I.O comodatário que realiza obras no prédio objecto do contrato, tem direito (1) a ser indemnizado das benfeitorias necessárias (2) a levantar as benfeitorias úteis desde que o possa fazer sem detrimento da coisa benfeitorizada (3) a ser indemnizado pelas benfeitorias úteis, calculada segundo as regras do enriquecimento se causa, se o levantamento implicar detrimento. Mas não tem direito à indemnização por benfeitorias voluptuárias.
II. Determinando o art.1273 nº2 do CC que indemnização pelas benfeitorias úteis é calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa ( “ enriquecimento por incremento de valor em coisa alheia” ), não basta, por força do art.479 CC, provar-se o valor económico das benfeitorias, sendo necessário ainda demonstrar-se o incremento de valor trazido ao prédio, à data da citação, pois só assim se conseguirá aquilatar daquilo com que efectivamente o proprietário se enriqueceu à custa do possuidor.
I - RELATÓRIO
1.1.- Os Autores- AA e esposa BB, - instauraram acção declarativa, com forma de processo comum, contra os Réus
1ª.- CC
2ª.- DD
3º.- EE
4ª.- FF.
Alegaram, em resumo:
O Autor marido e as 1ª. e 2ª. Rés são herdeiros directos e interessados na herança de seus falecidos pais, GG e HH, e de cuja herança a 1ª. Ré é Cabeça-de-Casal e são também herdeiros os 3º e 4ª. RR., primeiramente em representação de seu falecido pai, II (falecido em .../.../2007), e depois como herdeiros de sua mãe, JJ, entretanto falecida em .../.../2013.
Do acervo dos bens deixados e incluídos no Activo da Relação de Bens do dito Inventário apresentada pela Cabeça-de-Casal, ora 1ª. Ré, consta,
“Verba Nº 1
Prédio misto denominado Quinta ..., sito em ..., com a área de 21,9200 ha, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...55, composto por um prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...41, secção I, da freguesia ..., concelho ..., e por um prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...65 da mesma freguesia e concelho.
Após o falecimento do inventariado pai, GG, em .../.../1985, e ainda em vida da viúva inventariada HH (que faleceu em .../.../2007), os herdeiros acordaram partilhar a herança e investir de imediato cada um dos herdeiros na posse dos bens que integrava o seu quinhão, sem que, contudo, escriturassem tal decisão; porém, o prédio, integrando o seu quinhão, é entregue ao herdeiro A.-marido em Outubro de 1999, e elaborando e assinando a herdeira/cabeça-de-casal o mapa síntese de tal acordo, o qual se junta e se dá por reproduzido.
Mais tarde em 2007, a mesma herdeira/cabeça-de-casal exige alterar essa partilha antes acordada, de modo a ela ficar também com uma parcela da parte rústica da referida Quinta ... supra identificada, pelo que o mesmo prédio ficou então assim dividido e quinhoado:
a) Manter a parte urbana da Quinta para o ora Autor marido em cuja posse e fruição aliás já estava investido;
b) Dividindo a parte rústica da dita quinta com a área total de 21,9200 ha, em duas novas parcelas, ficando:
b.1) uma parcela de 6,0382 ha atribuída e entregue à herdeira/cabeça-de-casal CC, ora 1ª. Ré, parcela melhor identificada a vermelho no levantamento topográfico adrede feito, e o qual se junta e se dá por reproduzido-
b.2) a área rústica restante, com 15,8818 ha continuou atribuído a investido na posse do herdeiro AA, ora A. e daí nascendo com o acordo de todos os herdeiros, um segundo mapa da partilha, elaborado e rubricado (no canto superior direito).
Não obstante os referidos acordo verbais e escritos de partilha havidos entre os herdeiros e destes terem entrado logo na posse e fruição dos bens que lhes couberam, a verdade é que a 1ª. Ré, dando o dito por não dito, veio a negar-se lavrar a escritura de formalização da partilha, o que levou a que, os 3º e 4º RR. e a mãe deles, JJ-ainda viva ao tempo- se vissem coagidos a requerer o Inventário Judicial que corre no Tribunal ....
O Autor marido, na sua reclamação à Relação de Bens apresentada no dito Inventário pela cabeça-de-casal, ora 1ª. Ré, veio a reclamar que no Passivo da Herança fossem inseridos como dívida da herança os custos das benfeitorias que ele havia entretanto feito no imóvel Quinta ... que lhe coube e lhe foi entregue na partilha acordada, como atrás se explicou; benfeitorias essas que os AA. custearam e que, dada a sua importância e natureza não poderão levantar, mas que devem ser relacionadas como crédito seu sobre a herança.
Dada a complexidade da questão referida, o Mmº. Juiz do Processo de Inventário pendente, entendeu abster-se de apreciar e decidir tal matéria e remeteu os interessados para os meios comuns para dirimir a questão.
