JUNÇÃO DE DOCUMENTOS COM A MOTIVAÇÃO DE RECURSO
EXTEMPORÂNEO
CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL
TOQUES COM A MÃO NOS OMBROS E NAS COSTAS DE MENOR
Sumário


I- É manifestamente extemporânea a junção de documento com a apresentação da motivação de recurso para o Tribunal da Relação.
II- Comete o crime de importunação sexual p. e p. pelo artigo 170º do Código Penal o arguido que, com insistência e reiteração, sem qualquer justificação e sempre aproveitando a distração do pai da menor, toca com a sua mão nos ombros e nas costas de menor de 14 anos de idade, por configurar contactos de natureza sexual suscetíveis, de criar uma situação de constrangimento, de limitação ou anulação da vontade da vítima e contenderem com a liberdade de ação e decisão da mesma, tendo, aliás, sido essa a sua intenção.

Texto Integral


 Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

No processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, com o nº 182/19.... do Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Criminal ... - Juiz ..., realizado julgamento, foi proferido acórdão no dia 26 de Setembro de 2022, depositada no mesmo dia, em que foi decidido (transcrição):

“Por todo o exposto, acordam os Juízes que integram o Tribunal Colectivo do Juízo Central Criminal ...:

a) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso sexual de crianças, p. e p. no art.º 171.º, n.º 3, al. a), do Código Penal, de que vinha acuado;
b) Convolar a conduta do arguido descrita na acusação pública e assim, condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de importunação sexual previsto no art. 170º do C. Penal, na pena de 6 meses de prisão;
c) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de setenta e dois crimes de abuso sexual de crianças, ps. no art.º 171.º, n.º 1 e 2, do Código Penal, de que vinha acusado;
d) Convolar parcialmente a conduta do arguido descrita na acusação pública e assim, condenar o arguido AA pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de 87 crimes de recurso à prostituição de menores, p. e p. pelo art. 174.º, n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um dos crimes;
e) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de coação sexual agravado, p. e p. nos arts.º 163.º, n.º 2 e 177.º, n.º 1, al. c), ambos do Código Penal, de que vinha acusado.
f) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de perseguição, p. e p. no art.º 154.º-A, n.º 1, do Código Penal, de que vinha acusado.
g) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de pornografia de menores, p. e p. no art.º 176.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão;
h) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de coacção sexual, p. e p. pelo artigo 163º nº 1 do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão;
Em cumulo jurídico das referidas penas de prisão, ao abrigo do disposto nos artigos 77º do Código Penal na pena única de 8 (oito) anos de prisão.
i) Condenar o arguido AA no pagamento das custas do processo, e individualmente na taxa de justiça que se fixa em 4 UC (artigos 513º nºs 1 a 3, 514º, 524º do Código de Processo Penal e art. 8º nº 9 do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-lei nº 34/2008 de 26/02 por referência à tabela III), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que possa usufruir.
j) Condenar o arguido AA a pagar à assistente BB a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros), a título de indemnização civil pelos danos não patrimoniais perpetrados com os crimes cometidos, quantia a que acrescerão juros de mora a contar da data deste acórdão à taxa legal de 4%, até efectivo e integral pagamento;
k) Condenar o arguido nas custas do pedido de indemnização civil, (artigo 4º nº 1 alínea n) do RCP), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que possa usufruir.

Inconformado com tal acórdão, dele veio o arguido, interpor o presente recurso, apresentando a respectiva motivação que finalizou com as conclusões e petitório que a seguir se transcrevem:

I. O objecto do presente recurso reconduz-se, essencialmente, à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, cuja alteração, nos termos que seguidamente se expõem, impõe, necessariamente, uma diferente subsunção ou qualificação jurídica dos factos que devem ser dados como provados.
II. O presente recurso tem como motivação, nos termos do n.º 1 e das alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, quer o erro notório na apreciação da prova, quer a insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto provada.
III. A decisão do tribunal recorrido de considerar provados os factos 3 a 8 teve como fundamento, essencialmente, quer as declarações da assistente, quer as declarações do pai desta, quer a confissão do arguido.
IV. Relativamente a estes factos e, concretamente, quanto às zonas do corpo que ale-gadamente foram tocadas pelo arguido, sempre há a referir que, da transcrição das declarações prestadas pela assistente, nas páginas 6 a 8, resulta que a menor reconheceu que as partes do corpo que foram tocadas pelo arguido foram as costas, os ombros e a barriga. A assistente jamais referiu que fosse tocada “à volta do peito”.
V. Das declarações prestadas pelo arguido, na audiência que teve lugar no dia 16 de Setembro de 2022, cujo início ocorreu pelas 09:58:58 horas e termo pelas 10:48:15 horas, gravadas sob o ficheiro n.º 20220916095857_1420542_2871879, resulta a confissão de que apenas tocou no ombro da menor e nada mais (cfr. entre os 09m00s e os 09m33s), razão pela qual não se pode admitir que o arguido confessou que tocou nas costas, na barriga e, muito menos, à volta do peito.
VI. Quanto às datas da ocorrência dos factos, plasmadas nos referidos factos dados como provados, a assistente jamais referiu quais eram os clubes de futebol intervenientes no jogo, o dia ou a data do jogo, como se retira da transcrição das suas declarações de folhas 6 a 9; já o pai da assistente, CC, não identificou os clubes de futebol intervenientes no jogo, nem o dia da semana em que ocorreu o facto (cfr. depoimento entre os 21m45s e os 22m50s, bem como entre os 23m50s e os 24m31s); o arguido também não referiu o dia da semana em que foi o jogo em causa entre o ... e o ... (cfr. depoimento entre os 04m50s e os 05m27s), pelo não poderia o tribunal recorrido assentar que foi referido, pelas anteditas pessoas, que o jogo ocorreu num sábado.
VII. Durante as declarações, nessa parte, o arguido esclareceu que o jogo teve lugar no ano de 2018, sendo facto notório que os jogos da 1.ª divisão, entre o ... e o ..., em que este último clube de futebol veio jogar em ..., tiveram lugar nos dias 27 de Setembro de 2018, 14 de Agosto de 2017, ... de 2016 e 13 de Dezembro de 1998.
VIII. Os factos em causa nestes autos, nomeadamente os descritos nos referidos pontos 3 a 8 da matéria de facto como provada, tiveram necessariamente de ocorrer após o jogo de futebol entre as referidas equipas no ano de 2018 e na data constante da anterior conclusão.
IX. Resulta do facto provado sob o n.º 17 que os factos imputados ao arguido ocorreram numa carrinha de marca ..., modelo ..., de cor ..., com a matrícula ..-FJ-.., como foi confirmado quer pela assistente, quer pelo seu pai.
X. Ora, a verdade é que o arguido apenas adquiriu a referida carrinha de marca ..., branca, em finais do ano de 2017, tendo o registo a seu favor ocorrido em 29 de Novembro de 2017, como resulta do registo de propriedade que se junta sob o Documento n.º ....
XI. Acontece que, após a data da aquisição do referido veículo pelo arguido, o jogo de futebol que teve lugar em ..., entre o ... e o ..., ocorreu em 27 de Setembro de 2018, como é facto notório.
XII. Só a partir desta data, em face de inexistência de outro elemento de prova concreto, poderia o tribunal fixar o início da relação entre o arguido e a assistente.
XIII. É que, além de o arguido ter afirmado que os factos só se iniciaram em 2018, da transcrição do depoimento da assistente, na página 21, resulta que a mesma, perguntada sobre a idade que o arguido tinha à data dos factos, afirmou: “Não sei se era cinquenta e seis para aí”.
XIV. Ora, tendo o arguido nascido em .../.../1962, e tendo cinquenta e seis anos de idade quando iniciou as relações sexuais com a assistente, resulta claro que os factos se reportam, necessariamente, ao ano de 2018.
XV. Um outro elemento probatório que situa a prática dos factos no ano de 2018 e que também foi descurado pelo tribunal, resulta das declarações do pai da assistente, quando foi ouvido na qualidade de arguido e cujas declarações foram lidas em audiência de julgamento, nas quais afirmou :“Quando a sua filha começou a ter dezasseis anos iam a ... e ele deixava-o num café e seguia com a sua filha. Passado pouco tempo vinha com a sua filha e iam almoçar ao meio dia”.
XVI. Ora, tendo a assistente nascido em .../.../2002, daí resulta, necessariamente, que as idas para ... só ocorreram em 2018, pois apenas nesse ano completou dezasseis anos.
XVII. Aquela matéria de facto, tal como foi assentada pelo tribunal recorrido, carece totalmente de prova e baseia-se em meras suposições e extrapolações e, em nome do princípio do in dubio pro reo, não poderá ser dada como provada outra matéria de facto que não a que com este recurso se pretende assentar, nos termos infra.
XVIII. Assim, impunha-se uma decisão diferente quanto aos factos dados como provados, nos termos seguintes: 3. No dia 26 de Setembro de 2018, o arguido AA convidou CC para ir com ele à cidade ..., no dia seguinte, para verem um jogo de futebol entre o clube local e o ..., pedindo-lhe que levasse com ele a filha; 4. No dia 27 de Setembro de 2018, o arguido transportou a menor BB e o pai dela num veículo ligeiro de mercadorias, até à cidade ...; 6. Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros e nas costas da Assistente; 7. Após chegarem a ..., foram os três para um café ver o jogo de futebol; 8. Aí o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros e costas da menor sempre que o pai dela estava distraído.
XIX. Quanto à data em que ocorreu o primeiro acto sexual entre o arguido e a assistente, entendeu o tribunal recorrido, tal como se retira dos factos provados 12 a 14, que o mesmo ocorreu logo no dia 8 de Outubro de 2016 e, assim, quinze dias depois de ter sido feita a viagem a ... para ver o jogo de futebol, estribando-se nas declarações para memória futura da assistente, a qual, alegadamente, terá confirmado estes factos e referiu que os mesmos ocorriam aos fins-de-semana, com frequência quinzenal.
XX. Tal não corresponde necessariamente à verdade, pois, conferida a transcrição do depoimento da assistente, resulta que a mesma, perguntada quando foi a primeira vez, esclareceu que foi na carrinha (cfr. página 15 da transcrição) e, mais adiante, perguntada sobre a frequência dos contactos sexuais, a assistente esclareceu que os mesmos não aconteciam todas as semanas, mas com intervalos de “Para aí de 15 em 15 dias ou mais, não sei” (cfr.página 33 da transcrição). E, perante a incerteza expressada pela assistente, foi-lhe perguntado se seria uma média de quinze em quinze dias, tendo a mesma dito que sim.
XXI. Ora, uma coisa é ser uma média de quinze em quinze dias. Outra bem diferente é ser, de facto, de quinze em quinze dias, sendo de censurar o entendimento professado pelo tribunal, já que estamos perante factos que consubstanciam crimes em concurso efectivo e não um mero crime continuado ou de trato sucessivo.
XXII. Não se pode, por isso, aceitar que sejam dados como provados os factos 12 e 16 na redacção constante do acórdão recorrido.
XXIII. Dificilmente se concebe que, quem quer que seja, tendo saído pela primeira vez com uma jovem e sem manter uma relação de proximidade, no dia-a-dia, com a mesma, logre obter o consentimento para a prática de actos sexuais, passados quinze dias, da segunda vez que se encontram.
XXIV. Certamente que esse consentimento apenas ocorreu após algumas saídas da assistente com o arguido e o seu pai, e, em função de tais regras da experiência comum, mesmo que se assente que o arguido e a assistente saiam de carrinha todos os quinze dias, sem falta, ao fim-de-semana, seria de pressupor que o primeiro contacto sexual ocorreria apenas passadas duas saídas e, assim, em 27 de Outubro de 2018.
XXV. Nessa senda, se contabilizarmos todos os quinze dias desde 27 de Outubro de 2018 até ao 20 de Abril de 2019 (facto n.º 22), temos que, em média, o arguido e a assistente tiveram, no máximo, doze encontros na carrinha.
XXVI. E se cuidarmos que, de acordo com as palavras da assistente, essas saídas ocorreram, algumas vezes, mais do que de quinze em quinze dias, resulta que o número de encontros na carrinha foi menor, não sendo assim tão evidente, como professa o tribunal recorrido na página 12 do acórdão, que o pai “estaria equivocado”, quando referiu que saíram os três de carrinha umas quatro ou cinco vezes.
XXVII. Não se pode, por isso, aceitar que seja dada como assente a factualidade vertida nos factos provados 20 a 23, com a redacção constante do acórdão recorrido.
XXVIII. Por outro lado, a assistente refere que os encontros no anexo da sua casa ocorriam ao fim-de-semana (cfr. página 21 da transcrição) - até porque o arguido trabalhava durante a semana -, mas tal não significa que os encontros acontecessem todos os fins-de-semana, nem tal foi precisado pela assistente, a qual referiu que aconteceu “várias vezes”, sem precisar o número, “explicando que o arguido lhe ligava quando via os pais dela a sair de casa" (cfr. página 22 da transcrição).
XXIX. Para decidir que o arguido manteve relações sexuais com a assistente uma vez por semana desde Dezembro de 2018 até Abril de 2019, o tribunal fez apelo ao depoimento da mãe da assistente, que declarou ter surpreendido a menor a ter relações sexuais com o arguido em Dezembro (há quatro anos - o que seria em 2018), no anexo da casa de habitação e que fez queixa à guarda nessa altura. Ora, tal circunstância causa muita estranheza. Com efeito, se a mãe da assistente foi fazer queixa à guarda, como alegou, percebe-se mal que o processo apenas se tenha iniciado passados mais de quatro meses e por iniciativa dos vizinhos DD e mulher EE.
XXX. O único depoimento que, de facto, merece credibilidade a propósito destes factos, foi o prestado pela testemunha DD, nos termos alegados.
XXXI. Por outro lado, percebe-se mal que o tribunal recorrido tenha dado como provado que os encontros na carrinha aconteceram todos os quinze dias a acumular com os encontros no anexo todas as semanas, tratando-se de uma mera suposição, sem suporte fáctico bastante.
XXXII. De acordo com as regras da experiência comum, certamente nas alturas em que os encontros ocorriam na carrinha, não teriam de ser repetidos no anexo, pelo que é mais razoável pressupor que os encontros no anexo ocorriam nos fins-de-semana em que não saiam de carrinha.
XXXIII. Esta “média” é a que mais sentido faz: encontros, em média, de quinze em quinze dias na carrinha, e encontros, em média, de quinze em quinze dias no anexo, em fins-de-semana alternados.
XXXIV. O que significa que, entre Dezembro de 2018 e 20 de Abril de 2019, os contactos sexuais entre o arguido e a assistente, no anexo, não foram mais do que dez.
XXXV. Assim, em face de tudo quanto se expôs, impõe-se uma decisão diferente sobre a matéria de facto, devendo ser alterada a resposta aos factos elencados infra, nos seguintes termos:
3. No dia 26 de Setembro de 2018, o arguido AA convidou CC para ir com ele à ci-dade de ..., no dia seguinte, para verem um jogo de futebol entre o clube local e o ..., pedindo-lhe que levasse com ele a filha.
4. No dia 27 de Setembro de 2018, o arguido transportou a menor BB e o pai dela num veículo ligeiro de mercadorias, até à cidade ....
6. Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros, costas e barriga da menor.
7. Após chegarem a ..., foram os três para um café ver o jogo de futebol.
8. o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros e costas da menor sempre que o pai dela estava distraído.
12. Assim um mês depois do episódio descrito em 4 a 8, ou seja, em 27/10/2018, o arguido formulou o propósito de praticar atos sexuais com a menor BB.
20. O arguido agiu desta forma com uma periocidade quinzenal até 20 de Abril de 2019.
21. O arguido praticou os factos acima descritos pelo menos 12 vezes.
22. Não provado.
23. Não provado.
24. Para além das viagens efectuadas aos fins de semana, com ela e com o pai dela, em data não concretamente apurada mas seguramente no início de Dezembro de 2018, o arguido passou a deslocar-se, também, pelo menos, a cada quinze dias e até ao dia 20 de abril de 2019, a um anexo da residência da menor, situada no Bairro ..., em ..., após combinação prévia com a mesma.
28. O arguido agiu da forma descrita nos artigos 24 a 27 pelo menos 10 vezes.
29. Num dia não concretamente apurado mas seguramente situado entre 27 de Outubro de 2018 e 20 de Abril de 2019 o arguido tirou seis fotografias ao corpo da menor BB totalmente despido nas quais a retratou a sua vagina, seios e nádegas.
39. Não provado.
40. O arguido quis, como conseguiu, manter relações sexuais de cópula completa com a menor, pelo menos durante 12 vezes na viatura automóvel e da forma supra descrita, quando sabia que ela tinha idade compreendida entre 16 e os 17 anos.
41. O arguido quis, como conseguiu, manter relações sexuais de cópula completa, pelo menos durante 10 vezes no anexo da residência da menor e da forma supra descrita, quando sabia que ela tinha idade compreendida entre 16 e 17 anos.
42. O arguido quis utilizar a BB em fotografias pornográficas e retratar os seus seios, vagina e nádegas sem roupa, quando sabia que ela tinha idade compreendida entre 16 e 17 anos.
XXXVI. Quanto ao enquadramento jurídico desses factos, com a redacção alterada
 nos termos supra explicitados, deverá o mesmo ser diferente.
XXXVII. Assim, quanto aos factos provados sob os números 3 a 8, dificilmente os mesmos podem ser reconduzidos ao tipo objectivo previsto no artigo 170.º do CP, pois os toques são perfeitamente aceitáveis no trato social e normal, dificilmente podem ser vistos como uma formulação de propostas de teor sexual ou como um constrangimento a contacto de natureza sexual, tanto mais que não foi dado como provado que, aquando dos toques no corpo da assistente, fossem formuladas quaisquer propostas ou ditas quaisquer palavras de conteúdo sexual.
XXXVIII. Pelo que deve o arguido ser absolvido da prática do crime de importunação sexual de que foi acusado, devendo igualmente manter-se, porque correcta, a absolvição, quanto aos factos descritos em 3 e 8, da prática do crime de abuso sexual de criança.
XXXIX. Já quanto à factualidade prevista nos pontos 12 a 28, com a redacção alterada nos termos supra, entende-se que a mesma é susceptível de integrar o crime de recurso a prostituição de menores, nos termos previstos e punidos nos n.os 1 e 2 do artigo 174.º do CP, bem como nos termos constantes do acórdão recorrido, com excepção do número de vezes em que o crime foi consumado, o qual é de apenas vinte e duas vezes e não de oitenta e sete vezes.
XL. Assim, por tais factos, deverá o arguido ser condenado, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, pela prática de vinte e dois crimes de recurso a prostituição de menores.
XLI. No que tange ao enquadramento jurídico dos demais factos, entende-se que o acórdão proferido não admite censura, aceitando-se, assim, nos seus precisos termos.
XLII. No que se refere à medida concreta da pena correspondente a cada um dos crimes praticados, entendeu o tribunal recorrido fixar tais penas numa medida correspondente a metade da moldura penal abstractamente aplicável.
XLIII. Todavia, deve entender-se que tais penas são excessivas.
XLIV. De facto, a gravidade dos factos que efectivamente aconteceram é, claramente, mais diminuta; a assistente já tinha mais de dezasseis anos, tendo uma idade que, legalmente, lhe permite contrair matrimónio, ter liberdade religiosa e também, em certa medida, autodeterminação sexual.
XLV. Pelo que, por cada crime de recurso à prostituição de menores, considera-se proporcional, necessária e adequada a pena de um ano de prisão.
XLVI. As considerações supra expendidas valem, mutatis mutandis, para os crimes de pornografia de menores e de coacção sexual.
XLVII. Operado o cúmulo jurídico destas penas, entende-se que, valorando os ilícitos perpetrados, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relação com a personalidade do arguido, deveria este ser condenado na pena única de cinco anos de prisão, suspensos na sua execução por igual período, nos termos do artigo 50.º do CP, com sujeição a um regime de prova, nos termos do artigo 53.º, n.º 4, do mesmo diploma legal, uma vez que o arguido se revelou arrependido, bem como se encontra social, familiar e profissionalmente inserido, inexistindo um risco de incorrer na prática de ilícitos do mesmo tipo.
XLVIII. Por último, tendo por base a redução significativa do número de crimes em que o arguido deverá ser condenado, nos termos acima expostos, imediatamente se conclui ser excessivo e desproporcionado o quantum indemnizatório de €15.000,00 (quinze mil euros) atribuído pelo tribunal recorrido à assistente, impondo-se, outrossim, a redução do mesmo para quantia não superior a €5.000,00 (cinco mil euros).
XLIX. A decisão recorrida carece de prova que a sustente, não tem correspondência com os meios de prova produzidos e gravados, viola as regras de experiência comum e da lógica, não se apresenta devidamente fundamentada, apresenta contradições entre a fundamentação e a decisão, erra notoriamente na apreciação da prova produzida, violando, entre outros, os artigos 374.º, n.º 2, e 410.º, n.º 2, a contrario, do CPP, os artigos 71.º e 170.º do CP, bem como o artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do artigo 4.º do CPP, e ainda o princípio constitucional do in dubio pro reo, consagrado no artigo 32.º, n.º 2, da CRP.”

