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EMBARGOS À EXECUÇÃO
REJEIÇÃO DE RECURSO SOBRE MATÉRIA DE FACTO
FUSÃO DE SOCIEDADE
PRESCRIÇÃO DE JUROS
INTERRUPÇÃO DO PRAZO
Sumário
I. No caso de transformação ou fusão de sociedade, parte na causa, a instância não se suspende para o efeito de habilitação, que não tem lugar (apenas se efetuando, se for necessário, a substituição dos seus representantes); e a sociedade incorporante permanece a mesma, enquanto parte. II. Interrompendo-se o prazo de prescrição com a citação, se esta não fizer dentro de 5 dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se aquela por interrompida logo que decorram os ditos cinco dias; e a causalidade em causa é de carácter objectivo (ou seja, a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objectivamente a lei, desde que propôs a acção até à verificação da citação, em qualquer termo processual).
Texto Integral
Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo
Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2.ª Adjunta - Alexandra Maria Viana Parente Lopes.
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ACÓRDÃO
I - RELATÓRIO
1.1.Decisão impugnada 1.1.1. AA (aqui Recorrente), propôs os presentes embargos à execução (movida contra ele e Outros por Banco 1..., S.A., para haver deles a quantia de € 13.382,28, acrescida de juros vincendos, e de que stes autso são apenso), contra Banco 1..., S.A. (aqui Recorrida), pedindo que
· os mesmos fossem julgados procedentes e, em consequência, fosse declarada extinta a acção executiva que constitui os autos principais.
Alegou para o efeito, em síntese, que a obrigação exequenda seria inexequível, uma vez que, sendo composta de capital e de juros, estes últimos encontrar-se-iam prescritos, já que só foi citado nos autos em 06 de Outubro de 2020, isto é, muito depois de terem decorrido cinco anos sobre a liquidação daqueles.
Mais alegou ser manifesta a ilegitimidade da Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.), já que quem figuraria como autora na sentença condenatória que se executa seria Banco 1..., S.A., e não ela própria, inexistindo ainda nos autos qualquer documento de cessão de créditos ou de sub-rogação. 1.1.2. Recebidos liminarmente os embargos, e regularmente notificada a Embargada/Exequente (Banco 1..., S.A.), a mesma contestou, pedindo que os embargos fossem julgados improcedentes.
Alegou para o efeito, em síntese, e quanto à alegada prescrição de juros, ser a mesma inexistente, já que, tendo a sentença condenatória exequenda transitado em julgado em 15 de Dezembro de 2010, intentou a presente acção executiva menos de cinco anos depois, presumindo a citação do Executado/Embargante (AA) nos cinco dias posteriores, nos termos do art. 323.º, n.º 2, do CPC.
Mais alegou, relativamente à sua pretensa ilegitimidade, ser igualmente a mesma inexistente, já que apenas teria alterado a sua denominação comercial, de inicial Banco 1..., S.A. para Banco 1..., S.A. e, actualmente, para Banco 2..., S.A. (conforme impressão de «Certidão Permanente» do Registo Comercial, que juntou).
1.1.3. Foi proferido despacho fixando o valor da causa em € 13.382,28; e saneador-sentença (certificando tabelarmente a validade e a regularidade da instância e conhecendo do mérito da causa), julgando os embargos totalmente improcedentes, lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Dispositivo Pelo exposto, julgo os presentes embargos de executado improcedentes e, em consequência, determina-se o prosseguimento da instância da acção executiva apensa os seus ulteriores termos. Custas pelo executado/embargante. (…)»
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1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos
Inconformado com esta decisão, o Executado/Embargante (AA) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que se julgasse o mesmo provido e se revogasse a sentença recorrida, sendo os respectivos embargos julgados procedentes.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis):
1.º - O objeto do presente recurso consiste em impugnar a improcedência dos embargos de executado, quanto à fundamentação de facto, na valoração dada aos itens 7.º e 8.º e quanto à fundamentação de direito nas exceções de ilegitimidade e da prescrição. (…)
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1.2.2. Contra-alegações
A Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) contra-alegou, pedindo que se julgasse o recurso improcedesse e se mantivesse o saneador-sentença recorrido, por serem infundadas as excepções de prescrição de juros e de ilegitimidade própria.
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II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR
2.1. Objecto do recurso - EM GERAL
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC [1]), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC) [2].
Com efeito, as conclusões deverão servir dois objectivos: um primeiro, para indicar «resumidamente os fundamentos da impugnação», fazendo-o pela «enunciação abreviadados fundamentos do recurso» (Professor Aberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, Limitada, pág. 359, com bold apócrifo) [3]; e um segundo (não menos importante), de definição do objecto do recurso [4].
Logo, as «conclusões são, não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações stricto sensu, mas também o elemento definidor do objeto do recurso e balizador do âmbito do conhecimento do tribunal ad quem» (Ac. do STJ, de 27.10.2016, Ribeiro Cardoso, Processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1).
Pretende-se, por isso, que o recorrente indique de forma resumida, através de proposições sintéticas, os fundamentos de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão, para que seja possível delimitar o objecto do recurso de forma clara, inteligível, concludente e rigorosa (conforme Ac. do STJ, de 18.06.2013, Garcia Calejo, Processo n.º 483/08.0TBLNH.L1.S1).
Assim, e independentemente do que o recorrente tenha antes expendido (em sede de corpo de alegações de recurso), terão as conclusões que conter a indicação precisa de quais os concretos pontos de facto cuja alteração se pretende (ónus principal) já que só assim «verdadeiramente [se] permite circunscrever o objecto do recurso no que concerne à matéria de facto» (Ac. do STJ, de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1).
Está-se aqui perante uma das concretizações do princípio da auto-responsabilidade das partes.
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Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida) [5], uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação/reponderação e consequente alteração e/ou revogação, e não a um novo reexame da causa).
