DIFAMAÇÃO
FIGURAS PÚBLICAS
FACEBOOK
AGRAVAÇÃO
Sumário

I. Embora se reconheça existir uma maior margem de crítica admissível quando se trata de titulares de cargos políticos, comete o crime de difamação o arguido que, em diversas publicações no Facebook, visando um presidente de Junta de Freguesia, apelida-o de “mentiroso”, “racista”, “fascista”, “ditador”, “ladrão”, “ignorante”, “cobarde”, “aldrabão”, “falso”, “discriminatório” e “hipócrita” e afirma que o mesmo “gere a Junta com ditadura, mentiras, ameaças, abuso de poder, racismo, discriminação, falsidade”.
II. O arguido ultrapassou claramente o exercício do direito de crítica objetiva ao comportamento político e público do assistente, enquanto presidente de Junta de Freguesia, para atingir diretamente a sua substância pessoal.
III. Uma vez que os textos foram publicados em conta de Facebook (rede social que funciona através da internet), comprovadamente acessível ao público em geral (e não apenas àqueles que faziam parte do grupo de “amigos” do arguido), estamos perante um “meio de comunicação social”, que visa, pois, atingir um conjunto alargado de pessoas, pelo que se mostra preenchida a circunstância agravante a que se reporta o n.º 2 do artigo 183.º do Código Penal.

Texto Integral

Acordam, em conferência, os Juízes que integram a 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
1. No Juízo Local Criminal de Lisboa (Juiz 1) do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, no âmbito do processo comum n.º 8013/19.2T9LSB, foi proferida sentença que absolveu o arguido A da prática de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º, n.ºs 1, alínea a), e 2 e 184.º, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal., que lhe era imputado.
2. Inconformado com a decisão, dela interpôs recurso o assistente B, formulando as seguintes conclusões:
1. «O Tribunal a quo, salvo o devido respeito, não valorou corretamente a prova produzida em sede de Audiência de Discussão e Julgamento e, bem assim, não fez uma correta aplicação do Direito ao caso concreto.
2. Com efeito, entende o Recorrente que deveriam ter sido dados como provados os factos elencados nos pontos 1. e 2. da Matéria de Facto dada como não provada, por considerar ter sido produzida prova suficiente que demonstra que "ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões que não correspondiam à verdade e juízos de valor sobre a pessoa de B que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal, profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia que o arguido conhecia, sabendo ainda que tais comentários que visaram directamente o ofendido enquanto Presidente da Junta de Freguesia, dirigidos à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas como, de facto sucedeu. ", bem como que "bem sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei penal. ".
3. Resulta da prova produzida que o Arguido tinha consciência da ilicitude dos seus atos, por um lado, porque continuou a praticá-los mesmo depois de ter sido apresentada queixa contra si, e por outro, porque o próprio Arguido admite ter cometido os crimes em causa, propondo um acordo em que deixava de os cometer: estou disposto a não voltar a praticar crimes da mesma natureza e me comprometo a não efetuar mais publicações idênticas às que constam nos autos(...)", conforme resulta do e-mail enviado pelo Arguido ao Ministério Público, que consta do processo (fls. 252).
4. Resulta da prova produzida que as afirmações produzidas pelo Arguido, através das inúmeras publicações feitas na página de Facebook "Todos contra B Presidente da junta de freguesia de C" traduzem-se na imputação ao Recorrente de factos graves, ilícitos e criminosos.
5. Porquanto as imputações dirigidas ao Recorrente, bem como os juízos de valor proferidos pelo Arguido nos comentários e publicações feitas no Facebook, revestem-se de uma inequívoca e enorme gravidade, com o propósito de atingir diretamente o prestígio e honorabilidade do Recorrente, ultrapassando as meras suspeitas ou suposições, destinando-se a imputar factos e a formular juízos sobre supostas condutas ilícitas e mesmo sobre o caráter pessoal do Recorrente, através de afirmações caluniosas e difamatórias, que são falsas e ostensivamente ofensivas da honra, consideração, credibilidade, prestígio e confiança do Recorrente.
6. Face a todo o exposto, não existem dúvidas que o Arguido praticou, na forma consumada e com dolo direto, o crime de Difamação previsto no artigo 180.º do Código Penal, porquanto a consumação do crime de difamação basta-se com a imputação de factos ou de juízos mesmo que apenas sob o manto da suspeita,
7. Acresce ainda que o Arguido agiu de um modo particularmente grave, porque insidioso, recorrendo a suspeitas infundadas e não demonstradas para denegrir a imagem do Recorrente enquanto Presidente da Junta de Freguesia de C, o que logrou alcançar, tendo praticado os atos sempre com a perfeita consciência de que as suas imputações e comentários teriam uma forte repercussão na opinião pública, causando sérios danos à reputação do Recorrente, designadamente nos fregueses de C, sedimentando a ideia através da referida página de Facebook de que o ora Recorrente atua de forma incorreta, imoral e ilícita.
8. É hoje transversalmente aceite pela jurisprudência e doutrina que no crime de difamação não é exigido qualquer dolo específico ou elemento especial do tipo subjetivo que se traduza no especial propósito de atingir o visado na sua honra e consideração, e neste sentido, grosso modo, basta que o Arguido conheça e tenha consciência do teor ofensivo da imputação ou juízo formulados e atue conformando-se com ele (dolo eventual), para que se verifique preenchido o elemento subjetivo do tipo.
9. Ora, resulta cabalmente demonstrado que o Arguido praticou o facto com dolo direto, tal é a ostensiva intenção de atacar o bom nome, a honra, a reputação e a consideração do Recorrente e, bem assim, a sua credibilidade e prestígio enquanto Presidente da Junta e enquanto cidadão, não podendo desconhecer o teor ofensivo das imputações e juízos de valor formulados, tendo plena consciência de atingir o Recorrente na sua honra e consideração,
10. O Arguido sempre teve consciência, e não podia ignorar, o impacto que imputações de tal ordem têm na praça pública e consequentemente na vida do Recorrente.
11. Apesar disso, e disso se aproveitando, nunca se inibiu de reiterar os juízos de valor formulados relativamente à pessoa do Recorrente, o que fez por diversas ocasiões e recorrendo a meios privilegiados e facilitadores de divulgação, concretamente a rede social Facebook, resultando evidenciada a pretensão inequívoca do Arguido em criar um efeito generalizado e devastador da honra do Recorrente junto da opinião pública.
12. Pelo exposto, verificam-se também os pressupostos do agravamento previsto no previsto no artigo 183º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, porquanto as ofensas perpetradas pelo Arguido são praticadas por meios e em circunstâncias obviamente facilitadoras da sua divulgação,
13. Importa salientar que o Arguido não se limitou a formular meras considerações ou críticas no exercício do seu direito à liberdade de expressão, ao invés imputou factos e formulou juízos sobre o carácter e moralidade do Recorrente, que estão muito para além da liberdade de expressão de uma opinião ou de um simples ponto de vista.
14. Os direitos de personalidade têm proteção no Direito Internacional, designadamente nos artigos 6º, 12º e 15º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e a nível interno, no artigo 260 da Constituição da República Portuguesa e nos artigos 70.º e seguintes do Código Civil.
15. Mostra-se basilar a proteção de direitos de personalidade como a honra, a privacidade e o bom nome, sendo certo que a fundamentabilidade destes princípios radicam na necessidade, demonstrada pela realidade social, de preservar, em todos os seus principais traços, a dignidade da pessoa humana, que é pedra angular de todo o sistema jurídico,
16. Sendo que o direito à liberdade de expressão não se pode sobrepor a outros direitos e valores, nomeadamente, o direito ao bom nome, à reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e ao desenvolvimento da personalidade.
17. Da prova produzida resulta que o Arguido sujeitou o Recorrente a uma verdadeira perseguição, que ofendeu a sua honra e consideração, e ao fazer tais insinuações demonstrou total desprezo pela honra, consideração, reputação e dignidade do Recorrente.
18. Discorda-se da Sentença recorrida, porquanto não se trata de publicações residuais que refletem o estado de alma de um cidadão, que tem o seu direito à critica, mas sim de uma verdadeira perseguição ao Recorrente, através de uma página pública onde, durante meses, são difundidos factos falsos e formulados juízos injuriosos e difamatórios acerca do Recorrente e que pela sua gravidade se repercutem negativamente na sua vida, a todos os níveis.
19. Note-se ainda que a regularidade e consistência das publicações revela uma estratégia premeditada, de pura maldade, que tem como único escopo desgastar, atacar e mesmo terminar com a imagem, reputação e autoestima do Recorrente, seja na sua esfera pessoal como na sua esfera pública.
20. Expressões tais como "racista", "corrupto", ou mesmo "fascista", estão intimamente ligadas à esfera íntima do individuo e afetam diretamente a sua honra, não apenas o político, mas também o cidadão, não estando somente em causa a sua atuação profissional.
21. Com a formulação de tais juízos, o Arguido ultrapassou, de forma excessiva, a imputação ao Recorrente de meros factos, emitindo verdadeiros juízos sobre o carácter do Recorrente, que não podem deixar de ser vistos como ofensivos da honra e consideração do Recorrente, o que o Arguido fez com dolo e consciência da ilicitude.
22. Razão pela qual não se acompanha a Sentença recorrida, na parte que absolveu o Arguido da prática de um crime de difamação agravada, mostrando-se verificados todos os pressupostos para a incriminação pelo respectivo tipo de ilícito criminal.
23. No que respeita à parte da decisão que julgou improcedente o pedido de indemnização civil formulado pelo Assistente, ora Recorrente, também não se acompanha a Sentença recorrida, porquanto se considera que o Tribunal a quo, uma vez mais, não valorou corretamente a prova produzida em sede de Audiência de Discussão e Julgamento e, bem assim, não fez uma correta aplicação do Direito ao caso concreto.
24. Dispõe o artigo 484.º do Código Civil que "Quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva, responde pelos danos causados.
25. A liberdade de expressão, seja qual for a forma da sua exteriorização, tem sempre como limite a salvaguarda de outros direitos fundamentais, designadamente dos direitos consagrados nos artigos 25.º e 26.º da CRP, entre os quais se incluem o direito ao nome, o direito à imagem e o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar.
26. No entanto, considerou o Tribunal a quo que "o teor das expressões em causa inculca a ideia de que se criticou um comportamento mas não expressamente a pessoa do ofendido. Mas ainda que se possa considerar que se trata de uma crítica directamente dirigida à actuação do ofendido/assistente, é patente que a mesma se situa que ela se situa na área dos seus comportamentos estritamente profissionais/funcionais e não atinge o núcleo da dignidade pessoal do queixoso" e que "Resulta do teor das publicações em causa nos autos que há uma crítica que incide sobre a actuação profissional do ora assistente no âmbito das suas funções num cargo que é de natureza politica.
Crítica esta, indelicada, acintosa, repetitiva, mas relativa à sua actuação enquanto presidente da junta de freguesia, logo a uma posição política, mas não à pessoa em si do ora assistente.
Ainda que algumas das expressões se possam considerar objectivamente insultuosas, as mesmas reportam-se à actuação profissional do ora assistente.
E numa sociedade democrática, aqueles que exercem cargos públicos, como é o caso do ora assistente, estão sujeitos a um controlo das pessoas que compõem a comunidade na qual exercem as suas funções.
27. Entendimento que não recebe, nem merece de todo, o nosso acolhimento.
28. Afirmações como "o presidente B é um mentiroso, racista, fascista, ditador, discrimina funcionários/as e favorece funcionários" não se limitam à sua esfera política ou de figura pública, estando diretamente associado à sua personalidade.
29. É este o entendimento perfilhado pela jurisprudência, que tem refere que a utilização de expressões tais como "racista", "corrupto", ou mesmo "fascista", estão intimamente ligadas à esfera íntima do individuo e afetam diretamente a sua honra.
30. A formulação de tais juízos pelo Arguido, nos termos em que as mesmas foram feitas, ultrapassou de forma excessiva e manifesta a imputação de meros factos, sendo verdadeiros juízos sobre o carácter do Recorrente que não podem deixar de ser vistos como ofensivos da sua honra e consideração, e o que o Arguido fez com dolo e consciência da ilicitude das suas ações, sendo que o dever de indemnizar não está dependente de intencionalidade ofensiva, bastando a mera culpa.
31. Concluindo-se, pois, que não podem deixar de ser julgados procedentes os argumentos do Recorrente, impondo-se a revogação da Sentença recorrida, por outra que condene o Arguido pelos crimes de que vem acusado e no pagamento de 5.000,00€ (cinco mil euros) a título de indemnização cível.»

3. Também o Ministério Público interpôs recurso, com a seguinte síntese conclusiva:
1ª Nos presentes autos, o arguido A foi submetido a julgamento e absolvido da acusação contra ele formulada pela prática de um crime de difamação agravada, previsto e punível pelos artigos 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º, n.ºs 1, al. a) e 2 e 184.º, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.
2ª Esta sentença absolutória, na parte em que entende não estarem verificados os elementos típicos do crime de difamação, não pode, a nosso ver, colher aplauso, na medida em que, da matéria de facto dada como provada, decorre o preenchimento do tipo objetivo e subjetivo de ilícito pelo qual o arguido foi acusado.
3ª Assim sendo, as razões da discordância relativamente à sentença recorrida prendem-se erro notório na apreciação da prova (art.º 410.º, n.º 2, al. c), do Cód. de Processo Penal), bem como e discordância relativamente à decisão de direito.
4ª Desde logo, verifica-se erro notório, quando, da leitura da decisão impugnada, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, se conclua que se deu como provado algo que não podia ter acontecido ou que se deu como não provado algo que não podia deixar de ter acontecido ou, ainda, quando se retira de um facto uma conclusão ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum.
5ª No caso dos autos, resultaram provados todos os factos constantes da acusação, sob os factos 1 a 26 da douta sentença recorrida, à exceção dos factos referentes ao elemento subjetivo.
6ª Deste modo, exige a normalidade da vida e o saber da experiência que se conclua que o arguido atuou com a intenção de ofender a honra pessoal e pública do assistente.
7ª Com efeito, os elementos subjetivos do crime pertencem à vida íntima e interior do agente. Isto significa que, só é possível captar a sua existência através e mediante factualidade material que os possa inferir ou permitir divisar, ainda que por meio de presunções ligadas ao princípio da normalidade ou às regras da experiência comum. Assim, o elemento subjetivo do tipo legal de crime infere-se, por presunções naturais, dos factos materiais correspondentes à ação objetivamente considerada (neste sentido, Acórdão Relação de Lisboa, de 28/01/1997, sumariado em dgsi.pt, processo nº 0001015).
8ª Ora, a Mmª Juiz considerou provados os factos integradores do tipo objetivo, incluindo na matéria de facto não provada a descrição dos elementos que integram a intenção do arguido na prática de tais factos objetivos.
9ª Assim sendo, resulta evidente que o tribunal a quo deu como provado algo que não podia deixar de ter acontecido, fazendo-o de uma forma ilógica, arbitrária e notoriamente violadora das regras da experiência comum.
10ª Deste modo, incorreu em erro notório na apreciação da prova, nos termos do artigo 410º, n.º 1, alínea a) do Cód. de Processo Penal, vício esse que poderá ser ultrapassado com recurso ao próprio texto da decisão recorrida e às regras da experiência, sem necessidade de reenvio do processo para novo julgamento (artigos 426.º, n.º 1 e 431.º, al. b) do Cód. de Processo Penal).
11ª Sem prescindir, apenas no caso de não proceder a argumentação acima expendida, sempre se dirá que a Mmª Juiz incorreu em erro de julgamento ao incluir na matéria de facto não provada os factos 1 e 2 referentes à intenção com que o arguido, ao proferir as expressões dadas como provadas, atuou com o propósito de ofender a honra pessoal e profissional do assistente de modo deliberado, livre e consciente.
