VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
INDEMNIZAÇÃO OFICIOSA
VENCIMENTO
RECORRIBILIDADE
Sumário

I–Tratando-se de indemnização arbitrada a pedido do Ministério Público nos termos dos artigos 21°, n°1 e n° 2 da Lei n°112/2009, de 16.9, e 82°-A do Código de Processo Penal, e não na sequência de pedido de indemnização civil formulado pela ofendida , mostra-se aplicável o disposto no nº 2 , do artigo 400º , do C.P.P. .

II–Deste modo a admissibilidade do recurso depende do valor arbitrado pelo tribunal a quo , que não pode ser inferior a metade da alçada do tribunal de 1ª instância , sendo neste caso a decisão objecto do mesmo irrecorrível .

Texto Integral

DECISÃO SUMÁRIA

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Por sentença proferida no âmbito de processo comum com intervenção do tribunal singular nº 743/21.5SXLSB foi o  arguido A condenado  como autor material de um crime de violência doméstica, como reincidente, previsto e punido pelos artigos 75°, n° 1 e n° 2 e 76°, n°1 e 152°, n°1, al. b), n°2, al. a), n°4 e n°5, todos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, nas penas acessórias de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica a cumprir no prazo máximo fixado para a pena de prisão e na pena acessória de proibição de contactos com B, seja por que meio for, proibindo-o de dela se aproximar a menos de 500 metros, por 3 (três) anos e 6 (seis) meses incluindo o local de trabalho e a sua residência, nos termos do artigo 152°, n°4 e n°5 do Código Penal e ainda no pagamento à ofendida B da quantia de €1.500,00 (mil quinhentos euros) a título de indemnização nos termos dos artigos 21°, n°1 e n° 2 da Lei n°112/2009, de 16.09, e 82°-A do Código de Processo Penal.

Não se conformando com esta decisão o arguido A veio interpor recurso desta decisão na parte em que o condenou no pagamento à ofendida B da quantia de 1.500,00 euros (mil e quinhentos euros) a título de indemnização nos termos dos artigos 21º, n. º1 e 2 da Lei 112/2009, de 16 de setembro e 82º- A do Código de de Processo Penal, apresentando as seguintes conclusões, que se transcrevem na íntegra :

1- O arguido foi condenado no pagamento à ofendida B da quantia de 1.500,00 euros (mil e quinhentos euros) a título de indeminização nos termos dos artigos 21º, n. º1 e 2 da Lei 112/2009, de 16 de setembro e 82º- A do Código de processo Civil.
2- O pagamento da indemnização baseia-se nos termos do disposto do artigo 129º do código penal, em conjugação com o disposto nos artigos 483º, nº1, 496, nº1 e 562 e seguintes, todos do Código Civil.
3- O arguido foi sujeito à medida de coação de prisão preventiva a 27.01.2022(fls 214 a 228). Encontrando-se ainda preso.
4- O arguido não tem condições económicas, não aufere rendimento para além dos valores recebidos na prisão e não tem qualquer tipo de bem em seu nome.
5- O recorrente entende e propugna que a pena concretamente aplicada no que concerne ao pagamento de indeminização foi demasiado severa, tendo em conta as condições socioeconómicas do Arguido.
6- O agregado familiar não consegue oferecer qualquer apoio no pagamento da indemnização.
7- Atendendo às condições socioeconómicas do ora requerente, ademais provadas em audiência de julgamento, o arguido não consegue pagar qualquer quantia indemnizatória.

Termos em que requer que seja concedido provimento ao presente recurso, sendo a sentença referente ao pagamento da indeminização revogada, com as legais consequências, assim se fazendo Justiça.

“Dispõe o artigo 400º , nº 2 , do C.P.P. , que o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior em metade desta alçada.

Tratando-se no caso em análise de indemnização arbitrada a pedido do Ministério Público nos termos dos artigos 21°, n°1 e n° 2 da Lei n°112/2009, de 16.9, e 82°-A do Código de Processo Penal, e não na sequência de pedido de indemnização civil formulado pela ofendida , coloca-se a questão de saber se o disposto no nº 2, do artigo 400º, do C.P.P., lhe é aplicável .

A resposta é forçosamente afirmativa dado que nem o artigo 21 °  da Lei n°112/2009, de 16.9, nem o artigo 82°-A do Código de Processo Penal , alteram a natureza desse instituto , indemnização civil com fundamento  na prática de facto ilícito criminal, ou sequer restringem a aplicabilidade da previsão do nº 2, do artigo 400º, do C.P.P. nesses casos.

Conforme decidido pelo Acórdão da Relação de Évora de 10.4.2018, “sendo o regime de definição de admissibilidade do recurso assente na natureza do objecto de recurso – obrigação de indemnização quantificável – e não na característica processual, necessariamente secundária, da forma de arbitramento (assente no dispositivo das partes ou oficiosa), haverá que interpretar aquele nº 2 do artigo 400º do C.P.P. de forma adaptada à oficiosidade limitada imposta pela nova realidade criminológica “ , “desta forma, utilizando apenas o segundo critério por impossibilidade de uso do primeiro – o quantum desfavorável”. ( rel. Gomes de Sousa , disponível em www.dgsi.pt).

Concorda-se assim com o entendimento subscrito  pelo Acórdão da Relação de Évora de 10.4.2018 acima citado, que “no caso de recurso de indemnização arbitrada oficiosamente ao abrigo do disposto no artigo 82°-A do C.P.P. e artigo 21°  da Lei n°112/2009, de 16 de Setembro, a primeira regra da dupla secumbência não é não é aplicável por ausência de pedido cível, estando essa admissibilidade do recurso dependente do montante arbitrado “. ( no mesmo sentido ver Acórdão da Relação do Porto de 14.9.2016, rel. Ernesto Nascimento, disponível em www.dgsi.pt)

Ora considerando que foi arbitrada uma  indemnização civil de 1500,00 euros, inferior a metade da alçada do tribunal de 1ª instância, o presente recurso não é admissível face ao disposto pelo artigo 400º, nº2, do C.P.P. por a decisão objecto do mesmo ser irrecorrível .

Estatui o  artigo 420º nº1 do C.P.P. que o recurso é rejeitado sempre que se verifique causa que devia ter determinado a sua não admissão nos termos do artigo  414º, nº2, do C.P.P., designadamente quando a decisão em causa for  irrecorrível.

Em face do exposto, e nos  termos preconizados pelos artigos 400º , nº 2 , 414º, nº 2, e 420º, nº 1 , b ), do C.P.P., rejeita-se o presente recurso .
Custas pelo Recorrente, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.


L.,16.3.2023

Maria Carlos Duarte do Vale Calheiros