TRANSMISSÃO DA UNIDADE ECONÓMICA
REENVIO PREJUDICIAL
Sumário


Em uma atividade que repouse essencialmente sobre a mão de obra a identidade da entidade económica não se mantém – e não há transmissão – quando o novo prestador de serviços não retoma o essencial dos efetivos, em termos de número e de competências, tanto mais que não foi provada a transmissão de know-how.

Texto Integral



Processo n.º 445/19.2T8VLG.P1.S1


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,


Relatório


AA, com patrocínio pelos serviços jurídicos do Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticos e Profissões Similares e Atividades Diversas (STAD), veio intentar a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra 2045 – Empresa de Segurança, S.A., e contra Strong-Charon – Soluções de Segurança, S.A., com sede no ..., nº 3, ..., ....


Invocando transmissão de unidade económica com a consequente mudança de empregador pediu a condenação da ré 2045 – Empresa de Segurança, S.A.:


a) a reconhecer que foi transmitida para si, com efeitos a partir de 01-01-2019, a posição de entidade empregadora no contrato individual de trabalho do A. celebrado com a Ré STRONG-CHARON e, por isso, a obrigação de respeitar todos os direitos de decorrentes desse contrato, incluindo os de antiguidade e demais condições de trabalho;


b) a reintegrar o A. ao seu serviço, no local de trabalho Cliente A...... ........, S.A. (F..... ........), atribuindo-lhe as funções correspondentes à sua categoria profissional de vigilante, nos horários que praticava;


c) a pagar ao A. 908,76€ da retribuição correspondente ao mês de janeiro p.p.;


d) a pagar ao A. as demais retribuições que se vencerem, como se estivesse no normal exercício de funções, desde 01.01.2019 até à reintegração;


e) a pagar ao A. a compensação de 15.000€, a título de danos morais;


f) a pagar ao A. os juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação pedida em c) e d) e desde a citação quanto ao pedido em e);


Subsidiariamente, e para a hipótese de tal transmissão não ter ocorrido, pediu que a ré Strong-Charon – Soluções de Segurança, S.A., fosse condenada nos mesmos pedidos.


Realizado o julgamento foi proferida sentença com o seguinte teor:


“Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, condenando a 1ª ré, 2045 - EMPRESA DE SEGURANÇA, S.A.: a) a reconhecer que foi transmitida para si, com efeitos a partir de 01-01-2019, a posição de entidade empregadora no contrato individual de trabalho do A. celebrado com a Ré STRONG-CHARON e, por isso, a obrigação de respeitar todos os direitos de decorrentes desse contrato, incluindo os de antiguidade e demais condições de trabalho; b) a reintegrar o A. ao seu serviço, no local de trabalho Cliente A...... ........, S.A. (F..... ........), atribuindo-lhe as funções correspondentes à sua categoria profissional de vigilante, nos horários que praticava; c) a pagar ao A. a importância correspondente às retribuições vencidas e vincendas desde 01.01.2019 até à data do trânsito da decisão final, a liquidar através do competente incidente; d) a pagar ao A. os juros moratórios, à taxa legal, atualmente de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação pedida em c) até efetivo e integral pagamento. Absolvo a 2ª ré do pedido. Custas por autor e 1ª ré, na proporção de 1/3 e 2/3, respetivamente.”


Inconformada a 1.ª Ré, 2045 – Empresa de Segurança, S.A., interpôs recurso de apelação.


O Tribunal da Relação proferiu Acórdão em que julgou procedente o recurso de apelação e revogou a sentença, nos seguintes termos:


“A. Absolve-se a ré 2045 – Empresa de Segurança, S.A., de todos os pedidos contra ela deduzidos pelo autor AA;


B. Condena-se a ré Strong-Charon – Soluções de Segurança, S.A.:


a) a respeitar todos os direitos decorrentes do contrato de trabalho celebrado com o autor, incluindo os de antiguidade e demais condições de trabalho;


b) a reintegrar o autor ao seu serviço, atribuindo-lhe as funções correspondentes à sua categoria profissional de vigilante, nos horários que praticava;


c) a pagar ao autor a importância correspondente às retribuições vencidas e vincendas desde 1 de janeiro de 2019 até à data do trânsito da decisão final, a liquidar através do competente incidente;


d) a pagar ao A. as demais retribuições que se vencerem, como se estivesse no normal exercício de funções, desde 1 de janeiro de 2019 até à reintegração.


e) a pagar ao A. os juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação pedida até efetivo e integral pagamento.


No mais, nomeadamente a absolvição da ré do pedido por danos não patrimoniais, confirma-se a decisão recorrida.


Custas, em ambas as instâncias, pela recorrida Strong-Charon – Soluções de Segurança, S.A., na proporção do seu decaimento, atenta a isenção de que beneficia o autor”.


Inconformada a 2.ª Ré, Strong-Charon – Soluções de Segurança, S.A., interpôs recurso de revista com as seguintes Conclusões:

a. O presente recurso tem como objeto a solução de direito, plasmada no douto acórdão proferido nos presentes autos, mais precisamente a incorreta aplicação das normas jurídicas que consagram e regulam o instituto da transmissão da unidade económica/estabelecimento presentes nos artigos 285º e seguintes do Código do Trabalho e artigo 3.º da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001;

b. Considerou o Tribunal ad quo que o serviço de vigilância e segurança privada nas instalações do cliente F..... ........ não constitui uma unidade económica (conjunto de meios organizados e autónomos) porquanto não se verificou o elemento transmissivo por falta de preservação e manutenção da identidade;

c. Na verdade, julgou o Tribunal ad quo para afastar a transmissão da referida unidade económica que o serviço de segurança e vigilância privada prestado não foi objeto de transmissão dos bens corpóreos e incorpóreos, como igual não se verificou o preenchimento do requisito/pressuposto da assunção de efetivos;

d. Ora, salvo o devido respeito, entende a Recorrente que o Tribunal ad quo cometeu um erro de julgamento na interpretação da matéria de facto dada como assente como no respetivo e consequente enquadramento jurídico, traduzida na manifesta violação de lei substantiva laboral – art. 285.º, n.º 5 do Código do Trabalho;

e. Pelo que cometeu um erro de julgamento quanto à interpretação do quadro jurídico-legal que baliza o instituto da transmissão da unidade económica, presente no artigo 285.º, n.º 1, 3 e 5 do Código do Trabalho e Diretiva 2001/23/CE;