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2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar 2.2.1. Questões incluídas no objecto do recurso
Mercê do exposto, e do recurso de apelação interposto pelo Executado/ Embargante (AA), 02 questões foram submetidas à apreciação deste Tribunal ad quem: 1.ª- Fez o Tribunal a quo uma erradainterpretação e aplicação do Direito, nomeadamente pora Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) não ter legitimidadepara interpor a acção executiva, devendo ser alterada a decisão de mérito proferida, por forma a que se julgue extinta aquela com esse fundamento ? 2.ª- Fez o Tribunal a quo uma erradainterpretação e aplicação do Direito, nomeadamente por os juros reclamados nos autos se encontrarem prescritos, devendo ser alterada a decisão de mérito proferida, por forma a que se julgue inexigível a obrigação exequenda e extinta a acção executiva com esse fundamento ?
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2.2.2. Questões excluídas do objecto do recurso 2.2.2.1. Rejeição de (eventual) recurso sobre a matéria de facto
Lê-se, no art. 640.º, n.º 1, al. a), do CPC, que, quando «seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição» os «a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas».
Logo, deve o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso [6], para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, e de indicar para cada um deles a prova que justificaria uma decisão diferente, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada.
Esta exigência, «vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente», devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor [7] enquanto «decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes», «impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo» (António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 129, com bold apócrifo).
Somando-se, porém, a este ónus de impugnação, encontra-se o já referido ónus de conclusão, previsto no art. 639.º, n.º 1, do CPC (onde, recorda-se, se lê que o «recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão»).
Sendo o mesmo incumprido (nomeadamente, quando nas respectivas conclusões seja omissa a indicação dos «concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados»), não é admissível despacho de aperfeiçoamento [8], tendo o recorrente limitado desse modo o seu objecto [9]; e deverá o recurso efectivamente interposto (limitado à matéria de direito) ser apreciado em conformidade (nomeadamente, quanto à tempestividade da respectiva apresentação) [10].
Compreende-se que assim seja, já que, nesta segunda situação, a impugnação da matéria de facto - bem ou mal feita - faz parte do objecto do recurso [11]; e «o prazo de interposição do recurso é pela lei fixado em função do modo como o recorrente concebe o respectivo objecto» (Ac. da RG, de 07.04.2016, José Amaral, Processo n.º 4247/10.3TJVNF.G1).
Concretizando, veio o Recorrente (AA), no corpo das suas alegações, defender que, «não obstante os factos sejam considerados provados pelo tribunal a quo, quer por via dos documentos juntos aos autos, quer por ausência de motivação que não é explicita, quer pelos factos não controvertidos, por acordo das partes, vem o recorrente impugnar a factualidade documental que intenta legitimar a posição do exequente».
Contudo, e se era sua intenção recorrer sobre a matéria de facto julgada pelo Tribunal a quo, deveria para o efeito impugnar expressamente os factos provados enunciados na sentença recorrida sob os números 7 e 8 (que se lhe referem [12]); e cumprir os ónus que lhe estavam cometidos, o que, porém, não fez.
Precisando, e quanto ao ónus de impugnação do art. 640.º, n.º 1, do CPC, não indicou, nomeadamente, qual a decisão que, em seu entender, deveria ser proferida sobre aqueles factos, por indicação da concreta redacção para eles proposta; e, quanto ao subsequente ónus de conclusão, não indicou expressamente nas conclusões do seu recurso que impugnava os referidos factos provados, em vez de apenas discordar da «valoração dada aos itens 7.º e 8.º»
Estas omissões implicam a rejeição de um eventual e pretendido recurso com esse objecto.
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2.2.2.2. (Subsidiária) Improcedência de (eventual) recurso sobre a matéria de facto
Contudo, e ainda que assim se não entendesse, continuaria o Executado/Embargante (AA) a não lograr qualquer êxito numa pretendida alteração da matéria de facto.
Com efeito, sendo a fusão, a cisão, o aumento de capital e a alteração de denominação de uma sociedade comercial actos obrigatoriamente sujeitos a registo (conforme art. 3.º, n.º 1, al. r), do CRCom.), uma vez realizado este presume-se que existe a situação jurídica que documenta, nos precisos termos em que o faz (art. 11,º, do CRCom.).
Ora, tendo a Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) juntado, com a sua contestação, a impressão de uma «Certidão Permanente» relativa a si própria[13], e tendo o acesso on line à mesma o valor de uma certidão tradicional do registo comercial [14], não foi o documento autêntico que consubstancia oportunamente arguido de falso, ou colocada em causa a veracidade ou exactidão do respectivo conteúdo (arts. 363.º, n.ºs 1 e 2, 370.º, 371.º, 372.º e 383.º, todos do CC).
Logo, beneficiando a Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) de uma presunção registral, não foi a mesma oportunamente ilidida pelo Executado/Embargante (AA) (que, perante o documento que a consubstanciava, permaneceu absolutamente inerte); e, por isso e desde então, ficou assente que Banco 1..., S.A., entre outras instituições, foi objecto de uma escritura de cisão/fusão, aumento de capital e alterações do contrato de sociedade, passando, como sociedade incorporante, a denominar-se Banco 1..., S.A. e, posteriormente, Banco 2..., S.A..
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Mostra-se, por isso, definitivamente assente a matéria de facto que foi apurada pelo Tribunal a quo.
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III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
3.1. Decisão de Facto do Tribunal de 1.ª Instância 3.1.1. Factos Provados
O Tribunal a quo considerou que, face «aos documentos juntos aos autos e por acordo das partes, e com interesse à boa decisão da causa», se provaram «os seguintes factos»:
1 - Banco 1..., S.A. (aqui Exequente/Embargada), intentou a execução com o n.º 945/15...., a que os presentes autos estão apensos, contra, entre outro, AA (aqui Executado/Embargante), para cobrança da quantia de € 13.382,28.
