RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
PERDA DE CAPACIDADE DE GANHO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
Sumário


I - A compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão pelo lesado traduzida em perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o afete mas,  inclui também a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as deficiências funcionais de maior ou menor gravidade que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.
II - A perda relevante de capacidades funcionais - mesmo que não ou não totalmente refletida no valor dos rendimentos obtidos pelos lesado nomeadamente por este se encontrar já reformado - constitui uma redução no trem de vida quotidiano com reflexos de indemnização em termos patrimoniais uma vez que a esperança de vida não confina à denominação de vida ativa com rebate exclusivo no exercício de uma profissão.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



Relatório

AA, residente em Rua ..., ... – ... ... ..., instaurou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra Zurich Insurance PLC, sucursal em Portugal, com sede em Rua Barata Salgueiro, 41 – 1269- 058 Lisboa, onde conclui pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe:

- O montante de €123 588,61 (cento e vinte e três mil quinhentos e oitenta e oito euros e sessenta e um cêntimos), a título de danos patrimoniais e não patrimoniais;

- Todas as despesas médicas, medicamentosas, hospitalares, transportes e outras despesas futuras que sejam decorrentes das lesões sofridas do acidente ou do seu tratamento;

-Todos os danos patrimoniais e não patrimoniais futuros decorrentes do tratamento ou agravamento daquelas lesões e sequelas que se vierem a fixar de acordo com as circunstâncias que se apurarem em sede de incidente de liquidação de sentença;

- Juros de mora contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para tanto e em síntese alegou que, no dia 9 de julho de 2018, pelas 10 horas, conduzia o veículo ligeiro de passageiros da marca Audi, com a matrícula ..-..-JU, de sua propriedade, pela Av.ª..., em ..., no sentido nascente/poente, pela sua hemiataxia de rodagem, no meio de uma série de veículos que seguiam no mesmo sentido, quase em fila.

Em sentido contrário, seguia o veículo da marca BMW, com a matrícula ..-PI-.. que, tendo saído da sua faixa de rodagem, invadiu a faixa de rodagem onde circulava o Autor e os restantes veículos e colidiu com os mesmos de forma violenta. O acidente em causa provocou-lhe danos de carácter patrimonial e não patrimonial, que o mesmo descreveu, os quais devem ser ressarcidos pela aqui Ré que, por contrato de seguro automóvel, assumiu a responsabilidade civil pela circulação do veículo que provocou a referida colisão.

A Ré apresentou contestação onde assume estar constituída na responsabilidade de indemnizar a Autora pelos danos decorrentes do acidente. Impugnou, contudo, os danos sofridos e a extensão dos mesmos.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, onde se fixou a matéria assente e se selecionaram os temas de prova, despacho esse que não mereceu reclamação das partes.

Antes da realização da audiência de julgamento, com fundamento na extensão dos danos apurada em consequência da perícia realizada, veio o Autor requerer a ampliação do pedido de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, para o montante total de €182.186,61.

Realizado julgamento foi proferida sentença onde se julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, se condenou a Ré Zurich Insuranc Plc a pagar ao Autor AA:

a) A quantia de €39.176,91 (trinta e nove mil cento e setenta e seis euros e noventa e um cêntimos) a título de danos patrimoniais;

b) A quantia de €40.000,00 (quarenta mil euros) a título de compensação por danos não patrimoniais;

c) juros de mora, sobre as quantias líquidas acima referidas, desde a data desta decisão relativamente à quantia referida em b) e desde a data da citação relativamente à referida em a), à taxa de 4%, desde a presente data, até integral pagamento, aplicando-se qualquer alteração que venha a ser introduzida a esta taxa de juro até àquela data. No mais, absolveu-se a Ré dos restantes pedidos formulados.


A apelação deu parcial provimento ao recurso e julgou e revogou a sentença julgando a ação parcialmente procedente condenando a Ré Zurich Insuranc Plc a pagar ao Autor AA

a) A quantia de € 24.171,91 (vinte e quatro mil cento e setenta e um euros e noventa e um cêntimos) a título de danos patrimoniais;

b) A quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros) a título de compensação por danos não patrimoniais;

c) Os juros de mora, sobre as quantias líquidas acima referidas, desde a data desta decisão relativamente à quantia referida em b) e desde a data da citação relativamente à referida em a), à taxa de 4%, desde a presente data, até integral pagamento, aplicando-se qualquer alteração que venha a ser introduzida a esta taxa de juro até à data do pagamento. No mais, absolve-se a Ré dos restantes pedidos formulados.

