RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
INTERMEDIÁRIO
BANCO
DEVER DE INFORMAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
INCUMPRIMENTO
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
ÓNUS DA PROVA
DANO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
APLICAÇÃO FINANCEIRA
VALORES MOBILIÁRIOS
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
Sumário


I - Se funcionário do réu, que propôs ao autor que aplicasse a quantia de €50 000,00 em “Obrigações SLN 2006”, lhe disse que tal aplicação era como se fosse um depósito a prazo, sem qualquer risco, e que o BPN garantia o reembolso do capital ao fim de dez anos, porquanto a sociedade “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A” era a “dona do BPN” prestou, nesse caso, uma informação que não era verdadeira, susceptível de influenciar a decisão do autor (art. 7.º, n.º 1, do CVM).
II - Se a Relação não apreciou a questão do nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro e o dano do não reembolso do capital investido, não pode o STJ apreciar a questão do referido nexo de causalidade, por se tratar de uma questão nova, que não foi apreciada no acórdão recorrido.

Texto Integral



Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça:


*


Os Autores AA e mulher BB, com domicílio na Rua ..., ..., intentaram a vertente acção em processo comum contra o BANCO BIC PORTUGUÊS S.A., NIPC ..., com sede na Avenida ..., ..., peticionando ser o Réu BANCO BIC condenado a restituir aos Autores a quantia de 50.000,00€ (cinquenta mil euros), acrescida dos juros remuneratórios convencionados e ainda os juros moratórios vencidos sobre o capital, desde 9 de maio de 2016 até efectivo e integral pagamento.

Alegam, sinteticamente, que:

-Em data que não pode precisar, quando o Réu BANCO BIC ainda girava sob a denominação social de “BPN - BANCO PORTUGUES DE NEGOCIOS, S.A.”, o Autor AA dirigiu-se à agência de ... de tal banco, no qual já tinha conta bancária, sita na Rua ..., ..., pois pretendia então aplicar a quantia de €50.000,00 num depósito a prazo;

- Em Abril de 2006, CC, um dos trabalhadores por conta de outrem do Réu BANCO BIC e seu gestor de conta à época, propôs ao Autor AA que aplicasse a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros) em “Obrigações SLN 2006”, garantindo ao Autor AA que estava em causa uma aplicação muito segura, sem qualquer perigo ou risco e que lhe garantia o reembolso do capital;

- Mais lhe tendo sido asseverado que o reembolso do capital investido lhe seria garantido pelo próprio BPN, porquanto a sociedade “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A” era a “dona do BPN”, ao fim de dez anos, com uma excelente taxa de juro durante todo esse período;

- Confiando que nenhum risco adviria da subscrição daquela aplicação, o Autor AA anuiu em assinar o respectivo boletim de subscrição;

- Desde aquela subscrição, em 10 de Abril de 2006 e até maio de 2015, o Autor AA foi recebendo semestralmente as quantias referentes aos juros, que rondavam cerca de €300,00 (trezentos) a €400,00 (quatrocentos) euros, confiando legitimamente que, em 09 de maio de 2016, no termo do prazo convencionado, lhe seria reembolsado o capital investido;

- Em finais do mês de agosto de 2015, o Autor AA foi surpreendido com uma comunicação escrita, endereçada por DD, na qualidade de representante comum dos obrigacionistas “SLN Rendimento Mais 2004”, onde o signatário lhe dava conta de que a sociedade “GALILEI, SGPS, S.A.” tinha apresentado um Processo Especial de Revitalização;

- O Autor AA recebeu uma outra comunicação escrita, datada de 03 de Setembro de 2015, esta endereçada pela própria sociedade “GALILEI, SGPS, S.A.”, onde afirmava que havia instaurado um Processo Especial de Revitalização, convidando-o a encetar negociações no âmbito de tal processo com vista à aprovação de um Plano de Recuperação;

- Foi então que o Autor AA resolveu dirigir-se à agência de ... e informar-se junto do seu actual gestor de conta, EE, sobre o que se estaria a passar, descobrindo então o autor que aplicação financeira que lhe asseguraram não representar qualquer perigo se tratava, afinal, de uma aplicação de risco, sem qualquer garantia de reembolso do capital investido;

- Na pendência desse processo, os Autores já não receberam os juros semestrais vencidos nos meses de Outubro de 2015 e Abril de 2016;

- Em 09 de maio de 2016, o Réu BANCO BIC não procedeu, como se lhe impunha, ao reembolso do montante do capital e juros devidos - situação que se mantém até à presente data.