Reclamam os Autores da identificada herança indivisa de que os Réus. com o Autor marido são únicos herdeiros, o pagamento das benfeitorias que fizeram nos prédios urbano e rústico identificado e que consistiram em síntese no seguinte:
1. Melhorias e reconstrução da casa dos caseiros; incluindo instalação eléctrica, água canalizada e esgotos;
2. Reparações na adega e capela;
3. Reconstrução e adaptação de algumas instalações a casa de apoio agrícola;
4. Reconstrução dos galinheiros e sua adaptação para alojar as ovelhas existentes;
5. Levar às instalações água canalizada, cuja puxada do ramal se encontrava longe da Quinta;
6. Levar à Quinta rede eléctrica e fazer a instalação respectiva;
7. Criação duma rede de esgotos;
8. Reparações dos regueiros, reconstrução dos muros de suporte das terras e dos quintais;
9. Arranque da vinha velha, no ano 2000, preparação da terra e plantio de vinha nova, em 2004, numa 1ª. fase, e em 2006 numa 2ª. fase.
1. As obras e benfeitorias realizadas na parte urbana e envolvente – ascendem € 312.873,00 2. As obras e benfeitorias feitas na parte rústica importam em € 146.362,00, num total de € 459.235,00
Como desde a data em que foi conferida ao A., a posse do prédio denominado Quinta ..., identificado nos precedentes Artºs 2º e 4º desta P.I., como fazendo parte do seu quinhão hereditário, fez o A. no mesmo obras e benfeitorias necessárias e úteis que originaram as despesas supra referidas, que aumentaram muito o valor real do identificado imóvel, e pelas quais têm os Autores direito a ser indemnizados, nos termos do nº1 do art.1273 CC, pela herança indivisa da qual são herdeiros, além do Autor-marido, todos os Réus seus titulares que dela beneficiam.
Pediram:
a) Seja reconhecido que o Autor marido, desde que entrou na posse do imóvel, fez na Quinta ..., que faz parte da referida herança indivisa objecto do Inventário (que corre com o Nº 29108/12.... pela Comarca ...- Secção Cível- J...), benfeitorias úteis e necessárias, insusceptíveis de serem levantadas, no montante de € 459.235,00 e que aumentaram significativamente o seu valor real, e que tal despesa foi suportada com dinheiro comum do casal AA.;
b) Que a herança indivisa aberta por óbito dos pais do Autor-marido e representada por todos os seus herdeiros, ora RR., além do Autor-marido, e em cujo acervo do Activo se inclui o identificado imóvel, seja condenada a pagar aos AA. a dita quantia de € 459.235,00 (quatrocentos e cinquenta e nove mil, duzentos e trinta e cinco euros), a qual constitui passivo da mesma herança; mais juros legais, à taxa de 4% ,desde a citação e até efectivo e integral reembolso.
1.2.- Os Réus FF e EE contestaram, defendendo-se, em síntese:
Por excepção arguiram o erro na forma do processo e a litispendência.
Por impugnação, alegaram que os Réus contestantes são netos dos inventariados, sobrinhos dos demais herdeiros na herança e desconhecem o “acordado”, informalmente entre aqueles que seriam, na altura os seus titulares, bem como o alegado enriquecimento.
1.3. - No saneador julgou-se improcedente a excepção do erro da forma de processo e da litispendência.
1.4. Realizada audiência de julgamento, foi proferida (21/11/2021) sentença que, na parcial procedência da acção, decidiu:
a) Condenar os Réus a reconhecer que após 18/12/2000 o Autor realizou no prédio referido no ponto 4 as benfeitorias úteis referidas em 9, 10, 11, 12, 13, 14, 18 e 19 e que as mesmas com excepção das indicadas em 17 são insuscetíveis de ser levantadas,
b) Condenar as heranças de GG e HH a satisfazer aos Autores o valor das benfeitorias mencionadas em a) insuscetíveis de levantamento em montante a liquidar em execução de sentença não superior a 305.597,97 euros nem àquele que se vier a apurar como sendo o da expressão do aumento der valor do prédio referido em 21,
c) Absolver os Réus do demais peticionado
d) Condenar as partes no pagamento das custas da acção na medida do decaimento que provisoriamente fixou em 50% para cada.
1.5.- Recorreram de apelação os Autores e os Réus CC, II e FF, e a Relação, por acórdão de 7/4/2022, decidiu:
“ Pelo exposto, acordam os juízes em julgar improcedentes as apelações e confirmar decisão recorrida, corrigindo-se tão só sob b) do dispositivo o valor em consonância com o cálculo de III supra alínea b) que passa a ter a seguinte redacção: “se condenam as heranças de GG e HH a satisfazer aos AA. o valor das benfeitorias mencionadas em a) insuscetíveis e levantamento em montante a liquidar posteriormente não superior a 406.707,00 euros (quatrocentos e seis mil setecentos e sete euros) nem àquele que se venha a apurar como sendo o da expressão do aumento do valor do prédio referido em 21)”
Regime de Responsabilidade por custas: As custas são da responsabilidade dos apelantes, nas respectivas apelações que decaem e porque decaem (art.°s 527/1 e 2), sem prejuízo do apoio judiciário que foi concedido.”
