PARTICIPAÇÃO EM RIXA
OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA AGRAVADA
CONSUMPÇÃO
CO-AUTORIA
Sumário

I. No crime de participação em rixa, previsto no art.º 151.º n.º 1 CP pune-se a situação de conflito ou de desordem, com intervenção de duas ou mais pessoas, sem que seja possível individualizar ou distinguir a conduta de cada um dos contendores.
II. Provando-se que a atuação intencional e conjunta dos arguidos foi a de agredir o ofendido e causar-lhe lesões físicas, o ilícito praticado é o de ofensas à integridade física qualificadas, previstas no artigo 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, o qual, afasta a qualificação jurídica de participação em rixa, que é consumida pelo enquadramento jurídico-criminal daqueles ilícitos mais gravosos, praticado em coautoria.

Texto Integral


ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

1. RELATÓRIO


A – Decisão Recorrida

No processo comum singular nº 247/17.0PALGS, do Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo de Competência Genérica ..., Juiz ..., foi deduzida acusação pública contra os arguidos AA, BB, CC, DD e EE, pela prática, em co-autoria material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p., pelos Artsº 143 nº1 e 145 nsº1 al. a) e 2, por referência ao Artº 132 nº2 al. h), todos do C. Penal.

Efectuado julgamento, foi decidido o seguinte (transcrição):

a) Condenar o arguido AA pela pratica, em co-autoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143.º, nº 1, 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de dez meses de prisão;
b) Substituir a pena de dez meses de prisão aplicada ao arguido AA por uma pena de 150 dias de multa, à taxa diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), correspondente à quantia global de €825,00 (oitocentos e vinte e cinco euros);
c) Condenar o arguido BB pela prática, em co-autoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143.º, nº 1, 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de um ano de quatro meses de prisão;
d) Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido BB por igual período (de um ano e quatro meses anos), sendo a suspensão acompanhada da imposição de regime de prova;
e) Condenar o arguido CC pela pratica, em co-autoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143.º, nº 1, 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de dois anos de prisão;
f) Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido CC por igual período (de dois anos), sendo a suspensão acompanhada da imposição do regime de prova;
g) Condenar o arguido FF pela pratica, em co-autoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143.º, nº 1, 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de oito meses de prisão;
h) Substituir a pena de oito meses de prisão aplicada ao arguido FF por uma pena de 120 dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), correspondente à quantia global de €600,00 (seiscentos euros);
i) Condenar o arguido EE pela pratica, em co-autoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143.º, nº 1, 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de um ano e oito meses de prisão;
j) Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido EE por igual período (de um ano e oito meses anos), sendo a suspensão acompanhada da imposição do regime de prova.
k) Condenar os arguidos no pagamento das custas criminais, fixando-se a taxa de justiça individul em duas UC.

B – Recursos

Inconformados com o assim decidido, recorreram os arguidos BB e CC, em peças autónomas.

B.1. Recurso do arguido BB

Este arguido apresentou as seguintes conclusões (transcrição):

A) Não era possível concretizar, face à discrepância entre os depoimentos do Ofendido e da sua Testemunha (alegadamente também ofendida, mas que não apresentou queixa) e dos depoimentos do Arguido Recorrente e do Arguido AA, assim como da Testemunha Sr. GG, à data Porteiro, que o Arguido Recorrente se encontrava àquela data (da agressão), naquele local.
B) Muito pelo contrário, foi comprovado que não se encontrava.
C) Também não é possível concretizar que aquelas mazelas correspondem aquela agressão.
D) Em última instancia, o que só por mera hipótese académica se concebe, estaria em causa um crime de rixa, previsto e punido pelo art. 151.º do CP.
E) E jamais se poderia comprovar, face aos factos dados como provados e não provados, de que houve um crime em regime de Co-Autoria, quanto muito tratar-se-ia de um crime em regime de cumplicidade.

B.2. Recurso do arguido CC

Este arguido, por sua vez, deduziu as seguintes conclusões (transcrição):

A) A Sentença recorrida apreciou e valorou excessivamente e incorrectamente as declarações prestadas pelo ofendido/testemunha HH;
B) A Sentença recorrida apreciou e valorou incorrectamente as declarações prestadas pela testemunha II;
C) A sentença recorrida fez uma incorrecta apreciação crítica das declarações da testemunha inquirida, GG;
C) Ante tal incorreta valoração das declarações do ofendido/testemunha HH e das testemunhas II e GG, foram dados como provados factos na sentença do Tribunal a Quo que não deveriam ter sido.
D) Impõe-se pois assim a revogação da sentença proferida pelo Tribunal a Quo.

C – Respostas aos Recursos

O M. P, junto do tribunal recorrido, respondeu, apenas, ao recurso interposto pelo arguido BB, tendo, em tal resposta, oferecido as seguintes conclusões (transcrição):

1. O recorrente insurge-se quanto à matéria de facto dada como provada, por, em seu entender, face à prova produzida em julgamento não poderiam ter sido dados como provados os factos sob os pontos 5, 6 e 8, mormente que se encontrava àquela data (da agressão) no local dos factos e que as lesões e sequelas físicas apresentadas pelo ofendido resultaram da agressão.
2. O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão quanto à matéria de facto provada, em toda a prova produzida, enumerando os elementos probatórios que contribuíram para a formação da sua convicção, indicação as razões que os dotaram de relevância e credibilidade - à luz de critérios de normalidade e da experiência comum.
3. A sentença recorrida fez uma correta apreciação da prova produzida em audiência, não se vislumbrando qualquer erro na formação da convicção do tribunal que imponha a alteração da matéria de facto provada ou a insuficiência desta para a decisão, nem se verificando a existência de quaisquer razões objetivas para que o tribunal modifique essa prova no sentido pretendido pelo recorrente, como melhor resulta da motivação do presente recurso.
4. Resulta devidamente demonstrado os elementos objectivos e subjectivos dos crimes de ofensa à integridade física qualificada e, em especial, que o recorrente actuou em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, por reporte aos exemplos-padrão previstos no artigo 132.º, n.º 2, alínea h) do Código Penal, ex vi do disposto no artigo 145.º, n.º 2, do mesmo diploma legal [“h) Praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas ou utilizar meio particularmente perigoso ou que se traduza na prática de crime de perigo comum”].
5. Da matéria de facto dada como provada resulta indiscutivelmente que o arguido se constitui co-autor do ilícito de ofensa à integridade física qualificada, tendo actuado conjuntamente e em comunhão de esforços com os demais arguidos, com o idêntico propósito de ofender o corpo de HH, resultado que lograram atingir.
6. Pelo que, e ainda pelas razões expendidas na motivação acompanhamos integralmente a sentença recorrida, a qual não nos merece nenhum reparo e à qual nada se nos oferece acrescentar com utilidade.
7. Não se mostram, pois, violados, por qualquer forma, quaisquer preceitos legais ou princípios, designadamente o disposto no artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, nos artigos 13.º, 14.º, 26.º, 27.º, 29.º, 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, al. a), por referência ao artigo 132.º, n.ºs 1 e 2, al. h), todos do Código Penal e nos artigos 127.º do Código do Processo Penal.
Face ao exposto deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se, na íntegra, a decisão judicial recorrida.