O Mº Público em primeira instância respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência e, em consequência, pela manutenção do acórdão recorrido, apresentando a final as seguintes conclusões (transcrição):

“1-O âmbito do recurso retira-se das respectivas conclusões as quais por seu turno são extraídas da motivação da referida peça legal, veja-se por favor a título de exemplo o sumário do douto Acórdão do STJ de  15-4-2010, in www.dgsi.pt,  Proc.18/05.7IDSTR.E1.S.
2- Como decorre do artigo 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso.
É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso.
3- São assim, as conclusões quem fixam o objecto do recurso, artigo 417º, nº3, do Código de Processo Penal.
4- O arguido tem antecedentes criminais, tendo já sido condenado por crimes de natureza similar.
5- Toda a prova considerada nos autos respeitou os dispositivos contidos nos arts.124º a 127º, do Código de Processo Penal.
6- Na motivação do Douto Acórdão descrevem-se de modo claro as razões de o Tribunal “a quo” ter considerado provados todos os factos que levaram à condenação do arguido, não se vislumbrando por não existirem quaisquer circunstâncias para dar tal matéria como não provada…ou alterada.
7- O "erro notório na apreciação da prova”, invocado pelo recorrente vem sendo entendimento unânime da doutrina e jurisprudência que ele apenas se terá como verificado em apertadas circunstâncias”. Erro notório na apreciação da prova é aquele que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta (Simas Santos e Leal Henriques, C.P.P. Anotado, I, 554) e traduz uma desconformidade do facto apurado com a prova.
8- Toda a matéria de facto dada como provada no Douto Acórdão se provou sem qualquer excepção.
9- Esmiuçado o Douto Acórdão, extrai-se que a matéria de facto dada como provada é bastante para alicerçar a solução de direito encontrada, não deixando qualquer margem para que procedam os desígnios do recorrente.
10- O Tribunal “a quo” não teve dúvidas sobre a génese e sucessão dos factos dados como provados, e por tal não houve lugar à aplicação do princípio do “in dubio pro reo”, nem em sede de recurso deverá ocorrer essa aplicação, por falta de base factual e legal que o permitam.
11- Dever-se-ão manter as qualificações jurídicas que o Tribunal “a quo” apôs aos factos dados como provados, bem como as condenações por todos os crimes pelos quais foi o recorrente
condenado em 1ª instância, assim como as penas parciais e única devem persistir.
12- Não foi pelo Douto Acórdão violado qualquer disposição europeia, constitucional ou criminal, e também não está inquinado de nenhum vício, em especial, não ocorreram os previstos no art.410º, nº2, ou 412º do Código de Processo Penal.
13- O arguido vem questionar a medida das penas e pretende que lhes sejam diminuídas as penas parcelares e única.
14- Ponderou o Douto Acórdão todas as circunstâncias que pesavam a favor e contra o arguido e teve o Tribunal “a quo” linha de conta para a escolha e medida das penas parcelares e única a que foi condenado o arguido em 1ª instância, tudo o que preceituam os artigos 40º, 70º e 71º, do Código Penal, conjugados com os factos que se provaram em audiência de julgamento.
15- Estando as penas, em sintonia com a culpa do arguido e não tendo sido esquecida sua reintegração social.”

Também a assistente respondeu ao recurso, pedindo a sua improcedência e, em consequência, a manutenção do acórdão recorrido, apresentando a final as seguintes conclusões (transcrição).
“1- O recorrente AA na motivação apresentada visa a reapreciação da matéria de facto e a de direito a ela inerente.
2- O inconformismo do arguido, com a sua condenação na D. Sentença, determinante do presente recurso, tem incidência sobretudo ao nível da sua componente factual que determinou a condenação, para além de outros, de um crime de importunação sexual previsto no art. 170º do C. Penal.
3- O arguido pugna, pois, pela revogação da d. Sentença alegando que o presente recurso tem como motivação, nos termos do nº1 e das alíneas b) e c) do n.º2 do artigo 410 do CPP, quer o erro notório na apreciação da prova, quer a insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto provada.
4- Face ao recurso interposto a ora assistente tem como certo e adquirido que o D. Acórdão recorrido assume uma posição decisória inatacável, porque sustentada em juízos corretos, que fazem do caso em apreço uma leitura consentânea com a prova produzida em Audiência de Julgamento e sem mácula no plano processual e substantivo.
5- Ao contrário dessa justeza de análise, na vertente abordada pelo recorrente percebe-se que o mesmo tem perante o problema jurídico “sub judice” uma visão desfocada, porque obtida de um ângulo que lhes não favorece um olhar claro, objetivo e neutral.
6- Condenar o arguido supra referido pela prática dos crimes, nos seus precisos termos, foi o mais justo e esperado pelo Juízo do D. Tribunal, pois, as provas carreadas para o processo são irrefutáveis e abundantes, encontrando-se, devidamente esplanadas as razões porque o Tribunal a quo deu tais factos como provados.
7- Pretendendo o arguido ”ludibriar” o Tribunal, ao afirmar que o mesmo não poderia ter dado como provados os factos que constam da D. Sentença.
8- Tal pretensão está condenada ao fracasso, uma vez que a Mma Juiz a quo fundamentou devidamente cada um dos factos dados como provados, cimentando a sua decisão, em todos os elementos que constam dos autos, declarações da ofendida, testemunhas, relatórios, declarações do arguido e que permitiram ao D. Tribunal decidir com a certeza suficiente e convicção necessária para poder condenar o arguido nos termos em que o condenou.
9- Na verdade, quem ouvir as declarações para memória futura da menor, BB, bem como quem assistiu ao Julgamento ou quem ouvir integralmente a prova nele produzida, outras conclusões não poderá tirar senão aquelas que efetivamente o Tribunal a quo, e muito bem, plasmou nos factos dados como provados.
10- Pretendendo o arguido em desespero de causa, pretendendo o arguido em desespero de causa, dar o seu “entendimento” ou pretender “ ensinar” como é que o D. Tribunal deveria ter decidido, esquecendo-se de que o Tribunal a quo não teve qualquer dúvida de que o arguido praticou os factos dados como provados que constam da D. acusação pública.
11- De facto, a D. Sentença posta em crise, em nosso entender é rigorosa, assertiva, bem fundamentada e onde são exaustivamente elencadas toda as razões, todos os pontos em que se baseou/fundou a convicção do Tribunal, nomeadamente estribando-se nas próprias declarações e postura do arguido, da menor e das testemunhas arroladas pela assistente e pelo próprio arguido, no registo criminal do mesmo…
12- Assim terão de ser mantidos, na íntegra, todos os factos dados como provados da matéria de facto provada da D. Sentença.
13- Perante tal acervo fáctico dado como provado, é óbvio ter o arguido praticado os crimes pelos quais foi condenado nas suas precisas penas e pelos fundamentos constantes e fundamentados expostos no D. Acórdão recorrido, sendo as penas aplicadas absolutamente adequadas aos crimes praticados e princípios reguladores da culpa e da prevenção geral e especial.
14- Perante a prova produzida é absolutamente consentânea com os factos dados como provados não devendo por isso ocorrer qualquer alteração da matéria de facto, e as penas aplicadas são absolutamente adequadas aos princípios reguladores da culpa e da prevenção geral e especial, pelo que, nenhuma norma foi violada na d. Sentença posta em crise.
15- Sendo a prova de livre apreciação, não pode o tribunal para onde se recorre, sem elementos que formalmente isso determine, aquilatar do “grau de convicção” que na instância recorrida foi dado à prova testemunhal e à prova documental.
16- É entendimento unânime que o Tribunal de recurso não dispõe da relação de proximidade comunicante com os participantes processuais, de modo a obter uma perceção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão, que só o princípio da imediação, intrinsecamente ligado ao da oralidade, assegura.
17- Desta forma, uma vez que o Tribunal a quo analisou a prova produzida, concluindo que os testemunhos em causa, se mostraram convincentes pelos motivos que fez consignar, nenhuma censura lhe poderá ser feita, pois a resposta dada aos factos provados e não provados, foi firmemente sustentada na prova documental e testemunhal, que in casu se mostra adequada face a todos os elementos juntos aos autos.
18-Devendo manter-se na íntegra o D. Acórdão recorrido.
19-Improcedendo o recurso e mantendo-se a decisão recorrida nas suas partes criminal e civil far-se-á Justiça”

Nesta instância, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, emitiu parecer no seguinte sentido:

 -O documento junto com o recurso deve ser desentranhado dos autos e devolvido ao recorrente ou, de qualquer forma, não ser relevado na decisão a proferir;
O recurso deve ser julgado improcedente, porquanto:
-Deverá improceder a existência do vício do erro notório e os seus argumentos serem apreciados em sede de impugnação da matéria de facto, a que também procedeu;
- À excepção de dever ser retirado dos factos provados n.º 6 e 8 a menção “à volta do peito”, por inexistência de prova que a sustente, deve manter-se a restante factualidade impugnada pelo arguido, por este não ter logrado demonstrar, no recurso, que provas impõem uma decisão diferente da adoptada pelo Tribunal Colectivo;
- Ao contrário do invocado pelo recorrente, inexistem fundamentos para se concluir, como pretendido, que os factos subsumíveis aos crimes de prostituição de menores p. e p. no art.º 174.º do Código Penal ocorreram por vinte e duas vezes e que apenas deve ser condenado em conformidade com esse número;
- A pena aplicada ao arguido revela-se criteriosa, ponderada, equilibrada e até bastante benevolente, tendo em conta a culpa do agente e todas as circunstâncias do caso, e bem assim, a moldura penal abstratamente cominada nos tipos legais subsumidos à sua conduta.

Cumprido o disposto no art.º 417º, nº 2, do CPP, não foi apresentada resposta ao parecer emitido.

Colhidos os vistos, procedeu-se à realização da conferência, por o recurso aí dever ser julgado - artigo 419º, nº 3, al. c), do Código de Processo Penal.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1 – OBJECTO DO RECURSO:
A jurisprudência do STJ[1]  firmou-se há muito no sentido de que é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta que se delimita o objecto do recurso, devendo a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas, sem prejuízo do dever de se pronunciar sobre aquelas que são de conhecimento oficioso.[2]

Atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir são as seguintes.

1. Insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto, contradição entre a fundamentação e a decisão e erro notório, vícios previstos, respectivamente, nas als. a), b) e c) do nº 2 do art.º 410º do C. P. Penal;
2. Impugnação da matéria de facto, por erro de julgamento, relativamente à factualidade inserta nos nºs 3 a 8, 12 a 14, 16, 20 a 24, 28, 29, 39, 40, 40, 41 e 42, designadamente por violação do princípio in dubio pro reo;
3. Enquadramento jurídico-penal;
4. Penas parcelares e única excessivas; e
5. Indemnização excessiva e desproporcional.