O Réu BANCO BIC PORTUGUÊS S.A. aduziu contestação, arguindo as excepções de incompetência territorial e de prescrição, e impugnando as alegações do Autor com referência ao não conhecimento das condições da obrigação subscrita.

Concluiu, propugnando a procedência da excepção de incompetência territorial e a improcedência da acção.

Exarou-se o despacho saneador, o qual julgou improcedente a excepção de incompetência territorial, bem como o despacho que identificou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.

 Efectivou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença onde se decidiu:

“A) Condenar o Réu BANCO BIC PORTUGUÊS S.A. a pagar aos Autores AA e mulher BB a quantia de 50.000,00€ (cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora à taxa aplicável às obrigações civis, computados desde a citação integral pagamento;

B) Absolver o Réu BANCO BIC PORTUGUÊS S.A. do demais peticionado;

C) Condenar o Réu BANCO BIC PORTUGUÊS S.A. no pagamento das custas processuais.”

Inconformado com tal sentença dela recorreu o R. apelou mas sem êxito.

Não se conformou de novo o R. que interpôs recurso de revista formulando as seguintes conclusões:

“1. O douto acórdão da Relação de Coimbra violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º , 290º n9 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e (…)19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 7989 e ss. do C.C.

2. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido, similar a um depósito a prazo, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, configura a prestação de uma informação falsa.

3. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

4. Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveria ter sido informado ao A., sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verificado incumprimento do reembolso...

5. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

6. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado RISCO GERAL DE INCUMPRIMENTO!

7. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos!

8. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2014, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2004, dez anos antes!          

9. A SLN era Titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

10. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

11. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco!

12. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

13. O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente!

14. A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

15. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.

16.  A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer Ipo de aplicação…

17. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto - corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!

18. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses - www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

19. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!

20. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo sua obrigação assegurar-se de que o cliente compreendeu a afirmação.

21. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.

22. A comercialização por intermediário financeiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.

23. O dever de informação ao cliente, não se trata de um direito absoluto do cliente à prestação de informações exactas, mas apenas de um dever de esforço sério de recolha de informações o mais fiáveis possível pelo banco.

24. O grau de exactidão em relação às informações será variável, consoante o tipo de informação em causa.

25. No caso dos presentes autos, ficou demonstrado, e foi assumido pelo Autor, que era do seu interesse e vontade investir em produtos de com boa rentabilidade e de elevada segurança.

26 Apesar do autor não ser investidor com especiais conhecimentos técnicos na área financeira o risco do produto em causa nos presentes autos era, pelas razões já várias vezes repetidas, baixo uma vez que nada fazia antever qualquer dificuldade futura do emitente.

27. Assim, não pode o Banco Recorrente senão concluir que foram salvaguardados os legítimos interesses do cliente.

28. Resultou demonstrado que os funcionários, mais concretamente o funcionário que o colocou, sempre acreditaram - até praticamente ao momento do incumprimento - que se tratava de produto seguro e se preocupavam com os interesses dos clientes.

29. Dispunha sobre esta matéria o Artigo 304º do CVM no sentido de que os intermediários financeiros estão obrigados a orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, devendo conformar a sua actividade aos ditames da boa-fé, agindo de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.

30. E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º nº 1 alínea a) do CdVM, que obriga então o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”.

31. Tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução.

32. Tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si!

33. A informação quanto ao risco dos instrumentos financeiros propriamente dito apenas veio a ser exigida prestar aos intermediários financeiros com o D.L. 357-A/2007 de 31/10, que aditou o art. 312º-E nº 1, passando a obrigar o intermediário financeiro a informar o cliente sobre os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa.

34 O legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do Ipo do instrumento financeiro em causa nas quatro alíneas do nº 2 do art. 312º-E.

35. São ESTES e APENAS ESTES os riscos do Ipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação, mesmo na actual redacção do CdVM.

36. A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do Investimento está afirmada em função das características do investimento.

37. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.

38. O Investimento em causa foi feito em Obrigações não estando sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do Investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título (de “capital garantido”), acrescido da respectiva rentabilidade.

39. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso, pois que nunca resultaria do mecanismo interno do instrumento em causa!

40. A informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do Ipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ SE tais riscos de facto existirem!

