ACIDENTE DE VIAÇÃO
FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL
LIMITE DA INDEMNIZAÇÃO
INSTITUTO DE SEGUROS DE PORTUGAL
CERTIDÕES
Sumário

I - O limite da indemnização a suportar pelo FGA é o valor mínimo do seguro obrigatório e não a soma dos limites referentes à indemnização máxima dos incidentes com danos corporais e materiais.
II - O ISP pode, no quadro das suas competências, emitir certidões que assumem a natureza de documentos autênticos, e que por isso, comprovam o valor das indemnizações liquidadas.

Texto Integral

Processo: 526/16.4T8VFR.P1


Sumário
……………………………….
……………………………….
……………………………….


I - Relatório
AA, ( Fls. 2 e ss) por si e na qualidade de tutora nomeada a BB, seu filho, instaurou a presente acção declarativa com processo comum contra “CC E FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, pedindo que a presente acção seja julgada provada e procedente e, por via dela, solidariamente condenados os RR. a pagar: a) Ao A., BB, a título de danos morais, a quantia de €500.000,00; b) Ao mesmo A., a título de dano biológico, a quantia de €80.000,00; c) Na renda mensal vitalícia ou temporária de €2.750,00 a pagar no início do mês a que disser respeito, por cheque a enviar para a tutora do mesmo, supra identificada; d) Nas custas de transportes e tratamentos médicos, medicamentosos e hospitalares que se tornem necessárias em função do estado de saúde do BB; e) À A., AA, a quantia de €100.000,00 a título de danos morais; f) Nos juros que se venceram sobra as quantias peticionadas desde a data da citação até integral pagamento e g) Nas custas e demais encargos do processo.
Alegam os AA. para o efeito, e em síntese, que no dia 20-09-2009, pelas 07:10 hr. ocorreu um sinistro, na Rua ..., na freguesia ..., concelho de Santa Maria da Feira, com o motociclo/ciclomotor, de marca ..., de matrícula ..-FP-.. (doravante FP), conduzido pelo seu proprietário, o 2.º réu CC, e seguindo nele como passageiro o A. BB; que o ciclomotor FP transitava pela Rua ..., no sentido ... – ... e que o condutor do mencionado ciclomotor ao passar por um desnível existente no pavimento, perdeu o controlo do mesmo, derivando para a esquerda, embatendo num muro que ladeava a faixa de rodagem. Em consequência do embate, quer o condutor, quer o passageiro do motociclo de matrícula ..-FP-.. tombaram no pavimento, tendo sido projetados e ficando imobilizados a cerca de 6/7 metros desse veículo, acrescentando ainda que à data do sinistro, o 2.º réu não se encontrava devidamente habilitado para conduzir aquele tipo de veículos na via pública. Mais diz o A. que em consequência do sinistro ficou com lesões irreversíveis para o resto da vida que demandam permanente ajuda de outrem pois que ficou com 98 pontos de Défice Funcional Permanente da integridade Físico-Psíquica. Refere ainda que o 2º R. não tinha transferido para qualquer seguradora a responsabilidade causada por danos causados a terceiros com a circulação do veículo pelo que é o FGA o responsável solidário com o 2º R. pelos danos materiais e morais emergentes, nos termos do disposto nos Arts. 5º e 49º do DL 291/07 de 21/08, acrescentando que o próprio FGA, por email dirigido ao Advogado do A., datado de 21/01/2011 informava que “ após instrução do seu processo de sinistro, decidiu assumir a responsabilidade do referido acidente de viação.”, tendo o FGA, por carta datada de 23/7/12, e a pedido do Advogado do A., informado que “ O Fundo de Garantia Automóvel, não irá invocar a excepção de prescrição dos direitos do seu constituinte, decorridos três anos após o acidente.” Concluem os AA. que o CC, com a sua conduta, foi o causador do acidente.
O Ré FGA contestou invocando desde logo que o A. pede uma indemnização no valor de €713.000,00, mas o capital mínimo obrigatoriamente seguro à data em que ocorreu o acidente de viação era de €1.800.000,00 assim repartido: de €1.200.000,00 por acidente para os danos corporais e €600.00,00 por acidente para os danos materiais, limite que invoca porquanto já procedeu ao pagamento de €561.415,15 a título de despesas hospitalares, médicas, material médico e medicamentos, concluindo que a sua responsabilidade civil está limitada ao valor máximo de €638.584,85. No mais refere que a responsabilidade do acidente é do condutor do veículo ciclomotor ..-FP-.., que à data do acidente a circulação daquele veículo ... estava coberta por um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel Apólice ... celebrado com a seguradora I.... Aduz que aquela seguradora informou o FGA que o referido contrato de seguro era nulo devido à existência de inexactidões dolosas prestadas pelo seu tomador, o R. CC. Nesses termos o FGA remeteu ao reclamante carta a aceitar a responsabilidade pela liquidação do presente sinistro. Em todo o caso, acrescenta o FGA, a anulabilidade do contrato de seguro é inoponível ao A., concluindo pela condenação da seguradora e absolvição do FGA se se verificarem os pressupostos de que depende o seu dever de indemnizar, designadamente a responsabilidade do seu segurado na produção do acidente, logo pela sua ilegitimidade nos presentes autos.
Foram apensados a estes os autos nº 2755/18.7T8VFR em que o autor FGA – Fundo de Garantia Automóvel instaurou a acção declarativa com processo comum contra “ F..., S.A.” e CC, com base no acidente ocorrido pedindo que: i. Ser o condutor do veículo de matrícula ..-FP-.. considerado único e exclusivo responsável pela produção do acidente de viação aqui em crise, e, consequentemente, ii. Ser a Ré F... condenada no pagamento ao aqui Autor da quantia de €589.840,80 (quinhentos e oitenta e nove mil e oitocentos e quarenta euros e oitenta cêntimos), acrescida dos juros legais, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento, incrementados em 25%, e ainda ao pagamento das despesas que o ora Autor vier a suportar com a cobrança do reembolso que também serão oportunamente liquidadas em ampliação do pedido ou em execução de sentença, bem como em custas e procuradoria; iii. Subsidiariamente, caso de demonstre a inexistência e invalidade do contrato de seguro de responsabilidade automóvel que titulava a circulação do veículo de matrícula ..- FP-.., à data de 20.9.2009, ser o Réu subsidiário condenado no pagamento ao Autor da quantia de €589.840,80 (quinhentos e oitenta e nove mil e oitocentos e quarenta euros e oitenta cêntimos), acrescida dos juros legais, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
A Ré contesta invocando desde logo a nulidade do contrato de seguro celebrado entre si e BB, e dizendo desconhecer a restante factualidade.