D – Tramitação subsequente

Aqui recebidos, foram os autos com vista à Exmª Procuradora-Geral Adjunta, que pugnou pela improcedência dos recursos.
Observado o disposto no Artº 417 nº2 do CPP, não foram apresentadas respostas.
Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO

A – Objecto do recurso

De acordo com o disposto no Artº 412 do CPP e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no D.R. I-A de 28/12/95 (neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria), o objecto do recurso define-se pelas conclusões que os recorrentes extraem da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Na verdade, e apesar de os recorrentes delimitarem, com as conclusões que retiram das suas motivações de recurso, o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, este, contudo, como se afirma no citado aresto de fixação de jurisprudência, deve apreciar oficiosamente da eventual existência dos vícios previstos no nº2 do Artº 410 do CPP, mesmo que o recurso se atenha a questões de direito.
As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem, assim, da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no nº 2 do Artº 410 do CPP, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no nº1 do Artº 379 do mesmo diploma legal.
O objecto do recurso cinge-se às conclusões dos recorrentes, nas quais se deduzem as seguintes questões:

1) Erro de julgamento (Ambos os recursos)
2) Crime de participação em rixa (Recurso do arguido BB)
3) Cumplicidade ao invés de co-autoria (Recurso do arguido BB)

B – Apreciação

Definidas as questões a tratar, importa considerar o que se mostra fixado, em termos factuais, pela instância recorrida.
Aí, foi dado como provado e não provado, o seguinte (transcrição):