f. Da atividade probatória produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, e retificada pelo Tribunal ad quo, mormente nos artigos 29.º, 48.º, 71.º, 72.º, 80.º, 81.º, 86.º, 87.º e 88.º dos factos provados, resulta em consonância e inequivocamente em sentido contrário ao que foi fixado pelo Tribunal ad quo: 46. No local onde exercia funções ultimamente, na “A...... ........, S.A. (F..... ........)”, o A. desempenhava nomeadamente as seguintes tarefas: a. Abertura e fecho das instalações; b. controle chaveiro da A...... ........ S.A.; c. Registo de movimento de pessoas e viaturas em ficheiro excel, em PC cedido pela A...... ........ S.A.; d. Ativação e desativação de alarme de intrusão da A...... ........ S.A.; e. Controlo de cctv propriedade da A...... ........ S.A.; f. Rondas noturnas de 2 e 2 horas, com picagem de pontos estratégicos com pastilhas e bastão próprio, e lanterna de apoio propriedade da Strong-Charon” – Similitude serviço e transmissão métodos e procedimentos; 48. Em face da adjudicação dos referidos serviços de vigilância, a R. ...., para além dos restantes trabalhadores atrás referidos que já faziam parte dos seus quadros e da sua estrutura operacional e administrativa (Chefe de Grupo, Supervisor, Gestor Operacional e Diretor de Operações), admitiu ao seu serviço apenas 1 trabalhador Vigilante que, anteriormente, prestava serviço por conta da STRONG-CHARON – BB – e 1 outro Vigilante. – Assunção Efetivos; 71. Em ... de ... de 2019, a 1ª R., 2045, manteve o mesmo número de trabalhadores, ainda que, em parte, com outros vigilantes, assumiu a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivo existentes no local afeto ao desempenho do serviço antes adjudicado pelo A...... ........ S.A. – F..... ........ à 2ª R., e pertencentes ao cliente, nomeadamente cancelas/barreiras de acesso, sistema de CCTV, alarme de intrusão, computador, telefone. – Mesmos meios humanos e operacionais/bens e equipamentos/ Retoma bens; 72. Recursos esses que foram utilizados pela 2ª R., Strong-Charon, na prestação de serviço até ao dia 31 de dezembro de 2018. – Retoma bens. 80. A 1ª R. assumiu a posição de entidade prestadora de serviços de segurança e vigilância humana/estática e eletrónica nas instalações pertencentes à A...... ........ S.A. – F..... ........, compreendendo a vigilância e segurança de pessoas, instalações, equipamentos e bens e controlo de acessos, e o que implicava, nomeadamente, a prestação dos seguintes serviços: a. Atendimento telefónico com telemóvel de serviço pertencente ao cliente; b. Fiscalização de entrada e saída de pessoas e bens após o encerramento das instalações, registando em documento do cliente esses movimentos; c. Operação e controlo do sistema de videovigilância [monitorização] – numa central de monotorização; d. Monitorização do sistema de alarme de intrusão instalado no edifício e da propriedade do Cliente; e. Efetuar giros periódicos durante a dia e noite – rondas; f. Assegurar a execução e vigilância do chaveiro pertença do Cliente. – Similitude serviço, meios humanos e transmissão métodos e procedimentos. 81. No edifício onde são prestados os serviços de segurança e vigilância, foi instalada pelo Cliente um sistema de CCTV composta com diversas câmaras, dispostas por vários locais, as quais se encontram ligadas a uma série de monitores de visualização interna. 86. A 2ª R. prestou serviço até às 24h00 do dia 31 de dezembro de 2018, tendo a 1ª R. iniciado funções às 00h00 do dia ... de ... de 2019. – Ininterrupção atividade. 87. A 1ª Ré continua a afetar o mesmo número de vigilantes para executar as mesmas funções e tarefas que até então a 2ª R. tinha vindo a desenvolver no referido cliente. – Similitude serviço, meios humanos; 88. Os serviços que eram assegurados pelo A. e colegas de trabalho no nome e no interesse da 2ª Ré são agora assegurados por um vigilante que já aí trabalhava por conta da 2ª ré e por outros três vigilantes em nome e no interesse da 1ª Ré. – Assunção efetivos. Realces nossos.

g. Com efeito, dos referidos factos extrai-se na subsunção da premissa menor à premissa maior a ocorrência de diversos indícios concretizadores da figura da manutenção e preservação da unidade económica, tais como a transmissão de bens corpóreos ora equipamentos indispensáveis e necessários à prossecução e prestação dos serviços de segurança e vigilância privada nas instalações do cliente F..... ........, a transmissão de bens incorpóreos ora como conjunto de conhecimentos práticos (know-how), a assunção de efetivos, a manutenção e similitude da atividade prestação, bem como a semelhança dos meios humanos e operacionais e ainda a ininterrupção da atividade;

h. A valoração conjugada de todos estes indícios é a solução interpretativa apresentada pela extensa jurisprudência comunitária (v., neste sentido, acórdão de 26 de novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C‑509/14, EU:C:2015:781, n.° 32 e jurisprudência referida);

i. O que não foi respeitado pelo Tribunal ad quo quando não considerou todos estes indícios numa linha de valoração global e conjunta, tendo em conta todas as circunstâncias que caraterizam a operação da transmissão, mas tão somente a não assunção de efetivos e a não transmissão de bens corpóreos e incorpóreos.

j. Tanto a transmissão de bens e equipamentos, como a transmissão do conjunto de conhecimentos práticos do serviço de segurança e vigilância privada do cliente F..... ........ ocorreu de forma indireta; a primeira traduzida na retoma de diversos equipamentos pela 1.ª Ré ora Recorrida quando iniciou o serviço (vide artigos 71.º e 72.º dos factos dados como provados) e a segunda através da assunção e integração de um vigilante (vide artigos 48.º, 87.º e 88.º dos factos dados como provados) e do reconhecimento prévio efetuado às instalações pela 1.ª Ré ora Recorrida, antes do início da prestação do serviço e quando ainda lá estava a empresa cedente ora Recorrente, unicamente com vista a instruir os seus vigilantes e consequentemente a dar cabal cumprimento às obrigações contratualizadas com o beneficiário F..... .........

k. Se por um lado os demais indícios da manutenção e preservação da identidade se encontraram verificados, não é menos verdade que o critério indiciário principal adotado pelo Tribunal ad quo (não assunção de efetivos) igualmente se encontra como preenchido, pese embora o Venerando Juiz Desembargador não tenha assim entendido por apenas um dos quatro vigilantes ter sido integrado/assumido.

l. Entendimento sufragado na doutrina citada no douto acórdão quando fixa factual que “Em 1 de janeiro de 2019, a 1ª R. 2045, manteve o mesmo número de trabalhadores (…), conforme facto provado n.º 71.

m. Conforme refere Joana Nunes Vicente, em artigo publicado em Questões Laborais, Coimbra, nº 32, 2008, págs. 183-202, e reproduzido nos Cadernos do CEJ, de Setembro de 2014, Transmissão de Estabelecimento (a págs. 150-151), “em atividades de mão-de-obra intensiva, é sobretudo o “capital humano” o suporte da atividade desenvolvida. Aí, a manutenção ou não dos trabalhadores deve assumir um apport qualificante, pelo que se, numa dada situação concreta, se apura a não manutenção dos trabalhadores, isso releva como indício de não transmissão. É especialmente nestes casos que se pode equacionar o referido efeito perverso [o por alguns invocado incentivo do empresário a não reassumir os trabalhadores para evitar a aplicação da diretiva, conforme Júlio Gomes, Direito do Trabalho – Relações individuais de trabalho, vol. I, 2007, págs. 825 e ss.]. (…)em atividades de mão-de-obra intensiva, a manutenção dos trabalhadores é um elemento importante a atender, a par de outros, designadamente, saber se a atividade é prestada nos mesmos moldes, com o mesmo método de organização do trabalho, pelo que nem tudo estará completamente condicionado pela decisão de “não-reemprego” dos mesmos trabalhadores.” [fim de transcrição].

n. Ao intérprete bastará descortinar se antes da transmissão estavam quatro trabalhadores e após a transmissão continuaram outros quatro, para se verificar a existência de um dos indícios relevantes para apurar a manutenção da identidade da unidade económica.

o. A não assunção de efetivos – que não se concede uma vez que ela está demonstrada - “O anterior vigilante da R. Strong-Charon, admitido pela R.2045, passou, a partir de 01 de janeiro de 2019, a estar fardado com o modelo e insígnias da 1ª R., 2045. conforme facto provado n.º 79 (Cfr. ainda com os factos provados n.ºs 71, 87 e 88) - não é argumento suficiente para afastar a falta de manutenção da identidade da unidade económica.

p. A sedimentação de tal argumento determinaria, sempre e em qualquer circunstância a inaplicabilidade do regime legal da transmissão previsto nos artigos 285.º e seguintes do Código do Trabalho à atividade da segurança privada, por opção unilateral da cessionária, a quem simplesmente bastaria rejeitar tais elementos humanos da contraparte para afastar a transmissão.

q. Aceitar-se essa posição, de inexistência de transmissão pelo facto de a cessionária não receber/assumir nenhum dos trabalhadores [assunção de efetivos] seria deixar ao livre arbítrio do cessionário a verificação dessa realidade, permitindo-lhe afastar a transmissão do contrato de trabalho, respaldando-se em não assumir os trabalhadores, como também a não assumir ou receber quaisquer elementos transmissivo;

r. Colocando, definitivamente em crise, a teleologia do instituto da transmissão do estabelecimento/unidade económica, que visa a salvaguarda e o respeito pelo princípio constitucional e, até, comunitário da segurança no trabalho [53.º da CRP], adotando (...) disposições para proteger os trabalhadores em caso de mudança de empresário especialmente para assegurar a manutenção dos seus direitos” (cfr. considerando 3 da Diretiva 2001/23/CE).