2 - A Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) deu à execução uma sentença judicial, transitada em julgado a 15 de Outubro de 2010, cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido e onde nomeadamente se lê: «(…) Em face do exposto, o Tribunal decide julgar a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: 1. Condenar solidariamente os Réus O... Sociedade Construtora, L.da, e AA a pagar ao Autor Banco 1..., S.A. a) A quantia mutuada e não paga no valor de € 6.084,38 (seis mil e oitenta e quatro euros e trinta e oito cêntimos); b) A quantia de € 74,95 (setenta e quatro euros e noventa e cinco cêntimos), a título de juros remuneratórios relativos à 31.ª prestação; c) Os juros vencidos e vincendos desde 10/12/2008 sobre o capital a que se alude em a), à taxa convencional de 15,142% ao ano, até integral pagamento; d) O imposto de selo devido sobre os juros vencidos e vincendos referidos na alínea anterior. (…)»
3 - No requerimento executivo (que aqui se dá por integralmente reproduzido), a Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) liquidou a obrigação exequenda.
4 - A liquidação da obrigação exequenda foi feita no requerimento executivo nos seguintes termos: «(…) CAPITAL I ----------------------- € 6.084,38 CAPITAL II ---------------------- € 74,95 JUROS VENCIDOS À TAXA DE 15,142% SOBRE (i) € 6.084,38 DESDE 10.12.2008 ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA, EM 15.12.2010 ----- € 1.855,21 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% ATÉ 15.12.2010 ------------- € 74,21 JUROS VENCIDOS À TAXA DE 20,142% (15,142% + 5% ARTIGO 829.º-A, N.º4 C.CIVIL e ART.º 13-1-D) e 21º do DECRETO-LEI 269/98, DE 1 DE SETEMBRO) SOBRE (i) € 6.084,38 DESDE 16.12.2010 ATÉ AO PRESENTE, 28.01.2015 ---------------- € 5.053,15 IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% ATÉ 28.01.2015 -------------- € 202,13 TAXA DE JUSTIÇA ---------- € 38,25 TOTAL (EXCLUÍDOS JUROS VINCENDOS E IMPOSTO DE SELO DESDE 29.01.2015) ------- € 13.382,28 MAIS JUROS VINCENDOS À TAXA DE 20,142% SOBRE € 6.084,38, DESDE 29.01.2015 ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO E IMPOSTO DE SELO À TAXA DE 4% SOBRE ESSES JUROS. (…)»
5 - A execução apensa - execução sumária - deu entrada em juízo a 28 de Janeiro de 2015.
6 - O Executado/Embargante (AA) foi citado a 06 de Outubro de 2022, após penhora.
7 - Banco 1..., S.A., entre outras instituições, foi objecto de uma escritura de cisão/fusão, aumento de capital e alterações do contrato de sociedade, como sociedade incorporante, passando a denominar-se Banco 1..., S.A..
8 - Em 30 de Dezembro de 2011, foi registada a fusão/cisão referida no facto provado anterior.
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3.1.2. Factos não provados
Na mesma decisão, o Tribunal de 1.ª Instância não elencou quaisquer factos como não provados.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
4.1. Legitimidade activa em acção executiva 4.1.1.1. Legitimidde do exequente
Lê-se no art. 10.º, n.º 5, do CPC, que toda «a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva».
Mais se lê, no art. 53.º, n.º 1, do mesmo diploma, que a «execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor».
«Apela-se, assim, à literalidade do título executivo, seja ele sentença, contrato, título de crédito ou qualquer outro. Num certo sentido, a legitimidade singular executiva apura-se por confronto entre o título executivo e as partes da causa» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 278, com bold apócrifo).
Compreende-se, por isso, que se afirme, não se dizendo «no preceito em causa que são partes legítimas, como exequente e executado, credor e devedor, respectivamente, mas aqueles que no título figurem nessas qualidades», «vale por dizer que uma pessoa pode aparecer no título na posição de credor ou de devedor sem que seja realmente titular de um direito de crédito ou sujeito de uma obrigação. Apenas o título executivo faz presumir a existência de um crédito e de uma dívida» (Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 12.ª edição, Almedina, Janeiro de 2010, pág. 74).
«Daqui resulta que há ilegitimidade singular na ação executiva se o exequente ou o executado, apesar de partes processuais, não são os sujeitos do título executivo». Já se a dívida exequenda não existe efectivamente, «isso não tolhe a legitimidade inicial das partes, sendo já do domínio da procedência da pretensão do autor, executiva» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 293).
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4.1.1.2. Transformação de sociedade
A transformação de uma sociedade comercial (lato sensu) não implica a sua extinção, conforme art. 130.º, n.º 3 do CSC [15]. A sociedade transformada mantém, assim, a sua personalidade jurídica, embora com outro estatuto ou efeitos jurídicos [16].
Contudo, e no caso da fusão [17], a mesma implica o desaparecimento da sociedade incorporada (fusão por incorporação ou absorção), ou de todas as sociedades fundidas quando haja lugar à constituição de uma nova (fusão por concentração ou constituição de uma nova sociedade). Com efeito, lê-se no art. 112.º, al. a), do CSC, que, uma vez realizada, e inscrita a fusão no registo comercial, extinguem-se «as sociedades incorporadas ou, no caso de constituição de nova sociedade, todas as sociedades fundidas, transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante ou para a nova sociedade» [18].
Já no caso da cisão, pode, ou não, dar lugar à extinção da sociedade. Com efeito, lê-se no art. 118.º, n.º 1, do CSC, que é «permitido a uma sociedade: a) Destacar parte do seu património para com ela constituir outra sociedade; b) Dissolver-se e dividir o seu património, sendo cada uma das partes resultantes destinada a constituir uma nova sociedade; c) Destacar partes do seu património, ou dissolver-se, dividindo o seu património em duas ou mais partes, para as fundir com sociedades já existentes ou com partes do património de outras sociedades, separadas por idênticos processos e com igual finalidade».
Estando a sociedade transformada ou objecto de fusão em juízo, lê-se no art. 269.º, n.º 2, do CPC, que, no «caso de transformação ou fusão de pessoa coletiva ou sociedade, parte na causa, a instância não se suspende, apenas se efetuando, se for necessário, a substituição dos representantes».