41. Em lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na actividade de intermediação financeira de recepção e transmissão de ordens.

42. E também em lado nenhum da lei resulta a obrigação de prevenir o investidor acerca das hipóteses de incumprimento das obrigações assumidas pelo emitente do instrumento financeiro ou até da probabilidade de insolvência do mesmo!

43. Esse hipotético incumprimento tem que ver com as qualidades ou circunstâncias do emitente (ou obrigado) do instrumento financeiro e não com o tipo do instrumento financeiro, conforme referido no art. 312º-E nº 1 do CdVM, que é expressão que aponta claramente para uma objectivização do risco em função do próprio instrumento de Investimento e não para uma subjectivação em função do emitente!

44. O artigo 312º, alínea e) do CdVM refere-se apenas aos riscos da actividade dos serviços de intermediação financeira. Os deveres de transparência, lealdade e defesa dos interesses do investidor que sobre o intermediário financeiro impendem, obrigam apenas à informação sobre os riscos endógenos ao mecanismo de funcionamento do concreto instrumento financeiro, não abrangendo o risco geral de incumprimento das obrigações. Neste sentido não estava o intermediário financeiro obrigado a informar especificamente sobre o risco de insolvência da entidade emitente de determinado produto.

45. Do elenco de factos provados não resultam factos provados suficientes que permitam estabelecer uma ligação entre a qualidade (ou falta dela) da informação fornecida ao A. e o acto de subscrição. 

46. A nossa lei consagra essa perfeita autonomia de cada um dos pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, apresentando-os e regulando-os de forma perfeitamente estanque.

47. No que toca à causalidade não conseguimos sequer vislumbrar como passar da presunção de culpa – juízo de censura ético-jurídico sobre o agente do ilícito, e expressamente prevista na lei – à causalidade – nexo factual de associação de causa-efeito, como se de uma inevitabilidade se tratasse!

48. Do texto do art. 799º nº 1 do C.C. não resulta qualquer presunção de causalidade.

49. E, de resto, nos termos do disposto no artº 344º do Código Civil, a inversão de ónus depende de presunção, ou outra previsão, expressa da lei!

50. Se em abstracto, e de jure condendo até se pode, porventura e em tese, perceber esta interpretação para uma obrigação principal de um contrato – tendo por critério o interesse contratual positivo do credor -, não se justifica já quando estão em causa prestações acessórias do mesmo contrato.

51. Analisado o fim principal pretendido pelo contrato aqui em apreço – contrato de execução da actividade de intermediação financeira, de recepção e transmissão de ordens por conta de outrem -, parece-nos evidente que o mesmo se circunscreve à recepção e retransmissão de ordens de clientes – no caso o A. É este o único conteúdo típico e essencial do contrato e que é, portanto, susceptível de o caracterizar.

52. Não é por um dever de prestar ser mais ou menos relevante para qualquer parte, ou até para o comércio jurídico em geral, que será quantificável como prestação principal ou prestação acessória de um contrato. Releva outrossim se o papel de uma tal prestação na economia do contrato se revela como o núcleo típico ou não do acordo contratual entre as partes.

53. A única prestação principal neste contrato será a de recepção e transmissão de ordens do cliente.

54. Sendo uma obrigação acessória, a prestação de informação não estaria nunca, nem no entender do Prof. Menezes Cordeiro, ao abrigo da proclamada presunção de causalidade.

55. Estamos perante uma situação em que e configuram dois contratos distintos e autónomos entre si: por um lado, (i) um contrato de execução de intermediação financeira, e por outro, (ii) a contratação de um empréstimo obrigacionista do cliente a entidade terceira ao primeiro contrato!

56. Neste caso, estaremos perante uma falta de resultado no âmbito da emissão obrigacionista e não do contrato de execução de intermediação financeira.

57. O contrato de intermediação financeira foi já cumprido no acto de subscrição, tendo-se esgotado nesse momento.

58. É esta uma óbvia dificuldade: como pode a falta do resultado normativamente prefigurado de um contrato desencadear uma presunção de ilicitude, culpa e causalidade no âmbito de um outro contrato?

59. O juízo de verificação de causalidade mecânica, aritmética ou hipotética tem inevitavelmente de se fundar em factos concretos que permitam avaliar da referida probabilidade, e não apenas em juízos abstratos ou meras impressões do julgador!

