EXECUÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
EMBARGOS DE EXECUTADO
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário


1 - A nulidade da sentença por omissão de pronúncia, prevista na alínea d) do nº1 do art.615º do CPC, apenas existe quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as questões que devesse apreciar, não implicando pronúncia expressa sobre todos os argumentos ou razões alegadas pelas partes.
2 – Pretendendo executar-se sentença estrangeira revista e confirmada, deve juntar-se com o requerimento executivo a decisão condenatória proferida no estrangeiro e não apenas aquela que a confirmou, conferindo-lhe força executória.
3 – Porém, estando essa decisão junta nos embargos, não pode deixar-se de considerar completado o título executivo compósito que ela constitui juntamente com a decisão do processo de revisão de sentença estrangeira que a confirmou.
4 – Tendo corrido processo de revisão de sentença estrangeira que a confirmou, conferindo-lhe força executória, não pode depois em embargos de executado ser discutida a falta de intervenção do réu na acção declarativa confirmada, como previsto no art. 729º, al. e), do CPC, por tal questão ter ficado definitivamente assente no processo de revisão que concluiu pela confirmação.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral


ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:

I – Por apenso à execução que contra ele e ainda contra AA e BB foi instaurada por CC e DD, veio o executado EE deduzir os presentes embargos de executado, pedindo que pela procedência dos mesmos seja declarada extinta a execução, com todas as consequências legais, pedindo também que a execução seja suspensa ao abrigo do disposto no art.733º, nº1, alínea d), do C.P.C.
Para tanto alegou os seguintes fundamentos:
No dia 25/09/2017 foi proferida sentença arbitral pela Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil, na qual os executados foram condenados a devolver aos exequentes os valores, indemnização por lucros cessantes, multas, verbas de sucumbência, custas, honorários dos árbitros, despesas arbitrais, acrescido dos juros legais, em resultado do incumprimento contratual ali verificado.
Nesse processo a citação dos executados FF e EE foi feita editalmente.
A referida sentença arbitral foi revista e confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, sendo que neste processo de revisão e confirmação de sentença os executados foram citados pessoalmente.
O referido Tribunal da Relação de Lisboa deu como provada a celebração da convenção de arbitragem e deu também como provada a prolação da sentença arbitral estrangeira e considerou verificarem-se todos os requisitos legalmente exigidos, seja pela Convenção de Nova Iorque sobre o reconhecimento e execução de decisões arbitrais estrangeiras, seja pela Lei de Arbitragem Voluntária, para rever e confirmar a sentença estrangeira.
Porém, considera o embargante que nos presentes autos de execução não existe título executivo, porque os exequentes não juntaram com o requerimento executivo a sentença proferida no dia 25/09/2017 pela Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil.
E por outro lado porque os exequentes entendem ter um título executivo que lhes permitiria realizar coactivamente uma obrigação em euros, quando na verdade, quanto muito, teriam direito à realização coactiva de uma obrigação em reais.
E além disso os cálculos feitos para obter a liquidação da obrigação exequenda padecem de diversos erros, verificando-se o fundamento de oposição à execução previsto na alínea d) do artigo 729º, do CPC, já que os executados EE e FF não tiveram oportunidade de indicar árbitro, nem puderam intervir nos autos, pois foram citados editalmente quando podiam e deviam ter sido citados pessoalmente.
Consta na sentença que os Requeridos foram condenados a pagar o valor de R$ 39.999,00 aos Requerentes a titulo de serviços prestados pelos Requerentes aos Requeridos, que deverá ser corrigido pelo índice IGPM a partir do mês da prestação de serviços (Junho a Setembro de 2011) acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar de 04/10/2011, até o efectivo pagamento pelos Requeridos e na conta consta a titulo de serviços prestados o valor de R$ 53.332,00.
Na sentença consta que os Requeridos foram condenados a pagar aos Requerentes a multa contratual no valor de R$ 30.000,00 que deverá ser corrigido pelo índice IGPM a partir de 12/08/2011 e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar de 17/02/2016, até ao efectivo pagamento pelos Requeridos, e na “conta” consta o valor de R$ 150.000,00 e os juros de mora deveriam ser contados a partir de 17/02/2016 e foram-no a partir de 12/08/2011.
