EXECUÇÃO
ENCARREGADO DE VENDA EXTRAJUDICIAL
REMUNERAÇÃO
VALOR
ACORDO EXISTENTE
VALIDADE
Sumário

1. Nos termos do n.º 6 do Art.º 17.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, é ao Juiz da Execução que compete a fixação da remuneração devida ao Encarregado de Venda extrajudicial até ao limite de 5% do valor da causa ou dos bens vendidos.
2. Qualquer eventual acordo havido entre o Agente de Execução e o Encarregado de Venda, relativamente ao valor devido por essa remuneração, é inoponível às partes no processo executivo, que delas não tiveram conhecimento (cfr. Art.º 406.º n.º 2 do C.C.), ou ao tribunal onde pende a execução.

Texto Integral

Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I- RELATÓRIO
No âmbito da ação de execução para pagamento de quantia certa, que corre termos sob a forma sumária do processo de execução, em que o Bank - Sucursal Em Portugal demanda M… e J…, pedindo que os executados lhe paguem a quantia total de €364.171,66, acrescida de juros vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento (cfr. “Requerimento Executivo” de 07-02-2014 – Ref.ª n.º 3719184 - p.e.), veio a ser penhorado um imóvel aos executados (cfr. “Auto de Penhora Editável (AE)” de 22-08-2014 – Ref.ª n.º 4092457 - p.e.).
Por decisão judicial proferida em auto de abertura de propostas em carta fechada, veio a ser determinada a venda desse imóvel por negociação particular pelo valor base de €516.120,00, sendo o valor para venda de €438.702,00 (cfr. “Auto” de 27-09-2016 – Ref.ª n.º 102071466 – p.e.).
O Agente de Execução, que havia sido nomeado para encarregado de venda nesse auto, notificou os executados de que poderia delegar essa função em empresa especializada para a realização dessa venda, nos termos do Art.º 833.º do C.P.C. (cfr. “Notificação ao executado (outra) (AE)” de 29-09-2016 – Ref.ª n.º 8147351, n.º 8147453, n.º 8147465 e n.º 8147468 - p.e.) e, como não houve oposição expressa a essa possibilidade, veio a notificar a L…, S.A. da sua nomeação para o exercício do cargo de encarregada de venda (cfr. “Notificação (outras) (AE)” de 12-10-2016 – Ref.ª n.º 8228905 - p.e.), notificando igualmente, na mesma data, as partes dessa decisão e dando dela conhecimento ao juiz de execução (cfr. “Junção de documentos (AE)” de 12-10-2016 – Ref.ª n.º 8229034 - p.e.).
No exercício das funções de encarregado de venda, a L…, S.A. apresentou várias propostas, tendo por decisão do Agente de Execução, de 20 de junho de 2017, sido aceita uma proposta final no valor de €501.000,00 (cfr. “Requerimento para outras questões” de 12-06-2017 – Ref.ª n.º 10061828 - p.e.), vindo posteriormente a ser junta aos autos a correspondente escritura de compra e venda do imóvel penhorado (cfr. “Junção de documentos (AE)” de 04-07-2017 – Ref.ª n.º 10226510 - p.e.).
Nessa sequência o Agente de Execução veio a transferir o valor de €30.811,50 a favor da L…, S.A. para liquidação da remuneração devida ao encarregado de venda (cfr. “Pagamento de serviços (AE)” de 11-07-2017 – Ref.ª n.º 10276143 - p.e.).
Sucede que, ambos os executados vieram apresentar reclamação contra a remuneração paga ao encarregado de venda. A executada, para além da anulação da venda, explicitamente pediu a anulação do valor pago à leiloeira e a devolução ao processo do montante pago, no valor de €30.811,50, por haver omissão nos autos da informação deste encargo (cfr. “Execução - Reclamação de ato” de 04-09-2017 – Ref.ª n.º 10579736 - p.e.). Já o executado pediu essencialmente a anulação da venda (cfr. “Execução - Reclamação de ato” de 14-09-2017 – Ref.ª n.º 10650922 - p.e.).
Nesta sequência sucederam-se os esclarecimentos solicitados diretamente ao Agente de Execução, que acabou por informar que a remuneração paga ao encarregado de venda se referia à aplicação da percentagem de 5% sobre o valor do produto da venda, acrescido de IVA, conforme fatura que havia sido apresenta para pagamento (cfr. “Resposta a Solicitação do Tribunal (AE)” de 07-02-2018 – Ref.ª n.º 11675445 - p.e.), sendo que anteriormente já havia esclarecido que as partes processuais não se haviam pronunciado relativamente à matéria de remuneração do encarregado de venda e, por isso, atendendo à fatura emitida pela empresa nomeada para esse efeito, procedeu ao pagamento da comissão pelo valor de 5% do produto da venda (cfr. “Resposta a Solicitação do Tribunal (AE)” de 30-11-2018 – Ref.ª n.º 13642119 - p.e.).
É assim que vem a ser proferido o despacho datado de 20 de fevereiro de 2020 (Cfr. “Despacho” de 20-02-2020 – Ref.ª n.º 123984296 - p.e.), com o seguinte teor:
«Dispõe o n.º 6 do artigo 17.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro: “Os liquidatários, os administradores e as entidades encarregadas da venda extrajudicial recebem a quantia fixada pelo tribunal, até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados”
«Assim, entende o tribunal adequado fixar em 2% o valor da remuneração do Encarregado de Venda, pague-se as despesas apresentadas.
«DN».
Esse despacho não foi notificado à L…, S.A., sendo que, após tal decisão, o Agente de Execução veio a remeter ao encarregado de venda guia para efeitos de restituição da quantia de €18.486,90 a título de honorários liquidados em 11/07/2017 (cfr. “carta (AE) de 02-06-2020 – Ref.ª n.º 16876321 - p.e.).
Posteriormente veio o mesmo a informar os autos que o encarregado de venda se recusou efetuar a devolução reclamada, por considerar nada haver a devolver, por nada ter sido indevidamente recebido (cfr. “Resposta a Solicitação do Tribunal (AE)” de 31-03-2021 – Ref.ª n.º 18530667 - p.e.).
O que determinou que fosse proferido o despacho datado de 9 de abril de 2021 (cfr. “Despacho” de 09-04-2021 – Ref.ª n.º 130060661 - p.e.), com o seguinte teor:
«Notifique a Encarregada da venda para proceder à devolução do montante pago em excesso referente aos honorários fixados de acordo com a lei, sob pena das legais consequências, nomeadamente, ser condenada em multa.
«DN»
Este despacho foi devidamente notificado à L…, S.A. (cfr. “Not do despacho” de 12-04-2021 – Ref.ª n.º 130127458 - p.e.) que, em resposta, apresentou o requerimento de 27 de abril de 2021 (cfr. “Execução - Requerimento para outras questões” de 27-04-2021 – Ref.ª n.º 18695502 - p.e.), onde reclamou da nulidade por omissão da notificação do despacho de 20 de fevereiro de 2020, sustentando que lhe seria devida a retribuição oportunamente acordada e fixada, estranhando que 3 anos depois tivesse sido alterada, sem fundamento, a remuneração que lhe era devida.
Cumprido o contraditório, somente o exequente veio responder, defendendo a extemporaneidade do requerimento do encarregado de venda (cfr. “Execução - Requerimento para outras questões” de 10-05-2021 – Ref.ª n.º 18783597 - p.e.).
É assim que vem a ser proferido o despacho de 8 de outubro de 2021 (cfr. “Despacho” de 08-10-2021 – Ref.ª n.º 132787834 - p.e.), com o seguinte teor:
«Compulsados os autos verifico que por despacho datado de 20-02-2020, foi proferida a seguinte decisão: “Dispõe o n.º 6 do artigo 17.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro: “Os liquidatários, os administradores e as entidades encarregadas da venda extrajudicial recebem a quantia fixada pelo tribunal, até 5 % do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados”
«Assim, entende o tribunal adequado fixar em 2% o valor da remuneração do Encarregado de Venda, pague-se as despesas apresentadas.
«DN
*
«Oeiras, d.s.”
«A decisão transitou em julgado. A EV foi notificada da decisão e nada disse.
«Assim, entende este tribunal, não se verificar qualquer nulidade.
«Custas pela requerente.
«Notifique».