12ª Ora, da prova produzida em audiência não é possível concluir como faz a Mmª Juiz que o arguido não quisesse insultar e ofender a pessoa do assistente.
13ª De facto, o arguido foi acusado pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelo artigo 180º, n.º 1, 182º, 183º, n.ºs 1, alínea a), n.º 2 e 184º, todos do Cód. Penal.
14ª O bem jurídico protegido por aquela incriminação é a honra, entendida como o conjunto de valores éticos de cada pessoa, tais como o carácter e a retidão, ou seja, a dignidade de cada um.
15ª Difamar significa imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, entendida aquela como o elenco de valores éticos que cada pessoa humana possui, tais como o carácter, a lealdade, a probidade, a retidão, ou seja a dignidade subjetiva, o património pessoal e interno de cada um, e esta última como sendo o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, bom- nome, o crédito, a confiança, a estima, a reputação, ou seja a dignidade objetiva, o património que cada um adquiriu ao longo da sua vida, o juízo que a sociedade faz de cada cidadão (Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 6.2.96, in CJ I, 156 e Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 25.10.2004, P. 1467/04 in dgsi.pt).
16ª Deste ponto de vista, a honra é concebida como o direito que cada cidadão tem de reclamar o respeito dos outros e a não receber deles juízos ou imputações vilipendiosos e degradantes ou, mais subjetivamente, equivale à representação psicológica que cada um tem de si próprio, ao apreço ou autoestima, a qual poderá corresponder, ou não, à consideração ou à reputação social de que goza.
17ª De acordo com a factualidade assente na douta sentença condenatória, o arguido registou uma conta de ‘facebook’ onde, no período compreendido entre 25/10/2018 e 26/11/2020, publicou os escritos constantes da acusação e da douta sentença recorrida, dos quais se destacam os seguintes:
- (…) O PRESIDENTE B (…) NÃO TEM COMPETÊNCIAS NEM CAPACIDADES PARA OS CARGOS QUE DESEMPENHAM” (facto provado 5);
- “porque o presidente B e o encarregado D não gostavam de ouvir as verdades que lhe dizia nas trombas sem nenhum problema?” (facto provado 6);
- “o presidente B é um mentiroso, racista” (facto provado 6);
- “presidente B é um ladrão” (facto provado 6);
- “AS VERDADES EM BREVE VÃO VIR AO DE CIMA SENHOR MENTIROSO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B” (facto provado 8);
- “O PRESIDENTE B É UM MENTIROSO, ALDRABÃO, LADRÃO, IGNORANTE” (facto provado 11);
- “Ai ai ai senhor MENTIROSO B nunca lhe ensinaram que se tapar a cabeça destapa os pés?” (facto provado 13);
- “CONTRA ESTE COBARDE, MENTIROSO, ALDRABÃO, DITADOR, DISCRIMINATÓRIO, RACISTA DO PRESIDENTE B A FAZER-SE DE VITIMA, DE COITADINHO, DE INCOMPREENDIDO (…) E ANDA COM O RABINHO APERTADO PELO QUE FEZ E FAZ POR ISSO É QUE NÃO TEM VINDO PARA AS REDES SOCIAIS, POIS NÃO CONVÉM E SIM B HAJA PACIÊNCIA” (facto provado 15);
- “a mando do comunista cobarde ignorante do B” (facto provado 16);
- “mais verdades e realidades sobre o cobarde, mentiroso, aldrabão, falso do presidente B.” (facto provado 18);
- “pelo cobarde, mentiroso, aldrabão, falso do presidente B.” (facto provado 19);
- “Senhor Presidente Cobarde, Mentiroso, Aldrabão, Ladrão, Falso do B” (facto provado 21);
- “Venho comunicar mais verdades e realidades vergonhosas do ignorante, hipócrita, cobarde, mentiroso, aldrabão, racista, ditador, falso do presidente B” (facto provado 24);
- “Vergonha, verdade e realidade que o presidente cobarde, aldrabão, mentiroso, ignorante, hipócrita, racista, ditador, falso B” (facto provado 25);
18ª Deste modo não se compreende como pode a Mmª Juiz afirmar que não é posta em causa a honra pessoal do assistente com os insultos acima transcritos que são escritos em tais publicações. De facto, ao apelidar o assistente de “ladrão”, “aldrabão” “mentiroso”, “racista”, “ignorante”, “hipócrita”, “cobarde”, “racista”, usando diminutivos e nem sempre fazendo referência às funções exercidas, o arguido pretendeu, como é evidente, colocar também em causa a honra pessoal daquele.
19ª No caso dos autos, a prova do elemento subjectivo do crime consubstanciada no dolo direto, decorre da verificação dos elementos objectivos descritos nos factos 1 a 26 da douta sentença sub judice.
20ª Acresce que, face ao comportamento do arguido descrito na douta sentença não é possível afirmar, como faz a Mmª Juiz, que aquele exercia apenas a sua liberdade de expressão, consagrada na ordem jurídica portuguesa pelos artigos 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e artigos 8º e 37º da Constituição da República Portuguesa (CRP).
21ª Por seu lado, a existência da lei penal decorre dos próprios princípios do Estado de Direito Democrático, da independência dos tribunais e da legalidade (artigos 2º e 3º da CRP), assim como do princípio da tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20º, n.º 5 da CRP.
22ª Decorre dos princípios ínsitos neste artigo 18º, n.º 2 da CRP que a restrição de direitos, liberdades e garantias terá de respeitar os critérios constitucionais da legalidade, necessidade (ou exigibilidade) e adequação (proporcionalidade em sentido restrito). Como vem sendo entendido, a necessidade supõe a existência de um bem juridicamente protegido.
23ª Deste ponto de vista, decorre do disposto no artigo 18º, n.º 2 da CRP o princípio da necessidade da tutela penal do qual resulta que, não basta a violação de bem jurídico-penal, uma tal violação terá de ser indispensável à livre realização da personalidade de cada um na comunidade. Decorre ainda desta norma basilar do nosso ordenamento jurídico o princípio da proibição do excesso, que impõe que o Direito Penal só possa intervir nos casos em que todos os outros meios de política social se revelem inadequados ou insuficientes.
24ª Tudo ponderado, não se olvida que a liberdade de expressão constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa. Os políticos e outras figuras públicas, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas.
25ª Sucede que, no caso dos autos, as informações publicadas pelo arguido na rede social ‘facebook’ não eram públicas e não se prendiam apenas com a atuação funcional do ofendido, já que, como acima se demonstrou, são dirigidas à própria pessoa do assistente, com o objetivo de enxovalhar a própria pessoa daquele. Acresce que, aquelas publicações são realizadas através das redes sociais pelo que, basta atender ao conteúdo das mesmas para se concluir que visam apenas destilar mensagens de insatisfação e ódio direcionadas à pessoa do ofendido e não manifestar quaisquer opiniões ou ideias que permitam informar o público em geral sobre a atuação funcional de um político.
26ª Assim sendo, a restrição operada à liberdade de expressão do arguido através da criminalização da sua conduta revela-se adequada e proporcional, respeitadora dos princípios da necessidade, adequação e proibição do excesso consagrados no artigo 18º, n.º 2 da CRP.
27ª Nestes termos, mostrando-se que esta restrição aos direitos de informar e de ser informado constitui uma proteção constitucional do direito à reserva da intimidade da vida privada e se revela respeitadora dos princípios da legalidade, necessidade e proibição do excesso, inerentes à própria necessidade de criminalização, é manifesto que a norma penal que fundamenta a condenação do arguido pode ser aplicada ao comportamento daquele.
28ª Com efeito, resultando da prova, como se expôs, que o arguido publicou escritos no ‘facebook’ contendo mensagens totalmente insultuosas e ofensivas para a honra e consideração pessoais e profissionais do assistente, não existem quaisquer dúvidas de que a conduta do arguido A integrou os elementos objetivos e subjetivos do crime de difamação agravada por que veio acusado, devendo ser condenado em conformidade.
4. O Ministério Público declarou concordar com recurso interposto pelo assistente, aderindo à respetiva fundamentação.
5. O arguido respondeu aos recursos interpostos no sentido da sua improcedência, formulando as seguintes conclusões:
«1. Foi o Arguido absolvido do Crime de Difamação agravada, previsto e punível pelos art.ºs 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º, n.ºs 1, al. a) e 2 e 184.º, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.
2. Entendeu e bem o Tribunal “a quo” que não resultou provado que o arguido sabia não corresponderem à verdade as publicações e que os juízos de valor que escreveu sobre o Presidente e que o ofendiam enquanto pessoa e que desconhecia que a sua conduta era proibida e punível por lei pena”
3. O artigo 180º n.º 1 do Código Penal restringe a Liberdade de expressão conferindo uma proteção à integridade moral, bom nome e reputação do cidadão.
4. Existe a necessidade de criar uma fronteira entre esta norma limitativa e a própria liberdade de expressão consagrada constitucionalmente pelo artigo 37º da Constituição da República Portuguesa
5. “nem tudo o que causa contrariedade, é desagradável, pouco ético, Ou que envergonha e perturba ou humilha, cabe na previsão das normas dos art.ºs 180º e 181º” - (Oliveira Mendes, O Direito à Honra e a sua Tutela Penal, p. 37).
6. “A conduta pode ser reprovável em termos éticos, profissionais ou outros, mas não o ser em termos penais.”
7. a Liberdade de expressão deverá ser vista como direito fundamental individual e como princípio conformador e essencial à manutenção e aprofundamento do Estado de Direito democrático.
8. O direito de informar, de opinião e de crítica deve ser reconhecido como fundamento do sistema democrático e alicerce de um Estado de Direito.
9. E bem andou o Tribunal “a quo” quando decidiu no sentido de entender que as publicações em causa nos autos, têm de ser entendidas como tendo sido proferidas no exercício da critica objectiva (intensa e repetitiva, é certo), sendo que o chamado direito de crítica objetiva não se descaracteriza pela verificação de pequenos desvios ou transgressões que se enquadrem no exercício da liberdade de expressão. De facto, o teor das expressões em causa inculca a ideia de que se criticou um comportamento mas não expressamente a pessoa do ofendido. Mas ainda que se possa considerar que se trata de uma crítica directamente dirigida à actuação do ofendido/assistente, é patente que a mesma se situa que ela se situa na área dos seus comportamentos estritamente profissionais/funcionais e não atinge o núcleo da dignidade pessoal do queixoso.”
10. O contrário é colocar uma mordaça nos cidadãos que queiram de forma mais ativa e mordaz criticar o poder político.
11. Numa sociedade democrática, as pessoas que exerçam cargos públicos, estão sujeitos a um controlo das pessoas que compõem a comunidade na qual exercem as suas funções.
12. Por último realça-se a condenação recente do Estado Português pelo TDH a indemnizar os Jornalistas SG e EA por terem sido indevidamente condenados por “difamar políticos”.»
5. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da procedência dos recursos, acompanhando a argumentação de ambas as motivações quanto à parte criminal:
«Também discordamos que tenham sido dados como não provados os factos respeitante ao elemento subjetivo, vertidos na matéria de facto não provada sob pontos 1. e 2.
Salienta-se que na fundamentação da sentença recorrida diz-se que o recorrido “declarou não pretender não prestar declarações, limitando-se a afirmar que não criou a página do Facebook em causa nos autos”. E “Analisando o conjunto da prova produzida à luz das regras da experiência comum, concluiu o Tribunal para além da dúvida razoável, que foi o arguido quem criou a página da rede social em causa nos autos e que fez as publicações enunciadas”.
Mas, diz-se também “A prova produzida no que respeita às publicações, tem de ser analisada atendendo ao que em concreto foi escrito e a interpretação que às mesmas pode ser dado, no contexto em que foram proferidas. E analisando as mesmas nesse contexto se concluiu no sentido de se considerar como não provado que ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões que não correspondiam à verdade e juízos de valor sobre a pessoa de B que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal, profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia que o arguido conhecia, sabendo ainda que tais comentários que visaram directamente o ofendido enquanto Presidente da Junta de Freguesia, dirigidos à comunidade de internautas, facilitando
assim a sua divulgação por inúmeras pessoas como, de facto sucedeu, bem sabendo o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei penal, nos termos e pelos fundamentos que melhor se analisarão de seguida”.
Ora, o arguido criou no Facebook a página pública, Todos contra B da Junta de Freguesia de C, do qual é administrador, aí introduziu e divulgou os textos dados como provados, cujos conteúdos são reiterada e manifestamente difamatórios, atentas as expressões usadas e aos juízos de valor que contêm. São inequivocamente ofensivos e em muito extravasam a liberdade de expressão e não constituem a mera discordância quanto a comportamentos funcionais e profissionais do assistente.
Publicações de textos, com palavras como racista, mentiroso, ladrão, aldrabão, ditador, cobarde, falso, hipócrita, amplamente divulgados entre a comunidade dos utentes do Facebook, só podiam ter como objetivo denegrir o assistente e atingi-lo na honra e dignidade não só profissional, mas também pessoal.
Importa trazer à colação o decidido no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11.12.2019, no processo nº 4695/15.2T9PRT.L1, da 9ª secção, relator Abrunhosa de Carvalho, acessível in www.dgsi, cujo sumário se transcreve:
“I- Nas ofensas à honra estão sempre em causa dois valores constitucionais de igual valor – a honra e a liberdade de expressão (art.ºs 26º e 37º da CRP ), sendo que a prevalência de um deles em cada caso tem sempre que resultar de uma ponderação das circunstâncias do caso concreto, encontrando um equilíbrio que preserve sempre a liberdade de expressão, indispensável à subsistência de uma sociedade democrática, limitada pela proibição do aniquilamento da honra.