Dispensa-se, assim, a dedução de qualquer incidente de habilitação, mercê do princípio da identidade ou continuação da sociedade comercial; e apenas se prevê a necessidade de se substituírem os seus representantes, quando essa função não continue a ser exercida pelas mesmas pessoas (isto é, na anterior e na actual pessoa colectiva).
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4.1.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)
Concretizando, verifica-se que, mediante uma escritura de cisão/fusão, Banco 1..., S.A. (que figurava com autor na sentença condenatória que constitui o título que se executa nos autos principais) incorporou outras sociedades financeiras, passando a denominar-se Banco 1..., S.A. (que propôs, como exequente, os ditos autos principais).
Logo, mostra-se assegurada a sua legitimidade activa para o efeito (não obstante a mesma não resultasse de imediato do título executivo, mas sim da prova que posteriormente foi feita, sempre autorizada nos termos dos arts. 726.º, n.º 4, 729.º, al. c) e 734.º, aplicáveis ex vi do art. 551.º, n.º 3, todos do CPC).
Improcede, assim, o primeiro fundamento do recurso de apelação do Executado/Embargante (a ilegitimidade da Exequente/Embargada).
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4.2. Prescrição de juros 4.2.1.1. Regime legal
Lê-se no art. 310.º, al. d), do CC, que prescrevem «no prazo de cinco anos» os «juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos».
Com efeito, o decurso do tempo é um factor modificador das relações jurídicas, actuando, nomeadamente, por efeito da prescrição (regulada, de forma geral, nos arts. 298.º, e 300.º a 327.º, todos do CC, e, em especial, nos arts. 430.º, 482.º, 498.º, 500.º, 521.º, 530.º e 636.º, do mesmo diploma) [19].
Por via dela, «tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito», embora «a prestação realizada espontaneamente em cumprimento de uma obrigação prescrita», ainda que com ignorância quanto à mesma, não possa ser repetida (art. 304.º, n.º 1 e n.º 2, do CC).
Logo, e independentemente de se considerar a prescrição uma causa extintiva [20], ou não extintiva [21], da obrigação, certo é que, por meio dela, se torna inexigível o cumprimento civil da obrigação, nos termos dos arts. 576.º, n.º 3 e 579.º, ambos do CPC (como excepção peremptória que é).
São, assim, seus requisitos: a existência de um direito [22]; o seu não exercício por parte do respectivo titular; e o decurso do tempo [23].
Uma vez verificada, a «prescrição aproveita a todos os que dela possam tirar benefício, sem excepção dos incapazes» (art. 301.º, do CC).
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Este instituto fundamenta-se na negligência do titular de um direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei, e que a leva a presumir que ele tenha querido renunciar ao direito; ou que, pelo menos, o torna indigno da sua protecção.
Por outro lado, e ao mesmo tempo que actua como estímulo e pressão educativa sobre os titulares dos direitos (no sentido de não descurarem o seu exercício, quando não querem abdicar deles), o instituto de prescrição salvaguarda ainda interesses de ordem pública, nomeadamente de certeza e segurança jurídicas [24].
Com efeito, o titular do direito que, negligentemente, não o exerceu, permitiu a constituição, e o prolongamento por muito tempo, de situações de facto, sobre as quais se criaram expectativas e se organizaram planos de vida; e contribuiu, outrossim, para que a prova do alegado devedor que, porventura, já tenha cumprido, se tornasse muito mais difícil, senão mesmo impossível.
Logo, pela prescrição atende-se não só à probabilidade séria, baseada na experiência, de que uma pretensão formulada com base num facto alegadamente constitutivo, ocorrido há um lapso de tempo relevante, nunca se tenha verdadeiramente verificado (ou se tenha, entretanto, extinguido), como se atende ainda, quando assim não seja, à negligência do respectivo titular (que só poderá imputar a si próprio o prejuízo resultante da natureza intrinsecamente injusta deste instituto).
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4.2.1.2. Contagem do prazo - Interrupção
Em regra, o «prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido» (art. 306.º, n.º 1, do CC); e, sendo fixado em anos, «a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro do último (...) ano, a essa data» (art. 279.º, al. c), aplicável ex vi do art. 296.º, ambos do CC).
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Contudo, lê-se no art. 323.º, n.º 1, do CC, que «a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente».
Logo, e por razões de certeza, exige-se que o acto interruptivo revista determinada forma(por só ela permitir a interpretação inequívoca da vontade de exercer o direito): apenas actos judiciais; e específicos, como a citação e a notificação judicial.
Com efeito, embora a instância se inicie pela proposição da acção, com o recebimento da respectiva petição inicial pela secretaria, certo é que tal «acto de proposição não produz efeitos em relação ao réu senão a partir do momento da citação, salvo disposição legal em contrário» (art. 259.º, do CPC). Assegura-se, deste modo, que a actuação do credor (que exerce o seu direito ou exprime a intenção de o fazer) - desconforme então com qualquer pretérita negligência ou inércia sua - chegue ao conhecimento do devedor (que passa a ter conhecimento daquele exercício ou desta intenção).
Precisa-se, porém, que a deslocação do efeito interruptivo da prescrição para a citação é feita no pressuposto de que esta se segue à propositura da acção, e mediando entre uma e outra um curto intervalo de escassos dias.
Mais se lê, no n.º 2 do art. 323.º, citado, que, se «a citação ou notificação não se fizer dentro de cinco dias depois e ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição interrompida logo que decorram os cinco dias».
Previnem-se, assim, os atraso que se poderão registar na prática dos referidos actos judiciais (citação e notificação judicial), não imputáveis ao credor, que, logo após apresentar o seu requerimento inicial, perde o controlo do processo [25]. Logo, o decurso do prazo de cinco dias previsto no n.º 2, do art. 323.º, do CC, equivale a uma citação ficta (tida como realizada no quinto dia) [26], pressupondo que a real se venha a realizar.
