A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer questões temáticas centrais suscitadas pelos litigantes (ou de que se deva conhecer oficiosamente), cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras, não se considerando como tal os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocados, até porque o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
Revista n.º 625/21.0T8CSC.L1.S1
MBM/JG/RPMBM/JG/RP
Acordam, em conferência, na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça
I.
1. Os autores, AA e BB, vieram arguir a nulidade do acórdão proferido no âmbito do recurso de revista interposto nos autos, invocando “omissão de pronúncia”.
Para tanto, alegam, em síntese:
– O Acórdão desatendeu ao circunstancialismo em que os factos que são imputados aos trabalhadores, não se lhe referindo e desatendendo à matéria de facto alterada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
– Ao não atender ao circunstancialismo inerente à factualidade, maxime quanto à ordem lhe ter sido dada pelo superior hierárquico, não se pronunciando e não atendendo a este facto, o Acórdão padece de nulidade, por omissão de pronúncia.
– Ao não considerar o circunstancialismo inerente à conduta dos Recorridos, maxime quanto à pressão sobre eles exercida pelo superior hierárquico, no sentido de concretizarem o negócio, o acórdão em causa não se pronuncia sobre uma questão essencial e levantada nos presentes autos.
– O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça é também omisso quanto a outra questão levantada, atinente à violação do princípio da igualdade, traduzido na circunstância de se aferir se o comportamento dos AA. foi tão grave de molde a fundamentar o seu despedimento, então porque motivo a Empregadora, não podendo desconhecer a existência de uma ordem, nada fez quanto ao superior hierárquico que os mandou agir daquela forma.
– Em causa está uma flagrante violação do princípio da igualdade e da coerência disciplinar, uma vez que um dos critérios de aferição da proporcionalidade da aplicação de uma sanção é a prática disciplinar da empregadora.
2. A R., FCA - Portugal, Lda., pronunciou-se pelo indeferimento do requerido.
Cumpre decidir.
II.
3. A nulidade por omissão de pronúncia (art. 615.º, n.º l, d), do CPC1), sancionando a violação do estatuído no nº 2 do artigo 608.º, apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer “questões temáticas centrais”2 (isto é, atinentes ao thema decidendum, que é constituído pelo pedido ou pedidos, causa ou causas de pedir e exceções) suscitadas pelos litigantes, ou de que se deva conhecer oficiosamente, cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras, questões (a resolver) que não se confundem nem compreendem o dever de responder a todos os invocados argumentos, motivos ou razões jurídicas, até porque, como é sabido, “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito” (art. 5.º, n.º 3).
Especificamente em sede de recurso, o tribunal deve conhecer de todas as questões suscitadas nas conclusões das alegações apresentadas pelo(s) recorrente(s) – arts. 663.º, n.º 2, e 679º, do CPC.
Ora, in casu, a única questão a decidir consistia em aferir da (não) existência de justa causa de despedimento, suscitada no recurso interposto pela ré/recorrente (pois os ora reclamantes obtiveram ganho de causa na Relação), questão que se mostra cabalmente abordada.
4. Com efeito, depois de detalhada fundamentação, concluiu-se no acórdão reclamado:
“(…)
Grave e culposamente, os AA. violaram os deveres laborais de obediência, lealdade e de promover os atos tendentes à melhoria da produtividade da empresa.
Tendo em conta a imagem global dos factos, incluindo todas as suas circunstância e consequências (art. 351.º, n.º 3, do CT), concluímos – à luz de critérios de razoabilidade, exigibilidade e proporcionalidade – que com a sua conduta os AA. tornaram prática e imediatamente impossível a subsistência da relação laboral (arts. 330.º, n.º 1, e 351.º, n.º 1 e 2, do mesmo diploma).
Vale por dizer que se configura justa causa de despedimento.
Conclusão que, refira-se, sempre se imporia, dada a gravidade objetiva e subjetiva da conduta dos recorridos, independentemente da discutida – e aqui reconhecida – violação do dever de lealdade.”
Não se configurando qualquer omissão de pronúncia, improcede, manifestamente, o requerido.
III.
4. Em face do exposto, acorda-se em julgar improcedente a arguida nulidade.
Custas pelos requerentes.
Lisboa, 08 de março de 2023
Mário Belo Morgado (Relator)
Júlio Manuel Vieira Gomes
Ramalho Pinto
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1. Como todas as disposições legais citadas sem menção em contrário.↩︎
2. Nas palavras de Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, II, 2015, p. 371.↩︎