Atendendo a que a CEDH, como todo o direito convencional de que Portugal é parte contratante, tem valor infra-constitucional, mas supra-legal, na indagação sobre se determinada conduta constitui crime contra a honra há que ter em atenção o disposto nesta convenção, interpretada pela jurisprudência do TEDH, nomeadamente a produzida a propósito do art.º 10º, Liberdade de expressão;
II- Como se sabe, a honra é um bem jurídico complexo, que inclui quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a sua manifestação exterior - reputação ou consideração -, traduzida na estima e respeito que a personalidade moral de alguém infunde aos outros e que vai sendo adquirida ao longo dos anos, probidade e lealdade de carácter, protegendo-se a honra interior inerente à pessoa enquanto portadora de valores espirituais e morais e, para além disso, a valência deles decorrente, a sua boa reputação no seio da comunidade", a qual encontra o seu "fundamento essencial" na "irrenunciável dignidade pessoal" ;
III- Nesta perspectiva, como reiteradamente vêm decidindo os nossos tribunais e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, aqueles que exercem cargos com relevância/expressão pública têm um qualificado dever de suportar as críticas inerentes à sua actividade, por muito duras - ou mesmo infundadas - que sejam. Salvo nos casos em que sejam notoriamente gratuitas ou infundadas, a eles cabe, na primeira linha, convencer do infundado das críticas, não podendo nunca subtrair-se ao debate público por via da ameaça - contra quem divulgue irregularidades no funcionamento das instituições - com o jus puniendi do Estado. Naturalmente, estes tipos de preocupações não implicam que se deva descurar a necessidade de adequada tutela do (também fundamental) direito à honra e, muito menos, o reconhecimento do direito ao insulto;
IV- Uma expressão degradante só assume o carácter de «difamação» quando nela não avulta em primeiro plano a discussão objectiva das questões mas antes o enxovalho das pessoas. Para além da crítica polémica e extremada tem de se visar o rebaixamento das pessoas. Só poderá falar-se de «difamação» quando o juízo de valor ou a crítica perdem todo o contacto com a obra, a prestação ou o problema que os motiva ou com a discussão das questões de interesse comunitário. E, em vez disso, passam a obedecer apenas ao propósito de rebaixamento de uma pessoa. Atingindo- a no sentimento de auto-estima ou ferindo-a na sua dignidade pessoal e consideração social";
V- Relativamente ao elemento subjectivo do crime de difamação a lei não exige como elemento do tipo criminal em análise qualquer dano ou lesão efectiva da honra ou da consideração, bastando, para a existência do crime, o perigo de que tal dano possa verificar-se, com efeito, tratando-se de um crime de perigo, não é necessário que o agente com o seu comportamento queira "ofender a honra ou consideração alheias, nem mesmo que se haja conformado com esse resultado, ou sequer que haja previsto o perigo (previsão da efectiva possibilidade ou probabilidade de lesão do bem jurídico da honra), bastando a consciência da genérica perigosidade da conduta ou do meio da acção previstos nas normas incriminatórias respectivas;
VI- Assim não merece censura a decisão do Tribunal “a quo“ ao entender e sustentar na sentença que, no hipotético confronto entre dois direitos fundamentais– a putativa liberdade de expressão do recorrente e direito à honra da Assistente – deveria prevalecer concretamente o direito da assistente, justamente na medida em que os comentários do Recorrente ultrapassam a crítica sustentada, objetiva e equilibrada, constituindo antes uma ofensa gratuita e desmedida que não satisfaz qualquer propósito informativo ou crítico com utilidade nem constitui qualquer exercício lícito de um direito do recorrente – tais expressões jamais poderiam ser consideradas lícitas a coberto do alegado exercício do direito à liberdade de expressão sob pena de violação do princípio da dignidade da pessoa humana – enquanto princípio regulativo primário da nossa ordem jurídica, pois para o cidadão médio as expressões “A senhora devia tomar mais banho, cheira mal!” e “Aquela jornalista com mau aspecto” são ofensivas, porque nelas “... não avulta em primeiro plano a discussão objectiva das questões mas antes o enxovalho das pessoas ...”, isto é, não correspondem a qualquer crítica ao desempenho profissional da Assistente, que era o que estava em causa, mas são meramente depreciativas da sua pessoa, pelo que são ofensivas da honra e consideração;
VII- Logo tais expressões jamais poderiam ser consideradas lícitas a coberto do alegado exercício do direito à liberdade de expressão sob pena de violação do princípio da dignidade da pessoa humana – enquanto princípio regulativo primário da nossa ordem jurídica”.»
6. Foi cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta.
7. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Delimitação do objeto do recurso
Conforme doutrina e jurisprudência sedimentada, o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (vd., por todos, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 2ª ed., Ed. Verbo, pág. 335, e Acórdão do STJ de 29.01.2015, Proc. n.º 91/14.7YFLSB.S1).
Assim, atentas as conclusões dos recorrentes, são as seguintes as questões a conhecer:
- Do erro notório na apreciação da prova quanto ao elemento subjetivo do tipo;
- Do erro de julgamento também no que respeita ao elemento subjetivo do tipo;
- Do preenchimento dos elementos objetivo e subjetivo do tipo legal de difamação agravada;
- Da escolha e medida da pena; e
- Do pedido de indemnização civil.
2. Decisão recorrida.
A sentença recorrida apresenta o seguinte teor, na parte que releva para a decisão do recurso (transcrição):
«II- FUNDAMENTAÇÃO
Matéria de facto provada
De relevante para a discussão da causa, resultou provada a seguinte matéria de facto:
1. B é Presidente da Junta de Freguesia de C, tendo sido eleito em 2013, cargo esse que exerce até à data de hoje.
2. No dia 22 de Agosto de 2018, o arguido criou a conta de Facebook acessível ao público em geral no endereço https://www.facebook.com/Todos- contra-B-presidente-da-junta-de-freguesia-de- C458092648044653/ da qual é administrador.
3. Desde então, o arguido tem efectuado várias publicações nas quais se dirige a B, enquanto Presidente de Junta de Freguesia.
4. Assim, o arguido elaborou e publicou na referida conta de facebook, que é acessível a todos os internautas, as seguintes publicações.
No corpo das referidas publicações escreveu o arguido:
5. No dia 25 de Outubro de 2018, o arguido escreveu “MAIS UMA DENUNCIA SOBRE O ENCARREGADO D DO POSTO DE LIMPEZA DE C QUE ABUSA DO PODER QUE TÊM, DISCRIMINA, AMEAÇA E FAZ OFENSAS À INTEGRIDADE FISICA AO FUNCIONARIO MC DO POSTO DE LIMPEZA DE C E DE NACIONALIDADE Angolana QUE TEM 75% DE INCAPACIDADE E QUE O ENCARREGADO D DIZ QUE VAI CORRER COM O FUNCIONÁRIO MC DA JUNTA DE FREGUESIA DE C E ISTO COM O CONHECIMENTO E CONSENTIMENTO DO PRESIDENTE B E H AMBOS DO Partido Comunista Português, RESUMINDO ESTÃO A TENTAR FAZER AO FUNCIONÁRIO MC O QUE FIZERAM COMIGO. O PRESIDENTE B, SENHORA H E ENCARREGADO D NÃO TÊM COMPETENCIAS NEM CAPACIDADES PARA OS CARGOS QUE DESEMPENHAM”.
6 Na publicação de dia 17 de Janeiro de 2019, o arguido escreveu “Verdade que o presidente B em conjunto com o coordenador I e encarregado D correram comigo da junta para pôr no meu lugar o amigo JR marido da Y do quiosque de jornais do jardim da luz onde a esposa do mesmo foi testemunha falsa que era para pôr o marido na junta e o primo do encarregado D e E onde a namorada do mesmo F também foi falsa testemunha e estes senhores são ambos do bairro da horta nova porque o presidente B e o encarregado D não gostavam de ouvir as verdades que lhe dizia nas trombas sem nenhum problema?
VERDADE
verdade que o presidente B é um mentiroso, racista, fascista, ditador, discrimina funcionários/as e favorece funcionários/as (E, F, encarregado D, G), manda o encarregado D cortar horas e sábado a quem lhe diz as verdades e ao encarregado
D nas trombas?
VERDADE
verdade que o presidente B, a senhora H, coordenador I e o PCP estão na mama da feira popular que vai ser em C e que as obras que tanto prometeu só vão ser feitas quando for próximo das eleições e se forem feitas?
VERDADE
verdade que o presidente B é um ladrão que foi condenado por roubar parquímetros da EMEL na freguesia de C se fosse eu ou outra pessoa íamos logo presos, que o encarregado D persegue e ameaça e já agrediu funcionários do posto de limpeza da junta de C, que o encarregado O foi condenado e pagou uma indemnização por agredir um funcionário que foi corrido para a câmara municipal de Lisboa como já outros funcionários que pediram transferência porque não conseguem trabalhar com o encarregado D do posto posto de limpeza de C nem com a presidência da junta de freguesia de C?
VERDADE
verdade que o presidente B só faz algo pelos militantes comunista ou quem anda a cheirar-lhe o cú, lamber-lhe as botas ou algo que lhe favoreça ou o seu partido e que vos anda a enganar à 6 anos, que continua no poleiro e ninguém têm a coragem de fazer algo, com tomates ou com H grande para correr com o mentiroso da junta de freguesia de C?
VERDADE
Verdade que digo onde está a liberdade de expressão, verdade e a justiça neste
país?
VERDADE”.
7. No dia 22 de Janeiro de 2019, o arguido escreveu “INFORMAÇÃO E VERDADE SOBRE UMA AGRESSAO DO FUNCIONARIO DO POSTO DE LIMPEZA DA JUNTA DE FREGUESIA DE C JR MARIDO DA SENHORA Y QUE FOI TESTEMUMHA FALSA PARA PÔR O MARIDO NO MEU LUGAR AO FUNCIONÁRIO MN DO POSTO DE LIMPEZA DE C, QUE FICOU MARCADO DA AGRESSÃO E A FUNCIONÁRIA DO POSTO DE LIMPEZA DE C F QUE FOI TESTEMUNHA FALSA PARA PÔR O NAMORADO E E DO MESMO POSTO NO MEU LUGAR, QUE A MESMA TENTOU MAS SEM SUCESSO FAZER A CAMA A UM FUNCIONÁRIO QUANDO O MESMO JÁ TINHA PEDIDO TRANSFERÊNCIA PARA A CAMARA MUNICIPAL DE LISBOA,DE ONDE VEIO, PORQUE O FUNCIONÁRIO NÃO QUERIA CONTINUAR A TRABALHAR NA JUNTA DE FREGUESIA DE C POR CAUSA DO PRESIDENTE B, SENHORA H, ENCARREGADO D E OS FUNCIONÁRIOS E, F E JR COMO TANTOS FUNCIONÁRIOS QUE VIERAM DA CAMARA MUNICIPAL DE LISBOA EM 2013 PARA A JUNTA DE FREGUESIA DE C E QUE QUEREM VOLTAR OU PEDEM TRANSFERÊNÇIA PARA A Câmara Municipal de Lisboa, PORQUE SERÁ. MAIS UMA DE TANTAS TRISTES SITUAÇÕES QUE SE PASSSARAM E SE PASSAM NA JUNTA DE FREGUESIA DE C.”
8. No dia 28 de Janeiro de 2019, o arguido convoca uma “manifestação pacífica” em frente da Sede do Partido Comunista Português “DIA 26 DE FEVEREIRO MANIFESTACÃO PACIFICA EM FRENTE À SEDE DO PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS RUA SOEIRO PEREIRA GOMES 3 LISBOA ONDE GRAVEI PARTE DA CONVERSA COM UM SENHOR MILITANTE COMUNISTA ONDE APONTOU AS DENUNCIAS SOBRE O QUE O PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C E ENCARREGADO D PELO QUE ME FIZERAM E CONTINUAM A FAZER A FUNCIONÁRIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DA JUNTA DE FREGUESIA DE C, ABUSO DE PODER, PERSEGUISÃO, AMEAÇAS, DISCRIINAÇÃO, RACISMO, CORTE DE HORAS EXTRAS, SÁBADOS ONDE ME IMFORMOU QUE AS DENUNCIAS IAM PARA AS ALTAS INSTÂNCIAS DO PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS. ESPERO QUE SEJA AGORA QUE SE FAÇA JUSTIÇA E AS VERDADES SEJAM REPOSTAS.NUNCA DESISTIR DE LUTAR PELA VERDADE, JUSTIÇA E PELO QUE ACREDITO. FAÇAM DOWNLOAD E PARTILHEM”.
9. No dia 18 de Fevereiro de 2019, o arguido escreveu: “AS VERDADES EM BREVE VÃO VIR AO DE CIMA SENHOR MENTIROSO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B E A SENHORA MENTIROSA H, ESTÁ POR UM FIOZINHO, QUEM CALA CONSENTE SENHOR PRESIDENTE.”
10. No dia 3 de Abril de 2019, o arguido escreveu: “MAIS DENUNCIAS VERDADEIRAS SOBRE O PRESIDENTE B E ENCARREGADO D, QUE O ENCARREGADO D VOLTOU PARA A CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA PORQUE VIU O CUZINHO APERTADO DA QUEIXA QUE FIZ NO MINISTÉRIO PÚBLICO E SABE QUE O PRESIDENTE B NÃO VAI  GANHAR AS ELEIÇÕES EM 2021, FOI PARA O POSTO DA BOAVISTA NO CAIS DO SODRÉ, ESCONDER-SE ATRÁS DAS SAIAS DOS PADRINHOS DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, FC, CB, SV, ONDE ANTES DE SAIR PARA A CÂMARA DE LISBOA ARRANJOU O TACHINHO PARA A FUNCIONÁRIA F SUBIR A ENCARREGADA SEM CONCORRER A CONCURSO PÚBLICO PARA ADMISSÃO AO CARGO, SEM QUALIFICAÇÕES NEM COMPETÊNCIAS PARA O CARGO E SEM ESCOLARIDADE OBRIGATÓRIA PARA O CARGO E A GANHAR MAIS DINHEIRO POR BAIXO DA MESA, QUE NÃO APARECE NA FOLHA DE ORDENADO, MAIS VERGONHAS, ARRANJINHOS, TACHINHOS, FAVORECIMENTOS QUANDO A JUNTA TÊM FUNCIONÁRIOS/AS COM MAIS ANOS DE CASA, COM
QUALIFICAÇÕES E COMPETÊNÇIAS PARA O CARGO.”
11. No dia 8 de Maio de 2019, o arguido escreveu: “O PRESIDENTE B JÁ DESPEDIU DA JUNTA DE FREGUESIA DE C O FUNCIONÁRIO LN QUE É SURDO MUDO MAIS DE 3 VEZES E A ÚLTIMA FOI POR PÔR O FUNCIONÁRIO LN A CONDUZIR O CARRO ELETRICO DA JUNTA DE FREGUESIA DE C SEM CARTA E ONDE O FUNCIONÁRIO FOI APANHADO PELA POLÍCIA EM FLAGRANTE DELITO ONDE FOI RESPONDER À POLÍCIA DE TRÂNSITO NA ALTA DE LISBOA E O PRESIDENTE B DESPEDIU NA ALTURA O FUNCIONÁRIO PARA SE LIVRAR COMO O COBARDE E MENTIROSO QUE É MAS CONTINUA A CHAMAR ESTE FUNCIONÁRIO LN, MAS A MIM DESPEDIU-ME INJUSTAMENTE PARA PÔR NO MEU LUGAR O FUNCIONÁRIO E E PRIMO DO ENCARREGADO D QUE VOLTOU PARA A CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA PELOS MOTIVOS QUE SÃO DE CONHECIMENTO PÚBLICO E O FUNCIONÁRIO JR AMIGO DO PRESIDENTE B E AINDA ME ROUBOU 800 EUROS DO ACORDO, MAIS UMA VEZ SE PROVA AS VERDADES E QUE O PRESIDENTE B É UM MENTIROSO, ALDRABÃO, LADRÃO, IGNORANTE QUE DEVIA DEMITIR-SE DO SEU CARGO.”
12. No dia 28 de Junho de 2019, o arguido escreveu: “MAIS UMA INDIGNAÇÃO GRAVE NA JUNTA DE FREGUESIA DE C, QUE A FUNCIONÁRIA F DO POSTO DE LIMPEZA DA JUNTA QUE SUBIU A ENCARREGADA SEM ADMISSÃO AO CARGO, SEM QUALIFICAÇÕES NEM COMPETÊNCIAS PARA O CARGO, FOI MAIS UMA DE AJUSTO DIRECTO, ABUSA DO PODER QUE TEM, TRATA MAL, PERSEGUE, AMEAÇA OS FUNCIONÁRIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DA JUNTA, RECEBE DINHEIRO POR BAIXO DA MESA, TUDO ISTO COM O CONHECIMENTO DO PRESIDENTE B E QUE É DO CONHECIMENTO PÚBLICO COMO A FUNCIONÁRIA F SUBIU A ENCARREGADA E APRENDEU BEM COM O FALSO ENCARREGADO D QUE TAMBÉM É DE CONHECIMENTO PÚBLICO PORQUE VOLTOU PARA A CAMARA MUNICIPAL DE LISBOA, QUE O FUNCIONÁRIO E E DO POSTO DE LIMPEZA DA JUNTA E MARIDO DA FUNCIONÁRIA F ESTÁ SEMPRE MUITO ALCOOLIZADO NAS HORAS DE TRABALHO, TRATA MAL E AMEAÇA FUNCIONÁRIOS/AS DA JUNTA DE FREGUESIA DE C E QUE O PRESIDENTE B TEM CONHECIMENTO E NADA FAZ PORQUE SE FOSSE OUTRO FUNCIONÁRIO/A QUE FIZESSE O MESMO OU DISSE-SE ALGO SOBRE ESTES ASSUNTOS GRAVES JÁ SE SABE O QUE ACONTECIA DA PARTE DA FUNCIONÁRIA F, FUNCIONÁRIO E E O PRESIDENTE B PORQUE AS VERDADES PARA ESTES SENHORES/RAS NUNCA CONVÊM DIZER OU OUVIR.