s. Aliás, a não consideração deste requisito nos casos onde não há assunção de efetivos pela empresa cessionária é bem explicitado no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo: 357/13.1TTPDL.L1-4, relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO, com a seguinte fundamentação:

“Ora, chegados aqui e atendendo aos elementos de facto e aos documentos que os suportam e complementam bem como às normas jurídicas em presença, dir-se-á que concordamos em absoluto com a sentença impugnada quando aplica à situação descrita nos autos o regime da transmissão de estabelecimento previsto nos referidos artigos 285.º a 287.º do Código do Trabalho de 2009 e Cláusula 13.ª, n.º1, do CCT. Dir-se-á que tal figura jurídica não pode entrar em cena, dado nunca se ter operado a transferência da unidade económica formada pelo conjunto dos Autores (nos moldes deixados antes analisados) da 2.ª Ré SS para a 1.ª Ré RR, vindo esta a implantar, desde o início do contrato que firmou com a sociedade PORTOS DOS AÇORES, uma equipa ou equipas próprias de trabalhadores e equipamentos seus, assim recusando, à partida, o recebimento dos trabalhadores da ICTPS que até aí desempenharam idênticas funções e nas mesmas instalações daqueles outros, desenvolvendo as demandadas a mesma atividade económica de vigilância e segurança. Logo, segundo tal raciocínio, bastará a uma empresa de segurança (ou de limpeza, por exemplo)[6] avançar, de uma forma unilateral com um quadro de pessoal autónomo e excludente do que até à dita passagem do testemunho (transição efetiva do cliente da anterior empresa para a nova) aí se acha a desenvolver serviços similares, obstando, assim, a que este último conjunto de trabalhadores aí se mantenha, por já não ter lugar físico nem tarefas a desenvolver nos correspondentes espaços comerciais, por ter sido dessa forma substituído e renegado para uma situação equívoca, as mais das vezes de terra queimada ou de ninguém, para obstar ao funcionamento do regime legal dos artigos 285.º a 287.º do C.T./2009 e, no nosso caso, da cláusula 12.ª, n.º 1 do CCT aplicável. Deparamo-nos assim, não perante um regime legal imperativo, mas antes de cariz meramente facultativo ou seletivo, dependendo a sua real execução da disponibilidade e/ou boa vontade das empresas de segurança (ou de outros setores de atividade, onde se criam idênticos cenários e problemas). Esta estratégia de facto consumado, em que os Autores nos presentes autos (assim como a sua anterior entidade empregadora, a Apelada SS, ainda que, convirá dizê-lo, num plano material e jurídico diverso do daqueles) se veem confrontados com um cenário criado de origem pela 1.ª Ré e privativo da sua continuidade nos postos de trabalho que até aí tinham sido os seus, apesar do regime jurídico e convencional em vigor e das expetativas criadas pelas comunicações da 2.ª Ré não encontra, ao contrário do sustentado pela Apelante, um mínimo de sustentação nas regras do concurso aberto pela PORTOS DOS AÇORES nem esta entidade tem a legitimidade e virtualidade de se sobrepor, tornear ou alterar o regime legal imperativo (nos moldes antes analisados) derivado dos aludidos artigos 285.º a 287.º do C.T./2009 (e, ainda no nosso caso, da cláusula 12.ª, n.º 1 do CCT aplicável).”

t. O Tribunal ad quo na fundamentação do enquadramento jurídico adotado não esclareceu nem tampouco justificou de forma analítica o processo de silogismo judiciário efetuado, na medida em que não demonstra a justificação do juízo conclusivo de não transmissão de bens e equipamentos, quando tal resulta expressa, inequívoca e diretamente dos factos dados como provados, e de não transmissão dos procedimentos de segurança quando os factos somente apontam nesse sentido.

u. Pese embora o Tribunal ad quo tenha considerado como provado factos que demonstram, para além da verificação dos outros indícios caraterizadores da manutenção da identidade, a (i) transmissão entre cedente e cessionária de diversos bens corpóreos, indispensáveis, por retoma indireta já que os mesmos pertenciam ao cliente/beneficiário e (ii) a transmissão, igualmente indireta, do conjunto de conhecimentos práticos (know how), acontece que na sua douta motivação não concluiu nesse sentido, na medida em que determinou não ter ocorrido a transferência, direta ou indireta, de quaisquer equipamentos ou bens corpóreos da Ré Strong para a Ré 2045 por outras palavras, esta última não retomou quaisquer equipamentos da primeira indispensáveis ao exercício da prestação de serviços de vigilância e de segurança, nem conclui pela transferência/transmissão do conjunto de conhecimentos práticos (know-how).

v. A interpretação realizada pelo Tribunal ad quo não tem em conta a posição da nossa doutrina e jurisprudência, quer nacional quer comunitária, quanto à determinação do elemento transmissivo da unidade económica;

w. Violando em consequência o princípio pelo direito comunitário, cfr. artigo 8.º, n.º 4 da CRP.

x. O Estado-juiz encontra-se subordinado às orientações comunitárias e delas não poderá escudar-se, sob pena de violação do primado do direito comunitário.

y. O que não foi cumprido pelo Tribunal ad quo quando não considerou a mais recente jurisprudência comunitária sobre esta temática, presente no acórdão do TJUE de 17.10.2017, processo C‑200/16, o qual declara que a norma comunitária deve ser interpretada com vista a estar abrangida pelo conceito de transferência da unidade económica mesmo a empresa cessionária se recusa integrar os trabalhadores da primeira, desde que transferidos os bens corpóreos indispensáveis: “O artigo 1.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa aÌ aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que está abrangida pelo conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção desta disposição, uma situação em que um contratante resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância e de segurança das suas instalações celebrado com uma empresa e, em seguida, para a execução dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa, que recusa integrar os trabalhadores da primeira, quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação foram retomados pela segunda empresa

z. Alicerçou-se o Tribunal ad quo unicamente no aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de dezembro de 2017, processo 357/13.3TTPDL.L1.S1, relatora ANA LUÍSA GERALDES, com fundamento na similitude quer da temática jurídica quer da matéria factual.

aa. Acontece, porém, que a matéria factual nos presentes autos se mostra como mais rica quanto à verificação dos diversos elementos indiciários do elemento transmissivo, quando se realizada um juízo de comparação com o referido aresto de referência;

bb. Acresce ainda, sempre com o devido respeito, que no referido aresto judicial o decisor fez uma incorreta avaliação da atividade da segurança privada quando erigiu a transmissão dos alvarás e das licenças como parte integrante dos elementos incorpóreos a transmitir entre empresa cedente e cessionária;

cc. Se os métodos e organização do trabalho, o know-how, o conjunto de conhecimentos práticos e o conhecimento especializado constituem parte integrante dos elementos incorpóreos de cada serviço de segurança e vigilância privada prestado em determinada instalação, não se mostra como possível estender esta classificação aos alvarás e às licenças;

dd. É que os alvarás e as licenças não são mais do que títulos administrativos habilitantes do acesso e do exercício da atividade comercial de segurança privada e em nada se relacionem com o serviço prestado em cada instalação, mormente serviço de segurança e vigilância prestado nas instalações do cliente F..... ........;

ee. A transmissão do alvará no domínio da atividade da segurança privada não se mostra como possível nem a título contratual nem a título legal, razão pela qual a adoção deste elemento como bem incorpóreo caraterizador da figura do elemento transmissivo resulta na desconsideração da regra jurídica – vinculação à lei -, que visa assegurar a prevalência da lei, obstando assim à substituição do legislador pelo juiz;

ff. Mais, no referido Acórdão STJ/2017 é ainda destacado que a atividade da segurança privada se mostra como mais complexa e exigente tecnicamente face à atividade da limpeza de escritórios e de residências, ainda que ambas assentem essencialmente na mão-de-obra, e como tal a verificação da unidade económica e da sua autonomia carecem de um esforço interpretativo;

gg. A atividade da segurança e vigilância privada é de facto exigente e complexa, o que impede o exercício da atividade por empresa que não reúna os pressupostos e os requisitos legais [Lei n.º 34/2013 de 16 de maio]-

hh. Todavia, esta exigência e complexidade técnica apresentam-se como características transversais a qualquer empresa de segurança privada, que necessitam de estarem dotadas de uma estrutura humana e operacional devidamente formada e cumpridora igualmente das exigências legais.

