Ac. do STJ de 26-02-2017, Rel. Tomé Gomes, Proc. 540/11.6TVLSB.L2.S1, em www.dgsi.pt, igualmente referenciado no acórdão impugnado, entendeu-se que:

«A interpretação e aplicação dos pressupostos do instituto da resolução ou modificação do contrato por alterações das circunstâncias, previstos no artigo 437.º do CC, não deve ser feita de forma atomizada ou parcelar, numa lógica conceptual subsuntiva, mas na sua implicação recíproca, já que a alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar não é alheia ao risco inerente ao próprio negócio, nem a verificação de tais requisitos e das suas consequências poderão deixar de ser perspetivados à luz de uma ponderação mais global dos princípios orientadores da boa fé e da tutela da confiança.

VII. Por outro lado, tratando-se de conceitos indeterminados, o seu preenchimento não deve ser realizado de modo abstrato, apriorístico, sob um prisma marcadamente categorial, mas antes mergulhando na substancialidade do caso concreto.»


Na fundamentação deste aresto, referiu-se, a dado passo, que:

«Como são doutrina e jurisprudência correntes, o instituto da “alteração anormal das circunstâncias” consagrado no artigo 437.º e seguintes do CC, traduz-se num mecanismo derrogatório do princípio contratual de pacta sunt servanda consagrado no artigo 406.º do mesmo Código e inspirado na vetusta cláusula rebus sic stantibus, através do qual se procura fazer face a casos-limites em que a execução do programa contratual se revele superlativamente injusta em face de alterações anormais das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar, afetando de forma grave os princípios da boa fé reclamados pela tutela da confiança.»


No Ac. do STJ de 08-06-2017, Rel. Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, Proc. 2118/10.2TVLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt, exarou-se o seguinte:

«IX - Para que a lei portuguesa confira o direito potestativo de resolver ou de modificar equitativamente um contrato, do qual resulta para a parte a necessidade de realizar uma ou mais prestações no futuro, invocando alteração anormal das circunstâncias (art. 437.º, n.º 1, do CC), é necessário que se prove: (i) que as circunstâncias objectivas em que ambas fundaram a decisão de contratar; (ii) se alteraram anormalmente após a realização do contrato; (iii) que essa alteração, objectiva e anormal, não está coberta pelos riscos próprios do contrato e que (iv) a exigência do cumprimento dessa prestação (ou dessas prestações) contrarie gravemente o princípio da boa fé


No que toca ao caso concreto, resultou provado que:

A Ré é uma cooperativa que se dedica a explorar estabelecimentos de ensino e formação profissional e, no âmbito desta sua actividade, explora um estabelecimento de ensino superior privado denominado Universidade ... (U...).

Em 29/09/2008, o Autor celebrou com a Ré um contrato, que as partes denominaram de “Contrato de Docência em Regime de Tempo Integral”, através do qual o  Autor foi admitido a exercer funções de docente do Ensino Superior, atribuindo-se-lhe a categoria académica de assistente, para exercer as suas funções em regime de tempo integral, de molde a preencher os requisitos predefinidos pelo Ministério da tutela, obrigando-se o Autor a prestar o trabalho correspondente a tal função, nos termos determinados pelos “órgãos académicos competentes” e a “contribuir para a gestão democrática da universidade”.

Em 01/03/2009, a pedido da Ré, o Autor subscreveu um contrato, de conteúdo em tudo idêntico ao referido.

O A. sempre prestou o seu serviço para a Ré, nos termos contratados, leccionando as disciplinas que esta lhe atribuiu, fazendo a avaliação de conhecimentos, prestando assistência aos alunos, orientando teses e estágios, participando nos órgãos de gestão da Universidade e representando a mesma em diversos eventos do âmbito académico.

Foi acordado que a Ré pagava ao Autor, por cada hora lectiva, o valor de 25,50€, até 12h lectivas semanais, e o valor de 20,00€ a partir das 12h lectivas semanais.

Tendo em conta tal valor e o horário atribuído, a Ré pagava ao Autor uma retribuição correspondente a: 4 x N.º de horas lectivas x Valor/h, sendo esta retribuição paga mensalmente, 14 vezes por ano, no mesmo momento temporal em que são recebidos os subsídios de férias e de Natal, incluindo os meses em que a U... se encontrava encerrada para férias e em que o Autor não prestava qualquer serviço.

