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OPOSIÇÃO À PENHORA
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
FUNDAMENTOS
INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário
Os fundamentos de oposição à penhora são apenas os taxativamente previstos no artigo 784.º/1, a) a c), do CPC e não os fundamentos de oposição à execução, pelo que a oposição à penhora deve ser liminarmente indeferida se não se fundar nos citados requisitos. (Sumário do Relator)
Texto Integral
Proc.º 2422/04.9TBSTR-I.E1
Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
Recorrente: AA.
Recorrida: BB.
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No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Execução do Entroncamento – Juiz 1, o recorrente deduziu oposição à penhora que incidiu sobre o prédio misto ali identificado.
A oposição foi liminarmente apreciada e decidido o seguinte: Através da petição que consta da ref.ª ...68 de 13-06-2022 veio o executado AA deduzir tempestivamente (cfr. ref.ªs ...72 de 21-06-2022, ...88 de 21-06-2022, ... de 27-06-2022 e ...03 de 28-06-2022) oposição à penhora que incidiu sobre o imóvel ali devidamente identificado. Para tanto alegou, em síntese, o seguinte: - Conforme consta do título executivo, o Executado é responsável subsidiário pelas dívidas da sociedade “E..., Limitada” que, no dia 21 de Março de 2006, foi dissolvida; - Não houve lugar a partilha na referida dissolução, em virtude de, à época, não existir activos para partilhar entre os sócios; - A quantia exequenda apenas poderá ser considerada como um passivo superveniente da sociedade extinta, motivo pelo qual, deve ser tratado nos termos do artigo 163.º do Código das Sociedades Comerciais, sendo que o Executado tinha responsabilidade limitada na referida sociedade; - No título executivo consta que “condeno a autora a proceder à eliminação dos defeitos acima aludidos em XVII., ponto (xxii), no prazo de 6 (seis) meses, a contar da data do trânsito em julgado desta decisão”; - A Autora, para efeitos de interpretação do título executivo é a sociedade comercial e não os aqui Executados; - Salvo melhor opinião, não existe nenhuma sentença que declare os Executados, na qualidade de sócios/liquidatários responsáveis pelo pagamento de qualquer passivo da sociedade extinta, pelo que não existe qualquer título executivo contra o Executado; - Sobre o bem penhorado incide a quantia exequenda no valor de € 518.629,90 (quinhentos e dezoito mil, seiscentos e vinte e nove euros e noventa cêntimos), ou seja, a eventual responsabilidade do Executado está limitada a 0,48% do valor da quantia exequenda; - A Exequente nunca moveu qualquer ação destinada a condenar o Executado em montante superior ao que recebeu na partilha, sendo assim evidente o excesso de penhora; - A Exequente pretende receber uma quantia cuja lei lhe veda essa possibilidade, de acordo com o n.º 1 do artigo 163.º do Código das Sociedades Comerciais; - Bem, mas dirá a Exequente que existe um acórdão onde se refere que “este excerto decisório da sentença dos embargos tem, pois, como pressuposto necessário, a existência de título executivo contra os executados ex-sócios da sociedade autora, contra os quais seguiu a acção declarativa e foi determinado o prosseguimento da execução, a qual impõe por efeito do caso julgado, nos termos do n.º 1 do artigo 619.º do Código de Processo Civil”; - Porém, «tal decisão é uma aberração jurídica e lá por ser não significa que “encarneiremos” nessa mesma aberração»; - Ademais, o título executivo é claro e apenas fala em Autora (a sociedade) e não os seus sócios; - Mas ainda mais, prosseguir a acção em representação da sociedade extinta não significa que os bens pessoais dos sócios respondam pela dívida, até porque a Exequente continuou sem alegar e provar os montantes recebidos na partilha, cujo ónus lhe cabe. - Se a Exequente pretende ser ressarcida, se tiver razão para tal, deve seguir os trâmites da lei e não passar por cima dela, até porque os Executados nunca tiveram a oportunidade de se defenderem de um incidente de habilitação; 36. Ademais, havendo duas sentenças contraditórias, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar, o que significa que a decisão que julga os Executados como pessoalmente