RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
PERDA DA CAPACIDADE DE GANHO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
EQUIDADE
Sumário


Numa situação em que o lesado que tinha 47 anos aquando o acidente, é um trabalhador indiferenciado na agricultura que auferia o equivalente a um salário mínimo nacional, esteve 394 dias até à alta médica com incapacidade absoluta para o trabalho e permaneceu com uma afetação da integridade físico-psíquica de 45 pontos com uma incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo, como é o caso para o trabalho agrícola que o mesmo sempre executou, é justa e equitativa a indemnização por danos patrimoniais de € 180 000,00 por danos futuros.

Texto Integral


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


           

I. Relatório

1. AA propôs ação com processo comum contra Victória Seguros, S.A., pedindo:

“… reconhecendo-se e declarando-se que o acidente supra descrito se ficou a dever única e exclusivamente à culpa do condutor do veículo ligeiro de passageiros ..-..-CN, a condenada a pagar ao A.:

A) A quantia de 573.760,00€ …, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência do acidente;

B) Pagar juros legais contados desde a data de citação até integral pagamento; …”.

Alegou, em síntese, que: no dia, hora e local referidos nos autos, ocorreu um acidente de viação em que foi interveniente o veículo com a matrícula ..-..-CN, conduzido por BB, segurado na Ré, sendo que o condutor do veículo referido perdeu o controlo do mesmo e entrou em despiste;

nesse acidente, sendo transportado como passageiro, sofreu danos físicos com sequelas que lhe acarretaram prejuízos de ordem patrimonial e não patrimonial, sendo que é na quantificação desses danos que encontra o montante peticionado.

2. Citada, a Ré veio contestar no sentido de aceitar, no essencial, a versão do sinistro, bem como a responsabilidade pelo ressarcimento de prejuízos sofridos em consequência de tal acidente, impugnando, contudo, a matéria alegada relativa à extensão dos danos sofridos pelo Autor.

3. Na fase de condensação e saneamento fixou-se o objeto do litígio e selecionaram-se os temas da prova.

4. Realizada audiência final, foi proferida sentença, sendo o dispositivo do seguinte teor:

“1º Julgo parcialmente procedente o pedido formulado pelo autor AA contra a Victória Seguros, S.A. e, consequentemente, condeno a a pagar ao autor a quantia global de € 297 850,00 …, a título de ressarcimento pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência do acidente em discussão nos autos, quantia à qual deve ser descontado o valor de €4 100,00 que a adiantou ao autor, bem como as quantias que, entretanto, foram e vierem a ser pagas ao autor, pela ré, até ao trânsito em julgado da decisão, nos termos da transação celebrada e homologada nos autos de procedimento cautelar apensos.

Sobre a quantia devida acrescem juros, à taxa legal, a contar desde a citação da ré.

Absolvo a da parte restante do pedido. …”.

5. Inconformados com esta decisão, o Autor e a Ré interpuseram recurso de apelação.

6. O Tribunal da Relação de Guimarães veio a proferir o acórdão onde consta o seguinte dispositivo:

“Por todo o exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar ambos os recursos parcialmente procedentes e daí que no mais confirmando-se a sentença, condena-se a R a pagar ao A a quantia global de 227.980,00, a título de ressarcimento pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, quantia à qual deve ser descontado o valor de 4.100,00€.

Quanto ao recurso do recorrente as custas serão suportadas por ambas as partes na proporção de 9/10 e 1/10 e no que respeita ao recurso da recorrente as custas serão na proporção de 2/5 e 3/5.”

7. Novamente inconformado, o Autor veio interpor recurso de revista, recurso que foi admitido parcialmente pelo Relator, formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

1.ª A indemnização a fixar no âmbito de uma ação de responsabilidade civil visa colocar o lesado no estado em que se encontrava antes do facto que obriga à reparação (artigo 562º do Código Civil), sendo que, quando tal não seja possível, a indemnização em dinheiro atende ao prejuízo efectivamente sofrido, tendo como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.

2.ª - Como resulta do teor da petição inicial, o apelante pediu a condenação da R/Seguradora a pagar-lhe a quantia total de 577.860,00 € (quinhentos e setenta e sete mil e oitocentos e sessenta euros), discriminada da seguinte forma:

I - DANO BIOLÓGICO NA VERTENTE DE DANO PATRIMONIAL:

a) 11.820.00 € a título de perda dos 394 dias em que esteve com incapacidade temporária absoluta (394 dias x 30,00 € = 11.820,00 €), conforme resulta das conclusões do “RELATÓRIO DA PERÍCIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CÍVEL”;

b) 383.040,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente de perda de capacidade de ganho decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica de 45 pontos. As sequelas permanentes com que o recorrente ficou a padecer determinam-lhe uma incapacidade de 100% para a profissão de jornaleiro, bem como de qualquer outra dentro da área de preparação técnico-profissional do recorrente;

c) 108.000,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e que se consubstancia no trabalho não remunerado que o Recorrente executava no desempenho da casa, família e nas tarefas agrícolas para proveito próprio.

II – DANO BIOLÓGICO NA VERTENTE DE DANO NÃO PATRIMONIAL:

- 75.000,00 € a título de danos não patrimoniais;

3.ª No douto acórdão proferido acordaram os Srs. Desembargadores em conferência julgar parcialmente procedente o recurso de apelação do A. e da R, e, em consequência, alteraram os seguintes valores:

a) – De 7.850.00 € para 7.980,00 € o quantum indemnizatório relativo aos 394 dias em que esteve absolutamente incapaz para o exercício de qualquer atividade;

b) De 250.000,00 € para 180.000,00 € o quantum indemnizatório relativo aos danos futuros;

c) Em relação ao quantum indemnizatório relativo aos danos morais do lesado o d. acórdão manteve a indemnização fixada pela 1ª Instância no valor de 40.000,00 €;

4.ª O Apelante conforma-se com a decisão na parte em que imputa a responsabilidade exclusiva pela produção do acidente dos presentes autos ao condutor do veículo garantido pela R., bem como com a quantia de 720,00 € correspondente a 24 dias do mês de Outubro de 2018, dos 394 dias em que esteve absolutamente incapaz (ITA) para o exercício de qualquer atividade para além do dia do acidente.

5.ª Todavia, e quanto ao demais, não pode o A/recorrente conformar-se com o d. acórdão em reapreciação, porquanto, e ressalvando o máximo respeito por melhor entendimento, entende que andou mal o Tribunal a quo na decisão proferida a propósito do arbitramento da indemnização pelo dano biológico na vertente do dano patrimonial e não patrimonial e na fixação do respetivo quantum, por se afigurar sobejamente desadequado, por redutor e pouco razoável, face aos critérios legais e jurisprudenciais aplicáveis.

6. Relativamente às perdas salariais do período de ITA de 394 dias fixado nas “Conclusões” do “Relatório da Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil”, afigura-se-nos que o cálculo da indemnização a efetuar deve atender ao valor ilíquido da remuneração que o A/recorrente auferia, por jorna, na data do acidente, uma vez que o mesmo trabalhava à jorna e não ao mês.

7.ª Este não foi o critério seguido pelo d. acórdão em reapreciação, que mantendo os critérios redutores fixados pela 1ª Instância, calcula a indemnização da ITA a partir de 01/11/2018 até 05/11/2019, com base no ordenado mínimo aplicável ao período a que a ITA diz respeito e não com base no rendimento real do A/recorrente.

8.ª Apesar do d. acórdão em reapreciação ter corrigido o cálculo da ITA fixado pela 1ª Instância da quantia de 7.850,00 € para a quantia de 7.980,00 €, tal cálculo encontra-se erradamente efetuado, uma vez que seguindo os critérios defendidos no d. acórdão em reapreciação, o valor total pelos 394 dias de ITA correspondem à quantia de 8.079,33 €, em conformidade com o explanado no item I das presentes alegações e para onde se remete a sua leitura por uma questão de economia processual

9.ª Da factualidade dada como assente nos pontos de facto 66 a 69, resulta a prova que o A/recorrente, na altura do acidente, trabalhava todos os dias da semana e que, ao longo do ano trabalhava, habitualmente, de Segunda-Feira a Sábado, 6 dias por semana e que auferia 30,00 € por jorna.

10.ª De realçar que o valor calculado e pedido pelo A/recorrente corresponde ao valor real que o mesmo auferia à data do acidente, sendo que no valor de 30,00 €/jorna, não se encontram previstos os proporcionais dos subsídios de férias e de Natal, bem como o subsídio de alimentação.

11.ª Apesar disso, o d. acórdão em reapreciação, num raciocínio também ele redutor e pouco razoável, entendeu manter os critérios de fixação da indemnização por aquelas perdas salariais, não com base no rendimento real do A/recorrente, mas antes com base no Rendimento Mínimo Mensal Garantido e correspondente a cada período de tempo a que aquela incapacidade absoluta diz respeito, em manifesto e injustificado prejuízo indemnizatório do lesado.

12.ª A nossa doutrina e jurisprudência, quando o lesado não exerce qualquer atividade remunerada, tem vindo a determinar que para o apuramento do quantum indemnizatur há que partir de um vencimento superior ao salário mínimo, e que corresponda a um valor próximo do salário médio nacional - Cfr., neste sentido, ÁLVARO DIAS, Dano Corporal – Quadro epistemológico e aspectos ressarcitórios, 2001, pág. 297 e acórdãos do STJ de 3.06.2003 (processo nº 03A1270), de 18.12.2003 (03A3897), de 25.11.2009 (processo nº 397/03.0GEBNV.S1) e de 9.07.2014 (processo nº 686/05.0TBPNI.L1.S1), todos acessíveis em www.dgsi.pt.

13.ª De acordo com a informação colhida na base de dados “PORDATA”, o salário médio nacional no ano de 2018, altura em que ocorreu o acidente, cifrou-se no valor de 970,40 € (novecentos e setenta euros e quarenta cêntimos).

14.ª No mesmo sentido e com a finalidade de satisfazer as exigências do princípio da igualdade, o Ac. do TRP, de 19/03/2018, proc. nº 1500/14.0T2AVR.P1, consultável em www.dgsi.pt, defende que nos casos em que não há perda de capacidade de ganho, deverá usar-se, no cálculo do dano biológico, um valor de referência comum sob pena de violação do princípio da igualdade, defendendo-se que se tome por base um rendimento de 850,00 € x 14.

15.ª Pelo que a quantia de 11.820,00 € pedida pelo A/recorrente pelos 394 dias de ITA, em face do supra exposto não nos parece ser excessiva e, salvo o devido respeito por melhor entendimento, corresponde à indemnização que se nos apresenta como mais equitativa, razoável e ajustada à situação concreta.

16.ª Por outro lado, entendeu o d. acórdão em reapreciação alterar o quantum indemnizatório de 250.000,00 € arbitrado pela 1ª Instância para 180.000,00 € pelos danos patrimoniais futuros.