1.7.- Inconformada, a Ré CC recorreu de revista, com as seguintes conclusões:
1)Da matéria de facto dada como provada resulta que prédio que está causa nestes autos pertence à herança dos pais do Autor e dos Réus (pontos 1 a 4 do relatório de facto);
2)E que o Autor explora esse prédio desde Dezembro de 2000, a coberto de contratos de comodato, estando autorizado a efectuar todas e quaisquer benfeitorias necessárias à prossecução da actividade agrícola (ponto 7 do relatório de facto);
3)Os contratos de comodato, ao abrigo do qual o Autor explora o prédio, têm subjacente que essa exploração se refere unicamente à parte rústica e agrícola desse prédio;
4) Da matéria de facto, porém, resulta que, excedendo o âmbito desses poderes de fruição, o Autor converteu a casa de apoio agrícola (incluído curral de ovelhas e espaços para queima de bagaço uva e dispensa) em casa de habitação (pontos 8 a10 e 16 do relatório de facto); O Autor mandou executar obras na construção dos galinheiros a qual passou a ser casa agrícola (ponto 12 do relatório de facto); Solicitou um ramal de água (ponto 14 do relatório de facto).
5) Diz-se no douto Acórdão que é objecto de recurso, que não resulta dos contratos de comodato que o Autor apenas estava autorizado a realizar aquelas benfeitorias necessárias à prossecução da actividade agrícola, mas não é assim, pois, esses contratos, como decorre do seu teor, estão funcionalizados a essa exploração agrícola, apenas admitindo os actos que sejam relevantes para tal;
6)Mas sempre teria que estar demonstrado quais os outros actos a que estaria autorizado – os quais não resultam dos contratos juntos;
7)E essa possibilidade de alteração de finalidade da coisa resulta do regime legal do contrato de comodato, porquanto uma das obrigações do comodatário em relação a ela é exactamente a de “não a aplicar a fim diverso daquele que a coisa de destina” (alínea c) do art. 1135º do Código Civil);
8) Os actos praticados excedem manifestamente o âmbito e objecto do contrato de comodato referido e apenas podem ser entendidos como integrados na detenção e administração de um bem da herança (pontos 5 e 6 do relatório de facto);
9)Esses actos inserem-se no âmbito da administração feita por um herdeiro de bens da herança e apenas deverão ser suportados por essa herança se corresponderem a actos de administração ordinária, como ocorre com os actos que são praticados pelo cabeça de casal;
10)Não podem qualificar-se como meros actos de administração ordinária, pois, não se destinam a “prover pela conservação dos bens administrados” nem a “promover a sua frutificação normal”.
11)Ainda que assim não se entendesse, tais actos não poderiam nunca ser qualificados senão como benfeitorias voluptuárias, por corresponderem a uma alteração, por unilateral vontade do Autor, da finalidade das coisas onde foram introduzidas, o que é evidente nas obras feitas de transformação de instalações de apoio agrícola em casa de habitação para utilização do Autor e família.
1.8.- Os Autores contra-alegaram, em resumo:
Suscitaram a questão prévia da inadmissibilidade do recurso de revista, dizendo existir dupla conforme, e não se verificar os pressupostos da revista excepcional.
Invocaram também a extemporaneidade do recurso, alegando que a Recorrente se considera notificada do Acórdão recorrido no 3º dia da certificação Citius (nº1 do art 248 CPC), ocorrida em 08/04/2022, logo foi notificada em 11/04/2022. Daí que o prazo de 30 dias (art.638º nº 1 do CPC) para a recorrente interpor recurso terminaria a 11/05/2022, porém, só o fez em 12/05/2022, já fora de prazo, sendo que não pagou imediatamente a multa.
Quanto ao mérito, sustentam a improcedência da revista.
2.1. – A questão prévia da (in)admissibilidade da revista
A “dupla conforme” pressupõe um requisito subjectivo (ausência de voto de vencido) e dois requisitos objectivos – a conformidade decisória (reportado à decisão) e a conformidade essencial de fundamentação (incidindo sobre a fundamentação) .
Verifica-se que não existe conformidade decisória pois a Relação, alterando o ponto 16 dos factos provados passou a corrigir o valor total das despesas de € 305.597,97 (decidido na sentença ) para € 406.707,00. Nesta medida, a revista é legalmente admissível
No tocante à preclusão do direito de recorrer, por extemporaneidade, os Recorridos não têm razão, conforme se justificou na Relação, por despacho de 27/6/2022, para o qual se remete, visto que desconsideraram o período de férias judiciais ( 10 a 11 Abril), pelo que, presumindo-se notificada do acórdão em 11/4/2022( plenas férias), o prazo legal de 30 dias iniciou-se em 19/4/2022 terminando em 19/5/2022, sendo que a revista foi interposta em 12/5/2022, logo em tempo.