Na sentença foi decidido determinar à Secretaria da Arbitac que informasse no prazo de 10 dias a contar do recebimento da sentença, o valor total desembolsado pelos Requerentes a título de custas, despesas de arbitragem e honorários de árbitros, devidamente corrigidos pelo índice IGPM desde a data do seu desembolso, devendo os Requeridos efectuar o pagamento desse montante aos Requerentes, no prazo de 15 dias, a contar do recebimento da apresentação das contas pela Secretaria da Arbitac, devendo incidir juros moratórios de 1% ao mês caso não seja cumprido dentro o prazo de 15 dias, até o efetivo pagamento pelos Requeridos e na “conta” consta o valor de R$ 285.464,85, mas em conformidade com a comunicação Arbitac de 5/10/2017 que consta antes da sentença, o valor total da sucumbência já com a correção do índice IGPM, ascende a R$ 196.876,98, e não a R$ 228.189,33 como consta da “conta”, sendo decidido na sentença a condenação dos Requeridos a efectuarem o pagamento de R$ 50.000,00 a titulo de honorários sucumbência, aos Patronos dos Requerentes, no prazo de 30 dias, a contar do recebimento da sentença, incidindo correcção monetária pelo índice IGPM e juros moratórios de 1% ao mês caso o pagamento não seja realizado dentro do prazo fixado, até ao efetivo pagamento pelos Requeridos e na “conta” consta o montante de R$ 71.984,52, quando em obediência à sentença (alínea g) do dispositivo) os juros de mora só deviam ter sido calculados a partir de 25 de Outubro de 2017 (30 dias depois da sentença) e na “conta” foi ainda incluído o valor de R$ 382.138,65 aparentemente a título de multa diária a que os executados não foram condenados na sentença, não explicando os exequentes como foram calculados estes montantes e por consulta ao sitio do Banco Central do Brasil os executados constataram que o índice de correcção é diferente do que foi considerado pelos exequentes, sendo que por exemplo para o montante de R$ 150.000,00, período de Agosto de 2011 a Setembro de 2017, na “conta” foi considerado o IGPM de 1,598603, obtendo-se o valor de R$ 239.790,43, enquanto o IGPM do Banco Central do Brasil é 1,39547820, obtendo-se o valor de R$ 209.321,73, resultando uma diferença a favor dos exequentes de R$ 30.468,70.
Além disso, a mera circunstância de a sentença arbitral condenatória apelar à aplicação de um índice estrangeiro exige aos exequentes a alegação e prova de qual é esse índice e de qual o seu valor a cada momento, o que demonstra que a obrigação de pagamento em que os executados foram condenados na sentença, mesmo que esta estivesse nos autos e constituísse título executivo, não seria líquida e a sua liquidação não dependeria sequer de cálculo aritmético, o que também é fundamento de oposição à execução que desde já se invoca, e ao invés de juntarem uma conta elaborada por contador escolhido por eles, os exequente deveriam ter feito era a liquidação da obrigação de pagamento em sede de processo declarativo como impõe o nº 6, do artigo 704º, do CPC, pretendendo os exequentes beneficiar de uma sentença arbitral que condena os executados a pagar-lhes diversas quantias, mas essas quantias estarão expressas em reais e não em euros, não dispondo os exequentes de título executivo para exigir o pagamento aos executados de qualquer quantia em euros, como fazem, questão que não se confunde com o valor da causa, que deve ser indicado na moeda com curso legal em Portugal, o euro, mas essa indicação apenas vale para esse efeito e consequente cálculo do valor das custas, podendo os executados vir a pagar em euros, mas para isso deve ser utilizado o câmbio em vigor à data do pagamento e não na data da propositura da acção executiva ou qualquer outra e o momento em que uma obrigação em moeda estrangeira pode ser convertida numa obrigação com curso legal em Portugal é o momento do pagamento, mas os exequentes tentam utilizar a data de entrada do requerimento executivo, sendo que a quantia em reais de que se arrogam os exequentes/credores, com base no câmbio da data da propositura desta execução ascende a 792.374,05 € e com base no câmbio do dia de hoje ascende a 556.814,30 €, ou seja, menos de cerca de 30%.
Mais alegou o embargante/executado que tanto ele como o co-executado FF são portugueses e residem em Portugal, e os exequentes sabem e sabiam-no antes de iniciar o procedimento arbitral, e já em 27/08/2013 quando apresentaram requerimento de arresto, desde logo invocaram que os executados tinham voltado a Portugal e indicaram as suas moradas neste país e como resulta dos autos a sua morada e/ou domicilio profissional é conhecida do Estado Português e estes foram citados pessoalmente para os autos de reconhecimento e confirmação de sentença arbitral estrangeira e para os presentes autos de execução, e o tribunal arbitral podia e devia ter solicitado a cooperação dos tribunais brasileiros e estes podiam e deviam ter solicitado a cooperação dos tribunais portugueses, já que é para isso que existem os mecanismos de cooperação judiciária internacional, e a falta de notificação pessoal dos executados FF e EE para nomear árbitro e participar no processo arbitral impõe que não possa prosseguir a presente execução, pelo que a mesma deve ser julgada extinta por falta de citação dos executados na acção declarativa, com todas as legais consequências, devendo a execução ser suspensa ao abrigo do disposto no artigo 733º, alínea d), do CPC.
Regularmente notificados, os exequentes não deduziram, no prazo legal, contestação.
De seguida, por entender que os autos continham já todos os elementos necessários para conhecer do mérito da causa, proferiu o M.mo Juiz “a quo” o respectivo saneador-sentença, na qual veio a julgar os presentes embargos de executado parcialmente procedentes e parcialmente improcedentes e, em consequência, determinou que a execução prosseguisse os seus trâmites normais, devendo ser abatida à quantia exequenda o montante de R$ 13.333,00 referente aos serviços prestados de set/2011, o montante de R$ 120.000,00 € à multa, a qual assume apenas o valor de R$ 30.000,00 ao invés do indicado valor de R$ 150.000,00; o montante de R$ 382.138,65 referente a multa diária de R$ 1.000,00 no período de 13/07/2011 a 12/11/2011 e o montante de R$ 31.312,35 referente a custas ARBITAC, porquanto resulta da informação ARBITAC datada de 05 de Outubro de 2017 que o valor corrigido é de R$ 196.876,98 ao invés do peticionado valor de R$ 228.189,33, devendo os juros serem contados a partir dos momentos determinados na presente decisão e o índice IGPM deverá ser calculado tendo por referência a data da prolação da sentença arbitral, ou seja 25/09/2017.