Foi saneada e instruída a causa e procedeu-se a julgamento findo o qual foi proferida a seguinte decisão:
a) julgo a presente acção, em que são AA. BB e AA e interveniente Activo Centro Hospitalar do Porto E.P.E. e RR. Fundo de Garantia Automóvel e CC e Interveniente Passivo F..., S.A., parcialmente procedente, por provada, e em consequência, condeno o FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL a pagar ao A. BB ( na pessoa da sua tutora): - A quantia de €80.000,00 ( oitenta mil euros) a que acrescem juros de mora desde a presente data ( da sentença ) até efectivo e integral pagamento; - A renda mensal de €2.500,00 ( dois mil e quinhentos euros) a pagar no início do mês a que disser respeito, por cheque a enviar para a tutora do mesmo, até esgotar o que sobrar do limite de capital seguro de €1.800.000,00 ( após descontar os demais montantes resultantes das várias condenações da presente sentença, quer no processo 526/16 quer no processo 2755/18 nos moldes acima equacionados); - A quantia de €500.000,00 ( quinhentos mil euros ) a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora desde a presente data ( da sentença ) até efectivo e integral pagamento.
Mais condeno o FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL a pagar à A. AA: - A quantia de €100.000,00 (cem mil euros) a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora desde a presente data (da sentença) até efectivo e integral pagamento (…).
Quanto à acção apensa: “Pelo exposto, e ao abrigo das referidas disposições legais, julgo a presente acção, em que é A. FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL e RR. F..., S.A. e CC, procedente, por provada, e em consequência, considerando o condutor do veículo ..-FP-.. único e exclusivo responsável pelo acidente, condeno a R. Seguradora F..., S.A.: - a pagar ao FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL a quantia de €589.840,80 ( quinhentos e oitenta e nove oitocentos e quarenta euros e oitenta cêntimos), acrescida dos juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento, incrementados em 25% e no pagamento das despesas que o FGA vier a suportar com a cobrança do reembolso. - Absolvo o R. CC do contra si peticionado nestes autos.
Inconformada veio o FGA interpor recurso, o qual foi admitido como de Apelação, a subir de imediato, nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo ( cfr. Arts. 639.º, n.º 1 e n.º 2.º alíneas a), b), na alínea a) do nº 1 do art. 644º, na alínea a) do nº 1 do art. 645º e art.º 647.º, nº 1 todos do Código de Processo Civi).
BB interpôs ainda um recurso subordinado que foi admitido.

*
2.1. Foram apresentadas as seguintes conclusões
I. O capital mínimo obrigatoriamente seguro à data em que ocorreu o acidente de viação em apreço nos autos é de 1.200.000,00€ (um milhão e duzentos mil euros).
II. Proceder à adição dos montantes mínimos de cobertura fixados no n.º 1 do artigo 12.º do SORCA é uma operação contrária ao legalmente determinado, que potencia o locupletamento indevido do lesado.
III. Ao não decidir assim, o Tribunal recorrido violou, entre outras disposições legais, o disposto nos artigos 12.º n.º 1 do SORCA, as Primeira, Segunda e Quinta Diretivas, o artigo 9.º do CC.

2.2. Os autores BB e outra contra-alegaram nos seguintes termos “o recurso está votado a um manifesto fracasso. Apesar disso, valerá a pena reconhecer ao mesmo uma estratégia que não só não tem apoio na lei, como também não tem apoio na interpretação que o recorrente pretende dar à norma que constitui a base da decisão quantificadora na douta decisão. (…) A Lei fala em dois tipos de danos que poderão advir dum acidente: os danos corporais e os danos materiais. Uns e outros são passíveis de ressarcimento, sendo incontestável que o capital mínimo obrigatoriamente seguro terá de ser ressarcido. Termos em que deve julgar-se improcedente o recurso interposto.

2.3. Os autores BB e outra vieram interpor recurso subordinado nos termos do qual concluem que:
1. Absolvendo o Réu/recorrido FGA do pagamento dos juros fixados a título de danos morais a contar da citação, a M. Juiz a quo fez errada aplicação ao caso sub judice do disposto no artº 566, nº 2 e 805º e 806º do Co. Civil, bem como do Acórdão Unificador de Jurisprudência do STJ nº 4/2002 de 27 de Junho;
2. Dando como provado que o R., FGA, à data da contestação, já havia despendido por conta das despesas emergentes do acidente a quantia de €589 840,80, a M. Juiz fez errada aplicação aos autos do disposto no artº 607º, nº 3,4 e 5 do Co. Proc. Civ. e artigo 374º, nº 1 e 2 do Cod. Civ.

2.4. O FGA contra-alegou, nos seguintes termos:
Quanto aos juros alega que a sentença condena nestes valores e não em outros diferentes, pois considera que esses são os valores justos e devidos à data da prolação da sentença – encontrando-se, por isso, atualizados. Logo, os juros só podem ser contabilizados desde a mesma sentença.
Quanto ao montante despendido diz que a Certidão emitida pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), que foi validamente junta aos autos, atesta o pagamento das indemnizações aos lesados, constituindo documento autêntico e fazendo prova plena de tal pagamento – Vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo n.º 157-E/1996.G1.S1, na data de 10.01.2013.
Pelo que termina pedindo a improcedência do recurso.

3. Questões a apreciar
1. Determinar a procedência ou não do recurso do FGA determinando qual é o capital máximo indemnizatório
2. Analisar as duas questões suscitadas no recurso subordinado (momento da contagem dos juros e comprovação do montante indemnizatório liquidado).