II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
2.1. Factos provados:
1. No dia 19.05.2017, pelas 05:55 horas, encontravam-se no interior do bar denominado “S...”, sito na Rua ..., em ..., HH e os arguidos AA, BB, CC, FF e EE;
2. Nesse local e por motivo não concretamente apurado, os arguidos decidiram, de forma conjugada e em comunhão de esforços e de intenções, agredir fisicamente HH;
3. Nessa sequência, no interior desse estabelecimento e à hora supra referida em 1., o arguido AA dirigiu-se para junto de HH, aproximando-se deste pelas costas e desferiu-lhe um murro, acertando-lhe na zona da cabeça;
4. Após, o arguido EE aproximou-se de HH e, munido com uma cadeira, desferiu-lhe uma pancada, acertando-lhe na zona da cabeça;
5. Após, os demais arguidos BB, CC e FF aproximaram-se de HH e começaram todos a desferir pontapés no corpo de HH, aproveitando o facto de este se encontrar prostrado no chão e acertando-lhe, entre outros locais do corpo, no braço esquerdo e cabeça;
6. Mercê da conduta dos arguidos, HH sofreu dores nas zonas corporais atingidas e apresentava no crânio, tumefações na região frontal esquerda com equimose inclusa que mede, 4*1 centímetros; na região frontal direita com escoriações inclusas numa área de 5*5,3 centímetros, e na região retroauricular esquerda uma ferida contusa com 6*4 centímetros e ainda crosta com serosidade; uma fratura do dente do ciso inferior direito, e no membro superior esquerdo uma escoriação longitudinal com 2 centímetros no terço médio da face posterior do antebraço;
7. Mercê das agressões que foi alvo, HH perdeu temporariamente a consciência;
8. Tais lesões determinaram, de forma directa e necessária, um período de 8 dias para a cura, com 2 dias de afectação da capacidade de trabalho profissional e da capacidade de trabalho geral;
9. Os arguidos agiram de forma livre, deliberada e conscientemente, em conjunto e comunhão de esforços, com o idêntico propósito de ofender o corpo de HH, resultado que lograram atingir;
10. Com a conduta descrita, sabiam os arguidos que lesavam o corpo do ofendido e, não obstante tal conhecimento, decidiram agir como agiram;
11. Os arguidos sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal; Mais se provou:
12. O arguido AA é solteiro;
13. Reside com a namorada, a filha e a mãe em casa própria, sem crédito bancário acoplado;
14. Tem uma filha com 6 anos de idade;
15. É proprietário de um veículo automóvel da marca ... do ano de 2006;
16. Não é proprietário de prédios;
17. Não tem créditos bancários;
18. Exerce a profissão de vendedor ambulante auferindo dessa actividade a quantia mensal que cifra entre €600,00 a €700,00;
19. Como habilitações literárias tem o 6.º ano de escolaridade;
20. O arguido BB é divorciado;
21. É empresário no ramo do alojamento turístico e da hotelaria;
22. Da sua actividade aufere mensalmente a quantia de €1.500,00;
23. Tem uma filha com 12 anos de idade;
24. Paga alimentos à filha na quantia mensal de €287,50;
25. Reside com a namorada em casa arrendada despendendo a título de renda a quantia mensal de €500,00;
26. É proprietário de dois veículos automóveis, um da marca ... do ano de 2017 e um outro da marca ... do ano de 2000;
27. Não é proprietário de prédios;
28. Não tem créditos bancários;
29. Como habilitações literárias tem o 11.º ano de escolaridade;
30. O arguido CC é solteiro;
31. Nasceu em ambiente familiar afectuoso e equilibrado;
32. É o mais velho de três irmãos;
33. Beneficia do suporte afectivo dos progenitores;
34. Tem uma filha com três anos de idade com quem reside de domingo a quarta feira; 35. O arguido, em outubro de 2021, abriu um clube noturno e de dança que explora como apoio de dois funcionários, auferindo dessa actividade quantia que cifra entre €1.200,00 e €1.300,00;
36. Reside sozinho em casa arrendada e com a filha de domingo a quarta feira despendendo a título de renda a quantia mensal de €1.000,00;
37. Não tem créditos bancários;
38. Não é proprietário de prédios;
39. Como habilitações literárias tem o 9.º ano de escolaridade;
40. O FF é solteiro;
41. Não aufere qualquer quantia a título de pensão;
42. Não é proprietário de veículos automóveis;
43. Não é proprietário de prédios;
44. EE é solteiro;
45. EE provém de uma família carenciada e monoparental;
46. É o mais novo de três irmãos;
47. Emigrou para a ..., onde reside;
48. Reside em casa arrendada despendendo a título de renda a quantia mensal de €500,00;
49. Trabalha no restaurante de um hotel, auferindo o vencimento mensal de aproximadamente €900,00;
50. É proprietário de um veículo automóvel da marca ...;
51. Tem um filho de 10 anos de idade;
52. Paga alimentos ao filho na quantia mensal de €200,00;
53. Como habilitações literárias tem o 9.º ano de escolaridade;
54. Do certificado do registo criminal do arguido AA constam as seguintes condenações:
i. Por sentença datada de 03.12.2018, transitada em julgado em 17.12.2018, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito do Processo Sumaríssimo n.º 349/17...., o arguido foi condenado pela prática de dois crimes de ameaça agravada, p. e p. pelo art.º 153º, n.º 1 e 155.º, n.º 1 do Código Penal, por factos ocorridos a 17.07.2017, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, extinta pelo cumprimento a 06.06.2019;
55. Do certificado do registo criminal do arguido BB constam as seguintes condenações:
ii. Por sentença datada de 22.03.2012, transitada em julgado em 20.04.2012, no então Tribunal de Família e Menores da comarca ..., proferida no âmbito do Processo Comum n.º 992/10...., o arguido foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143º, Nº.1 do Cód. Penal, por factos ocorridos a 09.09.2010, na pena de 130 dias de multa, à taxa diária de € 6,50, o que perfaz o total de 845,00€, extinta pelo cumprimento a 14.03.2013;
iii. Por sentença datada de 04.11.2016, transitada em julgado em 23.02.2017, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito do Processo Sumaríssimo n.º 154/16...., o arguido foi condenado pela prática de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86º, Nº.1 al. c), 2º., nº. 1 al. x) e 3º., nº. 2 al. i), da lei 5/2006, de 23 de fevereiro, por factos ocorridos a 09.04.2016, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de € 6,50, o que perfaz o total de 1.170,00€, extinta pelo cumprimento a 06.09.2017;
56. Do certificado de registo criminal do arguido CC constam averbadas as seguintes condenações:
i. Pela prática em 4 de Dezembro de 2015 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98 de 3 de Janeiro, na pena de 70 dias de multa à taxa diária de € 5,00, transitada em julgado em 2 de Fevereiro de 2016, no âmbito do processo n.º 691/15.... no Juízo de Competência Genérica ..., J..., extinta a 26 de Janeiro de 2017.
ii. Pela prática em 7 de Outubro de 2014 de um crime de receptação, previsto e punido pelo artigo 231.º do Código Penal, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de € 5,00, transitada em julgado em 31 de Outubro de 2016, no âmbito do processo n.º 454/14.... no Juízo de Competência Genérica ..., J..., extinta a 18 de Janeiro de 2017.
iii. Pela prática em 21 de Março de 2015 de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º do Código Penal, na pena de dois anos e oito meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e sujeita a regime de prova, transitada em julgado em 15 de Fevereiro de 2017, no âmbito do processo n.º 101/15.... no Juízo de Competência Genérica ..., J....
iv. Pela prática em 28 de Fevereiro de 2014 de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86º, n.º 1, alínea d), da Lei 5/2006, de 23 de Fevereira, na pena de 90 dias de multa, transitada em julgado em 13 de Fevereiro de 2017, no âmbito do processo n.º 76/14.... no Juízo de Competência Genérica ..., J..., extinta a 8 de Maio de 2017.
v. Pela prática em 12 de Abril de 2017 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98 de 3 de Janeiro, na pena de sete meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano e sujeita a condições transitada em julgado em 10 de Julho de 2017, no âmbito do processo n.º 168/17.... no Juízo de Competência Genérica ..., J..., extinta a 14 de Junho de 2020.
57. Do certificado do registo criminal do arguido FF não consta averbada qualquer condenação;
58. Do certificado do registo criminal do arguido EE constam as seguintes condenações:
i. Por sentença datada de 03.07.2007, transitada em julgado em 18.07.2007, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito do Processo Comum n.º 703/04...., o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3º, do Dec. Lei 2/98, de 3/1, por factos ocorridos a 21.08.2004, na pena de 96 dias de multa, à taxa diária de € 3,00, o que perfaz o total de €288,00, extinta pelo cumprimento a 16.04.2008;
ii. Por sentença datada de 26.05.2009, transitada em julgado em 16.06.2009, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito do Processo Comum n.º 60/08...., o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3º, do Dec. Lei 2/98, de 3/1, por factos ocorridos a 02.02.2008, na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de € 6,00, o que perfaz o total de 1.200,00€, extinta pelo cumprimento a 07.12.2011;
iii. Por sentença datada de 21.09.2009, transitada em julgado em 12.10.2009, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito doProcesso Sumário n.º 325/09...., o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3º, do Dec. Lei 2/98, de 3/1, por factos ocorridos a 18.08.2009, na pena de 5 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, pena que veio a ser revogada e determinado o cumprimento da pena de 5 meses de prisão, pena que veio a ser declarada extinta a 02.10.2015;
iv. Por sentença datada de 10.02.2011, transitada em julgado em 18.01.2012, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito do Processo Comum n.º 153/10...., o arguido foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada na forma tentada, p. e p. pelos artºs 145º, 132º, n.º 2, 2º e 23º do C.Penal, por factos ocorridos a 09.03.2010, na pena de 1 ano e 1 mês de prisão, suspensa por 1 ano e 1 mês, extinta pelo cumprimento a 18.02.2013;
v. Por sentença datada de 20.12.2012, transitada em julgado em 31.01.2013, do Juízo de Competência Genérica ..., J..., proferida no âmbito do Processo Sumário n.º 134/12...., o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelos art.º 3º, Nº.2 do Dec. Lei 2/98, de 3 de Janeiro, por factos ocorridos a 09.03.2010, na pena de 7 meses de prisão cumprida por dias livres, em 42 períodos, correspondentes a fins-de-semana e atento o arto. 45º, nºs 3 e 4, do Código Penal, extinta pelo cumprimento a 06.06.2018.
* *
2.2. Factos não provados: Não se provou:
a. Que em consequência do murro supra referido em 3. HH foi projectado para o chão, onde caiu desamparado;
b. Que no circunstancialismo supra descrito em 5. os arguidos AA e EE continuaram conjuntamente com os demais arguidos a desferir pontapés no corpo de HH.
*
Os restantes factos, não especificamente dados como provados ou não provados, constituem factos repetitivos, conclusivos ou contêm factualidade irrelevante para a decisão da presente acção penal.
Mais se consigna que as demais alterações operadas na matéria de facto provada não redundam em qualquer alteração substancial ou mesmo não substancial dos factos descritos na acusação pública, na medida em que reflectem meras concretizações dos factos pré-existentes, decorrentes da prova produzida e examinada em audiência de discussão e julgamento.