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II – Contra o decidido no douto saneador–sentença, na parte em que decaiu, interpôs o executado/embargante o presente recurso, que veio a delimitar com as seguintes conclusões:
“1 - A sentença recorrida deve ser revogada por ter decidido que a sentença arbitral estrangeira não era título executivo, sendo este o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.
2 - Ao decidi-lo violou o disposto na lei, mais concretamente nos artigos 706º e 730º do CPC e os artigos 42º, n.º 7, e 47º da Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro.
3 - Faltando o único título executivo possível – a sentença arbitral estrangeira – o Tribunal Recorrido podia e devia ter concluído pela inexistência de título e determinado a procedência da oposição e a consequente extinção da execução.
4 - Caso assim não se entenda, deve – mesmo assim – concluir-se que a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia (artigo 715º do CPC), dado o Tribunal Recorrido não ter apreciado e decidido os demais fundamentos e argumentos da Executado para defender não haver título executivo.
5 - Por outro lado, ao decidir que o Executado não podia suscitar a falta de citação porque o poderia ter feito em sede de revisão e confirmação da sentença arbitral, o Tribunal Recorrido violou o disposto no artigo 696º e al. d) do artigo 729.º do CPC.
Termos em que se requer a Vossas Excelências se dignem revogar a douta sentença recorrida e substituí-la por outra que julgue procedente a oposição à execução e determine a extinção da mesma, com todas as consequências legais.”
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III – Pelos exequentes/recorridos não foram apresentadas oportunamente quaisquer contra-alegações.
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IV – Expondo a factualidade que considerou relevante para a apreciação da causa, o Tribunal recorrido julgou provados os seguintes factos:
“1. CC e DD intentaram em 09/09/2020 a execução contra AA, FF e EE, indicando como título executivo “Decisão arbitral condenatória” e juntaram a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, datada de 28/10/2019, transitada em julgado em 14/11/2019, proferida no processo nº 356/19.1YRLSB, no essencial com o seguinte teor “Processo nº 356/19.1YRLSB- Revisão de Sentença Estrangeira. Requerentes: CC. DD. Requeridos: EE. AA. FF. I – Relatório. CC e DD, ambos de nacionalidade brasileira vêm requerer a confirmação da sentença proferida no processo de arbitragem nº 113/2013, da Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil que declarou a existência de créditos daqueles perante os requeridos relativos ao contrato-promessa de compra e venda de quotas da EBW RS Franchising Ltda, e condenou os aqui requeridos na devolução de valores, indemnização por lucros cessantes, multas contratuais, verbas de sucumbências, custas, honorários dos árbitros, despesas arbitrais, tudo corrigido e acrescido dos juros legais. Foi junta aos autos a sentença arbitral proferida no processo nº 113/2013, da Câmara da Associação Comercial do Paraná, conforme consta de fls. 13 a 89 e respectivos esclarecimentos à sentença, conforme documento junto a fls. 91 a 115. Os requeridos foram pessoalmente citados para deduzirem oposição. Decorrido o prazo legal para o efeito, os requeridos não apresentaram contestação. Em 2 de Julho de 2019 foi proferido despacho convidando os requerentes a juntarem aos autos o original da convenção de arbitragem ou cópia autenticada (cf. fls. 150). Em 31 de Julho de 2019, os requerentes procederam à junção do contrato promessa de compra e venda de quotas da EBW RS em cuja cláusula vigésima oitava consta a convenção de arbitragem (cf fls. 278 a 284 e 303 a 309). Foi facultado às partes e ao Ministério Público o exame do processo para alegações. Apenas o Ministério Público se pronunciou, conforme requerimento de 18 de Setembro de 2019 (cf fls. 315) considerando não oferecer dúvidas a autenticidade do documento que contém a decisão a rever e se mostrarem cumpridos os demais pressupostos previstos no art. 980º do CPC, pugnando pela confirmação da decisão. A simplicidade da causa consente que se profira decisão sumária liminar, ao abrigo das disposições conjugadas do artº 656º do CPC e art. 57º, nº 4 da Lei 63/2011, de 14-12 (Lei da Arbitragem Voluntária). (…) II – Questões a Decidir. A única questão a decidir consiste em verificar se estão demonstrados os requisitos legais de que depende a revisão e confirmação da sentença acima identificada. III – Fundamentação. 3.1 Fundamentação de Facto. Encontra-se documentalmente provado nos autos o seguinte: (…) 4. Constituído o tribunal arbitral foi proferida sentença no processo de arbitragem nº 113/2013, da Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil, em 25 de Setembro de 2017, com decisão sobre pedido de esclarecimentos proferida em 8 de Dezembro de 2017, que os acolheu parcialmente, que decidiu o seguinte: a) Declarar a existência dos créditos dos Requerentes em face dos Requeridos relacionados ao Contrato de promessa de compra e venda de quotas da EBW RS; b) Condenar os Requeridos a pagar o valor de R$ 39.999,00 aos Requerentes, a titulo de serviços prestados pelos Requerentes aos Requeridos, que deverá ser corrigido pelo índice IGPM a partir do mês da prestação de serviços (Junho a Setembro de 2011) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar de 04 de Outubro de 2011, até ao efectivo pagamento pelos Requeridos; c) Condenar os Requeridos