4. Motivação Factual
1. Em consequência das lesões sofridas no acidente de viação, no dia 20 de Setembro de 2009, cerca das 7,10 horas, na Rua ..., da freguesia ..., área deste concelho, quando seguia como passageiro no veículo ciclomotor com a matrícula ..-FP-.., na altura conduzido por CC, proprietário do mesmo, o supra referido filho de AA, de nome BB, ficou totalmente incapacitado para o trabalho e Incapacitado de reger a sua pessoa e administrar os seus bens;
3. Situação que determinou que o D.A. do M.P. intentasse acção de interdição que correu termos no Tribunal de Santa Maria da Feira, pelo então 4º Juízo Cível, acção essa que foi julgada procedente e provada e, na sentença, decretada a interdição do dito BB, datada da 25 de Outubro de 2013, já transitada em julgado, cuja certidão se encontra junta aos autos de providência cautelar nº 180/16.3TBVFR que corre termos pela Grande Instância Cível deste tribunal- J3, aqui apensa, para onde se remete e aqui se considera integralmente reproduzida.
4. Onde foi nomeada tutora do mesmo, sua mãe, ora A. AA, conforme da mesma certidão consta.
5. No dia 20 de Setembro de 2009, pelas 7,00 h., conduzia CC , ora 1º R., o seu veículo ciclomotor de matrícula ..-FP- .. na Rua ..., da freguesia ..., área deste concelho.
6. E transportava como passageiro o ora A., BB, vindos de ....
7. Após passar a circular na citada Rua ..., o condutor do ciclomotor, ao passar por cima de uma cova, existente na estrada, não se tendo apercebido da mesma cova, perdeu o controle do veículo que conduzia, acabando por se despistar e ir bater num muro ali existente.
8.Em consequência do embate, quer o referido CC, quer o A. caíram por terra, ficando a cerca de 6/7 metros do ciclomotor.
9. Em consequência do referido acidente, ambos os intervenientes sofreram ferimentos, tendo sido assistidos no Hospital.
10. Na altura em que conduzia o veículo em questão, CC não estava habilitado de licença de condução.
11. À data da propositura da acção o A. desconhecia que CC havia transferido para a Seguradora F... (anteriormente I...) a responsabilidade por danos causados a terceiros com a circulação do mesmo veículo, dispondo com aquela seguradora contrato de seguro obrigatório com tal finalidade.
13. Pelo que deduziu a presente acção contra o Fundo de Garantia Automóvel.
14. O próprio Fundo de Garantia Automóvel, por mail dirigido ao advogado signatário, datado de 21 de Janeiro de 2011, informava que, “após instrução do seu processo de sinistro, decidiu assumir a responsabilidade do referido acidente de viação ( cfr. doc. nº 1 junto com a petição inicial para o qual se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido).
15. E, por carta datada de 23.07.2012, a pedido do advogado signatário, informou o mesmo mandatário de que “O Fundo de Garantia Automóvel, não irá invocar a excepção da prescrição dos direitos do seu constituinte, decorridos três anos após o acidente” (cfr. doc. nº 2 junto com a petição inicial para o qual se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido).
16. Em consequência do acidente, dado o seu estado de saúde, foi o A. assistido de urgência no Hospital de Santo António, onde foi assistido no mesmo dia, para onde foi transportado, tendo permanecido internado nos serviços de cuidados intensivos até Abril de 2010, altura em que foi transferido para o Centro de Reabilitação Rovisco Pais.
17. Aí sofreu algumas intercorrências (infecções respiratórias) que deram origem ao internamento temporário do mesmo A. nos Hospitais da Universidade de Coimbra.
18. Durante o internamento no Centro de Reabilitação Rovisco Pais foi também submetido a uma intervenção cirúrgica à anca direita, intervenção essa que teve lugar em Maio de 2011 no Hospital de Cascais.
19. Durante o internamento no Centro de Reabilitação Rovisco Pais, foi também observado no Hospital de S. João, para realização de um teste de injecção intratecal com Baclofeno.
20. Desde 19 de Setembro de 2011 esteve internado no Hospital da Prelada, no serviço de Medicina Física e Reabilitação, fazendo tratamentos de manutenção, estando completamente dependente de 3ª pessoa para todas as actividades, necessitando de cuidados médicos e de enfermagem diários, mantendo incapacidade para deglutição e verbalização.
21. De acordo com o Dr. DD, no período compreendido entre o exame preliminar (Fevereiro de 2012) e o exame efetuado em 02 de Abril de 2013, embora se tenham mantido os tratamentos previstos e se tenha efectuado cirurgia de artrodese do punho direito em Julho de 2012, o A. não apresentou evolução clínica positiva significativa (ao contrário do que era esperado nessa data).
22. Encontrava-se (à data de Abril de 2013) em estudo a possibilidade de o A. ficar na sua residência prévia, ao cuidado de familiares, após determinação dos apoios necessários – cfr. Relatório de Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil efectuado na delegação do Norte do INML, Serviço de Clínica Forense, junto aos autos de providência cautelar apensa para onde se remete e se dá aqui por inteiramente reproduzido.