Pelo exposto, improcedem as questões prévias.
2.2.- Delimitação do objecto do recurso
A questão submetida a revista consiste em saber se assiste aos Autores o direito de indemnização por benfeitorias em relação às obras, por eles realizadas no prédio, conhecido por Quinta ..., sita em ....
2.3. – Os factos provados
1.GG faleceu a .../.../1985 no estado civil de casado com HH.
2.HH faleceu a .../.../2007 no estado civil de viúva de GG.
3.GG e HH deixaram como únicos e universais herdeiros AA, CC, DD, JJ, FF e EE.
4.Do acervo de bens deixado por GG e HH faz parte o prédio misto denominado Quinta ..., sito em ..., com área de 21,9200 ha, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n°....55, composto pelo prédio rústico inscrito na matriz predial sob o art°.41, secção I, da freguesia ..., e pelo prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art...65 da mesma freguesia.
5.Existiu um acordo verbal de partilhas entre os interessados na herança de GG, nos termos do qual a propriedade referida em 4) integraria o quinhão hereditário do A., acordo esse do qual resultou a investidura de cada um dos interessados na herança na detenção dos bens que integrariam o seu quinhão.
6.Até ao momento, não foi formalizada a partilha do acervo hereditário GG e HH.
7.Pelo menos a partir de 18.12.2000, a coberto de contratos de comodato, com o conhecimento e concordância dos demais interessados na herança de GG, o A. explora e a frui do imóvel referido em 4), estando autorizado a efectuar na propriedade todas e quaisquer benfeitorias necessárias à prossecução da actividade agrícola, nomeadamente a plantação de vinha, e a utilizar os direitos de plantação de vinha existentes.
8.Na altura referida em 7) a casa de apoio agrícola da propriedade, onde se localizaram o curral de ovelhas e os espaços para queima do bagaço, uva e dispensa encontrava-se em estado de ruína.
9.Após a data referida em 7) o A. mandou executar obras na ruína aludida em 8) que a converteram numa habitação com alpendre no alçado principal, sala ampla com mezanino, cozinha, 3 I.S., 3 quartos, um deles com mezanino e sótão.
10.As obras referidas em 9) implicaram, entre outros, construir uma cozinha, quartos, instalações sanitárias, telhado, esgotos, colocar portas e janelas.
11.Após a data referida em 7) foram realizadas obras no telhado e paredes da adega.
12.Após a data referida em 7) o A. mandou executar obras na construção onde se situavam os antigos galinheiros, a qual passou a ser uma casa de apoio agrícola.
13.Após a data referida em 7) foi construída uma muralha de betão na propriedade dita em 4) para suporte de terras, depois de demolida a estrutura pré-existente danificada.
14.No ano de 2004 foi solicitado à Câmara Municipal ... um ramal de água para a Quinta ....
14A- Não havia água canalizada na propriedade referida em a)
15.As obras, trabalhos e intervenções referidas em 9), 11), 12), 13) e 14) foram custeadas pelos AA.
16.O valor global das obras, trabalhos, intervenções, acabamentos e arranjos realizados pelos AA. na parte urbana do imóvel referido em 4) ronda os € 302.758,00.
17.No valor referido em 16) está considerada: a aquisição de apliques, lâmpadas, projectores, puxadores, gambiarra, balde, loiças sanitárias, expressores, agulhcta de rega, móveis de casa de banho, torneiras, monocomandos, bases de duche, clarabóias, lambrins, cabine de chuveiro, móveis de cozinha, bancada de cozinha, misturadoras, tubo esquentador, janelas de alumínio, tanque, pavimento flutuante, rodapé, ficha tripla, caixa de arrumação, iluminação, portas, gradeamento, escada aberta, roupeiros, luvas, máscaras, túnel de luz e acessórios de casa de banho, no valor global de € 29 751,03.
18.Após a data referida em 7) o A. arrancou a vinha existente no prédio dito em 4) e procedeu à plantação de uma nova vinha numa área de cerca de 9 ha.
19.A plantação e conservação da vinha implicou, pelo menos, surribar o solo, a adubação da área a plantar; frezagem da terra; plantação dos bacelos; colocação dos tutores (canas de bambu); colocação rede de protecção dos bacelos; colocar postes de metal e madeira e respectivos arames para condução da vinha; atar a vinha; regar e fazer deservagens.
20.O custo de preparação do terreno e instalação da vinha ascendeu a cerca de € 133 000.
21.As intervenções levadas a cabo pelos AA. no prédio referido em 4) aumentam o seu valor.
22.Pela sua natureza, com excepção dos referidos em 17), os trabalhos, obras, intervenções, acabamentos e arranjos referidos em 16) não podem ser levantados sem detrimento da coisa onde foram realizados.
23.Pela sua natureza os trabalhos e obras referidas em 18) e 19) não podem ser levantados sem detrimento da coisa onde foram realizados.