a pagar o valor de R$ 571.428,57 aos Requerentes, a título de devolução do valor aportado pelos Requerentes na EBW RS, que deverá ser corrigido pelo índice IGPM a contar da data do depósito na conta corrente dos Requeridos e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar de 04 de Outubro de 2011, até o efectivo pagamento pelos Requeridos; Condenar os Requeridos a pagar aos Requerentes a multa contratual no valor de R$ 150.000,00, conforme estabelecido na cláusula décima quarta, alínea a), do Contrato, que deverá ser corrigido pelo índice IGPM a partir de 12 de agosto de 2011 e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar de 17 de Fevereiro de 2106, até o efectivo pagamento pelos Requeridos; d) Condenar os Requeridos a pagar aos Requerentes a multa contratual no valor de R$ 150.000,00, conforme estabelecido na cláusula décima quarta, alínea 1), do Contrato, que deverá ser corrigido pelo índice IGPM e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar a partir de 12 de agosto de 2011, até o efectivo pagamento pelos Requeridos (redacção conferida pela decisão proferida sobre o pedido de esclarecimento); e) Condenar os Requeridos a pagar aos Requerentes a multa contratual diária no valor de R$ 1.000,00, conforme estabelecido na cláusula décima quarta, alínea a), do Contrato, a partir do quinto dia útil da notificação de 13 de Julho de 2011 até o dia 12 de Agosto de 2011, devidamente corrigido pelo índice IGPM e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar da incidência diária da multa, até o efectivo pagamento pelos Requeridos (redacção conferida pela decisão proferida sobre o pedido de esclarecimento); f) Determinar à Secretaria da ARBITAC que informe, no prazo de 10 dias, a contar do recebimento desta Sentença, o valor total desembolsado pelos Requerentes a título de custas, despesas de arbitragem e honorários de árbitros, devidamente corrigidos pelo índice IGPM desde a data do seu desembolso. Os Requeridos deverão, no prazo de 15 dias, efectuar o pagamento desse mesmo montante aos Requerentes, a contar do recebimento da apresentação das contas pela Secretaria da ARBITAC, devendo incidir juros moratórios de 1% caso não seja cumprido dentro do prazo de 15 dias, até o efectivo pagamento pelos Requeridos; g) Condenar os Requeridos a efectuarem o pagamento do valor de R$ 50.000,00 a título de honorários sucumbência, aos Patronos dos Requerentes, no prazo de 30 dias, a contar do recebimento desta Sentença, devendo incidir correcção monetária pelo índice IGPM e juros moratórios de 1% ao mês caso o pagamento não seja realizado dentro do prazo fixado, até o efetivo pagamento pelos Requeridos. Restam indeferidos todos os demais pleitos formulados pelas Partes neste procedimento arbitral (…) IV – Decisão. Por todo exposto, julga-se procedente o pedido e confirma-se a sentença proferida no dia 25 de Setembro de 2017, no processo de arbitragem nº 113/2013, da Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil que declarou a existência dos créditos de CC e DD perante EE, AA e FF relativos ao contrato promessa de compra e venda de quotas da EBW RS Franchising Ltda e condenou estes últimos na devolução de valores, indemnização por lucros cessantes, multas contratuais, verbas de sucumbências, custas, honorários dos árbitros, despesas arbitrais, tudo corrigido e acrescido dos juros legais, conforme descrito em 4 dos factos provados. Custas a cargo dos requerentes (atentando-se no disposto no art. 14º-A, b) do RCP). Lisboa, 28 de Outubro de 2019. Micaela Sousa”;
2. Foi elaborado o escrito que que foi junto com o requerimento executivo, no essencial com o seguinte teor “Processo nº 356/19.1YRLSB – Revisão de Sentença Estrangeira. Requerentes: CC. DD. Requeridos: EE. AA. FF. Cálculos de Liquidação. Resumo: Valor atualizado até: 28 outubro, 2019. Serviços prestados R$ 167.425,32. Devolução R$ 1.891.902,07. Multa R$ 346.177,45. Multa. R$ 353.872,49. Multa Diária R$ 382.138,65. Honorários R$ 71.984,52. Custas Arbitac R$ 285.464,85. Total apurado em 28 outubro, 2019 R$ 3.498.965,35. GG. Contador. CRC-RS 61.369. a) Serviços Prestados. Mês/ano. Jun/11. Valor Devido: 13.333,00. Variação IGPM: 1,593810. Valor Corrigido: 21.250,28. Juros desde 04/10/2011: 96,80%. Valor Juros: 20.570,27. Total no mês: 41.820,54. Mês/ano: Jul/11. Valor Devido: 13.333,00. Variação IGPM: 1.596685. Valor Corrigido: 21.288,59. Juros desde 04/10/211: 96,80%. Valor juros: 20.607,36. Total no mês: 41.895,95. Mês/ano: ago/11. Valor devido: 13.333,00. Variação IGPM: 1,598603. Valor Corrigido: 21.314,17. Juros desde 04/10/2011: 96,80%. Valor juros: 20.632,12. Total no mês: 41.946,29. Mês/ano: set/11. Valor Devido: 13.333,00. Variação IGPM: 1,591600. Valor Corrigido: 21.220,80. Juros desde 04/10/2011: 96,80%. Valor juros: 20.451,73. Total no mês: 41.762,53. 167.425,32 b) Devolução. Mês/ano: nov/10. Valor Devido: 571.428,57. Variação IGPM: 1,682332. Valor Corrigido: 961.332,35. Juros desde 04/10/2011: 96,80%. Valor juros: 930.569,72. Total no mês: 1.891.902,07. 1.891.902,07 c) Multa. Mês/ano: ago711. Valor da multa: 150.000,00. Variação IGPM: 1,598603. Valor Corrigido: 239.790,43. Juros desde 17/02/2016: 44,37%. Valor Juros: 106.387,02. Total no mês: 346.177,45. 346.177,45. d) Multa. Mês/ano: fev/16. Valor Multa: 150.000,00. Variação IGPM: 1,188289. Valor Corrigido: 178.243,36. Juros desde 12/08/2011: 98,53%. Valor juros: 175.629,12. Total no mês: 353.872,49. 353.872,49 e) Multa diária de R$ 1.000,00 no período de 13/07/2011 a 12/11/2011. Mês/ano: Jul/11.