13. No dia 4 de Julho de 2019, o arguido escreveu: “Oh senhor MENTIROSO B explique lá também aqui à malta como conseguiu a proeza de colocar mais uma peça do seu xadrez ♟ numa posição de interesse na Freguesia de C. Ai ai ai senhor MENTIROSO B nunca lhe ensinaram que se tapar a cabeça destapa os pés?”.
14. No dia 11 de Julho de 2019, o arguido escreveu: “DENUNCIAS SOBRE O PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B, COORDENADOR I, SENHORA H TODOS DO Partido Comunista Português E DO ENCARREGADO D QUE ABUSAM DO PODER, DISCRIMINAM FUNCIONÁRIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DE C, O ENCARREGADO D CORTA HORAS EXTRAS E SABADOS A FUNCIONARIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DE C PREJUDICANDO AS VIDAS DOS MESMOS, BENEFICIA O PRIMO E FUNCIONÁRIO E E DO POSTO DE LIMPEZA DE C, A FUNCIONÁRIA F DO POSTO DE LIMPEZA DE C NAMORADA DO FUNCIONÁRIO E,ISTO TUDO COM O OVAL DOS SUPERIORES..VIM DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA ONDE ESTIVE DE 2006 A 2013 PARA A JUNTA DE C ONDE
ESTIVE ATÉ 2016, O PRESIDENTE B JUNTO COM O ENCARREGADO D DESPEDIRAM-ME POR UMA FALSA AGRESSÃO AO ENCARREGADO D, EM JUNHO DE 2016 PUSERAM - ME UM PROCESSO DISCIPLINAR POR UMA AGRESSÃO QUE NUNCA HOUVE,COMO NÃO CONSEGUIRAM PROVAR O QUE NÃO HOUVE PROPUSERAM UM ACORDO QUE ERA NÃO PODER FALAR DO MESMO E QUE TINHAM FUNCIONÁRIO A MAIS NO CANTÃO DO JARDIM DA LUZ, PAGARAM-ME UMA MISÉRIA DE INDEMNIZAÇÃO E QUE NÃO FOI O QUE ESTAVA NO ACORDO QUE ASSINEI A 31 DE OUTUBRO DE 2016 POR PRESSÃO DO PRESIDENTE B E ADVOGADO J E O PRESIDENTE DO STML L E MILITANTE DO PARTIDO COMUNISTA QUE SABIA E SABE DOS GRAVES CRIMES QUE SE PASSARAM E SE PASSAM NA JUNTA DE FREGUESIA DE C, DESTRUIRAM-ME A VIDA E DE PESSOAS PRÓXIMAS PARA POR NO MEU LUGAR EM AGOSTO DE 2016 NO POSTO DE LIMPEZA DE C O PRIMO DO ENCARREGADO D, E, ONDE A FUNCIONARIA F E NAMORADA DO FUNCIONARIO E FOI TESTEMUNHA A FAVOR DO ENCARREGADO D E O AMIGO DO PRESIDENTE B, O FUNCIONÁRIO M ONDE A ESPOSA DO SENHOR M FOI TESTEMUNHA A FAVOR DO ENCARREGADO D. AGRESSÃO EM 2014 DO ENCARREGADO D AO FUNCIONÁRIO CC DO NO ALMOÇO DE REIS NO PAVILHÃO NO BAIRRO PADRE CRUZ. AGRESSÃO EM 2015 DO ENCARREGADO D AO FUNCIONARIO N DO POSTO DE LIMPEZA DE C NO JARDIM DA LUZ E QUE TÊM 75 POR CENTRO DE INCAPACIDADE. AGRESSÃO EM 2014 DO ENCARREGADO O AO EX FUNCIONÁRIO P QUE TINHA VINDO DA CÂMARA DE LISBOA PARA ONDE VOLTOU EM QUE O ENCARREGADO O FOI CONDENADO A 1 ANO DE PENA SUSPENSA E A PAGAR UMA INDEMNIZAÇÃO ONDE O PRESIDENTE B TRANSFERE O EX FUNCIONÁRIO P PARA A CÂMARA DE LISBOA. AGRESSÃO EM 2015 DA EX FUNCIONÁRIA Q QUE ATUALMENTE ESTA NA JUNTA DE FREGUESIA DO LUMIAR Á FUNCIONARIA R NA CASA DE BANHO DO POSTO DE LIMPEZA DE C E FOI FEITA UMA QUEIXA CRIME NA ESQUADRA DA PSP DO BAIRRO DA HORTA NOVA EM QUE O PRESIDENTE B NADA FEZ. O EX FUNCIONÁRIO S QUE TINHA VINDO DA CÂMARA DE LISBOA PARA ONDE VOLTOU EM 2018 TRANSMITIU AO PRESIDENTE B QUE NÃO SE SENTIA BEM NA JUNTA DE C NEM NO POSTO DE LIMPEZA DE C E QUE QUERIA VOLTAR PARA A CÂMARA DE LISBOA, O EX FUNCIONÁRIO T TAMBÉM PEDIU TRANSFERÊNCIA EM 2019 PARA A CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA PORQUE NÃO QUERIA CONTINUAR NA JUNTA POR CAUSA DO PRESIDENTE B, ENCARREGADO D E PARA BOM ENTENDEDOR MEIA PALAVRA BASTA. HÁ PROVAS E TESTEMUNHAS E SE PROVA QUE O PRESIDENTE B, CORDENADOR I, SENHORA H E ENCARREGADO D NÃO TEM COMPETÊNCIAS.
15. No dia 7 de Agosto de 2019, o arguido escreveu: “ESTÃO A RESULTAR TODAS AS QUEIXAS E DENÚNCIAS VERDADEIRAS FEITAS CONTRA ESTE COBARDE, MENTIROSO, ALDRABÃO, DITADOR, DISCRIMINATÓRIO, RACISTA DO PRESIDENTE B A FAZER-SE DE VITIMA, DE COITADINHO, DE INCOMPREÊNDIDO QUANDO SABE QUE NÃO PODE ESTAR NO DIA DE ELEIÇÕES A VER QUEM VOTA OU NÃO VOTA PORQUE JÁ FEZ O MESMO EM 2017 E ANDA COM O RABINHO APERTADO PELO QUE FEZ E FAZ POR ISSO É QUE NÃO TEM VINDO PARA AS REDES SOCIAIS, POIS NÃO CONVÉM E SIM B HAJA PACIÊNCIA PARA CERTOS FUNCIONÁRIOS E MORADORES NA FREGUESIA DE C ESTAREM A LEVAR CONSIGO E COM O SEU PARTIDO DE COBARDES, COMUDISTAS, RACISTAS, ALDRABÕES, MENTIROSOS, DITADORES.”
16. No dia 21 de Agosto de 2019, o arguido escreveu: “Os chibos/as cobardes ignorantes, os chibos/as comunistas cobardes ignorantes a mando do comunista cobarde ignorante do B que só vão espiar à noite que é para ver se a página foi bloqueada ou eliminada mas podem continuar a tentar, só gentinha reles e eu vou continuar aqui com mais força sempre a lutar contra tudo e contra todos sem medos ou receios. U”.
17. No dia 28 de Agosto de 2019, o arguido escreveu: “O COBARDE, MENTIROSO, ALDRABÃO DO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B E A SUA DIRECÇÃO COMUNISTA A ABUSAREM DO PODER QUE TÊM, A MENTIREM, A DESPREZAREM, A GOZAREM COM OS MIÚDOS, AS CRIANÇAS, LOGISTAS E MORADORES DO BAIRRO HORTA NOVA E SE PROVA MAIS VERDADES SOBRE A MÁ GESTÃO DO PRESIDENTE B E A DIRECÇÃO COMUNISTA”.
18. No dia 1 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “Mais uma vergonha de pura discriminação, desprezo, ilusão, gozo com os miúdos, as crianças do bairro da horta nova, uns são filhos outros enteados mais verdades e realidades sobre o cobarde, mentiroso, aldrabão, falso do presidente B.”
19. No dia 5 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “O Presidente Ditador Da Junta De Freguesia De C e Do PCP B Que Gere a Junta Com Ditadura, Mentiras, Ameaças, Abuso De Poder, Racismo, Discriminação, Falsidade”.
20. No dia 9 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “A verdade e a realidade vergonhosa que uns são filhos outros são enteados em que as crianças, os miúdos do Bairro Horta Nova são desprezados, discriminados, gozados, iludidos pelo cobarde, mentiroso, aldrabão, falso do presidente B.”
21. No dia 16 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “Perguntar Onde Está O Dinheiro Para O Polidesportivo, Parque Infantil, Hortas Comunitárias Ao
Senhor Presidente Cobarde, Mentiroso, Aldrabão, Ladrão, Falso Do B E Ao Senhor V Ambos Comunistas Do PCP E Se Não Tem Vergonha Do Que Estão A Fazer Aos Miúdos, Crianças Do Bairro Horta Nova.”.
22. No dia 17 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: ”Esta Publicação Verdadeira Foi O Que O Presidente B E Os Comunistas Me Fizeram E Ainda Fazem A Funcionários Da Junta De Freguesia De C DENUNCIAS SOBRE O PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B, CORDENADOR I, SENHORA H TODOS DO Partido Comunista Português E DO ENCARREGADO D QUE ABUSAM DO PODER, DISCRIMINAM FUNCIONARIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DE C,O ENCARREGADO D CORTA HORAS EXTRAS E SABADOS A FUNCIONARIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DE C PREJUDICANDO AS VIDAS DOS MESMOS, BENIFICIA O PRIMO E FUNCIONARIO E DO POSTO DE LIMPEZA DE C, A FUNCIONÁRIA F DO POSTO DE LIMPEZA DE C NAMORADA DO FUNCIONARIO E, ISTO TUDO COM O AVAL DOS SUPERIORES. VIM DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA ONDE ESTIVE DE 2006 A 2013 PARA A JUNTA DE C ONDE
ESTIVE ATÉ 2016, O PRESIDENTE B JUNTO COM O ENCARREGADO D DESPEDIRAM-ME POR UMA FALSA AGRESSAO AO ENCARREGADO D, EM JUNHO DE 2016 PUSERAM-ME UM PROCESSO DISCIPLINAR POR UMA AGRESSAO QUE NUNCA HOUVE, COMO NÃO CONSEGUIRAM PROVAR O QUE NÃO HOUVE PROPUSERAM UM ACORDO QUE ERA NÃO PODER FALAR DO MESMO E QUE TINHAM FUNCIONÁRIO A MAIS NO CANTÃO DO JARDIM DA LUZ, PAGARAM-ME UMA MISERIA DE INDEMINIZAÇÃO E QUE NÃO FOI O QUE ESTAVA NO ACORDO QUE ASSINEI A 31 DE OUTUBRO DE 2016 POR PRESSÃO DO PRESIDENTE B E ADVOGADO J E O PRESIDENTE DO STML L E MILITANTE DO PARTIDO COMUNISTA QUE SABIA E SABE DOS GRAVES CRIMES QUE SE PASSARAM E SE PASSAM NA JUNTA DE FREGUESIA DE C, DESTRUIRAM-ME A VIDA E DE PESSOAS PRÓXIMAS PARA POR NO MEU LUGAR EM AGOSTO DE 2016 NO POSTO DE LIMPEZA DE C O PRIMO DO ENCARREGADO D, E, ONDE A FUNCIONÁRIA F E NAMORADA DO FUNCIONARIO E FOI TESTEMUMHA A FAVOR DO ENCARREGADO D E O AMIGO DO PRESIDENTE B, O FUNCIONÁRIO M ONDE A ESPOSA DO SENHOR M FOI TESTEMUNHA A FAVOR DO ENCARREGADO D. AGRESSÃO EM 2014 DO ENCARREGADO D AO FUNCIONÁRIO CC DO NO ALMOÇO DE REIS NO PAVILHÃO NO BAIRRO PADRE CRUZ. AGRESSÃO EM 2015 DO ENCARREGADO D AO FUNCIONÁRIO N DO POSTO DE LIMPEZA DE C NO JARDIM DA LUZ E QUE TÊM 75 POR CENTRO DE INCAPACIDADE. AGRESSÃO EM 2014 DO ENCARREGADO O AO EX FUNCIONÁRIO P QUE TINHA VINDO DA CÂMARA DE LISBOA PARA ONDE VOLTOU EM QUE O ENCARREGADO O FOI CONDENADO A 1 ANO DE PENA SUSPENSA E A PAGAR UMA INDEMINIZAÇÃO ONDE O PRESIDENTE B TRANSFERE O EX FUNCIONÁRIO P PARA A CÂMARA DE LISBOA. AGRESSÃO EM 2015 DA EX FUNCIONÁRIA Q QUE ATUALMENTE ESTÁ NA JUNTA DE FREGUESIA DO LUMIAR À FUCIONARIA R NA CASA DE BANHO DO POSTO DE LIMPEZA DE C E FOI FEITA UMA QUEIXA CRIME NA ESQUADRA DA PSP DO BAIRRO DA HORTA NOVA EM QUE O PRESIDENTE B NADA FEZ. O EX FUNCIONARIO S QUE TINHA VINDO DA CÂMARA DE LISBOA PARA ONDE VOLTOU EM 2018 TRANSMITIU AO PRESIDENTE B QUE NÃO SE SENTIA BEM NA JUNTA DE C NEM NO POSTO DE LIMPEZA DE C E QUE QUERIA VOLTAR PARA A CÂMARA DE LISBOA, O EX FUNCIONÁRIO T TAMBÉM PEDIU TRANSFERÊNCIA EM 2019 PARA A CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA PORQUE NÃO QUERIA CONTINUAR NA JUNTA POR CAUSA DO PRESIDENTE B, ENCARREGADO D E PARA BOM ENTENDEDOR MEIA PALAVRA BASTA. HÁ PROVAS E TESTEMUNHAS E SE PROVA QUE O PRESIDENTE B, CORDENADOR I, SENHORA H E ENCARREGADO D NAO TEM COMPETENCIAS NEM CAPACIDADES PARA OS CARGOS QUE DESEMPENHAM.
23. No dia 18 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “Vim comunicar que percebi a verdadeira e única razão porque os comunistas B, I, H, V querem tanto estar no poder na junta de freguesia de C já que o comunismo não consegue em muitas câmaras municipais e juntas de freguesia como se viu e têm se visto desde 2017 e para os moradores de C perceberem a verdade, que o esquema, o teatrinho, o arranjinho está montado porque o presidente B sabe que não vai ganhar em 2021 por tudo o mal que fez, continua a fazer e que é público e verdadeiro e para os comunistas continuarem na junta de freguesia de C para fazerem o que querem e bem entendem quem vai concorrer em 2021 é o senhor V seja independente ou pelo PCP para que o comunismo reine na junta de freguesia de C e terem poder para ficarem a governar anos e anos na junta para esconder o que fizeram e não querem que descubram, Feira popular que é para encherem bem os bolsos como já enchem e dizerem que fizeram algo, fazerem algo quando estamos perto das eleições e se fizerem, para os dão graxa e os tachinhos para terem algo porque só assim são alguém porque quem cala consente senhor presidente.”
24. No dia 20 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “Venho comunicar mais verdades e realidades vergonhosas do ignorante, hipócrita, cobarde, mentiroso, aldrabão, racista, ditador, falso do presidente B e a direcção comunista que funcionários da câmara municipal de lisboa que foram em 2013 para a Junta de freguesia de C houve 7 funcionários que de 2015 a 2019 muito insatisfeitos, cansados e saturados psicologicamente, discriminados, agredidos, ameaçados voltaram para a câmara municipal de lisboa e isso se deve à muita má gestão feita pelo presidente B e os comunistas na junta de freguesia de C como é publico e verdadeiro. Quem cala consente senhor presidente”.