2.3.- Os factos não provados
24.Que o prédio referido em 4) tenha sido entregue ao A. em 1999.
25.Que em 2007 os herdeiros de GG e HH tenham acordado na partilha do acervo hereditário daqueles, destinando ao A. a parte urbana do imóvel referido em 4) e 15,8818ha da sua parte rústica.
26.Que, na data aludida em 7), a casa dos caseiros da Quinta ... não tivesse o mínimo de condições da habitabilidade, não dispondo de instalação eléctrica, água canalizada, rede de esgotos, sendo a habitação insuficiente para o seu fim.
27.Que, após a data aludida em 7), na casa de caseiros tenha sido feita uma casa de banho condigna; reparado o telhado; melhorado o quarto dos caseiros; e criado um novo quarto com o aproveitamento do espaço não utilizado de um estábulo e casa da palha que lhe eram contíguos.
28.Que os trabalhos executados na casa de caseiros tenham sido executados com mão-de-obra de trabalhadores que viviam na ... e em ..., tendo todos os materiais de construção e equipamentos para a obra sido adquiridos pelos AA., com dinheiro sua pertença.
29.Que as obras realizadas na casa de caseiros tenham montado em€ 16 555.
30.Que em 2007 tenha sido reedificada a casa de apoio agrícola dita em 8) e que tanto tenha implicado rebaixar os níveis do solo, abrir portas interiores, criar portas de acesso à rua, abrir janelas, construir cozinha, quartos, instalação sanitária, telhado e esgotos.
31.Que as obras referidas em 9) tenham implicado rebaixar o nível do solo, abrir portas interiores, criar portas de acesso à rua, abrir janelas.
32.Que o custo das obras referidas em 9), com materiais e equipamentos, tenha ascendido a € 167 694,65.
33.Que na altura referida em 7) os telhados, tectos e paredes mestras da adega e capela se encontrassem bastante degradados.
34.Que, em razão do referido em 33), tenha sido necessário proceder a reparação e restauro profundos da adega e capela.
35.Que o custo dos trabalhos mencionados em 34), tenha sido de € 4 617,51.
36.Que a estrutura referida em 12) seja presentemente um curral de ovelhas.
37.Que as obras referidas em 12) tenham implicado custos que montam a € 1 366,94.
38.Que na altura referida em 7) não houvesse água canalizada, nem luz na propriedade dita em 4).
39.Que tenham sido realizadas diligências para a Câmara Municipal ... levar um ramal de luz eléctrica até à Quinta ....
40.Que depois da disponibilização dos ramais de água e electricidade tenha sido necessário abrir e fechar valas para a passagem da tubagem da água e dos cabos eléctricos, numa extensão de cerca de 300m, a fim de os levar para as instalações da Quinta.
41.Que o referido trabalho tenha sido feito por máquinas e mão-de-obra especializada.
42.Que o custo desses trabalhos tenha montado em € 46 953,97, pagos pelos AA,
43.Que a muralha pré-existente tivesse ruído num Inverno rigoroso.
44.Que, após a data referida em 7) tenham sido abertos regueiros de drenagem junto à muralha e nos quintais.
45.Que a construção da muralha e abertura dos regueiros tenha tido o custo de € 75 674,93.
46.Que, em 2000, a Quinta ... tivesse uma pequena vinha velha, cuja implantação, em terreno de inclinação irregular, era inadequada à rentabilização moderna do trabalho mecanizado.
47.Que para proceder ao plantio da nova vinha tenha sido necessário apanhar a pedra decorrente da surriba; arrumar as pedras nas cabeceiras das vinhas e enterrar outras.
48.Que a plantação da vinha tenha ocorrido em duas fases.
49.Que a partir da plantação das vinhas novas, e enquanto estas não produziram anualmente, tenham sido realizadas as tarefas de charruar, gradar, escarificar, fresar, podar, atar a vinha, adubar e sulfatar, com a intervenção de mão de obra directamente contratada.
50.Que os trabalhos e melhoramentos feitos na parte urbana e envolvente da Quinta ... tenham ascendido a €312 873.
51.Que os trabalhos e melhoramentos feitos na parte rústica do prédio montem a € 146 362.
52.Que o aumento de valor referido em 21) tenha a medida da despesa feita com as intervenções realizadas
2.4.- A pretensão dos Autores – crédito por benfeitorias
A Relação qualificando as benfeitorias como úteis, executadas pelos Autores no prédio da herança indivisa por óbito de GG e HH, a coberto de três contrato de comodato, datados de 18/12/2000, celebrados pelo Autor, também ele herdeiro, com os restantes herdeiros, atribuiu-lhes o direito à indemnização, relegando para incidente posterior a quantificação do montante, alterando, no entanto, o limite desse crédito.
Os Réus/revistantes questionam no recurso o crédito relativamente às (i) obras de conversão da casa de apoio agrícola (incluído curral de ovelhas e espaços para queima de bagaço uva e dispensa) em casa de habitação; (ii) às obras na construção dos galinheiros a qual passou a ser casa agrícola, (iii) às obras de ramal de água.