… …

O Autor interpôs recurso de revista concluindo que:

1. O recorrido entende, com o devido respeito e salvo melhor opinião, que o Tribunal a quo, na fixação do quantum indemnizatório devido a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, não retirou da matéria de facto dada como provada as consequências necessárias e, consequentemente, o mesmo não é justo e equitativo, pecando por defeito.

2. No que tange ao dano biológico deve ter-se em consideração que para a quantificação do mesmo existem, todavia, alguns tópicos ou elementos referenciais que podem/devem ser tidos em conta, como (i) a idade do Autor/Recorrente à data do acidente; (ii) a remuneração mensal auferida pelo lesado à data do acidente e/ou outros rendimentos por si usufruídos; (iii) a taxa média de inflação e a taxa de rentabilidade do capital, baseadas num juízo de previsibilidade e (iv) a gravidade das lesões, as suas consequências e a atribuição do grau de incapacidade ou de défice funcional.

3. Sendo certo que, o recorrente ao receber esta quantia de uma só vez não obterá qualquer vantagem patrimonial, uma vez que, atentas as condições económicas e financeiras que se vivencia em Portugal e no Mundo atualmente, a verdade é que tal  recebimento “de uma assentada” não lhe trará qualquer vantagem patrimonial. Se considerarmos a diminuição acentuada da rentabilidade dos produtos bancários (a qual é há vários anos muito próxima de zero e, assim, previsivelmente, continuará a ser por muitos anos), a desvalorização da moeda, o crescente aumento do custo de vida e, ainda, a grande inflação que se vive atualmente em Portugal e no Mundo – que, de acordo com o Banco de Portugal, em outubro de 2022 atingiu os 10,6% e tendencialmente continuará a subir -, o recorrido não retira qualquer vantagem patrimonial ao receber tal quantia de uma só vez, nem a mesma o compensará da desvalorização da moeda e do aumento do custo de vida.

4. Deste modo, considerando que o recorrente em consequência do do sinistro dos autos ficou afetado de um défice funcional permanente de 37 pontos e que tinha 71 anos de idade à data daquele, entende-se como adequada a quantia de 35.000,00 €, para o indemnizar pelo dano biológico de que sofreu.

5. Quanto ao dano não patrimonial, tendo em consideração todas as, gravíssimas e extensas, lesões, sequelas e demais consequências que do sinistro dos autos decorrem para o recorrente – maxime cfr. factos provados 12, 13, 14, 16, 17, 18, 19, 20, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 31, 32, 40, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52 e 53 - recorrendo a juízes de equidade, sempre se dirá que a quantia justa em que deve ser fixada o quantum indemnizatório a título de dano não patrimonial é de €40.000,00.

6. Quando além do mais, o recorrente necessitou, necessita – e necessitará – de tratamentos de fisioterapia de forma continuada.

7. Continua - e continuará - a sentir dores, mal-estar físico e psíquico (conforme resultou provado no facto 22 in fine, 44 e 48 da douta sentença), ou seja, inequivocamente, quando estamos perante uma situação em que o sofrimento do recorrente se perpetuará por toda a sua vida.

8. Destarte, o douto acórdão em crise violou o disposto nos artigos 496.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil.

Deve o presente recurso ser julgado procedente”.


A ré contra alegou sustentando que embora nenhuma quantia devesse ser fixada a título de dano biológico, deve ser mantida a decisão recorrida.

 Colhidos os vistos, cumpre decidir.

… …

 Fundamentação

Está julgada como provada a seguinte matéria de facto:

1) No passado dia 09/07/2018, pelas 00h10, na Av.ª..., em ..., junto aos arcos, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os seguintes veículos:

- o veículo ligeiro de passageiros, Audi A 4, propriedade e conduzido pelo Autor, com a matrícula nº ..-..-JU;

- o veículo ligeiro de passageiros, BMW M5, ..-PI-.., conduzido pelo seu proprietário BB;

- o veiculo ligeiro Seat, com a matricula ..-PT-.., propriedade de “F... e R..., Lda.” e conduzido por CC e o - veículo ligeiro de passageiros, marca Volvo, ..-PX-.., propriedade de “M..., Lda.” conduzido por DD;

2) O A seguia naquela avenida, no sentido nascente/poente, pela sua  hemi-faixa de rodagem, no meio de uma série de veículos que seguiam no mesmo sentido, quase em fila;

3) O veículo BMW, que seguia em sentido contrário, ou seja, no sentido  poente/nascente, saiu da sua faixa de rodagem, invadiu a faixa de rodagem onde  circulava o Autor e os restantes veículos;

4) Colide com estes e, de forma descontrolada, sobe um terreno que ladeia a berma direita, atento o sentido de marcha do Autor e vai embater descontroladamente contra um muro da propriedade, aí ficando imobilizado;