Nesta sequência, a “L…, S.A.”, na qualidade de encarregada de venda, veio a interpor recurso de apelação desse despacho, que veio a ser admitido a subir em separado, que constituiu o apenso “A”, e sobre o qual veio a incidir decisão sumária do Relator que julgou a apelação procedente por provada, revogando aquele na parte decidiu inexistir qualquer nulidade do despacho de 20 de fevereiro de 2020, por preterição de contraditório e de possibilidade de exercício oportuno do direito de defesa, determinando que essa decisão fosse substituída pela de reconhecer a verificação dessa nulidade, anulando o despacho de 20 de fevereiro e todo o processado subsequente que dele dependesse diretamente, devendo oportunamente ser apreciado o fundo do demais requerido pela L…, S.A. no requerimento de 27 de abril de 2021, no exercício legítimo e tempestivo do contraditório, ordenando-se previamente que aquela seja notificada de todos os requerimentos das partes e esclarecimentos do agente de execução pertinentes e relativos à questão da remuneração do encarregado de venda (Cfr. “Decisão Sumária” de 20-01-2022 do apenso “A” – Ref.ª n.º 17917321 - p.e.).
Notificada a encarregada de venda de todos os atos, em conformidade com o decidido no apenso “A” (cfr. “Not do despacho” de 25-02-2022 – Ref.ª n.º 135945594 - p.e.), veio a mesma, por requerimento de 15 de março de 2022 (cfr. “Execução - Requerimento para outras questões” de 15-03-2022 – Ref.ª n.º 20661505 – p.e.) reiterar o já alegado nos requerimentos anteriores de 27-4-2021 e 27-5-2021, reforçando-os nos seguintes termos:
«1º As tarefas exercidas em prol da exequente foram além do quanto adstrito ao cargo de Encarregada de Venda nos autos,
«2º E prestadas de acordo com a respetiva contratação havida e condições pré-estabelecidas, em similitude com inúmeros outros processos,
«3º Tendo sido negociadas condições genéricas e em pacote a serem aplicadas em todos os processos em que interviessem a exequente e a L….
«4º O valor cobrado consolida o desiderato de uma prévia negociação e contratação, ao abrigo da liberdade contratual, cujos contornos, aqui incluindo o ressarcimento, moldes e percentagens, foram entre as partes pré-estabelecidos e definidos, de acordo com os limites legais estabelecidos no art.º 17º/6 do RCP.
«5º O quanto faturado, foi-o em idos de há mais de três anos, e de acordo com as condições pré-estabelecidas entre as partes,
«6º Faturação enviada, recebida, aceite e não reclamada,
«7º Não devolvida, nem alvo de qualquer reparo pela Exequente,
«8º Que voluntariamente e de acordo com a sua obrigação pagou em conformidade (em similitude com condições adstritas e pré-determinadas em inúmeros outros processos),
«9º Tendo sido emitido o respetivo recibo,
«10º Documentação contabilística esta com lançamento nas respetivas contabilidades para todos os efeitos legais em sede de IRC dos anos transatos,
«11º E totalmente interdependente do quanto contratado e previsto no art.º 17º/6 do RCP.
«Ainda, e por cautela e em lisura a V/ conhecimento, do quanto lhe terá sido ocultado:
«12º No dia 11/7/2016 a EVJ foi nomeada Fiel Depositária (vide desde logo serviço que vai além da configuração de apenas Encarregada de Venda) do imóvel penhorado correspondente ao “Prédio Urbano, sito na E…, Lote .., Lugar de Aldeia do Juso, … Cascais, descrito na 1.ª CRP de Cascais sob o n.º 4…, da freguesia de Cascais e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o Artigo n.º 1…, este deu origem ao Artigo Matricial n.º 1…, da União das Freguesias de Cascais e Estoril.” (Doc. 1).
«13º Para esta nomeação foi efetuada a Tomada de Posse do Imóvel (vide também aqui desde logo serviço que vai além da configuração de apenas Encarregada de Venda).
«14º Só posteriormente, a 11/10/2016, a L…, S.A. foi nomeada EVJ no processo.
«15º No sentido de obter os melhores resultados possíveis em prol da boa conclusão do processo de venda, a L…, S.A. deu início às diligências necessária, tendo efetuado inúmeras visitas junto do bem, conforme se pode verificar através do relatório que se junta (Doc. 2).
«16º Como resultado destas diligências, esta EVJ submeteu, junto aos autos do processo, diversas propostas, sendo que, a proposta no valor de 410.000,00€, foi aceite pelo Exequente, que, por ser inferior ao valor mínimo anunciado para a venda, teve de ser remetida para o Tribunal competente (Doc. 3).
«17º Ora, na medida em que a pronúncia estava morosa, a L…, S.A., conseguiu no interregno obter ainda os melhores resultados possíveis, conseguindo incrementar a proposta para 438.702,00€, correspondente ao valor mínimo anunciado para a venda (Doc. 4).
«18º Desta forma, o Sr. Agente de Execução emitiu a decisão de adjudicação (Doc. 5), em conformidade, tendo sido iniciadas todas as diligências inerentes à outorga da escritura de transmissão do bem.
«19º Aquando da outorga da escritura, o proponente não compareceu (Doc. 6).
«20º Não obstante, pelo valor de 438.702,00€ o processo poder ter ficado resolvido, na medida em que tal não foi possível, a L…, S.A., através dos seus esforços encetados, conseguiu mais uma vez melhorar o resultado da sua atividade e prol dos autos, e obter uma proposta no valor de 501.000,00€ (Doc. 7).
«21º Ora, o valor conseguido por esta EVJ, 501.000,00€ (não os 500.000,00€ mencionados pelo Exequente no seu requerimento), foi um valor bastante superior ao valor aceite pelo Credor/Exequente, de 410.000,00€.
«22º Atendendo a que o valor da dívida do Exequente/Credor Reclamante, já com despesas prováveis, corresponde a 384.456,74€, o valor da proposta conseguida por esta Entidade permitiu que o Exequente fosse ressarcido da totalidade do seu crédito, podendo ainda ter sido o remanescente entregue aos Executados.
«23º Atendendo ao exposto, não se compreende o que haja aqui em apreço (que se desconhece de facto), que se considera completamente descabido e desrespeitoso, atendendo ainda os seguintes:
1º - Após diversas reuniões encetadas entre esta EVJ e a SPS Advogados, foi possível chegar a um entendimento, conforme é possível verificar através do anexo que se junta (DOC 8), sendo certo que a nota de despesas desta Entidade encontra-se em conformidade com esses mesmo entendimento;
2º - À época, os procedimentos que visaram o pagamento da L…, S.A., foram cumpridos em conformidade com os pressupostos pré- estabelecidos, à semelhança de outros processos com os mesmos intervenientes, ou seja, foi enviada a nota de honorários desta EVJ (Doc. 9), na medida em que não existiu qualquer reclamação, foi emitida fatura (Doc. 10) em conformidade com os dados de faturação informados pelo Sr. AE.
3º - Com o pagamento efetuado, foi emitido o correspondente recibo (Doc. 11), tendo a L…, S.A. procedido ao pagamento do IVA inerente ao mesmo, bem como aos seus colaboradores, comerciais comissionistas que tramitaram o processo, entre outros custos inerentes.
«38º Estranha-se que agora, 3 anos depois, surja em apreciação, de modo inusitado, alheio até hoje à L…, S.A., um assunto que já se encontra mais que resolvido.
«39º Importa acrescentar que a L…, S.A., em todos os processos nos quais se encontra mandatada, trata de forma esclarecedora e transparente nomeadamente, junto de quem procedeu à nomeação desta Entidade, no que concerne às suas condições e honorários, daí terem existido as reuniões anteriormente referidas, que resultaram no entendimento também já junto (Doc. 10).
«40º No decurso do processo, conforme acontece com todos os que a L…, S.A. se encontra nomeada, dado que esta Entidade preza sempre pelo profissionalismo e respeito de todas as partes intervenientes, são remetidos, em tempo exato, relatórios com as diligências celebradas por esta EVJ, com todos os objetivos, resultados, movimentações e perspetivas.
«41º Tal só é possível com um investimento/custo inerente às diligências encetadas, nomeadamente, com as deslocações realizadas, análise processual, elaboração das mais diversas comunicações, e o muito tempo despendido pelos diversos colaborados desta Encarregada de Venda Judicial.
«42º Face ao exposto, também aqui não se consegue compreender o que haja aqui em questão, uma vez que, contrariamente ao entendimento celebrado e ao estipulado pelo Regulamento das Custas Processuais, esta Entidade não peticionou, na sua nota de honorários, as despesas tidas com a tramitação do processo, beneficiando assim o mesmo, inclusive, os Credores e os Executados.
«43º Os custos referidos, atendendo a que o processo, para esta EVJ, encontra-se concluído desde 23-08-2017 (data recibo), acabam inclusive por agora se elevar, atendendo aos valores despendidos com terceiros, impostos, e à necessidade de agora ter esta Entidade de melhor esclarecer os autos do processo (despendendo taxas e custas), obrigando o envolvimento de vários colaboradores, nomeadamente, o mandatário da L…, S.A..