B.1. Erro de Julgamento (Ambos os recursos)

Entendem os recorrentes que o tribunal recorrido errou ao ter dado como provados os factos que permitiram a sua condenação, na medida em que, em seu entender, a prova produzida em Audiência não permitia a assunção probatória da factualidade vertida nos Artsº 2/11, tendo o tribunal, nessa apreciação, violado o princípio in dubio pro reo.
Deduzem assim os recorrentes uma impugnação da matéria de facto, traduzida num alegado erro de julgamento, com a pretensa violação do princípio in dubio pro reo.
O erro de julgamento, decorrente do Artº 412 nº3 do CPP, não é o erro-vício da sentença previsto no nº2 do Artº 410 do mesmo diploma legal.
A base de um recurso deste género, relativo à matéria de facto, é a incorrecta e deficiente apreciação da prova testemunhal produzida na audiência de julgamento, pelo tribunal recorrido, por ter valorizado, indevidamente, alguns testemunhos em detrimento de outros.
É sabido que constitui princípio geral que as Relações conhecem de facto e de direito, nos termos do estatuído no Artº 428 do CPP, sendo que, no tocante à matéria de facto, é também sabido que o Tribunal da Relação deve conhecer da questão de facto pela seguinte ordem: primeiro, da impugnação alargada, se tiver sido suscitada, incumbindo a quem recorre o ónus de impugnação especificada, previsto no Artº 412 nsº3 e 4 do citado diploma, condição para que a mesma seja apreciada e, depois e se for o caso, dos vícios a que alude o Artº 410 nº2 do aludido Código.
O erro de julgamento, ínsito no Artº 412 nº3, do CPP, ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tivesse sido feita prova, pelo que deveria ter sido considerado não provado, ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado.
Nesta situação, de erro de julgamento, o recurso quer reapreciar a prova gravada em 1ª instância, havendo que a ouvir em 2ª instância.
Neste caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão recorrida, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência de julgamento, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente, no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos nsº3 e 4 do Artº 412 do CPP.
É que nestes casos de impugnação ampla, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, agora com base na audição das gravações, antes constituindo um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorrecções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspectiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente.
E é exactamente porque o recurso em que se impugne amplamente a decisão sobre a matéria de facto não constitui um novo julgamento do objecto do processo, mas antes, um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir, cirurgicamente, erros in judicando (violação de normas de direito substantivo) ou in procedendo (violação de normas de direito processual), que se impõe, ao recorrente, o ónus de proceder a uma tríplice especificação, nos termos constantes do nº3 do Artº 412 do Código de Processo Penal.
Assim, impõe-se-lhe a especificação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, o que só se satisfaz com a indicação do facto individualizado que consta da sentença recorrida e que considera indevidamente julgado.
Mais se lhe atribui, a discriminação das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, o que se traduz na anotação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que acarreta decisão diversa da recorrida, acrescendo a necessidade de explicitação da razão pela qual essa prova implica essa diferente decisão, devendo assim, reportar o conteúdo específico do meio de prova por si invocado com o facto individualizado que considera incorrectamente julgado.
Por fim, é-lhe ainda assacada a pormenorização das provas que devem ser renovadas, o que só se compraz com a informação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em sede de 1ª instância, dos vícios referidos nas alíneas do nº2 do artº 410 do CPP e das razões para crer que aquela renovação da prova permitirá evitar o reenvio do processo (Cfr. Artº 430 nº1 do citado diploma).
No fundo, o que está em causa e se exige na impugnação mais ampla da matéria de facto, é que o recorrente indique a sua decisão de facto em alternativa à decisão de facto que consta da decisão revidenda, justificando, em relação a cada facto alternativo que propõe, porque deveria o Tribunal ter decidido de forma diferente.
Ou, por outras palavras, como se afirma no Acórdão de Fixação de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de 08/03/12, publicado no D.R., I Série, nº 77, de 18/04/12:
«Impõe-se ao recorrente a necessidade de observância de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta especificação dos concretos pontos da matéria de facto, que considera incorrectamente julgados, das concretas provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, tudo com referência ao consignado na acta, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso. Esta exigência é de entender como contemplando o princípio da lealdade processual, de modo a definir em termos concretos o exacto sentido e alcance da pretensão, de modo a poder ser exercido o contraditório.
A reapreciação por esta via não é global, antes sendo um reexame parcelar, restrito aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, necessário sendo que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam, não bastando remeter na íntegra para as declarações e depoimentos de algumas testemunhas.
O especial/acrescido ónus de alegação/especificação dos concretos pontos de discórdia do recorrente (seja ele arguido, ou assistente), em relação à fixação da facticidade impugnada, bem como das concretas provas, que, em seu entendimento, imporão (iam) uma outra, diversa, solução ao nível da definição do campo temático factual, proposto a subsequente tratamento substantivo, justifica-se plenamente, se tivermos em vista que a reapreciação da matéria de facto não é, não pode ser, um segundo, um novo, um outro integral, julgamento da matéria de facto.
Pede-se ao tribunal de recurso uma intromissão no julgamento da matéria de facto, um juízo substitutivo do proclamado na 1ª instância, mas há que ter em atenção que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em segunda instância, não impõe uma avaliação global, não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida e muito menos um novo julgamento da causa, em toda a sua extensão, tal como ocorreu na 1ª instância, tratando-se de um reexame necessariamente segmentado, não da totalidade da matéria de facto, envolvendo tal reponderação um julgamento/reexame meramente parcelar, de via reduzida, substitutivo».
Postos estes considerandos e sem os olvidarmos, é evidente, atento o seu confronto com a argumentação recursiva, que os recorrentes não deram cumprimento, ainda que de modo mínimo, à tripla exigência resultante do Artº 412 do CPP, o que logo implicaria o naufrágio dos recursos, neste segmento.
De todo o modo, atente-se na forma como na sentença recorrida se justificou a motivação da decisão de facto (transcrição):