17.ª O A/recorrente discriminou de forma diferenciada na sua petição inicial o cálculo da indemnização pelos anos patrimoniais futuros, tendo requerido o seguinte pedido:

1) 383.040,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente de perda de capacidade de ganho decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica de 45 pontos. As sequelas permanentes com que o recorrente ficou a padecer determinam-lhe uma incapacidade de 100% para a profissão de jornaleiro, bem como de qualquer outra dentro da área de preparação técnico-profissional do recorrente;

2) 108.000,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e que se consubstancia no trabalho não remunerado que o Recorrente executava no desempenho da casa, família e nas tarefas agrícolas para proveito próprio.

18.ª Para a determinação da quantia de 180.000,00 € atribuído pela Relação de Guimarães, é enunciado no d. acórdão em reapreciação que aquele cálculo foi efetuado com base na Lei nº 98/2009, de 04/09, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.

19.ª Resulta, ainda, do teor do d. acórdão em reapreciação (Cfr. Pag. 26 do d. acórdão) o seguinte remate:

«Em conclusão não se pode falar no caso concreto de perda absoluta da capacidade de ganho»

20.ª E é com base nesta conclusão que o d. acórdão em reapreciação calcula a indemnização pelos danos futuros tendo como referência o regime de reparação dos acidentes de trabalho, tendo por base a redução de 70% da retribuição auferida pelo A/recorrente e ainda tendo por base o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 45 pontos.

21.ª O d. acórdão em reapreciação não teve em conta o determinado no “RELATÓRIO DA PERICIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL” quando lá é expressamente firmado que desvalorização de 45 pontos corresponde a uma incapacidade total (100%) para a profissão de jornaleiro que o A/recorrente sempre exerceu, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional.

22.ª Como resulta do seu petitório inicial, o evento danoso em que o A/recorrente fundou o seu pedido indemnizatório consiste num acidente de viação que não concorre com um acidente de trabalho.

23.ª Por outro lado e no modesto entendimento do recorrente, a responsabilidade da entidade empregadora por acidente de trabalho e a responsabilidade civil aquiliana geral obedecem a lógicas diferentes, procuram uma tutela diversa e regem-se por regras perfeitamente distintas.

24.ª Contrariando o propugnado no d. acórdão em reapreciação, o Ac. STJ de 09/11/2017, Proc. 2035/11.9TJVNF.G1.S1 (Cons. Maria da Graça Trigo), consultável em www.dgsi.pt, refere que não deve acolher-se, neste tipo de casos, «como critério-base para o cálculo do montante indemnizatório uma das tradicionais fórmulas financeiras criadas para a determinação dos danos patrimoniais resultantes da incapacidade (neste caso parcial) para o exercício da profissão habitual, adoptando a taxa de incapacidade laboral parcial de (…) com base na IGP (Incapacidade Geral Permanente) fixada em (…) pontos.»

25.ª Concluindo, ainda, o mesmo acórdão que:

«Este procedimento não pode ser aceite. Os índices de Incapacidade Geral Permanente não se confundem com índices de Incapacidade Profissional, correspondendo a duas tabelas distintas, aprovadas pelo Decreto-Lei nº 352/2007, de 23 de Outubro. Nas palavras do preâmbulo deste diploma legal, na incapacidade geral avalia-se “a incapacidade para os actos e gestos correntes do dia-a-dia”, a qual pode ter reflexos ao nível da incapacidade profissional, mas que com esta não se confunde (cfr. da autoria da relatora do presente acórdão, Adopção do conceito de dano biológico pelo direito português, in Revista da Ordem dos Advogados, ano 72, I, págs. 148-149).»

26.ª No caso dos autos e conforme resulta do “RELATÓRIO DA PERICIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL”, o dano em equação, traduzido naquela incapacidade apurada de 45 pontos, não é compatível com o exercício da atividade profissional do lesado, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional,

27.ª tratando-se, assim, de uma irreversível incapacidade que se constitui como total e permanente para o desempenho da sua profissão de jornaleiro e de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional.

28.ª Como vem sendo uniformemente reconhecido pela nossa jurisprudência, o valor estático alcançado através da automática aplicação das tabelas matemáticas - e que apenas permitirá alcançar um «minus» indemnizatório -terá de ser temperado através do recurso à equidade – que naturalmente desempenha um papel corrector e de adequação do montante indemnizatório às circunstâncias específicas e à justiça do caso concreto, permitindo ainda a ponderação de variantes dinâmicas que escapam, em absoluto, ao referido cálculo objectivo, tais como:

- O facto de todo o cálculo ser feito na base de que o trabalhador ficaria sempre a auferir aquele salário e que não teria progressão na carreira, ou seja, num completo congelamento da progressão profissional;

- Não se ter em consideração a contemplação da tendência, pelo menos a médio e longo prazo, quanto à melhoria das condições de vida do país e da sociedade e do próprio aumento de produtividade;

- Não se ter em consideração a tendência para o aumento da vida activa para se atingir a reforma nem o aumento da própria longevidade;

- Não se ter em conta o aumento do rendimento disponível e melhoria expectável das condições de vida;

- E o de não se contar com a inflação provável ao longo do período temporal a que se reporta o cômputo da indemnização;

29.ª Constitui, ainda, entendimento jurisprudencial reiterado que, no cálculo da indemnização por danos futuros, deve corresponder a um capital produtor do rendimento de que o lesado ficou privado e que se extinguirá no termo do período provável da sua vida, determinado com base na esperança média de vida (e não apenas em função da vida profissional ativa do lesado), quer porque, prejudicando a sua carreira contributiva, vem a reduzir, ou até a excluir, a pensão de reforma, quer porque sempre condicionará a possibilidade de obtenção de ganhos no exercício de actividades económicas alternativas a realizar para além da idade da reforma (Vide Acs. STJ, de 01.03.2018, proc. 773/07.0TBALR.E1.S1, de 08/05/2012, Proc. nº 3492/07.3TBVFR.P1; de 27/05/2021, Proc. nº10682/15.3T8LSB.L1.S1; TRG, de 28/06/2018, Proc. nº 2476/16.5T8BRG.G1; TRP, de 23/03/2015, Proc.  nº 1783/11.8TBPNF.P1 e de 23-10-2014, Proc. nº 148/12.9TBVLP.P1), todos consultáveis em www.dgsi.pt.

30.ª Segundo as “Tábuas de Mortalidade” relativas ao triénio 2018-2020, a esperança de vida à nascença em Portugal foi estimada em 78,07 anos para os homens e de 83,67 anos para as mulheres.

31.ª Reconhecendo-se que a esperança média de vida em Portugal do sexo masculino se encontra fixada nos 78 anos de idade, importa dizer que este iria continuar previsivelmente, por imposição legal, a contribuir para os encargos do seu agregado familiar, e a executar as tarefas domésticas e agrícolas para terceiros e para autoconsumo, previsivelmente, por mais 30 anos.

32.ª Como emerge do substrato factual apurado, à data do acidente, o recorrente trabalhava na agricultura – vindima – 7 dias por semana e auferia, por jorna, a quantia de 30,00 €, o que perfazia a quantia mensal de 900,00 € (30,00 € x 30 dias = 900,00 €), estando, assim, em causa a indemnização pelo que se vem denominando de dano biológico;

33.ª E, habitualmente, trabalhava de Segunda-Feira a Sábado, 6 dias por semana.

34.ª O que lhe proporcionava o rendimento real anual de 9.360,00 € (nove mil trezentos e sessenta euros) (30,00 €/jorna x 6 dias por semana =180,00 € x 52 semanas =9.360,00 €).

35.ª O d. acórdão aqui em crise, ao arrepio do que vem sendo determinado pela nossa doutrina e jurisprudência, desconsiderou as palavras expostas no preâmbulo do DL nº 352/2007, de 23/10, bem como a real retribuição do A/recorrente como jornaleiro à data do acidente e, de forma redutora e pouco razoável, quantificou a indemnização arbitrada com base numa fórmula de cálculo que apenas se aplica para os acidentes de trabalho e que não é aplicável ao caso sub judice.

36.ª Na sequência do que atrás se deixou dito, a nossa jurisprudência e a doutrina têm vindo a determinar que, quando estamos na presença de um lesado que não aufere qualquer vencimento, o que não é o presente caso, a indemnização deve ser calculada com base num vencimento superior ao ordenado mínimo e que corresponda a um valor próximo do salário médio nacional.

37.ª Em face do determinado no “RELATÓRIO DA PERICIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL” e na factualidade dada como assente, não oferece dúvida que a situação do A/recorrente, a quem foi atribuído uma desvalorização funcional permanente de 45 pontos, que equivale na prática a uma incapacidade total, na medida em que ficou impossibilitado de exercer o trabalho de jornaleiro, que sempre exerceu desde os 14 anos de idade, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, não tem formação profissional para o exercício de outra atividade, ficou a padecer de fortes limitações ao nível da sua mobilidade, o que, associado à idade actual (51 anos de idade), o seu grau de escolaridade/qualificações (2ª classe) e crescentes exigências do mercado laboral, torna praticamente impossível a obtenção de um trabalho estável e permanente, à semelhança daquele que possuía e que, não fora o acidente, manteria.

38.ª Destarte, sopesando o quadro factual apurado e ponderando a total perda de rendimentos e a significativa perda de capacidade, com a inerente restrição ao exercício de uma profissão alternativa por parte do A/recorrente, parece-nos mais justo e equilibrado - quer na vertente da justiça do caso, quer na ótica da justiça comparativa -, fixar em 383.040,00 € (trezentos e oitenta e três mil e quarenta euros), o montante destinado a reparar o dano patrimonial futuro na vertente da perda de capacidade de ganho decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica.

39.ª Para além da inaplicabilidade da fórmula de cálculo usada pelo d. acórdão em reapreciação em conformidade com o acima exposto, o veredicto aqui em crise omite ainda o cálculo do dano biológico resultante da perda de utilidade económica referente aos custos traduzidos na perda de produção referentes à perda potencial de produção fora do mercado e que se consubstancia no trabalho não remunerado que era desempenhado pelo A/recorrente, no âmbito da casa, família, da comunidade e tarefas agrícolas para autoconsumo.

40.ª Refere-nos o art. 564º, nº1 do CC que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.

41.ª De acordo com o disposto no nº 2, do art. 564º do CC, o dano ressarcível é também o dano futuro, desde que previsível, pelo que não é apenas o prejuízo causado a nível de repercussão de perda de rendimentos de trabalho, mas todos os outros danos.

Ou seja,

42.ª Resulta do disposto neste normativo que quando os lesados ficam privados de efetuar serviços ou tarefas que eles próprios efetuariam se não tivesse ocorrido o acidente, para passar a ter de os solicitar, gratificar ou pagar a terceiros, em termos futuros, tudo isto se traduz em perdas patrimoniais.

43.ª Embora de difícil estimação quanto à quantificação destes custos, a Universidade Autónoma de Lisboa e a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária apresentam o estudo “Custo Económico e Social dos Acidentes de Viação em Portugal” que tem como autores, ARLINDO ALEGRE DONÁRIO E RICARDO BORGES DOS SANTOS, publicado pela Editora Ediual, e que estima os custos traduzidos na perda de produção fora do mercado, em 30% do rendimento do trabalho no mercado.