responsáveis ao arrepio da lei (o que é uma aberração jurídica) transitou em julgado em segundo lugar, logo apenas se pode cumprir a primeira; - Ademais, o despacho de 21 de janeiro de 2009, proferido na ação principal em momento algum refere que os Executados tomavam a posição da sociedade extinta; - Os efeitos do referido despacho servem apenas para efeitos de representação da sociedade extinta e não uma substituição de sujeitos processuais; - Ninguém pode afirmar que os Executados foram citados, na qualidade de liquidatários, porque tal afirmação não seria verdadeira; - Logo, não tendo sido citados, nunca podem responder pessoalmente; - Não existindo nenhum incidente de habilitação que tenha julgado os Executados corresponsáveis pelo pagamento de uma alegada dívida da sociedade extinta, todo o processo executivo é nulo, por força da ilegitimidade dos Executados; - Assim, verifica-se que o referido bem é impenhorável, em virtude dos bens dos Executados não responderem pela dívida em causa e, por conseguinte deve ser a presente oposição à penhora julgada procedente.
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(…) Dito isto, é tempo de regressar à situação dos autos para deixar desde logo claro que o aqui executado/oponente há muito deduziu a oposição à execução que correu termos sob Apenso E, aí invocando, para além do mais, a inexequibilidade do título executivo (sentença condenatória). E o que vem agora trazer à colação são, precisamente, fundamentos de oposição à execução (em que se inclui aquela discussão acerca da existência de título executivo) e não qualquer um dos sobreditos fundamentos de oposição à penhora. De resto, o executado/oponente claramente assume uma tal constatação ao não se fazer rogado em atacar diretamente – e em termos que nos dispensamos aqui de qualificar – o caso julgado em sede de oposição à execução. E como a alegação de impenhorabilidade do imóvel assenta exclusivamente na defesa do entendimento de acordo com o qual bens os executados não respondem pela dívida em causa, defesa essa que já não é aqui processualmente admissível, a oposição à penhora deve, sem necessidade de outras considerações, ser liminarmente indeferida, tanto por falta de fundamento como por ser manifestamente improcedente.
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Na defluência do exposto, e tendo ainda presente as disposições conjugadas dos artigos 732.º, n.º 1, alíneas b) e c), e 785.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, decido indeferir liminarmente a presente oposição à penhora deduzida por AA.
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Valor: € 172.817,68 (cento e setenta e dois mil, oitocentos e dezassete euros, sessenta e oito cêntimos), correspondente ao valor atribuído ao imóvel cuja penhora foi alvo da presente oposição (cfr. auto constante da ref.ª ...82 de 26-05-2022 dos autos principais – Apenso D) e, desse modo, à utilidade económica imediata do pedido – artigos 296.º, n.º 1, in fine, 297.º, n.º 1, e 304.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil. Corrija nos locais adequados. Custas integralmente a cargo do executada/oponente (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário com que litiga. Registe e notifique, incluindo a Sra. Agente de execução.
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Não se conformando com o decidido o recorrente apelou formulando as seguintes conclusões,que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC:
A. Posto isto, dúvidas não existem que “conforme consta do título executivo, oExecutado é responsável subsidiário pelas dívidas da sociedade «E..., Limitada»,que,nodia21deMarçode2006,foidissolvida.”
B. Ademais, o despacho de 21 de janeiro de 2009 refere que “de acordo com o disposto no artigo 160.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais, «asociedadeconsidera-seextinta(...)peloregistodoencerramentodaliquidação.».Todavia,asacçõesemqueasociedadesejapartecontinuamapósaextinçãodesta,que se considera substituída pelageneralidade dos sócios, representados pelos liquidatários (cfr. artigo 162.º, n.º1,doCódigo deProcessoCivil).Nocasoconcreto,oencerramentodaliquidaçãodaAutorafoijáobjectoderegistoeossóciosdaextintaAutoravieramjájuntarprocuraçõesaosautos–cfr.fls.977eseguintes”.