23 .Conforme Relatório de Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil efectuado na delegação do Norte do INML, Serviço de Clínica Forense, junto aos autos a Fls. 11 e ss dos autos de providência cautelar apensa para onde se remete e se dá aqui por inteiramente reproduzido o A. apresenta, como sequelas do acidente: - Défice funcional temporário- correspondente ao período durante o qual o A., em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação viu condicionada a sua autonomia na realização de actos correntes da vida diária, familiar e social, excluindo-se a repercussão na actividade profissional; - Défice Funcional Temporário Total (anteriormente designado por incapacidade geral total e correspondente com os períodos de internamento e/ou de repouso absoluto) que se situou entre 20/09/2009 e 1/10/2012, sendo assim fixável num período de 1108 dias; -Repercussão Temporária na Actividade Profissional (correspondendo ao período durante o qual a vítima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos inerentes à sua actividade habitual, considerando-se e repercussão Temporária da Actividade Profissional (anteriormente designada por Incapacidade Temporária Total, correspondente aos períodos de internamento e/ou repouso absoluto, entre outros), que se situou ente 20/09/2009 e 1/10/2012, sendo assim fixável num período total de 1108 dias. - No âmbito do período de danos permanentes, são valorizáveis, entre os diversos parâmetros de dano os seguintes: -Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-psíquica (refere-se à afetação definitiva da integridade física e/ou psíquica, da pessoa, com repercussão na actividade da vida diária, incluindo as familiares e sociais, e sendo independente das actividades profissionais..., considerando-se os danos permanentes constantes, com referência à tabela nacional de Incapacidades de Direito Civil (Anexo II do D.L. 352/07 de 23 de Outubro, num grau de 100 pontos, uma incapacidade parcial permanente, decorrente das lesões e o facto de estas serem causas de limitações funcionais importantes impeditivas da capacidade do A. realizar qualquer actividade da vida diária, tornando-se totalmente dependente de ajudas técnicas e de terceira pessoa) fixada em 98 pontos, sendo as sequelas impeditivas de toda e qualquer actividade profissional pois - O seu estado de saúde, em consequência das sequelas do acidente torna-o dependente, permanentemente de: - Ajudas medicamentosas- correspondente à necessidade permanente de recurso a medicação regular – ex. analgésicos antiespasmódicos ou antiepiléticos, sem os quais o A. não consegue ultrapassar as suas dificuldades em termos funcionais e nas situações da vida diária; - Tratamentos médicos regulares- correspondentes à necessidade de recurso regular a tratamentos médicos para evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas – ex. fisioterapia; - Ajudas técnicas (referem-se à incapacidade permanente de recurso a tecnologia para prevenir, compensar, atenuar ou neutralizar o dano pessoal. Do ponto de vista anatómico, funcional e situacional – com vista à obtenção de maior autonomia e independência possíveis nas actividades da vida diária; podem tratar-se de ajudas técnicas lesionais, funcionais ou situacionais; - Adaptação do domicílio, de veículo de transporte (correspondente à necessidade de recurso à tecnologia a nível arquitectónico, de mobiliário e/ou equipamentos, no sentido de permitir a realização de determinadas actividades diárias a pessoas que, de outra maneira, o não conseguiriam fazer sem a ajuda de terceiros; - Ajuda de terceira pessoa (correspondente a ajuda humana apropriada ao A. que se tornou dependente como complemento ou substituição na realização de uma determinada função ou situação da vida diária tudo conforme exame supra referido, já junto com a providência cautelar.
24. De acordo com o mesmo relatório, conforme supra se refere, das sequelas resultantes para o A., do acidente supra relatado, resultou um Défice Funcional Permanente da Integridadae Físico-Psíquica fixada em 98 pontos, num grau de 100 pontos.
25. Em consequência do acidente, de acordo com aquele relatório, o A. apresenta cicatriz localizada na face anterior do terço inferior do pescoço com 1,5 cm de diâmetro, compatível com cicatriz de traqueostomia; * Ao nível da face anterior do abdómen, verifica-se a existência de dispositivo para alimentação (sonda PEG) e, ao nível da fossa ilíaca direita, observa-se cicatriz disposta obliquamente de cima para baixo e da direita para a esquerda, com 10 cm de comprimento; * Na face posterior do punho e antebraço direitos apresenta cicatriz muito ténue própria de cirurgia de artrodeses do punho, com 7 cm; * Na face lateral da anca direita, apresenta cicatriz arciforme de concavidade anterior, com 29 cm de comprimento; * A anca direita apresenta mobilidade passiva anormal própria de procedimento de osteotomico do fémur; * Apresenta espasticidade marcada dos quatro membros, particularmente dos membros superiores, efectuando alguns movimentos ligeiros espontâneos do membro superior direito e pinça espática digito-digital com os 2ºs e 3º dedos da mão esquerda, * O punho esquerdo apresenta-se em flexão palmar rígida e o direito apresenta-se em posição neutra, devido a artrodose, com flexão rígida dos dedos desse lado em forma de punho fechado; * Apresenta ainda alguma mobilidade passiva espástica do membro inferior direito, apresentando, no entanto, flexo do joelho desse lado e
26. Não obstante apresentar as mobilidades referidas, constata-se que não apresenta movimentos úteis com nenhum membro/conforme relatório do INML junto aos autos da providência cautelar.
27. O A. apresenta, de acordo com tal Relatório: * A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 1/10/2012; * O período de Défice Funcional Temporário Total é fixável num período de 1108 dias; * O Período de Repercussão na Actividade Profissional Total é fixável num período de 1108 dias; * Quantum doloris fixável no grau 7/7; * Défice Funcional Permanente da Integridad Físico-Psíquica fixável em 98 pontos; * As sequelas em termos de Repercussão Permanente na Actividade Proficcional são impeditivas de toda e qualquer actividade profissional; * Dano estético permanente no grau 7 duma escala de 7. * Ajudas técnicas Permanentes: ajudas medicamentosas, tratamentos médicos regulares, ajudas técnicas, adaptação domicílio e ajuda de terceira pessoa.
28. Depois de efetuadas obras na habitação dos familiares com quem vivia à altura do acidente, custeadas pelo 2º R., teve o A. alta do Hospital da Prelada a 02/11/2015.
29. De acordo com o relatório de alta, à data da admissão a 19/09/2011, apresentava o A. um quadro de tetraplegia com espasticidade muito grave, acentuado emagrecimento (P= 38 Kgs), agitação psicomotora associada a queixas álgicas generalizadas. Estado de consciência vigil, sem resposta verbal, sem cumprimento de ordens. Deformidade músculoesquelética nos 4 membros com flexos irredutíveis dificultando a postura corporal e a prestação de cuidados de higiene.
30. Apresenta: - Disfagia, sendo alimentado por PEG, - Incontinência de esfíncteres; - Total dependência de cuidados de terceira pessoa a nível do leito;
31. Em consequência do seu estado foi posto em prática um plano de reabilitação cujos objectivos, dada a gravidade da lesão neurológica e das suas complicações, se orientou para: * controlar a dor e a espasticidade; * melhorar o estado de nutrição; * prevenir infecções essencialmente as respiratórias e * estimular a estimulação psicomotora.