44.ª Dadas as dificuldades inerentes à fixação da pretendida e devida indemnização, o A/recorrente estimou o trabalho não remunerado e que era desempenhado no âmbito da casa, da família e das tarefas agrícolas para autoconsumo, no valor de 300,00 €/mês, quantia esta que se enquadra dentro dos parâmetros de 30% dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e estimados no estudo acima exposto.

45.ª Destarte, e partindo da referência monetária de 300,00 €, no défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 45 pontos, mas que determinam uma incapacidade total (100%) para a profissão de jornaleiro que o recorrente sempre exerceu, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, e pelo período de 30 anos (até aos 78 anos), o valor da perda de produção nas tarefas desempenhadas pelo recorrente no âmbito da casa, família, comunidade e agrícolas para auto-consumo, afigura-se-nos ser equitativo a determinação da indemnização da quantia de 108.000,00 € (cento e oito mil euros), conforme peticionado no seu petitório inicial.

46.ª É ainda de realçar que as indemnizações peticionadas pelo A/recorrente têm ainda como justificação a jurisprudência professada no Acórdão do STJ, de 19.04.2018, Proc. nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 – Relator António Joaquim Piçarra) e consultável em www.dgsi.pt, quando lá é afirmado que: “o recebimento de uma só vez do montante indemnizatório não releva actualmente como em tempos não muito recuados já relevou, tendo em conta que a taxa de juro remuneratório dos depósitos pago pelas entidades bancárias é muito reduzido (cerca de 0,5%), o que implica, por si só, a elevação do capital necessário para garantir o mesmo nível de rendimento”.

47.ª Pelo que o montante de 180.000,00 €, fixado no d. acórdão em reapreciação a título de dano biológico, é, assim, insuficiente;

48.ª Pelo que e temperando o montante a arbitrar à luz das regras da equidade, afigura-se-nos que será mais justo e equilibrado a atribuição ao A/recorrente, como compensação a título dos dois danos biológicos na vertente de dano patrimonial futuro, a indemnização global de 491.040,00 € (quatrocentos e noventa e um mil e quarenta euros).

49.ª Discorda, ainda, o Recorrente em relação ao montante indemnizatório/compensatório que lhe foi atribuído, a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial;

50.ª O valor de 40.000,00 €, fixado pela d. acórdão em reapreciação, é insuficiente para ressarcir/compensar os danos a este título sofridos pelo A/recorrente, tendo em conta a gravidade das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes em conformidade com os factos dados como provados e acima descritos;

51.ª Como vem sendo reiteradamente proferido pela nossa jurisprudência, a indemnização por danos não patrimoniais deve ter um alcance significativo, e não meramente simbólico, abandonando-se, nestas matérias, montantes indemnizatórios miserabilistas.

52.ª Por outro lado, e quando se trata do arbitramento de uma indemnização a título de danos não patrimoniais, é impreterível conjugar o critério da equidade com o princípio da igualdade e da uniformização jurisprudencial, que visa evitar a discrepância entre os montantes indemnizatórios atribuídos pelos tribunais superiores.

53.ª O montante de 40.000,00 € arbitrado pelo Tribunal a quo a título de danos não patrimoniais afigura-se-nos como inadequado à luz dos princípios de equidade e de razoabilidade que devem pautar a aplicação da justiça, não se encontrando em sintonia com outras indemnizações que os tribunais superiores têm aplicado-

54.ª Pelo que, em face da jurisprudência seguida pelas instâncias superiores a este respeito, de entre outros, destacamos, por alguma similitude, os seguintes acórdãos, todos consultáveis em www.dgsi.pt:

- Ac. do STJ, de 09/07/2014, proc. nº 686/05.0TBPNI.L1.S1, que atribuiu uma indemnização de 200.000,00 € a título de danos não patrimoniais, a um lesado menor com uma IPP de 70%;

- Ac. do STJ, de 07/06/2011, proc. nº 524/07.9TCGMR.G1.S1, que atribui a indemnização de 250.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, a um lesado com uma IPP de 90%;

- Ac. do STJ, de 07/06/2011, proc. nº 3042/06.9TBPNF.P1.S1, que atribui a indemnização de 90.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, a um lesado com a IGP de 29,55%, com agravamento de 10% daqui a alguns anos;

- Ac. do STJ, de 07/10/2010, proc. 839/07.6TBPFR.P1.S1, que atribuiu a indemnização de 150.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, a um lesado, com a IPG de 80%;

- Ac. do STJ, de 30/06/2021, proc. nº 3133/08.1TBVCT.G1.S1, que atribui a indemnização de 60.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, a um lesado com um deficit funcional de 15 pontos;

- Ac. do STJ, de 29/04/2021, proc. nº 2648/18.8T8FNC.L1.S1, que atribui a indemnização de 60.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, a um lesado com um deficit funcional de 22 pontos;

55.ª Pelo que, ponderando o quadro factual acima exposto e dado como assente, em especial, as circunstâncias em que ocorreu o acidente (sem qualquer culpa do A/recorrente), a extrema gravidade das lesões sofridas por este, os dolorosos tratamentos a que foi sujeito, com destaque para a intervenção cirúrgica a que foi submetido, os períodos de clausura hospitalar e de tratamentos, as inúmeras deslocações que teve que realizar para consultas e tratamentos, a enorme incomodidade daí resultante, as graves e extensas sequelas anátomo-funcionais decorrentes do acidente, que se traduzem num deficit funcional permanente de elevado grau (45 pontos), correspondente a uma incapacidade total para o exercício da profissão de jornaleiro, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, a um dano estético de grau 4, numa escala de 1 a 7, a de ter uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 2 numa escala crescente de 7 graus, as intensas dores sofridas (de grau 5, numa escala de 1 a 7), o desgosto e amargura de, com 47 anos de idade, se ver fisicamente limitado e sem perspectivas futuras, em termos laborais, e, ainda, em face da jurisprudência segui da pelas instâncias superiores a este respeito e supra enunciada, o A/recorrente, ponderando os princípios de equidade e razoabilidade que devem pautar a aplicação da justiça, entende ser mais justo a atribuição do montante indemnizatório de 75.000,00 € (setenta e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais, conforme peticionado por si no seu petitório inicial.

56.ª Pelo que deverá o d. acórdão em reapreciação ser revogado e, consequentemente, deve ser determinado a condenação da R/recorrida na indemnização ao recorrente na quantia global de 577.860,00 € (quinhentos e setenta e sete mil e oitocentos e sessenta euros), em conformidade com o supra exposto por ser este o valor que mais se harmoniza com os critérios ou padrões duma jurisprudência mais equitativa, atualista e contemporânea.

57.ª Depois destas conclusões e de todo o seu alcance, é lícito afirmar que o Tribunal da Relação de Guimarães devia ter enquadrado juridicamente os factos como integrantes do direito que assiste ao A/recorrente e, consequentemente, ter condenado a recorrida em conformidade com o supra exposto.

58.ª Assim não se tendo entendido e decidido, não se fez a melhor e mais correta interpretação e aplicação ao caso sub judice das pertinentes disposições legais, nomeadamente, o disposto nos arts. 495º, 496º, 562, 564º e 566º, nºs 2 e 3 todos do Código civil.

E conclui: “deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se parcialmente o douto acórdão recorrido, substituindo-se por outro acórdão que condene a Recorrida em conformidade com o supra exposto”.

8. O Réu contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade parcial do recurso de revista e pela improcedência da parte restante.

9. Cumpre apreciar e decidir.

II. Delimitação do objeto do recurso

Como é jurisprudência sedimentada, e em conformidade com o disposto nos artigos 635º, nº 4, e 639º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, o objeto do recurso é delimitado em função das conclusões formuladas pelo recorrente, pelo que, dentro dos preditos parâmetros, da leitura das conclusões recursórias formuladas pelo A. / ora Recorrente decorre que o objeto do presente recurso está circunscrito à questão de saber qual Quantum indemnizatório relativo ao dano patrimonial futuro na vertente de dano biológico, dado que relativamente aos restantes pretensões do Recorrente o recurso não foi admitido por despacho do Relator, por se verificar a dupla conforme (quanto ao pedido indemnizatório dos danos respeitantes a salários por incapacidade temporária absoluta e danos não patrimoniais).

III. Fundamentação

1. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

1.1. No dia 07 de outubro de 2018, cerca das 17:10 horas, na Estrada ..., Km 9,650, em União de freguesias ..., ... e ..., concelho ..., distrito ..., ocorreu um acidente de viação.

1.2. Na altura estava bom tempo e o piso encontrava-se seco.

1.3. No local do acidente a via é uma estrada pavimentada de linha curva à esquerda atento o sentido de marcha do veículo de matrícula ..-..-CN, e de boa visibilidade.

1.4. Foi interveniente neste acidente o veículo ligeiro de passageiros, tipo misto, marca ..., modelo ..., com a matrícula ..-..-CN.

1.5. O veículo ligeiro de passageiros era conduzido por BB e é propriedade sua.

1.6. O aludido acidente de viação traduziu-se num despiste do veículo ligeiro de passageiros, nas circunstâncias seguintes:

1.7. O veículo ligeiro de passageiros “CN” circulava no sentido .../..., com destino à residência do sinistrado, AA, sita na freguesia ....

1.8. E após descrever uma curva para a sua esquerda, e sem que nada o fizesse prever, o condutor do veículo perdeu o controlo do mesmo e entrou em despiste, invadindo a berma do lado direito.

1.9. O condutor do veículo “CN” ao aperceber-se que não conseguia controlar a trajetória da viatura, ainda travou, mas a viatura seguiu em frente.

1.10. Partiu/arrancou um poste de granito de guarda e proteção rodoviária.

1.11. Tendo caído, depois, numa ribanceira.

1.12. Por via de tal despiste, o veículo automóvel “CN” capotou.

1.13. Tendo depois embatido numa árvore que o imobilizou.

1.14. No momento do acidente, o Autor fazia-se transportar como passageiro, no banco traseiro do veículo “CN”.

1.15. Atento o forte embate do veículo e face à gravidade das lesões sofridas pelo Autor, este ficou imobilizado no interior do veículo acidentado.

1.16. Tendo depois conseguido sair do mesmo pelos seus próprios meios, arrastando-se.

1.17. O Autor, logo após o acidente, foi assistido pelo INEM, onde recebeu os primeiros cuidados clínicos.

1.18. Porém e atento a gravidade das lesões do Autor, foi imediatamente transportado para o C..., EPE, onde permaneceu até ao dia 12/10/2018.

1.19. Naquele Hospital foram-lhe diagnosticadas as lesões e submetido aos tratamentos constantes no “RELATÓRIO MÉDICO” e a seguir sucintamente discriminados:

- Luxação do ombro esquerdo;

- Fratura do 5º e 6º arcos costais esquerdos.