«44º Resulta erróneo ainda o desconhecimento de AE e partes de condições da EVJ, até porque a mesma era antes dessa nomeação já fiel depositária do imóvel,
«45º Atendendo precisamente a tais condições e cabal conhecimento (que, diga-se, cujas condições haviam sido remetidas por via postal ao Sr. AE),
«46º E negociadas inclusive com a exequente, sob alçada de respetivos mandatários, a qual responsável por solicitação direta de sua nomeação.
«47º Sem prejuízo, atendendo a sua posição de fiel depositária, ao quanto desenvolvido no sentido de tomada de posse do imóvel, sua potenciação no mercado e resultado efetivo, bem acima da expectativa das partes, deverá ser atendido ao disposto no art.º 17º/6 do RCP não só em respeito do contratado, como também na percentagem máxima legalmente prevista de 5%.
«48º Nada existindo assim mais a sindicar, em cabal proporcionalidade, e adequação ao escorreito histórico e processual verificado.
«Pelo que, com o devido respeito, e feito o presente esclarecimento, deve o quanto a este propósito ser dado sem efeito, concluindo-se por nada haver a apreciar ou determinar no que concerne a ressarcimento da Encarregada de Venda (face ao já prestado há cerca de 3 anos), e nada havendo a devolver, na medida em que nada há em excesso, ou não compete a estes autos apreciar tal questão, pois que, se tanto, a reconduzir para meios comuns por no âmbito da liberdade contratual das partes (prévia à própria nomeação enquanto Encarregada de Venda), ou em limite apenas reconduzível ao desígnio de obrigação natural.
«Sempre no entanto, assim não se entendendo, passível de V/ superior apreciação e definição de como também na percentagem máxima legalmente prevista de 5%, nada existindo assim mais a sindicar, em cabal proporcionalidade, e adequação ao escorreito histórico e processual verificado, e inclusive já voluntariamente cumprido».
De referir que, em anexo a esse requerimento, a encarregada de venda juntou ainda um documento, constituído por carta datada de 15 de julho de 2015, dirigida ao Agente de Execução, onde expunha as condições dos seus serviços, de onde se destaca que, quanto à venda de bens imóveis, os honorários a cobrar seriam os resultantes do cálculo de 5% sobre o valor da transação do bem.
Não tendo sido exercido direito de resposta ao assim exposto e requerido, veio a ser proferido o despacho de 13 de junho de 2022 (cfr. “Despacho” de 13-06-2022 – Ref.ª n.º 137031667 – p.e.), com o seguinte teor:
«Em cumprimento do acórdão proferido pelo tribunal da Relação de Lisboa, e após cumprido o contraditório, cumpre fixar a retribuição ao EV.
«O Agente de Execução veio a transferir o valor de €30.811,50 a favor da L…, S.A. para liquidação da remuneração devida ao encarregado de venda (cfr. “Pagamento de serviços (AE)” de 11-07-2017 – Ref.ª n.º 10276143 - p.e.)
«Os executados vieram apresentar reclamação contra a remuneração paga ao encarregado de venda.
«O EV veio requerer a fixação de remuneração no valor de 5% do valor da proposta apresentada, cfr. Ref. 20661505.
«Vejamos.
«Estando em causa a fixação da remuneração devida ao encarregado de uma venda de imóvel, no âmbito de uma ação executiva, importa chamar à colação o disposto no artigo 17.º, n.º 3, do Regulamento das Custas Judiciais o qual, sob a epígrafe Remunerações fixas preceitua que: «Os liquidatários, os administradores e as entidades encarregadas da venda extrajudicial recebem a quantia fixada pelo tribunal, até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados, se este for inferior.»
«Ao utilizar a proposição “até” o legislador introduziu no preceito a possibilidade de gradação do valor da remuneração devida ao encarregado da venda decorrente da ponderação dos critérios que devem nortear a fixação daquela remuneração, designadamente, das atividades desenvolvidas pelo encarregado da venda com vista à concretização do desiderato da sua função e a maior ou menor complexidade das mesmas, o tempo despendido nessas atividades e o esforço manifestado com vista à concretização da venda (por exemplo, os contactos efetuados, o tipo de publicidade desenvolvida, o número de possíveis interessados angariados).
«Da análise dos autos verifica-se que o “contrato” ou condições combinadas com o Sr. AE junto pela EV não tem qualquer validade no caso concreto, considerando que a remuneração é fixada pelo tribunal.
«Verifica-se que a EV diligenciou pela obtenção de várias propostas, e compareceu na diligência de outorga de escritura pública.
«Assim, e atento os fatores supra referidos, considerando que estamos no âmbito de processo executivo, as diligências realizadas, o facto de ter sido bastante longo o processo de venda, afigura-se-nos ajustada fixar a remuneração em 3%.
«Notifique e DN».
É desse despacho que a Encarregada de Venda vem agora interpor novo recurso de apelação, apresentando no final das suas alegações as seguintes conclusões:
I – O despacho recorrido decide erroneamente pela fixação exígua em 3% a título de remuneração à EVJ.
II – Fá-lo de forma infundamentada quanto a ponderação nominada de critérios, e sem qualquer cotejamento lógico adstrito a factualidade e atos concretos.
III – Os critérios que norteiam tal ponderação, atento o caso concreto e quanto praticado e almejado, porque além do quanto adstrito a atividade normal da EVJ, impõem equitativamente fixação em 5%.
IV – O quanto oportunamente apresentado, recebido e pago, sem reparo, em 2017.
V – Por tal, e atendendo a constituição de obrigação e cumprimento voluntário, de forma natural, de acordo com o quanto previsto e consignado pelas partes, em respeito pelo art.º 17º do RCP, nada há a apreciar ou determinar no que concerne a ressarcimento da Encarregada de Venda (face ao já prestado há cerca de 3 anos), e nada havendo a devolver, na medida em que nada há em excesso.
VI – Sem prejuízo de qualquer dissídio competir a recondução para meios comuns por no âmbito da liberdade contratual das partes (prévia à própria nomeação enquanto Encarregada de Venda), ou em limite apenas reconduzível ao desígnio de obrigação natural.
VII - O despacho recorrido viola as obrigações contratuais advenientes do contrato celebrado entre os intervenientes processuais/autos e a Encarregada de Venda e as regras afetas à responsabilidade civil contratual. Aliás do próprio art.º 833º do CPC decorre que “Ao determinar-se a venda por negociação particular, designa-se a pessoa que fica incumbida, como mandatário, de a efetuar.”.
VIII - O despacho recorrido viola o previsto no art.º 833º do CPC e 17º/6 do RCJ.
IX - A Encarregada de Venda foi devidamente contratada para o exercício das suas funções nos moldes contratualmente previstos e legalmente sustentados.
X - Conforme jurisprudência diversa, de que se aduz apenas em exemplo o Acórdão do TRL de 03-12-2009 – “Na venda por negociação, sub-espécie da venda extrajudicial, o encarregado da venda é equiparado ao “mandatário” –art.º 905.º do CPC; A sua atuação pautar-se-á pelas regras do contrato de mandato civil, assim se justificando a sujeição da atuação do encarregado da venda às regras do mandato; No caso particular das vendas em processo executivo, o encarregado da venda atua mandatado pelo tribunal”.
XI – Compulsados os autos, só pode ser intelectualmente descabido que após apresentação de conta em conformidade com o definido pelas partes, em respeito pelo exposto no art.º 17º do RCP, no valor de 5% do valor da proposta apresentada, nos termos estabelecidos e pré-definidos pelas partes em face de resultado profícuo de atividade, a qual oportuna e voluntariamente paga pela exequente (a exemplo de inúmeros outros processos), venha agora, como se nenhum histórico processual viesse a ocorrer, e de facto aquela não houvesse já cumprido com a sua obrigação voluntariamente (e natural), a ser fixada remuneração inferior (3%), numa lógica de devolução de suposto indevido (esperemos que não revanchista quanto ao contexto processual, pois que tal não é seguramente função da Justiça).
XII - O que deve nortear a fixação da remuneração pelo Tribunal são as atividades desenvolvidas pela EV com vista à concretização do desiderato da sua função e a maior ou menor complexidade das mesmas, o tempo despendido nessas atividades e o esforço manifestado com vista à concretização da venda, e dizemos ainda nós, não podendo ser olvidado o sucesso do resultado.