Argumentam, em síntese, que estas obras extravasam o objecto do comodato, pelo que os actos praticados pelos Autores, embora actos de administração praticados por herdeiro, não se reconduzem a actos de administração ordinária. Caso se qualifiquem de benfeitorias, elas devem assumir a natureza de benfeitorias voluptuárias.
A distinção entre benfeitorias e acessão tem sido objecto de larga indagação doutrinária e jurisprudencial, assentando em dois critérios - o subjectivo e o objectivo.
Para o critério subjectivo, a distinção arranca da existência ou inexistência de uma relação jurídica que vincule a pessoa à coisa beneficiada, e daí que a benfeitoria consista num melhoramento feito por quem está ligado à coisa em consequência de uma relação ou vínculo jurídico, ao passo que a acessão é um fenómeno que vem do exterior, de um terceiro que não tem qualquer contacto jurídico com a coisa.
Assim, são benfeitorias os melhoramentos feitos na coisa pelo proprietário, pelo possuidor, pelo locatário, comodatário, usufrutuário, e acessão os melhoramentos realizados por um terceiro, não ligado juridicamente, podendo ser um simples detentor ocasional.
Segundo o critério objectivo, a distinção funda-se na finalidade e no regime de ambos os institutos, sendo a benfeitoria uma despesa para a conservação ou o melhoramento da coisa, que não é alterada na sua substância, e que dá lugar a um direito de levantamento ou um direito de crédito contra o dono da coisa benfeitorizada, pressupondo a acessão a união e incorporação de uma coisa com outra pertencente a proprietário diverso, atribuindo a lei, em determinadas condições, ao autor da acessão o direito de propriedade. A distinção é objectiva, por ser independente da posição jurídica da pessoa que faz a obra, mas antes da natureza desta, havendo acessão quando se trate de construção nova e benfeitoria se é melhorada uma já existente.
Conforme jurisprudência prevalecente, deve acolher-se o “critério subjectivo”, pelo que, em face a relação jurídica ( comodato), a questão terá que ser enquadrada no âmbito do regime das benfeitorias.
Comprovou-se que Autor AA passou a ocupar e explorar o prédio designando por Quinta ..., ..., com base num acordo verbal de partilhas, nos termos do qual o imóvel integraria o seu quinhão, e pelo menos a partir de 18/12/2000, a coberto de contrato de comodato, com o conhecimento e concordância dos demais interessados na herança de GG.
Não obstante as quatro declarações, tal não significa quatro contratos de comodato, mas apenas a um só, porque as declarações ( idênticas) foram subscritas todas na mesma data, e não se exigindo a unicidade material documento não é indispensável a concentração das declarações negociais e das assinaturas dos seus autores num único documento material.
As obras realizadas pelos Autores ocorreram depois de 18/12/2000, ou seja, no âmbito do contrato de comodato.
Como se sabe, o contrato típico ou nominado de comodato é legalmente definido como “ contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa móvel ou imóvel, para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir” ( art.1129 do CC ).Trata-se de um contrato real na sua constituição, logo só se perfectibiliza com a entrega da coisa ao comodatário, assim o investindo no direito de a usar, com a obrigação de a restituir, findo o contrato, sendo um contrato bilateral imperfeito ( não sinalagmático) ( sobre a caracterização doutrinária, cf. P.LIMA/A. VARELA, Código Civil Anotado, vol.II, 2ª ed., pág.582, FERNANDO DE MATOS, Contrato de Comodato, 2005, pág.7 e segs., JÚLIO GOMES, “ Do contrato de comodato”, Cadernos de Direito Privado, nº17, 2007, pág.3 e segs.).
Considerando o “critério subjectivo” importa aquilatar se as obras foram realizadas no âmbito do contrato de comodato, e, portanto, se existiu um vínculo jurídico para aferir da existência de benfeitorias.
A qualificação de um negócio jurídico postula, antes de mais, um problema de interpretação sobre a inerente declaração de vontade, na sua dupla função ambivalente: como acto de comunicação interpessoal e como acto determinativo ou normativo.
A interpretação dos negócios jurídicos rege-se pelas disposições dos arts.236 a 238 do CC, que consagram de forma mitigada o princípio da impressão do destinatário. Por conseguinte, na interpretação dos contratos prevalecerá, em regra, a vontade real do declarante, sempre que for conhecida do declaratário. Faltando esse conhecimento, o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um destinatário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante. Para tanto, deve recorrer-se para a fixação do sentido das declarações a determinados tópicos, ou seja, à “ordem envolvente da interacção negocial”, como a letra do negócio, as circunstâncias do tempo, lugar e outras, que precederam a sua celebração ou são contemporâneas desta, bem como as negociações respectivas, a finalidade prática visada pelas partes, o próprio tipo negocial, a lei, os usos e costumes por ela recebidos, bem assim o comportamento posterior dos contraentes. Nos negócios formais, se o sentido da declaração não tiver reflexo ou expressão no texto do documento, ele não pode ser deduzido pelo declaratário e não deve por isso ser-lhe imposto (art.238 do CC ). Isto significa que a letra do negócio ( o texto do documento ) surge como limite à validade de sentido com que o negócio deve valer, nos termos gerais da interpretação.