2- DA DECISÃO RECORRIDA:

Fundamentação de facto e motivação:

“2.1. FACTOS PROVADOS:

Com interesse para a decisão da causa, provaram-se os seguintes factos:
1. O arguido AA conhece o CC, com quem convive no café, por residirem ambos no Bairro ..., em ....
2. O CC é pai da menor BB, nascida em .../.../2002.
3. No dia 23 de Setembro de 2016, o arguido AA convidou CC para ir com ele à cidade ..., no dia seguinte, para verem um jogo de futebol entre o clube local e o ..., pedindo-lhe que levasse com ele a filha.
4. No dia ... de 2016, sábado, o arguido transportou a menor BB e o pai dela num veículo ligeiro de mercadorias, até à cidade ....
5. A menor BB viajou no banco da frente do lado direito do arguido e o pai dela viajou no mesmo banco, do lado direito da filha.
6. Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros, costas e à volta do peito da menor.
7. Após chegarem a ..., foram os três para um café ver o jogo de futebol.
8. Aí o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros, costas e à volta do peito da menor sempre que o pai dela estava distraído.
9. A partir deste dia, o arguido passou a remeter mensagens à menor através do telemóvel no decurso das quais lhe dizia que gostava dela e que ela era bonita.
10. E passou também a convidar o CC a ir com ele, aos sábados, quinzenalmente, a supermercados, a espaços comerciais e a cafés situados nas cidades de ..., ..., ... ou ....
11. O arguido pedia sempre ao CC que trouxesse a sua filha BB com ele, ao que este acedia.
12. Assim quinze dias depois do episódio descrito em 4 a 8, ou seja, em 08/10/2016, o arguido formulou o propósito de praticar atos sexuais com a menor BB.
13. Assim, o arguido transportou a menor BB e o pai dela no seu veículo automóvel até à cidade ... ou de ... onde, após lhe ter dado quantia monetária não concretamente apurada, mas seguramente entre € 5 a € 10, deixou o último num café, dizendo-lhe que ia dar uma volta com a filha.
14. A seguir, o arguido AA transportou a menor BB no seu veículo automóvel para um local deserto, onde imobilizou a marcha, pediu-lhe para entrar para o interior da bagageira e deitar-se num colchão coberto com cobertores, tendo toalhas a tapar as janelas, pediu-lhe para tirar a roupa, ao que ela obedeceu ficando totalmente despida, tirou a roupa dele, deitou-se sobre o corpo da menor, beijou-a na boca e face, introduziu o seu pénis erecto na sua vagina, sem preservativo e efectuou movimentos de vai e vem até ejacular no exterior daquela.
15. A menor BB era virgem, nunca tendo mantido antes relações sexuais com quem quer que fosse.
16. A partir desta data o arguido passou a transportar com uma periocidade quinzenal, aos sábados, a menor BB e o pai dela para as cidades de ..., ..., ... ou ....
17. Nessas alturas, o arguido entregava quantia monetária não concretamente apurada, mas seguramente entre € 5 a € 10 ao pai da menor BB, deixava-o no café e ausentava-se com esta para locais ermos, onde lhe pedia para tirar a roupa e se deitar no colchão que tinha no interior da bagageira da carrinha de marca ..., modelo ..., de cor ..., com a matrícula ..-FJ-...
18. Depois da menor estar sem roupa o arguido deitava-se por cima dela, dava-lhe beijos na boca e na face, passava-lhe a mão pelo corpo e pelos seios e introduzia o pénis erecto na vagina dela, umas vezes com preservativo e outras vezes sem preservativo, fazendo movimentos de vai e vem até ejacular no exterior da vagina.
19. A seguir, o arguido dava dinheiro à menor ou ia com ela aos espaços comerciais das cidades onde se encontravam, comprava-lhe roupa e calçado novo e pagava-lhe refeições.
20. O arguido agiu desta forma com uma periocidade quinzenal até a menor completar 16 anos de idade, em 06/03/2018.
21. O arguido praticou os factos acima descritos pelo menos 37 vezes.
22. Após a menor completar 16 anos de idade, o arguido continuou a praticar os supra referidos factos, quinzenalmente aos sábados, o que fez pelo menos até 20 de Abril de 2019.
23. Assim, nesse período temporal, o arguido praticou os factos pelo menos 30 vezes.
24. Para além das viagens efectuadas aos fins de semana, com ela e com o pai dela, em data não concretamente apurada mas seguramente no início de Dezembro de 2018, o arguido passou a deslocar-se, também, pelo menos, uma vez por semana e até ao dia 20 de abril de 2019, a um anexo da residência da menor, situada no Bairro ..., em ..., após combinação prévia com a mesma.
25. O arguido entrava no anexo referido e esperava pela menor BB, que aí entrava alguns minutos depois e lá permanecia cerca de 30 minutos.
26. O arguido tirava a roupa, pedia à menor que tirasse a roupa dela, deitava-se em cima dela, dava-lhe beijos na cara e na boca, tocava-lhe nos seios e nas coxas, massajava-lhos e introduzia o pénis erecto na vagina dela, onde efectuava movimentos de vai e vem até ejacular no seu exterior.
27. Em contrapartida pelos favores sexuais que a menor lhe prestava o arguido entregava-lhe dinheiro, comprava artigos de vestuário e de calçado ou pagava-lhe refeições.
28. O arguido agiu da forma descrita nos artigos 24 a 27 pelo menos 20 vezes.
29. Num dia não concretamente apurado mas seguramente situado entre 08 de Outubro de 2016 e 20 de Abril de 2019 o arguido tirou seis fotografias ao corpo da menor BB totalmente despido nas quais a retratou a sua vagina, seios e nádegas.
30. O arguido tirou ainda uma fotografia onde retrata a sua cara a dar um beijo na cara da menor.
31. Em dia não concretamente apurado mas situada entre os dias 21 e 25 de Abril de 2019 o arguido propôs à menor BB manterem relações sexuais.
32. Porque ela se recusou a fazê-lo, o arguido remeteu-lhe as seguintes mensagens para o seu telemóvel: “Atão vou por as tuas fotos nuas no feicebuk o pior vai ser para ti Vou-te por anvergonha Sua puta amanhã vou mostrar ao teu pai. E no café vou ânvia las para o feicebok Hoje estamos juntos as 10*33 eu dou-te 10 euros ok Atão estamos juntos Sua puta agora a que vou por Se fazes sexo comigo também não fazer com mais ninguém já os dias contados Tu amanhã só vais ver Vai a puta que te pariu. Sua puta sua reca”.
33. Com muito medo de que o arguido concretizasse o por ele afirmado, após o envio das mensagens referidas em 32 e no período temporal referido em 31, a menor BB acedeu em ir com ele e com o pai dela.
34. Assim, o arguido levou o CC, pai da BB para um café, deu-lhe quantia não concretamente apurada mas seguramente entre € 5 e € 10,00 e foi com a última para um lugar ermo, onde manteve com ela, na bagageira do seu veículo automóvel, relações sexuais de cópula completa, introduzindo o pénis na sua vagina, com movimentos de vai e vem até ejacular para o seu exterior.
35. A BB só acedeu em manter esta relação sexual com receio de que o arguido divulgasse as fotografias que retratam a sua vagina, seios e nádegas no facebook ou as mostrasse ao seu progenitor ou a atacasse, tal como lhe havia anunciado.
36. Porque os contactos sexuais do arguido com a menor BB chegaram ao conhecimento do Tribunal ..., esta última acabou por ser institucionalizada na Santa Casa da Misericórdia ... onde se manteve até ao mês de Julho de 2020, sem que tivesse qualquer contacto com aquele.
37. Por ter atingido a maioridade e ser essa a sua vontade, em finais do mês de julho de 2020, a BB regressou para casa dos seus progenitores, situada na cidade ....
38. O arguido teve sempre perfeito conhecimento da idade da BB.
39. Ao agir da forma descrita em 6 e 8 o arguido fê-lo com o propósito concretizado de constranger a menor BB a contactos de natureza sexual.
40. O arguido quis, como conseguiu, manter relações sexuais de cópula completa com a menor, pelo menos durante 67 vezes na viatura automóvel e da forma supra descrita, quando sabia que ela tinha idade compreendida entre 14 e 17 anos.
41. O arguido quis, como conseguiu, manter relações sexuais de cópula completa, pelo menos durante 20 vezes no anexo da residência da menor e da forma supra descrita, quando sabia que ela tinha idade compreendida entre 16 e 17 anos.
42. O arguido quis utilizar a BB em fotografias pornográficas e retratar os seus seios, vagina e nádegas sem roupa, quando sabia que ela tinha idade compreendida entre 14 e 17 anos.
43. O arguido quis, como conseguiu, através da ameaça de que iria divulgar as fotografias com o seu corpo nu nas redes sociais e ao seu pai e de que a iria atacar, constranger a ofendida BB a manter relações sexuais consigo nos termos descritos em 34 a 35 apesar de saber que a mesma, devido à sua idade, era uma pessoa particularmente vulnerável.
44. O arguido sabia que a BB, devido à sua idade, não tinha a capacidade nem o discernimento imprescindível à adopção de uma decisão livre e esclarecida em matéria sexual.
45. Não obstante quis, como conseguiu, violar a integridade, liberdade e autodeterminação sexual e, com isso, prejudicar a sua saúde física e psicológica e atentar contra o seu livre desenvolvimento psicossexual.
46. O arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente e, embora soubesse que tais condutas eram proibidas e punidas por lei não se inibiu de as concretizar.
Do Pedido de Indemnização Civil
47. A BB era uma criança de sensibilidade e comportamento normal para a sua idade.
48. Era saudável, extrovertida, sociável, participativa, alegre e responsável.
49. Em consequência dos comportamentos do arguido tornou-se introvertida, tímida, calada, triste, envergonhada, nervosa, insegura, angustiada e com crises convulsivas de choro.
50. Sentiu-se e sente-se profundamente vexada e humilhada.
51. Sente grande vergonha.
52. Depois dos factos, passou a ter dificuldades em adormecer, e tem frequentemente pesadelos.
53. Continua com ansiedade.
54. A BB carece e vai continuar a carecer de apoio psicológico.
Mais se provou que:
55. O arguido nasceu em .../.../1962 e provém de um agregado familiar constituído pelos pais e quatro irmãos, subsistindo o agregado com os rendimentos da agricultura, que asseguravam a satisfação das necessidades básicas.
56. Completou o 4.º ano de escolaridade, com cerca de 14 anos de idade, passando para o mundo do trabalho, em ..., inicialmente numa vacaria, depois na restauração.
57. Regressou a ..., trabalhando na agricultura, casou e teve três filhos, já adultos.
58. Divorciou-se há quinze anos, passando a residir em ....
59. Passou a trabalhar como cantoneiro e uniu-se de facto com FF, há 12 anos, residindo em casa arrendada por esta em bairro social de ....
60. O arguido é bom trabalhador e respeitador dos seus colegas de trabalho.
61. No âmbito do Proc. nº 220/02...., por acórdão transitado em julgado em 21/09/2004, foi o arguido condenado pela prática dos seguintes crimes:
- prisão de 2 anos e 6 meses pela prática antes 13/02/2002 de um crime de abuso sexual de crianças cometido na pessoa da sua filha GG, p.p pelos art.ºs 172.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal;
- prisão de 2 anos pela prática em 13/02/2002 de um crime de abuso sexual de crianças cometido na pessoa da sua filha GG, p.p pelos art.ºs 172.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal;
- prisão de 2 anos pela prática antes 13/02/2002 de um crime de abuso sexual de crianças cometido na pessoa da sua filha HH, p.p pelos art.ºs 172.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal;
- prisão de 1 ano pela prática antes 11/01/2004 de um crime de abuso sexual de crianças cometido na pessoa da sua filha GG, p.p pelos art.ºs 172.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal;
- prisão de 6 meses pela prática antes 11/01/2004 de um crime de atos exibicionistas cometido na pessoa da sua filha HH, p.p pelos art.ºs 172.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.
- prisão de 3 anos pela prática de um crime de maus tratos a cônjuge;
- inibição do exercício do poder paternal relativamente às suas filhas HH e GG pelo período de 5 anos;
Em cúmulo jurídico na pena única de 5 anos de prisão, julgada extinta em 07/07/2009.

2.2. FACTOS NÃO PROVADOS:

Não se provaram outros factos interesse para a decisão da causa, designadamente que:

a) O arguido conhece CC desde, pelo menos, o ano de 1999.
b) O convite referido em 3 tenha ocorrido num dia não concretamente apurado do ano de 2014, quando a menor BB tinha apenas 12 anos.
c) A viatura referida em 4 era de cor ..., de marca ....
d) Os factos descritos em 10 ocorreram alguns meses após o arguido e a menor se terem conhecido, pelo menos desde que a menor BB fez 13 anos, no ano de 2015.
e) Os factos descritos em 12 ocorreram num sábado indeterminado entre o ano de 2015 e o ano de 2016.
f) Nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas em 16 a 19, o arguido praticou os factos pelo menos 72 vezes.
g) Os factos descritos em 24 a 27 no anexo da residência da menor, tenham ocorrido depois da BB completar 16 anos de idade, no dia 6 de março de 2018 e até ao dia 25 de Abril de 2019.
h) Nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 25 o arguido ali permanecia entre 30 a 60 minutos.
i) O arguido agiu da forma descrita nos artigos 24 a 27 pelo menos 50 vezes.
j) Os factos descritos em 29 e 30 ocorreram no ano de 2019.
k) Os factos descritos em 31 e 32 tenham ocorrido no dia 24 do mês de abril de 2019.
l) Os fatos descritos em 33 a 35 ocorreram em 25 de Abril de 2019 concretamente na cidade ....
m) Desde a data referida em 37 que o arguido, que reside no mesmo bairro, passa em frente à residência da BB no seu veículo automóvel reduzindo a marcha e olhando insistentemente para as suas janelas.
n) O arguido persegue a BB sempre que ela se desloca para o estabelecimento de ensino que frequenta ou para outros locais e envia-lhe beijos.
o) Quando passa pela mãe dela pergunta-lhe pela menor e diz-lhe que não a vai deixar.
p) No dia 10 de outubro de 2020, às 17h40, quando a BB caminhava na Rua ..., em ..., o arguido passou por ela e disse-lhe: “Vem deitar-te comigo”.
q) Os factos descritos em 39 ocorreram quando a menor tinha idade inferior a 14 anos.
r) O arguido quis, como conseguiu, manter relações sexuais de cópula completa, pelo menos durante 72 (setenta e duas) vezes, com a BB quando sabia que ela tinha idade inferior a 14 anos.
s) O arguido quis, como conseguiu, manter relações sexuais de cópula completa, pelo menos durante 50 (cinquenta) vezes com a BB quando sabia que ela tinha idade compreendida entre os 14 e os 17 anos.
t) O arguido quis, como conseguiu, perseguir e assediar a menor BB de modo reiterado e, com esta conduta, causar-lhe medo e afectar a sua liberdade de determinação.
Do Pedido Cível
u) Os colegas de escola da BB comentaram que foi violada e abusada.
v) A BB tem medo de andar na rua porque o arguido a persegue e a ameaça de que há de ser dele.
w) Viu afectado o seu rendimento escolar, pois perdeu concentração nas aulas.
2.3. MOTIVAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO:
A convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica e ponderada da prova produzida em audiência de julgamento e da prova documental e pericial constante dos autos, devidamente conjugada com as regras da experiência comum.
Em audiência de julgamento, o arguido prestou declarações e confirmou parte dos factos descritos na acusação embora ressalvando que tudo teria sucedido quando a menor já tinha 16 anos, em 2018, sendo que foi nessa altura que a conheceu. Assumiu integralmente os factos descritos em 1 a 9 referindo apenas que sucederam em 2018. Relativamente aos factos descritos 10 a 19 assumiu que manteve relações com a menor na carrinha, várias vezes, o que ocorria aos sábados embora não fosse todos os sábados nem de quinze em quinze dias, sempre quando ela já tinha 16 anos. Negou que a menor fosse virgem e que lhe tivesse tirado a virgindade. Quanto aos factos ocorridos no anexo da habitação da menor, assumiu que ali manteve   também relações sexuais com ela mas referiu que foi só uma vez, sendo que era a menor que por diversas vezes o provocava e chamava para fazerem sexo. Justificou a sua conduta com o facto de a menor gostar e querer fazer sexo com ele, sendo que tinha a conivência do pai e da mãe, uma vez que mãe autorizava e entregava a filha para fazer sexo com ele. Disse que o pai bem sabia porque os via a beijarem-se em público.
Assim, os factos descritos em 1 e 2 foram confirmados pelo arguido e pela testemunha CC, pai da menor e bem assim o facto nº 2 resulta da análise da certidão de nascimento junta a fls. 80 dos autos.
Para prova dos factos descritos em 3 a 9 o Tribunal considerou as declarações do arguido que, como supra se referiu, assumiu integralmente tais factos com excepção da data da sua ocorrência, tendo referido terem ocorrido em 2018, quando a menor tinha 16 anos, sendo certo que os mesmos foram também, na sua quase generalidade, confirmados pela menor em declarações para memória futura. Na verdade, a menor em declarações apenas não confirmou o toque à volta do peito e referiu que os toques ocorreram quando estavam de pé, mas sempre temos as declarações do arguido que assumiu os factos nas precisas circunstâncias de modo e lugar referidas na acusação e ainda acrescentou que até perguntou logo à menor se “gostava de fazer sexo”. Quanto ao momento temporal, a menor, o arguido e o pai da menor referiram-se ao jogo ..., pelo que considerou o Tribunal que estariam a referir-se ao jogo do ... com o ... e não com o ..., até porque todos referiram que ocorreu num sábado, sendo que é facto notório e do conhecimento geral que tal jogo ocorreu no Estádio ... em ... de 2016. Em 2014 e 2015 o ... estava na ... divisão e não se descortina que o arguido e o pai da menor sendo de ... (que não de ...) viessem a esta cidade apenas para ver o .... Assim, o Tribunal se convenceu que tais factos ocorreram na referida data, já a menor tinha 14 anos e não 16 como quis o arguido fazer parecer. Aliás, o arguido refere que a menor teria 16 anos e que até pediu o bilhete de identidade ao pai dela e confirmou isso, o que é negado por aquele, nem assume grande credibilidade face às regras da experiência comum.
Relativamente aos factos descritos em 10 a 23 foram os mesmos também confirmados pelo arguido com excepção das datas, tendo o mesmo assumido que tal ocorria aos sábados, na referida carrinha, embora tivesse negado que fossem todos os 15 dias assim como referiu, uma vez mais, que a menor já teria 16 anos. Por sua vez, a menor em declarações para memória futura confirmou estes factos e referiu que os mesmos ocorriam aos fins de semana, com frequência quinzenal (fls. 319). Confirmou igualmente que era virgem e que perdeu a virgindade com o arguido e que tais situações no carro sucederam “até agora” tendo até referido que ao que se lembra, a última vez teria ocorrido na carrinha.
Também o pai da menor CC referiu, em audiência de julgamento, que saiam habitualmente aos sábados, indo para ..., ..., ..., sendo que ficava no café e depois o arguido comprava roupa, ténis à miúda. Esta testemunha referiu que as saídas ocorreram por 5 vezes mas resulta evidente que estaria equivocado, até porque foi referindo ao longo do depoimento que tal ocorreu por diversas vezes, o que foi também confirmado pela mãe da menor, em declarações, II. Esta testemunha referiu que os três saiam muitas vezes, para irem a ..., ..., ..., sendo que sempre que o arguido ligava eles saiam, relatando igualmente que o marido recebia cerca de 10 euros e o arguido comprava roupa e calçado para a menor, sendo que o marido “era muito inocente” e não percebia nada do que se estava a passar. Aliás, o arguido assume que tais factos ocorreram por diversas vezes, aos sábados, embora tenha negado a frequência quinzenal. A testemunha CC, sendo imputável, padece de epilepsia e possui “um funcionamento intelectual na zona da debilidade ligeira”, como resulta do relatório pericial de fls. 374 e ss. Assim, é de aceitar que o mesmo não tenha tido plena consciência dos factos assim como as incongruências verificadas nos períodos temporais registadas nos seus depoimentos, prestados quer em audiência, quer perante o Magistrado do MP, exaradas a fls. 341, em 03/12/2020 e lidas em audiência nos termos do disposto no artigo 356º nº 3 alínea b) do Código de Processo Penal.
Deste modo, o Tribunal decidiu situar a primeira vez em que ocorreram as relações sexuais na carrinha, num sábado, quinze dias depois do dito jogo de futebol, em 08/10/2016, passando as mesmas a correr todos os sábados quinzenalmente até 20 de Abril de 2019, último sábado antes da queixa apresentada pela vizinha EE, ocorrida em 25 de Abril de 2019 (auto de notícia de fls. 114). De resto, a menor refere que as relações se foram mantendo de forma contínua, o que aliás resulta evidente do expediente e fotografias de fls. 198 a 214, sendo de realçar que em 01 de Maio de 2019 após exame realizado pela PJ ao veículo ainda o mesmo possuía na sua parte traseira o colchão, os vidros tapados, as almofadas… e ali foram detectados vestígios de sémen do arguido assim como ADN da assistente num lenço de papel que ali se encontrava também (cfr. exame pericial de fls. 359 e ss.).
Quanto aos beijos na boca a menor diz não se recordar, mas resulta evidente que os mesmos ocorriam na sequência das relações sexuais. O arguido não os negou e a fotografia de fls. 52 retirada do telemóvel do arguido evidencia isso mesmo.
Assim o Tribunal considerou provados os factos descritos em 21 e 23 contabilizando os sábados, de quinze em quinze dias, no período temporal descrito.
Relativamente aos factos descritos em 24 a 28, o arguido referiu que as relações sexuais no anexo da habitação só ocorreram uma vez, nas circunstâncias de modo descritas na acusação, embora reportando a situação a 2018 uma vez mais, quando a menor tinha 16 anos. A menor, em declarações para memória futura, confirma as relações sexuais no anexo da habitação também naquelas concretas circunstâncias de lugar e modo mas não consegue especificar quando começaram e terminaram, o que é perfeitamente natural. Diz, contudo, que foram várias vezes e localiza a última vez no ano passado (sendo que foi ouvida em declarações em 21/01/2020). A mãe da menor, em audiência refere ter surpreendido a menor a ter relações sexuais com o arguido em Dezembro (há quatro anos - o que seria em 2018), sendo que antes disso já desconfiava porque via a porta do anexo sempre mal fechada…
A testemunha EE, vizinha da ofendida e que apresentou a queixa, referiu, com segurança, que via o arguido rondar a habitação duas a três vezes por semana, o que sucedeu em 2018 e 2019, acabando por referir depois que, pelo menos uma vez por semana, ele ia a casa dela, ela abria a porta e ele entrava para o dito anexo. O marido desta testemunha, DD também presenciou essas entradas “às escondidas” do arguido com a ofendida no anexo, o que localizou em 2018/2019 tendo por baliza temporal o momento em que teve uma oficina. E de resto, as duas testemunhas referiram que optaram por fazer a denúncia em Abril de 2018 que até “já se comentava no povo” que o arguido andava a abusar da ofendida, de tantas vezes que lá viam o arguido rondar.
Assim sendo e com a devida segurança, para não prejudicar o arguido, cremos que se deve considerar provado que, pelo menos, desde inicio de Dezembro de 2018 até 20 de Abril de 2019, o arguido estava com a ofendida no anexo a ter relações sexuais, ao menos, uma vez por semana, a acrescer aos episódios na carrinha, que ocorriam aos sábados, quinzenalmente.
Note-se que os pais da ofendida quando questionados sobre o número de vezes que aquela lhes teria contado ter estado com o arguido, referiram 5 vezes (o pai em relação às viagens na carrinha) e 3 vezes (a mãe quanto às relações na carrinha) mas tal não nos mereceu qualquer credibilidade. O pai pelas razões já sobejamente apontadas supra e a mãe, porque ao que nos parece, bem se apercebeu da situação, mas preferiu não a denunciar… e por essas razões “tenta agora sacudir a água do capote”.
Valorou-se igualmente o expediente e fotografias de fls. 208 e ss. tendo sido recolhida uma colcha no anexo da habitação da ofendida, por indicação desta, a qual seria usada aquando das ditas relações sexuais.
Relativamente aos factos descrito em 29 e 30 embora o arguido os tenha negado, por não se recordar deles (como referiu), os mesmos foram confirmados pela ofendida em declarações para memória futura naquelas circunstâncias de modo e resultam evidentes da análise das fotografias retiradas do telemóvel do arguido e juntas a fls. 45 a 52. Relativamente ao momento temporal em que o arguido terá tirado as referidas fotografias, o mesmo não se apurou com certeza, pelo que se considerou que tal terá ocorrido certamente durante todo o período temporal em que o arguido manteve relações sexuais com a menor.
Quanto aos factos descritos em 31 a 35, embora negados pelo arguido, resultam da análise das mensagens retiradas do telemóvel da ofendida a fls. 32 a 34 e foram confirmados pela ofendida que embora não os tenha localizado concretamente no tempo, referiu que a última vez terá sido na carrinha e que teve relações sexuais com o arguido pressionada elas fotos da última vez que esteve com ele (cfr. fls. 317). Assim, o Tribunal considerou que tais factos terão ocorrido entre os dias 21 e 25 de Abril de 2019 uma vez que a queixa apresentada pela vizinha que, cremos nós, terá feito cessar a situação, ocorreu neste dia 25 de Abril de 2019.
Os factos descritos em 36 e 37 foram confirmados pela ofendida e pelas testemunhas JJ e KK, respectivamente Directora Técnica e Psicóloga da ... onde a menor esteve institucionalizada.
Relativamente ao facto descrito em 38, o mesmo é considerado provado atentas as regras da experiência comum e da normalidade dos acontecimentos. De salientar que o arguido manteve relações sexuais com a menor variadíssimas vezes durante quase três anos, ininterruptamente, saiu várias vezes com a mesma e mantinha uma relação de amizade e proximidade com o pai daquela.
Paralelamente, atingiu-se a convicção de que o arguido conhecia as proibições e actuou de forma dolosa, nos termos melhor descritos em 39 a 46.
O elemento subjectivo descrito é por si insusceptível de prova directa, dada a sua natureza, mas sempre o mesmo se extrairia dos factos objectivos provados, que, tendo em conta as regras da experiência comum e com base em presunção natural, permitem de forma segura inferir tal matéria.
O arguido referiu que a menor queria ter sexo consigo, que não era virgem, que o provocava para fazer sexo, como se aquela tivesse capacidade e discernimento para tomar uma decisão livre e esclarecida em matéria sexual. É bem evidente que não, e o arguido sabia-o. É impensável que o arguido, com 54 anos (quando tudo começou) pudesse pensar que uma menor de 14, 15, 16, 17 anos pudesse querer e gostar de ter relações sexuais consigo.
Não fosse desde logo a idade que impedia que a menor tivesse autodeterminação sexual, sendo se diga que a mesma sendo imputável, apresenta um desenvolvimento cognitivo na zona limítrofe, com uma linguagem verbal inferior (cfr. relatório de pedopsiquiatria relativo á menor junto aos autos a fls. 185 a 188), o que arguido também não podia desconhecer, atentas as diversas vezes que esteve com a mesma. Não obstante estas características da menor, o relatório pericial é cristalino em afirmar que a mesma foi segura ao longo de toda a sua narrativa, com discurso fluente ao relatar os episódios de abusos ao perito médico.
Os factos descritos em 47 a 54 relativos às consequências dos abusos deixados na menor BB, resultaram das declarações prestadas pela testemunha LL, assistente social e pelas testemunhas JJ e KK, respectivamente Directora Técnica e Psicóloga da ... onde a menor esteve institucionalizada, que relataram tais factos de forma espontânea, coerente e segura. Mais se considerou o teor do relatório de pedopsiquiatria relativo à menor junto aos autos a fls. 185 a 188.
Para prova dos factos relativos às condições sociais e económicas do arguido e à sua situação familiar, descritos em 55 a 59, teve-se em atenção as declarações prestadas pelo arguido que mereceram a nossa credibilidade nessa parte e bem assim o teor do relatório da DGRSP de fls. 460 e ss. Para prova da idade do arguido valorou-se a cópia do seu cartão de cidadão junta a fls. 35.
Para prova do facto descrito em 60 considerou o Tribunal o depoimento prestado pelas testemunhas MM, NN e OO, colegas de trabalho do arguido que assim o descreveram.
No que se refere aos antecedentes criminais do arguido descritos em 61, o Tribunal considerou o certificado de registo criminal, constante dos autos com a refª ...05 e a certidão de fls. 476 e ss.
No que se refere aos factos não provados, efectivamente, cremos que não foi feita em julgamento, prova cabal e suficiente dos mesmos.
Os factos descritos em a) a f) não foram confirmados pela menor com a certeza que se impõe. Relativamente à idade em que tudo começou, embora aquela tenha referido que os abusos terão começado aos 12, 13 anos o certo e que toda a demais prova não aponta nesse sentido e a mesma acaba por não conseguir localizar temporalmente os factos tendo por referência os anos em que a mesma teria tais idades.
O facto descrito em g) não foi confirmado por ninguém, não se vislumbrando em que medida foi no aniversário da menor que os abusos no anexo terão começado.
Quanto ao facto descrito em h) a menor falou em cerca de 30 minutos assim como a testemunha EE.
Nenhuma prova se fez dos factos descritos em i) a l) sendo que a menor também não confirmou os factos descritos em m) a p), tendo estes sido negados pelo arguido e também pela mãe da ofendida. Por isso também não se provou o facto descrito em t).
Quanto ao facto descrito em q) embora a menor tenha referido que tudo começou com 12, 13 anos, já supra se explicou porque razão não se considerou tal facto provado, aquando da fundamentação dos factos provados descritos em 3 a 9.
Também não se fez prova dos factos descritos em r) e s), antes se tendo provado outros de sinal contrário, já devidamente fundamentados.
Por último nenhuma das testemunhas inquiridas ou a ofendida relataram os factos descritos em u) a w).

3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

Questão prévia:

Juntamente com a motivação do recurso o recorrente junta um documento referente ao registo da propriedade do veículo de matricula ..-FJ-...
Dispõe o artigo 165º, nº 1, do Código de Processo Penal que “O documento deve ser junto no decurso do inquérito ou da instrução e, não sendo isso possível, deve sê-lo até ao encerramento da audiência”.
Como refere o Juiz-Conselheiro Santos Cabral[3], “Após o encerramento da audiência em primeira instância não é admissível a junção de documentos. Efectivamente a redacção do número 1 cinge-se aos ciclos processuais, e enquanto o processo se encontra na primeira instância, o que se compreende pois que, a partir do momento em que está fixada a matéria de facto, a admissão de um documento por pertinente implica que o recurso não verse integralmente sobre as provas produzidas que constituíram o meio de convicção do juiz de primeira instância, mas, também, sobre algo distinto que é o documento. Caso pertinente, tal documento poderá ser analisado como fundamento de revisão de sentença”.
Também a jurisprudência dominante do STJ[4] considera que os documentos se destinam a fazer prova de factos e dado que para a formação da convicção probatória só relevam as provas que forem produzidas ou examinadas em audiência (cf. art. 355.º, n.º 1, do CPP), os documentos apresentados depois deste limite temporal não podem estar a coberto daquele normativo processual expressivo do princípio fundamental da imediação.
 No caso, o documento foi junto com a motivação do recurso para a Relação, pelo que a sua junção é manifestamente extemporânea e injustificada, pois a alusão ao veículo a que se reporta esse documento já foi feita na acusação, que foi notificada ao arguido em 16 de Abril de 2021, pelo que inexiste qualquer razão plausível para que, após todas as vicissitudes processuais conhecidas ( um primeiro julgamento, recurso para o TRG, acórdão deste de 21 de Março de 2022 e novo julgamento em 16 de Setembro de 2022), o venha agora a juntar.
Assim sendo, face à manifesta extemporaneidade, não será considerado para a apreciação do recurso o documento ora junto pelo recorrente.