25. No dia 24 de Setembro de 2019, o arguido escreveu: “Vergonha, verdade e realidade que o presidente cobarde, aldrabão, mentiroso, ignorante, hipócrita, racista, ditador, falso B do PCP fez promessas, mentiu, iludiu os moradores do Bairro Horta Nova com as novas hortas comunitárias mas o que fez foi destruir as hortas, destruir o sustento de seres humanos, deixar um rasto de destruição a céu aberto com ratos, ratazanas, cobras, pulgas, carraças e outros bichos que podem provocar doenças graves ou mesmo o falecimento para as crianças, miúdos, idosos, adultos, animais do bairro da horta nova e da freguesia de C, quem cala consente senhor presidente e PCP.”
26. No dia 26 de Novembro de 2020, o arguido escreveu: “Senhores aldrabões, mentirosos, cobardes, cínicos, falsos da direcção comuna da junta de freguesia de C quantas foram os chamados beneficiados, amigos e conhecidos do presidente que tiveram direito porque andam sempre a engraxá-lo e a lamber-lhe as botas enquanto há famílias a passar muitas mais dificuldades que não tem direito a nada porque não andam a dar-lhe graxa ou a lamber-lhe as botas, porque quem cala consente senhor presidente”.
Mas se provou que:
27. O arguido trabalha como empregado de balcão em part-time recebendo uma indemnização de montante equivalente a metade da remuneração mínima mensal garantida.
28. Vive com a companheira e com a mãe desta.
29. A sua companheira é empregada de balcão e aufere a remuneração mínima mensal garantida.
30. Ao nível de habilitações literárias concluiu o 6º ano da escolaridade.
31. Do certificado do registo criminal do arguido nada consta.
Matéria de facto não provada
1. Ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões que não correspondiam à verdade e juízos de valor sobre a pessoa de B que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal, profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia que o arguido conhecia, sabendo ainda que tais comentários que visaram directamente o ofendido enquanto Presidente da Junta de Freguesia, dirigidos à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas como, de facto sucedeu.
2. Bem sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei penal.
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Consigna-se que não se fez constar dos factos assentes e não assentes factos conclusivos, bem como matéria irrelevante para a boa decisão da causa ou meramente instrumental para a mesma, em face da prova produzida em sede de audiência de julgamento.
Fundamentação da matéria de facto
O Tribunal formou a sua convicção na ponderação, à luz das regras da experiência comum e na livre convicção do julgador, da análise crítica e conjugada do conjunto da prova produzida, nos termos do disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
A livre apreciação da prova não se confunde com apreciação arbitrária da prova, pois que tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios de experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica.
O arguido declarou não pretender prestar declarações limitando-se a afirmar que não criou a página de facebook em causa nos autos.
O assistente prestou declarações de forma objectiva e esclarecedora dizendo que conhece o arguido porque aquele foi trabalhador da junta de freguesia de que é presidente e que em 2016 foi rescindido, por mútuo acordo, o contrato de trabalho que aquele tinha com esta entidade.
Mais relatou o teor das publicações de que teve conhecimento, em consonância com o que da acusação consta, dizendo que em várias situações designadamente em vídeos que eram publicados na página da rede social em causa nos autos, aparecia o arguido a falar. Confrontado com as impressões das publicações que estão juntas aos autos, confirmou o seu teor dizendo que eram as publicações cuja autoria imputa ao arguido e a que o assistente se referiu no decurso das suas declarações.
Referiu o seu estado de espírito e os sentimentos vivenciados com estas publicações, não revendo a sua actuação no teor das mesmas.
Testemunhas X, Y que na data da prática dos factos faziam parte do executivo da Junta de freguesia de que o assistente é presidente, relataram as circunstâncias em que tiveram conhecimento e viram as publicações em causa nos autos. Esta última testemunha referiu que dos comentários às publicações, era-se direcionado a links de páginas pessoais do ora arguido e havia publicações que se repetiam na página pessoal deste.
Z e G, que têm ligações com a Junta de freguesia, conheciam o arguido de ter sido ali funcionário. Esta última testemunha disse que o teor das publicações também versava sobre situações concretas que se tinham passado com o arguido e que sobre elas escrevia, sendo que da página constavam os contactos do arguido, pelo que para si não tinha dúvidas que era o arguido que fazia as publicações na mesma.
Os sentimentos vivenciados pelo assistente foram relatados pelo próprio e pelas demais testemunhas que prestaram o seu depoimento.
Analisando o conjunto da prova produzida à luz das regras da experiência comum, concluiu o Tribunal para além da dúvida razoável, que foi o arguido quem criou a página da rede social em causa nos autos e que fez as publicações
enunciadas.
Na prova apresentada sob a forma digital numa das sessões da audiência de julgamento, pode ser vista a página da rede social Facebook do arguido, onde constam várias fotografias em que é retarda a pessoa do arguido, e na qual constam algumas das publicações em causa nos presentes autos e em que são assinaladas as questões que estão em causa nestas publicações.
Num outro ficheiro pode ver-se um filme em que o arguido se filma a falar sobre o teor de uma das publicações em causa nos presentes autos (em concreto do dia 28 de Janeiro de 2019).
Do teor de fls. 64 a 66, constam os dados relativos à identificação do administrador do perfil.
Do conjunto da prova produzida, dúvidas não se suscitam ao Tribunal de que as publicações efectuadas na página em causa, são da autoria do arguido.
A prova produzida no que respeita às publicações, tem de ser analisada atendendo ao que em concreto foi escrito e a interpretação que às mesmas pode ser dado, no contexto em que foram proferidas. E analisando as mesmas nesse contexto se concluiu no sentido de se considerar como não provado que ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões que não correspondiam à verdade e juízos de valor sobre a pessoa de B que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal, profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia que o arguido conhecia, sabendo ainda que tais comentários que visaram directamente o ofendido enquanto Presidente da Junta de Freguesia, dirigidos à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas como, de facto sucedeu, bem sabendo o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei penal, nos termos e pelos fundamentos que melhor se analisarão de seguida.
No que respeita à situação pessoal do arguido teve o Tribunal em conta o que por aquele foi declarado.
No que respeita à inexistência de antecedentes criminais, teve-se em conta o teor do certificado do registo criminal junto aos autos.

III- DO DIREITO
Ao arguido é imputada a prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos art.ºs 180.º n.º 1, 182.º, 183.º n.ºs 1, al. a) e 2 e 184.º, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.
Quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo, é punido com pena de
prisão até 6 meses ou com pena de multa até 240 dias (art.º 180º nº 1 do Código
Penal).
O art.º 26º nº 1 da Constituição da República Portuguesa consagra o direito ao bom nome e reputação entre os vários direitos de personalidade, que representa um lado individual (o bom nome) e um lado social (a reputação), cujo conteúdo é constituído basicamente pela pretensão de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros, ou seja, a pretensão de não ser vilipendiado ou depreciado no seu valor aos olhos da comunidade, independentemente do reconhecimento real ou merecido de que uma pessoa goza ou deve gozar (vd Augusto Silva Dias, ob. e loc. cít.) - citado por Ac do TRE de 23-01-2018 relatado pelo Exmo. Sr. Desembargador António João Latas in www.dgsi.pt).
O artigo 37º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe "Liberdade de expressão e informação", dispõe nos seguintes ternos:
1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.
2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
3. As infracções cometidas no exercício destes direitos ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal ou do ilícito de mera ordenação social, sendo a sua apreciação respectivamente da competência dos tribunais judiciais ou de entidade administrativa independente, nos termos da lei.
4. A todas as pessoas, singulares ou colectivas, é assegurado, em condições de igualdade e eficácia, o direito de resposta e de rectificação, bem como o direito a indemnização pelos danos sofridos ".
A liberdade de expressão e opinião está igualmente consagrada no artigo 190.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de Dezembro de 1948 (publicada no DR. I série, de 9 de Março de 1978), no artigo 190 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, assinado em Nova York em 7 de Outubro de 1977 (aprovado, para ratificação, pela Lei na 29178, de 12 de Junho) e no artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aprovada para ratificação pela Lei n° 65/78, de 13 de Outubro (em vigor na ordem jurídica portuguesa desde 09 de Novembro de 1978, data do depósito do instrumento de ratificação junto do Secretário-Geral do Conselho da Europa).
Mas o direito de expressão não pode ser encarado como um direito absoluto, que prevalece em qualquer circunstância, podendo por vezes sofrer restrições que se justificam pela necessidade de se conjugar ou compatibilizar com outros direitos ou bens com expressão no texto constitucional. Segundo os acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 81/84 (publicado no Diário da República, II Série, n." 26, de 31 de Janeiro de 1985, p. 1025) e n." 384/03 (inwww.tribunalconstitucional.pt). "a liberdade de expressão [...] não é um direito absoluto nem ilimitado" e, não obstante o artigo 37°, n. ° 2, da Constituição proibir toda a forma de censura, "é lícito reprimir os abusos da liberdade de expressão".
A Convenção Europeia dos Direitos do Homem pressupõe a tutela do direito à honra no n.º 2 do seu artigo 10.º, ao estabelecer os limites da liberdade de expressão e informação. Estabelece esta norma que: "O exercício destas liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades. condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e da prevenção do crime. A protecção da saúde e da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e imparcialidade do Poder Judicial".
O artigo 180º n.º 1 do Código Penal traduz uma medida restritiva da liberdade de expressão, conferindo tutela penal ao direito do cidadão à sua integridade moral e aos seus bom nome e reputação, ao estabelecer que comete o crime de difamação quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo".
Difamar e injuriar mais não é basicamente que imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, entendida aquela como o elenco de valores éticos que cada pessoa humana possui, tais como o carácter, a lealdade, a probidade, a rectidão, ou seja a dignidade subjectiva, o património pessoal e interno de cada um, e esta última como sendo o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, bom-nome, o crédito, a confiança, a estima, a reputação, ou seja a dignidade objectiva, o património que cada um adquiriu ao longo da sua vida, o juízo que a sociedade faz de cada cidadão, em suma a opinião publica (Ac. do TRL de 6-2-96, CJ, I, 156, citado in Ac. do TRG de 25-10-2004 relatado pela Exma. Sra. Desembargadora Nazaré Saraiva, consultado in www.dgsipt).
A honra é entendida no ordenamento jurídico-penal português, como um bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior.
Como refere Faria Costa, in "Comentário Conimbricense do Código Penal", Tomo I, para aferir se as palavras proferidas são ou não ofensivas da honra e consideração de uma pessoa, há que atender ao contexto situacional, pese embora, existam palavras cujo sentido primeiro e último seja tido, por toda a comunidade falante, como ofensivo da honra e consideração e que exprimem e carregam consigo um indesmentível desvalor, objectivamente ofensivo.
O bem jurídico protegido com a incriminação é a honra (que respeita mais a um juízo de si sobre si) e a consideração (que se reporta prevalentemente ao juízo dos outros sobre alguém) de uma pessoa.
Quanto ao elemento subjectivo do tipo, traduz-se na vontade livre de praticar o acto com a consciência de que as expressões utilizadas ofendem a honra e consideração alheias, ou pelo menos são aptas a causar aquela ofensa, e que tal
acto é proibido por lei.
Quanto ao elemento objectivo, há duas modalidades do comportamento que integram, a igual título, o tipo: o comportamento do agente pode traduzir-se na imputação de um facto ou na formulação de um juízo.
Se é certo que o nosso Código Penal adopta uma concepção normativo-pessoal de honra em que esta é vista como bem jurídico complexo que abrange quer o valor interior ou subjectivo de cada indivíduo, quer a sua reputação ou consideração exterior, não se discute igualmente o carácter fragmentário ou de última ratio do direito penal, sendo ainda verdade para o nosso ordenamento jurídico-penal que nos art.ºs 180º e 181º do C. Penal tutela a dignidade e o bom nome do visado e não a sua especial susceptibilidade e melindre (Ac. do TRE de 23- 01-2018 relato pelo Exmo. Sr Desembargador António João Latas, in www.dgsi.pt cuja fundamentação se seguirá muito de perto por se aderir aos seus fundamentos).
Assim, impõe-se levar devidamente em conta logo ao nível do preenchimento do tipo de ilícito que o direito penal tutela apenas os valores essenciais e fundamentais da vida em sociedade, obedecendo a um princípio de intervenção mínima, bem como de proporcionalidade imanente ao Estado de Direito, e que nem tudo o que causa contrariedade, é desagradável, pouco ético, ou que envergonha e perturba ou humilha, cabe na previsão das normas dos art.ºs 180º e 181º - sublinhado nosso (Oliveira Mendes, O Direito à Honra e a sua Tutela Penal, p. 37).
Também se vem entendendo que nem todo o facto ou juízo que envergonha e perturba ou humilha, cabem na previsão do art.º 180.º do Código Penal. A conduta pode ser reprovável em termos éticos, profissionais ou outros, mas não o ser em termos penais.
Existem margens de tolerância conferidas pela liberdade de expressão, que compreende não só a liberdade de pensamento, como a liberdade de exteriorização de opiniões e juízos. É o que decorre do art.º 37.º n.º1 da Constituição da República Portuguesa, quando preceitua que «todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem descriminações.» (AC do TRP de 26-3-2014, relatado pela Exma. Sr.ª Eduarda Lobo, consultado in www.dgsi.pt).
Como se decidiu no Ac do TRC de 02-03-2005, relatado pelo Exmo. Sr. Desembargador Oliveira Mendes, in www.dgsi.pt "devem-se considerar atípicos os juízos de apreciação e de valoração crítica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, etc., ou sobre prestações conseguidas nos domínios do desporto e do espectáculo, quando não se ultrapassa o âmbito da crítica objectiva, isto é, enquanto a valoração e censura críticas se atêm exclusivamente às obras, às realizações ou prestações em si, não se dirigindo directamente à pessoa dos seus autores ou criadores, posto que não atingem a honra pessoal do cientista, do artista ou desportista, etc., nem atingem a honra com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica.
E no Ac do STJ de 07-03-2007 relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Oliveira Mendes, in www.dsgi.pt decidiu-se que no conflito entre o direito à honra e a liberdade de expressão, tem vindo a verificar-se um ponto de viragem, tendo por base e fundamento o relevo, a dignidade e a dimensão da liberdade de expressão considerada numa dupla dimensão, concretamente como direito fundamental individual e como princípio conformador e essencial à manutenção e aprofundamento do Estado de Direito democrático, reconhecendo-se que o exercido do direito de expressão, designadamente enquanto direito de informar, de opinião e de crítica, constitui o próprio fundamento do sistema democrático, o que justifica a assunção de uma nova perspectiva na resolução do conflito. Neste contexto, temos vindo a defender, na esteira da orientação assumida por Costa Andrade, deverem considerar-se atípicos os juízos de apreciação e de valoração critica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, etc., ou sobre prestações conseguidas nos domínios do desporto e do espectáculo, quando não se ultrapassa o âmbito da crítica objectiva, isto é, enquanto a valoração e censura criticas se atêm exclusivamente às obras, às realizações ou prestações em si, não se dirigindo directamente à pessoa dos seus autores ou criadores, posto que não atingem a honra pessoal do cientista, do artista, do desportista, do profissional
em geral, nem atingem a honra com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica.
Costa Andrade in Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, Coimbra Editora - 1996, considera que a atipicidade da critica objectiva não depende do acerto, da adequação material ou da "verdade" das apreciações subscritas, as quais persistirão como actos atípicos seja qual for o seu bem fundado ou justeza material, para além de que o correlativo direito de critica, com este sentido e alcance, não conhece limites quanto ao teor, à carga depreciativa e mesmo à violência das expressões utilizadas, isto é, não exige do crítico, para tornar claro o seu ponto de vista, o meio menos gravoso, nem o cumprimento das exigências da proporcionalidade e da necessidade objectiva.