Motivação:
Nos termos preceituados no artigo 127.º do Código de Processo Penal, “a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”, não estando o julgador subordinado a regras rígidas de prova tarifada. A convicção judicial mostra-se norteada por imperativos de busca da verdade material, num juízo que não poderá configurar arbitrariedade, devendo apresentar-se racional, ponderado, crítico, e, nessa decorrência, sindicável.
Antes do mais, cumpre explicitar que o arguido FF foi julgado na ausência, por não ter comparecido em audiência de julgamento - apesar de regularmente notificado da data de realização da mesma - razão por que não foi ouvido em declarações, encontrando-se o Tribunal desprovido da sua versão dos factos se é que a tem.
Os arguidos AA, BB, CC e EE, após serem devidamente esclarecidos no que respeita ao direito que lhe assiste ao silêncio, pretenderam prestar declarações sobre os factos que se lhe imputam nos autos.
Atentemos.
AA nas declarações que prestou referiu que no dia 19.05.2017 encontrou HH no bar N... e que este estava alterado e a querer “picardia” e que, por isso, saiu desse bar e foi para o bar S...; que decorridos alguns minutos chegou a esse bar HH acompanhado de II; asseverou que estava encostado ao balcão e “ele pergunta o que queres beber” com “voz de arrogância” e faz um gesto com o copo “ainda me molha” e “agarrei-me a ele e caímos os dois no chão” aduzindo que “ele estava feito para mim e eu para ele”; ele estava à “procura de problemas” e já agarrados um ao outro “houve um soco de uma parte e de outra” e caímos no chão e “veio o amigo dele tentar bater-me” - referindo-se à testemunha II; perguntado se só se envolveram os dois referiu que, nesse momento, foram apenas os dois; mais esclareceu que “se envolveram” e foi a correr para a rua atrás da testemunha II, por este o ter agredido e embora tenha tentado entrar novamente no bar tal não lhe foi permitido; no mais, negou a prática dos factos e afiançou que na actualidade é amigo de HH.
O arguido BB nas declarações que prestou referiu tão só que nessa noite estava no bar N... e que quando se deslocou para o bar S... “já estava instalada a confusão” e, no mais, negou a prática dos factos que lhe são imputados.
O arguido EE, por seu turno, referiu que nessa noite, pelas 5:50 horas, estava a trabalhar como relações públicas do bar S...; explicou que viu os outros arguidos nesse bar esclarecendo que o arguido BB estava junto ao bar; que se apercebeu que estava a existir uma confusão e viu o arguido AA e o HH presentes; afiançou que, nesse momento, já não se estavam a agredir; no tocante aos factos que lhe são imputados negou a prática dos factos; mais referiu que deu o alerta da confusão ao barman e que também foi “tentar separar” asseverando “que foi tentar acalmar” a situação até o segurança chegar; perguntado disse que o bar nessa noite estava cheio e que com a referida confusão algumas pessoas saíram do bar; esclareceu que nessa noite não bebeu porque estava ali a trabalhar e perguntado confirmou que o ofendido saiu do bar pelo próprio pé e mais de relevante não disse.
O arguido CC negou a prática dos factos que lhe são imputados aduzindo que “viu uma confusão, mas não tem nada a ver com isso”.
Procedeu-se, ainda, à inquirição das testemunhas HH, II e GG.
Atentemos ao depoimento de cada uma destas testemunhas.
HH referiu que em data que não logrou precisar se deslocou ao estabelecimento S..., com o intuito de beber uma bebida, conjuntamente com o seu amigo II; que foi abordado pelo arguido AA que lhe disse que não podia estar ali naquele local; que não lhe respondeu e dirigiu-se ao bar para pedir uma bebida; que após pedir a bebida levou um soco na face “que até me partiu o dente” do lado direito, o qual desferido pelo arguido AA que estava pelas suas costas e “virei-me e levei com um banco na cabeça”, desta feita, pelo arguido EE e em seguida os arguidos CC, DD e BB deram-lhe pontapés e socos, no corpo todo, aduzindo que foi “levando porrada até ficar inconsciente”; explicou que não lhe é possível recordar-se se os arguidos CC, DD e BB lhe desferiu, em concreto, um murro ou um pontapé mas “sei que me agrediram” afiançando que até perder os sentidos teve consciência de quem o agrediu; esclareceu que houve o primeiro murro e o arremesso da cadeira e que após lhe terem sido desferidos pontapés e socos até cair ao chão; esclareceu que já no chão continuou a tentar defender-se das agressões até perder a consciência; afiançou ainda que existiram outras pessoas que o agrediram mas asseverou que só logrou identificar os ora arguidos; relatou ainda que quando recuperou a consciência e recuperou pegou no carro e foi para casa e só no dia seguinte é que se deslocou ao hospital. Mais referiu que a testemunha II estava consigo e assistiu ao que tinha sucedido; por fim, explicou que sofreu dores e asseverou que nos dias seguintes não foi trabalhar atento o aspecto físico em que a sua cara se encontrava; perguntado disse que os arguidos estavam no mesmo grupo e mais de relevante não disse.
II referiu que no dia em que os factos terão sucedido saiu à noite para tomar um copo com o seu amigo HH e que o arguido AA acompanhado de alguns dos arguidos, que não logrou precisar, abordou o seu amigo e lhe disse “o que é que estás aqui a fazer; porque é que estás aqui” e que saíram desse bar, “não aconteceu nada” e foram para outro bar onde “sucedeu a situação” e “houve outra vez aquela troca de palavras” e “o AA desferiu um golpe e de seguida levou uma cadeirada e acabou por desmaiar” acrescentando a testemunha que “fiquei em choque”; mais esclarecendo que o arguido AA lhe deu um soco na cara “frente a frente e em pé” explicitando que estava na retaguarda do Sr. HH a uma distância de cerca de 5 metros e os arguidos fizeram em cerco em redor; perguntado quem lhe deu a cadeirada na cabeça disse que tem ideia que foi o arguido EE apontando para o mesmo esclarecendo depois que não sabe precisar mas afiançando que o mesmo também se encontrava no local; aduzindo que “foi tudo muito rápido”; explicou que depois desferiram socos e pontapés, em número não concretamente apurado, no corpo do seu amigo HH já deitado no chão aduzindo que “talvez fossem todos menos o JJ que ficou na mesma posição” asseverando que este arguido “acabou por não dar continuidade”; mais refere que estavam rodeados por volta de sete elementos e também “levei alguns golpes” e sai do bar “nem sei como consegui sair” insistindo que foi tudo muito rápido; explicou que horas depois falou com o HH e questionado se àquela hora existiam muitos clientes no bar disse que “haviam muito poucos”; perguntado disse que o arguido AA primeiramente desferiu um murro, após foi agredido com uma cadeirada, ficou inconsciente cai no chão e continuou a levar murros e pontapés.