ii. É esta exigência e complexidade técnica de índole geral que reforçam a identidade do serviço de vigilância e segurança privado que o dotam de uma autonomia, individualidade e sobretudo transversalidade, independentemente da empresa;

jj. Na visão da Recorrente os critérios das figuras dos alvarás, das licenças e da complexidade e exigência técnica, sempre tendo em consideração o respetivo regime e enquadramento legal, mostram-se como úteis e adequados quando interpretados no sentido de que todas as empresas de segurança privada possuem a mesma identidade, porquanto a prestação de serviços que podem assegurar está exaustiva e taxativamente regulada no regime jurídico da atividade da segurança privada.

kk. Os bens corpóreos [bens e equipamentos] e incorpóreos [know how e procedimentos de organização] foram transmitidos entre cedente e cessionária [elemento transmissivo] e essa transmissão ocorreu, por um lado, com a retoma de todos os bens mencionados e, por outro lado, pela apreensão e interiorização do conhecimento e informação através da prévia visita e assunção de um dos quatro vigilantes;

ll. Ao invés, o douto acórdão desconsiderou tout court dados característicos e indiciadores da existência de unidade económica autónoma como:

I - Não interrupção na prestação da atividade; A cessionária iniciou a sua prestação de serviços de vigilância privada, no mesmo local, e com o mesmo objeto de prestação de serviços contratual às 00h00 do dia 1 de janeiro de 2019 quando até as 23h59 os serviços foram prestados pela cedente;

II - Grau de semelhança entre a atividade prosseguida antes e depois da “transferência” e Retoma dos bens e equipamentos indispensáveis à prestação de serviços; Em 1 de janeiro de 2019, a Recorrida 2045 manteve os mesmos recursos humanos – teve de alocar o mesmo número de vigilantes com a mesma categoria profissional e os mesmos recursos logísticos, assumindo a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivos existentes no local afeto ao desempenho do serviço contratado pelo cliente F..... ........, recursos esses que foram utilizados pela Recorrente Strong Charon na prestação de serviço até à data da transmissão, isto é, até ao dia 31 de dezembro de 2018;

III. - Continuação do cliente; O local da prestação da atividade da Recorrida é o mesmo onde prestava a atividade a Recorrente;

IV.- - Grau de semelhança entre os meios utilizados antes pela Recorrente e depois da “transferência” pela Recorrida 2ª Ré O equipamento destinado a controlar o acesso, permanência e saída das instalações de pessoas e bens, afeto o exercício da atividade de segurança das instalações usado pela Recorrida é similar ao usado pela Recorrente, sendo todo ele retomado pela cessionária, pese embora pertencesse a terceiro ora beneficiário;

V – Assunção de efetivos. A cessionária ora Recorrida integrou no serviço de segurança a si adjudicado um dos quatro vigilantes e alocou exatamente o mesmo número de trabalhadores vigilantes para o exercício e prestação do serviço adjudicado;

mm. Não obstante o amplo quadro factual dado como assente o Tribunal ad quo entendeu numa interpretação minimalista e desconforme com a orientação legal e judicial comunitária que não existiu manutenção da identidade, porque não existiu transmissão direta de bens e elementos corpóreos e incorpóreos, razão pela qual o serviço de vigilância e segurança privada não se apresentava como uma unidade económica.

nn. Não tem sido esse o entendimento da nossa doutrina e jurisprudência superior, nacional e comunitária, que têm definido que a verificação de uma unidade económica, para efeitos de transmissão ope legis ao abrigo do regime instituído no artigo 285.º do Código do Trabalho, carece de um esforço interpretativo resultante de uma conjugação global de uma série de indícios da manutenção da “unidade económica”.

oo. Considerou ainda o Tribunal ad quo que o serviço de segurança e vigilância privada prestado no cliente F..... ........ não possuía uma autonomia técnico-organizativa, na linha de raciocínio do Acórdão STJ/2017;

pp. O que, uma vez mais, não se mostra como correto, tendo em conta a factualidade dada como provada;

qq. Efetivamente, ficou dado como provado que o conjunto de trabalhadores, ora Autores, afetos à prestação dos serviços de segurança e vigilância privada nas instalações do cliente F..... ........ tinham, pelo menos até ao dia 31/12/2018, autonomia organizativa e operacional dentro da empresa, tanto assim era que nas instalações não se encontrava permanentemente nenhum superior hierárquico a determinar e conformar as tarefas a desempenhar pelos vigilantes;

rr. Neste contexto não se levanta a menor dúvida de que era a equipa de vigilância que diariamente executava os serviços de segurança e vigilância privada, sem que tivesse necessidade de reportar, comunicar, solicitar à estrutura operacional central o que quer que fosse;

ss. A autonomia técnica da equipa de segurança e vigilância a prestar funções no cliente F..... ........ deriva, não só da execução permanente do serviço sem recorrer à estrutura hierárquica, mas também como em resultado da sua formação profissional, obtida para dar resposta a uma exigência tecnicamente complexa.

tt. É certo que a montante estava todo o acervo empresarial da 2.ª Ré ora Recorrente, e decerto que o trabalho destes trabalhadores era de algum modo e em alguma medida fiscalizado, o habitual no seio de uma subordinação jurídica, mas o cerne dos serviços de segurança e vigilância privada, o seu asseguramento um dia após outro, todos os dias do ano, consecutivamente, era a equipa de vigilância dos Autores que cabia executar, sem necessidade, como se postula evidente, de recorrerem aÌ “sede” ou ao superior hierárquico, não se descortinando dificuldade de maior em prestarem o mesmo serviço, com elevado grau de autonomia, ainda que sob a alçada de um outro e novo enquadramento empresarial.

uu. Conforme citado no douto acórdão em escrutínio “Por outro lado, não se questiona igualmente que o conjunto de trabalhadores especificamente adstritos à limpeza das instalações da residência universitária ..., pode integrar o conceito de “identidade económica” para efeitos de aplicação da diretiva. Conforme decidido no acórdão do TJUE de 12 de fevereiro de 2009, processo C-466/07, Dietmar Klarenberg Ferroton Technologies GMBH, a sucessão laboral também ocorre numa situação em que a parte da empresa ou centro de atividade não mantém autonomia organizativa, sempre que se mantenha o nexo funcional e teleológico existente entre os diversos fatores transferidos.”

vv. Pelo que a única conclusão admissível passa pela classificação do referido serviço como um conjunto de meios organizados com uma autonomia técnico-organizativa com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória.

ww. A propósito desta temática e das suas consequências em sede social, a recente Resolução da Assembleia da República [Resolução 24/2020 de 11 de maio de 2020] recomenda ao Governo a assunção de medidas de salvaguarda dos direitos dos trabalhadores dos setores da vigilância e da limpeza quando estejam em processo de transmissão do estabelecimento;

xx. O que efetivamente importa consiste em proteger os trabalhadores para assegurar a manutenção dos seus direitos em caso de mudança de empresário, considerando o espirito e o objetivo do presente no artigo 1.º, n.º 1 da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos (JO 2001, L 82, p. 16);

yy. O que motivou não só a apresentação de mais propostas/projetos de lei [atualmente em discussão na respetiva comissão de Trabalho e Segurança Social – Assembleia da República] sobre a figura da transmissão da unidade económica na manutenção dos postos de trabalho quando a entidade beneficiária é um ente/instituição pública: O Projeto Lei 414/XIV/1.ª Densifica o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento, clarificando a sua aplicação nas situações de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação ou limpeza (décima sexta alteração ao Código do Trabalho). O Projeto Lei 448/XIV Introduz uma norma interpretativa do artigo 285.º do Código do Trabalho, tornando obrigatória a sua aplicação à adjudicação, por concurso público, de prestações de serviços públicos. O projeto Lei 503/XIV/1.ª Defende e reforça os direitos dos trabalhadores em caso de transmissão de empresa ou estabelecimento, no setor privado ou no setor público, por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste direto ou qualquer outro meio previsto.