- Pneumonia diagnosticada durante a permanência no SU.

1.20. O Autor esteve internado no C..., EPE, durante 5 dias.

1.21. Após a alta médica, em 12/10/2018, o Autor regressou a sua casa, iniciando um longo e desgastante período de regime ambulatório.

1.22. Dado que era fortemente acometido por frequentes dores nas regiões atingidas, em 23/10/2018, o Autor deslocou-se ao Centro de Saúde ..., a fim de ser consultado.

1.23. Em 07/11/2018, o Autor deslocou-se, novamente, ao Centro de Saúde ..., a fim de ser consultado.

1.24. Nessa consulta foi-lhe atribuída uma incapacidade de 30 dias para a sua atividade profissional, com início em 06/11/2018 até 05/12/2018.

1.25. Dado que o Autor continuava a ser frequentemente acometido de fortes dores nas regiões atingidas, o mesmo, por iniciativa da Ré/Seguradora, passou a ser acompanhado clinicamente pelos serviços clínicos de ortopedia indicados pela mesma.

1.26. Em 18/12/2018, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA”, sita na cidade ..., a fim de ser consultado para a avaliação de dano.

1.27. Nessa consulta foi-lhe determinado incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 18/12/2018, e marcado nova consulta para o dia 24/01/2019.

1.28. Em 20/12/2018, o Autor deslocou-se ao C..., EPE, a fim de ser consultado na especialidade de fisiatria.

1.29. Em 02/01/2019, o Autor deslocou-se, novamente, ao C..., EPE, Serviço de Imagiologia, a fim de realizar um exame “TC ARTICULAR”.

1.30. Tendo-lhe sido marcada nova consulta para o dia 14/01/2019.

1.31. Em 14/01/2019, o Autor deslocou-se ao C..., EPE, a fim de ser consultado na especialidade de ortopedia.

1.32. Em 24/01/2019, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado na especialidade de ortopedia.

1.33. Nessa consulta foi-lhe determinado uma incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 24/01/2019, e marcado nova consulta para o dia 31/01/2019.

1.34. Em 31/01/2019, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado, tendo-lhe sido determinado uma incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 24/01/2019, e marcado nova consulta para o dia 12/02/2019.

1.35. Em 12/02/2019, o Autor foi submetido a uma intervenção cirúrgica no Hospital ..., no ....

1.36. Em 21/02/2019, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado, tendo-lhe sido determinado uma incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 21/02/2019, e marcado nova consulta para o dia 07/03/2019.

1.37. Em 07/03/2019, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado, tendo-lhe sido determinado uma incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 07/03/2019, e marcado nova consulta para o dia 04/04/2019.

1.38. Em 04/04/2019, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado, tendo-lhe sido determinado uma incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 04/04/2019, e marcado nova consulta para o dia 02/05/2019.

1.39. Com a finalidade do Autor se reabilitar fisicamente, foram-lhe prescritas 17 sessões de tratamentos de medicina física e reabilitação na ..., em ..., durante os meses de abril e maio de 2019.

1.40. Em 02/05/2019, deslocou-se o Autor à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado, tendo-lhe sido determinado uma incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho, a partir de 02/05/2019, e marcado nova consulta para o dia 30/05/2019.

1.41. A partir de 09 de maio de 2019 até 25 de outubro de 2019, o Autor passou a fazer 120 sessões de tratamentos de medicina física e reabilitação no “Hospital – Clínica ...”, em ....

1.42. Em 30/05/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado.

1.43. Nessa consulta o médico determinou-lhe a prorrogação da incapacidade temporária absoluta, tendo-lhe marcado nova consulta para o dia 27/06/2019.

1.44. Em 27/06/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA”, sita na cidade ..., a fim de ser consultado.

1.45. Nessa consulta o médico determinou-lhe a prorrogação da incapacidade temporária absoluta, tendo-lhe marcado nova consulta para o dia 25/07/2019.

1.46. Em 25/07/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado.

1.47. Nessa consulta o médico determinou-lhe a prorrogação da incapacidade temporária absoluta, tendo-lhe marcado nova consulta para o dia 29/08/2019.

1.48. Em 29/08/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado.

1.49. Nessa consulta o médico determinou-lhe a prorrogação da incapacidade temporária absoluta, tendo-lhe marcado nova consulta para o dia 26/09/2019.

1.50. Em 26/09/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado.

1.51. Nessa consulta o médico determinou-lhe a prorrogação da incapacidade temporária absoluta, tendo-lhe marcado nova consulta para o dia 31/10/2019.

1.52. Em 31/10/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., a fim de ser consultado.

1.53. Nessa consulta o médico determinou-lhe a prorrogação da incapacidade temporária absoluta, tendo-lhe marcado nova consulta para o dia 05/11/2019.

1.54. Em 05/11/2019, o Autor deslocou-se à clínica “T..., SA, sita na cidade ..., para consulta de avaliação do dano.

1.55. Nessa consulta o médico considerou «a situação consolidada dado a fraca resposta ao programa de MFR», tendo procedido à elaboração do “Relatório final de avaliação de dano corporal em direito civil”.

1.56. Não obstante se ter sujeito a todas as consultas, tratamentos e cumprido todas as prescrições médicas, o Autor está e continuará afetado por limitações funcionais definitivas que muito o limitam para o exercício das atividades ao seu alcance e que habitualmente exercia.

1.57. Sendo elas o trabalho agrícola e as tarefas do seu quotidiano.

1.58. Como consequência direta e necessária do acidente, o Autor, devido às frequentes dores que sente no ombro esquerdo, tem mais dificuldade em poder executar trabalhos que impliquem um maior esforço físico, tais como, vestir-se e calçar-se e trabalhar com uma enxada.

1.59. Tais sequelas de que está afetado o Autor, constituem um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos.

1.60. Resulta ainda do teor do “Relatório final de avaliação de dano corporal em direito civil”, o seguinte:

- Lesão do plexo braquial esquerdo;

- Incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo.

1.61. E de que, por isso mesmo, lhe determinam uma incapacidade total para a profissão de jornaleiro que o Autor sempre exerceu.

1.62. Não obstante as consultas e tratamentos a que se sujeitou, o Autor vai ficar com sequelas permanentes e definitivas, limitativas quanto às suas opções de trabalho.

1.63. Devido às sequelas com que ficou a padecer, o Autor frequentemente sente fortes dores no ombro esquerdo e não pode fazer esforços com o seu braço esquerdo.

1.64. O Autor sempre trabalhou na agricultura, trabalhos que exigem grande esforço e desgaste físico.

1.65. E apenas possui como habilitações literárias a 2ª classe.

1.66. E na altura do acidente o Autor trabalhava na vindima 8 dias por semana.

1.67. Auferia por jorna a quantia de 30,00€ (trinta euros).

1.68. No ano de 2018, o período das vindimas estendeu-se até finais de outubro.

1.69. Com a exceção do período das vindimas, habitualmente, o Autor, trabalhava de Segunda-Feira a Sábado.

1.70. Descansando aos Domingos e feriados.

1.71. Com os trabalhos agrícolas que efetuava para terceiros, o Autor obtinha mensalmente uma quantia equivalente, pelo menos, ao salário mínimo nacional, com a qual fazia face às despesas pessoais e da casa.

1.72. À data da alta médica, o Autor tinha 48 anos de idade.

1.73. Em consequência de tal acidente, resultaram para o Autor as lesões supra descritas e que, desde o dia 08/10/2018 até à data da alta médica (05/11/2019), lhe determinaram, direta e necessariamente, 394 dias de incapacidade temporária absoluta.

1.74. A Ré já pagou ao autor a quantia de 2.000,00 € como adiantamento por conta da indemnização.

1.75. Bem como a quantia de 2.100,00 €, em 7 prestações mensais de 300,00 €/cada, e que mediaram entre 09/07/2019 e 20/01/2020.

1.76. As sequelas de que está afetado o Autor, constituem uma afetação da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos e que constitui uma incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo, como é o caso para o trabalho agrícola que o mesmo sempre executou, para além de configurarem um dano estético de grau 4 numa escala crescente de 7 graus, e terem repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 2 numa escala crescente de 7 graus.

1.77. O Autor sempre foi uma pessoa trabalhadora.

1.78. Granjeava, ainda, o Autor uma pequena propriedade onde o mesmo cultivava e colhia batatas, cebolas e tomate e demais produtos hortícolas para seu consumo.

1.79. O Autor aproveitava o período pós-laboral, feriados e Domingos para granjear e cultivar os produtos hortícolas da época.

1.80. E nessa atividade, retirava daquela propriedade os produtos agrícolas, tais como, batatas, tomates, alfaces, ervilhas, favas e outros legumes necessários à sua subsistência.

1.81. Com a limitação funcional total e permanente de que o Autor ficou a padecer após o acidente em mérito, viu a sua capacidade de ganho também diminuída.

1.82. Vendo-se obrigado a contratar pessoas para executar os trabalhos que exigem maior esforço físico.

1.83. Tanto na altura do acidente como nas horas seguintes, o Autor sentiu um autêntico pavor ao ver-se ferido e sofreu dores horríveis, fixadas num grau 5 de uma escala crescente de 7 graus.

1.84. Dores essas associadas a um enorme desconforto e angústia que se mantiveram durante toda a sua permanência nos estabelecimentos hospitalares por onde passou.

1.85. Não podendo dar à sua família a atenção, o apoio e acompanhamento que queria dar, uma vez que o seu agregado familiar, como resulta do deferimento do apoio judiciário, é de fracos recursos financeiros.

1.86. Tudo isto o entristece e lhe causa grande desgosto e amargura e mais lhe faz sentir o seu estado de doença.

1.87. O problema físico sofrido pelo Autor, implica consequências ao nível psíquico e na sua maneira de ser, revelando-se mais triste.

1.88. Ao aperceber-se que o despiste e consequente queda na ribanceira era inevitável, o Autor sentiu medo das consequências que resultariam para a sua integridade física.

1.89. O Autor, à data do acidente, era pessoa robusta e dinâmica, gozando de boa saúde e sem qualquer defeito físico.

1.90. Com uma grande alegria de viver e constante boa disposição.

1.91. Em consequência do acidente, viu-se transformado numa pessoa fisicamente diminuída.

1.92. Em resultado da limitação física, o Autor passou a ter de desenvolver um maior esforço físico e até mental para superar a dor, ficando limitado no seu trabalho, pelo cansaço e sofrimento que daí decorre.

1.93. Também no plano estético há a registar consequências negativas, tendo o autor sofrido um dano estético permanente de grau 4, numa escala crescente de 7 graus.

1.94. Consequências essas que advieram por efeito da operação e tratamentos a que o Autor foi submetido.

1.95. O que fez com que tenha notórias cicatrizes no ombro esquerdo, que pelo seu aspeto e tamanho e pela vergonha que delas sente, o incomodam e evita mostrar.