GG referiu que na noite em que os factos terão sucedido estava a trabalhar como porteiro no bar S...; que “não viu nada” e quando chegou ao local - chamado por um cliente que não logrou identificar - o ofendido HH já estava prostrado no chão e encontrava-se inconsciente; que decorridos entre 5 a 10 minutos o ofendido levantou-se e foi embora; perguntado disse que arguidos nessa noite tinham estado no bar excepção feita ao arguido BB afiançando quanto a este arguido que o mesmo, nessa noite, não estava dentro do bar não obstante asseverar outrossim que o bar estava cheio “100 pessoas” e mais de relevante não disse.
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Levou-se ainda em consideração os demais elementos de prova constantes dos autos, em concreto:
- o teor do auto de denúncia de fls. 3;
- o teor do relatório de avaliação do dano corporal, de fls. 5 e 6;
- o escrito, de fls. 54;
- os fotogramas, de fls. 55.
- o teor dos certificados de registo criminal dos arguidos, de fls. 431 (referente ao arguido FF), de fls. 432 e 433 (referente ao arguido AA), de fls. 434 a 436 (referente ao arguido BB), fls. 437 a 442 (referente ao arguido CC) e de fls. 443 a 448 (referente ao arguido EE).
- o teor dos relatórios sociais respeitantes aos arguidos CC e EE, constante das ref.as citius n.os 1081236 e 10246710.
- resultados das pesquisas efecuadas nas bases de dados, constantes das ref.ª citius n.os 124892265, 1248992280, 124892302, 124892552, 124892559, 124892563, 124892569, 124892575, 124892582 e 124892591.
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Concretizando:
No que concerne aos factos consignados supra nos pontos 1 a 8, a convicção do Tribunal assentou, essencialmente, no teor dos depoimentos de HH e II prestados de forma credível, isenta e circunstanciada. As referidas testemunhas veicularam versões fácticas dos acontecimentos globalmente coincidentes e apenas divergentes em pontos não essenciais - discrepâncias essas que, para além de assumirem foros de normalidade, tendo em conta a intensidade da situação experienciada, de ocorrência rápida “foi tudo muito rápido”, contribuiu para reforçar a credibilidade dos seus depoimentos, na medida em que afastou um cenário de concertação prévia dos mesmos.
As referidas testemunhas relataram, de forma pormenorizada, a sucessão de acontecimentos que se verteu na materialidade fáctica julgada demonstrada e revelaram fluidez no discurso e imparcialidade ao não veicularem uma versão hiperbolizada do sucedido.
Quanto às lesões concretamente infligidas pelos arguidos na pessoa de HH, impõe-se igualmente considerar os depoimentos de HH e II.
Para prova do necessário nexo causal entre as lesões constatadas no corpo do ofendido e a conduta dos arguidos, levou-se ainda em consideração o teor do relatório de perícia de avaliação do dano corporal em direito penal, de fls. 5 e 6.
O relato do ofendido posterga, como é evidente, a versão dos factos carreada para o processo pelos arguidos que com um discurso parco em pormenores se limitam a negar na sua generalidade a prática dos factos, o que fizeram, todos eles excepção feita ao arguido DD, julgado na ausência, com uma narrativa ligeira, inconsistente e inverosímil.
Pelo que, numa ponderação conjunta, à luz das regras de experiência comum e de normalidade do acontecer, de todos os aludidos elementos - a saber, as declarações dos arguidos; os depoimentos do ofendido e das testemunhas II e GG e os sobreditos elementos documentais juntos aos autos - permitem concluir que os factos ocorreram talqualmente descritos pelo ofendido e, nesta decorrência, o Tribunal não teve qualquer dúvida em considerar provados os factos supra consignados nos pontos 1 a 8.
Os elementos subjectivos da incriminação, constantes supra dos pontos 9 a 11 dos factos provados, resultam inferidos da materialidade dos factos dados como provados e da ressonância ético-jurídica da protecção da integridade física, que torna ao alcance de qualquer cidadão o conhecimento da proibição jurídico-penal daqueles actos e, ainda, dos factos concretamente imputados aos arguidos, julgados provados nesta instância, os quais, com a sua conduta, não poderiam deixar de estar conscientes de que se encontravam a lesar a integridade física do ofendido, agindo intencionalmente.
As condições pessoais, sociais e familiares dos arguidos, descritas supra nos pontos 12 a 53, sobrevieram das declarações dos próprios arguidos em audiência de julgamento - excepção feita ao arguido DD, por ter sido julgado na ausência - as quais se reputaram plausíveis e, nessa medida, atendíveis, à míngua de outros elementos de prova que neste circunstancialismo factual pudessem mostrar-se relevantes. Além disso, no que respeita aos arguidos CC e EE para lá das declarações prestadas pelos próprios atendeu-se outrossim ao teor dos relatórios sociais juntos aos autos com as ref.as citius n.os 1081236 e 10246710. Para lá destes elementos foram ainda valorados os resultados das pesquisas efectuadas a juntos com as ref.ª citius n.os 124892265, 1248992280, 124892302, 124892552, 124892559, 124892563, 124892569, 124892575, 124892582 e 124892591.
A prova dos antecedentes criminais dos arguidos e a ausência de antecedentes criminais por parte do arguido DD - vd. pontos 54 a 58 dos factos provados - decorreu do teor dos certificados de registo criminal dos arguidos, de fls. 431 (referente ao arguido FF), de fls. 432 e 433 (referente ao arguido AA), de fls. 434 a 436 (referente ao arguido BB), fls. 437 a 442 (referente ao arguido CC) e de fls. 443 a 448 (referente ao arguido EE).
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O juízo valorativo acerca da factualidade constante supra das alíneas a) a b) dos factos não provados decorreu da ausência de prova da sua ocorrência, maxime da circunstância de o próprio ofendido HH a ter infirmado ao explicar a sucessão do acontecimento.