Valor Multa: 18.000,00. Variação IGPM: 1,596685. Valor Corrigido: 28.740,32. Juros: 98,93%. Valor juros: 28.433,76. Total no mês: 57.174,08. Mês/ano: ago/11. Valor Multa: 31.000,00. Variação IGPM: 1,598603. Valor Corrigido: 49.556,69. Juros: 97,93%. Valor juros: 48.532,52. Total no mês: 98.089,20. Mês/ano: set/11. Valor Multa: 30.000,00. Variação IGPM: 1,591600. Valor Corrigido: 47.747,99. Juros: 96,93%. Valor juros: 46.283,72. Total no mês: 94.031,72. Mês/ano: out/11. Valor Multa: 31.000,00. Variação IGPM: 1,581321. Valor Corrigido: 49.020,96. Juros: 95,93%. Valor juros: 47.017,44. Total no mês: 96.048,40. Mês/ano: nov/11. Valor Multa: 12.000,00. Variação IGPM: 1,572984. Valor Corrigido: 18.875,81. Juros: 94,93%. Valor juros: 17.919,44. Total no mês: 36.795,25. 382.138,65 h) Honorários. Mês/ano: set/17. Valor honorários: 50.000,00. Variação IGPM: 1,150832. Valor Corrigido: 57.541,59. Juros desde 25/09/2017: 25,10%. Valor Juros: 14.442,94. Total no mês: 71.984,52. 71.984,52 g) Custas Arbitac. Mês/ano: set/17. Valor Custas: 198.282,10. Variação IGPM: 1,150832. Valor Corrigido: 228.189,33. Juros desde 25/09/2017: 25,10%. Valor Juros: 57.275,52. Total no mês: 285.464,85. 285.464,85”;
3. Os exequentes calcularam o valor da quantia exequenda em euros, considerando o câmbio de 1 EUR= 4.41580 BRL; 1BRL=0,22646 EUR, reportado a 28/10/2019, obtendo o valor em Euros de 792.374,05;
4. Até à presente data os executados ainda não liquidaram qualquer valor por conta dos montantes que foram condenados a pagar, na sentença proferida pelo Tribunal Arbitral e revista pelo Tribunal da Relação de Lisboa;
5. Foi elaborado o escrito que faz fls. destes autos, no essencial com o seguinte teor “Associação Comercial do Paraná. ARBITAC- Câmara de Mediação e Arbitragem. Curitiba, 05 de outubro de 2017. Arbitragem Nº 113/13. Comunicação ARBITAC. Prezados Doutores, Para fins de adimplemento da sucumbência fixada na Sentença Arbitral no que tange ao cálculo de Custas do Procedimento e Honorários dos Árbitros, informamos a seguir todos os valores despendidos pelas Partes no curso da presente Arbitragem: Demandantes: Despesa: Taxa de Registro. Valor: R$ 3.000,00. Valor corrigido- índice IGPM (FGV) total: R$ 3.653,75 (…) Taxa de Administração: Valor. R$ 36.000,00 (…) Honorários dos Árbitros: R$ 153.300,00 (…) Despesas do procedimento (gravação e desgravação de audiência, SEDEX, FEDEX, viagens árbitros). Valor R$ 5.982,12 (…) Total: R$ 198.282,12 (cento e noventa e oito mil, duzentos e oitenta e dois reais e doze centavos) R$ 196.876,98 (cento e noventa e seis mil, oitocentos e setenta e seis reais e noventa e oito cêntimos) (…) Reforçando que, por força de Sentença, o montante a ser considerado para cálculo de reembolso a título de custas, despesas de arbitragem e honorários de Árbitro é sempre o “total despendido pela Parte”, e no caso, corrigido pelo índice IGPM (FGV) (…) .... Analista de Processos da ARBITAC”.