60. A causalidade resume-se a uma avaliação de um dano hipotético apenas em casos em que esse dano não seja efectivo, como é o caso do citado dano da perda da chance! Em todos os restantes casos, o juízo deverá ser feito, não numa perspectiva probabilidade, mas sim de adequação entre uma causa e um efeito.

61. No âmbito da responsabilidade contratual, presumindo-se a culpa, caberá a quem alega o direito demonstrar a ilicitude, o nexo causal e o dano, que em caso algum se presumem!

62. O nexo causal sujeito a prova será necessariamente entre um concreto ilícito - uma concreta omissão ou falta de explicação de uma determinada informação - e um concreto dano (que não hipotético)!

63.  Não basta afirmar-se genericamente que eles não foram informados do risco de insolvência ou da falta de liquidez das obrigações e que é essa causa do seu dano!

64.  Num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou.

65. Num segundo momento é necessário provar que aquele concreto negócio produziu um dano.

66.  E, num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objectiva ao tempo da lesão.

67.  E nada disto foi feito!

68. A origem do dano do A. reside na incapacidade da SLN em solver as suas obrigações, circunstância a que o Banco é alheio!

Termos em que se conclui pela admissão do presente recurso, e sua procedência, e, por via dele, pela revogação da douta decisão recorrida e sua substituição por outra que absolva o Banco-R. do pedido, assim se fazendo… ... JUSTIÇA!”

Os autores contra-alegaram pugnando pela improcedência do recurso.

Cumpre decidir.

Estão provados os seguintes factos:

“1. O Autor AA é um cidadão de nacionalidade portuguesa residente na aldeia de ..., União das Freguesias ... e ..., concelho ..., que se dedica, por conta própria, à actividade da panificação, tendo apenas logrado completar a antiga 4a (quarta) classe de escolaridade.

2. O Réu BANCO BIC, por sua vez, é uma instituição bancária, com sede na Avenida ..., ... ..., com o número único de matrícula e identificação de pessoa colectiva (NUMIPC) ..., com o capital social de 410.429.800,00€.

3. O Autor era cliente do BPN, agência de ..., com a conta à ordem n.o ...11, onde depositava e movimentava dinheiro, constitua poupanças e efectuava pagamentos.

4. Em Abril de 2006, CC, um dos trabalhadores da agência de ..., do Réu BANCO BIC, e gestor de conta do Autor, declarou propor ao mesmo que aplicasse a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros) em “Obrigações SLN 2006”.

5. No circunstancialismo referenciado em 4), o mencionado funcionário do Réu disse ao Autor que a antedita aplicação era como se fosse um depósito a prazo, sem qualquer risco, e que o BPN garantia o reembolso do capital ao fim de dez anos, porquanto a sociedade “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A” era a “dona do BPN”.

6. Os trabalhadores da agência de ..., incluindo o sobredito gestor de conta do Autor, sabiam que o mesmo pretendia investir o seu dinheiro numa aplicação segura e sabiam também que a aplicação que lhe propuseram subscrever era uma aplicação de risco, sem garantia de capital investido.

7. Em decorrência do enunciado em 4) e 5), em 10 de Abril de 2006, na agência do BPN sita em ..., o Autor subscreveu um “boletim de subscrição” de 1 (uma) obrigação no valor nominal de €50.000,00 (cinquenta mil euros), com a designação SLN 2006, que se encontra depositada em seu nome no Banco BIC Português, S.A..

8. O boletim de subscrição referenciado em 7) consigna, designadamente, que:

a) O prazo de emissão é de 10 anos, sendo o reembolso do capital efectuado em 9 de Maio de 2016;

b) Juros pagos semestral e postecipadamente às seguintes taxas: 1o (primeiro) semestre à taxa nominal bruta 4,5%, a que correspondia uma Taxa Anual Efetiva e Líquida de 3,632%); 9 (nove) cupões seguintes à taxa Euribor 6 meses acrescida de 1,15%; Restantes semestres à taxa Euribor 6 meses acrescida de 1,50%.

9. No circunstancialismo referenciado em 8), o Autor efectivou a predita subscrição com a convicção de que de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação com as características de um depósito a prazo.

10. No âmbito do procedimento de venda directa lançado para alienação da totalidade das ações representativas do capital social do BPN, o BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A. lançou uma proposta para a sua aquisição.