Lendo o teor das motivações de recurso, facilmente se compreende que o que há, da parte dos recorrentes, é a invocação de um erro de julgamento, apontando uma deficiente valoração probatória no que toca à matéria que lhes era imputada, entendendo que uma apreciação crítica do conjunto da prova produzida teria de levar, necessariamente, a conclusão contrária da assumida pelo tribunal recorrido, no sentido de dar por assente todos os factos alegados na sua acusação.
Lendo o texto das motivações dos recursos – que as conclusões reproduzem por súmula - verifica-se que as recorrentes invocam este vício porque discordam da forma como o tribunal deu como provados os factos que levaram à sua condenação.
Com efeito, em abono de tal invocação aduzem que o tribunal a quo cometeu esse erro por ter dado como provados os factos valorando o depoimento do ofendido HH e da testemunha II, sem atentar, quer nas suas próprias declarações, quer na testemunha GG, que, estando presente, não viu qualquer agressão cometido pelos arguidos.
Nesta medida, aquilo que os recorrentes trazem á liça é, unicamente, a sua discordância com o tribunal julgador no tocante à apreciação que este fez da prova, pretendendo sobrepor a sua perspectiva pessoal à livre convicção daquele tribunal, mas esquecendo que esta, neste domínio, se impõe soberanamente sem outros limites para além dos que a lei assinala.
A base de um recurso relativo ao erro de julgamento, é, como se disse, a incorrecta e deficiente apreciação da prova testemunhal produzida na audiência de julgamento, pelo tribunal recorrido, por ter valorizado, indevidamente, alguns testemunhos em detrimento de outros.
Os recorrentes não referem quais são os meios de prova - em concreto, por referência aos momentos dos respectivos depoimentos - que implicam uma conclusão factual diversa da que foi assumida pelo tribunal recorrido, limitando-se a apelar, no fundo, às suas próprias declarações e entendendo que o depoimento do ofendido e da testemunha II, não merecem credibilidade.
Numa palavra, o dissídio dos recorrentes não assenta em qualquer divergência entre o que afirmam ter sido dito no decurso da audiência de e aquilo que quem julgou diz que se disse, nessa mesma ocasião, mas apenas e tão só, na avaliação que fazem da prova que ali foi produzida.
Ora, o tribunal recorrido explicou, com suficiência bastante, as razões pelas quais valorizou o depoimento do ofendido HH, o qual foi corroborado pelo testemunho de II, em termos que aqui e agora nos dispensamos de reproduzir e que, sem dúvidas e em termos que não suscitaram dúvidas ao tribunal recorrido, descreveram as agressões em causa – documentadas pela perícia médica constante dos autos - imputando-as aos arguidos e explicitou também, de forma a não deixar dúvidas, as razões pelas quais não aceitou os depoimentos destes.
Considerada a prova produzida, inexistem motivos que justifique qualquer alteração desta convicção probatória, sendo que a mesma se apresenta conforme, quer com tal prova, quer com as regras de experiência e o sentido das coisas, até porque a interpretação e a valoração concertadas dos meios de prova, são efectuadas nos termos do Artº 127 do CPP - princípio da livre apreciação da prova – onde se estipula que: Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
Tal princípio assenta, fundamentalmente, em duas premissas:
A de que o juiz decide de forma livre e de acordo com a sua íntima convicção, formada a partir do confronto das provas produzidas em audiência.
E que tal convicção há-de ser formada com base em regras de experiência comum.
Nestes termos, o juiz não está sujeito a critérios de valoração de cada um dos meios probatórios, legalmente pré-determinados, sistema da prova legal, sendo o tribunal livre na apreciação que faz da prova e na forma como atinge a sua convicção.
Contudo, sendo esta uma apreciação discricionária, não é a mesma arbitrária, tendo a referida apreciação os seus limites.
Não verdade, livre convicção não pode ser sinónimo de arbitrariedade.
Ou seja, a livre apreciação da prova tem sempre de se traduzir numa valoração "racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência (…), que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão” de modo a que seja possível, por qualquer pessoa, entender porque é que o tribunal se convenceu de determinado facto, ou, dito de outro modo; porque é que o juiz conferiu credibilidade a uma testemunha e descredibilizou outra, por exemplo.
«A sentença, para além dos factos provados e não provados e da indicação dos meios de prova, deve conter os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, constituam o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados na audiência»- Ac. do STJ de 13/02/92, CJ Tomo I, pág. 36.
O que o juiz não pode fazer nunca é decidir de forma imotivada ou seja, decidir sem indicar o iter formativo da sua convicção, « é o aspecto valorativo cuja análise há-de permitir (…) comprovar se o raciocínio foi lógico ou se foi racional ou absurdo» (Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, II, pág. 126 e sgs.).
Como se diz no Ac. da Relação de Coimbra, de 18/02/09, proferido no proc. 1019/05.0GCVIS.IC, disponível em www.dgsi.pt:
“A sindicância da matéria de facto na impugnação ampla, ainda que debruçando-se sobre a prova produzida em audiência de julgamento, sofre quatro tipos de limitações (cfr ac. do S.T.J., em acórdão de 12 de Junho de 2008 (Processo:07P4375, www.dgsi.pt):
1º) – A que decorre da necessidade de observância pelo recorrente do mencionado ónus de especificação, pelo que a reapreciação é restrita aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, sendo necessário que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam;
2º) – A que decorre da natural falta de oralidade e de imediação, com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações;
3ª) – A que resulta da circunstância de a reponderação de facto pela Relação não constituir um segundo/novo julgamento, cingindo-se a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disse;
4ª) – A que tem a ver com o facto de ao tribunal de 2.ª instância, no recurso da matéria de facto, só ser possível alterar o decidido pela 1.ª instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida (al. b) do n.º3 do citado artigo 412.º)”.
Bem andou assim o tribunal recorrido, pois a factualidade provada e não provada configura-se como adequada às regras de experiência, à normalidade da vida e à razoabilidade das coisas, razão pela qual, não merecendo censura, não é sindicável por este tribunal, inexistindo por isso motivos para ser alterado.
No confronto entre as duas versões em causa – a dos arguidos e da testemunha GG e a do ofendido e da testemunha II – o tribunal optou por aquela que era sustentada pelos meios de prova produzidos, quer de prova directa, quer de prova circunstancial, em detrimento de uma outra sem qualquer corroboração em meios de prova fiáveis e violadora da normalidade das coisas e das regras de experiência.
O modo de valoração das provas e o juízo resultante dessa mesma aferição, efectuado pelo tribunal a quo, ao não coincidir com a perspectiva das recorrentes nos termos em que esta as analisa e nas consequências que daí derivam, não traduz, face ao que se expôs, qualquer erro ou vício.
Importa trazer à colação o já afirmado em Acórdão deste Tribunal da Relação, em 03/05/07, proferido no processo n.º 80/07-3 disponível no sítio da internet www.dgsi.pt:
«O erro na apreciação das provas relevante para a alteração da decisão de facto pressupõe, pois, que estas (as provas) deveriam conduzir a uma decisão necessária e forçosamente diversa e não uma decisão possivelmente diferente; se a interpretação, apreciação e valoração das provas permitir uma decisão, diversa da proferida, mas sem excluir logicamente a razoabilidade desta, neste caso pode haver erro na apreciação das provas, mas não será juridicamente relevante para efeitos de modificação da matéria de facto pelo Tribunal Superior; a decisão proferida com base numa interpretação e valoração (ainda que discutíveis) fundamentadas nas provas produzidas contida no espaço definido pela livre apreciação das provas e pela convicção por elas criada no espírito do juiz, não pode ser alterada, a menos que contra ela se apresentem provas irrefutáveis, já existentes nos autos e desconsideradas ou supervenientes.
Por outras palavras: a sindicância da decisão de facto deve limitar-se à aferição da sua razoabilidade em face das provas produzidas …
… A segunda instância em matéria de facto não vai à procura de uma nova convicção (que lhe está de todo em todo vedada exactamente pela falta desses elementos intraduzíveis na gravação da prova), mas tão só apreciar se a convicção expressa pelo tribunal a quo na decisão da matéria de facto tem suporte razoável …»
A decisão, nesta matéria, do tribunal recorrido, foi proferida com base numa interpretação e valoração que se mostra suficientemente fundamentada, quer nas provas produzidas, quer pela livre convicção por elas criada no espírito do julgador, só podendo ser alterada, se contra si se apresentassem meios de prova irrefutáveis, existentes nos autos e que tivessem sido desconsiderados, ou se a mesma se configurasse como totalmente irrazoável, contrária às mais elementares regras de experiência ou ao sentido das coisas.
Mas nenhuma destas condições é o caso sub judice, em que o decidido pelo tribunal recorrido, se desenha com lógica e razoabilidade necessárias, de modo que se deve concluir como no aresto citado: «… se a interpretação, apreciação e valoração das provas permitir uma decisão, diversa da proferida, mas sem excluir logicamente a razoabilidade desta, neste caso pode haver erro na apreciação das provas, mas não será juridicamente relevante para efeitos de modificação da matéria de facto pelo Tribunal Superior
Discordar, sem qualquer fundamento legal, leva simplesmente à sua improcedência, como já por este Tribunal foi afirmado em Acórdão de 23/03/01 : «A divergência quanto à decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto será relevante na Relação apenas quando resultar demonstrada pelos meios de prova indicados pelo recorrente a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, sendo necessário para que ele se verifique, que os mencionados meios de prova se mostrem inequívocos no sentido pretendido pelo recorrente».
O presente tribunal só poderia assim alterar o decidido factualmente pela 1ª instância se existissem provas nos autos que impusessem decisão diferente e in casu, embora a prova produzida, eventualmente e no entendimento dos recorrentes, permitisse uma decisão de facto em sentido diverso, ela não impunha decisão distinta, pelo que o por si pretendido está destinado ao fracasso.
Por outro lado, ao ter assim decidido, em caso algum se desenha uma violação do princípio in dubio pro reo, na medida que esta só ocorre, quando, em sede de prova, perante uma dúvida objectiva e intransponível, o tribunal decide desfavoravelmente ao arguido.
Sendo ele uma emanação do princípio constitucional da presunção de inocência, surge como resposta ao problema da incerteza em processo penal, impondo a absolvição do acusado quando a produção de prova não permita resolver a dúvida inicial que está na base do processo.
Se, a final, persistir uma dúvida razoável e insanável acerca da culpabilidade ou dos concretos contornos da actuação do acusado, esse non liquet na questão da prova terá de ser resolvido a seu favor, por imposição do estatuído no Artº 32 nº1 da Constituição da República Portuguesa.
Mas esta dúvida não é a que os recorrentes entendem que o tribunal deveria ter tido, mas antes, a que o tribunal, efectivamente, teve.
Ora, resulta com toda a clareza da fundamentação da sentença recorrida, que não existiu qualquer dúvida no espírito do julgador, na construção do esqueleto factual dos autos, após a apreciação, livre, mas responsável, livre, mas motivada, da prova produzida em Audiência de Julgamento, corroborada com a já existente nos autos.
Nessa medida, não tem cabimento a aplicação do referenciado princípio in dubio pro reo, pois o tribunal a quo entendeu que havia sido produzida suficiente prova do cometimento dos factos pelos arguidos, entendimento que foi sufragado ao abrigo do já escalpelizado princípio da livre apreciação da aprova, ínsito no Artº 127do CPP.
Inexistindo assim qualquer erro na avaliação da prova por banda do tribunal a quo, ter-se-á que finalizar pela improcedência do recurso do arguido CC, bem como, do recurso do arguido BB, nesta parte.