No contrato de comodato outorgado em 18/12/2000 as partes acordaram que o prédio é cedido para o Autor, “como agricultor o explorar” ( cl. 2ª) e que autorizam o Autor ( comodatário) a “efectuar na propriedade cedida todas e quaisquer benfeitorias necessárias à prossecução da actividade agrícola, nomeadamente a plantação de vinha e ainda autoriza a utilização dos direitos de plantação de vinha” ( cl.3ª).
Como se anotou no acórdão recorrido, nada foi alegado quanto à vontade real das partes, pelo que se impõe a interpretação segundo o critério dos arts.236, 237 e 238 CC, e, como bem disse a Relação, a conversão da casa de apoio agrícola onde se encontravam o curral de ovelhas e os espaços para queima de bagaço uva e dispensa numa habitação com as características de 8 a 10, são obras que ainda se inscrevem no âmbito do comodato e por causa dele.
Na verdade, justificou-se no acórdão recorrido que “(…) a construção onde se encontravam os antigos galinheiros passou a desempenhar as funções que a antiga ruina de casa de apoio agrícola- entretanto convertida em habitação- desempenhava pelo que em boa verdade o Autor geriu o prédio identificado sob 4 dentro dos parâmetros de um comodatário consciencioso. Não se limitou, porém, a explorar e fruir o prédio que tendo parte rústica conservando, mantendo e administrando a parte agrícola posto que tendo o prédio parte urbana, pelo menos quanto à antiga Casa agrícola que era uma mina a transformou em casa de habitação, provavelmente a habitação dele próprio enquanto explorava a parte agrícola do mesmo prédio, houve aqui efectivamente uma transformação dessa parte urbana do prédio mas não é possível concluir que tal transformação tenha servido como único propósito o recreio do benfeitorizante, ou seja não é possível concluir que tal reconstrução da ruína com transformação de uma casa de habitação constitua uma benfeitora voluptuária para efeitos do art.° 216/3 parte final do CCiv.”.
Ou seja, tanto a plantação da vinha nova como a transformação das ruínas da casa de apoio em casa de habitação, enquanto explorava a parte agrícola do imóvel, estão cobertas pela finalidade do contrato de comodato. Além disso, também como elemento coadjuvante, as circunstâncias anteriores e contemporâneas do contrato de comodato, já que houve um acordo prévio de partilha através do qual foi atribuído ao Autor, como fazendo parte do seu quinhão, a Quinta ..., e, por outro lado, no contrato de comodato é mencionada a área total de 21,920 ha.
Muito embora o comodatário seja um possuidor precário ( art.1253 c) CC), a lei confere-lhe o direito de indemnização por benfeitorias, sendo equiparado quanto a elas ao possuidor de má fé, conforme estatui o art.1138 nº1 CC.
De acordo com o regime estatuído no 1273 do CC, o comodatário tem direito (1) a ser indemnizado das benfeitorias necessárias (2) a levantar as benfeitorias úteis desde que o possa fazer sem detrimento da coisa benfeitorizada (3) a ser indemnizado pelas benfeitorias uteis, calculada segundo as regras do enriquecimento se causa, se o levantamento implicar detrimento. Mas não tem direito a indemnização por benfeitorias voluptuárias.
Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa, podendo ser necessária, úteis ou voluptuárias ( art.216 CC).
Perante a factualidade apurada, as benfeitorias são havidas como úteis ( art.216 CC ), tal como justificado no acórdão, e demonstrando-se que não podem ser levantadas sem detrimento da coisa benfeitorizada, assiste aos Autores um crédito por benfeitorias. Com efeito, tratam-se de melhoramentos para a o prédio, em si mesmo, ou seja, como se decidiu no Ac STJ de 30/11/2021 ( proc. nº 6438/15), em www dgsi.pt – “ O que releva particularmente, no que tange ao aumento de valor, para efeito de qualificação de benfeitorias úteis, é um critério objectivo, no sentido de se tratar de despesas que se destinaram a conservar ou melhorar a coisa (benfeitorias úteis para a coisa, em si mesma). Ou seja, importa é o valor objectivo ou venal da coisa (valor real) e independentemente do específico fim a que possa estar temporariamente afectada”.
Por imperativo do art.1273 nº2 do CC, a indemnização é calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa ( “ (..) satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa” ), tratando-se do chamado “enriquecimento por incremento de valor em coisa alheia” ou “enriquecimento forçado”( cf. MENEZES LEITÃO, O Enriquecimento Sem Causa no Direito Civil, 2005, pág.798, JÚLIO GOMES, O Conceito de Enriquecimento e o Enriquecimento Forçado e os Vários Paradigmas do Enriquecimento Sem Causa , pág. 322 e segs. ).