Esta ficção legal exige, porém, a concorrência de três requisitos: que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à instauração da acção declarativa ou executiva; que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; e que o retardamento da citação não seja imputável ao requerente (nomeadamente, por - entre a apresentação do seu requerimento executivo e o acto de citação - ter negligentemente omitido ou praticado actos que atrasaram o processo, em desrespeito da lei do processo)[27].
Precisando este último requisito, é entendimento pacífico na jurisprudência que a conduta do credor só não exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação; e não lhe é exigível que se socorra de actos ou mecanismos aceleratórios, destinados a permitir um curso mais célere do processo na sua fase liminar, já que os mesmos constituem uma faculdade e não um dever ou ónus seu [28].
Por fim, lê-se no art. 326.º, do CC, que «a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo» (n.º 1), sendo que «a nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva» (n.º 2).
Precisa-se, porém, que quando a interrupção resulta da citação, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo do processo (art. 327.º, n.º 1, do CC); e este regime aplica-se quer à citação efectivamente realizada nos cinco dias após entrada do requerimento inicial, quer à citação ficta [29].
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4.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)
Concretizando, verifica-se que, tendo transitado em julgado, em 15 de Outubro de 2010, uma sentença a condenar o aqui Executado/Embargante (AA) a pagar à aqui Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) um determinado montante, constituído por capital e juros, acrescido de juros vincendos, veio esta, em 28 de Janeiro de 2015, a intentar a acção executiva que constitui os autos principais.
Logo, quando o fez ainda não se encontrava decorrido o prazo de cinco anos de prescrição dos juros a que tinha direito (que só se completaria no dia 15 de Outubro de 2015).
Mais se verifica que, no âmbito da referida execução sumária, o Executado/Embargante (AA) apenas foi citado, após realização de penhora, em 06 de Outubro de 2022.
Contudo, nada tendo sido alegado, nem se tendo provado, quanto a uma eventual imputabilidade à Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) da falta de realização da citação nos cinco dias posteriores à entrada em juízo da acção executiva por si instaurada, tem-se a dita prescrição de juros por interrompida em 2 de Fevereiro de 2015 (sendo irrelevante para este efeito a sua conduta anterior, ou posterior, porque não é esse o hiato temporal considerado aqui pela lei [30]).
Precisa-se, a propósito, que nem é imputável à Exequente/Embargada (Banco 1..., S.A.) a forma de acção executiva que lhe foi imposta (sumária), em que a penhora antecede a citação do executado (arts. 550.º e 856.º, ambos do CPC) - e que, inclusivamente, se destinada a beneficiá-la, pela maior celeridade que assim se consegue na cobrança dos créditos -, nem o agente de execução (a quem poderiam ser imputáveis eventuais atrasos) é seu representante legal (art. 720.º, do CPC).
Logo, não ocorreu a prescrição de juros invocada pelo Executado/Embargante (AA).
Improcede, assim, o segundo fundamento do recurso de apelação do Executado/Embargante (a prescrição do crédito exequendo, ainda que parcial).
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Deverá decidir-se em conformidade, pela improcedência total do recurso de apelação do Executado/Embargante (AA).
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V - DECISÃO
Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pelo Excecutado/Embargante (AA), e, em consequência, em
· Confirmar integralmente a sentença recorrida.
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Custas da apelação pelo Executado/Embargante (art. 527.º, n.º 1, do CPC).
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Guimarães, 16 de Fevereiro de 2023.
O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos
Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2.ª Adjunta - Alexandra Maria Viana Parente Lopes.
[1]Lê-se no art. 639.º, n.º 1, do CPC, que o «recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão»; e lê-se no art. 635.º, n.º 4 do CPC, que nas «conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso». [2] «Trata-se, aliás, de um entendimento sedimentado no nosso direito processual civil e, mesmo na ausência de lei expressa, defendido, durante a vigência do Código de Seabra, pelo Prof. Alberto dos Reis (in Código do Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 359) e, mais tarde, perante a redação do art. 690º, do CPC de 1961, pelo Cons. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III, 1972, pág. 299» (Ac. do STJ, de 08.02.2018, Maria do Rosário Morgado, Processo n.º 765/13.0TBESP.L1.S1, nota 1 - inwww.dgsi.pt, como todos os demais citados sem indicação de origem). [3]Reafirmando hoje este entendimento, Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, Almedina, págs. 172 e 173, onde nomeadamente se lê que, «expostas pelo recorrente, no corpo da alegação, as razões de facto e de direito da sua discordância com a decisão impugnada, deve ele, face à sua vinculação ao ónus de formular conclusões, terminar a sua minuta pela indicação resumida, através de proposições sintéticas, dos fundamentos, de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão».
Na jurisprudência, Ac. do STJ, de 08.02.2018, Maria do Rosário Morgado, Processo n.º 765/13.0TBESP.L1.S1, nota 1, onde se lê que se trata, «aliás, de um entendimento sedimentado no nosso direito processual civil e, mesmo na ausência de lei expressa, defendido, durante a vigência do Código de Seabra, pelo Prof. Alberto dos Reis (in Código do Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 359) e, mais tarde, perante a redação do art. 690º, do CPC de 1961, pelo Cons. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III, 1972, pág. 299». [4] No mesmo sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág.118, onde nomeadamente se lê que as «conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objecto do recurso».
Ainda António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código De Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, pág. 762, nota 3, quando afirmam que «objeto do recurso é integrado pelas respectivas conclusões», sem prejuízo das «questões de conhecimento oficioso relativamente às quais existam elementos que possam ser apreciados» (o que reafirmam a pág. 767, nota 4, e a pág. 770, nota 3, da mesma obra).