11. Em 20 de Dezembro de 2011, foi notificada à Autoridade da Concorrência a proposta de aquisição da totalidade das acções representativas da totalidade do capital social do BPN pelo BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A.

12. Em 20 de Março de 2012, foi celebrado entre o Estado Português e o BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A. o contrato de compra e venda do BPN.

13. Após, os membros do Conselho de Administração do BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A. e do BPN deliberaram fundir essas duas sociedades comerciais numa só entidade, mediante incorporação do BANCO BIC no BPN.

14. O Réu BANCO BIC resultou de uma operação societária de fusão, na modalidade de transferência global do património do sociedade incorporada BANCO BIC PORTUGUES, S.A., sociedade anónima, com sede na Rua ..., ... ..., matriculada na Conservatória do Registo Comercial ..., com o número único de matrícula e identificação de pessoa colectiva (NUMIPC) ..., com o capital social de €30.000,00 (trinta milhões de euros), para a sociedade incorporante BANCO PORTUGUES DE NEGÓCIOS, S.A, doravante abreviadamente designada por BPN, sociedade anónima, com sede na Avenida ..., ... ..., matriculada na Conservatória do Registo Comercial ..., com o número único de matrícula e identificação de pessoa colectiva (NUMIPC) ..., com o capital social de €380.000.000,00 (trezentos e oitenta milhões de euros).

15. Desde a subscrição indicada em 7) e até Maio de 2015, o Autor AA foi recebendo semestralmente as quantias referentes aos juros, que rondavam cerca de €300,00 (trezentos) a €400,00 (quatrocentos) euros.

16. Por sentença proferida em 29.6.2016 no âmbito do processo de insolvência n.o 23449/15...., que corre termos no Juízo de Comércio, do Tribunal Judicial da Comarca ..., transitada em julgado em 14.7.2016, foi declarada a insolvência da sociedade GALILEI, SGPS, S.A., que anteriormente se denominava SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS.

17. A SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS/ GALILEI, SGPS, S.A. não pagou ao Autor os 50.000,00€ (cinquenta mil euros) descritos em 7).

Deu-se como não provado o seguinte facto:

18. No circunstancialismo indicado em 7), o Autor foi informado que o reembolso antecipado da emissão só era possível por iniciativa da SLN -Sociedade Lusa de Negócios, S.A. a partir do 5o ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal., e foi informado de que a única forma do investidor liquidar este produto de forma unilateral seria transmitindo as suas obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso.”

Da ilicitude e da culpa:

O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 8/2022, publicado no DR I Série, nº 212, uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos:

“1- No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, n.º 1, 312.º n.º 1, alínea a), e 314.º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto -Lei n.º 357 -A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, n.º 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2 – Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” -  informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º 1, do CVM.

3 – O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4 – Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.”

Da ilicitude e da culpa.

Ficou provado que “o … funcionário do Réu disse ao Autor que a antedita aplicação era como se fosse um depósito a prazo, sem qualquer risco, e que o BPN garantia o reembolso do capital ao fim de dez anos, porquanto a sociedade “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A” era a “dona do BPN”.”

Relativamete à ilicitude da informação, tem interesse o seguinte trecho do AUJ:

“(…) se o intermediário financeiro equipara simplesmente a subscrição de obrigações subordinadas a um depósito a prazo, viola esse dever de informação, porquanto existem diferenças assinaláveis e muito significativas entre os dois produtos, que aqui resumidamente se apontam:

- As obrigações representam um direito de crédito sobre a entidade emitente (artigo 348.º do Código das Sociedades Comerciais), o que implica que é a entidade emitente que fica obrigada a restituir ao titular da obrigação (credor obrigacionista) quer o montante que lhe é mutuado quer os juros respetivos, quando convencionados, restituição que dependerá sempre da solidez financeira da entidade emitente. A subscrição de uma obrigação é um investimento e, através da sua aquisição, os investidores aplicam as suas poupanças visando uma remuneração do capital investido mais elevada, embora com mais riscos do que aqueles que resultariam de outras aplicações do capital, designadamente, através dos depósitos a prazo. As entidades emitentes colocam no mercado, pelo melhor preço que consigam obter, os valores mobiliários que emitem no intuito de conseguirem formas alternativas de financiamento da sua atividade sem os custos do recurso ao crédito bancário.

- Os depósitos a prazo são exigíveis no fim do prazo por que foram constituídos, podendo as instituições de crédito conceder aos seus depositantes, nas condições acordadas, a sua mobilização antecipada (artigo 1.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 430/91, de 2 de novembro).