*
Cumpre agora apreciar as questões objecto de recurso.

3.1. Da insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto provada, contradição entre a fundamentação e decisão e erro notório na apreciação da prova, vícios previstos, respectivamente, nas als. a), b) e c) do nº 2 do art.º 410º do C. P. Penal.
A decisão sobre a matéria de facto é susceptível de ser sindicada, além do mais, através da arguição dos vícios decisórios previstos no n.º 2 do art.º 410.º do C. P. Penal, que o recorrente alega que foi violado.
O citado art.º 410.º n.º 2 do Código de Processo Penal, estatui que mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito “…o recurso pode ter por fundamento, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:

a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) O erro notório na apreciação da prova.”.

Saliente-se que, em qualquer das apontadas hipóteses, o vício tem de resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para o fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento, tratando-se, assim, de vícios intrínsecos da sentença que, por isso, quanto a eles, terá de ser auto-suficiente.[5]
Sendo que, como escreve Germano Marques da Silva [6]As regras da experiência comum não são senão as máximas da experiência que todo o homem, de formação média conhece e respeitam à apreciação de quaisquer das hipóteses previstas no nº 2 do art.º 410º”.
Como persistentemente e uniformemente se vem sustentando na doutrina e jurisprudência[7] a insuficiência a que se reporta a citada al. a) ( e não a al. b) como erradamente o recorrente enquadra o vício em questão) do art.º 410º é um vício que ocorre quando a matéria de facto é insuficiente para a decisão de direito, o que se verifica porque o tribunal deixou de apurar a matéria de facto que lhe cabia apurar dentro do objecto do processo, tal como este está circunscrito pela acusação e pela defesa. Tal vício consiste na formulação incorrecta de um juízo, ou seja, ocorre quando a conclusão extravasa as premissas por a matéria de facto provada ser insuficiente para fundamentar a solução de direito encontrada.[8]
Esse vício não se verifica quando os factos dados como provados permitem a aplicação segura do direito ao caso submetido a julgamento.
Nas palavras de Germano Marques da Silva [9] “ Para se verificar este fundamento é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão proferida e submetida a recurso por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito.
A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não tem nada a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida. “
Como se escreveu também no Acórdão da Relação de Lisboa de 18-10-2006[10]A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não se confunde com uma suposta insuficiência dos meios de prova para a decisão de facto tomada. Este vício só existe quando do acervo de factos vertido na sentença se constata faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados e julgados (provados ou não provados), são necessários para se formular um juízo seguro de condenação ou de absolvição; ou, ainda noutra formulação, quando a matéria de facto provada é insuficiente para a decisão de direito, o que se verifica porque o tribunal recorrido deixou de apurar matéria de facto que lhe cabia apurar dentro do objecto do processo, tal como está configurado pela acusação e pela defesa”. (sublinhado nosso).[11]

Por seu turno, a al. b) do n.º 2 do citado artigo 410.º do CPP abrange três situações:

- Contradição insanável da fundamentação;
- Contradição entre os fundamentos e a decisão;
- Contradição entre os factos.

Como salientam Simas Santos e Leal-Henriques[12] “(…): há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente.
Por último, como dizem Simas Santos e Leal-Henriques[13], o erro notório na apreciação da prova é a "... falha grosseira e ostensiva da análise da prova, perceptível pelo cidadão comum, denunciadora de que se deram como provados factos inconciliáveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, seja, que foram provados factos incompatíveis entre si ou as conclusões são ilógicas ou inaceitáveis ou que se retirou de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável. Ou, dito de outro modo, há um tal erro quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o Tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis.”
Não se trata de qualquer desconformidade entre a decisão de facto e aquela que o recorrente considere ser a correcta, face à prova que foi produzida, mas antes de um erro grosseiro, de uma falha grave e gritante, patenteada pelo texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, que, pela sua manifesta desconformidade com as regras da lógica e da normalidade da vida, não escaparia à análise do homem de formação média, sendo fácil e liminarmente perceptível pelo mesmo.
Traduz-se num vício de raciocínio na apreciação da prova de que um cidadão comum, perante a leitura da decisão, dele facilmente se apercebe.
Como se escreveu no Ac. do STJ de  06-10-2010[14]Para avaliar da não arbitrariedade (ou impressionismo) e da racionalidade da convicção sobre os factos, há que apreciar, de um lado, a fundamentação da decisão quanto à matéria de facto (os fundamentos da convicção), e de outro, a natureza das provas produzidas e dos meios, modos ou processos intelectuais, utilizados e inferidos das regras da experiência comum para a obtenção de determinada conclusão.
Relevantes neste ponto, para além dos meios de prova directos, são os procedimentos lógicos para prova indirecta, de conhecimento ou dedução de um facto desconhecido a partir de um facto conhecido: as presunções.”
No caso concreto o recorrente invoca os vícios da insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto provada e da contradição entre a fundamentação e decisão, respectivamente previstos nas als. a) e b) do nº 2 art.º 410, do CPP, em termos genéricos e sem qualquer sustentação, pois não identifica o(s) segmento (s) do acórdão em ocorreram esses vícios.
Do texto da decisão recorrida também não se descortina qualquer falha grosseira que, ferindo a mais elementar lógica, fosse detectável pelo cidadão comum, nem que tenham sido considerados provados e não provados factos incoerentes e inconciliáveis entre si, ou que que o Tribunal a quo se tenha baseado em juízos ilógicos, arbitrários, absurdos ou contraditórios, desrespeitando as regras da experiência comum e da normalidade da vida.
Por seu turno, percorrendo a motivação e a síntese conclusiva do seu recurso, evidencia-se claramente que o recorrente questiona essencialmente a convicção adquirida pelo tribunal a quo com base na prova produzida que, em seu entender, justificaria decisão diversa- o tribunal recorrido deu como provados factos que, na sua perspectiva, deviam ser considerados não provados -confundindo erros de julgamento com os vícios previstos no nº 2 do art.º 410º.
Nestes termos, os vícios apontados pelo recorrente não resultam do teor da sentença, em conformidade com o enquadramento supra referido, mas sim, num alegado erro de julgamento, que, como acima mencionamos, será apreciado em sede de impugnação da matéria de facto.
Desta forma, não se mostram violados os artºs 374º, nº 2 (sendo que quanto a este não foi invocada qualquer fundamentação que a sustente) e 410º, nº 2, ambos do C. P. Penal.

3.2. Impugnação da matéria de facto, por erro de julgamento, relativamente à factualidade inserta  nos nºs 3 a 8, 12 a 14, 16, 20 a 24, 28, 29, 39, 40, 40, 41 e 42, designadamente por violação do princípio in dubio pro reo.

Pese embora a expressa referência ao vício de erro notório da apreciação da prova previsto no artigo 410º nº 2 alínea c) do Código de Processo Penal, como referimos na questão anterior, da motivação e das conclusões apresentadas, afere-se que o recorrente pretende é sindicar o juízo que o tribunal a quo levou a cabo sobre a prova produzida em audiência de julgamento.
A impugnação ampla da matéria de facto, tendo em vista o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento e visando a modificação da matéria de facto, nos termos do art.º 431º, al. b), é sempre delimitada pelo recorrente através do ónus de especificação previsto nos n.ºs 3 e 4 do art.º 412º do C. P. Penal (diploma a que reportam as demais disposições citadas sem menção de origem).

Mais concretamente impõe que o recorrente especifique:

a)- os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b)- as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c)- as provas que devem ser renovadas.

Assim, no que diz respeito à alínea a) do mencionado preceito, impõe-se que o recorrente individualize/concretize o facto que considera mal julgado, não bastando uma remissão genérica para um conjunto de factos.
No que toca à alínea b), o recorrente deve especificar as concretas provas que impõe que no caso concreto o tribunal a quo tivesse decidido de forma diferente, exigindo-se a indicação do concreto conteúdo probatório, não sendo suficiente, também a mera remissão genérica para um determinado meio de prova (para a integralidade de um depoimento, para o teor de todas as declarações de um determinado sujeito processual e para um documento).
A especificação das «concretas provas» só se satisfaz com a indicação do conteúdo especifico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida.[15]
No mesmo sentido, pronunciou-se o acórdão desta Relação de 23-03-2015,[16] onde se defende que o ónus imposto pelas als. a) e b) do nº3 do artº412º do C.P.P. tem de ser observado para cada um dos factos impugnados “Em relação a cada um têm de ser indicadas as provas concretas que impõem decisão diversa (é mesmo este o verbo - «impor» - utilizado pelo legislador) e em que sentido devia ter sido a decisão. É que há casos em que, face à prova produzida, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução.”
Para além disso, quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) fazem-se por referência ao consignado na acta, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que funda a impugnação (nº4 do citado artº412º).
Revertendo ao caso concreto, embora de forma não muito precisa e concretizada, o recorrente identificou pontos de facto que considera incorrectamente julgados, como sendo os insertos nos nºs 3 a 8, 12 a 14, 16, 20 a 24, 28, 29, 39, 40, 40, 41 e 42, bem como as provas que, na sua perspectiva, impunham decisão diversa.

Analisando as conclusões de recurso, verifica-se que o recorrente assenta, essencialmente, a sua discordância relativamente a essa matéria de facto em duas ordens de razões, a saber:

a) As partes do corpo mencionadas nos factos 6 e 8 que foram efectivamente tocadas pelo arguido; e
b) A data início do seu comportamento relativamente à assistente, consubstanciado nos actos sexuais que com ela praticou, bem como a periodicidade com que os mesmos foram praticados.

Concretizando:

Os itens 6 e 8 que o recorrente impugnou tem o seguinte teor:

“6-Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros, costas e à volta do peito da menor.
8-Aí o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros, costas e à volta do peito da menor sempre que o pai dela estava distraído.”
Como resulta da motivação da decisão de facto, o tribunal a quo para prova desses factos “considerou as declarações do arguido que, como supra se referiu, assumiu integralmente tais factos com excepção da data da sua ocorrência, tendo referido terem ocorrido em 2018, quando a menor tinha 16 anos, sendo certo que os mesmos foram também, na sua quase generalidade, confirmados pela menor em declarações para memória futura. Na verdade, a menor em declarações apenas não confirmou o toque à volta do peito e referiu que os toques ocorreram quando estavam de pé, mas sempre temos as declarações do arguido que assumiu os factos nas precisas circunstâncias de modo e lugar referidas na acusação”.
Entende, no entanto, o recorrente que, ao contrário do que consta dessa motivação, não corresponde à verdade que " o arguido assumiu os factos nas precisas circunstâncias de modo e lugar referidas na acusação", indicando para tanto as concretas passagens da gravação das suas declarações, de que resulta, na sua perspectiva, que apenas tocou no ombro da menor e nada mais, designadamente nas costas, na barriga e à volta do peito.
Vejamos se lhe assiste razão.
Procedemos à audição integral das gravações[17] atinentes às declarações do arguido e à audição e leitura da transcrição das declarações para memória futura prestadas pela assistente.
Como salienta o tribunal recorrido a menor apenas admitiu que “ele estava sempre a tocar-me … “, “…nas costas e à frente “..”…só à frente “(explicando com gestos que não se conseguem perceber) “…na barriga…” …” quando ele (pai) não via …” (minuto 4.50 a 6. 41), nunca tendo feito referência ao toque à volta do peito.
Por sua vez, da audição das declarações do arguido, pese embora se compreenda que o tribunal possa ter interpretado das declarações por ele prestadas que ele estava admitir essa factualidade integralmente, o que se justifica eventualmente por em determinada altura a Mmª Juiz presidente ter questionado o arguido se admitia os factos e ele não o ter rebatido expressamente, o certo é que ele anteriormente  (ao minuto 9.10 a 9.18 ) já tinha mencionado expressamente que apenas tinha tocado no ombro da assistente.
Assim, relativamente a este concreto segmento do recurso entendemos que, na esteira do propugnado pelo recorrente, no que foi secundado pela Exmª PGA no seu parecer, não existe prova cabal produzida na audiência de julgamento que sustente que o arguido nas circunstâncias de tempo e lugar descritas nos citados pontos 6 e 8 da matéria de facto provada também tenha tocado à volta do peito da menor.
Assim, ao abrigo do disposto da al. b) do art.º 431º do C. P. Penal, altera-se a redacção dos factos contidos nessas alíneas nos seguintes termos:
6-Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros e costas da menor.
8-Aí o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros e costas sempre que o pai dela estava distraído.
E, por consequência, será aditada essa factualidade aos factos não provados nos seguintes termos:
C1. O arguido nas circunstâncias mencionadas nos nº 6 e 8 também tenha tocado à volta do peito da menor.
Relativamente ao segundo fundamento da sua discordância, mais concretamente a data do início do seu comportamento, o recorrente alega que a fundamentação do acórdão recorrido não corresponde ao que efectivamente foi dito, quer pela assistente, quer pelo seu pai.
Na motivação da decisão de facto aduzida no acórdão, o tribunal recorrido começou por invocar ter estribado a sua convicção na análise crítica e ponderada da prova produzida em audiência de julgamento, da prova documental e pericial constante dos autos, devidamente conjugada com as regras da experiência comum.
Como é consabido o art.º 127º do C. P. Penal, prevê o princípio da livre apreciação da prova, princípio estruturante do direito processual penal português, dispondo que “Salvo quando a lei dispuser diferentemente a prova é apreciada segundo as regras da experiência e livre convicção da entidade competente.
Exige-se, no entanto, que o julgador indique os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção, ou seja, os meios concretos de prova e as razões ou motivos pelos quais relevaram ou obtiveram credibilidade no seu espírito. Não basta indicar o concreto meio de prova gerador do convencimento, é também necessário expressar a razão pela qual, apoiando-se nas regras de experiência comum, o julgador adquiriu, de forma não temerária, a convicção sobre a realidade de um determinado facto.
Também em idêntico sentido se escreveu no Ac. da Relação de Coimbra de 12-09-2018[18] “ O princípio da livre apreciação da prova assume especial relevância na audiência de julgamento, encontrando afloramento, nomeadamente, no art. 355.º do Código de Processo Penal. É aí, na audiência de julgamento, que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na receção direta de prova e se assegura o princípio do contraditório, garantido constitucionalmente no art.32.º, n.º5.
(…)
A convicção do Tribunal a quo é formada da conjugação dialética de dados objetivos fornecidos por documentos e outras provas constituídas, com as declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, em função das razões de ciência, das certezas, das lacunas, contradições, inflexões de voz, serenidade e outra linguagem do comportamento, que ali transparecem.”
Não basta, pois, que o recorrente pretenda fazer uma revisão da convicção alcançada pelo tribunal recorrido por via de argumentos que permitam concluir que uma outra convicção era possível, havendo antes que demonstrar que as provas indicadas a impõem, conforme resulta expressamente do já citado art.º 412º, n.º 3, al. b).
E tem sido sustentado pela jurisprudência dos tribunais superiores[19] que “ se a decisão factual do tribunal recorrido se baseia numa livre convicção objectivada numa fundamentação compreensível e naquela optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção – obtida com o benefício da imediação e da oralidade – apenas pode ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.”
No caso, ouvidas integralmente as gravações atinentes às declarações do arguido e da assistente e aos depoimentos das testemunhas – cf. art.º 412º, nº 6, do CPP – e analisada a restante prova pericial e documental produzida nos autos, consideramos que o tribunal a quo se cingiu a prova legalmente admissível e interpretou correctamente e em conformidade com os ditames legais o disposto no citado art.º 127º do Código de Processo Penal.
Na verdade, o tribunal recorrido explanou, de modo claro e perceptível, na fundamentação da decisão de facto do acórdão as fontes probatórias que acolheu para a tomada de decisão, o respetivo conteúdo e alcance, bem como justificou de forma segura e coerente os motivos porque credibilizou umas e descredibilizou outras, sempre dentro dos limites legais da livre convicção, respeitando as regras da experiência e da lógica.
Como se concluiu no acórdão da Relação de Coimbra, de 06/03/2002[20]: “Quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum”.
No caso resulta evidenciado da motivação da decisão de facto do acórdão recorrido, que os factos em causa tiveram o seu início no dia ... de 2016, sábado, data em que o arguido transportou a menor BB e o pai dela num veículo ligeiro de mercadorias, até à cidade ... para verem um jogo de futebol entre o clube local e o ... (factos 3 e 4) de que se destaca a seguinte fundamentação:
“Para prova dos factos descritos em 3 a 9 o Tribunal considerou as declarações do arguido que, como supra se referiu, assumiu integralmente tais factos com excepção da data da sua ocorrência, tendo referido terem ocorrido em 2018, quando a menor tinha 16 anos, sendo certo que os mesmos foram também, na sua quase generalidade, confirmados pela menor em declarações para memória futura. Na verdade, a menor em declarações apenas não confirmou o toque à volta do peito e referiu que os toques ocorreram quando estavam de pé, mas sempre temos as declarações do arguido que assumiu os factos nas precisas circunstâncias de modo e lugar referidas na acusação e ainda acrescentou que até perguntou logo à menor se “gostava de fazer sexo”. Quanto ao momento temporal, a menor, o arguido e o pai da menor referiram-se ao jogo ..., pelo que considerou o Tribunal que estariam a referir-se ao jogo do ... com o ... e não com o ..., até porque todos referiram que ocorreu num sábado, sendo que é facto notório e do conhecimento geral que tal jogo ocorreu no Estádio ... em ... de 2016. Em 2014 e 2015 o ... estava na ... divisão e não se descortina que o arguido e o pai da menor sendo de ... (que não de ...) viessem a esta cidade apenas para ver o .... Assim, o Tribunal se convenceu que tais factos ocorreram na referida data, já a menor tinha 14 anos e não 16 como quis o arguido fazer parecer. Aliás, o arguido refere que a menor teria 16 anos e que até pediu o bilhete de identidade ao pai dela e confirmou isso, o que é negado por aquele, nem assume grande credibilidade face às regras da experiência comum.
Também o pai da menor CC referiu, em audiência de julgamento, que saiam habitualmente aos sábados, indo para ..., ..., ..., sendo que ficava no café e depois o arguido comprava roupa, ténis à miúda. Esta testemunha referiu que as saídas ocorreram por 5 vezes mas resulta evidente que estaria equivocado, até porque foi referindo ao longo do depoimento que tal ocorreu por diversas vezes, o que foi também confirmado pela mãe da menor, em declarações, II. Esta testemunha referiu que os três saiam muitas vezes, para irem a ..., ..., ..., sendo que sempre que o arguido ligava eles saiam, relatando igualmente que o marido recebia cerca de 10 euros e o arguido comprava roupa e calçado para a menor, sendo que o marido “era muito inocente” e não percebia nada do que se estava a passar. Aliás, o arguido assume que tais factos ocorreram por diversas vezes, aos sábados, embora tenha negado a frequência quinzenal. A testemunha CC, sendo imputável, padece de epilepsia e possui “um funcionamento intelectual na zona da debilidade ligeira”, como resulta do relatório pericial de fls. 374 e ss. Assim, é de aceitar que o mesmo não tenha tido plena consciência dos factos assim como as incongruências verificadas nos períodos temporais registadas nos seus depoimentos, prestados quer em audiência, quer perante o Magistrado do MP, exaradas a fls. 341, em 03/12/2020 e lidas em audiência nos termos do disposto no artigo 356º nº 3 alínea b) do Código de Processo Penal.”
Deste modo, o tribunal a quo de uma forma lógica e consentânea com as regras da experiência comum, analisou todos os elementos de prova e da sua análise concatenada chegou a à conclusão e decidiu  situar a primeira vez em que ocorreram as relações sexuais na carrinha, num sábado, quinze dias depois do dito jogo de futebol, em 08/10/2016, passando desde então as mesmas a ocorrer todos os sábados, quinzenalmente, até 20 de Abril de 2019, último sábado antes da queixa apresentada pela vizinha EE, ocorrida em 25 de Abril de 2019 (auto de notícia de fls. 114).
Efectivamente, o pai da menor, a testemunha CC, referiu expressamente que as saídas com o arguido se iniciaram após este os ter convidado a ele e a sua filha para irem a ... ver o jogo de futebol (a partir do minuto 21.34), circunstância que foi também confirmada pela testemunha II mãe da menor, que referiu expressamente que a primeira vez que eles saíram foram ver o ... a ... (a partir do minuto 42.47).
É certo, que a menor, quando prestou declarações para memória futura no dia 21 de Janeiro de 2020 não se referiu concretamente à equipas que se confrontaram nesse jogo, mas referiu, de uma forma espontânea, sincera e credível, que o início dos factos ocorreram numa viagem que fez com o arguido e com o seu pai a ver um jogo, quando tinha os seus 12/13 anos.
Na verdade, afirmou essa idade logo no inicio da diligência, assim como o voltou a afirmar a partir do minuto 26,48m, e que as relações com o arguido …continuaram até aos 16 anos…” para além de responder, igualmente, à questão de há quanto tempo antes tinha acontecido a última vez, ao minuto 29,30m “… em 2018 ou 2019, não tenho a certeza… “, e “que teria sido nas férias de Verão… “
O próprio arguido, embora pretendendo contextualizá-lo, no ano de 2018, admitiu expressamente que o seu relacionamento com a ofendida se iniciou “ porque sou ... …  no Verão…fomos ver o jogo de futebol ...…” (a partir do minuto 5, 42m e segs), constituindo tal ocorrência, pela sua objectividade, inquestionavelmente um ponto de referência, tendo também afirmado que as saídas/encontros com a menor ocorriam aos sábados.
Aliás, o arguido mantém no recurso que o seu relacionamento com a ofendida se iniciou numa altura em que foram a ... a pretexto de verem o jogo de futebol dessas duas equipas, apenas pretendendo a alteração do facto de que tal aconteceu em 2018.
De notar que também nós, à semelhança do que fez o tribunal recorrido e a Exmª PGA, fomos pesquisar e confirmamos que, de facto, o ... defrontou o ... no dia ... de 2016 (sábado), pelas 18 45m.
Importa igualmente salientar que as declarações do arguido, quanto a esta questão, não foram prestadas de molde a infirmar a demais prova. Na verdade, não obstante, afirmar constantemente não se recordar da maioria dos factos, asseverou invariavelmente, relativamente a todos os factos com que foi confrontado pela Exmª Srª Juiz Presidente e sem qualquer explicação plausível, que a menor teria 16 anos, chegando ao ponto de declarar que o pai da menor lhe tinha mostrado o seu BI, sem que, mesmo quando questionado nesse sentido, tenha justificado os motivos por que tal tinha acontecido.
A sustentar também que os factos em causa não podiam ter o seu início no ano de 2018, apontado pelo arguido, mostra-se já assente no facto provado n.º 36, não impugnado, que a menor foi institucionalizada na Santa Casa da Misericórdia ..., em Maio de 2019 e de acordo com as declarações da ofendida esses últimos contactos (e não os primeiros) teriam ocorrido em 2018 (nas férias de verão).
Aliás, também o depoimento da testemunha EE permite contextualizar parte dos factos em Abril/Maio de 2018, o que afasta a data pretendida pelo arguido -27 de Setembro de 2018- como sendo o início do seu relacionamento com a ofendida.
Por último, as referências invocadas pelo arguido para sustentar a sua versão, designadamente a data em que terá adquirido o veículo referido nos factos provados, não tem o mínimo sustento probatório nos autos, pois, como já referimos, não obstante esse facto já constar da acusação e todas as vicissitudes dos autos, só se lhe afigurou oportuno juntar prova dessa aquisição do veículo em questão no recurso, junção esta que, pelos fundamentos supra aduzidos, é manifestamente extemporâneo e, como tal, não pode ser considerada.
O mesmo sucedendo com a pretendida ilação retirada da afirmação que a assistente fez de que o arguido teria na ocasião “uns 56 anos prái…”. Com efeito, para além da incerteza revelada pela última expressão por ela empregue, também é do conhecimento geral a dificuldade inerente à identificação da idade precisa de uma pessoa na faixa etária em que na ocasião se situava o arguido.
Relativamente aos factos provados sob os n.ºs 12 a 14, 16 e 20 a 24, 28, 40 e 41 da matéria de facto, importa desde logo salientar que o arguido admitiu a sua ocorrência, apenas questionando, mais uma vez, o seu início e a periodicidade com que os factos em causa ocorreram.
Por outro lado, tendo o tribunal recorrido decidido que os factos em questão tiveram o seu início no dia ... de 2016 e não como indicado pelo arguido, em 2018, o que, pelos fundamentos expostos não nos merece qualquer censura, ficam prejudicados todos os seus argumentos referentes à cronologia dos acontecimentos, assim como ao número de vezes em que teve os contactos sexuais com a assistente.
Acresce que, se bem conseguimos compreender as razões da divergência do recorrente em relação ao que concluiu o tribunal a quo em relação a esta matéria, mais concretamente quanto à periodicidade e ao consequente número de vezes em que teve contactos sexuais com a assistente nos termos considerados provados, prendem-se somente com a diferente valoração da prova produzida, sendo que, em termos genéricos, pretende substituir a sua própria convicção à que foi alcançada pelo tribunal que julgou a causa.
 Sucede, porém, que impugnação da matéria de facto, por erro de julgamento, não se resume, em ouvir as pessoas nas passagens concretas do seu depoimento, em que, no entender do recorrente está inquinado, para saber se disseram ou não o que se mostra vertido na decisão da matéria de facto e não se destina ao confronto dos depoimentos, para descredibilizar a versão acolhida pelo tribunal.[21]
Na verdade, as passagens das declarações da assistente e dos depoimentos das testemunhas trazidos à colação pelo recorrente em relação aos alegados factos incorrectamente julgados, não impõem decisão diversa da recorrido, uma vez que através delas o recorrente não demonstra a existência de nenhum erro patente de julgamento, limitando-se a divergir, como já referimos, do modo como o tribunal recorrido valorou a prova produzida na audiência de julgamento.
De facto, o Tribunal recorrido, de forma clarividente e conforme ao sentido da globalidade da prova produzida nos autos, no exercício da sua liberdade de apreciação da prova produzida e socorrendo-se de modo apropriado das regras do normal suceder e da lógica, que não nos merecem qualquer censura, quantificou o número de crimes tendo em conta o número de vezes mencionados nos factos n.ºs 12, 16 a 18, 20, 21 a 28, 40 e 41.
Com efeito, a este respeito o tribunal recorrido na motivação da decisão de facto escreveu o seguinte: “Relativamente aos factos descritos em 10 a 23 foram os mesmos também confirmados pelo arguido com excepção das datas, tendo o mesmo assumido que tal ocorria aos sábados, na referida carrinha, embora tivesse negado que fossem todos os 15 dias assim como referiu, uma vez mais, que a menor já teria 16 anos. Por sua vez, a menor em declarações para memória futura confirmou estes factos e referiu que os mesmos ocorriam aos fins de semana, com frequência quinzenal (fls. 319). Confirmou igualmente que era virgem e que perdeu a virgindade com o arguido e que tais situações no carro sucederam “até agora” tendo até referido que ao que se lembra, a última vez teria ocorrido na carrinha.
Também o pai da menor CC referiu, em audiência de julgamento, que saiam habitualmente aos sábados, indo para ..., ..., ..., sendo que ficava no café e depois o arguido comprava roupa, ténis à miúda. Esta testemunha referiu que as saídas ocorreram por 5 vezes mas resulta evidente que estaria equivocado, até porque foi referindo ao longo do depoimento que tal ocorreu por diversas vezes, o que foi também confirmado pela mãe da menor, em declarações, II. Esta testemunha referiu que os três saiam muitas vezes, para irem a ..., ..., ..., sendo que sempre que o arguido ligava eles saiam, relatando igualmente que o marido recebia cerca de 10 euros e o arguido comprava roupa e calçado para a menor, sendo que o marido “era muito inocente” e não percebia nada do que se estava a passar. Aliás, o arguido assume que tais factos ocorreram por diversas vezes, aos sábados, embora tenha negado a frequência quinzenal. A testemunha CC, sendo imputável, padece de epilepsia e possui “um funcionamento intelectual na zona da debilidade ligeira”, como resulta do relatório pericial de fls. 374 e ss. Assim, é de aceitar que o mesmo não tenha tido plena consciência dos factos assim como as incongruências verificadas nos períodos temporais registadas nos seus depoimentos, prestados quer em audiência, quer perante o Magistrado do MP, exaradas a fls. 341, em 03/12/2020 e lidas em audiência nos termos do disposto no artigo 356º nº 3 alínea b) do Código de Processo Penal.
Deste modo, o Tribunal decidiu situar a primeira vez em que ocorreram as relações sexuais na carrinha, num sábado, quinze dias depois do dito jogo de futebol, em 08/10/2016, passando as mesmas a correr todos os sábados quinzenalmente até 20 de Abril de 2019, último sábado antes da queixa apresentada pela vizinha EE, ocorrida em 25 de Abril de 2019 (auto de notícia de fls. 114). De resto, a menor refere que as relações se foram mantendo de forma contínua, o que aliás resulta evidente do expediente e fotografias de fls. 198 a 214, sendo de realçar que em 01 de Maio de 2019 após exame realizado pela PJ ao veículo ainda o mesmo possuía na sua parte traseira o colchão, os vidros tapados, as almofadas… e ali foram detectados vestígios de sémen do arguido assim como ADN da assistente num lenço de papel que ali se encontrava também (cfr. exame pericial de fls. 359 e ss.).
Assim o Tribunal considerou provados os factos descritos em 21 e 23 contabilizando os sábados, de quinze em quinze dias, no período temporal descrito.
Relativamente aos factos descritos em 24 a 28, o arguido referiu que as relações sexuais no anexo da habitação só ocorreram uma vez, nas circunstâncias de modo descritas na acusação, embora reportando a situação a 2018 uma vez mais, quando a menor tinha 16 anos. A menor, em declarações para memória futura, confirma as relações sexuais no anexo da habitação também naquelas concretas circunstâncias de lugar e modo mas não consegue especificar quando começaram e terminaram, o que é perfeitamente natural. Diz, contudo, que foram várias vezes e localiza a última vez no ano passado (sendo que foi ouvida em declarações em 21/01/2020). A mãe da menor, em audiência refere ter surpreendido a menor a ter relações sexuais com o arguido em Dezembro (há quatro anos - o que seria em 2018), sendo que antes disso já desconfiava porque via a porta do anexo sempre mal fechada…
A testemunha EE, vizinha da ofendida e que apresentou a queixa, referiu, com segurança, que via o arguido rondar a habitação duas a três vezes por semana, o que sucedeu em 2018 e 2019, acabando por referir depois que, pelo menos uma vez por semana, ele ia a casa dela, ela abria a porta e ele entrava para o dito anexo. O marido desta testemunha, DD também presenciou essas entradas “às escondidas” do arguido com a ofendida no anexo, o que localizou em 2018/2019 tendo por baliza temporal o momento em que teve uma oficina. E de resto, as duas testemunhas referiram que optaram por fazer a denúncia em Abril de 2018 que até “já se comentava no povo” que o arguido andava a abusar da ofendida, de tantas vezes que lá viam o arguido rondar.
Assim sendo e com a devida segurança, para não prejudicar o arguido, cremos que se deve considerar provado que, pelo menos, desde inicio de Dezembro de 2018 até 20 de Abril de 2019, o arguido estava com a ofendida no anexo a ter relações sexuais, ao menos, uma vez por semana, a acrescer aos episódios na carrinha, que ocorriam aos sábados, quinzenalmente.
Note-se que os pais da ofendida quando questionados sobre o número de vezes que aquela lhes teria contado ter estado com o arguido, referiram 5 vezes (o pai em relação às viagens na carrinha) e 3 vezes (a mãe quanto às relações na carrinha) mas tal não nos mereceu qualquer credibilidade. O pai pelas razões já sobejamente apontadas supra e a mãe, porque ao que nos parece, bem se apercebeu da situação, mas preferiu não a denunciar… e por essas razões “tenta agora sacudir a água do capote”.
De facto, o tribunal recorrido quantificou o número de crimes tendo em conta o número de vezes mencionados nos factos n.ºs 12, 16, 20, 21 a 28, 40 e 41 por forma a, como no acórdão recorrido se salientou, não prejudicar o arguido.
Assim, aconteceu porquanto, pese embora não tenha conseguido indicar o número de vezes desses encontros sexuais – circunstância que é perfeitamente aceitável – a ofendida, depois de dizer ao Tribunal … que esses encontros ocorriam aos fins de semana “que não era todas as semanas “, ao ser questionada sobre a frequência com que tal acontecia, ao minuto 43 m, respondeu:” que era de 15 em 15 dias …“durante todo o período.
Por conseguinte, ao proceder a tal quantificação, o tribunal atendeu às declarações da ofendida, cuja credibilidade não foi posta em causa, de que, pelo menos, isso acontecia de 15 em 15 dias.
Em relação a esta factualidade além das declaração da assistente, também é relevante o depoimento da testemunha EE, que a partir do minuto 2,17 m e segs, afirmou que…” via o arguido a rondar a casa da ofendida 2/3 vezes por semana… eram bastantes vezes… ao longo de um ano…” e, a partir do minuto 6,09 m, concretizou que tais encontros do arguido com a ofendida se teriam iniciado…” a partir de Abril/Maio de 2018”, mais respondendo quando lhe perguntaram se esses encontros teriam acontecido mais de 50 vezes… “ Sim “, sustentado esta resposta ainda com a afirmação de que (a partir do minuto 9,50) “ele não largava a moça“…afirmando também que “ já se comentava no povo que o arguido andava a abusar da ofendida, de tantas vezes que lá viam o arguido rondar…” .
Deste modo, pelas razões supra explicitadas, é de concluir pela inteira correcção do juízo probatório efectuado pelo tribunal a quo relativamente à forma como contabilizou o número de vezes em que o arguido praticou todos os actos em causa sobre os factos provados que, ao contrário do alegado pelo arguido, não assentou em meras conjecturas e extrapolações, mas sim em dados objectivos.
Por último, não poderemos deixar de sublinhar que, tendo em consideração os factos em causa nos autos, que, pela sua natureza e repectivo circunstancialismo, contrariam manifestamente o normal acontecer, afiguram-se-nos completamente desajustadas e desadequadas as afirmações contidas nas conclusões de recurso XXII a XXIV, bem como as contidas nas conclusões XXVII e XXXI a XXXIV, essas sim assentes em meras conjecturas e juízos hipotéticos.
Resulta, pois, da leitura da motivação da decisão de facto, supra transcrita, que o tribunal a quo norteou-se pelo princípio da livre apreciação da prova e pelas regras da experiência comum, procedendo à avaliação global da prova produzida, numa perspectiva crítica, expondo de forma clara e segura as razões que fundamentaram a sua opção decisória, não competindo a este Tribunal censurar a decisão recorrida com base na convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida, sob pena de se desconsiderar o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127.º do Código Processo Penal.
Entende ainda o recorrente que o Tribunal a quo violou o princípio in dubio pro reo.
O princípio in dubio pro reo é corolário do princípio da presunção de inocência do arguido, constitucionalmente consagrado, no art.º 32º, nº 2, da CRP, que prevê que “todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”.
É um dos princípios básicos do processo penal e tem aplicação na apreciação da prova, impondo que, em caso de dúvida insuperável e razoável sobre a valoração da prova, se decida sempre a matéria de facto no sentido que mais favorecer o arguido.[22]
Como resulta do recurso, o recorrente invoca a violação deste princípio mais uma vez como fundamento na errada valoração dos elementos de prova pelo tribunal a quo, o que motivou que desse como incorrectamente provados os factos supra indicados.
Por conseguinte apela a esse princípio essencialmente como corolário da sua apreciação da prova, não tendo alegado ou demonstrado que o tribunal a quo se defrontou com dúvidas que resolveu contra ele ou demonstrou qualquer dúvida na formação da sua convicção.
O princípio in dubio pro reo só é, no entanto, desrespeitado quando o Tribunal, colocado em situação de dúvida irremovível na apreciação das provas, decidir, em tal situação, contra o arguido.
Daí decorre que tal princípio só teria sido violado se da prova produzida resultasse que, ao condenar a arguido com base em tal prova, o juiz tivesse contrariado as regras da experiência comum ou atropelasse a lógica intrínseca dos fenómenos da vida, caso em que, ao contrário do decidido, deveria ter chegado a um estado de dúvida insanável e, por isso, deveria ter decidido a seu favor.[23]
Ora, no caso concreto, como já foi dito, resulta de forma clara do acórdão recorrido, mais concretamente da fundamentação da convicção sobre a matéria de facto, que o Tribunal a quo após uma análise crítica e conjugada da prova produzida, concluiu, sem qualquer dúvida razoável, e sem contrariar as regras da experiência comum, pela verificação dos factos imputados ao arguido e que motivaram a sua condenação.
Importa acentuar que a apreciação pelo STJ[24] da eventual violação do princípio in dubio pro reo encontra-se dependente de critério idêntico ao que se aplica ao conhecimento dos vícios da matéria de facto: há-de ser pela mera análise da decisão que se deve concluir pela violação deste princípio, ou seja, quando, seguindo o processo decisório evidenciado através da motivação da convicção, se chegar à conclusão de que o tribunal, tendo ficado num estado de dúvida, decidiu contra o arguido.
Deste modo, pelas razões supra explicitadas, é de concluir pela inteira correcção do juízo probatório efectuado pelo tribunal a quo sobre os referidos factos provados, o que afasta a conclusão de que deveria ter ficado em estado de dúvida sobre os mesmos, não se mostrando, por isso, violado o princípio in dubio pro reo consagrado no artigo 32.º, n.º 2, da CRP.
Assim, com excepção da alteração da matéria de facto contida nos nºs 6 e 8 e, consequente aditamento aos factos não provados, nos termos supra explicitados, a restante matéria de facto, mantém-se nos seus precisos termos.