5) O tempo apresentava-se seco, havia visibilidade e o estado do piso é bom;

6) A Ré, em carta datada de 24 de Agosto de 2018, enviada ao Autor, assumiu a culpa do condutor do veículo seguro e a efetiva responsabilidade do sinistro;

7) A Ré já pagou o valor do veículo do Autor, cujos danos determinaram  a sua “perda total”;

8) Em consequência da colisão, o telemóvel que o Autor trazia consigo ficou danificado, assim como ficaram danificadas as roupas que trazia – uma camisa, um par de calças e um par de sapatos;

9) O Autor despendeu o valor de €108,00 com a requisição do auto de polícia com que instruiu os presentes autos;

10) Em consequência direta do acidente o Autor ficou politraumatizado,  e sofreu as seguintes lesões: a) Traumatismo Torácico; b) Hemotorax maciço à  Esquerda; c) Fractura desalinhada dos 4º-11º arcos costais esquerdos (7º e 8º em  dois pontos); d) Contusão Pulmonar Bilateral; e) Traumatismo Abdominal; f) foi  submetido a laparatomia exploradora à admissão, constatado hemoperitoneu de moderado volume, contusões de vários órgãos; g) Traumatismos ósseos; h)  Fractura do C6 i. Subluxação das articulações interapofisiárias C6-C7; j) Fractura dos Pratos Tibiais sem desvio à Esq; k) Fractura proximal do Perónio;  l) Fractura ramos isqui púbicos; m) Fractura do Astragalo; n) Fractura do anel pélvico; o) Laceração da face inferior do fígado; p) Hematoma do polo superior do baço; q) Laceração da Raiz do Mesentério;

11) Em consequência do acidente e das lesões sofridas, o Autor foi  transportado pelos serviços de emergência médica – INEM, para o Hospital  ..., em ..., e para o Hospital de S..., no ...;

12) Esteve internado no Hospital de S... durante 14 dias, sendo que  durante uma semana esteve internado em unidade de cuidados intensivos  polivalentes gerais;

13) Durante a permanência no hospital de ..., teve paragem cardíaca, fez transfusão de 4 unidades de sangue;

14) Foi-lhe aplicado colar cervical e foram aplicados diversos drenos;

15) Teve alta hospitalar do Hospital de S..., no ..., em 16/08/2018;

16) Após a alta fez prolongados tratamentos fisiátricos, inicialmente no  domicílio e depois em duas clínicas na ..., ... e na F..., na ...;

17) Está sujeito a medicação persistente com ansiolítico e antidepressivo, tal como Xanax e Tolvon;

18) Após alta hospitalar deambulou em cadeira de rodas durante cerca de um mês, e depois com auxílio de bengalas canadianas durante cerca de um mês;

19) Utilizou colar cervical até final de agosto de 2018;

20) Nos primeiros 3 meses após a alta hospitalar, o Autor esteve dependente de ajuda de terceira pessoa, prestada pela sua esposa, sua nora e pela sua filha;

21) Para prestar aquela assistência, os familiares referidos deixaram de fazer a sua vida diária, ficando condicionados durante todo aquele tempo;

22) O Autor apresenta as seguintes sequelas do acidente:

- No crânio: cicatriz irregular na região occipital, nacarada, coberta por cabelo, com 7 por 1 cm de maiores dimensões;

- No pescoço: distanciamento externo entre 2 cm (em flexão) e 17 cm (em  extensão), limitação ligeira na flexão lateral esquerda e rotação esquerda; dor referida à palpação para vertebral á esquerda na base do pescoço;

- No tórax: duas cicatrizes lineares, de tipo cirúrgico, com 2 cm de comprimento alinhadas pela linha axilar anterior no terço médio do hemi-torax esquerdo; dor referida à palpação da face lateral desse hemi-torax; sem deformidades ou assimetrias objectiváveis em repouso ou nos movimentos respiratórios;

- No abdómen: área de aspecto cicatricial ténue e irregular no hipocôndrio  esquerdo com 17 por 3 cm de maiores dimensões; uma cicatriz do tipo cirúrgico  na região supra umbilical, com 20 cm de comprimento, e uma outra de  características semelhantes na fossa ilíaca direita com 1 cm de comprimento; dor  ligeira referida à palpação dos quadrantes esquerdos, principalmente superior,  sem outras alterações;

- No membro superior esquerdo: manifesta limitação ligeira na  mobilidade activa do braço, em relação com dor referida à face lateral do hemitorax esquerdo, com mobilidades passivas praticamente completas; rigidez  ligeira e dor referida à mobilização da articulação interfalângica do 1º dedo, sem  outras alterações;