XIII - No caso concreto as tarefas exercidas em prol da exequente foram além do quanto adstrito ao cargo de Encarregada de Venda nos autos, e prestadas de acordo com a respetiva contratação havida e condições pré-estabelecidas, em similitude com inúmeros outros processos, tendo sido negociadas condições genéricas e em pacote a serem aplicadas em todos os processos em que interviessem a exequente e a L…, S.A., o valor cobrado consolida o desiderato de uma prévia negociação e contratação, ao abrigo da liberdade contratual, cujos contornos, aqui incluindo o ressarcimento, moldes e percentagens, foram entre as partes pré-estabelecidos e definidos, de acordo com os limites legais estabelecidos no art.º 17º/6 do RCP.
XIV – Denote-se que o próprio AE a pedido do Tribunal esclarece em 23-04-2019 - V/Refª117850800 – LSF, “Agente de Execução nos presentes autos, notificado que foi do despacho com V/Refª- 117850800 vem informar o seguinte:
-Em 01-02-2016 por despacho com a refª-96165616 a executada foi removida do cargo de fiel depositária do bem, tendo sido nomeado pelo douto tribunal o Agente de Execução, no entanto,
-Em 27-04-2016 por comunicação ao Agente de Execução veio a exequente indicar como fiel depositária do bem a sociedade L…, S.A. (anexo)
-o Agente de execução seguiu com a nomeação de fiel depositária do bem a referida sociedade, que veio a tomar posse do bem em - 14-09-2016, tendo ficado na posse das chaves do imóvel.
-Em 27-09-2016 tendo sido a venda frustrada por abertura de propostas e seguindo as diligências de venda por negociação particular entendeu o signatário que sendo uma firma especializada na venda judicial de bens penhorados, já era a fiel depositária do bem, inclusive tinha já a posse do bem seria a melhor escolha para ser a encarregada de venda e assim seguiu com a nomeação da sociedade L…, S.A. como encarregada de venda. Mais informa que, foram todas as partes notificadas da nomeação da firma L…, S.A., como encarregada de venda não tendo existido qualquer oposição. (anexo) É o que cumpre informar,”
XV – O quanto faturado, foi-o em idos de há mais de três anos, e de acordo com as condições pré-estabelecidas entre as partes, faturação enviada, recebida, aceite e não reclamada, não devolvida, nem alvo de qualquer reparo perante a EV.
XVI - Que voluntariamente e de acordo com a sua obrigação pagou em conformidade (em similitude com condições adstritas e pré-determinadas em inúmeros outros processos),
XVII - Tendo sido emitido o respetivo recibo, documentação contabilística esta com lançamento nas respetivas contabilidades para todos os efeitos legais em sede de IRC e IRS dos anos transatos, e totalmente interdependente do quanto contratado e previsto no art.º 17º/6 do RCP, e sempre em respeito com o mesmo incito legal.
XVIII - Veja-se que: No dia 11/7/2016 a EVJ foi nomeada Fiel Depositária (vide desde logo serviço que vai além da configuração de apenas Encarregada de Venda) do imóvel penhorado correspondente ao “Prédio Urbano, sito na …, Lote .., Lugar de Aldeia do Juso, … Cascais, descrito na 1.ª CRP de Cascais sob o n.º 4…, da freguesia de Cascais e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o Artigo n.º 1…, este deu origem ao Artigo Matricial n.º 1…, da União das Freguesias de Cascais e Estoril.”.
XIX - Para esta nomeação foi efetuada a Tomada de Posse do Imóvel (vide também aqui desde logo serviço que vai além da configuração de apenas Encarregada de Venda). Só posteriormente, a 11/10/2016, a L…, S.A. foi nomeada EVJ no processo.
XX - No sentido de obter os melhores resultados possíveis em prol da boa conclusão do processo de venda, a L…, S.A. deu início às diligências necessárias, tendo efetuado inúmeras visitas junto do bem, conforme se pode verificar através do relatório que se juntou (e não impugnado ou sindicado).
XXI - Como resultado destas diligências, esta EVJ submeteu, junto aos autos do processo, diversas propostas, sendo que, a proposta no valor de 410.000,00€, foi aceite pelo Exequente, que, por ser inferior ao valor mínimo anunciado para a venda, teve de ser remetida para o Tribunal competente.
XXII - Ora, na medida em que a pronúncia estava morosa, a L…, S.A., conseguiu no interregno obter ainda os melhores resultados possíveis, conseguindo incrementar a proposta para 438.702,00€, correspondente ao valor mínimo anunciado para a venda.
XXIII - Desta forma, o Sr. Agente de Execução emitiu a decisão de adjudicação, em conformidade, tendo sido iniciadas todas as diligências inerentes à outorga da escritura de transmissão do bem.
XXIV - Aquando da outorga da escritura, o proponente não compareceu. Não obstante, pelo valor de 438.702,00€ o processo poder ter ficado resolvido, na medida em que tal não foi possível, a L…, S.A., através dos seus esforços encetados, conseguiu mais uma vez melhorar o resultado da sua atividade e prol dos autos, e obter uma proposta no valor de 501.000,00€, valor acima do mínimo.
XXV - Ora, o valor conseguido por esta EVJ, 501.000,00€ (não os 500.000,00€ mencionados pelo Exequente no seu requerimento), foi um valor bastante superior ao valor aceite pelo Credor/Exequente, de 410.000,00€.
XXVI - Atendendo a que o valor da dívida do Exequente/Credor Reclamante, já com despesas prováveis, correspondia então a 384.456,74€, o valor da proposta conseguida por esta Entidade permitiu que o Exequente fosse ressarcido da totalidade do seu crédito, podendo ainda ter sido o remanescente entregue aos Executados.
XXVII - Atendendo ao exposto, não se compreende o que haja em apreço, que em respeitosa ponderação de atividade e agente, determine fixação em valor inferior a 5%, cfr. previsto no art. 17º do RCP.
XXVIII - Tudo o quanto se considera completamente descabido e desrespeitoso, atendendo ainda que após diversas reuniões encetadas entre esta EVJ e a SPS Advogados, foi possível chegar a um entendimento, conforme é possível verificar através do documento junto em pronuncia precedente da recorrente, sendo certo que a nota de despesas desta Entidade encontra-se em conformidade com esses mesmo entendimento.
XXIX - À época, os procedimentos que visaram o pagamento da L…, S.A., foram cumpridos em conformidade com os pressupostos pré- estabelecidos, à semelhança de outros processos com os mesmos intervenientes, ou seja, foi enviada a nota de honorários desta EVJ, na medida em que não existiu qualquer reclamação, foi emitida fatura, em conformidade com os dados de faturação informados pelo Sr. AE.
XXX - Com o pagamento efetuado, foi emitido o correspondente recibo, tendo a L…, S.A. procedido ao pagamento do IVA inerente ao mesmo, bem como aos seus colaboradores, comerciais comissionistas que tramitaram o processo, entre outros custos inerentes.
XXXI - Face ao exposto, também aqui não se consegue compreender o que haja aqui em questão, uma vez que, contrariamente ao entendimento celebrado e ao estipulado pelo Regulamento das Custas Processuais, esta Entidade não peticionou, na sua nota de honorários, as despesas tidas com a tramitação do processo, beneficiando assim o mesmo, inclusive, os Credores e os Executados.
XXXII - Os custos referidos, atendendo a que o processo, para esta EVJ, encontra-se concluído desde 23-08-2017 (data recibo), acabam inclusive por agora se elevar, atendendo aos valores despendidos com terceiros, impostos, e à necessidade de agora ter esta Entidade de melhor esclarecer os autos do processo (despendendo taxas e custas), obrigando o envolvimento de vários colaboradores, nomeadamente, o mandatário da L…, S.A.
XXXIII - Sem prejuízo, atendendo a sua posição de fiel depositária, ao quanto desenvolvido no sentido de tomada de posse do imóvel, sua potenciação no mercado e resultado efetivo, bem acima da expectativa das partes, deverá ser atendido ao disposto no art.º 17º/6 do RCP não só em respeito do contratado, como também na percentagem máxima legalmente prevista de 5%,
XXXIV - Nada existindo fundamentado no despacho recorrido no sentido de sustentar definição díspar, inferior e exígua.
XXXV - Nada existindo, pois que previamente resolvido, com apresentação e pagamento voluntário em respeito a 5% legalmente previstos (sempre e em limite, enquanto obrigação natural), assim a sindicar, em cabal proporcionalidade, e adequação ao escorreito histórico e processual verificado.