Refere-se, no acórdão, ser pacífico que, desde o início do contrato, em 29-09-2008, até Outubro de 2010, a carga horária para cada semestre lectivo podia ser aumentada, reduzida ou até excluída e, em consequência, respectivamente aumentados, reduzidos ou excluídos os honorários do A., inexistindo qualquer horário mínimo, dentro do qual teria, obrigatoriamente, de prestar serviço, ou qualquer carga horária fixa, impondo um regime remuneratório variável, cuja oscilação se mostra apurada nos autos e o que o mesmo aceitou.

Sucede que, em Julho 2010, o A. obteve o grau académico de Doutor, através do Curso de Doutoramento ministrado pela Universidade ....

Na sequência disso, a Coordenadora da Área Científica da ... da U..., em 13.09.2010, enviou uma carta ao Administrador da U..., na qual, face às qualidades científico-pedagógicas do A., propunha a alteração da categoria profissional do mesmo para Professor Auxiliar em regime de tempo integral, com um vencimento de 2.500,00€ mensais e, em 01.10.2010, as partes celebraram um aditamento ao contrato, no qual foi acordado que o Apelante, que já estava em tempo integral, passaria a auferir a quantia de 2.500,00€ mensais, sujeita aos devidos descontos legais.

Conforme se ponderou no acórdão recorrido:

«Com o aditamento realizado houve uma alteração de relevo no desenho contratual, porquanto a contrapartida da Recorrida deixou de estar adstrita ao número de horas lecionadas, e assim também ao maior ou menor número de alunos que determinassem a atividade a desenvolver pelo Recorrente, sendo o pagamento efetuado no montante estipulado, independentemente da variável horas/alunos, o que diga-se, não se configura como algo avesso à realidade académica, sendo conhecida a vertente de investigação, a nível nacional ou mesmo internacional, realizada em estabelecimentos de ensino universitário.»


Provou-se que (com destaque nosso a negrito):

«20. A partir de fevereiro de 2012, a Ré, sem o consentimento do Autor e sem qualquer tipo de comunicação, operou uma redução no valor da retribuição acordada, tendo-lhe passado a pagar o montante de 2.250,00€.

21. A partir de março de 2013, a Ré, sem o consentimento do Autor e sem qualquer tipo de comunicação, operou uma nova redução ao valor da retribuição acordada, tendo-lhe passado a pagar o montante de 2.137,50€.

22. Para além da falta de pagamento de outras prestações retributivas, em novembro de 2014, a título de remuneração pelos serviços prestados em outubro de 2014, a Ré apenas entregou ao Autor o montante de 280,80€.

23. Em dezembro de 2014, a título de retribuição pelos serviços prestados em novembro de 2014, a Ré apenas entregou ao Autor o montante de 280,80€.

24. No entanto, mesmo após várias insistências do Autor junto dos serviços de pessoal, a Ré não pagou o remanescente da retribuição contratada e em dívida.»


Há que, desde já, sublinhar que a redução operada relativamente ao que tinha sido convencionado em 01-10-2010 não teve, de acordo com o que está expressamente provado, o consentimento do Autor, registando-se, ademais, em consonância com essa afirmada falta de consentimento, as insistências do A. junto dos serviços de pessoal, para que lhe fosse pago o remanescente da retribuição contratada e em dívida.


No que concerne à crise socioeconómica, provou-se que:

«54. Devido ao aumento do endividamento público dos países do sul da Europa, em particular Portugal, Grécia e Espanha, e depois da crise europeia se agravar com o resgate à Grécia no início de 2010, foi necessária ajuda financeira (FMI) e diversos planos de recuperação austeros a aplicar aos países devedores.»


Também se provou que o ensino superior público e privado, em especial este último, experienciou um acentuado decréscimo na frequência de alunos; que, tal como o ensino superior,  a R. foi alvo de um fenómeno atípico de natureza económico-social,  que se fez sentir, em primeira linha, nas instituições de ensino superior privado e que, como é atestado pelo quadro constante do ponto 57, o número de alunos inscritos no 1.° Ciclo de estudos da U...  revelou um acentuado decréscimo em apenas 3 anos lectivos, nos quais perdeu, apenas no tocante a alunos inscritos nas licenciaturas, aproximadamente, 3200 alunos, sendo que, no que se refere, em específico, ao número de alunos no 1.º e 3.º Ciclos de Estudos, respetivamente Licenciatura e Doutoramento em ..., ciclos em que o A leccionou, se verificou  um número reduzido de alunos inscritos na U... (cf. quadros insertos no ponto 59).