zz. Todos estes pressupostos determinam a conclusão de que o serviço de segurança e vigilância privada nas instalações do cliente F..... ........ constitui unidade económica enquanto conjunto de meios organizados e autónomos com identidade própria passível de transmissão automática por força da lei – artigo 285.º do Código do Trabalho.

aaa. Houve efetivamente um elemento transmissivo entre a cedente e a cessionária traduzido na continuidade do tipo de serviço com manutenção dos recursos utilizados, com passagem de meios e procedimentos, razão pela qual foi preservada a identidade da unidade económica ora serviço de segurança e vigilância privada.

bbb. A 1.ª Ré ora Recorrida quando assumiu a posição de prestadora de serviços de vigilância e segurança privada nas instalações do cliente F..... ........ não trouxe nem implementou nada de inovatório;

ccc. Não nos podemos afastar dos critérios orientadores e dos princípio plasmados na génese da diretiva comunitária, especialmente o concretizado no seu considerando n.º 3 “É necessário adotar disposições para proteger os trabalhadores em caso de mudança de empresário, especialmente para assegurar a manutenção dos seus direitos.

ddd. Em função da transmissão dessa unidade económica o contrato individual de trabalho do A. celebrado com a aqui Recorrente, transmitiu-se, em 1 de janeiro de 2019, para a 1.ª Ré ora Recorrida, que passou a ser, a partir dessa data, a entidade empregadora do A. por alteração ope legis da posição contratual de entidade empregadora.

eee. A Recorrente não despediu ilicitamente o A. porque a sua posição de entidade empregadora no contrato individual de trabalho celebrado se transmitiu para a 1.ª Ré ora Recorrida por força do disposto nos artigos 285º e seguintes do Código do Trabalho, com todas as consequências legais emergentes de tal facto.

fff. O despedimento ora cessação do vínculo laboral resulta da conduta da 1.ª Ré ora Recorrida quando já era, por força da lei, entidade empregadora e não aceitou o Autor ora Recorrido com manutenção do vínculo, mediante o escrupuloso respeito pela antiguidade e demais direitos e garantias.

ggg. Razão pela qual deverá ser dado provimento ao presente recurso de Revista quanto à revogação do dispositivo que considerou inexistir transmissão da unidade económica, revogando-se consequentemente o douto acórdão recorrido.

hhh. Neste sentido, violou o Tribunal ad quo a correta interpretação ao regime da transmissão da unidade económica, mais precisamente os n.ºs 1, 2 e 5 do artigo 285.º do Código do Trabalho.

E terminava pedindo a revogação do Acórdão recorrido.

O Autor contra-alegou, defendendo a existência de transmissão, mas sustentando, igualmente, que se o Tribunal decidir que não há transmissão “deve o Acórdão em crise ser mantido, condenando-se a Ré Strong nos pedidos” (cfr. Conclusão 34).


Também a 2045 – Empresa de Segurança, S.A., contra-alegou.


O Ministério Público, em conformidade com o disposto no artigo 87.º n.º 3 do CPT emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.


Por Acórdão desta Secção proferido a 15 de setembro de 2021, decidiu-se suspender a instância e suscitar junto do Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a seguinte questão prejudicial:

1. Continua a poder afirmar-se que a inexistência de qualquer vínculo contratual entre sucessivos prestadores de serviços é um indício da inexistência de transferência na aceção da Diretiva 2001/23/CE, embora como os restantes indícios não seja só por si decisivo e não deva ser considerado isoladamente (Acórdão proferido a 11 de março de 1997, Ayse Süzen, C-13/95, n.º 11)?

2. Em uma atividade como a segurança privada de instalações industriais, em que o novo prestador assumiu apenas um dos quatro trabalhadores que integravam a unidade económica (e, por conseguinte, não assumiu a maioria) e não há elementos de facto que permitam concluir que o trabalhador em causa tinha competências e conhecimentos específicos de modo a poder afirmar-se que uma parte essencial dos efetivos em termos de competências tenha transitado para o novo prestador, nem tão pouco se verificou a transmissão de bens incorpóreos, pode concluir-se pela inexistência de transferência de qualquer entidade económica, apesar de algum equipamento (alarmes, circuito interno de televisão, computador) continuar a ser disponibilizado pelo cliente ao novo prestador de serviços, atendendo, por um lado, ao valor económico relativamente reduzido do investimento que tal equipamento representa no conjunto da operação e, por outro, que não seria economicamente racional (Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Grafe e Pohle, C-298/18, n.º 32) exigir ao cliente a sua substituição?

3. Se “esta questão [deve] ser apreciada in concreto pelo órgão jurisdicional nacional à luz dos critérios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça (Acórdão de 7 de agosto de 2018, Colino Siguënza, C‑472/16, EU:C:2018:646, n.o 45; Acórdão Grafe e Pohle n.º 27) e dos objetivos prosseguidos pela Diretiva 2001/23, conforme enunciados, designadamente, no seu considerando 3”, deve ter-se em conta que “a Diretiva 2001/23 não tem unicamente por objetivo salvaguardar os interesses dos trabalhadores, aquando de uma transferência de empresa, mas pretende assegurar um justo equilíbrio entre os interesses destes últimos, por um lado, e os do cessionário, por outro” (n.º 26 do Acórdão ISS Facility Services NV proferido a 26 de março de 2020, processo C-344/18, o qual retoma, aliás, afirmação já proferida no Acórdão Alemo-Herron de 18 de julho de 2013, C-426/11, n.º 25)?


Este Tribunal foi notificado do Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça a 16 de fevereiro de 2013, no processo C-675/21.


Cumpre agora, em função da resposta dada pelo Tribunal de Justiça decidir o recurso.


Fundamentação


De Facto


Foi esta a matéria de facto apurada nas instâncias:


1. O Autor tem a categoria profissional de vigilante e ambas as Rés se dedicam à atividade de prestação de serviços de segurança privada.


2. A 2ª R. paga atualmente – com referência à data da comunicação da transmissão da posição de entidade empregadora, dezembro de 2018 – o salário base mensal de € 694,39 a cada vigilante ao seu serviço, acrescendo o subsídio de alimentação de € 6,00 por cada dia de trabalho efetivo.


3. Relativamente à 2ª Ré quando é praticado horário em período noturno, entre as 20H de um dia e as 7H do dia seguinte, acresce ainda 25% sobre o valor hora.


4. A 2ª Ré, Strong-Charon, admitiu o A. com antiguidade reportada a 01-08-2003 para as funções de vigilante, e manteve-o a trabalhar, nos seus quadros de pessoal, sob sua autoridade e direção, até ao fim do ano de 2018.


5. Em 16-01-2017, colocou o A. a desempenhar as funções nas instalações do cliente A...... ........, S.A. (F..... ........), situadas na ..., ..., ... ....


6. O A. cumpria aí o horário normal de 40 horas por semana, no regime de turnos rotativos, das 00h00 às 08h00, das 8h00 às 16h00 e das 16h00 às 24h00.


7. Com data de 26.12.2018, a Ré Strong-Charon notificou por escrito o A. de que se ia verificar “a transmissão do estabelecimento correspondente ao Cliente A...... ........, S.A. (F..... ........)” e que a Ré 2045 passava a ser “a nova Entidade Empregadora” dele.


8. Dizia a Ré STRONG-CHARON nessa notificação escrita “que os serviços de vigilância prestados pela STRONG CHARON, SOLUÇÕES DE SEGURANÇA, S.A., nas instalações do cliente A...... ........, S.A. (F..... ........) foram adjudicados à Empresa 2045 – EMPRESA DE SEGURANÇA, S.A., com efeitos a partir do dia 01 de janeiro de 2019”.


9. E acrescentava que “a partir dessa data, 2045 – EMPRESA DE SEGURANÇA, S.A. será a Entidade patronal (...) conforme resulta dos art. 285 a 287 do Código do Trabalho”.


10. Dizia ainda “que não resultam quaisquer consequências de maior ou substanciais (...) porquanto lhe é garantida a manutenção de todos os seus direitos, designadamente a manutenção de antiguidade, de retribuição e da categoria profissional em que se encontra”.