XXXVI - De facto, apenas vislumbrou o quanto em apreço quando lhe foi inusitadamente solicitada a devolução de verba que recebeu, na medida da prévia (anos antes) apresentação de conta, fatura, recebimento da mesma, aceitação da mesma, e pagamento voluntário, de acordo com as condições subjacentes à prévia contratação, que por liberdade negocial das partes as vinculam além do circunstanciado ao art.º 17º do RCP, e o quanto pelos vistos, em desconhecimento dos autos e Meritíssimo Juiz, perspetivado.
XXXVII - Seria o mesmo que dizer que o quanto em prol do processo, surge do nada, é desenvolvida, o Sr. AE dá nota de tanto aos autos, ao Meritíssimo Juiz, ao credor e executados, beneficia-se com a mesma que impele a resultado acima do esperado, a cumprimento pelos devedores, todos sabem, são feitos relatórios e expressas informações, ninguém objeta, são-lhe dadas instruções, valor base, indicada modalidade de venda, é feita a venda, obtido e colhido resultado… e a final, nada é devido nos termos legalmente pronunciados e ajustados e que determinaram afinal a aceitação a atividade da EV.
XXXVIII - A atividade da Encarregada de Venda é uma atividade de meios que esta apenas pode providenciar considerando a sua expectativa legal e negocial, sob pena desta, inúmeras vezes, se descapitalizar e despender recursos, vendo o objeto do seu trabalho invariavelmente postergado. Ou seja, quer os autos, o Tribunal, Agente de Execução, credores, etc… beneficiavam e enriqueciam sem causa no que concerne ao trabalho alocado e recursos desenvolvidos pela Encarregada de Venda. Aliás do próprio art.º 833º do CPC decorre que “Ao determinar-se a venda por negociação particular, designa-se a pessoa que fica incumbida, como mandatário, de a efetuar.”.
XXXIX - Reforça que, a aqui recorrente foi nomeada Encarregada de Venda, por indicação expressa e conhecimento cabal nos autos, concordância do credor e sem qualquer oposição dos autos e dos intervenientes ao longo de todo o decurso processual, até ao momento em que apraz apresentar nota de honorários para ressarcimento. A Encarregada de Venda reitera o teor, explicitação de facto, e documentos que o atestam, conforme aposto no processo em contraditório, sendo que, conforme verificável a sua atividade e auxílio processual foi bem além do quanto seria de normal solicitação.
XL - A EVJ foi assim designada para estes autos e para efeitos de venda do imóvel penhorado, no âmbito das competências legais conferidas ao Sr. Agente de Execução e com indicação e concordância do exequente, e audição sem oposição dos executados, sob as condições previamente comunicadas, apreciadas e aceites. Tudo assim sob as respetivas condições conhecidas e acordadas no âmbito das respetivas competências e liberdade contratual
XLI - De imediato, esta Entidade procurou dinamizar o processo de venda e obter os melhores resultados; tendo diligenciado por tentativas de idas ao imóvel penhorado, tomada de posse e sua definição de fiel depositária, efetuou levantamento e relatório sobre o mesmo, sua guarda e cuidado, do que resultaram inúmeras propostas e em franca melhoria. Sem prejuízo, em conformidade com o art.º 17º do RCP, e com os termos das condições contratadas, incumbe a respetiva definição de pagamento à EVJ, nos moldes legais e contratuais, i.e., os 5% já respeitados e cumpridos.
XLII - A Encarregada de Venda é uma sociedade com atividade extensível a todo o país, com nome estabelecido no mercado, e com termos e moldes de atuação conhecidos a todos os intervenientes com que se cruza e nos mais diversos Tribunais ao longo do país, sendo precisamente em virtude do seu profissionalismo e clareza com que expõe a sua atividade que é regularmente indicada e nomeada. Fora a multiplicidade de tarefas óbvias de tratamento processual corrente que não carecem de discriminação detalhada em relatório.
XLIII - As condições invocadas na sua nota de honorários e despesas são assim cabalmente conhecidas de todos aqueles, por similitude a demais Encarregados de Venda, e ademais de próprios Agente de Execução e Administradores de Insolvência, e inclusivamente dos usos gerais, designadamente pela credora hipotecária ou não, beneficiária de penhora, entidade que lidou/lida com a Encarregada de Venda em inúmeros processos em situações idênticas.
XLIV - Não tem a Encarregada de Venda de suportar per si os encargos adstritos às diligências e riscos processuais das partes interessadas com as mesmas no sentido de visar obter cobrança coerciva/resultados. Tal configura um desrespeito e incompreensão pelo trabalho da Encarregada de Venda, que é atentatório e vexatório, e que se repete de forma intolerável no despacho aqui em crise!
XLV - A Encarregada de Venda Judicial não é equiparável a uma qualquer agência imobiliária/mediador como que só pago com a venda , não sendo a sua atuação processual circunscrita às tarefas por aquelas desenvolvidas, competindo-lhe para além da promoção no mercado, uma vasta panóplia de procedimentos processuais e perante as partes, em respeito da Lei, ao que ademais é desde logo exemplo as exigências adstritas ao respetivo alvará de atividade e securitização de atividade.
XLVI - Face à atividade incumbida, desenvolvida e prestada, no decurso de mandato direto e exclusivo para o ato, por conta e em nome de intervenientes, de acordo com a designação havida, deverá a Encarregada de Venda ser devidamente ressarcida, em Justiça e respeito pelas funções que com profissionalismo e dignidade exerceu, nos exatos termos em que o veio requerer, nos termos do contrato de mandato e da Lei e usos.
XLVII - De facto, como conhecido de todos proveu atividade conforme expresso nas informações prestadas aos autos por via do AE e já diretamente, sendo que para além de diversos contactos diretos com potenciais interessados e parceiros (presenciais e telefónicos), dirigiu-se com os seus respetivos meios ao imóvel, levando a cabo os atos procedimentais atinentes e comunicados, para consultoria, avaliação e estudo de mercado tendo em vista a potenciação do imóvel no mercado e a venda,
XLVIII - Identificando o bem sem fácil colaboração, almejando sua posse e sendo incumbido de sua guarda, e operando a sua especificação e registo fotográfico, de modo a prover ao processo e por via deste aos autos meios que serviriam aliás para eventuais diligências processuais futuras, sendo amiúde verificável que a tomada de posse, as deslocações, publicidade e contactos comerciais implicam tempo de consultor/promotor, e despesas com viatura própria, de ida e respetiva volta, que contendem assim com encargos com viaturas, gasóleo, portagens e recursos humanos, colocação e manutenção de base de dados, painéis, anúncios, para além dos respetivos honorários a prover de acordo com período temporal e carga horária adstrita quanto ao desenvolvimento e acompanhamento processual e administrativo.
XLIX - O quanto deverá ser ab initio atendido em respeito a nota de despesas e honorários apresentada pela Encarregada de Venda e respetivo valor, perfeitamente circunscrito à atividade de acompanhamento durante o tempo incumbido, nos termos contratuais vertidos pelas partes, em respeito havido perante a sua posição, atividade e timbre profissional, e bem assim a ponderação quanto ao supra expresso (que se reitera não ter em nenhuma circunstância de suportar em nome de quem a mandata). No demais dirá que a natureza da atividade e as regras da experiência permitem aferir que a mesma não poderá ser desenvolvida sem uso de meios humanos, papel e caneta, impressões e cópias, comunicações telefónicas e ou outras, e recurso a meios informáticos e internet, e as consequentes despesas que tal contende sem prejuízo da difícil comprovação nominada, mas por serem levadas a cabo a favor e por conta do processo e parte deverão ser consideradas nos termos gerais.
L - Ora, a Encarregada de Venda não só procedeu a inúmeras diligências de índole de assessoria processual, como almejou o resultado de uma perspetivada venda, bem acima de mínimo estabelecido, auxiliando à perceção de condições mais favoráveis às partes com a subsequente negociação e procura também ela de outras hipóteses, ao invés de aguardar de desfecho de difícil venda ou apreciação.
LI - Pelo que é inusitado e leviano dizer que a sua atividade não mereça merecimento ponderado a graduação máxima legal prevista, pois que essencial e fundamental e desonesto intelectualmente não considerar o atropelo que tal configura perante a EV.
LII - O artigo 17º/6 do RCP diz expressamente que “(…) as entidades encarregadas da venda extrajudicial recebem a quantia fixada pelo tribunal, até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados, se este for inferior, e o estabelecido na tabela iv pelas deslocações que tenham de efetuar, se não lhes for disponibilizado transporte pelas partes ou pelo tribunal”. Isto é, resulta a sapiência que, díspar àquela fixação, a título remuneratório deverá ser fixada pelo tribunal quantia “até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados”.
LIII -Resulta ainda do dito critério legal que tal não depende de efetiva venda, sendo fixado precisamente valor remuneratório independentemente daquela, com respeito ao limite percentual, tendo como base ou o valor da causa ou dos bens administrados, se este for inferior.