- No membro inferior direito: perímetro da coxa de 43,5 cm (medido a 15  cm da interlinha articular do joelho); perímetro da perna de 36 cm (medido a 13  cm da interlinha do joelho);

- No tornozelo: dorsiflexão entre os 0-30º e flexão plantar entre os 0º-30º;  consegue assumir genuflexão e agachamento com muita dificuldade, por poucos segundos, apresentando ainda marcha claudicante da dependência da rigidez do tornozelo e pé;

- Membro inferior esquerdo: dor referida à palpação da região isquiática;  perímetro da coxa de 42 cm (medido a 15 cm da interlinha articular do joelho); perímetro da perna de 34, cm (medido a 13 cm da interlinha do joelho); cicatriz irregular na face lateral do terço proximal da perna com 13 cm por 9 cm de maiores dimensões; uma outra linear na face lateral do terço distal da perna, com 11 cm por 1 cm de maiores dimensões, oblíqua, com tumefacção aplanada, mole, de diâmetro pericentimétrico na sua extremidade anterior; joelho sem instabilidades ligamentares objectiváveis; dor referida à palpação da interlinha na sua metade lateral; tornozelo com dorsiflexão abolida, com flexão plantar até aos 10º, ligeiro edema bimaleolar; pé com rigidez acentuada do médio pé (com  anquilose funcional) e dor referida ás tentativas de mobilização passiva;

- A nível psiquiátrico, mantém queixas depressivas, caracterizadas por  desânimo permanente, com retraimento social e alteração leve dos ritmos do sono, sendo aconselhável o tratamento com mianserina 15 a 30 mg à noite por tempo indeterminado;

23) Estas sequelas determinam-lhe um défice funcional permanente da  integridade físico-psíquica de 37 pontos numa escala crescente de 0 a 100 pontos;

 24) Tais sequelas não são compatíveis com a atividade profissional que  exercia antes de reformado, sendo compatíveis com o exercício de outras profissões da sua área de preparação técnico profissional;

25) Padeceu de um “quantum doloris” de 6 pontos numa escala crescente  de sete pontos;

26) Mercê das cicatrizes supra referidas e da claudicação do andar que o afeta, o sofreu um dano estético de 3 pontos numa escala crescente de 7 pontos;

27) Em consequência das lesões, o Autor deixou de pode praticar karaté, o que fazia antes do acidente;

28) Apresenta dificuldade de condução de automóvel, por dificuldade de utilização do pedal de embraiagem;

29) A repercussão permanente de tais sequelas na atividade desportiva e de lazer do Autor corresponde a 5 pontos numa escala crescente de sete pontos;

30) A data da consolidação médico-legal das lesões do Autor é fixável em 24 de setembro de 2019;

31) O período de défice temporário total é fixável em 39 dias;

32) O período de défice temporário parcial é fixável em 443 dias;

33) Em consequência das lesões sofridas, o Autor despendeu em medicamentos a quantia de 210,66€;

34) Despendeu em fraldas e resguardos a quantia de 30,97€;

35) Despendeu €125,00 em exames médicos e €100,00 em consultas médicas;

36) Despendeu €60 euros com transportes de ambulância;

37) Suportou com a aquisição de talas o valor de pelo menos €32,15 38) Despendeu €135,00 com a aquisição de uma cadeira de rodas e €33.13 com a aquisição de um andarilho;

39) Suportou a quanta de €250,00 com o pagamento das sessões de  fisioterapia a que foi submetido;

40) O Autor nasceu em .../.../1947;

41) Antes do acidente, o Autor era fisicamente saudável, não apresentando qualquer limitação ou condicionante física;

42) Estava reformado, auferindo, a título de reforma o montante mensal  de 400,00€;

43) Por causa das lesões foi sujeito a 3 intervenções cirúrgicas e consequentes anestesias gerais;

44) Que lhe causaram apreensão, medo, sofrimento e distúrbio físico e psíquico;

 45) Esteve sujeito a tratamento clínico e fisioterapêutico durante um largo  período de tempo;

46) Esteve acamado pelo menos 39 dias;

47) Necessitará, no futuro, de observação e tratamentos em medicina física e reabilitação, numa periodicidade bianual;

48) Sofreu incerteza e angústia com a sua situação física o atormenta;

49) Esteve sujeito ao apoio de andarilho e canadianas, como auxílio de locomoção, durante mais de 4 meses;

50) Esteve sujeito a ajuda de terceira pessoa, mormente dos seus familiares, durante pelo menos 90 dias;

51) Esteve sujeito, durante 3 meses, a permanente sedação e ingestão de  analgésicos para alívio de dor;

52) O Autor praticava exercício físico com regularidade;

53) Desde a data do acidente que o Autor deixou de ter qualquer pratica desportiva;

54) À data do acidente, a Ré garantia a responsabilidade civil estradal do veículo ..-PI-.., com capital seguro mínimo obrigatório, e a respetiva apólice de seguro automóvel – ...55, encontrava-se em vigor.