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V – Como é sabido, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (cfr. arts. 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC).
Sublinha-se ainda a este propósito que na sua tarefa não está o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelo recorrente, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (cfr. art. 5.º, n.º 3, do CPC).
No caso presente, tendo em conta as conclusões apresentadas, as questões colocadas ao tribunal de recurso sintetizam-se nas seguintes:
1º) Se a sentença é nula por omissão de pronúncia (cfr. art. 615º nº1 alínea d), do C.P.C.), por não ter apreciado devidamente a questão da inexistência de título executivo;
2º) Se inexiste título executivo, dado que não foi junta ao processo principal a que estes autos estão apensos a sentença arbitral estrangeira que terá condenado os executados ao pagamento das quantias ora reclamadas pelos exequentes;
3º) Por último, se o executado, aqui embargante, pode ainda suscitar nestes autos como fundamento de defesa a falta de citação dos executados no processo arbitral, com base no disposto no art.696º e na alínea d) do art.729º, ambos do C.P.C.
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VI – Passamos então a decidir do objecto do recurso, tal como ficou delimitado nas conclusões acima transcritas.
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A) Como se constata, a primeira questão a decidir, em termos lógicos, refere-se à invocada nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. d), do CPC), “dado o Tribunal Recorrido não ter apreciado e decidido os demais fundamentos e argumentos da Executado para defender não haver título executivo”.
Diga-se, desde logo, que, em face do modo como o recorrente configura a invocada nulidade, é possível concluir que a mesma não existe.
Com efeito, o tribunal não estava obrigado a examinar todos os fundamentos e argumentos utilizados pelo embargante (cfr. art. 5.º, n.º 3, do CPC), mas sim a decidir a questão que lhe era colocada – sendo esta a existência ou inexistência de título executivo.
E tal questão, bem ou mal, foi conhecida e decidida.
A alínea d) do nº 1 do art. 615º, estatui que é nula a sentença “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”, sendo essa a nulidade por omissão de pronúncia, mas essa estatuição não implica que o juiz esteja obrigado a apreciar todos os argumentos invocados pelos recorrentes, satisfazendo-se a norma com a decisão sobre a questão em apreço e com a fundamentação que for julgada suficiente.
Com efeito, é entendimento na jurisprudência dos nossos tribunais superiores que a nulidade por omissão de pronúncia há-de incidir apenas sobre “questões” que tenham sido submetidas à apreciação do tribunal, com elas não se confundindo as considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes (cfr., entre outros, o Ac. do STJ de 19/3/2002, Rev. nº 537/02, 2ª Sec., Sumários, 3/2002).
Sendo assim, como julgamos que é, perfilhamos o entendimento exposto no douto Acórdão da Relação de Évora de 15 de Dezembro de 2022, no recurso n.º 1980/20.5T8LLE-A.E1, em que foi relator Rui Machado e Moura, proferido em recurso paralelo a este, no apenso A (embargos deduzidos pela executada AA contra a mesma execução n.º 1980/20.5T8LLE), pronunciando-se precisamente sobre a arguição da mesma nulidade ora em apreço (omissão de pronúncia) deduzida naquele processo.
Transcrevendo: “…entendemos que não se vislumbra qualquer nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que o M.mo Juiz “a quo”, relativamente à questão da inexistência de título executivo, concluiu que o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que reviu e confirmou a sentença arbitral condenatória constitui, só por si, título executivo válido e, além disso, também concluiu que tendo a execução sido instaurada em Portugal, o pedido formulado tinha que ser expresso em euros, que é a moeda com curso legal no nosso país, e não em reais, que é a moeda com curso legal no Brasil, onde foi proferida a referida sentença arbitral condenatória.”
“Deste modo, constata-se que o Julgador “a quo” apreciou esta questão que lhe foi submetida pela embargante, não existindo qualquer omissão de pronúncia na decisão sob censura proferida na 1ª instância e, por via disso, forçoso é concluir que a sentença recorrida não padece da nulidade prevista na citada alínea d) do nº1 do art.615º que, erroneamente, lhe é imputada pela recorrente.”
“Porém, isto não implica que não possa existir eventual erro de julgamento e que a decisão em causa seja a correcta e a adequada ao caso em apreço, perante a factualidade carreada para os autos e o direito aplicável, mas nunca a nulidade de sentença invocada pela embargante, aqui apelante.”
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, indefere-se, portanto, a arguição de nulidade em apreço.
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B) Importa agora conhecer da segunda questão levantada pelo embargante/apelante, a de saber se inexiste título executivo, dado que efectivamente não foi junta com o requerimento inicial no processo principal a que estes autos estão apensos a sentença arbitral estrangeira que terá condenado os executados ao pagamento das quantias ora reclamadas pelos exequentes.
Neste ponto, é forçoso concordar com o recorrente quando refere que a sentença condenatória não é aquela que reviu e confirmou a sentença estrangeira que se pretende executar, uma vez que tal decisão apenas tem por efeito conferir força executiva ao aresto que confirmou.