LIV - A este propósito e a título de exemplo do quanto vem sendo entendimento generalizado da jurisprudência enuncia-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28-03-2019 in DGSI, quando expressa em resposta especifica à questão única a decidir que “consiste em saber se o encarregado da venda tem direito a receber a remuneração devida pela atividade que desenvolveu, apesar de não ter procedida à venda do bem penhorado.”.
LV - “A resposta à questão colocada prende-se com a interpretação e aplicação do n.º 1 do art.º 17.º do regulamento das Custas Processuais. O recorrente entende que estando prevista proposta de venda, o recebimento de 5% do valor da venda não é devido à encarregada da venda quando esta não procede a qualquer venda, sob pena de violação do nº 1 do artigo 17º do Regulamento das Custas. Em sentido oposto entendeu a decisão recorrida, considerando-se que “apesar de não ter sido concretizada a venda, a encarregada da venda tem direito a receber a remuneração devida pelo labor desenvolvido tendo em vista a venda, não podendo ignorar-se que a mesma deslocou-se ao local, elaborou uma brochura que divulgou na sua plataforma eletrónica e enviou a mesma para a sua carteira de clientes, realizando outras diligências e obtendo um total de 16 propostas”. Ora, é evidente que não podemos deixar de acompanhar a interpretação seguida pelo tribunal a quo. Com efeito, sob a epígrafe “Remunerações fixas”, reza, na parte que aqui importa, os n.ºs 1 e 6 do art.º 17.º do Regulamento das Custas Processuais: 1 – As entidades que intervenham nos processos ou que coadjuvem em quaisquer diligências, salvo os técnicos que assistam os advogados, têm direito às remunerações previstas no presente Regulamento. 6 – Os liquidatários, os administradores e as entidades encarregadas da venda extrajudicial recebem a quantia fixada pelo tribunal, até 5 % do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados, se este for inferior, e o estabelecido na tabela IV pelas deslocações que tenham de efetuar, se não lhes for disponibilizado transporte pelas partes ou pelo tribunal.
Assim, resulta expressamente deste preceito legal que a entidade encarregada da venda (excluindo o agente de execução, pese embora este possa, ao abrigo do n.º 2 do art.º 833.º, do CPC, ser encarregado da venda por negociação particular) recebe a quantia fixada pelo tribunal, até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados, se este for inferior, e o estabelecido na Tabela IV pelas deslocações que tenham de efetuar, se não lhes for disponibilizado transporte pelas partes ou pelo tribunal – n.º 6 do artigo 17.º do RCP.
Donde, resulta do seu n.º 6 o critério a observar na quantificação dessa remuneração.
Na verdade, enquanto o seu n.º 1 estabelece a regra geral de que o encarregado da venda (entre outros), que colabore em diligências processuais, tem direito à remuneração prevista no Regulamento das Custas processuais, o seu n.º 6 fixa os critérios que deve
presidir à fixação em concreto dessa remuneração, em particular quando a taxa seja variável, como no caso concreto, até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados, se este for inferior.
Salvador da Costa, in “Regulamento das Custas Processuais anotado”, 2013, 5.ª ed., Almedina, p. 286, socorrendo-se de Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, refere a este propósito que «intervêm acidentalmente nos processos, além das testemunhas a que se reporta a alínea e) do n.º 1 deste artigo, os peritos, os tradutores, os intérpretes, os depositários, os encarregados de vendas, os técnicos e outros”.
Esta retribuição integra o conceito legal de encargos do processo, como decorre da alínea h) do n.º 1 do art.º 16.º do R. C. Processuais, e entra na conta de custas da parte, são imputados na conta de custas da parte ou partes responsáveis por custas, na proporção da condenação – seu art.º 24.º.
Entender-se de outro modo, como defende o recorrente, a encarregada da venda, apesar das diligências efetuadas e encargos suportadas com vista á realização da venda não teria qualquer direito a remuneração sempre que a venda não chegasse a efetivar-se, o que seria totalmente inadmissível, violando-se, desde logo, o princípio geral previsto n.º 1 do citado art.º 17.º, ao prever a remuneração para quem coadjuve em qualquer diligência, independentemente do seu resultado, entenda-se.
Sumariando, nos termos do art.º 663.º/7 do C. P. C.
A sociedade nomeada, na execução, encarregada da venda, tem direito à remuneração a fixar pelo tribunal, até 5% do valor do processo, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 6 do art.º 17.º do Regulamento das Custas processuais, pelas várias diligências realizadas com vista à concretização da venda do imóvel penhorado”.
LV - Não é nem seria lógico que a Encarregada de Venda exercesse atividade profissional gratuitamente, adiantando inclusivamente despesas para exercer tal atividade de forma indefinida no tempo, despesas estas que, quiçá, poderia nem sequer ver devidamente tidas como verificadas e aceites nos autos…! E assim se compreende porque a Encarregada de Venda Judicial tem uma natureza em similitude legal a liquidatário/administrador, e não é equiparável a uma qualquer agência imobiliária/mediador só pago com a venda, na medida em que não é, de todo, a sua atuação processual circunscrita às tarefas por aquelas desenvolvidas, competindo-lhe para além da promoção no mercado, uma vasta panóplia de procedimentos processuais e perante as partes, em respeito da Lei, ao que ademais é desde logo exemplo as exigências adstritas ao respetivo alvará de atividade.
LVI - Dirá ainda como é de conhecimento de experiência comum, que nenhuma empresa do ramo de mediação de venda atual, com algum sustento no mercado, fixa comissão abaixo de 5% + IVA em regime de exclusividade, sendo que, nem comummente, uma qualquer outra cobra abaixo de 3% + IVA, reiterando que as exigências atinentes à atividade de Encarregada de Venda (desde logo a nível de normas legais, requisitos e seguro adstrito), e a sua atuação e natureza de funções vão muito além das singelamente tipificadas àquelas (confusão comummente feita), tendo ainda em conta a reputação e respeito granjeado pela aqui Encarregada de Venda.
LVII - Pelo que face à atividade incumbida, desenvolvida e prestada, no decurso de mandato direto e exclusivo para o ato, por conta e em nome de intervenientes, de acordo com a designação havida, deverá a Encarregada de Venda ser devidamente ressarcida, em Justiça e respeito pelas funções que com profissionalismo e dignidade exerceu, nos exatos termos em que o veio requerer, nos termos do contrato de mandato e da Lei e usos.
LVIII - Requer assim em acrescento material a exigível reapreciação e fixação de remuneração fixa nos termos e para efeitos do art.º 17º/6 do RCJ, em acordo com o supra expresso e apresentado a juízo e ora em retificação - tudo o quanto aliás já pago, nada mais havendo na realidade a prover, e portanto não se criando e suscitando um problema que na prática já não existe.
LVIX - Foi a Encarregada de Venda que foi contactada para o exercício da sua atividade, não foi esta que coagiu a sua contratação! Foram as partes que aceitaram as condições para o exercício da atividade da EVJ de acordo com a respetiva liberdade contratual. O tribunal a quo, as partes ou o AE, nunca notificaram a EVJ em alerta que não seria ressarcida de acordo com as expectativas configuradas, em respeito com o legalmente preceituado.
LX - Ocorrendo venda e resolução da pendência entre exequente e executados, certo é que a mesma o foi sobre égide, tratamento processual da Encarregada de Venda, e foi precisamente pelo resultado de potenciação da sua atividade que tal foi almejado. Em respeito havido perante a sua posição, atividade e timbre profissional, e bem assim a ponderação quanto ao supra expresso, estamos muito respeitosamente em crer, que se impõe no caso concreto, a dita fixação aos 5% previstos na Lei + IVA, e que compreende o valor faturado, apresentado, então aceite e já pago de 30811,50€ (já cotejado em sede fiscal no ano de 2017 por todas as partes, em sede de IRC, IVA e IRS).
LXI - Espera mui respeitosamente, em respeito e dignificação da atividade profissional da Encarregada de Venda - e exigível moralização, na medida em que em diversos autos é desejado perpassar a execução de atos tendencialmente desagradáveis (como seja lidar com imóveis sujos ou com escassas condições de salubridade, devedores, a remoção de pessoas e bens, e/ou zonas inseguras) e respetivos custos a terceiros, tentando posteriormente não os suportar - o deferimento equitativo quanto a nota de despesas e honorários, sem reparo.