C. Logo, o Executado não é o principal devedor e/ou obrigado, o que significa que a sua responsabilidade apenas poderia ser solidária e/ou subsidiária.
D. Ninguém pode afirmar que os Executados foram citados, na qualidade de liquidatários, porque tal afirmação não seria verdadeira.
E. Logo, não tendo sido citados, nunca podem responder pessoalmente.
F. Não houve lugar a partilha na referida dissolução, em virtude de, à época, não existir ativos para partilhar entre os sócios, cfr. doc. ... da oposição à penhora.
G. Representação processual não significa substituam do devedor no título executivo, pelo menos, sem que haja meios de habilitação, assunção pessoal da dívida pelos antigos sócios e/ou qualquer norma legal que permita a substituição de pessoas no título executivo.
H. Logo, deve a sentença recorrida ser revogada.
I. Assim, nestes termos e face ao exposto, considerando que a Recorrida, erradamente configurou os Recorrentes como executados e não como substitutos processuais, deve admitir-se a presente oposição à penhora, na medida em que a mesma atinge bens absolutamente impenhoráveis, como atinge bens que nos termos do direito substantivo não respondem pela dívida, em virtude de os bens não pertencerem a pessoa que figura no título executivo, como os Executados nunca foram condenados pessoalmente por qualquer dívida da sociedade extinta e, em consequência, deve ser admitida a oposição à penhora.
Assim, nestes termos e nos demais de direito que V. Exa., doutamente suprirá, deve dar provimento ao presente recurso, revogando a sentença recorrida e substituindo-a por outra que ordene o recebimento da oposição à penhora.
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A recorrida contra-alegou, concluindo:
a. Tal como configurado pela Recorrente não foi por esta carreado para os autos quaisquer elementos de mérito que permitam rebater seriamente a decisão do tribunal a quo.
b. Assim somente traz o Recorrente a sua opinião (por maioria de razão é parcial) e uma fundamentação extemporânea dado que este tema foi já tratado nos presentes autos no 2422/04....;
Até porque,
c. Como bem notou o tribunal a quo a fls. 7 da douta sentença recorrida,
“Dito isto, é tempo de regressar à situação dos autos para deixar desde logo claro que o aqui executado/oponente há muito deduziu a oposição à execução que correu termos sob Apenso E, aí invocando, para além do mais, a inexequibilidade do título executivo (sentença condenatória).
E o que vem agora trazer à colação são, precisamente, fundamentos de oposição à execução (em que se inclui aquela discussão acerca da existência de título executivo) e não qualquer um dos susoditos fundamentos de oposição à penhora.
De resto, o executado/oponente claramente assume uma tal constatação ao não se fazer rogado em atacar diretamente – e em termos que nos dispensamos aqui de qualificar – o caso julgado em sede de oposição à execução.
E como a alegação de impenhorabilidade do imóvel assenta exclusivamente na defesa do entendimento de acordo com o qual bens os executados não respondem pela dívida em causa, defesa essa que já não é aqui processualmente admissível, a oposição à penhora deve, sem necessidade de outras considerações, ser liminarmente indeferida, tanto por falta de fundamento como por ser manifestamente improcedente.
Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Exas. não deverá ser dado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente.
Devendo, em consequência, ser mantida a sentença proferida pelo Tribunal a quo, com as devidas consequências, assim se fazendo acostumada justiça.
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A questão que importa decidir é de saber que está verificado algum dos pressupostos de que depende a oposição à penhora.
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A matéria de facto a considerar é a que consta do relatório inicial.
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Conhecendo.
Alega o recorrente que foi penhorado um prédio misto de sua propriedade, verificando-se um excesso de penhora e a ilegitimidade dos executados, o que tem como consequência a impenhorabilidade do dito bem.