32. Em consequência de tais tratamentos, a situação clínica evoluiu lenta mas positivamente, verificando-se a diminuição progressiva das queixas dolorosas generalizadas e da espasticidade.
33. Efectuaram-se testes de baclofeno intratecal com 50 ng e com 100 ng que se revelaram negativos obrigando ao controlo da espasticidade através de medicação oral em elevadas doses e, no controlo da espasticidade grave localizada, essencialmente nos membros superiores, foram efectuados tratamentos periódicos com toxina botulínica por infiltração intramuscular.
34. Não se verificaram melhoras de disfagia, mantendo-se a necessidade de alimentação por PEG.
35. Melhorou o seu estado de consciência apresentando-se geralmente calmo, sem sinais de dor, atento e reagindo às pessoas, reconhecendo algumas e muito em especial a mãe.
36. Cumpre algumas ordens simples de forma inconstante.
37. A prestação de cuidados de higiene e o vestir está agora facilitado após intervenção cirúrgica ortopédica realizada em 25/07/2012, pelo Dr. EE, “artrodose do punho direito com placa AO e libertação dos flexores do cotovelo direito” para correcção de flexo irredutível do punho e cotovelo direito.
38. Como intercorrências apresentou episódios de infecção respiratória das vias aéreas, com boa resposta à antibloterapia.
39. Apresenta ainda lesões por foliculite na face, tendo sido observado por duas vezes por dermatologia e, apesar da medicação instituída, não apresentou melhoria significativa;
40. O A., apresenta em consequência de TCE em acidente de viação: - Quadro de tetraparésia muito intenso e definitivo; -Afasia do tipo misto; -Disfagia grave obrigando a alimentação por PEG; -Incontinência de esfíncteres; -Deformidades músculo-esqueléticas secundárias à hipertonia e imobilidade; - Total dependência de cuidados de terceira pessoa.
41. Considerando-se o seu estado funcional estabilizado, (Relatório de Alta do Hospital da Prelada que se juntou à petição da providência cautelar sob o doc. nº 3).
42. No Relatório de Alta a que se acaba de fazer referência, o médico fisiatra que o elaborou (Dr. DD) aconselha, após a alta e o regresso a casa: * A manutenção de boas condições clínicas e a prevenção de complicações resultantes do seu estado mórbido, nomeadamente a prestação de alguns cuidados de Fisioterapia e vigilância Fisiátrica, com uma periodicidade de pelo menos 2 ou 3 vezes por semana, incluindo mobilizações poliarticulares e cinesioterapia respiratória; * Vigilância fisiátrica mensal e sempre que as condições clínicas o aconselharem; * Devendo proceder-se à substituição regular do PEG de acordo com a deterioração apresentada, no intervalo máximo de 6 meses e controlo analítico hepático e renal (inicialmente de 6 em 6 meses).
43. Foram adquiridos produtos de apoio para permitir o transporte do paciente, ora A., bem como a sua melhor postura em cadeira de rodas, o repouso em leito adequado e a sua transferência de e para o leito.
44. Além da medicação (analgésicos, antiespasmódicos, antipilépticos – cfr. doc. 3v. junto com a petição para o qual se remete e aqui se considera reproduzido integralmente) é ainda necessária a aquisição de vários consumíveis, face aos deficits que o doente (ora A.) apresenta, e que se apresentam de carácter permanente, nomeadamente: - Seringas para alimentação por PEG(1/dia); - Colectores Conveen 30 mm de diâmetro (1/dia); - Fraldas de adulto (cerca de 5/dia) - Resguardos de incontinência (2/dia), - Babetes para alimentação+ baba-(6/dia) - Esponjas de banho e limpeza do períneo, descartáveis (6/dia) - Compressas esterilizadas de gaze 15 x 15 (1 pacote por dia), conforme relatório de Alta do Hospital da Prelada junto aos autos de providência cautelar sob o doc. nº 3, o que determina uma despesa mensal, só em produtos farmacêuticos, da ordem dos €907,67 .
45.O A. nasceu a 10 de Maio de 1988 ( cfr. certidão de nascimento junta como doc. nº 4 com a petição inicial para o qual se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido), tendo à data do acidente (20 de Setembro de 2009) 21 anos de idade.
46. Era pessoa saudável, válida para o trabalho, alegre e que gostava de gozar os prazeres da vida.
47. Gostava de trabalhar onde arranjasse emprego e, na altura, trabalhava no Hipermercado ..., como operador ajudante, prestando serviço 4 horas por dia, auferindo um salário mensal base de €235,00 ( cfr. doc. nº 5 junto com a petição inicial para o qual se remete e aqui se dá por integral ente reproduzido ).
48. Tendo a M..., SA, por carta datado de 7 de Abril de 2010, comunicado ao A. que o contrato de trabalho ficava sem efeito na data do seu termo ( cfr. doc. nº 6 junto com a petição inicial para o qual se remete e aqui se dá por integral ente reproduzido).
49. O A. ficou numa situação de permanente incontinência, com necessidade de cuidados higiénicos permanentes,
50. Passou a ter de ser alimentado por PEG (gastro endoscópica percutânea);
51. Passou a depender da colaboração permanente de terceira pessoa ao nível do leito para ajudar na sua movimentação, para os cuidados de higiene e limpeza diárias;
52. Encontra-se num estado de tetraplegia, com espasticidade muito grave;
52. Apresenta deformidades músculo-esqueléticas nos quatro membros com flexos irredutíveis, dificultando a postura corporal e a prestação de cuidados de higiene;
53. Estando, como actualmente se encontra, no seu domicílio tem necessidade de apoio médico para controlar a dor e a espasticidade,
54. Para melhorar o seu estado de nutrição,
55. Para prevenir infecções, especialmente as respiratórias,
56. Para iniciar a estimulação psicomotora.
57. O A. sofreu várias intervenções cirúrgicas, (conforme consta do relatório citado elaborado pela Delegação do Norte do INML, sob o capítulo “A.História do Evento” e B. Dados Documentais”);
58. As várias intervenções cirúrgicas e tratamentos a que foi submetido provocaram-lhe dores atrozes, que se prolongam com os tratamentos que terão de lhe ser prestados no domicílio “ad aeternum”;
59. Por força do seu estado e da alimentação que lhe é proporcionada, viu drasticamente reduzido o seu peso, que era, na altura da alta do Hospital da Prelada, em 2 de Outubro de 2015, de 38 Kgs!