1.96. O Autor viveu e ainda vive em constante sofrimento provocado pelas fortes dores que sentiu e continua a sentir.

1.97. O Autor receia, ainda, que as lesões se agravem com o passar dos anos.

1.98. À data do acidente, a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros pelo veículo ..-..-CN, propriedade de BB, achava-se transferida para a “V..., S.A.”, através da apólice nº ...58.

1.99. O autor foi assistido e acompanhado pelos serviços clínicos da ré até 05.11.2019, altura em que lhe foi atribuída alta clínica.

1.100. O autor é um trabalhador indiferenciado.”.

2. Da indemnização reclamada pelo Recorrente do dano patrimonial futuro relativo à perda de capacidade de ganho

Na sentença decidiu-se:

No caso dos autos, tendo em conta a idade do autor (48 anos à data da alta), o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 45 pontos, mas impeditivo do exercício da atividade habitual e qualquer outra para a qual tenha qualificações, sendo certo que as regras da experiência comum nos dizem que o autor, em circunstâncias normais, poderia continuar a trabalhar na agricultura, pelo menos, até aos 70 anos de idade e a tratar dos trabalhos agrícolas nas terras próprias, pelo menos, até aos 78 anos de idade (esperança média de vida para os homens), e sem esquecer que o défice funcional permanente de que ficou afetado o acompanhará para sempre, e tendo, ainda, em conta que não se apurando que o autor tivesse um vencimento fixo mensal, sempre corresponderia, pelo menos, ao salário mínimo nacional, o qual desde o ano de 2018 até ao ano corrente de 2021, tem vindo a subir gradualmente (580,00 euros em 2018, 600,00 euros em 2019, 635,00 euros em 2020 e 665,00 euros atualmente), prevendo-se que tal subida continuar, entende-se como adequado, em termos equitativos, ao abrigo do disposto no art. 566º, 3 do Código Civil, fixar a título de indemnização por dano patrimonial, o valor global de 250 000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), no qual se inclui qualquer atividade exercida pelo autor, quer por conta de terceiros, quer nas atividades agrícolas para autoconsumo.”.

O Autor não se conformou com a sentença nesta parte e dela apelou, pedindo um valor superior ao atribuído pelo tribunal.

O Tribunal da Relação justificou a não procedência do recurso do Autor nesta parte.

A questão que motivou a discordância do Autor na apelação era também questão que havia levado a Ré a recorrer da sentença.

E o Tribunal da Relação entendeu que o recurso da Ré devia proceder porque o tribunal da 1ª instância havia fixado a indemnização em causa tratando a incapacidade permanente parcial como se fosse uma incapacidade total e absoluta.

Disse-se no Acórdão recorrido:

Apesar disso a recorrente tem razão sobre o critério enveredado pelo tribunal a quo que não tem em consideração que a permanência da incapacidade permanente parcial em 45% tem de fundar uma parte de capacidade ganho que não pode ser incluída na indemnização.

É manifesto que, como já resulta do sobredito, não foi levado em conta o concreto défice funcional atribuído ao lesado, tendo-se computado o montante indemnizatório como se a incapacidade permanente fosse total ou absoluta.

Com efeito deu-se como provado que “As sequelas de que está afetado o Autor, constituem uma afetação da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos e que constitui uma incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo, como é o caso para o trabalho agrícola que o mesmo sempre executou,…” e “… o Autor está e continuará afetado por limitações funcionais definitivas que muito o limitam para o exercício das atividades ao seu alcance e que habitualmente exercia; Sendo elas o trabalho agrícola e as tarefas do seu quotidiano.”.

Esta circunstância não pode ser escamoteada e inexiste sequer qualquer fator que atenue intrinsecamente o significado destas situações.

Mesmo que se realça que estamos perante um trabalhador indiferenciado com baixa escolaridade em que é enfraquecida a valorização da capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão, através da sua reconversão.

Com efeito também, a factualidade assente não exclui só por si a possibilidade da exploração da propriedade para dela retirar bens para o seu consumo, apesar do recorrente ter mais dificuldade em poder executar trabalhos com uma enxada.

O que dela se realça cumulativamente é que para trabalhos que exijam maior esforço físico ele possa vir a ter necessidade de contratar terceiros, mas sem que se conclua de imediato que seja de forma remuneratória e em que quantitativos.

Em conclusão não se pode falar no caso concreto de perda absoluta da capacidade de ganho.

Dito isto, entendemos justificar-se que a avaliação do ponto de vista funcional dos danos no caso concreto deve partir socorrendo-nos do critério vertido nos artºs 48º, nº 3, alª b), 67º, nº 3 e 71º da Lei 98/2009, de 04.09, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, conjugado com o indexante de apoios sociais previsto na Portaria 24/2019, de 17.01, que assim inclui não só a prestação pela incapacidade como também o subsídio por situações de elevada incapacidade permanente.

A data a que deve ser reportada a incapacidade de ganho é a da consolidação da incapacidade pois até aí é temporária, não permanente.

Logo, obter-se-ia um valor de indemnização por perda futura da capacidade de ganho do recorrente anual de 4.956,00€ {[(8.400€ x 70%) (8.400€ x 50%) x 45%] + (8.400€ x 50%) = 4.956,00€)}, que multiplicada pelo número de anos da esperança de vida ascenderia a 148.680,00€, acrescida ainda do valor de 4,802,94€ atribuível à elevada incapacidade {[(435,76 x 1.1 x 12) (435,76,€ x 1.1 x 12 x 70%) x 45%] + (435,76€ x 1.1 x 12 x 70%) = 4.802,94€}, e, como tal, no total de 153.482,94€.

Importando não esquecer que estamos no domínio da indemnização do dano civil (e não laboral), embora se possa ponderar na vantagem do recebimento imediato do citado benefício que neste percurso o seu cálculo é meramente auxiliar do juízo de equidade que preside à determinação da indemnização devida, considera-se ainda adequado que o valor final seja antes de 180.000,00€, considerando no caso a necessidade de terceiros para manutenção da incapacidade de ganho, a idade do lesado e as diminutas chances para o mesmo conseguir qualquer aumento de ganho em profissão ou atividade económica alternativa por via da reconversão, visto as suas concretas competências (de resto, no recurso, como aconteceu na contestação a recorrente foi incapaz de alegar qualquer circunstância que depusesse em sentido contrário).

A incapacidade permanente absoluta para todo o trabalho habitual, não só pela necessidade de mudança de profissão, como pela dificuldade de reeducação profissional, exige por isso uma compensação maior.

E nesta oportunidade não é de esperar senão, como é público e notório que há que ter em conta a inflação e o aumento do custo de vida o que implica necessariamente perdas reais embora nesta altura de previsão incapaz de se alcançar.

Por sua vez, não se pode antecipar qualquer situação de enriquecimento injustificado à custa da recorrente, inclusivamente devido à situação suscetível de permitir retorno financeiro por qualquer forma, por isto também não se justificando a introdução de qualquer desconto a título por exemplo de juros, porquanto, atualmente, já não se obtém como em tempos recuados taxas de juros remuneratórios que permitiam a expansão do quantitativo adiantado com expressão económica relevante e, assim, obtendo-se um capital não esgotável ao longo do tempo de vida do recorrente.

Esta indemnização destina-se, pois, a consubstanciar uma compensação suscetível de minorar ou atenuar os efeitos da lesão sofrida e é equilibrada, não fugindo aos parâmetros que têm vindo a ser utilizados na jurisprudência em situações próximas.

Deve, portanto, nos termos sobreditos, proceder parcialmente o recurso do recorrente e da recorrente, pelo que no mais confirmando-se a sentença será reconhecido ao recorrente que o valor das indemnizações referentes aos momentos entre o do acidente e o da alta médica por incapacidade temporária absoluta, são de 720,00€ e de 7.260,00€ consoante o caso, e que o valor de indemnização por danos futuros deve ser fixado em 180.000,00€.”

Ao assim decidir o Tribunal fixou a indemnização em €180 000,00 euros, quando na sentença havia sido fixado o valor de €250 000,00.

Esta diferença de valor (€70 000,00) é a sucumbência do Autor – aquilo em que o mesmo ficou prejudicado, face à sentença; mas não constitui nenhum limite ao valor passível de ser conhecido na revista, porque o Autor apelou da sentença tendo pedido que o valor arbitrado fosse mais que €250 000,00.

O que não pode suceder é que o Tribunal agora venha a determinar que o valor da indemnização é inferior a €180 000,00.

Isto significa que não se identifica aqui o obstáculo limitativo indicado pela Recorrida, podendo o tribunal conhecer da questão suscitada pelo Autor, na parte relativa a este dano patrimonial futuro.


A questão objeto do recurso é assim uma só: a de saber se a indemnização atribuída ao Autor, a título de dano patrimonial por perda da capacidade de ganho, foi bem decidida.

O Autor/Recorrente entende que não.

A esse título o pedido do Autor fora assim formulado:

“b) 383.040,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente de perda de capacidade de ganho decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica de 45 pontos. As sequelas permanentes com que o recorrente ficou a padecer determinam-lhe uma incapacidade de 100% para a profissão de jornaleiro, bem como de qualquer outra dentro da área de preparação técnico-profissional do recorrente.

c) 108.000,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e que se consubstancia no trabalho não remunerado que o Recorrente executava no desempenho da casa, família e nas tarefas agrícolas para proveito próprio.”

Para justificar a revista invoca o Autor os seguintes argumentos (a partir das conclusões da revista, que se selecionaram):

“17 - O A/recorrente discriminou de forma diferenciada na sua petição inicial o cálculo da indemnização pelos anos patrimoniais futuros, tendo requerido o seguinte pedido:

1) 383.040,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente de perda de capacidade de ganho decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica de 45 pontos. As sequelas permanentes com que o recorrente ficou a padecer determinam-lhe uma incapacidade de 100% para a profissão de jornaleiro, bem como de qualquer outra dentro da área de preparação técnico-profissional do recorrente;

2) 108.000,00 € a título de dano patrimonial futuro na vertente dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e que se consubstancia no trabalho não remunerado que o Recorrente executava no desempenho da casa, família e nas tarefas agrícolas para proveito próprio.

18 - Para a determinação da quantia de 180.000,00 € atribuído pela Relação de Guimarães, é enunciado no d. acórdão em reapreciação que aquele cálculo foi efetuado com base na Lei nº 98/2009, de 04/09, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.

21 - O d. acórdão em reapreciação não teve em conta o determinado no “RELATÓRIO DA PERICIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL” quando lá é expressamente firmado que desvalorização de 45 pontos corresponde a uma incapacidade total (100%) para a profissão de jornaleiro que o A/recorrente sempre exerceu, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional.

22 - Como resulta do seu petitório inicial, o evento danoso em que o A/recorrente fundou o seu pedido indemnizatório consiste num acidente de viação que não concorre com um acidente de trabalho.

23 - Por outro lado e no modesto entendimento do recorrente, a responsabilidade da entidade empregadora por acidente de trabalho e a responsabilidade civil aquiliana geral obedecem a lógicas diferentes, procuram uma tutela diversa e regem-se por regras perfeitamente distintas.