Como se refere no acórdão de 5/12/2019, no contrato de depósito bancário, o Banco (depositário) tem a obrigação de restituir quantia idêntica à depositada, findo o prazo do depósito, acrescido de juros, caso hajam sido convencionados. No depósito bancário o valor depositado será sempre disponibilizado quando solicitado pelo cliente, não obstante a eventual perda dos frutos do depósito, mesmo nos casos de depósito a prazo não mobilizáveis antecipadamente. E quando os depósitos da instituição de crédito se tornam indisponíveis, o reembolso dos depósitos é garantido pelo Fundo de Garantia de Depósitos até ao valor global dos saldos em dinheiro de cada depositante, em conformidade com o limite estabelecido na lei.

- o Fundo de Garantia de Depósitos encontra -se regulado nos artigos 154.º e ss. Do Regime Geral das Instituições de Crédito. A garantia de depósitos foi regulada pela Diretiva n.º 94/19/CE, do Parlamento e do Conselho, de 30 de maio de 1994 e foi transposta para a ordem jurídica interna pelo Decreto-Lei n.º 246/95, de 14 de setembro.

- Assim, as informações não serão verdadeiras se se proceder a essa equiparação, porquanto as obrigações não são um produto equivalente aos depósitos a prazo e constituem um investimento com riscos superiores aos dos depósitos a prazo, não podendo o capital investido e respetivos juros serem levantados quando o cliente assim o desejar.

Retomando a linha de pensamento já afirmada, compete ao intermediário financeiro o dever de esclarecer sobre as reais características das obrigações e sobre os riscos que a operação envolve (mesmo sem olvidar que nos depósitos bancários também há o risco de insolvência da entidade depositária, mas esse risco sempre é atenuado pela existência do Fundo de garantia de devolução de depósitos, pelo menos, parcialmente).

Por outro lado, exige -se que o intermediário financeiro preste uma informação detalhada e verdadeira sobre o tipo de investimento que propõe ao investidor, designadamente, dando-lhe conta de a restituição, quer do montante investido, quer dos juros contratados depender sempre da solidez financeira da entidade emitente e que não há fundo de garantia nem mecanismos de proteção contra eventos imprevisíveis.

Isto significa que o intermediário financeiro deve informar o investidor que o risco de não retorno do capital investido corre por conta do cliente (investidor), não estando o Banco obrigado a restituir-lhe o valor investido nem a pagar-lhe os juros respetivos, com capitais próprios, tendo sempre em mente que para certo tipo de cliente (investidor) a garantia do reembolso do capital investido é essencial.

Deve, ainda, o intermediário financeiro informar o cliente que não poderá levantar o capital e respetivos juros quando assim entender, tornando claro o sentido do endosso como mecanismo de transmissão — desmobilização do investimento — do produto.

Não menos relevante: o intermediário financeiro deve informar o cliente (investidor) da sua relação com a sociedade emitente das obrigações, na medida em que possa estar em causa um potencial conflito de interesses.

Por outro lado, o intermediário financeiro deve esclarecer o cliente (investidor) no que consistem as “obrigações subordinadas”, isto é, informar que, em caso de insolvência do emitente, os obrigacionistas apenas serão reembolsados depois dos demais credores de dívida não subordinada.

Com tudo o que se referiu, não se pretende afirmar que, para prestar um melhor esclarecimento ao cliente (investidor) — atendendo ao seu nível de conhecimento —, o intermediário financeiro não possa socorrer -se de outras figuras ou produtos financeiros, comparando-os, desde que esclareça as respetivas diferenças.

Deste modo, é forçoso concluir que o intermediário financeiro que não informa o cliente (investidor não profissional) dos riscos do reembolso do capital investido, ou a sua perda significativa, sabendo que esse reembolso depende da solidez financeira do emitente das obrigações, bem como não esclarece o que sejam obrigações subordinadas, viola os seus deveres de informação (…).