… …

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido nos arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.

O conhecimento das questões a resolver na presente Revista importa em saber se a indemnização fixada pela decisão recorrida a título de dano biológico e de danos não patrimoniais deve ser alterada.

… …

A figura do dano biológico, na sua formulação foi abordada por Cesare Gerin, em 1952 tendo por definição a “diminuição somático-psíquica do individuo, ou seja, a lesão da integridade psicofísica da pessoa, provocada por um facto gerador de responsabilidade” – vd. João António Álvaro Dias, Dano Corporal - Quadro Epistemológico e Aspetos Ressarcitórios, Coimbra, Almedina, 2001, p. 99  - surgindo com o objetivo de proteger alguns lesados que até então viam ameaçado no ordenamento jurídico civil italiano o direito fundamental à saúde sem que houvesse uma resposta adequada à tutela dos seus interesses no campo da responsabilidade civil.

A primeira manifestação concreta no ordenamento jurídico italiano sobre o dano biológico surgiu com a sentença do Tribunal de Génova, de 25 de maio de 1974 - Tribunal de Génova, 25/5/1974, in Giurisprudenza Italiana, 1975, I, 2, p. 54 – aparecendo aí desvinculado e autonomizado dos danos de natureza patrimonial. Esta formulação jurisprudencial, partindo do art. 2043 do CC italiano que previa que todos os danos injustos são ressarcíveis, sejam eles de carácter patrimonial ou não patrimonial, apondo-lhe aquela outra que protegia o direito à saúde, encontrou a característica indispensável à ressarcibilidade prevista na cláusula geral de injustiça referida naquele art. 2043.

Com esta construção reportando o dano biológico aos de natureza não patrimonial contendia com a previsão do preceito concreto em que estavam definidos os casos em que estes eram indemnizáveis  (o art. 2083 do CC italiano) este normativo foi interpretado no sentido de apenas serem danos não patrimoniais os danos morais subjetivos, v.g. a perda de ânimo, o abatimento ou o sofrimento moral.

Com estes apontamentos de origem, certificamos que com a elaboração doutrinária e jurisprudencial do dano biológico começou em simultâneo a discussão sobre a natureza patrimonial ou não patrimonial do mesmo

Na jurisprudência portuguesa a primeira decisão que se encontra com referência ao dano biológico  é o ac. da RP de 12-12-1955, in dgsi.pt  onde se sumariza que “Não corresponde à necessidade de justa indemnização o enquadramento, como não patrimonial, do prejuízo decorrente da desvalorização física do lesado, resultante de sequelas permanentes das lesões sofridas (dano biológico). Há aí uma perda da efetiva utilidade que proporciona o bem que é um corpo são, nisso consistindo o prejuízo a indemnizar. Porque há um verdadeiro prejuízo (ao contrário do que se passa com a categoria do dano não patrimonial) esse dano deve ser qualificado como dano patrimonial, sendo injusta a sua sujeição à limitação do artigo 496, n.º3 do Código Civil”. Dele decorre que o dano biológico era  entendido como dano patrimonial.

Posteriormente e com mais elaboração sobre o conceito, o ac. da RP de 7-4-1997  -  In Coletânea de Jurisprudência, ano XXII, tomo II, 1997, p. 204 – veio a identificar-se o dano biológico com a “alteração morfológica do lesado, limitativa da sua capacidade de viver a vida como a vivia antes do mesmo acidente, por violação da sua personalidade humana. (…) num prejuízo concreto, consistente na privação ou diminuição do gozo de bens espirituais, insuscetíveis de avaliação pecuniária, como a saúde, a inteligência, os sentimentos, a vontade, a capacidade efetiva e criadora, a liberdade, a reserva da privacidade individual e o prazer proporcionado pela vida e pelos bens materiais, e integra-se na categoria dos danos não patrimoniais”.

A dificuldade e tentativa de identificação da natureza do dano biológico manteve-se presente desde início com esforços de identificação das fronteiras, nomeadamente entre o dano moral e o dano existencial os quais, aceitando todos serem não patrimoniais optam alguns por individualizar por categorias. Por exemplo, as dores físicas e psíquicas pertenceriam ao dano biológico, enquanto a tristeza, o desalento, ou o desânimo caberiam no dano moral, sendo de todo importante sublinhar que é a realidade que fornece sempre o guião para o apuramento da ressarcibilidade completa, sem embargo de se terem de evitar duplicações.