24 - Contrariando o propugnado no d. acórdão em reapreciação, o Ac. STJ de 09/11/2017, Proc. 2035/11.9TJVNF.G1.S1 (Cons. Maria da Graça Trigo), consultável em www.dgsi.pt, refere que não deve acolher-se, neste tipo de casos, «como critério-base para o cálculo do montante indemnizatório uma das tradicionais fórmulas financeiras criadas para a determinação dos danos patrimoniais resultantes da incapacidade (neste caso parcial) para o exercício da profissão habitual, adoptando a taxa de incapacidade laboral parcial de (…) com base na IGP (Incapacidade Geral Permanente) fixada em (…) pontos.»

25 – Concluindo, ainda, o mesmo acórdão que:

«Este procedimento não pode ser aceite. Os índices de Incapacidade Geral Permanente não se confundem com índices de Incapacidade Profissional, correspondendo a duas tabelas distintas, aprovadas pelo Decreto-Lei nº 352/2007, de 23 de Outubro. Nas palavras do preâmbulo deste diploma legal, na incapacidade geral avalia-se “a incapacidade para os actos e gestos correntes do dia-a-dia”, a qual pode ter reflexos ao nível da incapacidade profissional, mas que com esta não se confunde (cfr. da autoria da relatora do presente acórdão, Adopção do conceito de dano biológico pelo direito português, in Revista da Ordem dos Advogados, ano 72, I, págs. 148-149).»

26 - No caso dos autos e conforme resulta do “RELATÓRIO DA PERICIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL”, o dano em equação, traduzido naquela incapacidade apurada de 45 pontos, não é compatível com o exercício da atividade profissional do lesado, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional,

27 - tratando-se, assim, de uma irreversível incapacidade que se constitui como total e permanente para o desempenho da sua profissão de jornaleiro e de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional.

28 - Como vem sendo uniformemente reconhecido pela nossa jurisprudência, o valor estático alcançado através da automática aplicação das tabelas matemáticas - e que apenas permitirá alcançar um «minus» indemnizatório -terá de ser temperado através do recurso à equidade – que naturalmente desempenha um papel corrector e de adequação do montante indemnizatório às circunstâncias específicas e à justiça do caso concreto, permitindo ainda a ponderação de variantes dinâmicas que escapam, em absoluto, ao referido cálculo objectivo, tais como:

(…)

29 - Constitui, ainda, entendimento jurisprudencial reiterado que, no cálculo da indemnização por danos futuros, deve corresponder a um capital produtor do rendimento de que o lesado ficou privado e que se extinguirá no termo do período provável da sua vida, determinado com base na esperança média de vida (e não apenas em função da vida profissional ativa do lesado), quer porque, prejudicando a sua carreira contributiva, vem a reduzir, ou até a excluir, a pensão de reforma, quer porque sempre condicionará a possibilidade de obtenção de ganhos no exercício de actividades económicas alternativas a realizar para além da idade da reforma (…)

30 - Segundo as “Tábuas de Mortalidade” relativas ao triénio 2018-2020, a esperança de vida à nascença em Portugal foi estimada em 78,07 anos para os homens e de 83,67 anos para as mulheres.

32 - Como emerge do substrato factual apurado, à data do acidente, o recorrente trabalhava na agricultura – vindima – 7 dias por semana e auferia, por jorna, a quantia de 30,00 €, o que perfazia a quantia mensal de 900,00 € (30,00 € x 30 dias = 900,00 €), estando, assim, em causa a indemnização pelo que se vem denominando de dano biológico;

33 - E, habitualmente, trabalhava de Segunda-Feira a Sábado, 6 dias por semana.

37 - Em face do determinado no “RELATÓRIO DA PERICIA DE AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL” e na factualidade dada como assente, não oferece dúvida que a situação do A/recorrente, a quem foi atribuído uma desvalorização funcional permanente de 45 pontos, que equivale na prática a uma incapacidade total, na medida em que ficou impossibilitado de exercer o trabalho de jornaleiro, que sempre exerceu desde os 14 anos de idade, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, não tem formação profissional para o exercício de outra atividade, ficou a padecer de fortes limitações ao nível da sua mobilidade, o que, associado à idade actual (51 anos de idade), o seu grau de escolaridade/qualificações (2ª classe) e crescentes exigências do mercado laboral, torna praticamente impossível a obtenção de um trabalho estável e permanente, à semelhança daquele que possuía e que, não fora o acidente, manteria.

38 - Destarte, sopesando o quadro factual apurado e ponderando a total perda de rendimentos e a significativa perda de capacidade, com a inerente restrição ao exercício de uma profissão alternativa por parte do A/recorrente, parece-nos mais justo e equilibrado - quer na vertente da justiça do caso, quer na ótica da justiça comparativa -, fixar em 383.040,00 € (trezentos e oitenta e três mil e quarenta euros), o montante destinado a reparar o dano patrimonial futuro na vertente da perda de capacidade de ganho decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica.

39 - Para além da inaplicabilidade da fórmula de cálculo usada pelo d. acórdão em reapreciação em conformidade com o acima exposto, o veredicto aqui em crise omite ainda o cálculo do dano biológico resultante da perda de utilidade económica referente aos custos traduzidos na perda de produção referentes à perda potencial de produção fora do mercado e que se consubstancia no trabalho não remunerado que era desempenhado pelo A/recorrente, no âmbito da casa, família, da comunidade e tarefas agrícolas para autoconsumo.

44 - Dadas as dificuldades inerentes à fixação da pretendida e devida indemnização, o A/recorrente estimou o trabalho não remunerado e que era desempenhado no âmbito da casa, da família e das tarefas agrícolas para autoconsumo, no valor de 300,00 €/mês, quantia esta que se enquadra dentro dos parâmetros de 30% dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e estimados no estudo acima exposto.

45 - Destarte, e partindo da referência monetária de 300,00 €, no défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 45 pontos, mas que determinam uma incapacidade total (100%) para a profissão de jornaleiro que o recorrente sempre exerceu, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, e pelo período de 30 anos (até aos 78 anos), o valor da perda de produção nas tarefas desempenhadas pelo recorrente no âmbito da casa, família, comunidade e agrícolas para auto-consumo, afigura-se-nos ser equitativo a determinação da indemnização da quantia de 108.000,00 € (cento e oito mil euros), conforme peticionado no seu petitório inicial.

47 - Pelo que o montante de 180.000,00 €, fixado no d. acórdão em reapreciação a título de dano biológico, é, assim, insuficiente;

48 - Pelo que e temperando o montante a arbitrar à luz das regras da equidade, afigura-se-nos que será mais justo e equilibrado a atribuição ao A/recorrente, como compensação a título dos dois danos biológicos na vertente de dano patrimonial futuro, a indemnização global de 491.040,00 € (quatrocentos e noventa e um mil e quarenta euros).”


Os seus principais argumentos são os seguintes:

- Não se trata de acidente de trabalho, pelo que não se pode aplicar a solução legal relativa a eles;

- A incapacidade do Autor para o exercício da profissão é total;

- Os rendimentos que auferia incluíam a prestação de serviços a terceiros, 6 dias por semana, com valor diário de €30,00, e ainda a realização de trabalhos em proveito próprio, estimados em €300,00 mensais de rendimento.


No Acórdão recorrido as questões/argumentos do Autor foram objeto de análise e tiveram a seguinte resposta:

- No que respeita à atividade exercida por conta de terceiros –

“Em face disto, paradigma da discordância do recorrente é que quanto às duas qualificativas de dano biológico, o valor unitário fixado de 250.000,00€ revela-se insuficiente como capital que permita gerar rendimento para a sua provável esperança de vida, considerando a perda da capacidade aquisitiva profissional e de certas utilidades económicas.

Discorda do juízo de equidade em que se fundou o tribunal a quo particularizando que “não se encontrar explícita na sentença em reapreciação a base de cálculo e a fórmula como o Tribunal a quo quantificou o valor atribuído aos dois danos patrimoniais futuros pedidos pelo recorrente”.

No entanto diremos desde já que o argumento da falta de fórmula é redutor (a utilização de eventuais tabelas financeiras, como qualquer outro método que seja expressão de um critério abstrato, constitui um método de cálculo de valor meramente auxiliar) e o recorrente também não apresenta qualquer uma que lhe permita discordar da sentença.

Quanto à base do cálculo obviamente que sem razão aduz argumento no sentido da sua falta. Fácil será apercebermo-nos que o tribunal a quo multiplicou o RMMG (Rendimento Mínimo Mensal Garantido) referente ao ano de 2019 (600,00€) por 12 cujo produto, por sua vez, multiplicou por 30, o número de anos até á esperança média de vida, depois procedendo a uma majoração de cerca de 16% para atingir o valor de final, desse modo pretendendo satisfazer outros fatores que enumerou ou implicitamente são dedutíveis da sua argumentação, para a fixação por equidade.

O recorrente discorda inutilmente do ponto de partida da avaliação pelo dito RMMG quando, como já se antecipou, foi dado como assente que “Com os trabalhos agrícolas que efetuava para terceiros, o Autor obtinha mensalmente uma quantia equivalente, pelo menos, ao salário mínimo nacional, com a qual fazia face às despesas pessoais e da casa”.

Note-se que nesta matéria não se diz que se auferia o RMMG, mas sim quantia equivalente, o que atento à profissão de jornaleiro ou de trabalhador indiferenciado na agricultura permite a discussão sobre se anualmente cabe, ou não, a multiplicação do respetivo montante por 14 meses tendo em conta os subsídios de natal e de férias.

O que é indiscutível é que o tribunal tem de decidir baseado em factos concretos provados e não em argumentação meramente aleatória com causas e consequências sem possibilidade de aderência à realidade em termos futuros, pelo que, uma vez mais perde valor o argumento de que “Como supra exposto no item I, do ponto IV das presentes alegações, a nossa jurisprudência tem vindo a determinar que, quando estamos na presença de um lesado que não aufere qualquer vencimento, a indemnização deve ser calculada com base num vencimento superior ao ordenado mínimo e que corresponda a um valor próximo do salário médio nacional.”.

Por isso ainda, tão pouco se pode falar nesta matéria em congelamento salarial, sendo que quanto a eventual progressão na carreira é argumento que aqui também não colhe se atentarmos que o recorrente é uma pessoa que “sempre trabalhou na agricultura, trabalhos que exigem grande esforço e desgaste físico”, possui “como habilitações literárias a 2ª classe” e, ademais, “é um trabalhador indiferenciado”, sem qualquer especialização, não se perspetivando qualquer possibilidade de tal se cuidarmos ainda da sua idade e da referida condição académica.

Face à situação social do país e de outras contingências internas e externas que podem condicionar a sua economia não é também adequado sem mais favorecer a situação do recorrente referindo-se “em melhoria das condições de vida do país e da sociedade e do próprio aumento de produtividade”, para mais ao nível agrícola, e em “aumento do rendimento disponível e melhoria expectável das condições de vida”.