Como se observa no acórdão recorrido, mesmo em 2010/2011, aquando da alteração do quadro contratual do Recorrente, com o acordado pagamento certo mensal, de 2.500,00€, já se registavam números muito reduzidos na área de leccionação do Autor, o que não foi impeditivo de um tal acordo.

Provou-se que diante de um panorama que evidenciava uma severa redução de candidatos, a partir do ano lectivo 2012/2013, entendeu a Reitora da U..., conjuntamente com a Direção da COFAC, no âmbito das competências assinaladas e em consonância com os Diretores das Faculdades que integram a Universidade e outras instituições de ensino superior do denominado “Grupo ...”, pugnar pela redistribuição do serviço docente a todos os docentes vinculados à R., independentemente do figurino contratual.

Foi entendido reduzir percentualmente os montantes pagos a títulos de honorários ao A. de molde a evitar a (sua) desvinculação definitiva e de alguns professores e, com esta medida, suavizar o prejuízo a todos causado pela grave crise económica e social que assolou o país.

O montante mensal recebido pelo A. foi reduzido em 10% e foi transmitido ao A. e a outros professores que seria necessária essa redução em 10%, dada a grave crise que assoberbava a R. (pontos 69 e 70).

Não se provou que o A. e os restantes docentes, dado o circunstancialismo sui generis da conjuntura que a R. atravessava, tenham aceitado a redução de 2.500,00€ para 2.250,00€, nem que tenha o A. demonstrado anuência à alteração contratual, nem, ainda, que sabia que, se não fosse uma questão de sobrevivência da R., estes cortes não se verificariam e, por isso, tenha aceitado a dita redução.

No acórdão impugnado, tendo em conta este quadro factual, escreveu-se o seguinte (com destaque nosso, a negrito):

«Aqui chegados manifesto se torna que a pretendida alteração anormal das circunstâncias que segundo a Recorrida validam as modificações operadas na relação contratual como o Recorrente funda-se na crise económica e financeira iniciada em 2008, que não se questiona que se reconduz a um acidente anormal e estrutural e grave na evolução da economia mundial, não antecipável de forma generalizada e para surpresa de muitos, ou quase todos, maxime os não especialistas em tais questões.

Desde logo surge como perturbador da pretensão formulada, a cronologia enunciada do factualismo apurado, nomeadamente a alteração contratual realizada no ano de 2010/2011, na atribuição de uma prestação mensal certa, para além dos fluxos maiores ou menores dos alunos inscritos, não constituindo assim a base ou fundamento da modificação contratual que se manteve inalterada até fevereiro de 2012, sendo certo que mesmo o diminuto número de alunos inscritos na Licenciatura e Doutoramento em ... era uma realidade que já existia, aquando da aludida modificação do contrato do Recorrente.

Mais relevante contudo, é sem dúvida não ter a Recorrida carreado para aos autos os factos necessários que permitissem aferir das reais consequências que a crise de 2008 lhe provocou em termos de capacidade económica e financeira, nomeadamente quando à impossibilidade de cumprir as obrigações a que se encontrava adstrita, de modo a que se pudesse concluir que a imposição da satisfação das prestações ao Recorrente constituía um sacrifício contrário aos ditames da boa fé que deve regular a execução dos contratos.

Com efeito, admitindo-se que não tivesse atravessado, incólume, o período que se sucedeu ao despontar da crise de 2008, certo é que conforme acima se aludiu não ficou demonstrada uma efetiva correlação entre tal crise e a situação concreta da Recorrida, em termos da respetiva saúde financeira e situação económica, sendo manifestamente insuficiente para tanto a referência a indisponibilidade económico-financeira ou a grave situação, igualmente irrelevando uma assunção, por não faticamente provada, de procedimentos de outra entidades quanto aos pagamentos dos salários dos seus funcionários, como se verificou na administração pública.

Não verificados os requisitos positivos exigíveis para a constatação da alteração anormal das circunstâncias, nos termos do art.º 437, n.º1, do CC, carece de relevância apurar da existência do negativo, pese embora a haja mora, face às dificuldades marcadas de apuramento, novamente por falta de alegação e prova de factos pela Recorrida.»