Na jurisprudência: . Ac. do STJ, de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1 - onde se lê que, independentemente do que o recorrente tenha antes expendido (em sede de corpo de alegações de recurso), terão as conclusões que conter a indicação precisa de quais os concretos pontos de facto cuja alteração se pretende, já que só assim «verdadeiramente [se] permite circunscrever o objecto do recurso no que concerne à matéria de facto». . Ac. do STJ, de 27.10.2016, Ribeiro Cardoso, Processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1 - onde se lê que as «conclusões são, não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações stricto sensu, mas também o elemento definidor do objeto do recurso e balizador do âmbito do conhecimento do tribunal ad quem». [5]Neste sentido, numa jurisprudência constante, Ac. da RG, de 07.10.2021, Vera Sottomayor, Processo n.º 886/19.5T8BRG.G1, onde se lê que questão nova, «apenas suscitada em sede de recurso, não pode ser conhecida por este Tribunal de 2ª instância, já que os recursos destinam-se à apreciação de questões já levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que não foram nem submetidas ao contraditório nem decididas pelo tribunal recorrido». [6] Com efeito, e ao contrário d
o que sucede com o recurso relativo à decisão sobre a matéria de direito (previsto no art. 639.º, n.º 2 e n.º 3, do CPC), no recurso relativo à matéria de facto (previsto no art. 640.º, do CPC) não se admite despacho de aperfeiçoamento.
Aliás, o entendimento da não admissibilidade de despacho de aperfeiçoamento face ao incumprimento, ou ao cumprimento deficiente, do ónus de impugnação da matéria de facto, já era generalizadamente aceite no âmbito do similar art. 690.º-A do anterior CPC, de 1961 (conforme Carlos Lopes do Rego, Comentário ao Código de Processo Civil, Volume I, 2.ª edição, Almedina, pág. 203).
Neste sentido: . na doutrina -António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 128; ou Rui Pinto, Notas Ao Código De Processo Civil, Volume II, 2.ª edição, Coimbra Editora, Novembro de 2015, pág. 142, nota 4.
. na jurisprudência - Ac. da RG, de 19.06.2014, Manuel Bargado, Processo n.º 1458/10.5TBEPS.G1; Ac. do STJ, de 27.10.2016, Ribeiro Cardoso, Processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1; Ac. da RG, de 18.12.2017, Pedro Damião e Cunha, Processo n.º 292/08.7TBVLP.G1; Ac. do STJ, 27.09.2018, Sousa Lameira, Processo n.º 2611/12.2TBSTS.L1.S1; Ac. do STJ, de 03.10.2019, Maria Rosa Tching, Processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2); ou Ac. do STJ, de 02.02.2022, Fernando Samões, Processo n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1.
Contudo, em sentido contrário
, Ac. do STJ, de 26.05.2015, Hélder Roque, Processo n.º 1426/08.7TCSNT.L1.S1, onde se lê que a cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c) do n.º 1, ao contrário do que acontece quanto à matéria do n.º 2 do art. 640.º do CPC (a propósito da «exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso»), não funciona aqui, automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente, desde logo, a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação. [7] A exigência de rigor, no cumprimento do ónus de impugnação, manifestou-se igualmente a propósito do art. 685º-B, n.º 1, al. a), do anterior CPC, de 1961, conforme Ac. da RC, de 11.07.2012, Henrique Antunes, Processo n.º 781/09, onde se lê que este «especial ónus de alegação, a cargo do recorrente, deve ser cumprido com particular escrúpulo ou rigor», constituindo «simples decorrência dos princípios estruturantes da cooperação e lealdade e boa fé processuais, assegurando, em última extremidade, a seriedade do próprio recurso». [8]Aparentemente no mesmo sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código De Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, quando a pág. 768, nota 6, reservam o despacho de aperfeiçoamento ao recurso «em matéria de direito»; e quando a pág. 720, nota 2, referem - sem qualquer crítica, ou afastamento - que, segundo «a jurisprudência largamente maioritária, não existe relativamente ao recurso da decisão da matéria de facto despacho de aperfeiçoamento». Fazem, porém, notar que esta solução, «em vez de autorizar uma aplicação excessivamente rigorista da lei, deve fazer pender para uma solução que se revele proporcionada relativamente à gravidade da falha verificada».
Na jurisprudência mais recente, veja-se o Ac. do STJ, de 03.10.2019, Maria Rosa Tching, Processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2, onde se lê que, relativamente «ao recurso da decisão da matéria de facto, está vedada ao relator a possibilidade de proferir despacho de aperfeiçoamento, na medida em que, em matéria de recursos, o artigo 652º, nº1, al. a), do Código de Processo Civil, limita essa possibilidade às “conclusões das alegações, nos termos do nº 3 do artigo 639º”». [9]Precisa-se, a propósito, que importa distinguir a natureza, e as consequências, das diversas actuações possíveis do recorrente: uma primeira (relativa a um ónus primário), que contende com a delimitação do objecto do seu recurso, e que deixa absolutamente omissa, nas respectivas conclusões, a indicação da matéria de facto impugnada (limitando desse modo o recurso, e inexoravelmente, à sindicância da matéria de direito); e uma segunda (relativa ao ónus secundários), que contende com a análise jurídica do cumprimento do ónus de impugnação previsto no art. 640,º, do CPC, e que deixa absolutamente omissa, nas mesmas conclusões de recurso - e ao contrário do que previamente fizera no corpo das respectivas alegações -, a indicação dos concretos meios probatórios que imporiam decisão diferente, da decisão alternativa pretendida, e das exactas passagens da gravação que o fundariam.
Ora, servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, terão nelas que ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação, sob pena de rejeição do mesmo; mas basta quanto aos demais requisitos que constem de forma explícita na motivação do recurso.