No aumento de número de anos para se conseguir a reforma ainda que se conceba eventual prejuízo de carreira contributiva, com a consequente redução do seu valor, e na inflação, assim como “o aumento da própria longevidade” são circunstâncias que a admitir têm suficiente imprevisibilidade e somente de forma residual podem corroborar e condicionar as premissas da formulação do juízo de equidade quanto a este tipo de danos (artº 564º, nº 2 e 566º, nº 3 do CC).”

(…)

“Apesar disso a recorrente tem razão sobre o critério enveredado pelo tribunal a quo que não tem em consideração que a permanência da incapacidade permanente parcial em 45% tem de fundar uma parte de capacidade ganho que não pode ser incluída na indemnização.

É manifesto que, como já resulta do sobredito, não foi levado em conta o concreto défice funcional atribuído ao lesado, tendo-se computado o montante indemnizatório como se a incapacidade permanente fosse total ou absoluta.

Com efeito deu-se como provado que “As sequelas de que está afetado o Autor, constituem uma afetação da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos e que constitui uma incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo, como é o caso para o trabalho agrícola que o mesmo sempre executou,…” e “… o Autor está e continuará afetado por limitações funcionais definitivas que muito o limitam para o exercício das atividades ao seu alcance e que habitualmente exercia; Sendo elas o trabalho agrícola e as tarefas do seu quotidiano.”.

Esta circunstância não pode ser escamoteada e inexiste sequer qualquer fator que atenue intrinsecamente o significado destas situações.

Mesmo que se realça que estamos perante um trabalhador indiferenciado com baixa escolaridade em que é enfraquecida a valorização da capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão, através da sua reconversão.

Com efeito também, a factualidade assente não exclui só por si a possibilidade da exploração da propriedade para dela retirar bens para o seu consumo, apesar do recorrente ter mais dificuldade em poder executar trabalhos com uma enxada.

O que dela se realça cumulativamente é que para trabalhos que exijam maior esforço físico ele possa vir a ter necessidade de contratar terceiros, mas sem que se conclua de imediato que seja de forma remuneratória e em que quantitativos.

Em conclusão não se pode falar no caso concreto de perda absoluta da capacidade de ganho.

Dito isto, entendemos justificar-se que a avaliação do ponto de vista funcional dos danos no caso concreto deve partir socorrendo-nos do critério vertido nos artºs 48º, nº 3, alª b), 67º, nº 3 e 71º da Lei 98/2009, de 04.09, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, conjugado com o indexante de apoios sociais previsto na Portaria 24/2019, de 17.01, que assim inclui não só a prestação pela incapacidade como também o subsídio por situações de elevada incapacidade permanente.

A data a que deve ser reportada a incapacidade de ganho é a da consolidação da incapacidade pois até aí é temporária, não permanente.

Logo, obter-se-ia um valor de indemnização por perda futura da capacidade de ganho do recorrente anual de 4.956,00€ {[(8.400€ x 70%) – (8.400€ x 50%) x 45%] + (8.400€ x 50%) = 4.956,00€)}, que multiplicada pelo número de anos da esperança de vida ascenderia a 148.680,00€, acrescida ainda do valor de 4,802,94€ atribuível à elevada incapacidade {[(435,76 € x 1.1 x 12) – (435,76,€ x 1.1 x 12 x 70%) x 45%] + (435,76€ x 1.1 x 12 x 70%) = 4.802,94€}, e, como tal, no total de 153.482,94€.

Importando não esquecer que estamos no domínio da indemnização do dano civil (e não laboral), embora se possa ponderar na vantagem do recebimento imediato do citado benefício que neste percurso o seu cálculo é meramente auxiliar do juízo de equidade que preside à determinação da indemnização devida, considera-se ainda adequado que o valor final seja antes de 180.000,00€, considerando no caso a necessidade de terceiros para manutenção da incapacidade de ganho, a idade do lesado e as diminutas chances para o mesmo conseguir qualquer aumento de ganho em profissão ou atividade económica alternativa por via da reconversão, visto as suas concretas competências (de resto, no recurso, como aconteceu na contestação a recorrente foi incapaz de alegar qualquer circunstância que depusesse em sentido contrário).

A incapacidade permanente absoluta para todo o trabalho habitual, não só pela necessidade de mudança de profissão, como pela dificuldade de reeducação profissional, exige por isso uma compensação maior.

E nesta oportunidade não é de esperar senão, como é público e notório que há que ter em conta a inflação e o aumento do custo de vida o que implica necessariamente perdas reais embora nesta altura de previsão incapaz de se alcançar.

Por sua vez, não se pode antecipar qualquer situação de enriquecimento injustificado à custa da recorrente, inclusivamente devido à situação suscetível de permitir retorno financeiro por qualquer forma, por isto também não se justificando a introdução de qualquer desconto a título por exemplo de juros, porquanto, atualmente, já não se obtém como em tempos recuados taxas de juros remuneratórios que permitiam a expansão do quantitativo adiantado com expressão económica relevante e, assim, obtendo-se um capital não esgotável ao longo do tempo de vida do recorrente.

Esta indemnização destina-se, pois, a consubstanciar uma compensação suscetível de minorar ou atenuar os efeitos da lesão sofrida e é equilibrada, não fugindo aos parâmetros que têm vindo a ser utilizados na jurisprudência em situações próximas.”


- No que respeita à atividade desenvolvida por conta própria –

“Na sentença avalia-se que segundo “as regras da experiência comum nos dizem que o autor, em circunstâncias normais, poderia continuar a trabalhar na agricultura, pelo menos, até aos 70 anos de idade e a tratar dos trabalhos agrícolas nas terras próprias, pelo menos, até aos 78 anos de idade (esperança média de vida para os homens)”, e daí que não se entenda a chamada de atenção do recorrente para jurisprudência argumentando que “Constitui entendimento jurisprudencial reiterado que, no cálculo da indemnização por danos futuros, deve corresponder a um capital produtor do rendimento de que o lesado ficou privado e que se extinguirá no termo do período provável da sua vida, determinado com base na esperança média de vida (e não apenas em função da vida profissional ativa do lesado), quer porque, prejudicando a sua carreira contributiva, vem a reduzir, ou até a excluir, a pensão de reforma, quer porque sempre condicionará a possibilidade de obtenção de ganhos no exercício de atividades económicas alternativas a realizar para além da idade da reforma, quer porque sempre condicionará a possibilidade de obtenção de ganhos no exercício de atividades económicas alternativas a realizar para além da idade da reforma” e, depois, que “… ao contrário da fundamentação exposta na sentença recorrida, constitui entendimento jurisprudencial reiterado que a indemnização a arbitrar por tais danos futuros deve partir da esperança média de vida e não apenas da duração da vida profissional ativa do lesado…”.

A sentença, pois, vale-se de que ultrapassada a altura em que cesse a vida ativa profissional o recorrente necessariamente poderá continuar a passar a auferir um rendimento ainda que inferior, aliás, praticamente obnubilando a possibilidade natural da diminuição drástica da vitalidade e da saúde com o avanço da idade tardia.

Por seu turno, o que é certo, atento ao ficado assente, é que na sentença não se deixou de abranger na forma equitativa, por intermédio da predita majoração, o que o recorrente designa por “dano biológico consubstanciado na perda de produção do trabalho não remunerado desempenhado pelo recorrente no âmbito da casa, família, comunidade e nas tarefas agrícolas para autoconsumo e decorrente do déficit funcional permanente da integridade físico-psíquica”.

Além de que o recorrente não pode deixar cair no esquecimento que se por um lado apurou-se quegranjeava uma pequena propriedade onde cultivava e colhia batatas, cebolas e tomate e demais produtos hortícolas para seu consumo, aproveitando o período pós-laboral, feriados e domingos para o fazer e com a limitação funcional de que ficou a padecer vê-se obrigado a contratar pessoas para executar os trabalhos que exigem maior esforço físico, por outro lado, este enquadramento fático é suficientemente genérico permitindo unicamente uma determinação que não seja mais que a resultante de uma conceção relativa da valorização económica da capacidade de ganho perdida nesta parte.

Note-se, não resulta do que se deu como assente que houve “perda de utilidade económica referente aos custos traduzidos na perda de produção”, ficando por demonstrar o alegado na petição inicial de forma ambígua de que a “execução dos trabalhos agrícolas que o A. executava no prédio que, correspondente ao que teria de pagar a outra pessoa que contratasse, tinha uma utilidade económica não inferior a 300,00 € … por mês”. E é ambíguo porque fica por saber se esse valor é o do fator de produção trabalho ou o do rendimento retirado do cultivo o que no recurso não se chega a justificar e dilucidar: “Conforme requerido pelo recorrente na sua p.i., este estimou o trabalho não remunerado e que era desempenhado no âmbito da casa, da família e das tarefas agrícolas para autoconsumo, no valor de 300,00 €/mês, quantia esta que se enquadra dentro dos parâmetros de 30% dos custos traduzidos na perda de produção fora do mercado e estimados no estudo acima exposto, quantia esta que foi desconsiderada pela … sentença, sem que se explicite o iter seguido para o cálculo deste dano patrimonial futuro.”

O que da factualidade assente resulta também antes é a não existência de perda absoluta de produção e se neste âmbito a capacidade de ganho é diminuída tal derivará da eventual necessidade de se contratar pessoas “para executar os trabalhos que exigem maior esforço físico” de que o recorrente não é capaz.”


Na sentença a posição adotada era mais correspondente à vontade do Recorrente, dizendo-se aí:

“No que diz respeito ao défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, e conforme resulta do relatório pericial, podemos dizer que o mesmo, ainda que fixado em 45 pontos, afeta o autor em termos da sua atividade profissional habitual ou qualquer outra para a qual tenha preparação técnico-profissional, sendo tal défice funcional permanente, impeditivo de qualquer atividade profissional para a qual o autor tenha competências.

Assim, quanto aos danos patrimoniais pela perda de rendimento futuro, cabe referir o seguinte:

No que diz respeito aos alegados danos futuros decorrentes do défice funcional permanente de que o autor ficou afetado, temos por assente, como referido supra, que o mesmo ficou impedido de continuar a exercer as suas atividades habituais, tanto por conta de terceiros, como no granjeio da propriedade que possui, pelo que tal perda de rendimento corresponde a 100 % dos rendimentos que o autor auferia.

Esta afetação da capacidade de trabalho e nas atividades da vida diária, afeta na mesma medida, o autor, em termos patrimoniais. Tal dano que consiste no chamado dano biológico, enquanto lesão à saúde e integridade física do autor, tanto pode ser valorado enquanto dano patrimonial como enquanto dano não patrimonial.

No caso em discussão, tendo em conta o tipo de sequelas sofridas pelo autor, que, como dito, o afetam diretamente em termos patrimoniais, que o impedem de exercer a atividade remunerada que antes exercia, tal dano pode e deve ser valorado enquanto dano patrimonial.