Nuno Pinto de Oliveira, no artigo citado, refere, a propósito do requisito que exige que a alteração seja causa de uma lesão, o seguinte:

«O art.º 437.°, n.º 1, do Código Civil fala em "alteração anormal" e em "parte lesada", e tem sido interpretado no sentido de que se exige que a alteração anormal seja a causa de uma lesão:",

O conceito de lesão concretiza-se numa "perturbação no equilíbrio contratual"(…), de que decorre uma desvantagem sensível ou um prejuízo sen­sível para uma das partes, e o requisito de que a alteração seja a causa da lesão concretiza-se numa correlação adequada (...), numa correlação directa, ou numa correlação directa "demonstrada factualmente" (…).

O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Novembro de 2004 enuncia explicitamente o requisito de que o acontecimento imprevisível esteja em relação de causalidade com a lesão, ou seja, com a "perturbação do equilíbrio negocial", e de que a relação de causalidade seja uma relação de causali­dade adequada. Em consequência, a alegação e a prova de uma alteração das circunstâncias, designadamente de uma grande alteração das circunstâncias, deveria distinguir-se da prova de que a alteração das circunstâncias tenha sido a causa da impossibilidade prática, da impossibilidade económica ou da excessiva onerosidade da prestação - ainda que, p. ex., a crise económica e financeira que começou em 2008 fosse uma alteração anormal, a impossibilidade prática ou a impossibilidade económica de cumprimento só seria relevante para efei­tos dos art.ºs 437.°-439.° desde que houvesse uma correlação "demonstrada factualmente" entre a crise financeira geral e a actividade económica individual, concreta, de um determinado sujeito (…)»


No Ac. do STJ de 25-11-2004, Rel. Salvador da Costa, Proc. 04B3733, em www.dgsi.pt, considerou-se entre o mais, que:

«1. A alteração das circunstâncias a que se reporta o artigo 437º, nº 1, do Código Civil é a sua modificação anómala, ou seja, a que escapa ao curso ordinário ou à série natural dos acontecimentos, e a grave afectação dos princípios da boa fé consubstancia-se na perturbação do originário equilíbrio negocial.

2. A perturbação do equilíbrio negocial deve estar em relação de causalidade adequada com o acontecimento anormal ou imprevisível envolvido (…).»


No Ac. do STJ de 10-01-2013, Rel. Orlando Afonso, Proc., em www.dgsi.pt, concluiu-se que:

«I - Nos termos do art. 437.º, n.º 1, do CC, para que seja possível a resolução ou, ao menos, a modificação das cláusulas do contrato fundada na alteração anormal das circunstâncias é necessário: (i) que a alteração ocorrida não seja o desenvolvimento previsível de uma situação conhecida à data da celebração do contrato e (ii) que essa alteração torne o cumprimento da obrigação ofensivo dos princípios da boa fé.

II - Enquanto o erro na base do negócio é unilateral, na alteração das circunstâncias a base do negócio é bilateral, pois que respeita simultaneamente aos dois contraentes: o art. 437º, n.º 1, do CC fala, acentuadamente, das circunstâncias em que as partes (no plural) fundaram a decisão de contratar; não referindo as circunstâncias em que o lesado com a superveniente modificação teria fundado a sua decisão de contratar.

III - Muito embora a crise económico-financeira possa criar desequilíbrios económicos susceptíveis de provocarem alterações anormais das circunstâncias, nem todos os incumprimentos – em tempos de crise – se ficam a dever a essa alteração das circunstâncias.

IV- É necessário que haja uma correlação directa e demonstrada factualmente entre a crise económica geral e a actividade económica concreta de determinado agente para que se possa falar de uma alteração anormal das circunstâncias.

V - Não resultando provado nos presentes autos que a degradação da capacidade económica da autora – e que a conduziu à impossibilidade de satisfazer as obrigações assumidas com o réu – se tenha ficado a dever à crise económica internacional, não está configurada a previsão do n.º 1 do art. 437.º do CC.»


Conforme se ponderou no acórdão impugnado, o decisivo (na economia do presente processo) aditamento ao contrato, realizado no ano lectivo de 2010/2011, com atribuição de uma prestação mensal certa, sem reporte a fluxos maiores ou menores de alunos inscritos, revela que este aspecto não constituiu a base ou fundamento da modificação contratual que se manteve inalterada até Fevereiro de 2012.