Escreve Maria da Graça Trigo “Coexistem na doutrina e na jurisprudência diferentes aceções de dano biológico. Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, atualmente o significado com que mais frequentemente tal expressão é aquele que correspondente à de consequências patrimoniais da incapacidade geral ou genérica do lesado, aferida em função das Tabelas de Incapacidade Geral Permanente em Direito Civil. Mas este significado coexiste com outros, designadamente com o de dano biológico como consequência não patrimonial de uma lesão psicofísica. É, por isso, conveniente que, ao fazer-se uso da dita expressão (seja num texto de índole doutrinal seja numa decisão judicial), se comece por definir a aceção em que a mesma é utilizada.” - in O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – Breve contributo, Revista Julgar, n.º 46, págs. 268 e ac. STJ de 24-2-2022 no proc. 1082/19. 7T8 SNT . L1.S1, in dgsi.pt.

Como aconteceu no caso agora em decisão, as decisões das instâncias qualificaram o dano biológico como dano patrimonial futuro e, não obstante a polémica doutrinária e jurisprudencial em torno da qualificação do dano biológico, também nós seguimos o entendimento maioritário no STJ de considerar que o dano biológico, independentemente do rebate profissional e de comprovadamente afetar a capacidade aquisitiva salarial ou de rendimentos, deve ser considerado um dano patrimonial futuro na medida em que, limitando a capacidade funcional do lesado, exigirá, no futuro, esforços acrescidos para desenvolver as mesmas tarefas profissionais ou quaisquer outras e é suscetível de reparação como dano patrimonial autónomo. Aliás, considerando ou não o dano biológico como dano patrimonial ou dano não patrimonial, ou até mesmo como “tertium genus” ou ainda como uma entidade híbrida participando de uma e outra de tais dicotómicas modalidades, no cômputo dos danos sofridos não podem deixar de acrescer aqueles que jurisprudencialmente têm vindo a ser considerados como configuradores em conformidade com o estatuído nos arts. 494.º, 496.º e 566.º do CC. O  “quantum doloris” – que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária –, o “dano estético” – que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima –, o “prejuízo de afirmação social” – dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado nas suas variadíssimas vertentes (familiar, profissional, sexual, afetiva, recreativa, cultural e cívica) – o “prejuízo da saúde geral e da longevidade” – aqui avultando o dano da dor e o défice de bem estar, valorizando-se os danos irreversíveis na saúde e no bem estar da vítima e corte na expectativa da vida. – vd. ac.- STJ de 18-10-2018 no proc. 3643/13.9TBSTB.E1.S1, in dgsi.pt.

A questão essencial suscitada na revista é a de saber se os valores fixados pela decisão recorrida a título danos patrimoniais (€ 24.171,91) e não patrimoniais (€ 30.000,00) se encontra devidamente fixada. Não é na diferenciação da natureza dos danos que as instâncias divergiram, mas apenas na quantificação dos danos que acolheram como relevantes para indenização, ou seja, o critério de equidade que presidiu à quantificação do ressarcimento obteve diferentes resultados em Primeira instância e na Relação, defendendo o recorrente a repristinação da sentença e a recorrida a confirmação da decisão recorrida.

Afirmámos já no ac. deste STJ de 19.10.2021, no processo 7098/16.8T8PRT.P1.S1.,in dgsi.pt – que quer seja numa perspetiva e dimensão patrimonial e ou não patrimonial, a indemnização pelo dano biológico deve ser calculada segundo a equidade nos termos dos arts. 496 nº 3 e 566 nº 3 do CCivil. E que a aplicação de juízos de equidade não traduz a resolução de uma “questão de direito” porquanto se o STJ se pronuncia sobre uma indemnização fixada com base em juízos de equidade, o que se lhe impõe em conhecimento de recurso não é a determinação exata do valor a arbitrar mas sim a verificação dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto. Forçoso é que a equidade não dispense a observância do princípio da igualdade, o que obriga ao confronto com indemnizações atribuídas em outras situações – neste sentido e com maior explicação vd. o ac. STJ de 21/1/2021 - proc. 6705/14.1T8LRS.L1.S1in dgsi.pt  recenseando a jurisprudência do STJ enumerando extensa jurisprudência.