11. No dia 01.01.2019, o A. compareceu normalmente no posto de trabalho, mas a Ré 2045 não o deixou exercer as funções.


12. O A. repetiu nos dois dias seguintes a apresentação no local onde exercia funções ultimamente, mas a Ré 2045 continuou a recusa. (redação alterada pelo Tribunal da Relação)


13. E até ao presente nunca lhe deu trabalho.


14. O A. chamou a GNR, para confirmar a presença dele no local onde exercia funções ultimamente e o facto de ser impedido de entrar para trabalhar. (redação alterada pelo Tribunal da Relação)


15. No dia ........2019, foi realizada uma reunião na Direção de Serviços para as Relações Profissionais nas Regiões Norte e Centro (D......) da D............ .. ....... . ........ .. ........ (D....), para a qual foram convocadas ambas as RR. e o STAD, sindicato em que o Autor e outros trabalhadores envolvidos no cargo se encontram filiados.


16. Nessa reunião, a Ré STRONG CHARON manteve o seu entendimento de ter existido transmissão para a Ré 2045, com efeitos a partir de 01.01.2019, do estabelecimento ou unidade económica correspondente ao “Cliente A...... ........, S.A. (F..... ........)”.


17. Sendo certo que a Ré 2045 já tinha incorporado nos seus quadros de pessoal um dos trabalhadores que prestavam trabalho nesse Cliente por conta da Strong-Charon, BB, cujo posto de trabalho se manteve na “A...... ........, S.A. (F..... ........)”. Eliminado pela Relação


18. O Sindicato dos Autores, o STAD, na referida reunião, também defendeu a mesma posição em relação ao A. e seus colegas de trabalho no Cliente “F..... ........”, referindo que “estes têm direito a manter o seu posto de trabalho, independentemente da mudança das empresas que assumam o serviço (à qual são alheios), mantendo todos os direitos e regalias laborais, nomeadamente o vínculo da atividade, a antiguidade e a remuneração”.


19. A Ré 2045 declarou que não aceitava os trabalhadores, designadamente por entender não ter havido transmissão para si da posição de empregador nos respetivos contratos de trabalho.


20. A Ré 2045 argumentou, na defesa da sua tese, “que a manutenção do emprego e dos interesses dos trabalhadores pode ser acautelada através do princípio da rotatividade dos postos de trabalho, plasmada no contrato coletivo do trabalho do setor”.


21. O A., juntamente com outros trabalhadores escreveu e enviou, sob registo do correio, à Ré 2045 uma carta, com referência à notificação que tinham recebido da Ré STRONG-CHARON datada de ........2018, declarando a sua total disponibilidade para continuar a cumprir no seu posto de trabalho as funções que anteriormente lhe estavam atribuídas, solicitando ordens e autorização para continuar lá e dizendo que queria trabalhar e era obrigado a fazê-lo para sobreviver, não aceitando ser despedido.


22. Acrescentou ainda que exigiria todos os direitos, incluindo os salários desde 01.01.2019, ficando a aguardar instruções para retomar o trabalho.


23. Na mesma data, o A. dirigiu à Ré STRONG-CHARON uma outra carta, reportando-a também à comunicação que dela tinha recebido com data de ........2018, a dizer que aceitava a posição perfilhada pelo seu Sindicato, o STAD, quanto à transmissão do estabelecimento.


24. Mais acrescentou nessa carta que nada opunha a que a Ré STRONG-CHARON comunicasse à Ré 2045 todos os seus dados relacionados com o contrato de trabalho, incluindo a informação de que era sócio do STAD.


25. Nessa mesma carta advertiu a Ré STRONG-CHARON que, embora mantivesse total disponibilidade para continuar a cumprir o contrato de trabalho, no local que lhe estava atribuído, sob as ordens da Ré 2045, desencadearia todas as diligências judiciais para defender os seus direitos, fosse contra a STRONG-CHARON, fosse contra a 2045, se esta continuasse a recusar-lhe a prestação do trabalho.


26. Nenhuma das Rés deu trabalho ao Autor desde 01.01.2019.


27. As Rés também não pagaram ao A. o salário do mês de j...... .. ...., nem qualquer outra retribuição ou compensação.


28. O A. manteve e mantêm total disponibilidade para prestar o seu trabalho a qualquer das RR.


29. No local onde exercia funções ultimamente da “A...... ........, S... (F..... ........)”, o A. desempenhava nomeadamente as seguintes tarefas:


a. Abertura e fecho das instalações;


b. controle chaveiro da A...... ........ S.A.;


c. Registo de movimento de pessoas e viaturas em ficheiro excel, em PC cedido pela A...... ........ S.A.;


d. Ativação e desativação de alarme de intrusão da A...... ........ S.A.;


e. Controlo de cctv propriedade da A...... ........ S.A.;


f. Rondas noturnas de 2 e 2 horas, com picagem de pontos estratégicos com pastilhas e bastão próprio, e lanterna de apoio propriedade da Strong-Charon (redação alterada pelo Tribunal da Relação).


30. Para o exercício da totalidade das tarefas executadas, o A. não utilizava quaisquer instalações ou mobiliário pertencentes à Ré Strong-Charon.


31. Pelos serviços de vigilância prestados pelas rés, o Cliente A...... ......... .... (F..... ........) pagou e paga às RR (com referência ao respetivo período de adjudicação dos serviços) uma quantia mensal.


32. A Ré 2045, na sequência de ter ganhado, em finais de 2018, o concurso para adjudicação dos serviços de vigilância e segurança, continuou aí a mesma atividade, com pelo menos parte dos mesmos meios (instalações, mobiliário, equipamentos, instrumentos e materiais pertencentes à A...... ........, S.A.) e com idêntico número de trabalhadores (4), sendo que um deles transitou da Ré Strong-Charon para aquela Ré. Eliminado pela Relação.


33. No fim do passado mês de janeiro de 2019, as RR. pagaram, como de costume, os salários aos respetivos trabalhadores.


34. Mas nada pagaram ao A..


35. Ambas as rés recusaram-se a emitir o Mod. RP 5044 – DGSS, necessário à instrução do requerimento de subsídio de desemprego, pois a Strong-Charon no seu entendimento não tinha despedido o autor e a ré 2045 na sua opinião não tinha, ou tinha tido, qualquer vínculo com o mesmo, tendo o autor de recorrer à ACT para obter tal documento.


36. O A. está filiado no Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticos e Profissões Similares e Atividades Diversas (STAD) e é o sócio nº 88465.


37. A R. 2045 é apenas associada da AESIRF – Associação Nacional das Empresas de Segurança.


38. A R. 2045 apresentou-se a um concurso público para prestação de serviços de vigilância nas instalações do cliente A...... ........ SA, tendo sido selecionada como adjudicatária de entre outros concorrentes e celebrou com a entidade adjudicante o contrato de prestação de serviços correspondente ao objeto do concurso, cuja execução teve início em 1 de janeiro de 2019.


39. Os vigilantes que a R. 2045 coloca ao seu serviço em cada posto, designadamente os que foram colocados no cliente A...... ........, SA, dependem hierarquicamente, em primeira linha, de um Chefe de Grupo e de um Supervisor locais que organizam, coordenam e fiscalizam o seu trabalho, o qual, por sua vez, reporta ao Gestor de Operações, a nível regional e ao Diretor de Operações, a nível Nacional.


40. Para além da equipa de Vigilantes a prestar funções no referido local, a partir do dia 1 de Janeiro de 2019 prestam ainda funções o Chefe de Grupo CC, o Supervisor DD – os quais já vinham exercendo cumulativamente as mesmas funções de acompanhamento de outros postos de outros diversos clientes na região (O chefe de Grupo cerca de 11 postos num total de 28 Vigilantes e o Supervisor cerca de 80 postos, num total de cerca de 240 vigilantes), o Gestor Operacional EE que já vinha exercendo as mesmas funções junto de outros diversos clientes da região e o Diretor de Operações, dando apoio e supervisionando todos os postos de diversos clientes a nível nacional.


41. Tanto o Chefe de Grupo CC, o Supervisor FF, o Gestor Operacional, como também o Diretor de Operações, são trabalhadores do quadro permanente da R. que nunca estiveram ao serviço da empresa STRONG no cliente A...... ........, SA, sendo trabalhadores da R. 2045 respetivamente desde .../.../2008, .../.../2006, .../.../2005 e .../.../1999.