60. O A. reconhece a presença de familiares, nomeadamente sua mãe, (relatório junto) e que, consciente disso, ainda mais aumenta a sua amargura.
61. À data do acidente o A. encontrava-se em pleno vigor da vida, era saudável, perfeitamente válido para o trabalho e gostava de ajudar os pais a minorar as suas dificuldades económicas, contribuindo com parte do seu salário para o efeito.
62. Todo o mundo e vida com que o A. sempre sonhou, ficaram definitivamente destruídos no fatídico acidente que lhe provocaram sequelas extensas e redutoras da sua capacidade.
63. O seu peso, normal antes do acidente, era de cerca de 65 Kgs.
64. Na altura da alta em 2 de Outubro p.p., pesava só 38 Kgs.
65. Apresenta deformidades músculo-esqueléticas nos quatro membros, com flexos irredutíveis, dificultando a postura corporal e até a prestação de cuidados de higiene.
66. Dadas as sequelas do acidente a Segurança Social fixou uma pensão de invalidez do montante mensal de €556,83, sendo €60,60 de pensão estatutária, €318,44 de complemento social €177,79 de complemento de dependência (doc. nº 7 junto com a providência cautelar para o qual se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido).
67. Tal pensão foi-lhe atribuída pela Segurança Social com início a partir de 10/09/2012 (doc. nº 7 referido).
68. Acamado como está, com necessidade de tratamento médico, medicamentoso e de enfermagem, fisiatria e fisioterapia, para serem seguidas as prescrições do médico, Dr. DD, despenderá o A., mensalmente, quantia não inferior a €1.200,00 (doc. nº 3 referido).
69. Com a necessidade de contratar duas pessoas para assistirem o A., nos cuidados de higiene, ministração da alimentação e curativos de emergência, despenderá o A. quantia não inferior a 2 salários mínimos, no valor actual de €530,00, a que acrescerão os encargos com os subsídios de féria e natal de igual montante, e dos encargos com a Segurança Social, à taxa de 24,5%, no valor de €124,55.
70. O A. tem necessidade de utilizar transporte para deslocação às unidades hospitalares adequadas, bem como tratamentos indispensáveis, médicas e medicamentosas, a prestar em tais estabelecimentos.
71. A A. mãe do A. tem sido, ao longo do decurso dos anos, após a eclosão do acidente, a pessoa da cabeceira do seu filho,
72. Que o acompanha diariamente;
73. Que visitava o filho quase diariamente, quando estava internado nos estabelecimentos hospitalares da zona.
74. Que esteve sempre presente quando o filho foi transferido para os Hospitais ..., para o Hospital ..., no Hospital de Santo António e no Hospital de S. João, do Porto, contactando amargurada com o estado do filho,
75.E que presentemente vai estar permanentemente ao lado do BB uma vez que o mesmo passou a estar permanentemente na casa da também A., vivendo amargurada o seu presente e o do filho,
76. Que “vive” e sofre como o BB as dores que o atingem, que sente a amargura da sua inoperância em aliviar as dores ao BB,
77. Que, para estar junto do filho, pediu a sua reforma antecipada, 78. O FGA já suportou €561.415,15 (quinhentos e sessenta e um mil, quatrocentos e quinze euros e quinze cêntimos), a título de despesas hospitalares, médicas, material médico e medicamentos.
79. O veículo do ciclomotor de matrícula ..-FP-.., à data de 20 de setembro de 2009, encontrava-se coberto por um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, titulado pela apólice n.º ..., celebrado com a I... - Companhia de Seguros, S.A..
80. Tendo essa seguradora procedido à emissão da respetiva carta verde com validade para o período em questão.
81. A sobredita seguradora informou o FGA que o contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel identificado era nulo devido à "...existência de inexactidões dolosas..." prestadas pelo seu tomador, o aqui segundo Réu CC,
82. Já que o mesmo teria indicado na proposta de seguro "...no item da condução habitual do veículo que se pretendeu segurar (sendo indicado expressamente como condutor habitual uma pessoa que nunca teve essa qualidade, sendo o condutor habitual uma pessoa que nunca teve essa qualidade,...),..." - cfr. documento 1 junto com a contestação do FGA para o qual se remete e se considera integralmente reproduzido.
83. Contactado o responsável civil o mesmo veio confirmar a existência de seguro válido - vide documento 2 junto com a contestação do FGA para o qual se remete e se considera integralmente reproduzido
84. Tendo o FGA remetido ao Reclamante uma comunicação a aceitar a responsabilidade pela liquidação do presente sinistro, invocando o disposto no artigo 50.º do Dec. Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
85. O FGA assumiu a regularização do sinistro, comunicando essa situação quer à sobredita seguradora, quer ao aqui Autor, quer ainda ao responsável civil.
86. O FGA liquidou um total de €589.840,80 (quinhentos e oitenta e nove mil, oitocentos e quarenta euros e oitenta cêntimos), assim discriminados: - Despesas Hospitalares/Assistências Hospitalares: €245.808,33 (duzentos e quarenta e cinco mil, oitocentos e oito euros e trinta e três cêntimos); - Despesas com Tratamentos/Fisioterapia: €80.333,56 (oitenta mil, trezentos e trinta e três euros e cinquenta e seis cêntimos); - Despesas com Tratamentos/Internamento: €192.160,17 (cento e noventa e dois mil, cento e sessenta euros e dezassete cêntimos); - Despesas com Transportes: €9.981,21 (nove mil, novecentos e oitenta e um euros e vinte e um cêntimos); - Despesas Médico/Medicamentosas: €9.095,14 (nove mil e noventa e cinco euros) e catorze cêntimos); - Ajudas Técnicas: €5.568,99 (cinco mil, quinhentos e sessenta e oito euros e noventa e nove cêntimos); - Despesas com Obras de Adaptação da sua Residência: €45.876,52 (quarenta e cinco mil, oitocentos e setenta e seis euros e cinquenta e dois cêntimos). Cfr. 287 ordens de pagamento, juntos como documento n.º 12 para onde se remete e se consideram integralmente reproduzidos.