LXII - Não estando em causa verbas desproporcionadas, nem desconhecidas e não coincidentes com o livremente contratado aquando da adjudicação do mandato, ou em desrespeito pelo limites legais, nem verbas que haja sequer ainda a liquidar, impõe-se o cumprimento legal e o ressarcimento a título de honorários do quanto laborado e prestado, de tal modo, passível de V/ superior apreciação e definição de como também na percentagem máxima legalmente prevista de 5%, nada existindo assim mais a sindicar, em cabal proporcionalidade, e adequação ao escorreito histórico e processual verificado, e inclusive já voluntariamente cumprido.
Pede assim que seja dado provimento ao recurso e revogada a decisão recorrida, determinando, em consequência, a fixação da sua remuneração em 5%, de acordo com o art.º 17º do RCP (com reforço na liberdade contratual, e no quanto já prestado), nada havendo a corrigir ou decidir.
Não foi apresentada qualquer resposta a este recurso.
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II- QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Art.ºs 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do C.P.C., as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (vide: Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2017, pág. 105 a 106). Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. Art.º 5º n.º 3 do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas (Vide: Abrantes Geraldes, Ob. Loc. Cit., pág. 107).
Assim, as questões a decidir consistem em saber se o Tribunal Recorrido poderia fixar a retribuição devida ao encarregado de venda, nos termos do Art.º 17.º n.º 6 do R.C.P., em 3% do valor da venda do imóvel, quando havia sido acordada com o Agente de Execução que a remuneração seria no valor de 5%, e, sendo esse o caso, se a remuneração adequada seria de 5% e não de 3%, como decidido no despacho recorrido.
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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes para a apreciação da presente apelação são os que se mostram sucintamente sumariados no relatório, correspondendo à sucessão de atos processuais documentados nos autos de execução.

Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
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IV- FUDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
As questões que fazem parte do objeto da presente apelação pretendem-se, antes de mais, com a competência legal para a fixação da remuneração do encarregado de venda.
A este propósito, cumpre dizer que inquestionavelmente o Agente de Execução tem competência para efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à Secretaria ou sejam da competência do Juiz da Execução, incluindo, nomeadamente a realização de penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos (cfr. Art.º 719.º n.º 1 do C.P.C.). No entanto, como é fácil de compreender, efetuar “pagamentos”, não é exatamente a mesma coisa que fixar a remuneração devida ao encarregado de venda.
O ato a que o Art.º 719.º n.º 1 “in fine” do C.P.C. se refere, traduz-se unicamente no cumprimento, mais ou menos mecânico, de “pagamentos” que decorram de decisões judiciais produzidas no processo executivo ou que decorram diretamente da aplicação direta da lei.
Não se nega que o Agente de execução tem uma função de auxiliar da Justiça, com um poder geral de direção do processo, mas sob o controlo e supervisão do Juiz da Execução (vide: Rui Pinto in “A Ação Executiva”, 2018, pág. 75  e ss.; e Marco Carvalho Gonçalves in “Lições de Processo Civil Executivo”, 2016, págs. 29 a 32).
É ao Juiz da Execução compete decidir todas as questões que a lei especificamente lhe atribui (Art.º 723.º n.º 1 do C.P.C.) e, em especial, todas as que sejam suscitadas pelo Agente de Execução, pelas partes ou por terceiros intervenientes (cfr. al. d) do n.º 1 do Art.º 723.º do C.P.C.), para além de dever decidir todas as reclamações de atos e impugnação de decisões do Agente de Execução (cfr. Art.º 723.º n.º 1 al. c) do C.P.C.).
Debruçando-nos agora especificamente sobre a venda em processo executivo, cumpre referir que, nos termos do Art.º 812.º n.º 1 do C.P.C., quando a lei não disponha diversamente, a decisão sobre a venda de bens penhorados em ação executiva cabe ao Agente de Execução, ouvidas as partes, exequente e executado e credores com garantia sobre os bens a vender.
No entanto, no caso dos autos, como vimos, a decisão de venda do imóvel por negociação particular foi determinada por despacho do Juiz da Execução, na sequência de não terem sido apresentadas quaisquer propostas em auto de venda judicial por apresentação de propostas em carta fechada, tal como dispõem os Art.ºs 822.º n.º 2 e 832.º al. d) do C.P.C..
É de realçar que, nesse despacho, proferido em ata, é determinado especificamente que as partes deveriam ser notificadas para «em 10 dias virem aos autos informar se estão de acordo ou se se opõem à realização da venda pelo Agente de Execução LSF, com a advertência que nada dizendo, ficará aquele encarregue da realização da mesma». (cfr. “Auto” de 27-09-2016 – Ref.ª n.º 102071832 - p.e.).
Portanto, inicialmente teria sido o próprio Agente de Execução a ser designado como encarregado de venda, sendo que essa possibilidade é especialmente estabelecida pelo Art.º 833.º n.º 2 do C.P.C.. Muito embora, o n.º 3 do mesmo preceito estabeleça que, para a venda de imóveis, devesse ser preferencialmente designado um “mediador oficial”.
Ocorre que o Agente de Execução decidiu então notificar os executados de que, depois de ser nomeado encarregado de venda, poderia delegar essa função em empresa especializada para a realização da venda, nos termos do artigo 833.º do C.P.C. (cfr. “Notificação ao executado (outra) (AE)” de 29-09-2016 – Ref.ª n.º 8147351, n.º 8147453, n.º 8147465 e n.º 8147468 - p.e.). Sendo que, não tendo havido oposição expressa nos autos sobre essa possibilidade, o mesmo decidiu notificar a encarregada de venda, ora Recorrente, da sua nomeação para o exercício desse cargo (cfr. “Notificação (outras) (AE)” de 12-10-2016 – Ref.ª n.º 8228905 – p.e.), notificando igualmente, na mesma data, as partes dessa decisão e dando dela conhecimento ao Juiz de Execução (cfr. “Junção de documentos (AE)” de 12-10-2016 – Ref.ª n.º 8229034 - p.e.). Ora, nem as partes reclamaram ou impugnaram essa decisão do Agente de Execução, nem o Juiz se opôs a ela, limitando-se a esse propósito a escrever: “visto” (cfr. “Despacho” de 17-10-2016 – Ref.ª n.º 102463602 – p.e.). Pelo que, esse ato nomeação consolidou-se no processo.
Diga-se, no entanto, que, o que fica por demonstrar, é que o Agente de Execução tenha informado as partes (v.g. exequente e executados), que as condições de venda deste concreto encarregado de venda eram as que constavam da carta que se mostra datada de 10 de julho de 2015, que só veio mais tarde ser junta ao processo, nomeadamente através do requerimento de 15 de março de 2022 (cfr. “Execução - Requerimento para outras questões” de 15-03-2022 – Ref.ª n.º 20661505 – p.e.).
De facto, dessa carta consta explicitado que as condições propostas ao Agente de Execução relativamente a honorários devidos pela prestação dos seus serviços como encarregado de venda seriam de 5% do valor da transação, no caso de venda de bens imóveis.
Assim, o máximo que se pode dizer é que o Agente de Execução conhecia previamente as condições remuneratórias deste encarregado de venda, antes mesmo daquele ter nomeado este para o exercício desse cargo no processo de execução. Logo, em função dos elementos dos autos, a haver acordo sobre as condições de remuneração constantes dessa carta, ele estabeleceu-se unicamente entre encarregado de venda e o Agente de Execução.
Esse acordo é inoponível aos executados, ao exequente e, porque não desde já dizê-lo, ao tribunal onde pende o processo de execução, uma vez que estes são terceiros, estranhos a essa negociação (Art.º 406.º n.º 2 do C.C.).
Mas, a questão subsiste: quem tem competência para fixar a remuneração devida, no âmbito duma ação executiva, ao encarregado de venda?
Considerando que o pagamento dos honorários devidos a encarregado de venda, bem como o reembolso devido pelas despesas havidas com o exercício dessa função, são um encargo do processo de execução, não pode ser reconhecida competência própria ao Agente de Execução para fixar o seu valor.
Aliás, nem sequer os pagamentos devidos ao próprio Agente de Execução, por honorários ou despesas, podem ser fixados livremente pelo próprio, sem qualquer escrutínio das partes.
De facto, como se estabelece no Art.º 721.º n.º 5 do C.P.C., a nota discriminativa de honorários e despesas do Agente de Execução só constitui título executivo se for acompanhada da prova da notificação à parte responsável pelo seu pagamento, no pressuposto de que essa parte dela não tenha reclamado. Ou seja, é pressuposto da fixação definitiva dos honorários e despesas devidos ao Agente de Execução, que a nota discriminativa seja suscetível de reclamação, sendo inequívoco que a entidade legalmente competente para a apreciação dessa reclamação é o juiz do processo, no caso, o Juiz da Execução (cfr. Art.º 723.º n.º 1 al. d) do C.P.C.).