Nas benfeitorias úteis o enriquecimento não consiste na poupança da despesa pelo proprietário, pois poderia nem sequer as realizar, mas antes no correspondente incremento do valor da coisa. Por isso, face ao disposto no art.479 do CC, não basta provar-se o valor das benfeitorias, sendo necessário ainda demonstrar-se o incremento de valor trazido ao prédio, à data da citação, pois só assim se conseguirá aquilatar do valor com que o proprietário se enriqueceu à custa do possuidor.
Acolhendo a doutrina do “duplo limite” no caso das benfeitorias úteis, que não possam ser levantadas sem detrimento da coisa (art.1273 CC), exemplificam P.LIMA/A.VARELA (Código Civil Anotado, vol.I, pág.440 ):
“As benfeitorias podem valer menos do que aquilo que o possuidor despendeu para as realizar e pode verificar-se a hipótese inversa.
“Se, por exemplo, as benfeitorias custaram 20 e apenas valorizaram a coisa em 10, a obrigação de restituir não excederá o montante de 10, por ser este o valor com que o proprietário se enriquece à custa do possuidor.
“Se, ao invés, as benfeitorias custaram 10 e valorizaram a coisa em 20, o montante da restituição será igualmente de 10, visto ser esse o valor com o que o proprietário normalmente se enriquecerá à custa do possuidor. A diferença entre o custo das benfeitorias e o valor que elas acrescentaram à coisa possuída resultará, em regra, de factores ( localização, natureza, qualidades a coisa) que pertencem mais ao proprietário do que ao possuidor, segundo a ordenação jurídico-económica dos bens”
Por conseguinte, a lei estabelece o critério para apurar a indemnização, não pelo valor económico das benfeitorias, devendo antes ser calculada pelas regras do enriquecimento sem causa, pois uma coisa é o valor objectivo da vantagem obtida, outra o montante do enriquecimento proporcionado ao beneficiário.
Reportando-se os valores provados ao custo das benfeitorias, aquilo que os Autores gastaram com a sua realização, isso não corresponde, mesmo com a actualização (de acordo com a inflação), ao montante indemnizatório, segundo as regras do enriquecimento sem causa. Daí que se imponha relegar para liquidação posterior o respectivo cálculo, como fizeram as instâncias.
Conforme orientação predominante, é legalmente possível relegar-se para liquidação em incidente posterior quer o autor tenha feito um pedido genérico, como quando haja formulado pedido específico de determinada importância e não seja viável averiguar o valor exacto dos danos. É que nem a letra da lei, nem a unidade do sistema impõem uma interpretação restritiva do art.609 nº2 CPC ( anterior 661 nº2 ), o argumento por maioria de razão com o disposto no art.569 CC, razões de justiça material ( que se sobrepõem à justiça formal ), sem que ocorra violação do princípio da igualdade e do contraditório ( cf., por ex., Ac TC nº 1009/96, de 8/10/96, em www tribunalconstitucional.pt ) ( cf., por ex., Ac STJ de 25/3/2003, de 18/4/2006, disponíveis em www dgsi.pt ).Por outro lado, a indemnização segundo critérios de equidade ( art.566 nº3 CC ) só se impõe quando esgotadas as possibilidades de apuramento com base nas quais haja de ser determinado, mesmo em sede de liquidação em execução de sentença ( agora liquidação posterior ), já que a contradição entre a norma do art.566 nº3 do CC e a do art.661 nº2 do CPC ( actual 609 nº2 ) é meramente aparente (cf., por ex., VAZ SERRA, RLJ ano 113, pág.326 ).
2.5.- Síntese conclusiva
1.O comodatário que realiza obras no prédio objecto do contrato, tem direito (1) a ser indemnizado das benfeitorias necessárias (2) a levantar as benfeitorias úteis desde que o possa fazer sem detrimento da coisa benfeitorizada (3) a ser indemnizado pelas benfeitorias úteis, calculada segundo as regras do enriquecimento se causa, se o levantamento implicar detrimento. Mas não tem direito à indemnização por benfeitorias voluptuárias.
2. Determinando o art.1273 nº2 do CC que indemnização pelas benfeitorias úteis é calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa ( “ enriquecimento por incremento de valor em coisa alheia” ), não basta, por força do art.479 CC, provar-se o valor económico das benfeitorias, sendo necessário ainda demonstrar-se o incremento de valor trazido ao prédio, à data da citação, pois só assim se conseguirá aquilatar daquilo com que efectivamente o proprietário se enriqueceu à custa do possuidor.
Pelo exposto, decidem
Lisboa, Supremo Tribunal d e Justiça, 31 de Janeiro de 2023.
Os Juízes Conselheiros
Jorge Arcanjo ( Relator )
Isaías Pádua
Manuel Aguiar Pereira