87. De acordo com os registos informáticos existentes na Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, o último pagamento foi efetuado no passado dia 22.3.2017 - cfr. certidão emitida pelo Conselho de Administração da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, Certidão emitida pelo Conselho de Administração da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, que foi junta aos autos apensos em 30/7/2018, para onde se remete e aqui se dá por reproduzida na íntegra.
88. O Centro Hospitalar do Porto E.P.E. prestou assistência ao A. BB, no Serviço de Urgência a 20/09/09, Internamento de 20/09/09 a 20/04/10 e Consulta de Neurocirurgia no dia 1/6/2010, tendo aquela assistência custado ao Centro Hospitalar €48.103,47.
89. (a) No dia 20-09-2009, pelas 07:10 hr. ocorreu um sinistro, na Rua ..., na freguesia ..., concelho de Santa Maria da Feira, com o motociclo/ciclomotor, de marca ..., de matrícula ..-FP-.., conduzido pelo seu proprietário, o 2.º réu e seguindo nele como passageiro BB.
90. (b) O ciclomotor FP transitava pela Rua ..., no sentido ... - ..., a uma velocidade superior a 50km/h.
91. (c) A referida estrada descreve-se em reta de boa visibilidade.
92. (d) O condutor do mencionado ciclomotor ao passar por um desnível existente no pavimento, perde o controlo do mesmo, derivando para a esquerda e embatendo num muro que ladeava a faixa de rodagem.
93. (e) Em consequência do embate, quer o condutor, quer o passageiro do motociclo de matrícula ..-FP-.. tombaram no pavimento, tendo sido projetados e ficando imobilizados a cerca de 6/7 metros desse veículo.
94. (f) À data do sinistro, o 2.º réu não se encontrava devidamente habilitado para conduzir aquele tipo de veículos na via pública.
95. (g) O 2.º réu celebrou com a 1.ª ré (à data, I... – Companhia de Seguros, S.A.), um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel que titulava a circulação do veículo ..-FP-.., através da apólice n.º ..., emitida em 26-08-2009, indicando como condutor habitual FF, com limite de capital de €1.800.000,00, sendo €1.200.000,00 a cobertura de danos corporais por lesado e €600.000,00 a cobertura para danos materiais, conforme cópia junta sob doc. 4 com a contestação, para onde se remete e cujo teor se considera reproduzido.
*
*
5. Motivação jurídica

1. Do recurso do FGA
Pretende este que a decisão violou o limite máximo indemnizatório aplicável ao FGA que é de 1.200.000,00.
A sentença decidiu, de facto, que deve este pagar “até esgotar o que sobrar do limite de capital seguro de €1.800.000,00”.
O acidente ocorreu em 20.9.2009. Logo é aplicável o disposto no art. 12º, do DL 291/2007, de 21.8 dispõe que “O capital mínimo obrigatoriamente seguro, nos termos e para os efeitos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo anterior é de (euro) 1 200 000 por acidente para os danos corporais e de (euro) 600 000 por acidente para os danos materiais”.
Mas, desta norma não se pode retirar que o valor a suportar pelo FGA possa ser superior ao valor mínimo segurado.
E, esse valor, conforme resulta do teor literal, é sempre, no máximo 1.200.000 por acidente, pois, o limite variável depende apenas e só da natureza dos danos, que por sua vez, estão limitados de forma diferente tendo em conta a maior proteção dos direitos de personalidade do lesado.
Portanto, se dúvidas houvesse o sentido literal da norma, nos termos do art. 9º, do CC determina o respeito pela expressão “no máximo 1.200.000 euros por acidente”.
Depois, se quisermos o elemento sistemático aponta na mesma direção, o nº2, do mesmo artigo altera e aumenta os limites, frisando, porém, que são de 2.500.000 euros por acidente.
E, fundamentalmente o art. 49º, do mesmo diploma preceitua que “1 - O Fundo de Garantia Automóvel garante, nos termos do n.º 1 do artigo anterior, e até ao valor do capital mínimo do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, a satisfação das indemnizações”. (nosso sublinhado).
Esta norma desfaz, pois, quaisquer duvídas que possam existir ao fazer referência a um limite máximo. Depois, será dentro desse limite que se efectuam as diferenças relativas à natureza dos acidentes.
Por fim, se analisarmos o elemento histórico podemos concluir que o Fundo de Garantia Automóvel, resulta do disposto na 2.ª Diretiva Automóvel (artigo 10.º da Diretiva de Codificação) que prevê a obrigação, por parte dos Estados-membros, de criarem um organismo que tenha por função reparar, pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro, os danos materiais e pessoais causados por:
i) veículos não identificados, e
ii) veículos em relação aos quais não tenha sido respeitada a obrigação de contratação de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
Ou seja, além de subsidiária a responsabilidade do FGA está limitada ao capital do seguro e não à circunstância de existirem danos materiais e pessoais.
Note-se aliás que só com o Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro é que o FGA passou a assegurar também o ressarcimento de danos materiais e em situações limite, pelo que é congruente a existência de um limite total por acidente e não por natureza do dano.
Concluímos, por isso, assistir razão à apelante e, por via disso, que a decisão excedeu o limite aplicável ao capital indemnizável pela Ré FGA.
*
Teremos de notar que não faz parte do recurso a aplicação aos autos das regras previstas, além do mais, no art 24 [1], da LSO.