E Costa Andrade defende mesmo que se devem considerar atípicos os juízos que, como reflexo necessário da crítica objectiva, acabam por atingir a honra do
visado, desde que a valoração critica seja adequada aos pertinentes dados de facto, esclarecendo, no entanto, que se deve excluir a atipicidade relativamente a criticas caluniosas, bem como a outros juízos exclusivamente motivados pelo propósito de rebaixar e humilhar e, bem assim, em todas as situações em que os juízos negativos sobre o visado não têm nenhuma conexão com a matéria em discussão, consignando expressamente que uma coisa é criticar a obra, outra muito distinta é agredir pessoalmente o autor, dar expressão a uma desconsideração dirigida à sua pessoa.
Parte da jurisprudência dos nossos Tribunais superiores vem sufragando tal orientação, sendo que, de acordo com a mesma, entendemos que o direito de expressão, na sua vertente de direito de opinião e de critica, quando se exerça e
recaia nas concretas áreas atrás referidas e com o conteúdo e âmbito mencionados, caso redunde em ofensa à honra, se pode e deve ter por atípico, desde que o agente não incorra na crítica caluniosa ou na formulação de juízos de valor aos quais subjaz o exclusivo propósito de rebaixar e de humilhar.
Como tal, o preenchimento dos tipos legais de difamação e injúria apenas se verifica quando as palavras, devam considerar-se lesivas da honra ou consideração do visado, nas circunstâncias concretas em que foram proferidas, ou seja, as palavras referidas ou dirigidas a outra pessoa só serão típicas se, sendo depreciativas, puder concluir-se que nas circunstâncias concretas em que foram dirigidas ao visado as mesmas violaram o direito de cada um ao reconhecimento da sua dignidade por parte dos outros, ou seja a pretensão de não ser vilipendiado ou depreciado no seu valor aos olhos da comunidade (AC TRE de 23-01-2018 supra citado).
Ainda neste aresto se conclui que o art.º 180º do C. Penal deve ser interpretado de modo a que o direito à liberdade expressão consagrado genericamente no art.º 37º da CRP não seja subvalorizado e sacrificado mesmo quando a conduta potencialmente lesiva apenas pode violar a honra do visado em pequena medida ou de modo insignificante, nomeadamente quando do contexto respectivo sobressai o exercício do direito de critica objectiva apontado ao desempenho funcional, profissional, (sublinhado nosso) como se verifica no caso presente, tal como não pode ser lido como permitindo o sacrifício do direito à honra em nome da liberdade de expressão, por mais desproporcional e lesiva que se apresente a violação daquela.
Tendo em conta os considerandos de ordem geral supra enunciados, no caso sub judicie, o teor das publicações em causa nos autos, têm de ser entendidas como tendo sido proferidas no exercício da critica objectiva (intensa e repetitiva, é certo), sendo que o chamado direito de crítica objetiva não se descaracteriza pela verificação de pequenos desvios ou transgressões que se enquadrem no exercício da liberdade de expressão.
De facto, o teor das expressões em causa inculca a ideia de que se criticou um comportamento mas não expressamente a pessoa do ofendido. Mas ainda que se possa considerar que se trata de uma crítica directamente dirigida à actuação do ofendido/assistente, é patente que a mesma se situa que ela se situa na área dos seus comportamentos estritamente profissionais/funcionais e não atinge o núcleo da dignidade pessoal do queixoso.
Como resulta da matéria de facto provada, no dia 22 de Agosto de 2018, o arguido criou a conta de facebook acessível ao público em geral no endereço https://www.facebook.com/Todos-contra-B-presidente-da-junta-e-freguesia-de-C458092648044653/ da qual é administrador. Desde então, o arguido tem efectuado várias publicações nas quais se dirige a B, enquanto Presidente de Junta de Freguesia.
E isto porque importa ter em conta as circunstâncias concretas em que foram escritas ou proferidas as palavras susceptíveis de preencher os elementos objectivos do tipo legal de difamação e/ou injúria.
Veja-se, a título de exemplo que na publicação de dia 25 de Outubro de 2018, em que o arguido comenta a alegada actuação de um funcionário da junta de freguesia de que o assistente é presidente, diz que o faz “(…) com o CONHECIMENTO E CONSENTIMENTO DO PRESIDENTE B (…) DO Partido Comunista Português, (…). O PRESIDENTE B, (…) NAO TEM COMPETENCIAS NEM CAPACIDADES PARA OS CARGOS QUE DESEMPENHAM”.
E na publicação de 8 de Maio de 2019 PRESIDENTE B JÁ DESPEDIU DA JUNTA DE FREGUESIA DE C O FUNCIONÁRIO LN QUE É SURDO MUDO MAIS DE 3 VEZES (…) E O PRESIDENTE B DESPEDIU NA ALTURA O FUNCIONÁRIO PARA SE LIVRAR COMO O COBARDE E MENTIROSO QUE É (…) PRESIDENTE B É UM MENTIROSO, ALDRABÃO, LADRÃO, IGNORANTE QUE DEVIA DEMITIR-SE DO SEU CARGO.”
E na publicação de 4 de Julho de 2019 escreveu Oh senhor MENTIROSO B explique lá também aqui à malta como conseguiu a proeza de
colocar mais uma peça do seu xadrez ♟ numa posição de interesse na Freguesia de C. (…)
E na publicação de 28 de Agosto de 2019, escreveu “O COBARDE, MENTIROSO, ALDRABÃO DO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B E A SUA DIRECÇÃO COMUNISTA A ABUSAREM DO PODER QUE TÊM, A MENTIREM, A DESPREZAREM, A GOZAREM COM OS MIÚDOS, AS CRIANÇAS, LOGISTAS E MORADORES DO BAIRRO HORTA NOVA E SE PROVA MAIS VERDADES SOBRE A MÁ GESTÃO DO PRESIDENTE B E A DIRECÇÃO COMUNISTA”.
E ainda na publicação de 24 de Setembro de 2019 escreveu “Vergonha, verdade e realidade que o presidente cobarde, aldrabão, mentiroso, ignorante, hipócrita, racista, ditador, falso B do PCP fez promessas, mentiu, iludiu os moradores do Bairro Horta Nova com as novas hortas comunitárias mas o que fez foi destruir as hortas, destruir o sustento de seres humanos, deixar um rasto de destruição a céu aberto com ratos, ratazanas, cobras, pulgas, carraças e outros bichos que podem provocar doenças graves ou mesmo o falecimento para as crianças, miúdos, idosos, adultos, animais do bairro da horta nova e da freguesia de C, quem cala consente senhor presidente e PCP.”
Resulta do teor das publicações em causa nos autos que há uma crítica que incide sobre a actuação profissional do ora assistente no âmbito das suas funções num cargo que é de natureza política.
Crítica esta, indelicada, acintosa, repetitiva, mas relativa à sua actuação enquanto presidente da junta de freguesia, logo a uma posição política, mas não à pessoa em si do ora assistente.
Ainda que algumas das expressões se possam considerar objectivamente insultuosas, as mesmas reportam-se à actuação profissional do ora assistente.
E numa sociedade democrática, aqueles que exercem cargos públicos, como é o caso do ora assistente, estão sujeitos a um controlo das pessoas que compõem a comunidade na qual exercem as suas funções.
Como se pode ler no Ac do STJ de 14-10-2003 relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Alves Velho, in dgsi.p.t, Como é sabido e geralmente aceite, os cidadãos que exercem cargos públicos, nomeadamente políticos, como os exercidos pelas Partes neste processo, estão sujeitos à crítica, quer das colectividades pela satisfação de cujos interesses devem pautar o exercício das respectivas funções, quer dos titulares de entidades que tutelem interesses conflituantes, do ponto de vista da sua própria perspectiva de satisfação do bem comum. (…) E ainda, as pessoas que ocupam lugares de relevância política ou altos cargos na administração pública estão sujeitas a figurar como alvos de mais e de mais intensas críticas que os demais cidadãos, provenham elas de seus pares ou não. Em democracia, a tutela da honra pessoal e reputação dos políticos é, por isso, também menos intensa que a dos cidadãos em geral (…)”.
A liberdade de expressão apenas deve ser restringida nas situações em que os direitos de personalidade, máxime o direito ao bom nome e reputação (art.º 26º CRP) sejam verdadeiramente postos em causa e de forma significativa. O que não se verifica no caso concreto, na medida em que as afirmações/declarações do arguido devem entender-se apenas como apreciações subjetivas desta sobre a actuação profissional do assistente, impondo-se, assim, a absolvição do arguido, por se considerar, à luz do entendimento perfilhado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que o arguido agiu no exercício de um direito de critica pública, não configurando a sua actuação qualquer atentado à honra e consideração pessoal do assistente.
Como se decidiu no Ac do TRL de 16-11-2012 relatado pelo Exmo. Sr. Desembargador Jorge Langweg, Em democracia, não se pode confundir "comentário e insinuação inverídica" com a expressão de uma mera crítica subjetiva e parcial sobre a conduta pública de uma qualquer figura política, sob pena de se acabar por condicionar, ilegitimamente, o direito à liberdade de expressão, reconhecido na Constituição da República Portuguesa e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem e violar o princípio da intervenção mínima do direito penal. Um texto irónico e crítico publicado na rede digital global, na página pessoal de facebook de um político, que exprime juízos de valor e não ataca o visado – um seu adversário político - na sua substância pessoal (sublinhado nosso), não integra crime de difamação. A tolerância dispensada aos juízos de valor é ostensivamente mais generosa do que a outorgada às imputações de facto e os seus limites são mais alargados quando visam um político, agindo na sua qualidade de figura pública, do que quando se referem a um simples particular.
Também no Ac do TRE de 07-03-2017 relatado pelo Exmo. Sr. Desembargador Alberto Borges, in www.dgsi.pt decidiu-se que os limites da crítica admissível são mais amplos em relação a personalidades públicas visadas nessa qualidade, nomeadamente políticos, do que em relação a um simples particular.
E como no voto de vencido expresso no Ac do TRP de 27-03-2019 se escreveu, “Por força dos artigos 8º e 16º da Constituição da República Portuguesa a Convenção Europeia dos Direitos do Homem situa-se na hierarquia das normas, num plano superior ao das leis ordinárias internas. Ora, a citada Convenção europeia não tutela em termos gerais o direito à honra, a ele se referindo apenas em termos de exceções à liberdade de expressão, no nº2 do art.º 10 daquela Convenção, que tem vindo a ser interpretado de forma muito restritiva pelo TEDH, o que já tem originado várias condenações do Estado Português citadas pela sentença recorrida.
Neste sentido veja-se o Acórdão do STJ de 30/06/2011, relatado pelo Sr. Conselheiro João Bernardo. O que deve levar o intérprete, no caso concreto, a partir da tutela da liberdade de expressão e após, averiguar se estamos perante alguma exceção que possa integrar-se no citado art.º 10 nº2. Na jurisprudência do TEDH a liberdade de expressão constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa. E ela é válida não só para informações ou ideias que venham a ser acolhidas favoravelmente, mas também para aquelas que chocam ou de alguma forma inquietam. As exceções a esta liberdade devem ser interpretadas de modo restrito.
O TEDH tem vindo a entender de forma reiterada que os políticos e outras figuras públicas, pela sua exposição e discutibilidade das ideias que professam, bem pelo controle a que têm de ser sujeitos num estado democrático, seja pelo cidadão comum, seja pela comunicação social, têm de ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, ainda que estas sejam de alguma forma intensas e até injustas.
E por último como no Ac do TRP de 29-04-2020 relatado pela Exma. Sra. Desembargadora Maria Luísa Arantes in www.dgsi.pt se decidiu, O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem entendido, em vários arestos, que “a liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de todas as sociedades democráticas, sendo uma das condições primordiais para o seu progresso e para o desenvolvimento de cada um”. Ora, uma das manifestações da liberdade de expressão é o direito que cada pessoa tem de exercer o direito de crítica, nomeadamente, a nível político. O Presidente de uma Junta de Freguesia, exercendo um cargo público, tem uma maior exposição e tem de se sujeitar à crítica, a qual é comunitariamente aceite, ainda que se recorra a expressões contundentes, desagradáveis, grosseiras.
Impõe-se, assim, a absolvição do arguido.
IV- DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL
Foi deduzido pedido de indemnização civil pelo demandante nos presentes autos, contra o arguido, na qualidade de demandado.
Nos termos do art.º 71º do Código de Processo Penal “o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo (...)”.
Nos termos do disposto no art.º 129º do Código Penal a indemnização de perdas e danos emergentes de um crime é regulada pela lei civil.
Assim, para a existência de responsabilidade civil extracontratual necessário é que sejam preenchidos os requisitos constantes do artigo 483º do Código Civil, a saber: um facto voluntário do agente, ilicitude, imputação do facto ao lesante, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Não se tendo apurado a prática de qualquer acto ilícito por parte do arguido, deve o pedido formulado improceder.
São devidas custas pelo demandante (art.ºs 523º do C.P.Penal e 527º do C.P.Civil).»

3. Apreciação do mérito do recurso
3.1. Da sindicância da matéria de facto:
No caso em apreço, ambos os recorrentes afirmam discordar da matéria de facto dada como não provada, respeitante ao elemento subjetivo do tipo de crime.
Como tem sido reiteradamente salientado, a matéria de facto pode ser sindicada em recurso por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º 3, 4 e 6, do mesmo diploma (vd., por todos, Acórdão do TRC de 11.03.2009, Processo n.º 4/05.7TAACN.C1).
No primeiro caso estamos perante a arguição dos vícios da decisão previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como expresso no preceito, tem que resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum. No segundo caso temos a invocação de erros de julgamento, visando o recurso o reexame da matéria de facto, através da fiscalização das provas e da forma como o Tribunal recorrido formou a sua convicção a partir delas.
No caso em apreço, para sustentar a sua discordância relativamente à decisão sobre a matéria de facto dada como não provada, o Ministério Público lança mão da impugnação restrita através da invocação de erro notório na apreciação da prova previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal e, subsidiariamente, da impugnação ampla, nos termos do disposto no artigo 412.º, n.º 3 do mesmo diploma, tendo este último meio impugnatório sido também invocado pelo assistente no recurso por si apresentado.
3.1.1. Apreciemos, então, da existência do invocado vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal.
Estabelece o artigo 410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal que, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do tribunal a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; c) Erro notório na apreciação da prova.
São vícios da decisão sobre a matéria de facto – e não vícios de julgamento, não sendo confundíveis com o erro na aplicação do direito aos factos, nem com a errada apreciação e valoração das provas ou a insuficiência destas para a decisão de facto proferida-, de conhecimento oficioso.
Saliente-se que, em qualquer das apontadas hipóteses, como resulta expresso do  preceito legal, o vício tem de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para o fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cf. Acórdão do TRC de 04.03.2009, Processo n.º 257/03.5TAVIS.C1), tratando-se, assim, de vícios intrínsecos à sentença que, por isso, quanto a eles, terá que ser auto-suficiente.
O vício do erro notório na apreciação da prova, a que se reporta a alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º, do Código de Processo Penal, verifica-se quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se apercebe de que o tribunal, na análise da prova, violou as regras da experiência ou de que efetuou uma apreciação manifestamente incorreta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios, verificando-se, igualmente, este vício quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis. O requisito da notoriedade afere-se, como se referiu, pela circunstância de o erro não passar despercebido ao homem médio - ou, talvez mais adequadamente, seguindo o entendimento do Conselheiro Sousa Brito, na declaração de voto aposta no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 322/93, ou do Acórdão do TRE de 20.02.2018, processo n.º 386/09.1TASLV.E2, ao jurista ou ao juiz “normal”, dotado da cultura e experiência que são supostas existir em quem exerce a função de julgar, desde que seja segura a verificação da sua existência -, devido à sua forma grosseira, ostensiva ou evidente.