Referimos anteriormente que a compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão pelo lesado traduzida em perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o afete mas, também, inclui a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as deficiências funcionais de maior ou menor gravidade que constituem sequela irreversível das lesões sofridas. A perda relevante de capacidades funcionais - mesmo que não ou não totalmente refletida no valor dos rendimentos obtidos pelos lesado - constitui uma redução no trem de vida quotidiano com reflexos de indemnização em termos patrimoniais uma vez que a esperança de vida supõe precisamente atividade que se não confina à  denominação de vida ativa com rebate exclusivo no exercício de uma profissão.

Como se disse no ac. deste STJ de 06.12.2017 no proc. 1509/13.1TVLSB.L1.S1 in dgsi.pt  “O dano biológico abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, incluindo a frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer atividades ou tarefas de cariz económico, mesmo fora da atividade profissional habitual, bem como os custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expectáveis”.

E como se refere na decisão recorrida, na quantificação da compensação do dano biológico, em casos como o presente em que o lesado se encontra reformado e sem atividade profissional não havendo por essa razão perda ou diminuição de proventos laborais, a Jurisprudência tem essencialmente seguido critérios semelhantes aos que são utilizados na  indemnização de tal dano quando dele decorre aquela perda ou diminuição da capacidade de ganho. Cremos, no entanto, que o simples decalque de tais critérios desconsidera um elemento importante que é o de o lesado ter ou não atividade profissional ativa dominante conjugado com a sua situação de reformado - veja-se por exemplo que o ac. deste STJ de 6-2-2020 no proc. 2251.12.6TBVNG.P1.S1 tratou de um caso de um reformado que sendo médico continuava a ter atividade profissional tendo sido tomada em consideração não só a afetação do dano biológico á vida diária mas também o valor dos rendimentos que o mesmo ainda obtinha com o trabalho ativo. Se é verdade que ao ressarcimento do dano biológico inclui o sobre esforço no exercício da atividade diária e corrente do lesado e visa compensar e ultrapassar as deficiências funcionais que resultaram como sequela irreversível das lesões, deve aceitar-se igualmente que a fixação da indemnização deste dano, quando só esta afetação esteja presente e não já a reportada a uma atividade profissional, condiciona em termos de equidade o montante a fixar, cerzindo a indemnização a uma dimensão essencialmente não patrimonial mas distinta dos danos morais de acordo com a distinção clássica que se realizava quando não se procedia à avaliação do dano biológico, nos termos que no início desta exposição decisória enunciamos.

A este respeito provou-se que o autor, à data do acidente com 71 anos de idade, reformado com uma pensão mensal de 400,00 € ficou a padecer de um défice funcional permanente quantificado em 37 pontos numa escala de 1 a 100. Com rebate na sua vida diária as lesões determinaram ao autor o abandono da prática de karaté, claudicação e dificuldade de utilização do pedal de embraiagem com a consequente dificuldade na atividade de condução.

Com este quadro e tomando por referência a esperança de vida do autor que se situa em termos estatísticos em 78 anos, o dano biológico a ressarcir é o que compreende o esforço objetivo das sequelas das lesões na vida diária do autor. E aqui , sublinha-se que a claudicação confere expressão aos 37 pontos de déficit e repercute-se na atividade de condução, podendo concluir-se que não só existe maior penosidade no andar a pé como no andar de carro, tendo igualmente repercussão na vida ativa do recorrente uma vez que ficou privado não na sua capacidade de ganho mas na sua capacidade de saúde, quer por via direta e consequente das sequelas quer por via de não poder cuidar do seu bem estar físico, mental e social - como é definida a saúde pela OMS – pela privação da prática desportiva que realizava e que, na sua idade era necessariamente sinal de vitalidade e reação à inércia com manutenção do equilíbrio físico e psíquico.

Justificada a indemnização pelo dano biológico e as suas balizas, em termos quantitativos o déficit assinalado com incidência sobre a atividade do autor numa apreciação realizada com critérios de equidade revela como significativo o tempo durante o qual previsivelmente essa situação de esforço acrescido vai manter-se e o padrão dessa dificuldade  teremos em que é adequada a indemnização fixada para o dano biológico na decisão recorrida que está conforme a jurisprudência de casos idênticos sendo que nenhum caso coincide com qualquer outros. E se a idade, a situação profissional e até o déficit funcional se pode encontrar em semelhança noutras decisões a verdade é que a particularidade de cada caso obrigam sempre a uma apreciação onde se afira no concreto quer a atividade psicofísica do lesado quer o que as lesões determinam de acréscimo de esforço ao que antes se realizava.

Nestes termos julgam-se as conclusões de recurso improcedentes mantendo-se a decisão recorrida quando à indemnização que fixou para o dano biológico.