Este comportamento do Réu, consubstanciado na prestação de um esclarecimento pouco rigoroso sobre o produto financeiro, induzindo o cliente (inexperiente e sem conhecimentos do mercado mobiliário e prudente na gestão do seu dinheiro) em erro uma vez que garantiu que se tratava de uma aplicação segura, equivalente a um depósito a prazo, deve ser censurado como culpa grave, não sendo, por esse motivo, aplicável o prazo de prescrição de dois anos previsto no artigo 324.º, n.º 2 do C.V.M. “

Assim, e como decorre do AUJ, ao equiparar a subscrição de obrigações a um depósito a prazo e ao informar que que o BPN garantia o reembolso do capital ao fim de dez anos, o Banco prestou, desde logo, informação não verdadeira e, por isso, ilícita. E também culposa (com culpa grave), nos termos conjugados do art. 799º, nº 1 do CC e do art. 324º, nº 2 do CVM.

Nexo de causalidade:

Insurge-se o recorrente contra a causalidade entre a violação do dever de informação e o dano do não reembolso do capital, argumentando que, num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou, que num segundo momento é necessário provar que aquele concreto negócio produziu um dano e que num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objectiva ao tempo da lesão,, o que nada foi feito.

Sobre o nexo de causalidade, o AUJ é claro: é ao investidor que cabe o ónus de provar o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano, sendo que para estabelecer o referido nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir. Ora, analisando a matéria de facto dada como provada, verifica-se que os autores não alegaram nem provaram o nexo de causalidade nos termos configurados pelo AUJ, isto é, não alegaram nem provaram que se tivessem sido devidamente informados sobre as características das obrigações não as teriam adquirido. Ou seja: o recurso teria de improceder, por inverificação do pressuposto do nexo de causalidade, se o Supremo pudesse dela conhecer, o que não se verifica.

Senão vejamos.

Do recurso de apelação constam as seguintes conclusões:

“(…)

XXVIII. A VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO NÃO IMPLICA QUALQUER PRESUNÇÃO DE ILICITUDE! E, portanto, tinham que ser os Autores a alegar e provar que concretas informações é que o Banco Réu deveria ter dado, que não deu! Não o tendo feito, tem a presente ação necessariamente que claudicar!

XXIX. Os Autores não alegaram nem provaram que se não fosse aquela putativa garantia de capital e juros, e a natureza subordinada das Obrigações, não teriam subscrito a obrigação SLN 2006!

XXX. Num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou. Num segundo momento é necessário provar que aquele negócio produziu um dano. E, num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objetiva ao tempo da lesão. E nada disto foi provado!

XXXI. Não podendo, por fim, o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra olvidar que a falta de reembolso ocorreu por efeito da insolvência da emitente e não por causa de qualquer deficiente informação ou atuação do intermediário financeiro.

XXXII. Não se verificando, assim, o nexo de causalidade adequada entre a atuação do Recorrente enquanto intermediário financeiro e, o não reembolso, na maturidade, do capital investido.”

Porém, a Relação abordou apenas as seguintes questões: a) a violação do dever de informação; b) a existência de prescrição; c) o valor em que o recorrente foi condenado ser manifestamente excessivo (por referência ao valor do dano).

Não abordou a questão do nexo de causalidade.

Como é sabido, “não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação “ (cfr. Acórdão do STJ de 7.7.2016, proc. 156/12.0TTCSC.L1.S1; v. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, págs. 87 e 88, Amâncio Ferreira, em Manual dos Recursos, 8ª edição, pág. 147 e Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 395).

Como assim, se a Relação não apreciou a questão do nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano do não reembolso do capital investido (e o R. não suscitou, no recurso de revista, a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia) não pode o Supremo apreciar agora a questão do referido nexo de causalidade, por se tratar de uma questão nova, que não foi apreciada no acórdão recorrido.

Sumário (art. 663º, nº7 do CPC):

“1. Se funcionário do Réu, que propôs ao Autor que aplicasse a quantia de €50.000,00 em “Obrigações SLN 2006”, lhe disse que tal aplicação era como se fosse um depósito a prazo, sem qualquer risco, e que o BPN garantia o reembolso do capital ao fim de dez anos, porquanto a sociedade “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A” era a “dona do BPN” prestou, nesse caso, uma informação que não era verdadeira, susceptível de influenciar a decisão do autor (art. 7º, nº 1 do CMV);

2. Se a Relação não apreciou a questão do nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro e o dano do não reembolso do capital investido, não pode o Supremo apreciar a questão do referido nexo de causalidade, por se tratar de uma questão nova, que não foi apreciada no acórdão recorrido.”

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.


*


Lisboa, 28 de Fevereiro de 2023


António Magalhães (Relator)

Jorge Dias

Jorge Arcanjo