A nosso ver, adiante-se, é o que acontece no caso em apreço.
Importa recordar os factos em causa, dados como não provados, relativos ao elemento subjetivo do tipo:
«1. Ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões que não correspondiam à verdade e juízos de valor sobre a pessoa de B que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal, profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia que o arguido conhecia, sabendo ainda que tais comentários que visaram directamente o ofendido enquanto Presidente da Junta de Freguesia, dirigidos à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas como, de facto sucedeu.
2. Bem sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei penal.»
O tribunal a quo fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
«A prova produzida no que respeita às publicações, tem de ser analisada atendendo ao que em concreto foi escrito e a interpretação que às mesmas pode ser dado, no contexto em que foram proferidas. E analisando as mesmas nesse contexto se concluiu no sentido de se considerar como não provado que ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões que não correspondiam à verdade e juízos de valor sobre a pessoa de B que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal, profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia que o arguido conhecia, sabendo ainda que tais comentários que visaram directamente o ofendido enquanto Presidente da Junta de Freguesia, dirigidos à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas como, de facto sucedeu, bem sabendo o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei penal, nos termos e pelos fundamentos que melhor se analisarão de seguida.»
Decorre da sentença recorrida que a relevância deste ponto dos factos não provados é indissociável do entendimento de direito do tribunal a quo sobre a atipicidade, no plano objetivo, da imputação de factos e juízos de valor constantes dos textos escritos e publicados pelo arguido.
Ora, conforme melhor desenvolveremos infra, no caso concerto, entendemos estar perante a imputação de factos e juízos de valor de sentido e alcance imediatamente reconhecíveis pela generalidade das pessoas como atingindo a honra, a dignidade e a consideração do assistente, que ultrapassou em muito os limites da liberdade de expressão.
Na ausência de confissão, em que o arguido reconhece ter sabido e querido os factos do tipo objetivo e ter consciência do seu carácter ilícito, a prova do elemento subjetivo, por via de regra, faz-se de forma indireta, com recurso a inferências lógicas e presunções ligadas às regras da experiência comum, a partir dos factos conhecidos que são os modos de execução dos tipos de crime, associados à capacidade de discernimento e à liberdade de vontade do autor desses factos. A «intenção de praticar o crime pertence ao foro íntimo, psicológico, da pessoa e, se negada ou reconduzindo-se o agente ao silêncio, só a ela normalmente se chega através de factos externos ao agente, concludentes desse nexo psicológico e, assim, através de prova indireta (indiciária)», como se reconhece no Acórdão do TRP de 27.01.2021, Processo n.º 473/14.4JAPRT.P1.
No caso, analisando a factualidade objetiva considerada provada à luz das regras da experiência comum e da lógica corrente, infere-se que o arguido, ao escrever tais publicações, não podia deixar de ter conhecimento que as mesmas continham expressões e juízos de valor sobre o assistente que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal e profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia, que as publicações eram dirigidas à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas, e que tais atos eram proibidos e punidos por lei.
Concluímos, pois, que a sentença recorrida enferma do vício de erro notório na apreciação da prova, a que alude o artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal.
Constando dos autos todos os elementos de prova necessários, é possível a este Tribunal sanar esse vício e modificar a decisão de facto proferida (cf. artigo 426.º, n.º 1, a contrario, do Código de Processo Penal).
Assim, elimina-se os factos em causa do elenco dos factos não provados e adiciona-se os mesmos aos factos provados, com a seguinte redação:
26A- Ao escrever tais publicações, o arguido sabia que as mesmas continham expressões e juízos de valor sobre o assistente que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal e profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia, e que as publicações eram dirigidas à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas.
26B- Bem sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punível por lei.
3.1.2. Procedendo o recurso do Ministério Público na parte em que invoca a existência de vício de erro notório na apreciação da prova nos termos supra expostos, fica prejudicado o conhecimento da impugnação ampla da decisão sobre a matéria de facto invocada, subsidiariamente, pelo Ministério Público e, a título principal, pelo assistente.
3.2. Do preenchimento do tipo legal de difamação agravada:
O arguido foi absolvido do crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º, n.ºs 1, alínea a), e 2 e 184.º, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal., que lhe era imputado, por o  tribunal recorrido ter entendido que as publicações em causa não integram o crime de difamação, por traduzirem o exercício do direito de crítica objetiva, apontado à atuação profissional do ora assistente num cargo que é de natureza política.
Adiante-se que, apesar do esforço de ponderação e fundamentação que a sentença recorrida revela, não se concorda com a conclusão alcançada.
Antes de mais, importa tecer algumas considerações de ordem geral com relevância para a decisão da questão jurídica-penal que subjaz ao presente recurso.
Dispõe o artigo 180.º do Código Penal:
«1. Quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo, é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 240 dias.
(…)»
E o artigo 182.º do mesmo diploma:
«À difamação e à injúria verbais são equiparadas as feitas por escrito, gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão.»
Por sua vez, os artigos 183.º e 184, preceituam sobre os termos da agravação das penas.
Estipula o primeiro que:
«1 - Se no caso dos crimes previstos nos artigos 180.º, 181.º e 182.º:
a) A ofensa for praticada através de meios ou em circunstâncias que facilitem a sua divulgação; ou,
(…)
as penas da difamação ou da injúria são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo.
2 - Se o crime for cometido através de meio de comunicação social, o agente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias.»
E o artigo 184.º que:
«As penas previstas nos artigos 180.º, 181.º e 183.º são elevadas de metade nos seus limites mínimo e máximo se a vítima for uma das pessoas referidas na alínea l) do n.º 2 do artigo 132.º, no exercício das suas funções ou por causa delas, ou se o agente for funcionário e praticar o facto com grave abuso de autoridade.»
O tipo objetivo do crime de difamação p. e p. pelo artigo 180.º do Código Penal pode preencher-se mediante a imputação a outra pessoa de factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou juízos de valor ofensivos da honra ou consideração.
Como se vem entendendo, o bem jurídico protegido pelo crime em apreço é a honra ou consideração do visado. Na lição de Beleza dos Santos, in “Algumas Considerações Jurídicas sobre Crimes de Difamação e de Injúria”, RLJ ano 92, n.º 3152, p.167-168, a honra consubstancia-se “naquele mínimo de condições, especialmente de natureza moral, que são razoavelmente consideradas essenciais para que um indivíduo possa com legitimidade ter estima por si, pelo que é e vale” e a consideração é “aquele conjunto de requisitos que razoavelmente se deve julgar necessário a qualquer pessoa, de tal modo que a falta de algum desses requisitos possa expor essa pessoa (…) ao desprezo público. (…). A honra refere-se ao apreço de cada um por si, à auto-avaliação no sentido de não ser um valor negativo, particularmente do ponto de vista moral. A consideração ao juízo que forma ou pode formar o público no sentido de considerar alguém um bom elemento social ou ao menos de não o julgar um valor negativo”.
Os direitos à integridade moral e ao bom-nome e reputação dispõem de respaldo no texto constitucional e são emanação da dignidade da pessoa humana (artigo 1.º da Lei Fundamental). O n.º 1 do artigo 25.º da Constituição da República dispõe que “[a] integridade moral e física das pessoas é inviolável”. E o artigo 26.º do mesmo diploma estabelece que “[a] todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação”.
Para responder à questão essencial de saber se as publicações em causa são ofensivas da honra e consideração do assistente, importa, em primeiro lugar, ter presente o contexto situacional de vivência humana em que as mesmas foram proferidas.
Como refere Faria Costa, “o significado das palavras, para mais quando nos movemos no mundo da razão prática, tem um valor de uso. Valor que se aprecia, justamente, no contexto situacional e que ao deixar intocado o significante ganha ou adquire intencionalidades bem diversas no momento em que apreciamos o significado”, o que não significa que não haja palavras “cujo sentido primeiro e último é tido, por toda a comunidade falante, como ofensivo da honra e consideração” (Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, p. 630).
Em segundo lugar, há que ter presente, conforme bem refere a sentença recorrida, que o direito penal tutela apenas os valores essenciais e fundamentais da vida em sociedade, obedecendo a um princípio de intervenção mínima, bem como de proporcionalidade imanente ao Estado de Direito, não devendo intervir para criminalizar simples desrespeitos, grosserias, descortesias ou más educações.
Como ensina Costa Andrade, a conduta típica configura sempre “a concretização de uma expressão paradigmática de danosidade social intolerável” e, como tal, digna de tutela penal e carecida de tutela penal. Segundo este Professor: “É a dignidade penal que dá expressão ao mandamento constitucional segundo o qual só os bens jurídicos fundamentais merecem a tutela penal e, por via disso, assegura eficácia à exigência constitucional da proporcionalidade. Por seu turno, é a carência de tutela penal que garante vigência ao imperativo constitucional da subsidiariedade (ou última ratio), por força do qual só será admissível o recurso à criminalização de condutas quando esta se revele idónea e necessária. Isto é, quando não seja possível assegurar a proteção dos bens jurídico-criminais por forma igualmente eficaz e menos gravosa para a liberdade. Resumidamente (…): é a dignidade penal que assegura à criminalização a indispensável legitimação negativa; mas é a carência de tutela que mediatiza a não menos irrenunciável legitimação positiva.” Salienta o autor que estas considerações ganham “pertinência e alcance” precisamente face ao problema da proteção jurídico-penal de bens jurídicos como a honra, a privacidade/intimidade, a palavra e a imagem (“Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal”, Coimbra, 1996, pp. 178-179 e 182-184).
Conforme Acórdão do TRP de 07.11.2012, Processo n.º 18515/11.3TDPRT.P1, «[T]erá que se avaliar, em concreto, a específica danosidade social da expressão proferida, atendendo não só ao sentido comum das palavras usadas mas também ao contexto geral e intencionalidade com que foram afirmadas para se poder aquilatar da sua gravidade e, consequentemente, da necessidade de intervenção do direito penal, confirmando (ou não) o preenchimento da conduta típica do crime correspondente. (…) [F]ace à existência de uma margem de conflitualidade social tolerável, o direito penal só pode intervir quando a linguagem utilizada, para além de incomodar ou ferir a suscetibilidade do visado, atinge o núcleo essencial das qualidades morais dessa pessoa. A análise deve incidir, pois, sobre o significado próprio das palavras usadas e sobre o contexto geral em que são proferidas. Há palavras tidas, pela comunidade, como naturalmente [expressamente] ofensivas da honra e consideração mas que, analisadas à luz do contexto em que foram proferidas, não preenchem a conduta típica dos crimes de que falamos. Só em face dessa ponderação o tribunal pode afirmar a “carga ofensiva” (…), o “grau de ofensividade penalmente relevante” ou “a relevância injuriosa” da expressão e, nessa medida, configurar a prática do crime correspondente.»
Por último, e conforme refere o Acórdão do TRE de 23-01-2018, Processo n.º 80-16.7GGBJA.E1, «ainda em sede de preenchimento do tipo legal importa chamar explicitamente à colação o direito à liberdade de expressão, pois pode dizer-se com autor alemão citado por Costa Andrade (…) que “ À luz do efeito-recíproco, os tipos legais contra a honra terão de ser interpretados a partir do âmbito da área de tutela (da liberdade de expressão) e dos limites (…) A liberdade de expressão terá, por isso, de ser considerada já ao nível do tipo e não apenas em sede de justificação”.
Com efeito, como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “No contexto constitucional português, os direitos em colisão devem considerar-se como princípios suscetíveis de ponderação ou balanceamento nos casos concretos, afastando-se quaisquer ideias de supra ou infra valoração abstrata” (cfr CRP Anotada, Vol. I, 4ª ed.-2007 p. 466), com o que os autores parecem pôr justificadamente em causa tanto a posição que atribui supremacia ao direito à honra, conforme se encontra amiúde na jurisprudência nacional de forma mais ou menos explícita, como a interpretação da jurisprudência do TEDH que lhe confere o sentido de reconhecer prevalência, em abstrato, à liberdade de expressão sobre o direito à honra, maxime quando esteja em causa o bom nome e reputação política dos titulares de cargos políticos ou dos agentes políticos.
Nesta perspetiva, o art.º 180º do C. Penal deve ser interpretado de modo a que o direito à liberdade expressão consagrado genericamente no art.º 37º da CRP não seja subvalorizado e sacrificado mesmo quando a conduta potencialmente lesiva apenas pode violar a honra do visado em pequena medida ou de modo insignificante, nomeadamente quando do contexto respetivo sobressai o exercício do direito de crítica objetiva apontado ao desempenho funcional, profissional, ou de natureza idêntica, (…) tal como não pode ser lido como permitindo o sacrifício do direito à honra em nome da liberdade de expressão, por mais desproporcional e lesiva que se apresente a violação daquela.
Assumem, pois, particular importância as considerações de Costa Andrade (cfr ob. cit. pp. 232 a 240) sobre a atipicidade do direito de crítica objetiva (…). De acordo com este autor, enquanto os juízos de apreciação e valoração crítica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais, etc. ou sobre prestações conseguidas nos domínios do desporto e do espetáculo se atêm exclusivamente às obras, realizações ou prestações em si, não se dirigindo diretamente à pessoa dos seus autores ou criadores, aqueles juízos caem fora da tipicidade de incriminações como a Difamação. “Já porque não atingem a honra pessoal do cientista, artista ou desportista, etc., já porque não a atingem com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica. Num caso e noutro, a atipicidade afasta, sem mais e em definitivo, a responsabilidade criminal do crítico, não havendo, por isso, lugar à busca da cobertura de uma qualquer derimente da ilicitude. (cfr p. 233). – cfr ob. cit p. 233.»
Como elemento subjetivo do tipo, exige-se ao agente a consciência de que os factos que imputa ou as palavras que dirige são ofensivas da honra e consideração da pessoa visada, e que a sua conduta é proibida por lei.
Cumpre agora apreciar o caso concreto à luz dos considerandos expostos.
Apurou-se que, no dia 22.08.2018, o arguido criou a conta de Facebook acessível ao público em geral no endereço https://www.facebook.com/Todos-contra-B-presidente-da-junta-de-freguesia-de-C458092648044653/, da qual é administrador, e que, no período de 25.10.2018 a 26.11.2020, efetuou várias publicações nas quais se dirige ao assistente, enquanto Presidente da Junta de Freguesia de C, eleito em 2013.
Segundo resulta das publicações em causa, o arguido foi funcionário do posto de limpeza da Junta de Freguesia de C, tendo, segundo refere, sido despedido “por uma falsa agressão”, em junho de 2016, para colocarem no seu lugar “o primo do encarregado” e, no decurso do processo disciplinar, celebrou acordo, “por pressão do Presidente B”, tendo recebido uma “miséria de indemnização”, inferior à acordada.
Das publicações efetuadas, acessíveis a todos os internautas, destacam-se os seguintes textos:
- no dia 17.01.2019- «verdade que o presidente B é um mentiroso, racista, fascista, ditador, discrimina funcionários/as e favorece funcionários/as (…) verdade que o presidente B é um ladrão que foi condenado por roubar parquímetros da EMEL na freguesia de C (…) verdade que o presidente B só faz algo pelos militantes comunista ou quem anda a cheirar-lhe o cú, lamber-lhe as botas ou algo que lhe favoreça ou o seu partido e que vos anda a enganar à 6 anos, que continua no poleiro e ninguém têm a coragem de fazer algo, com tomates ou com H grande para correr com o mentiroso da junta de freguesia de C?»