A sentença condenatória invocada para basear a execução será necessariamente a sentença arbitral proferida pela Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil, no dia 25 de Setembro de 2017, e que foi devidamente revista e confirmada no processo de revisão de sentença estrangeira, de forma a valer na ordem jurídica interna.
Ou seja, diferentemente do que considerou o tribunal recorrido, a sentença que se executa é a sentença arbitral brasileira e não outra, nomeadamente a proferida em sede de revisão de sentença. A sentença que reviu e confirmou a sentença estrangeira e conferiu exequibilidade àquela integra o título executivo porquanto é ela que confere à sentença revidenda essa qualidade (a executoriedade).
É sabido que no ordenamento jurídico português a eficácia das sentenças proferidas por um país estrangeiro, quer quanto à sua força de caso julgado, quer quanto à sua exequibilidade (exequatur), têm de sujeitar-se a um processo especial de revisão e confirmação, regulado nos artigos 978.º e seguintes do atual CPC.
Nesta sentido dispõe o artigo 706º do CPC quando refere que “as sentenças proferidas por tribunais ou por árbitros em país estrangeiro só podem servir de base à execução depois de revistas e confirmadas pelo tribunal português competente”.
Ora é verdade que os exequentes apenas juntaram ao processo executivo, com o seu requerimento inicial, a decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa, datada de 28/10/2019, transitada em julgado em 14/11/2019, proferida no P.356/19.1YRLSB, a qual reviu e confirmou a sentença proferida no processo de arbitragem nº113/2013, da Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil que declarou a existência de créditos dos exequentes perante os executados relativos a um contrato-promessa de compra e venda de quotas da EBW RS Franchising Ltda, e condenou os aqui executados na devolução de valores, indemnização por lucros cessantes, multas contratuais, verbas de sucumbências, custas, honorários dos árbitros, despesas arbitrais, tudo corrigido e acrescido dos respectivos juros legais.
Acontece, todavia, no caso em apreço, que no artigo 1.º da presente petição de embargos o ora recorrente alegou precisamente que “no dia 25 de Setembro de 2017 foi proferida sentença arbitral pela Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil, na qual os Executados foram condenados a devolver aos Exequentes os valores, indeminização por lucros cessantes, multas, verbas de sucumbência, custas, honorários dos árbitros, despesas arbitrais, acrescido dos juros legais, em resultado do incumprimento contratual ali verificado (“Sentença”), que se junta como Doc. 1, que aqui se dá por reproduzido, bem como os demais, para todos os legais efeitos”.
E verificando esse documento n.º 1, constata-se que o mesmo, após a parte inicial cujo conteúdo essencial se encontra vertido no ponto n.º 5 da matéria de facto, é composto pela referida sentença arbitral proferida no dia 25 de Setembro de 2017, no processo de arbitragem n.º 113/2013, da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial do Paraná – ARBITAC, na qual consta aposto carimbo de recebimento com aquela data, às 14:50h, estando rubricada e assinada e terminando com um dispositivo que na alínea a) declara a existência dos créditos dos requerentes (CC e DD) em face dos requeridos (AA, FF e EE), relacionados com o contrato-promessa de compra e venda de quotas da EBWRS, e nas alíneas b) a g), condena os Requeridos a pagar os valores expressos em reais ali indicados, e juros moratórios também especificados.
Constata-se que a autenticidade e genuinidade deste documento não foi colocada em causa pelos exequentes, nos termos prevenidos nos artigos 444.º e 446.º do CPC.
Trata-se, pois, da sentença arbitral originalmente em falta no requerimento executivo, mas que foi junta aos autos pelo próprio executado/embargante, o qual deste modo complementou o título executivo (veja-se, ilustrativamente, como o artigo 413.º do CPC estabelece que o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las).
Importa neste passo recordar que a falta apontada não constituiria motivo para indeferimento liminar da execução, visto que não estamos perante a situação prevista na alínea a) do nº2 do art.726º do C.P.C., segundo a qual o juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando “seja manifesta a falta ou insuficiência do título”.
No caso o teor do requerimento inicial indiciava a existência e a suficiência do título que invocava, até por força do conteúdo da sentença de revisão de sentença estrangeira anexa, só que, sendo esse título compósito, não fazia a junção completa de todos os seus elementos documentais.
Desse modo, a falta em questão seria sempre suprível, como resulta do nº4 do citado art. 726º quando estipula que “fora dos casos previstos no n.º 2, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6º.”
Como afirma Rui Pinto, “ocorrendo um vício que não se subsuma ao nº2 do art.726º deverá o juiz proferir despacho de aperfeiçoamento para suprimento de irregularidades do requerimento executivo e de sanação da falta de pressupostos processuais. Por ex., sanação da incapacidade judiciária, da representação irregular, da falta de patrocínio obrigatório ou da junção de documento complementar do título executivo nos termos dos artigos 54º e 707º, uso de dois títulos executivos para a mesma dívida” – cfr. A Ação Executiva, pág.354.”
Assim sendo, e reconhecendo-se que a decisão singular proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa desacompanhada da decisão arbitral condenatória não bastaria por si só para valer como título executivo, julgamos que tal questão, sendo suprível, ficou ultrapassada pela junção a estes autos da sentença arbitral referida, apresentando-se agora completo o título executivo em causa.