Acerca da oposição à penhora dispõe o artigo 784.º do CPC, sob a epígrafe, “Fundamentos da oposição”: 1 - Sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos: a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada; b) Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda; c) Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência. 2 - Quando a oposição se funde na existência de patrimónios separados, deve o executado indicar logo os bens, integrados no património autónomo que responde pela dívida exequenda, que tenha em seu poder e estejam sujeitos à penhora.
Na alínea a) estão previstos os bens cuja penhora é inadmissível ou bens que excedem a o montante da dívida exequenda, fora dos casos proveitos no artigo 751.º/3, do CPC.
O fundamento a que alude a alínea b) dirige-se aos casos em que, existindo bens que respondem em primeira linha pelo pagamento da dívida exequenda, foram penhorados bens que apenas respondem em segunda linha, ou seja, que só subsidiariamente respondem pelo pagamento, v.g., bens do fiador que tenha a seu favor o benéfico da excussão prévia, artigo 638.º do CC.
A alínea c) prevê os bens que não respondem pela dívida exequenda porque excluídos pelo direito substantivo, tais como os casos de limitação convencional (v.g. artigo 603.º do CC) ou os bens não transmissíveis, ou seja, fora do comércio (v.g. artigo 736.º/b), do CPC).
Sobre a apreciação destas situações, cfr. Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL, 2019, pág. 678.
O recorrente sintetiza as suas alegações concluindo que a penhora “atinge bens absolutamente impenhoráveis, como atinge bens que nos termos do direito substantivo não respondem pela dívida, em virtude de os bens não pertencerem a pessoa que figura no título executivo, como os Executados nunca foram condenados pessoalmente por qualquer dívida da sociedade extinta”.
Neste conspecto identificam-se argumentos concernentes à ilegitimidade do titular do bem penhorado e à inexequibilidade do título executivo.
Contudo, tais desideratos não são permitidos como fundamentos da oposição à penhora, mas sim como oposição à execução, o que não é o caso em apreciação, uma vez que a fase de oposição à execução por embargos foi utilizada pelo ora recorrente e já se mostra ultrapassada, sendo que tais argumentos parece terem sido também esgrimidos em sede própria pelo ora recorrente tendo-se concluído pela sua legitimidade e pela exequibilidade do título (como resulta do despacho em crise).
O que significa dever improceder a apelação nesta parte.
Confrontando o alegado pelo recorrente com as possibilidades de oposição à penhora concedidas pela lei, verificamos que apenas se pode configurar o excesso de penhora, previsto na citada alínea a) do nº 1 do artigo 784.º do CPC.
Assim sendo, resta apreciar se a penhora se pode classificar como excessiva.
O bem penhorado tem o valor de € 172.817,68 (auto de penhora) e a dívida exequenda ascende a € 518.629,90 (artigo 19.º da oposição à penhora).
O recorrente alega que o excesso decorre do facto de apenas poder ser responsabilizado pelo pagamento de parte da quantia exequenda (como consta da oposição à penhora, mais concretamente 0,48% do valor da quantia exequenda).
O bem penhorado em causa é um prédio misto, em parte urbano e em parte rústico, sito na União de Freguesias ... e ..., pelo que, não tendo o recorrente alegado e provado que o valor do prédio é superior à quantia exequenda total, deve concluir-se que a penhora seria excessiva se a sua responsabilidade se resumisse a 0,48%, mas que, sendo a responsabilidade total, não se verifica excesso de penhora.
Para além disso, esta asserção resultava do próprio texto da oposição, pelo que o indeferimento liminar se impunha.
O que equivale a dizer que improcede a apelação na totalidade.
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Sumário:
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DECISÃO.
Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma o despacho recorrido.
Custas pelo recorrente Artigo 527.º do CPC.
Notifique.
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Évora, 25-01-2023
José Manuel Barata (relator)
Cristina Dá Mesquita
Rui Machado e Moura