  Por outro lado, como também  resulta do acórdão, não está factualmente demonstrado que as consequências que a crise de 2008 provocou relativamente à Ré (e era a esta que competia fazê-lo, nos termos do art. 342º, nº2, do C. Civil) acarretaram, em termos de causalidade adequada, a impossibilidade de cumprir as obrigações a que se encontrava adstrita, de modo a que se pudesse concluir que a imposição da satisfação das prestações ao A. constituía um sacrifício contrário aos ditames da boa fé (que deve regular a execução dos contratos), ou seja, não ficou demonstrada a correlação directa entre a indicada crise e a situação concreta da Recorrida, em termos de ter sido tal crise a tornar impossível ou excessivamente oneroso o cumprimento da sua obrigação para com o Autor.

Que o aditamento contratual feito em 01-10-2010 representou uma alteração de relevo no desenho contratual, porquanto a contrapartida da Recorrida deixou de estar adstrita ao número de horas lecionadas, e assim também ao maior ou menor número de alunos que determinassem a atividade a desenvolver pelo Recorrente (como se refere no acórdão impugnado) é, salvo o devido respeito, revelado pelo que a própria Recorrente alega, já que, referindo que não foi contratualizado um salário fixo ou retribuição certa, não deixa de dizer que tal se verificou “à excepção do período em que vigorou o documento complementar”, e alude a renegociação contratual e a um momento  em que, na sua perspectiva, se reverteu para o modelo remuneratório inicialmente acordado. Ou seja, admite que o aditamento contratual feito em 2010 se distinguia, com nitidez, do regime de retribuição que fora inicialmente acordado, ao qual pretendeu reverter e alegando que o Autor a isso anuiu.

 Ora, como acima se deixou adiantado, da factualidade provada resulta que o A. não consentiu na redução da retribuição e insistiu, junto dos serviços de pessoal, infrutiferamente, pelo remanescente em falta.

Além disso, resultou não provado que o A. tenha aceitado a redução ou tenha dado anuência a uma alteração contratual posterior à de 01-10-2010, que as partes livremente assumiram nessa altura (art. 405º, nº1, do C. Civil), não havendo razões para se falar de qualquer aceitação tácita por parte do A. ou na alegada partilha de risco.

Mantendo-se a obrigação de pagamento de retribuição tal como ela foi definida em 2010 (art. 407º do C. Civil), não sofre reparo o acórdão recorrido ao condenar a R. no pagamento das diferenças entre o montante mensal satisfeito a partir de Fevereiro de 2012 e a quantia mensal estabelecida de 2.500,00€, paga 14 vezes por ano, acrescidas dos juros de mora legais, contados desde cada prestação devida, até integral pagamento.

Improcede a revista.


*

Sumário (da responsabilidade do relator)



1. Destinando-se os recursos a apreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, devem as partes, nas suas alegações, conter-se no que foi decidido, sucedendo que o nosso modelo é de reponderação, visando o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame no sentido da repetição da instância no tribunal de recurso.

2. Para que as consequências que a crise de 2008 provocou fossem consideradas, num caso como o dos autos, seria necessário, num juízo de causalidade adequada, demonstrar factualmente que elas acarretaram a impossibilidade de cumprir as obrigações a que a Ré se encontrava adstrita, de modo que se pudesse concluir que a imposição da satisfação das prestações ao A. constituía um sacrifício contrário aos ditames da boa fé (que deve regular a execução dos contratos), ou seja, impunha-se a demonstração da correlação directa entre a indicada crise e a situação concreta da Recorrida, em termos de ter sido tal crise a tornar impossível ou excessivamente oneroso o cumprimento da sua obrigação para com o Autor.

3. Não se provando que o A. tenha aceitado a redução da retribuição, após a modificação do contrato, que alterou o seu desenho de molde a não o deixar dependente do número de horas leccionadas ou do número de alunos, não podia essa redução ser unilateralmente levada a efeito pela Ré.



IV


Pelo exposto, nega-se provimento à revista.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 07-03-2023


Tibério Nunes da Silva (Relator)

Nuno Ataíde das Neves

Sousa Pinto

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[1] Montantes ilíquidos recebidos pelo A.