Tal é consequência inevitável, também, da natureza dos embargos de executado, que constituem um procedimento adjectivo autónomo mas funcionalmente indissociável da execução que os justifica.
Seria de um formalismo extremo julgar condenada a execução, processo principal, por ali faltar um documento que está junto nos embargos (e que mesmo na visão mais formalista poderia desde logo mandar-se juntar à própria execução, por cópia ou certidão ou após desentranhamento e juntada).
Como tem sido reiterado nas sucessivas reformas do processo civil, impõe-se garantir a prevalência do fundo sobre a forma, sendo este um princípio estruturante do direito processual em vigor, até atendendo à sua natureza instrumental.
Conforme se salientava expressivamente no preâmbulo do Decreto-Lei 329-A/95 de 12 de Dezembro, que reviu o Código de Processo Civil então vigente, a preocupação do legislador foi já então a de “obviar-se a que regras rígidas, de natureza estritamente procedimental, possam impedir a efectivação em juízo dos direitos e a plena discussão acerca da matéria relevante para propiciar a justa composição do litígio.”
Julgamos, em consequência, que improcede o recurso na parte referente à falta do título executivo, já que a questão levantada se encontra suprida e ultrapassada, pelos motivos supra expostos.
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C) Finalmente, defende o recorrente/embargante que pode ainda invocar nestes autos como meio de oposição à execução a sua própria falta de citação e intervenção (tal como o outro co-executado BB) no processo arbitral em que foi proferida a sentença condenatória, com base no disposto no art. 696º e na alínea d) do art.729º, ambos do C.P.C.
A este respeito declarou-se na sentença impugnada que não pode agora conhecer-se das questões relacionadas com a citação dos requeridos no processo arbitral em que foi proferida a sentença uma vez que tal matéria ficou decidida no processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira que correu no Tribunal da Relação de Lisboa, onde foi confirmada a sentença arbitral.
Afigura-se que tem razão o julgador da primeira instância.
Como já referimos, no ordenamento jurídico português a eficácia das sentenças proferidas por um país estrangeiro, quer quanto à sua força de caso julgado, quer quanto à sua exequibilidade (exequatur), têm de sujeitar-se a um processo especial de revisão e confirmação, regulado nos artigos 978.º e seguintes do atual CPC.
E nesse procedimento consta como um dos requisitos para a confirmação da sentença revidenda precisamente a verificação de “que o réu tenha sido regularmente citado para a ação, nos termos da lei do país do tribunal de origem, e que no processo hajam sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes” (cfr. art. 980º, al. e), do CPC).
Tal significa que a questão referida tem o seu lugar próprio no dito processo, devendo ser ali invocada em sede de defesa, sendo caso disso.
E, consequentemente, com a confirmação da sentença estrangeira, fica essa questão precludida para o futuro como meio de defesa contra a sentença confirmada.
Consta da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que os requeridos foram pessoalmente citados nesse processo para deduzirem oposição e não o fizeram. Porém, era esse o momento e o lugar certos para esse efeito.
O que temos agora, consolidado na ordem jurídica, é a decisão final desse processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira, a qual considerou que no processo de arbitragem nº 113/2013 da Câmara da Associação Comercial do Paraná, Brasil, os réus foram regulamente citados nos termos da lei brasileira e que no processo foram observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes, não ocorrendo a violação de nenhum princípio de ordem pública.
Por outras palavras, sendo certo que um dos requisitos para que a sentença estrangeira seja confirmada é que o réu tenha sido regularmente citado para a acção nos termos da lei do país do tribunal de origem e que nesse processo hajam sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes, mencionados na alínea e), do artigo 980º do Código de Processo Civil, a verdade é que com a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a sentença revidenda tais questões ficaram definitivamente decididas.
Sublinha-se que essa matéria, ainda que não suscitada nessa sede pelos requeridos, é necessariamente objecto de apreciação oficiosa no processo de revisão da sentença estrangeira, por ser um dos requisitos legais para a confirmação.
As questões que ficaram assentes na decisão de confirmação da sentença arbitral não podem mais ser conhecidas noutro processo posterior, por força da autoridade do caso julgado, figura jurídica que visa precisamente a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior de modo a obstar a que a mesma questão possa ser definida de modo diverso por outra decisão judicial.
Portanto, quando o art. 729º, al. d), do CPC, menciona como um fundamento possível de oposição à execução baseada em sentença a falta de intervenção do réu no processo onde foi proferida a sentença (tendo esse processo corrido à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, cfr. art. 696º, al. e), CPC), esse fundamento de oposição tem que ser compreendido como restringindo-se às situações em que tal questão não tenha já sido oportunamente decidida, ao contrário do que necessariamente acontece nos casos em que houve processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira.
Tendo transitado a decisão de confirmação da sentença estrangeira, essa questão ficou esgotada, adquirindo autoridade de caso julgado.
Face ao exposto, improcede também nesta parte o recurso em análise, terminando-se consequentemente com a confirmação da sentença recorrida.
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VII - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo-se em consequência a decisão recorrida.
Custas recursais a cargo do embargante, dado o decaimento (cfr. art. 527º, n.º 1, do CPC).
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Évora, 25 de Janeiro de 2023
José Lúcio
Manuel Bargado
Albertina Pedroso