3.3. Enquadramento jurídico-penal.

Relativamente a esta questão a divergência do recorrente assenta nos seguintes fundamentos:
- Quanto aos factos provados sob os números 3 a 8, tendo em conta a alteração por ele propugnada relativamente aos factos insertos nos pontos 6 e 8, quanto às zonas do corpo da assistente que foram por ele tocadas, não podem ser reconduzidos ao tipo objectivo previsto no artigo 170.º do CP, pois os toques são perfeitamente aceitáveis no trato social e normal, dificilmente podem ser vistos como uma formulação de propostas de teor sexual ou como um constrangimento a contacto de natureza sexual, tanto mais que não foi dado como provado que, aquando dos toques no corpo da assistente, fossem formuladas quaisquer propostas ou ditas quaisquer palavras de conteúdo sexual, pelo que deve o arguido ser absolvido da prática do crime de importunação sexual de que foi acusado.
-Relativamente à factualidade prevista nos pontos 12 a 28, embora aceitando que são susceptíveis de integrarem o crime de recurso a prostituição de menores, nos termos previstos e punidos nos n. os 1 e 2 do artigo 174.º do CP, com a redacção alterada, entende que face à defendida alteração da matéria de facto, o número de vezes em que esse crime foi consumado é de apenas vinte e duas vezes e não de oitenta e sete vezes.
Assim, por tais factos, deverá o arguido ser condenado, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, pela prática de vinte e dois crimes de recurso a prostituição de menores, ou seja, apenas questiona o número de vezes que o referido crime foi praticado.
Face à improcedência da impugnação da matéria de facto relativamente a esta última factualidade dos pontos 12 a 28 e sendo a divergência do recorrente exclusivamente dela dependente, esta última questão estará liminarmente votada ao insucesso.
Assim, estando nós em concordância com a análise que é feita na decisão recorrida da prova constante dos autos, nos termos anteriormente explicitados, remetendo-se para os respetivos fundamentos de facto, entendemos não merecer tal decisão qualquer censura, devendo também nesta parte ser confirmada.
Já quanto aos factos provados sob os números 3 a 8, tendo em conta alteração da redacção dos pontos 6 e 8, nos termos acima decididos, importa determinar se essa alteração tem alguma influência no enquadramento jurídico desses factos e consequente condenação do recorrente.
Relativamente aos factos provados descritos em 3 a 8, o tribunal recorrido decidiu que, por os factos em causa terem ocorrido quando a menor tinha entre 14 e 16 anos, a conduta do arguido não pode preencher o tipo de abuso sexual de crianças previsto 171º nº 3 alínea a) do CP, mas tão somente o tipo legal previsto no artigo 170º sob a epígrafe “Importunação sexual”.
Dispõe o art.º 170º do C. Penal, na versão que lhe foi introduzida pela Lei nº 103/2015 de 24/08 em vigor à data da prática dos factos que: “Quem importunar outra pessoa praticando perante ela actos de carácter exibicionista, formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.”
No que respeita às condutas que poderão ser enquadráveis na previsão legal, podemos encontrar na doutrina entendimentos que, com pequenas diferenças, no essencial, são coincidentes.
Assim, José Mouraz Lopes[25] delimita as condutas que podem integrar este tipo legal nos seguintes termos:
«No que respeita à importunação por constrição ao contacto de natureza sexual como elemento típico da segunda dimensão do crime, introduzida pela reforma de 2007, importa precisar a questão do que pode ser, por um lado o contacto de natureza sexual e por outro em que se traduz esse constrangimento.
Sobre a primeira questão há que começar por sublinhar que se trata de um contacto de natureza sexual sendo por isso de pressupor que só um ato sexual, que possa ser objetivamente entendido como tal, pode estar em causa. Estarão por isso fora do âmbito do tipo por um lado todos e quaisquer contactos físicos que não tenham a natureza de um ato sexual e, por outro lado, de uma forma inequívoca, todas as palavras ou gestos grosseiros de natureza sexual dirigidas à vítima.
Vale a pena apelar ao que vinha constituindo alguma discussão efetuada pela doutrina e jurisprudência sobre o que não é (ou não deve ser) um «ato sexual de relevo» e que não configurando essa figura essencial que está na origem da reforma de 1995, caberá hoje no domínio do contacto de natureza sexual para efeitos deste tipo de crime. É o caso do «apalpão» ou o «roçar» ou pressionar partes do corpo contra partes do corpo da vítima, por exemplo nos transportes públicos ou em espaços fechados, que podem consubstanciar uma situação «froteurismo» (de frotter).
Verificado o contacto de natureza sexual importa sublinhar que não basta a sua existência, só por si, para configurar o tipo de crime. O contacto tem que decorrer através de alguma forma de pressão, aperto, compressão ou coação que configure um ato que de uma forma inequívoca cerceia a liberdade sexual da vítima. Não existindo esse «mínimo» que identifique, objetivamente, esse constrangimento não se pode configurar, à luz do tipo de crime, uma ação típica.».
Paulo Pinto de Albuquerque[26]  entende que a disposição legal em apreciação prevê três crimes distintos : “ o crime de ato de carácter exibicionista, o crime de formulação de propostas de teor sexual e o crime de contacto de natureza sexual”.
No caso, não está em causa a prática de actos exibicionistas, nem de formulação de propostas de teor sexual, pelo que os factos em questão apenas poderão configurar a prática de contactos de natureza sexual com constrangimento da vítima.
 Por sua vez, Paulo Pinto de Albuquerque[27]  define o contacto de natureza sexual como “ a ação com conotação sexual realizada na vítima, que não tem a gravidade do ato sexual de relevo. O contacto de natureza sexual pode incluir o toque (com objetos ou partes do corpo) da nuca, do pescoço dos ombros, dos braços, das mãos, do ventre, das costas, das pernas e dos pés da vítima.”
Para se tratar de contacto de natureza sexual o mesmo terá, pois, de representar um ataque à liberdade sexual da vítima que assuma certa gravidade (sem traduzir a prática de acto sexual de relevo, objecto de incriminação distinta e mais gravosa).

Como escreveram Simas Santos e Leal-Henriques[28], na importunação sexual o agente não chega a praticar qualquer ato sexual de relevo, referindo-se os contactos de natureza sexual a um contacto corporal que transporta significado sexual, sem contudo representar um acto sexual de relevo.
 Neste sentido asseverou-se no Ac. da Relação de Évora de 15-05-2012 [29]  “A conduta típica do crime de importunação sexual é um acto de natureza sexual (que não tenha a gravidade de acto sexual de relevo) praticado contra a vontade da vítima e na presença da mesma ou sobre esta (que seja constrangida a presenciar ou suportar) e, em tal medida, seja importunada.
O tipo subjectivo admite qualquer forma de dolo. No caso de contacto de natureza sexual, o agente deve querer aproveitar-se da proximidade física que tem da vítima, para manter um contacto sexual.[30]

No caso em apreço e em relação a esta concreta questão resultou provado (tendo em consideração a alteração acima decidida) que:

4. No dia ... de 2016, sábado, o arguido transportou a menor BB e o pai dela num veículo ligeiro de mercadorias, até à cidade ....
5. A menor BB viajou no banco da frente do lado direito do arguido e o pai dela viajou no mesmo banco, do lado direito da filha.
6. Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros e costas da menor.
7. Após chegarem a ..., foram os três para um café ver o jogo de futebol.
8. Aí o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros e costas da menor sempre que o pai dela estava distraído.
39. Ao agir da forma descrita em 6 e 8 o arguido fê-lo com o propósito concretizado de constranger a menor BB a contactos de natureza sexual.
Tendo em consideração as orientações acima citadas da doutrina e jurisprudência, entendemos que os provados toques do arguido com a sua mão nos ombros e costas da menor e o circunstancialismo em que os mesmos  ocorreram, designadamente a sua insistência e reiteração, sem qualquer justificação e sempre aproveitando a distracção do pai da menor, não foram claramente inofensivos, tiveram, pelo contrário, cariz sexual e constrangeram a ofendida - então, com 14 anos de idade e, por isso, continuam a configurar contactos de natureza sexual susceptíveis, de criar uma situação de constrangimento, de limitação ou anulação da vontade da vítima e contenderam com a liberdade de acção e decisão da mesma, tendo aliás sido essa a intenção do arguido, como resulta da factualidade assente no nº 39 (que se manteve inalterada).
Dessa forma, por se encontrarem preenchidos os respectivos elementos constitutivos, resultou provada a conduta tipificada no 170º do C. Penal, pelo que não merece censura a condenação do arguido também pela prática deste ilícito.
Improcede, assim, também esta questão.