Acresce que, o autor exercia também outras tarefas, de granjeio de terreno próprio, onde produzia para autoconsumo, tarefas que, agora, também não pode exercer como fazia antes, e que também têm uma utilidade económica significativa, pelo que se entende que configuram um dano patrimonial que deve ser ressarcido, com recurso à equidade (art. 566º, 3 do Código Civil) por não haver elementos que permitam determinar o seu valor exato.”


Vejamos se a orientação do Tribunal da Relação, no que respeita às sequelas que o Recorrente ficou a padecer, está correta, à luz dos factos provados ou se as mesmas devem ser consideradas como tendo determinado uma incapacidade de 100% para a profissão de jornaleiro, bem como de qualquer outra dentro da área de preparação técnico-profissional do Recorrente.

Os factos provados relevantes são os seguintes

“1.56. Não obstante se ter sujeito a todas as consultas, tratamentos e cumprido todas as prescrições médicas, o Autor está e continuará afetado por limitações funcionais definitivas que muito o limitam para o exercício das atividades ao seu alcance e que habitualmente exercia

1.57. Sendo elas o trabalho agrícola e as tarefas do seu quotidiano

1.58. Como consequência direta e necessária do acidente, o Autor, devido às frequentes dores que sente no ombro esquerdo, tem mais dificuldade em poder executar trabalhos que impliquem um maior esforço físico, tais como, vestir-se e calçar-se e trabalhar com uma enxada

1.59. Tais sequelas de que está afetado o Autor, constituem um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos.

1.60. Resulta ainda do teor do “Relatório final de avaliação de dano corporal em direito civil”, o seguinte:

- Lesão do plexo braquial esquerdo;

- Incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo.

1.61. E de que, por isso mesmo, lhe determinam uma incapacidade total para a profissão de jornaleiro que o Autor sempre exerceu.

1.62. Não obstante as consultas e tratamentos a que se sujeitou, o Autor vai ficar com sequelas permanentes e definitivas, limitativas quanto às suas opções de trabalho.

1.63. Devido às sequelas com que ficou a padecer, o Autor frequentemente sente fortes dores no ombro esquerdo e não pode fazer esforços com o seu braço esquerdo.

1.64. O Autor sempre trabalhou na agricultura, trabalhos que exigem grande esforço e desgaste físico.

1.65. E apenas possui como habilitações literárias a 2ª classe.

1.66. E na altura do acidente o Autor trabalhava na vindima 8 dias por semana.

1.67. Auferia por jorna a quantia de 30,00€ (trinta euros).

1.68. No ano de 2018, o período das vindimas estendeu-se até finais de outubro.

1.69. Com a exceção do período das vindimas, habitualmente, o Autor, trabalhava de Segunda-Feira a Sábado.

1.70. Descansando aos Domingos e feriados.

1.71. Com os trabalhos agrícolas que efetuava para terceiros, o Autor obtinha mensalmente uma quantia equivalente, pelo menos, ao salário mínimo nacional, com a qual fazia face às despesas pessoais e da casa.

1.72. À data da alta médica, o Autor tinha 48 anos de idade.

1.73. Em consequência de tal acidente, resultaram para o Autor as lesões supra descritas e que, desde o dia 08/10/2018 até à data da alta médica (05/11/2019), lhe determinaram, direta e necessariamente, 394 dias de incapacidade temporária absoluta.

1.76. As sequelas de que está afetado o Autor, constituem uma afetação da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos e que constitui uma incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo, como é o caso para o trabalho agrícola que o mesmo sempre executou, para além de configurarem um dano estético de grau 4 numa escala crescente de 7 graus, e terem repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 2 numa escala crescente de 7 graus.

1.77. O Autor sempre foi uma pessoa trabalhadora.

1.78. Granjeava, ainda, o Autor uma pequena propriedade onde o mesmo cultivava e colhia batatas, cebolas e tomate e demais produtos hortícolas para seu consumo.

1.79. O Autor aproveitava o período pós-laboral, feriados e Domingos para granjear e cultivar os produtos hortícolas da época.

1.80. E nessa atividade, retirava daquela propriedade os produtos agrícolas, tais como, batatas, tomates, alfaces, ervilhas, favas e outros legumes necessários à sua subsistência.

1.81. Com a limitação funcional total e permanente de que o Autor ficou a padecer após o acidente em mérito, viu a sua capacidade de ganho também diminuída.

1.82. Vendo-se obrigado a contratar pessoas para executar os trabalhos que exigem maior esforço físico.

1.92. Em resultado da limitação física, o Autor passou a ter de desenvolver um maior esforço físico e até mental para superar a dor, ficando limitado no seu trabalho, pelo cansaço e sofrimento que daí decorre.

1.100. O autor é um trabalhador indiferenciado.”.

Dos factos provados resulta claramente que o Autor., com 47 anos de idade à data do acidente, trabalhador indiferenciado, com apenas a 2.ª classe, exercia - antes do acidente - atividade no âmbito agrícola, para terceiros e para si próprio, da qual resultavam proventos económicos.

A atividade do Autor era exercida 6 dias por semana (fora da época das vindimas, onde trabalhava a semana toda), repartindo o seu tempo entre o trabalho para terceiros e atividade para si próprio, esta em horário pós-laboral, incluindo feriados e fins de semana, porquanto a primeira era a principal e em regime de jorna (trabalho ao dia, com remuneração diária); no âmbito da atividade jornaleira o Autor conseguia obter um valor, pelo menos, próximo do salário mínimo nacional. Da sua propriedade o Autor obtinha produtos agrícolas, tais como, batatas, tomates, alfaces, ervilhas, favas e outros legumes necessários à sua subsistência, e que eram destinados ao seu consumo e da família, nada se provando sobre qual o valor destes produtos em termos de poupança de custo da sua aquisição.

Em resultado das sequelas resultantes do acidente, o Autor ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (Dano Biológico) de 45 pontos, sendo as lesões relativas ao plexo braquial esquerdo (vulgo, relativas ao braço esquerdo), pelo que a utilização deste membro superior ficou comprometida no exercício da sua atividade (incapacidade total para profissões que exijam esforço/utilização do membro superior esquerdo), podendo ainda assim exercer alguma atividade agrícola que não envolva grande esforço e a utilização desse membro, o que envolverá, no entanto, um esforço acrescido. E na atividade por conta própria, algumas tarefas que implicam mais esforço deixaram de poder ser realizadas pelo Autor, tendo este de recorrer a terceiros. As tarefas mais pesadas como as que envolvem o uso da enxada não sendo impossíveis envolvem sofrimento e esforço acrescido, provocando cansaço.

Com estes factos provados, tudo aponta no sentido de a incapacidade do Autor não ser total e absoluta para o exercício da sua profissão habitual, mas implicar claramente um esforço acrescido e limitações que não existiam antes do acidente, o que se refletirá necessariamente na sua capacidade para encontrar empregadores dispostos e contratar um jornaleiro com estas limitações, mas sem que se possa afirmar que o mesmo não poderá mais exercer a sua atividade para terceiros ou em proveito próprio, pois a matéria de facto apurada pôs enfase evidente na limitação da atividade agrícola que envolva o braço esquerdo, não havendo elementos que apontem no sentido de o Autor ser esquerdino – caso em que o seu braço esquerdo seria absolutamente essencial para a boa realização da generalidade dos trabalhos agrícolas, como resulta da experiência.

Por serem estes os factos com que o Tribunal tem de aplicar o direito, não se afigura incorreta a conclusão do Tribunal da Relação ao considerar que não há que considerar existir aqui um dano que envolva uma incapacidade permanente e total para o exercício da profissão habitual, que pode continuar a ser exercida, mas envolverá um esforço acrescido.

Essa conclusão envolve um reflexo no quantum indemnizatório, pois a Ré não poderá ser responsabilizada pelo dano patrimonial futuro decorrente da lesão resultante do acidente como se o Autor não mais pudesse trabalhar na sua profissão ou noutra qualquer compatível com as suas aptidões e habilitações. Por isso justifica-se que, tomando por referência, o valor do salário mínimo que o Autor provou auferir, se considere a sua lesão na proporção definida em 45% (défice funcional permanente da integridade físico-psíquica), sendo esse o valor pelo qual a Ré deve responder.

Com os elementos dos autos, esse valor deveria ser definido nos moldes definidos no Acórdão recorrido e que, na nossa avaliação também seriam justificados nos termos que se indicam:

- Esse valor será devido pelo período de tempo entre a data do acidente e a idade de 78 anos (esperança média de vida masculina), atualizando-se o valor do salário mínimo anual conforme se encontra legalmente estabelecido para a atividade agrícola, o que envolve um valor estimado próximo de 140.000,00  [valor anual = 8640 x 45% (3.888 ano) x 30 anos = 117.000,00, sujeito a atualização], pois com esse valor o Autor obterá um capital produtor de rendimento que se esgotará no final do período considerado.

- A esse valor deve acrescer um valor estimado – por equidade – do rendimento obtido na produção própria, que deixa de ser obtido, e que se considera adequadamente fixado na ordem de 100 euros/mês (€36.000,00, atualizado com a inflação), fixado com recurso à equidade em €40.000,00.

E porque o valor é devido de uma só vez e, no momento atual, a situação económica e financeira em termos de mercado monetário ainda não se traduz num aumento da taxa de juro das poupanças dos particulares, porque os bancos portugueses ainda não refletiram na remuneração dos depósitos a prazo o aumento das taxas de juro que estão a aplicar à concessão de crédito – não obstante a inflação estar elevada (8%, sensivelmente) – não há motivos para efetuar qualquer desconto ao valor global apurado.

Tendo o Tribunal da Relação chegado ao mesmo valor que se apurou neste Tribunal (€180 000,00), com a justificação que aqui se expressou, não existem motivos para considerar que há qualquer erro jurídico que deva ser corrigido.

Mais se diga: o Tribunal da Relação analisou e contraditou cada um dos argumentos do Recorrente sobre o erro no cálculo da indemnização e utilizou os critérios habituais da jurisprudência na fixação do valor indemnizatório segundo a equidade, usando fórmulas apenas como ponto de partida, para logo as corrigir com os elementos usuais – inflação, esperança média de vida do homem, valor do salário provado, conhecimentos e habilitações do profissional, desconto por antecipação, etc.

Em síntese, a decisão recorrida é respeitadora das normas legais aplicáveis e oferece uma compensação justa e equitativa do dano sofrido pelo Autor, pelo que deve ser confirmada, encontrando-se em linha com a jurisprudência do STJ nas situações em que não há incapacidade total e permanente, não sendo aplicáveis ao caso as orientações jurisprudenciais citadas pelo Recorrente relativas a casos em que ocorria uma equivalência entre o dano e a incapacidade total e permanente.


Deste modo, o recurso tem de improceder


IV. Decisão

Posto o que precede, acorda-se em negar a revista, e, consequentemente, em manter o Acórdão recorrido.

Custas pelo Recorrente (sem prejuízo do apoio judiciário concedido).


Lisboa, 28 de fevereiro de 2023


Pedro de Lima Gonçalves

Maria João Vaz Tomé

António Magalhães