*
2. Do Recurso subordinado
Pretendem os apelantes subordinados que: Absolvendo o Réu/recorrido FGA do pagamento dos juros fixados a título de danos morais a contar da citação, a M. Juiz a quo fez errada aplicação ao caso sub judice do disposto no artº 566, nº 2 e 805º e 806º do Co. Civil, bem como do Acórdão Unificador de Jurisprudência do STJ nº 4/2002 de 27 de Junho”.
Respondeu o FGA que “Quanto aos juros alega que a sentença condena nestes valores e não em outros diferentes, pois considera que esses são os valores justos e devidos à data da prolação da sentença – encontrando-se, por isso, atualizados. Logo, os juros só podem ser contabilizados desde a mesma sentença”.
A sentença dos autos no que respeita aos juros determinou quanto aos “danos não patrimoniais, (..) que acrescem juros de mora desde a presente data (da sentença) até efectivo e integral pagamento”, e fixa esse montante tendo em conta a data dessa decisão.
Ora, o Ac. UJ nº 4/02 determina que: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do nº 2 do artº 566º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artºs 805º, nº 3 (interpretado restritivamente) e 806º, nº 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação”.
E, a razão de ser desta posição à qual sempre aderimos, é porque ao fixar nessa data o valor da indemnização o tribunal efectuou já uma actualização da quantia.
Com efeito esse determinou que, na medida em que as indemnizações atribuídas tinham “em conta não só todos os danos alegados, mas também a correcção monetária”, a “aplicação simultânea do n.º 2 do art. 566.º e do art. 805.º, n.º 3, conduziria a uma duplicação de benefícios resultantes do decurso do tempo”. Por isso é que o Supremo tribunal de Justiça determinou que “o n.º 3 do art. 805.º cederá quando a indemnização for fixada em valor determinado por critérios contemporâneos da decisão”.[2]
Deste modo, importa apenas distinguir se a indemnização foi ou não actualizada, pois, “os juros são devidos desde a data da decisão que os atribui, se o valor do capital tiver sido arbitrado nessa data de forma actualizada; e são devidos desde a data da citação se o valor do capital arbitrado não se reportar à data da decisão”[3].
Acresce que esse é, por via desse aresto, o entendimento pacifico e uniforme ente nós.
Ora, in casu a sentença refere que aplicou o mesmo pelo que “os juros deverão ser contabilizados à taxa legal, a contar data da prolação desta decisão e até efetivo e integral pagamento (neste sentido vide Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2002, in Diário da República, I Série A, de 27 de Junho”.
Ou seja, a indemnização foi fixada, expressamente, de forma actualizada.
Pelo que temos de concluir que a mesma atualizou as quantias e, por isso, os juros de mora iniciam-se apenas após essa data.
Improcede, pois, a questão suscitada.
*
2.1. Da comprovação dos montantes despendidos
Pretendem os apelantes do recurso subordinado que: “Dando como provado que o R., FGA, à data da contestação, já havia despendido por conta das despesas emergentes do acidente a quantia de €589 840,80, a M. Juiz fez errada aplicação aos autos do disposto no artº 607º, nº 3,4 e 5 do Co. Proc. Civ. e artigo 374º, nº 1 e 2 do Cod. Civ.
Respondeu o FGA que a Certidão emitida pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), que foi validamente junta aos autos, atesta o pagamento das indemnizações aos lesados, constituindo documento autêntico e fazendo prova plena de tal pagamento – Vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo n.º 157- /1996.G1.S1, na data de 10.01.2013.
Estamos perante o pedido de alteração de um facto com base numa norma jurídica.
O art 4º, nº5, do DL 289/2001, de 13/11 dispõe que “O ISP pode passar certidões de factos relacionados com as suas atribuições, nos termos da legislação aplicável.”.
Deste modo, esta norma consagrou a possibilidade de que as certidões emitidas pelo Instituto de Seguros de Portugal, atestando o pagamento de indemnizações aos lesados pelo Fundo de Garantia Automóvel, por cuja gestão aquele é responsável, sejam documentos autênticos.
Se são documentos autênticos fazem prova plena de tal pagamento nos termos do art. 394ºdo Código Civil.
O, que é pacífico entre nós.[4]
Logo, certamente por lapso foi citado o art. 374º, do CC que diz respeito a documentos particulares.
Improcede, pois, a questão suscitada
*
6. Deliberação
Pelo exposto, o tribunal julga a presente apelação totalmente procedente por provada e por via disso revoga a sentença recorrida na parte que determinou que o limite da indemnização é superior a um milhão e duzentos mil euros (1.200.000) .
Mais julga o recurso subordinado improcedente, por não provado.

Custas a cargo dos apelados e recorrentes subordinados, pois decaíram totalmente em ambas as apelações.

Porto em 14.12.22
Paulo Duarte Teixeira
António Carneiro da Silva
Isabel Ferreira.
_________________
[1] Cfr sobre esse rateio, Ac do STJ de 19/06/2012, proc. n.º 4445/06.4TBBRG.G1.S1.
[2] Teor do aresto in Diário da república, 1.ª Série-a, de 27 de junho de 2002.
[3] Por todos o Ac desta secção RP de 27.9.18, nº 75/10.4TBAMT.P1 (Deolinda Varão) que decidiu “ Se o juiz arbitra juros apenas a partir da data da decisão em relação à indemnização por danos não patrimoniais, tem não só de dizer expressamente como de demonstrar, na sentença, que fixou a indemnização de forma actualizada. Só assim pode aplicar a doutrina do Ac. UJ acima citado. Não se pode presumir que os danos não patrimoniais fixados na sentença são actualizados. Assim, se o juiz não explica, nem demonstra, que tenha fixado a indemnização por danos não patrimoniais de forma actualizada, são devidos juros desde a citação, por aplicação das disposições conjugadas dos citados artºs 566º, nº 2 e 805º, nº 3 do CC. “
[4] Entre vários Ac da RL de 29.9.22, 1795/19.3T8OER.L1-6 (Vera Antunes); Ac da RG de 31.10.18, nº 642/14.7TBBGC.G1 (Eugénia Cunha), Ac do STJ de 10.1.2013, nº 157-E/1996.G1.S1 (JOÃO BERNARDO) – já citado pela apelada-;