3.4 Penas parcelares e única excessivas

Entende o recorrente a este respeito que as penas parcelares são excessivas, sendo que por cada crime de recurso à prostituição de menores, considera proporcional, necessária e adequada a pena de um ano de prisão, o mesmo ocorrendo relativamente aos crimes de pornografia de menores e de coacção sexual.
Fundamenta essencialmente essa sua pretensão na circunstância da assistente à data da prática dos factos já ter mais de dezasseis anos, uma idade que, legalmente, lhe permite contrair matrimónio, ter liberdade religiosa e também, em certa medida, autodeterminação sexual, e, por isso, a gravidade dos factos que efectivamente aconteceram é mais diminuta.
Sucede, porém, que, como já foi por nós mencionado na 2ª questão analisada, inexistem fundamentos de facto que nos permitam concluir que, desde o início da prática dos factos, a assistente tinha mais de 16 anos, pelo que não se mostra verificado o único pressuposto invocado pelo arguido para a diminuição das penas parcelares aplicadas aos referidos crimes.
Por outro lado, o tribunal a quo fundamentou da seguinte forma a determinação da medida das penas concretas aplicadas:
“No presente caso, as exigências de prevenção geral que se fazem sentir neste tipo de crimes são elevadíssimas, uma vez que como é por demais sabido, é objecto de elevada reprovação social todo o comportamento da prática de actividades sexuais, ou de preparação destas, dirigida contra menores, reprovação essa que é tanto maior quanto mais baixa for tal idade.
A luta contra a violência sexual com crianças passa necessariamente, por dois aspectos: o lugar da criança na sociedade e a atitude dos adultos em relação às crianças, mas que convergem para o mesmo foco, qual seja, o direito da criança e sua violação – “A Pedofilia” - GELSON FRANCISCO ALVES DA COSTA, Cadernos jurídicos.
Por sua vez as exigências de prevenção especial são também muito elevadas, porquanto o arguido já sofreu condenação pela prática de crimes de abuso sexual de crianças cometidos contra a pessoa das suas filhas, em prisão efectiva de 5 anos que cumpriu, a qual como se viu, não surtiu qualquer efeito. Não obstante tais factos terem ocorrido há cerca de 20 anos e a pena se ter extinguido por cumprimento há cerca de 13 anos, o arguido voltou a delinquir na prática de crime da mesma natureza.
Actuou o arguido com total desprezo pelas regras sociais mais básicas, além de demonstrar o profundo desrespeito que tem pela sua vítima em relação à qual não revelou a mínima preocupação, revelando uma propensão por este tipo de comportamento que não sabe controlar.
Quanto ao grau de culpa, é inquestionável o dolo directo e bem assim intenso, tendo o arguido se aproveitado do facto de manter com o pai da menor uma relação de amizade assim como a situação económica algo precária da menor e do seu agregado para deste modo satisfazer os seus instintos libidinosos a troco de prendas e benefícios económicos atribuídos à menor e ao seu progenitor. Aproveitou-se também o arguido das dificuldades cognitivas do progenitor, que não se apercebia das situações com a normalidade que se impunha a qualquer outra pessoa.
No que se refere à ilicitude dos factos esta é também elevada, atendendo às circunstâncias em que os factos ocorreram, o concreto modo como foram praticados, o período temporal longo em que perduraram os abusos, durante cerca de 3 anos, primeiro com frequência quinzenal e depois numa escalada de ilicitude, também durante a semana, na residência onde a menor habitava com os progenitores.
De salientar os danos causados na formação da personalidade da menor.
Inexiste no caso em apreço e relativamente ao arguido qualquer circunstância concreta que faça diminuir por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
Quanto às condições pessoais e à situação económica do arguido, apurou-se que o mesmo está socialmente inserido. Tem actualmente 60 anos de idade. Trabalha como cantoneiro e tem uma companheira com quem reside há vários anos e que o apoia incondicionalmente, como se viu em sede de declarações por aquela prestadas.
Em desfavor do arguido, os seus antecedentes criminais por crime da mesma natureza, como já se referiu, ainda que por factos praticados há muito tempo.
Em sede de audiência de julgamento, o arguido não denotou qualquer consciência crítica e auto-responsabilização pelas suas condutas. Embora assumindo uma boa parte dos factos descritos na acusação, optou por responsabilizar a menor e a família da mesma, dizendo que aquela, na verdade, gostava dele, gostava de ter sexo, não era virgem e que a mãe e o pai aceitavam e “entregavam-na para ter sexo consigo”, como se isto pudesse, de alguma forma, desculpar a sua conduta.
Em sede de declarações finais pediu uma oportunidade e declarou-se arrependido, mas o arrependimento do arguido tem de ter demonstração prática de nada valendo a sua verbalização, sem mais, no fim da audiência.
Da leitura dessa fundamentação consideramos que o tribunal a quo na determinação da medida das penas parcelares teve em atenção, no essencial, todos os elementos que interessavam à graduação das mesmas, tendo avaliado a conduta do arguido de acordo com os parâmetros legais.
Por sua vez, não vislumbramos que tenham sido violadas regras de experiência ou que a respectiva quantificação se revele desproporcionada[31]. Por isso, nenhuma censura merecem as penas parcelares aplicadas.
Cumpre, pois, apreciar se apena única aplicada se mostra excessiva, seguindo para tal as directrizes previstas no do art.º 77º C. Penal, que estabelece as regras da punição do concurso de crimes.
A pena única corresponde a uma pena conjunta resultante das penas aplicadas aos crimes em concurso segundo um princípio de cúmulo jurídico, seguindo-se o procedimento normal de determinação e escolha das penas a partir das quais se obtém a moldura penal do concurso.
A pena aplicável aos crimes em concurso tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa, e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal)
Como se escreveu no Ac.  do S. T. J de  13-02-2019[32] “Como se tem sublinhado na jurisprudência constante deste Supremo Tribunal, e retomando-se o que se afirmou no recente acórdão proferido no processo n.º 144/14.0JACBR-A.S1 (ainda não publicado), citando-se os acórdãos de 06-02-2008 (Proc. n.º 4454/07), de 14.07.2016 e de 17.06.2015 (Proc. 4403/00.2TDLSB.S1, rel. Cons. Pires da Graça, e 488/11.4GALNH, rel Cons. Maia Costa, em www.dgsi.pt), com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente; importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso.”
Assim, e porque o recorrente refere que a pena única aplicada é desajustada, cumpre apreciar se lhe assiste razão.

No caso, não obstante o limite máximo da moldura da pena única seja fixado em 25 (vinte e cinco) anos, a soma aritmética das penas parcelares seria de 135 anos e 6 meses de prisão.
De acordo com as regras supra enunciadas e as penas parcelares fixadas, a moldura da pena única a considerar quanto ao arguido, oscila entre um mínimo de 2 anos e 6 meses de prisão e o máximo de 25 anos de prisão.
Para fixação da pena única o tribunal a quo considerou que “a ilicitude e a culpa são intensas. Os factos praticados assumem igualmente grande gravidade, atentas as circunstâncias em que foram cometidos. Na avaliação da personalidade do arguido, importa reter o que consta dos factos provados, sendo que o mesmo revela uma propensão por este tipo de comportamento. Por outro lado, o arguido encontra-se enquadrado no seio da Família e da Sociedade, é bom trabalhador e respeitador dos colegas de trabalho.
Em desabono do arguido, a sua atitude em audiência de julgamento, denotando total ausência de autocrítica e interiorização do mal cometido.
Por outro lado, analisando o C.R.C., o arguido carece de forte socialização, possuindo antecedentes criminais, pela prática de crimes de igual natureza jurídica cometidos contra as suas filhas, tendo cumprido pena de prisão efectiva de 5 anos que não surtiu efeito, pois que apesar do longo período de tempo decorrido desde a prática desses factos, o arguido voltou a delinquir.”
Concordamos com essa fundamentação, sendo ainda de sublinhar que os comportamentos do arguido, bem como os seus antecedentes criminais evidenciam uma personalidade distorcida e pouco respeitadora dos valores inerentes à vivência em sociedade e, concretamente, dos valores relativos ao respeito da autodeterminação sexual.
Deste modo, sopesando as circunstâncias referentes à gravidade dos factos no seu conjunto, comportamento anterior, as relevantes exigências de prevenção especial e a personalidade do arguido, afigura-se não haver qualquer fundamento para alterar a medida da pena única fixada de 8 (oito) anos.
Considerando a medida da pena (superior a 5 anos de prisão) afastada está a aplicação do disposto no artigo 50º do Código Penal, que não se mostra violado pela determinação do cumprimento efectivo da pena em causa.
Nesta parte improcede, igualmente, o recurso.

3.4. O valor da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela demandante é excessivo.

Relativamente a esta questão defende o recorrente que tendo por base a redução significativa do número de crimes em que deverá ser condenado, nos termos acima expostos, imediatamente se conclui ser excessivo e desproporcionado o quantum indemnizatório de € 15.000,00 (quinze mil euros) atribuído pelo tribunal recorrido à assistente, impondo-se, outrossim, a redução do mesmo para quantia não superior a €5.000,00 (cinco mil euros).
Como já foi por nós mencionado nas questões anteriormente analisadas, inexistem fundamentos de facto e de direito para se concluir, como pretende o recorrente, pela redução significativa do número de crimes em que deverá ser condenado.
Assim, mantendo-se na sua totalidade a condenação do arguido/recorrente pelos ilícitos que fundamentaram a fixação pelo tribunal recorrido da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela assistente, não existem fundamentos de facto e de direito para alterar o valor a esse título arbitrado. Valor esse que, sopesando o grau de gravidade dos factos provados, as consequências deles decorrentes, as soluções jurisprudenciais para casos semelhantes[33], a censurabilidade ético-jurídica merecida pelo demandado e a situação económica do mesmo, não é passível de ser considerado excessivo ( cfr. artºs 496º, nº 1, 562 e 566º, nº 1 e 2 do C. Civil).
Mantém-se, assim, a indemnização civil arbitrada, improcedendo também aqui o recurso.

IV. DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em:

A) Alterar a redacção dos pontos 6 e 8 dos factos provados, nos seguintes termos:
1-“6-Durante a viagem, aproveitando os momentos em que o pai da menor estava distraído, o arguido tocou com a sua mão nos ombros e costas da menor.
8- Aí o arguido tornou a tocar com a sua mão nos ombros e costas da menor sempre que o pai dela estava distraído.”
2- Aditar aos factos não provados a seguinte alínea:
“c1) O arguido nas circunstâncias mencionadas nos nº 6 e 9 também tenha tocado à volta do peito da menor.”
B) Julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, confirma-se o acórdão recorrido.
Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em quatro unidades de conta (art.º 513º, n.º 1, do Código de Processo Penal e art.º 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa a este último diploma).
 (Texto elaborado pela relatora e revisto pelos signatários - art.º. 94º, n.º 2, do CPP)
                                                               
Guimarães, 22 de Fevereiro de 2023

Anabela Varizo Martins (relatora)
Paulo Almeida Cunha (1º adjunto)
Helena Lamas (2ª adjunta)


[1] Cfr. arts. 412.º e 417.º do C P Penal e, entre outros, Ac.do STJ de 27-10-2016, processo nº 110/08.6TTGDM.P2.S1, de 06-06-2018, processo nº 4691/16. 2 T8 LSB.L1.S1  e da Relação de Guimarães de 11-06-2019, processo nº 314/17.0GAPTL.G1, disponíveis em www.dgsi.pt  e, na doutrina, Germano Marques da Silva- Direito Processual Penal Português, 3, pag. 335 e Simas Santos e Leal Henriques in «Recursos em Processo Penal», Editora Rei dos Livros, 6.ª Edição, pág. 81 e seguintes .
[2]Acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 7/95, proferido pelo Plenário das Secções Criminais do STJ em 19 de outubro de 1995, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 298, de 28 de dezembro de 1995, que fixou jurisprudência no sentido de que “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”.
[3] em anotação a este normativo, in Código de Processo Penal – Comentado, 4º edição revista, pag. 650.
[4] cf., entre outros Acs. do STJ de 25-03-2004, Proc. n.º 463/04 - 5.ª, de 20-02-2008, Proc. n.º 4838/08 - 3.ª e de 27-10-201 processo nº 72/06.4 GACBT.G1.S1.
[5] cf. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e ss.
[6] In Curso de Processo Penal, vol. III, 1994, pag. 325.
[7] nomeadamente, entre outros, Acórdão do S. T. J de 20-04-2006, processo n.º 06P363, 05-12-2007, Processo nº 07P3406, de 14-07-2010, Processo 149/07.9JELSB.E1.S1O e Ac. da Relação de Coimbra de 12-06-2019, Processo GDCBR C1, disponíveis in www.dgsi.pt.
[8] Ac. da Relação de Guimarães de 11-05-2015, processo nº 3805/12.6IDPRT.G1, disponível em www.dgsi.pt.
[9] In Direito Processual Penal, Do Procedimento (Marcha do Processo ), Vol. 3, 2020, pag. 324.
[10] Proc. 6894 3ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[11] Em igual sentido Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 24-04-2018, Processo nº 1086/17.4T9FIG.C1 disponível in www.dgsi.pt.
[12]In Recursos em Processo Penal, 5º edição, 2002, pag. 63.
[13] in ob. citada, pág. 65 e 66.
[14] Processo nº 936/08.JAPRT, 3ª Secção.

[15] Cfr. acórdão da Rel. de Coimbra, de 09/01/2012, disponível in www.dgsi.pt.
[16] Processo nº 607/12.3GBVLN.G1 Igualmente disponível in www.dgsi.pt.
[17] disponíveis no sistema informático citius – media studio.
[18] Processo nº 28/16.9PTCTB.C1, in www.dgsi.pt.
[19] Cf. A c. da Relação de Coimbra de 03-06-2015, Processo nº 12/14.7GBSRT.C1 e no mesmo sentido Ac. da Relação de Coimbra de 20-03-2017 Processo nº 44/14.5TACRZ.G1.
[20] CJ – Ano XXVII - Tomo II, pág.44.
[21] Cf., nomeadamente, os acórdãos do STJ de 17-03-2016, processo n.º 849/12.1JACBR.C1.S1, de 14-03-2007, processo n.º 07P21, e de 23-05-2007, processo n.º 07P1498, do TRG de 19-03-2018, processo nº 26/16.2T9MDL.G1 e do TRP de 11-07-2001, processo n.º 110407, todos disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[22] Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada”, 3ª ed., pág. 203.
[23] Ac do Supremo tribunal de justiça de 27-01-2021, Processo nº1663/16.0T9LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[24]Entre outros, Ac. do S.T.J de 15 de Dezembro de 2011, Processo nº17/09.0TELSB.L1.S1, 05 Fevereiro 2009, Processo  nº 08P2381 de 12-03-2009, Processo 07P1769 e de 21-06-2017, Processo nº 294/16.0PCBRG.S1. disponíveis em www.dgsi.pt.

[25] Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual no Código Penal, 4.ª Edição Revista e modificada de acordo com a Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, Coimbra Editora, 2008, pp. 108-109.
[26] Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ª edição actualizada, pág. 733 a 739.
[27] In ob citada, pag. 735.
[28] “Código Penal Anotado”, III, 4ª ed., pág. 534.
[29] Processo nº 37/11. 4 GDARL.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[30] Paulo Pinto de Albuquerque, in ob. citada, pag. 736.
[31] Ac. do STJ de 29-05-2008, processo n.º 1001/08 - 5ª; de 15-07-2008, processo n.º 818/08 - 5.ª; de 03-09-2008 no processo n.º 3982/07-3ª; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08 - 3ª; de 08-10-2008, nos processos n.ºs 2878/08, 3068/08 e 3174/08, todos da 3ª secção; de 15-10-2008, processo n.º 1964/08 - 3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª e 15.10.2014, Pº nº 353/13.0JAFAR.S1 e Prof. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra Editora, 2ª Reimpressão, 2009, pág. 197.
[32] processo nº 1205/15.5T9VIS.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[33] Cfr. acórdãos do STJ, de 25 de Junho de 2002, in C.J. ano X, tomo 2.º, pág. 128 e de 4 de Novembro de 2004 C.J., n.º 179, pág. 223.