- no dia 28.01.2019, ao convocar uma “manifestação pacífica” em frente da Sede do Partido Comunista Português, «APONTOU AS DENUNCIAS SOBRE O QUE O PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C (…) PELO QUE ME FIZERAM E CONTINUAM A FAZER A FUNCIONÁRIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DA JUNTA DE FREGUESIA DE C, ABUSO DE PODER, PERSEGUISÃO, AMEAÇAS, DISCRIMINAÇÃO, RACISMO»
- no dia 18.02.2019- «AS VERDADES EM BREVE VÃO VIR AO DE CIMA SENHOR MENTIROSO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B»;
-  no dia 08.05.2019- «O PRESIDENTE B DESPEDIU NA ALTURA O FUNCIONÁRIO PARA SE LIVRAR COMO O COBARDE E MENTIROSO QUE É (…) O PRESIDENTE B É UM MENTIROSO, ALDRABÃO, LADRÃO, IGNORANTE QUE DEVIA DEMITIR-SE DO SEU CARGO»
- no dia 04.07.2019- «Oh senhor MENTIROSO B explique lá também aqui à malta como conseguiu a proeza de colocar mais uma peça do seu xadrez ♟ numa posição de interesse na Freguesia de C. Ai ai ai senhor MENTIROSO B nunca lhe ensinaram que se tapar a cabeça destapa os pés?»;
- no dia 11.07.2019- «DENUNCIAS SOBRE O PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B (…) QUE ABUSAM DO PODER, DISCRIMINAM FUNCIONARIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DE C»;
- no dia 07.08.2019- «ESTÃO A RESULTAR TODAS AS QUEIXAS E DENÚNCIAS VERDADEIRAS FEITAS CONTRA ESTE COBARDE, MENTIROSO, ALDRABÃO, DITADOR, DISCRIMINATÓRIO, RACISTA DO PRESIDENTE B»;
- no dia 21.08.2019- «a mando do comunista cobarde ignorante do B»;
- no dia 28.08.2019- «O COBARDE, MENTIROSO, ALDRABÃO DO PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B E A SUA DIRECÇÃO COMUNISTA A ABUSAREM DO PODER QUE TÊM, A MENTIREM, A DESPREZAREM, A GOZAREM COM OS MIÚDOS, AS CRIANÇAS, LOGISTAS E MORADORES DO BAIRRO HORTA NOVA »;
- no dia 01.09.2019- «mais verdades e realidades sobre o cobarde, mentiroso, aldrabão, falso do presidente B»;
- no dia 05.09.2019- «O Presidente Ditador da Junta de Freguesia de C e do PCP B que gere a Junta com Ditadura, Mentiras, Ameaças, Abuso de Poder, Racismo, Discriminação, Falsidade»;
- no dia 09.09.2019- «(…) pelo cobarde, mentiroso, aldrabão, falso do presidente B»;
- no dia 16.09.2019- «Perguntar onde está o dinheiro para o Polidesportivo, Parque Infantil, Hortas Comunitárias ao Senhor Presidente Cobarde, Mentiroso, Aldrabão, Ladrão, Falso do B»;
- no dia 17.09.2019- «DENUNCIAS SOBRE O PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA DE C B (…) QUE ABUSAM DO PODER, DISCRIMINAM FUNCIONARIOS/AS DO POSTO DE LIMPEZA DE C»;
- no dia 20.09.2019- «Venho comunicar mais verdades e realidades vergonhosas do ignorante, hipócrita, cobarde, mentiroso, aldrabão, racista, ditador, falso do presidente B»;
- no dia 24.09.2019- «Vergonha, verdade e realidade que o presidente cobarde, aldrabão, mentiroso, ignorante, hipócrita, racista, ditador, falso B do PCP fez promessas, mentiu, iludiu os moradores»;
- no dia 26.11.2020- «Senhores aldrabões, mentirosos, cobardes, cínicos, falsos da direcção comuna da junta de freguesia de C quantas foram os chamados beneficiados, amigos e conhecidos do presidente que tiveram direito porque andam sempre a engraxá-lo e a lamber-lhe as botas».
Ainda que o arguido tenha criado a conta de Facebook para denunciar situações que, na sua perspetiva, eram irregulares na Junta de Freguesia de C, e não numa atitude de puro despeito/perseguição/vingança, a verdade é que os textos publicados ultrapassam em muito o chamado “direito de crítica objetiva”.
Considerando o teor das publicações em causa, estamos perante uma situação em que, objetivamente, a imputação de factos e a formulação de juízos de valor não têm outro conteúdo ou sentido que não a ofensa à honra, dignidade e consideração do visado.
Ao apelidar o assistente de “mentiroso”, “racista”, “fascista”, “ditador”, “ladrão”, “ignorante”, “cobarde”, “aldrabão”, “falso”, “discriminatório” e “hipócrita” e ao afirmar que o mesmo “gere a Junta com ditadura, mentiras, ameaças, abuso de poder, racismo, discriminação, falsidade”, o arguido ultrapassou claramente a crítica ao seu comportamento político e público, enquanto Presidente da Junta de Freguesia de C, para atingir diretamente a sua substância pessoal.
Embora se reconheça existir uma maior margem de crítica admissível quando se trata de titulares de cargos políticos ou agentes políticos, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que defendem, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum, sendo, por isso, admissível, no âmbito de controvérsias políticas e públicas, a utilização de linguagem forte, exagerada e violenta, a verdade é que há limites que não podem ser excedidos, sob pena de esvaziar o conteúdo do direito à honra e consideração. Como refere Iolanda Brito (apud Acórdão do TRL de 12.05.2016, processo n.º 2544/10.7TDLSB.L1-9), “mesmo em relação às figuras públicas há limites que não podem ser ultrapassados, ainda que no domínio da esfera pública. A tolerância à crítica tem que conhecer barreiras, sob pena de se negar, de uma forma intolerável, a proteção da honra das figuras públicas, o que poderia acarretar diversas consequências negativas, nomeadamente afastar as mais dignas da vida pública”. E, no caso em apreço, esses limites foram claramente ultrapassados, tendo a crítica excedido em muito a valoração do mérito da atuação do assistente enquanto Presidente da Junta de Freguesia, e atingido, com elevada carga depreciativa, o núcleo essencial das suas qualidades morais.
Em suma, contrariamente ao entendimento assumido pelo tribunal recorrido, entendemos que o arguido não se limitou à crítica objetiva às opções de gestão levadas a cabo pelo visado enquanto Presidente da Junta de Freguesia, esta coberta pela liberdade de debate político e de crítica política, inerentes à democracia, antes procedeu à crítica pessoal do assistente.
De resto, à difamação verbal é equiparada a feita por escrito, nos termos do artigo 182.º do Código Penal.
Concluímos, pois, pelo preenchimento do elemento objetivo do tipo.
Verifica-se ainda a circunstância agravante a que se reporta o n.º 2 do artigo 183.º do Código Penal (e que, neste caso, consome a prevista na alínea a) do n.º 1 deste artigo), uma vez que, tendo os textos sido publicados em conta de Facebook (rede social que funciona através da internet), comprovadamente acessível ao público em geral (e não apenas àqueles que faziam parte do grupo de “amigos” do arguido), estamos perante um “meio de comunicação social”, que visa, pois, atingir um conjunto alargado de pessoas.-  neste sentido, vd. Acórdão do TRP de 30.10.2013, processo n.º 1087/12.9TAMTS.P1. Para além disso, dirigindo-se o arguido, nas várias publicações efetuadas, ao assistente B, enquanto Presidente da Junta de Freguesia, mostra-se igualmente preenchida a circunstância qualificativa prevista no artigo 184.º do Código Penal.
 Mais se provou que o arguido, ao escrever tais publicações, sabia que as mesmas continham expressões e juízos de valor sobre o assistente que o ofendiam, como ofenderam, na sua honra e consideração pessoal e profissional e pública, como Presidente de Junta de Freguesia, e que as publicações eram dirigidas à comunidade de internautas, facilitando assim a sua divulgação por inúmeras pessoas, e, bem assim, que a sua conduta era proibida e punível por lei, pelo que, também, se mostra preenchido o elemento subjetivo do crime.
Em suma, considerando a factualidade dada como provada, dúvidas não existem de que o arguido cometeu o crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º, n.ºs 1, alínea a), e 2 e 184.º, este por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal., que lhe era imputado.
3.3. Da escolha e medida da pena:
O legislador estatui como parâmetros de determinação da pena que a mesma deve ser fixada - “dentro dos limites definidos na lei, (…) em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, visando a aplicação das penas “a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”, não podendo “em caso algum a pena (…) ultrapassar a medida da culpa” e levando ainda em conta “todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”, considerando, nomeadamente, as indicadas nas várias alíneas do n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal , relevantes para avaliar, quer a culpa, quer a prevenção - cf. artigos 71.º, n.ºs 1 e 2, e 40.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código Penal.
Sempre que o tipo legal preveja em alternativa pena privativa e pena não privativa da liberdade, o legislador dá ainda preferência à segunda “sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição” (artigo 70º Código Penal).
Visando a conciliação das finalidades da punição com a exigência da medida da pena em função da culpa, na operação de determinação concreta da pena, o Tribunal deve atender, em primeira linha, à culpa do agente, que constitui o fundamento e limite superior e inultrapassável da pena a aplicar sob pena de, sendo o mesmo ultrapassado, se violar a dignidade humana do delinquente. Por seu turno, o limite mínimo da moldura concreta há-de ser dado pela medida da necessidade de tutela de bens jurídicos, isto é, pelas exigências de prevenção geral, não como prevenção negativa ou de intimidação, mas antes como prevenção positiva ou de integração, uma vez que a aplicação de uma pena visa a proteção de bens jurídicos com um significado prospetivo, que se traduz na tutela das expetativas da comunidade na manutenção da validade e vigência da norma violada. Finalmente, o Tribunal deve fixar a pena concreta a aplicar de acordo com as exigências de prevenção especial de socialização do agente, ou sendo esta inexistente, pela necessidade de intimação e segurança individual - vd. Anabela Miranda Rodrigues, “O modelo de prevenção na determinação da medida concreta da pena”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, n.º 2, abril-junho de 2002, pp. 181 e 182, e Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, pp. 227 e ss.
No caso em apreço, o crime praticado pelo arguido é punível com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa de 180 a 540 dias (artigos 183.º, n.º 2, e 184.º, conjugados com o artigo 47.º, n.º 1, todos do Código Penal).
Na escolha da pena, tendo os critérios anteriormente referidos e a primazia que o legislador dá às penas não detentivas da liberdade, é indiscutível que, no caso, a pena de multa realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Na determinação da medida concreta da pena, cumpre ponderar o dolo direto e intenso com que o arguido atuou, o mediano grau de ilicitude do facto, os sentimentos manifestados no cometimento do crime, designadamente o total desprezo pelo valor pessoal do assistente, a persistência da sua conduta revelada na frequência das publicações e no período temporal em que as mesmas ocorreram, as consideráveis exigências de prevenção geral, pela frequência e facilidade a que se assiste à ofensa ao bom nome e reputação das pessoas, servindo a “internet” de meio de transmissão da ofensa, demonstrando a fraca interiorização do respeito pelo bem jurídico pessoal em causa e, assim, contribuindo para o seu enfraquecimento. A favor do arguido milita apenas a ausência de antecedentes criminais e a integração social e familiar.
Pelo exposto, e tendo em conta a moldura penal abstrata aplicável, reputa-se como justo e adequado condenar o arguido na pena de 300 dias de multa.
Quanto ao quantitativo diário da pena de multa, dispõe o n.º 2 do artigo 47.º do Código Penal que “[c]ada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais”.
No caso, face à factualidade dada como provada no que diz respeito às condições económicas do arguido, o Tribunal entende fixar o quantitativo diário da multa em €5,00, o que perfaz a quantia de €1.500,00.
3.4. Do pedido de indemnização civil:
Ainda que o recurso interposto pelo assistente no que respeita à parte cível não seja admissível, porquanto o pedido formulado, no montante de €5.000,00, não é “superior à alçada do tribunal recorrido” (cf. artigos 400.º, n.º 2, 414.º, n.ºs 2 e 3, 417.º, n.º 6, alínea b), e 420, n.º 1, alínea b), todos do Código de Processo Penal), julgado procedente o recurso no que respeita à parte criminal, perante o disposto no artigo 403.º, n.º 3, do mesmo diploma, há que retirar de tal procedência as consequências legais relativamente a toda a decisão do tribunal recorrido, nomeadamente no que respeita ao pedido de indemnização civil, evitando-se, assim, incongruências e contradições entre a decisão do recurso e a parte não recorrida (vd. Acórdão do TRP de 17.04.2002, Processo n.º 0010888).
Nos termos do artigo 129.º do Código Penal, «a indemnização de perdas e danos emergente de crime é regulada pela lei civil».
O princípio geral em matéria de responsabilidade civil por factos ilícitos encontra-se consagrado no artigo 483.º do Código Civil, determinando o seu n.º 1 que: «aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação».
São, assim, apontados correntemente como elementos constitutivos desta vertente da responsabilidade civil: o facto ilícito, o dano, o nexo de causalidade entre o facto e o dano e a imputação do facto ao lesante (Almeida Costa, Direito das Obrigações, 4ª ed., p. 364 e ss).
No caso, resulta da matéria de facto dada como provada que o arguido, com dolo, violou o direito do assistente à honra, bom nome e reputação, direitos de personalidade com tutela constitucional - cf artigos 70.º, n.º 1, e 484.º do Código Civil e 26.º, n.º 1, da Constituição.
Embora a matéria de facto apurada a respeito dos danos causados ao assistente seja bem parca, resulta do facto constante do n.º 26A, ora aditado, que o assistente se sentiu ofendido na sua honra e consideração, enquanto individuo e titular de cargo político, não restando dúvidas que tal prejuízo foi consequência da atuação do arguido, que redigiu as publicações em causa.
Cumpre, pois, concluir pelo preenchimento de todos os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos.
In casu, estão apenas em causa danos não patrimoniais.
Dispõe o artigo 496.º do Código Civil, no seu n.º 1, que «na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito» e, no n.º 4, que « o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494», ou seja, atendendo ao grau de culpa do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso.
Como escreveram Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª ed., p. 501) «O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante) segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e do titular da indemnização, às flutuações do valor da moeda etc.. E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida».
O assistente peticionou a quantia de €5.000,00 como compensação pelos danos não patrimoniais sofridos.
É indiscutível que a ofensa do direito à honra e consideração merece a tutela do direito.
Quanto à fixação do montante da indemnização, considerando todos os factos apurados e destacando-se, por um lado, tratar-se de difamação por escrito, com possibilidade de permanente acesso inerente à sua divulgação através da internet, e a reiteração da ofensa e, por outro, a fraca situação económica do arguido e o facto de o assistente, na qualidade de homem político e detentor de cargo público, com maior exposição, dever ser naturalmente mais tolerante e menos vulnerável aos efeitos danosos da ofensa do que o cidadão comum., afigura-se-nos adequado fixar a indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos no montante de €1.500,00.
III. DECISÃO
Pelo exposto, os Juízes que integram a 9.ª Secção deste Tribunal da Relação de Lisboa acordam em conceder provimento aos recursos interpostos pelo Ministério Público e pelo assistente B, na parte criminal, e, em consequência:
a) Alterar a decisão relativa à matéria de facto nos sobreditos termos;
b) Revogar a decisão de absolvição e, julgando a acusação procedente, condenar o arguido A pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º, n.ºs 1, alínea a), e 2 e 184.º, este por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à razão diária de €5,00, no montante global de €1.500,00; e
c) Julgando parcialmente procedente o pedido de indemnização civil, condenar o arguido a pagar ao assistente o montante de €1.500,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais.
Sem custas quanto à parte crime– artigos 513.º a 515.º, ambos do Código de Processo Penal.
Custas quanto à parte cível pelo arguido e assistente na proporção do decaimento.
Notifique.

Lisboa, 12 de janeiro de 2023
Micaela Pires Rodrigues
Madalena Augusta Parreiral
António Bráulio Alves Martins