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Quantos aos danos não patrimoniais, julgamos que é neste segmento que se situa a maior severidade e significativas consequências das lesões para a vida do auto porque uma pessoa com 71 anos de idade, reformado, que mantém e se preocupa com a sua saúde e equilíbrio com a prática desportiva e que por isso mesmo encara o futuro com mobilização da vontade e do ânimo  para manter a condição de equilíbrio e bem estar psicofísico que conseguiu até esse momento, vê essa sua situação comprometida por um acidente de que é vítima e que lhe determina um internamento hospitalar durante 14 dias com aplicação de colar cervical e onde teve paragem cardíaca e fez transfusões de sangue.

Depois da alta médica foi sujeito a longos tratamentos de fisiatria e a medicação com ansiolítico e antidepressivo; andou de cadeiras de rodas durante um mês e depois com bengalas e canadianas, mantendo o colar cervical estando nos primeiros 3 meses após a alta hospitalar dependente de ajuda de terceira pessoa.

Ficou como sequelas das lesões com cicatrizes na região occipital, no tórax, na região umbilical, no membro inferior esquerdo e na fossa ilíaca;  limitação ligeira na flexão lateral esquerda e rotação esquerda do pescoço; limitação ligeira na  mobilidade ativa do braço; claudicação e limitação dos movimentos de genuflexão. E a nível psiquiátrico, desânimo permanente, com retraimento social e alteração leve dos ritmos do sono para o que recebe medicação.

O “quantum doloris” foi de 6 pontos numa escala crescente  de sete pontos; o período de défice temporário total foi de 39 dias e o de défice temporário parcial foi de 443 dias;

por causa das lesões foi sujeito a 3 intervenções cirúrgicas e consequentes anestesias gerais e sofreu apreensão, medo, sofrimento e distúrbio físico e psíquico.

Na avaliação destes danos devendo o tribunal julgar equitativamente, nos termos do disposto no art. 496º, nº 3, do CCivil e com atenção aos critérios estabelecidos no art. 494 todos os fatores enunciados - idade, período de tempo já decorrido desde a data do acidente, condição económica do autor e os critérios/valores atribuídos pela jurisprudência e bem assim a desvalorização monetária entretanto ocorrida – segmento em que a se sublinha que a um período de ausência de inflação se passou a assistir a uma explosão da inflação sem previsão de termo e das taxas de juros - julgamos ainda merecer particular atenção que o autor, chegado aos 71 anos e a 7 da esperança de vida, mantinha uma boa situação de saúde de que cuidava com a prática do exercício físico. E foi o acidente que alterou de forma radical esse seu estado de confiança decorrente da boa saúde que tinha porquanto, mais que o valorado no dano biológico como acréscimo de esforço e penosidade para fazer os atos da sua vida diária, o autor experimentou conforme os factos o documentam um verdadeiro e decisivo rombo no ânimo, na sua auto estima e confiança, elementos que  julgamos deverem estar presentes na indemnização quando o lesado com 71 anos viu comprometida a previsão que tinha para o modo como, em termos de saúde física e mental, enfrentaria os seus últimos anos vida.

 Nestes termos, cremos ser adequada a indemnização de 40.000,00 € a título de danos patrimoniais englobando todas as dimensões valoráveis do património moral do lesado. E sobre esta são devidos juros de mora desde a data desta decisão, à taxa legal e até integral pagamento.

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Síntese conclusiva

- A compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão pelo lesado traduzida em perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o afete mas,  inclui também a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as deficiências funcionais de maior ou menor gravidade que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.

- A perda relevante de capacidades funcionais - mesmo que não ou não totalmente refletida no valor dos rendimentos obtidos pelos lesado nomeadamente por este se encontrar já reformado - constitui uma redução no trem de vida quotidiano com reflexos de indemnização em termos patrimoniais uma vez que a esperança de vida não confina à denominação de vida ativa com rebate exclusivo no exercício de uma profissão.

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 Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem teste tribunal em julgar parcialmente procedente o recurso e em consequência, revogar parcialmente a decisão recorrida na parte em que fixou a título de dano não patrimoniais a quantia de 30.000,00 €, condenado a ré a pagar ao autor a este título a quantia de 40.000,00 (quarente mil euros) e juros de mora sobre este montante á taxa legal, vencidos desde a data desta decisão até integral pagamento.

 No mais julga-se parcialmente improcedente o recurso mantendo a decisão recorrida nos seus termos.

Custas por recorrente e recorrida na proporção do respetivo decaimento.


Lisboa, 7 de março de 2023


Relator: Cons. Manuel Capelo

1º adjunto: Sr. Juiz Conselheiro Tibério Nunes da Silva

2º adjunto: Sr. Juiz Conselheiro Nuno Ataíde das Neves