Neste sentido: Ac. do STJ, de 19.02.2015, Tomé Gomes, Processo n.º 299/05.6TBMGD.P2.S1; Ac. do STJ, de 04.03.2015, Leonel Dantas, Processo n.º 2180/09.0TTLSB.L1.S2; Ac. do STJ, de 22.09.2015, Pinto de Almeida, Processo n.º 29/12.6TBFAF.G1.S1; Ac. do STJ, de 01.10.2015, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1; Ac. do STJ, de 26.11.2015, Leonel Dantas, Processo n.º 291/12.4TTLRA.C1.S; Ac. do STJ, de 03.12.2015, Melo Lima, Processo n.º 3217/12.1TTLSB.L1-S1; Ac. do STJ, de 11.02.2016, Mário Belo Morgado, Processo n.º 157/12-8TVGMR.G1.S1; Ac. do STJ, de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1; Ac. do STJ, de 21.04.2016, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 449/10.0TTVFR.P2.S1; Ac. do STJ, de 28.04.2016, Abrantes Geraldes, Processo n.º 1006/12.2TBPRD.P1.S1; Ac. do STJ, de 31.05.2016, Garcia Calejo, Processo n.º 1572/12.2TBABT.E1.S1; Ac. do STJ, de 09.06.2016, Abrantes Geraldes, Processo n.º 6617/07.5TBCSC.L1.S1; Ac. do STJ, de 13.10.2016, Gonçalves Rocha, Processo n.º 98/12.9TTGMR.G1.S1; Ac. do STJ, de 16.05.2018, Ribeiro Cardoso, Processo n.º 2833/16.7T8VFX.L1.S1; Ac. do STJ, de 06.06.2018, Ferreira Pinto, Processo n.º 167/11.2TTTVD.L1.S1; Ac. do STJ, de 06.06.2018, Pinto Hespanhol, Processo n.º 552/13.5TTVIS.C1.S1; Ac. do STJ, 12.07.2018, Ferreira Pinto, Processo n.º 167/11.2TTTVD.L1.S1; Ac. do STJ, de 31.10.2018, Chambel Mourisco, Processo n.º 2820/15.2T8LRS.L1.S1; Ac. do STJ, de 13.11.2018, Graça Amaral, Processo n.º 3396/14; ou Ac. do STJ, de 03.10.2019, Maria Rosa Tching, Processo n.º 77/06.5TBGVA.C2.S2. [11]Serão, por exemplo, os casos em que o recorrente, enunciando os pontos de facto que pretende impugnar, é porém omisso quanto aos concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida (Ac. da RP, de 10.07.2013, Manuel Domingos Fernandes, Processo n.º 391/11.8TBCHV.P1), ou não cumpre os ónus secundários do n.º 2 do art. 640.º do CPC, designadamente, de exacta indicação das passagens da gravação (Ac. do STJ, de 22.10.2015, Lopes do Rego, Processo n.º 2394/11.3TBVCT.G1.S1, ou Ac. do STJ, de 26.11.2015, António Leones Dantas, Processo n.º 291/12.4TTLRA.C1.S1). [12]Recorda-se que se lê nos mesmos:
«7 - Banco 1..., SA, entre outras instituições, foi objecto de uma escritura de cisão/fusão, aumento de capital e alterações do contrato de sociedade, como sociedade incorporante, passando a denominar-se Banco 1..., S.A.». «8 - Em 30 de Dezembro de 2011 foi registada a fusão/cisão». [13] A «Certidão Permanente» foi prevista pelo Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de Março (no âmbito do Programa Simplex, que adoptou medidas de desburocratização com a simplificação e eliminação de actos e procedimentos registrais e notariais): consagrou-se então a possibilidade de se praticar actos de registos on-line, permitindo que as empresas pudessem ter uma certidão permanentemente disponível num sítio na Internet e assegurando-se que, enquanto essa certidão estiver on-line, nenhuma entidade pública poderá exigir de quem aderiu a este serviço uma certidão em papel, ficando, pois, tal entidade obrigada a consultar o site sempre que pretenda confirmar a informação que lhe foi declarada.
Viria a ser criada pelo art. 14.º, da Portaria n.º 1416-A/2006, de 19 de Dezembro, onde é definida como «a disponibilização, em suporte electrónico e permanentemente actualizado, da reprodução dos registos em vigor respeitantes a uma sociedade ou outra entidade sujeita a registo». [14]De acordo com o art. 17.º, n.º 2, da Portaria n.º 1416-A/2006, de 19 de Dezembro, a «entrega, a qualquer entidade pública ou privada, do código de acesso à certidão permanente equivale, para todos os efeitos, à entrega de uma certidão do registo comercial» em papel.
De forma conforme, lê-se no art. 75.°, n.º 5, do CRCom. (na redacção que lhe foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março), que o registo se prova, para todos os efeitos legais e perante qualquer autoridade pública ou entidade privada, com a disponibilização da informação constante da certidão em sítio da Internet, definido por portaria do Ministério da Justiça. [15]Lê-se no art. 130.º, n.º 3, do CSC, que a «transformação de uma sociedade, nos termos dos números anteriores, não importa a dissolução dela, salvo se assim for deliberado pelos sócios». [16] Neste sentido:
. na doutrina - Raul Ventura, Fusão, Cisão e Transformação das Sociedades Comerciais, Almedina, págs. 509 e segs.; Miguel J. A. Pupo Correia, Direito Comercial, pág. 567; Miguel Caeiro, Temas de Direito Comercial, Almedina, pág.233; ou Menezes Cordeiro, Manual de Direito das Sociedades, Volume I, Almedina, 2004 , pág. 783, III.