42. Estes trabalhadores da R. 2045 nunca antes orientaram, coordenaram ou fiscalizaram qualquer atividade dos vigilantes que a S..... tinha colocado no posto do cliente ..., SA, que fosse do âmbito da prestação de serviços a efetuar pela STRONG.


43. São também este conjunto de trabalhadores do quadro permanente da R., globalmente considerado que passou, a partir de 1 de janeiro de 2019, a prestar a sua atividade fazendo o acompanhamento a este posto, mas também, em simultâneo a outros postos de clientes, desde que entraram ao serviço da R., sendo o Chefe de Grupo e o Supervisor a nível local, neste e noutros postos, o Gestor Operacional a nível regional e o Diretor de Operações a nível nacional.


44. A R. 2045 detém no seio da sua organização um Departamento de Formação permanente, devidamente autorizado e acreditado.


45. A R. 2045, desde há dezenas de anos, tem no seu quadro de pessoal inúmeros trabalhadores Vigilantes que desempenham funções, no âmbito de contratos de prestação de serviços que foi e vai sucessivamente celebrando com muitos outros clientes, de norte a sul do país.


46. Para além dos meios humanos afetos à atividade de segurança, no posto do cliente ..., SA, são utilizados pelos vigilantes que aí prestam serviço meios materiais, designadamente fardas, impressos (notas de comunicação internas, registo de entradas e saídas de pessoas, escalas de turno), lanternas, telemóveis e, pelos chefes de grupo e supervisores, viaturas de serviço que também servem em simultâneo outros postos onde a R. presta serviço a outros clientes, para além do posto do cliente A...... ........, SA.


47. A R. 2045 tem também no seu ativo empresarial elementos incorpóreos, que utiliza nos postos onde presta serviço, designadamente, alvarás próprios, métodos de organização de trabalho, cultura empresarial e Know-how que lhe são próprios e que não lhe foram transmitidos pela empresa STRONG ou sequer pelo cliente GG, SA.


48. Em face da adjudicação dos referidos serviços de vigilância, a R. 2045, para além dos restantes trabalhadores atrás referidos que já faziam parte dos seus quadros e da sua estrutura operacional e administrativa (Chefe de Grupo, Supervisor, Gestor Operacional e Diretor de Operações), admitiu ao seu serviço apenas 1 trabalhador Vigilante que, anteriormente, prestava serviço por conta da STRONG-CHARON – BB – e 1 outro Vigilante.


49. Sendo que os restantes 2 Vigilantes que a partir de 01.01.2019 compunham a equipa de Vigilante, num total de 4 Vigilantes no posto F..... ........, pertencente ao cliente “..., SA” – HH e II, já há muito que faziam parte dos quadros da R. 2045, desde .../.../2015 e .../.../2016, respetivamente.


50. Vigilantes que, ao longo da vigência contratual com a R. 2045 exerceram funções noutros e variados postos de diversos clientes.


51. Os 2 Vigilantes a admitir facultaram à R. 2045, antes de 1 de janeiro de 2019 todos os documentos individuais que esta lhe solicitou com vista à sua admissão (fotocópia do BI, número de contribuinte, certificado de habilitações e certificado de registo criminal) e preencheram a ficha de candidatura para nova admissão.


52. Posteriormente, a R. 2045 procedeu à devida comunicação aos serviços da Segurança Social e ao Departamento de Segurança Privada da PSP, da admissão dos dois vigilantes suprarreferidos, com efeitos a partir de 01/01/2019.


53. A empresa STRONG manteve após 1 de janeiro de 2019 e mantém ainda a sua atividade de forma regular, continuando a prestar serviços de segurança noutros locais e clientes.


54. Tendo a prestação de serviços da R. tido o seu início em 1 de janeiro de 2019, apenas em 31 de dezembro de 2018 esta recebeu a informação da R. STRONG, conforme teor da comunicação junta de fls 62 a 67 v. (doc. nº 7 de 13 fls, junto com a contestação da ré 2045), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


55. Pelo que a R. 2045 remeteu à R. STRONG a comunicação que está junta a fls 68 (doc. nº 8 de 2 fls da contestação da ré 2045) e que aqui se dá por integralmente reproduzida.


56. Pelo mesmo motivo – entender que não ocorreu de transmissão do contrato de trabalho – a R. 2045, em resposta a uma comunicação remetida pelo A., recebida em 7 de janeiro de 2019 (doc. de fls 69; doc. nº 9 de 3 fls, junto com a contestação da ré 2045), comunicou ao A. em 11 de janeiro de 2019, que em virtude de não ter ocorrido transmissão de estabelecimento nos termos previstos no disposto no art. 285º do Código do Trabalho, o A. não integrou os quadros da R., mantendo-se, para todos os efeitos legais, ao serviço da R. STRONG, conforme doc. de fls 70 v. (doc. nº 10 de 2 fls junto com a contestação da ré 2045).


57. Mais se esclarecendo o A. nessa comunicação que a revisão parcial do Contrato Coletivo de Trabalho supra identificado, publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, nº 48 de 29 de dezembro de 2018, a que o A. se reporta nessa comunicação apenas vincula as empresas representadas pela AES – Associação das Empresas de Segurança, o que não é o caso da ora R., não existindo, à data de 1 de janeiro de 2019, qualquer Portaria de Extensão.


58. Ainda em resposta à comunicação do A., e também a uma outra comunicação do A. datada de 23 de janeiro de 2019, junta a fls 71 v. e 72 (doc. nº 11 de 2 fls da contestação da ré 2045) a R, respondeu ao A. conforme cópia da carta que se junta a fls 72 v. e 73 (doc. nº 12 de 2 fls da contestação da ré 2045), documentos cujo teor aqui se dá por reproduzido.


59. Na qual, a R. 2045 reitera a informação que já havia sido prestada ao A. não reconhecendo a existência de qualquer vínculo contratual laboral como o A. e o subsequente despedimento que refere ter ocorrido.


60. Consequentemente, em virtude de entender não ter ocorrido cessação do contrato de trabalho, a R. informou o A. estar impedida de emitir a declaração solicitada, destinada do Fundo de Desemprego – Modelo RP 5044.


61. O A. tem vindo a desempenhar funções profissionais junto de outra ou outras entidades, auferindo rendimentos dessas atividades iniciadas após 1 de janeiro de 2019. (redação alterada pelo Tribunal da Relação)


62. A 2ª R., Strong-Charon, é uma empresa de segurança privada cujo objeto societário exclusivo é a prestação de serviços de segurança privada, nomeadamente a vigilância humana e eletrónica.


63. No âmbito dessa atividade, a 2ª R. garante a vigilância e segurança de pessoas e bens em locais de acesso ao público; de acesso vedado ou condicionado ao público; vigiando a entrada, a presença e a saída de pessoas e bens nesse local de trabalho.


64. Serviços que assegura aos seus clientes, quer entidades/sociedades privadas quer entes públicos, em vário locais do território nacional, garantindo a segurança de instalações.


65. A 2ª R. assegurou à A...... ......... .... – F..... ........ serviços de vigilância e segurança nos termos acordados no caderno de encargos.


66. A 2ª R. prestou serviços de vigilância e segurança ininterruptamente nas instalações da empresa A...... ......... .... – F..... ........, sendo aí que ultimamente o A. prestava as suas funções. (redação alterada pelo Tribunal da Relação)


67. O serviço de vigilância e segurança prestado pela 2ª R. a A...... ......... .... – F..... ........, ao longo do sucessivo ano e até ao termo da sua vigência, em 31 de dezembro de 2018, mantiveram, na sua essência, as mesmas caraterísticas. Eliminado pelo Tribunal da Relação.


68. Os trabalhadores afetos à prestação do serviço de vigilância na A...... ........, S.A., nos quais está incluído o A., prestaram consecutivamente serviço nas instalações da A...... ......... .... – F..... ........, ao serviço da 2ª R. desde datas variáveis, sendo o vigilante JJ desde 2007, o A. desde ...-...-2017 e o vigilante KK durante oito meses até 31 de dezembro de 2018, e tendo a prestação de serviço da 2ª R. início em pelo menos 2004. (redação alterada pelo Tribunal da Relação)


69. A 2ª R., ao longo do tempo de vigência contratual, foi mantendo um número constante – 4 – e similar – vigilantes – de trabalhadores afeto à prestação do serviço de segurança nas instalações do A...... ......... .... – Fogões Meireles.