B.2. Crime de participação em rixa (Recurso do arguido BB)

Insurge-se ainda o recorrente BB quanto à qualificação jurídica dos factos dados como provados, pois em seu entender estes apenas poderiam integrar a prática de um crime de participação em rixa, p.p., pelo Artº 151 nº1 do C. Penal.
A ausência de razão do recorrente é manifesta.
Como ensina a jurisprudência, no crime desenhado no Artº 151 nº1 do C. Penal, pune-se a situação de conflito ou de desordem, com intervenção de duas ou mais pessoas, sem que seja possível individualizar ou distinguir a conduta de cada um dos contendores, sendo seguro que tal punição é afastada no caso de se provar a responsabilidade em crime de homicídio ou de ofensas à integridade física, porquanto, nesta situação, a sanção por algum destes dois ilícitos afasta o desenho da participação em rixa que é, nesses termos, consumida pelo enquadramento criminal daqueles ilícitos mais gravosos. (Cfr. neste sentido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03/04/08, disponível em www.dgsi.pt.).
Ora, in casu, resulta, com clareza, da factualidade apurada, que os ora recorrentes, juntamente com os restantes arguidos, agrediram o ofendido, com socos e pontapés, o que fizeram de forma livre, deliberada e intencional, não se colocando, ainda que de modo incipiente, a existência de qualquer situação de contenda, caracterizada pela oposição dos contendores e que poderia qualificar o circunstancialismo dos autos como participação em rixa.
Torna-se pois evidente e sem necessidade de maiores considerações, que, em face da factualidade dada como provada, dúvidas não podem restar que a conduta dos arguidos não integra o crime de participação em rixa, como reclamado pelo recorrente BB, nada havendo a censurar ao enquadramento jurídico-criminal realizado pela instância sindicada.
Improcede, assim, o recurso deste arguido, neste domínio.


B.3. Cumplicidade ao invés de co-autoria (Recurso do arguido BB)

Por fim, defende o arguido BB que a sua conduta apenas poderia ser punida a título de cumplicidade.
Também aqui, a improcedência do recurso é de leitura meridiana.
Como se sabe, são elementos da co-autoria:
- a intervenção directa na fase de execução do crime (“execução conjunta do facto”);
- o acordo para a realização conjunta do facto, acordo esse que não pressupõe a participação de todos na elaboração do plano comum de execução do facto, nem tem que ser expresso, podendo manifestar-se através de qualquer comportamento concludente, com a existência da consciência e vontade de colaboração (aferidas à luz das regras da experiência comum), não tendo ainda de ser prévio ao início da prestação do contributo do co-autor;
- o domínio funcional do facto, no sentido de o agente “deter e exercer o domínio positivo do facto típico”, ou seja, o domínio da sua função, do seu contributo, na realização do tipo, de tal forma que, numa perspectiva “ex ante”, a omissão desse contributo impediria a realização do facto típico na forma planeada.
Por outro lado, quanto à execução propriamente dita, não é exigível que cada agente intervenha em todos os actos necessários à produção do resultado, bastando que a actuação de cada um seja indispensável à produção do resultado global.
Deste modo, ao elemento objectivo – a prática, por cada um dos agentes de, pelo menos, uma parte dos actos típicos -, acresce o elemento subjectivo – à soma dos actos dos vários agentes, preside um desígnio comum, qual fio condutor a uniformizar as condutas de cada um dos agentes, permitindo a imputação a todos do resultado típico, na sua globalidade.
Tal desígnio uniformizador poderá ser expresso ou tácito, podendo inferir-se dos actos materiais praticados, como atrás se referiu.
Revertendo para o caso em apreciação e tendo por base a factualidade dada como assente, apelando às regras da experiência e à lógica do raciocínio suficientemente plasmado no texto decisório, é facilmente apreensível a existência de um plano previamente traçado entre os arguidos – não carecendo de ser prévio à execução do facto típico, bastando que ocorra entre o início e o seu termo – e a execução conjunta desse plano.
Nessa medida, plasmou-se em tal factualidade, que o ora recorrente actuou conjuntamente e em comunhão de esforços com os demais arguidos, com o idêntico propósito de ofender o corpo de HH, resultado que lograram atingir, sendo evidente que os arguidos sabiam que lesavam o corpo do ofendido e que as suas condutas eram proibidas e punida por lei, o que não obstou a que agissem como agiram.
É pois indiscutível, que os arguidos se constituíram co-autores de um crime de ofensa à integridade física qualificada, como foi concluído pela instância recorrida, nada havendo a censurar, também aqui, ao decidido.
Improcede, nesta medida, o recurso do arguido BB.

3. DECISÃO

Nestes termos, decide-se negar provimento aos recursos e em consequência, manter, na íntegra, a sentença recorrida.
Custas a cargo dos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça, atendendo ao trabalho e complexidade das questões suscitadas, em 3 UC, ao abrigo do disposto nos Arts 513 nº 1 e 514 nº 1, ambos do CPP e 8 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa.
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Consigna-se, nos termos e para os efeitos do disposto no Artº 94 nº2 do CPP, que o presente acórdão foi elaborado pelo relator e integralmente revisto pelos signatários.
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Évora, 24 de Janeiro de 2023
Renato Barroso (Relator)
Maria Fátima Bernardes (Adjunta)
Fernando Pina (Adjunto)