. na jurisprudência - Ac. da RL, de 09.07.2003, Abrantes Geraldes, Processo n.º 5925/2003-7; Ac. da RG, de 25.09.2008, Gouveia Barros, Processo n.º 1617/08-1; Ac. do STJ, de 11.04.2018, Pinto Hespanhol, Processo n.º 708/11.5TTMTS-A.P1.S1; ou Ac. da RC, de 21.01.2020, António Carvalho Martins, Processo n.º 494/18.8T8CTB-A.C1. [17]Lê-se no art. 97.º, do CSC, que «duas ou mais sociedades, ainda que de tipo diverso, podem fundir-se mediante reunião numa só» (n.º 1); e a fusão poderá realizar-se mediante «a transferência global do património de uma ou mais sociedades para outras e a atribuição aos sócios daquelas de partes, acções ou quotas desta», ou mediante «a constituição de uma nova sociedade, para a qual se transferem globalmente os patrimónios das sociedades fundidas, sendo aos sócios destas atribuídas partes, acções ou quotas da nova sociedade» (n.º 4). [18] Precisa-se que, não «qualifica ou determina a lei que tipos ou espécies de direitos e obrigações se transmitem; a previsão abrange todos os direitos e obrigações que puderem ser transmitidos» (Assento do STJ n.º 5/2004, publicado no DR, de 21.06.2004). [19] Veja-se, a propósito: Vaz Serra, RLJ, Ano 109, pág. 246; Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Volume II, 7.ª reimpressão, Almedina, 1987, pág. 445; Albano Ribeiro Coelho, «Prescrições de Curto Prazo», Jornal do Foro, Ano 27, 142-144, Jan-Set., 1963, pág. 54; ou Karl Larenz, Derecho Civil - Parte General, Editoriales de Derecho Reunidas, 1978, pág. 328. [20]Neste sentido: Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidadeem anotação aos arts. 296.º a 333.º do Código Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2014, pág. 63; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1987, pág. 306; Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, Volume II, 5.ª edição, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2014, pág. 694; e Ana Prata, Dicionário Jurídico, Volume I, 5.ª edição, 5.ª reimpressão, Almedina, Lisboa, 2012, pág. 1103. [21]Neste sentido: António Menezes Cordeiro, Código Civil Comentado, I - Parte Geral, Almedina, 2020, pág. 884; Júlio Gomes, Comentário ao Código Civil - Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, pág.748, com referência também a Jacinto Rodrigues Basto, a Heinrich Horster e a Pedro Pais de Vasconcelos; e Rita Canas da Silva, Código Civil Anotado, coordenado por Ana Prata, Almedina, 2.ª edição revista e atualizada, pág.411. [22] Estão sujeitos a prescrição todos e quaisquer direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos delas (art. 298.º, n.º 1, do CC). [23]Contudo, a prescrição não opera ipso iure (com o decurso do prazo), não conferindo a lei ao tribunal a faculdade de a conhecer oficiosamente, já que tem de ser invocada pelo respectivo beneficiário (art. 303.º, do CC). [24] Neste sentido, Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 3.ª edição, 1990, págs. 375-376, onde se lê que «a prescrição extintiva, possam embora não lhe ser totalmente estranhas razões de justiça, é um instituto endereçado fundamentalmente à realização de objectivos de conveniência ou oportunidade. Por isso, encarada exclusivamente numa perspectiva de justiça, foi pelos antigos crismada de “impium remedium” ou “impium praesidium”.
Apesar disso, porém, sempre intervém na fundamentação da prescrição uma ponderação de justiça. Diversamente da caducidade, a prescrição arranca, também, da ponderação de uma inércia negligente do titular do direito em exercitá-lo, o que faz presumir uma renúncia ou, pelo menos, o torna indigno da tutela do Direito, em harmonia com o velho aforismo “dormientibus non succurrit jus”». [25] Neste sentido, Ac. da RL, de 26.11.2020, Isoleta Costa, Processo n.º 3325/19.8T8LSB-A.L1-8, onde se lê que a «sua [do art. 323.º, n.º 2, do CC] ratio reside em assegurar que por razões atinentes ao próprio devedor ou ao tribunal a interrupção do prazo se consume, mesmo que citação ocorra em data posterior aos cinco dias, já que depois de requeridas as citações ou notificações, o credor perde o controlo do processo». [26]Deste modo, se «a citação ou notificação é feita dentro dos cinco dias seguintes ao requerimento, não há retroactividade quanto à interrupção da prescrição. Atende-se, neste caso, ao momento da citação ou notificação. Se é feita posteriormente, por causa não imputável ao requerente, considera-se interrompida passados cinco dias. Se a culpa da demora é do requerente, atende-se ao momento da citação ou notificação» (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, pág. 210.). [27]Neste sentido: Ac. do STJ, de 30.04.1996, Pais de Sousa, Processo n.º 087981; Ac. do STJ, de 03.10.2007, Sousa Grandão, Processo n.º 07S359; Ac. da RE, de 08.03.2018, João Nunes, Processo n.º 1187/17.7T8PTM.E1; Acórdão do STJ de 29.11.2016, Garcia Calejo, Processo n.º 448/11.5TBSSB-A.E1.S1; Ac. da RL, de 26.03.2019, José Capacete, Processo n.º 3350/06.9TBAMD-A.L1-7; Ac. da RP, de 23.11.2020, Pedro Damião e Cunha, Processo n.º 3630/06.3YYPRT-C.P1; ou Ac. da RL, de 26.11.2020, Isoleta Costa, Processo n.º 3325/19.8T8LSB-A.L1-8. [28]Neste sentido, Ac. do STJ, de 9.11.2016, Garcia Calejo, Processo n.º 448/11.5TBSSB-A.E1.S1, onde se lê que a «expressão “causa não imputável ao requerente”, usada no art. 323º nº 2 do C.Civil, deve ser interpretada em termos de causalidade objetiva, só excluindo a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação (…) Deve, por outro lado, afastar-se o entendimento de que, em razão de o autor não se ter socorrido de atos ou diligências aceleratórias que, porventura, a terem sido adotadas, poderiam permitir um curso mais célere do processo na sua fase liminar, não poder beneficiar do dito regime (consagrado no nº 2 do art. 323º), já que essas diligências constituem uma faculdade e não um dever ou ónus do autor». [29] Neste sentido, Ac. da RP, de 23.11.2020, Pedro Damião e Cunha, Processo n.º 3630/06.3YYPRT-C.P1. [30]Neste sentido, Ac. do STJ, de 23.01.2014, Fernando Bento, Processo n.º 8021/04.8YYLSB-A.L1.S1.