De igual modo, no que concretamente se refere à fixação dos honorários devidos a encarregado de venda, na hipótese de se considerar que essa competência estaria atribuída à iniciativa direta do Agente de Execução, ela sempre pressuporia uma decisão deste último, a qual poderia ser objeto de reclamação para o Juiz da Execução, quanto mais não fosse, nos termos do Art.º 723.º n.º 1 al. c) do C.P.C..
Na verdade, foi isso mesmo que aconteceu no caso dos autos, em que as partes reclamaram do valor dos honorários pagos ao encarregado de venda, logo que tiveram conhecimento do valor que havia sido pago. Tendo sido isso mesmo que justificou a prolação do despacho recorrido, bem como do anterior, que foi objeto de revogação por decisão do Relator, constante do apenso “A”.
Mas se dúvidas houvessem, e efetivamente não há, a própria letra do n.º 6 do Art.º 17.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (R.C.P.) dissipá-las-ia, pois aí é dito explicitamente que: «Os liquidatários, os administradores e as entidades encarregadas da venda extrajudicial recebem a quantia fixada pelo tribunal, até 5% do valor da causa ou dos bens vendidos ou administrados».
Portanto, é ao Tribunal, através do Juiz da Execução, que compete fixar a remuneração devida ao encarregado de venda (cfr. Art. 723.º n.º 1 do C.P.C., conjugado com o Art.º 17.º n.º 6 do R.C.P.) e não ao Agente de Execução, que só pode efetuar o correspondente pagamento (cfr. Art.º 719.º n.º 1 “in fine” do C.P.C.) depois dele ser decidido pelo Tribunal (vide, neste sentido também: Salvador da Costa in “As Custas Processuais”, 2017, 6.ª Ed., pág. 198). Pelo que, se o Agente de Execução pagou a fatura apresentada pelo encarregado de venda, antes de qualquer decisão judicial que estabelecesse o valor desse encargo no processo, pagou mal, porque realizou uma prestação que não era devida.
Como é evidente, as razões de ordem contabilística e relacionadas com o cumprimento das obrigações tributárias por parte da empresa encarregada de venda, nomeadamente em sede de IRC, são completamente irrelevantes para o caso, na medida em que se estivermos perante uma prestação que não seria devida, a quantia em causa deve necessariamente ser restituída ao processo, com vista a ser oportunamente entregue a quem de direito.
Fixada assim a conclusão de que seria ao Tribunal que competiria a fixação dos honorários devidos ao encarregado de venda e que, qualquer eventual acordo entre o Agente de Execução e esse encarregado, não seria oponível, nem ao exequente, nem ao executado, nem ao próprio Tribunal, cumpre de todo o modo ponderar se seria adequado, no caso concreto, que a remuneração devida à ora Recorrente deveria ter sido fixada em 5%, como esta pretende, ou se, pelo contrário, deveria ser no valor de 3%, tal como decidido pelo Tribunal a quo.
Em primeiro lugar, temos de dizer que essa pretensão da Recorrente respeita o limite máximo previsto no Art.º 17.º n.º 6 do R.C.P.. Portanto, a reclamação do pagamento de honorários pela aplicação da percentagem de 5% do valor de transação do bem imóvel vendido por negociação particular não é, de todo, ilegítima.
Em segundo lugar, também temos de reconhecer que é muito comum no mercado da mediação imobiliária a fixação contratual estandardizada de comissões no valor de 5% do valor de venda, quando em causa está a venda de imóveis. Mas esta constatação deve ser ponderada ainda pelo facto de, também ser muito comum, quando o valor de venda dos imóveis é já muito elevado, que a percentagem negociada pelas comissões devidas às empresas de mediação imobiliárias tende a descer progressivamente. Isto, porque existe uma noção no mercado de que, a partir de certos valores, a comissão devida à mediadora deve ter alguma proporcionalidade com o serviço efetivamente prestado, sendo perfeitamente excessivo e especulativo, exigir honorários de 5% sobre o valor de venda, quando o trabalho despendido, mesmo ponderando custos de estrutura fixos, não são minimamente justificados só pela mera consideração de que o imóvel tem um valor milionário.
Dito isto, a lei estabelece no Art.º 17.º n.º 6 do R.C.P. a percentagem de 5% como limite máximo. O que significa que existe margem para fixar os honorários devidos aos encarregados de venda em percentagem inferior, ponderando não só as razões de mercado relativas ao exercício dessa atividade, mesmo que realizadas no contexto do auxílio à ação da Justiça, mas fundamentalmente tendo em consideração os resultados obtidos, o tempo despendido, a complexidade das tarefas e atos realizados, por forma concluirmos pela adequação da remuneração a fixar.
No caso, o resultado dos serviços prestados foi positivo, tendo-se obtido um valor de venda do imóvel penhorado muito próximo do valor base determinado no processo, sendo de admitir que esse valor possa vir efetivamente a liquidar integralmente a dívida exequenda.
Por outro lado, também se constata que foram apresentadas sucessivas propostas de compra através do encarregado de venda, sempre de valor crescente, o que faz presumir que as mesmas decorreram de esforços desenvolvidos no exercício da atividade da aqui Recorrente.
Também admitimos que a Recorrente possa ter custos de estrutura elevados, com funcionários, escritórios e equipamentos necessários à realização das suas tarefas, que no final lhe permitiram encontrar interessados nesta venda. Embora, também se deva dizer que essa estrutura não esteve, certamente, afeta unicamente à gestão deste processo.
Por outro lado ainda, parece-nos particularmente relevante que a Recorrente foi nomeada para o exercício do cargo de encarregada de venda em 12 de outubro de 2016 (cfr. “Notificação (outras) (AE)” de 12-10-2016 – Ref.ª n.º 8228905 - p.e.), tendo a proposta mais elevada, no valor de €501.000,00, sido apenas aceita pelo Agente de Execução em 20 de junho de 2017 (cfr. “Requerimento para outras questões” de 12-06-2017 – Ref.ª n.º 10061828 - p.e.), vindo a escritura a ser outorgada, logo de seguida, a 30 de junho de 2017 (cfr. “Junção de documentos (AE)” de 04-07-2017 – Ref.ª n.º 10226510 - p.e.). O que significa que a prestação de serviços do encarregado de venda nomeado prolongou-se por mais de 8 meses, com alguns incidentes documentados nos autos.
É este conjunto de factos que nos permite julgar que, no caso concreto dos autos, a remuneração dos serviços do encarregado de venda nomeado neste processo deveria ser fixado, pelo menos, em 4% do valor de venda, a que acrescerá o IVA.
Julgamos assim parcialmente procedentes as conclusões de recurso apresentadas e, em conformidade com o exposto, deverá ser revogado o despacho recorrido, na parte em que fixou a remuneração devida ao encarregado de venda em 3% do valor de venda do imóvel dos autos, substituindo-se essa decisão pela fixação dessa remuneração em 4% do valor dessa venda, com todas as demais consequências daí advenientes, nomeadamente quanto à necessidade da Recorrente restituir os valores que já recebeu em excesso.
Resta fazer um pequeno excurso em matéria de custas, relativas apenas à instância recursiva.
As partes que objetivamente eram recorridas nesta apelação não responderam ao presente recurso, não lhe tendo dado causa. Logo, também não podem nele ser tidas como “vencidas”, nem podem, por isso mesmo, ser responsabilizadas pelas custas do recurso (Art.º 527.º n.º 1 do C.P.C.).
Estas custas são assim pela Recorrente, seja na medida do decaimento, seja na medida em que tirou proveito desta apelação (Art.º 527.º n.º 1, 1.ª e 2.ª parte, do C.P.C.). Sendo certo que não existem encargos, nem direito a reembolso de custas de parte pela parte vencida (que não existe), reduzindo-se a questão da sua responsabilidade ao pagamento da taxa de justiça (cfr. Art.º 529.º n.º 1 e n.º 2 do C.P.C.), que já se mostra liquidada.
V- DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente, por provada, revogando o despacho recorrido, datado de 13 de junho de 2022 (Ref.ª n.º 137031667 - p.e.), na parte que fixou a remuneração devida ao encarregado de venda em 3% do valor da transação do imóvel dos autos, a qual é substituída pela decisão de fixar essa remuneração em 4% do valor dessa venda, acrescido de IVA, com todas as demais consequências daí advenientes.
- As custas pela Apelante (Art.º 527.º n.º 1 do C.P.C.), sem mais custas a considerar para além da taxa de justiça já liquidada.
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Lisboa, 24 de janeiro de 2023
Carlos Oliveira
Diogo Ravara
Ana Rodrigues da Silva