70. Ao longo do referido período de prestação dos serviços de vigilância, os trabalhadores da 2ª R., Strong-Charon, desenvolveram a sua atividade naquelas instalações através de uma equipa organizada, com uma estrutura hierárquica devidamente fixada, a qual obedecia, cumpria e fazia cumprir procedimento de segurança e operacionalidade, e com recurso a bens e equipamento destinado a controlar o acesso, permanência e saída das instalações de pessoas e bens, para dar resposta às especificidades e rotinas de segurança exigidas pelo A...... ......... .... – F..... .........


71. Em 1 de janeiro de 2019, a 1ª R., 2045, manteve o mesmo número de trabalhadores, ainda que, em parte, com outros vigilantes, assumiu a exploração e utilização do equipamento, bens e dispositivo existentes no local afeto ao desempenho do serviço antes adjudicado pelo A...... ......... .... – F..... ........ à 2ª R., e pertencentes ao cliente, nomeadamente cancelas/barreiras de acesso, sistema de CCTV, alarme de intrusão, computador, telefone.


72. Recursos esses que foram utilizados pela 2ª R., Strong-Charon, na prestação de serviço até ao dia 31 de dezembro de 2018.


73. Por decorrência de procedimento, foi adjudicada à 1ª Ré, 2045, o contrato de prestação de serviço de segurança privada no espaço, locais e instalações do A...... ......... .... – Fogões Meireles.


74. Serviço que se iniciou em ... de ... de 2019, data a partir da qual a 1ª R. começou a prestar a sua atividade no âmbito da aludida adjudicação.


75. Em concreto, manteve-se a necessidade de alocar o mesmo número de vigilantes (4) e meios afetos à prestação do serviço assegurado ao cliente A...... ........S.A. – F..... ......... Eliminado pelo Tribunal da Relação.


76. O modo de exercício da atividade assente na organização e hierarquização do serviço manteve-se. Eliminado pelo Tribunal da Relação.


77. O local da prestação da atividade é o mesmo e corresponde ao local de trabalho do A.. Eliminado pelo Tribunal da Relação.


78. Em virtude de lhe ter sido adjudicado o contrato de prestação de serviços de segurança privada, a 1ª R., 2045, integrou nos seus quadros um dos quatro vigilantes que aí prestavam serviço. Eliminado pelo Tribunal da Relação


79. O qual passou, a partir de 01 de janeiro de 2019, a estar fardado com o modelo e insígnias da 1ª R., 2045.


80. A 1ª R. assumiu a posição de entidade prestadora de serviços de segurança e vigilância humana/estática e eletrónica nas instalações pertencentes à A...... ......... .... – F..... ........, compreendendo a vigilância e segurança de pessoas, instalações, equipamentos e bens e controlo de acessos, e o que implicava, nomeadamente, a prestação dos seguintes serviços:


a. Atendimento telefónico com telemóvel de serviço pertencente ao cliente;


b. Fiscalização de entrada e saída de pessoas e bens após o encerramento das instalações, registando em documento do cliente esses movimentos;


c. Operação e controlo do sistema de videovigilância [monitorização] – numa central de monotorização;


d. Monitorização do sistema de alarme de intrusão instalado no edifício e da propriedade do Cliente;


e. Efetuar giros periódicos durante a dia e noite – rondas;


f. Assegurar a execução e vigilância do chaveiro pertença do Cliente.


81. No edifício onde são prestados os serviços de segurança e vigilância, foi instalada pelo Cliente um sistema de CCTV composta com diversas câmaras, dispostas por vários locais, as quais se encontram ligadas a uma série de monitores de visualização interna.


82. O referido equipamento assume a caraterística de sistema fechado, significa que não tem qualquer ligação à central de segurança da 2ª Ré. (redação alterada pelo Tribunal da Relação).


83. Era a equipa de vigilância, na qual o A. estava incluído, que operava o referido sistema do cliente, executando e iniciando o CCTV, redirecionando as câmaras entre outras funções e valências.


84. A 2ª R., STRONG, através de carta datada de 26 de Dezembro de 2018 informou a empresa 2045 que a partir de 1 de janeiro de 2019, o ora A., entre outros funcionários, passava a ser seu trabalhador. (redação alterada pelo Tribunal da Relação).


85. Igualmente e na mesma data, 2ª R., através de carta informou o A. e a sua associação sindical (STAD) que a partir de 1 de janeiro de 2019 passaria a ser trabalhador da 1ª R..


86. A 2ª R. prestou serviço até às 24h00 do dia 31 de dezembro de 2018, tendo a 1ª R. iniciado funções às 00h00 do dia 1 de janeiro de 2019.


87. A 1ª Ré continua a afetar o mesmo número de vigilantes para executar as mesmas funções e tarefas que até então a 2ª R. tinha vindo a desenvolver no referido cliente.


88. “Os serviços que eram assegurados pelo A. e colegas de trabalho no nome e no interesse da 2ª Ré são agora assegurados por um vigilante que já aí trabalhava por conta da 2ª ré e por outros três vigilantes em nome e no interesse da 1ª Ré” (redação alterada pelo Tribunal da Relação).


De Direito


O facto de um prestador de serviços – no caso dos autos, serviços de segurança de instalações – perder um cliente em favor de um outro prestador de serviços não significa, em si mesmo, que haja transmissão de uma entidade económica que mantenha a sua identidade, na aceção da Diretiva n.º 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001. Com efeito, a mera prossecução da atividade não se identifica com tal transmissão.


Por outro lado, para realizar tal serviço o anterior prestador tinha um conjunto organizado de fatores de produção afeto a essa tarefa, que se realiza nas instalações do cliente. Esse conjunto organizado de fatores de produção é uma entidade económica e a sua existência enquanto tal não é prejudicada pela existência de requisitos legais específicos para a atividade de segurança privada. Com efeito, o que interessa é a existência em termos de gestão de uma organização de fatores que pode ser “apropriada” pelo novo prestador e o que está em causa nestes casos é a eventual transmissão de uma entidade de uma empresa de segurança para outra empresa de segurança, a qual também tem que reunir os mesmos requisitos legais para o exercício da atividade.


No recente Acórdão de 16 de fevereiro de 2023 o TJ veio reafirmar que a atividade de segurança de instalações repousa essencialmente sobre a mão-de-obra. Manteve, assim, a dicotomia que já reiteradamente afirmou entre as atividades que repousam essencialmente sobre a mão-de-obra e aqueloutras em que não se pode afirmar o mesmo e em que o equipamento, por exemplo, representa o fator de produção essencial (e o investimento essencial para a empresa). Nas atividades que assentam essencialmente na mão de obra, um conjunto estável de trabalhadores afetos duradouramente a uma tarefa pode representar uma entidade económica. E muito embora também aqui haja que recorrer ao método indiciário (n.º 49 do Acórdão), assume grande relevo a questão de saber se se manteve ou não a maioria ou o essencial dos efetivos. O peso relativo dos indícios, como destaca o Tribunal, varia necessariamente em função da atividade exercida e dos métodos de produção e de exploração. Nestes casos em que, repete-se, a atividade repousa essencialmente sobre a mão-de-obra a identidade da entidade económica não se mantém – e não há transmissão – quando o novo prestador de serviços não retoma o essencial dos efetivos, em termos de número e de competências (n.º 53 do Acórdão C-675/21).


Resulta dos factos dados como provados que apenas um dos quatro dos trabalhadores afetados pelo primeiro prestador de serviços àquela atividade transitou para o segundo prestador de serviços (factos 48 e 88) e que não houve qualquer transmissão de know-how (facto 47). Face aos critérios definidos pelo TJ há, assim, que concluir pela inexistência de qualquer transmissão de entidade económica.


Decisão: Negada a revista


Custas pela Recorrente


8 de março de 2023


Júlio Gomes (Relator)


Ramalho Pinto


Domingos Morais