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CRIME DE CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
TÍTULO DE CONDUÇÃO CASSADO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Sumário
I – A partir de 8 de Janeiro de 2021, a cassação da carta fundada na perda total de pontos passou a determinar também a caducidade do título de condução (art. 130.º, n.º 1, al. d), do Código da Estrada, na redaçcão do DL n.º 102.º-B/2020). II - Esta caducidade é definitiva, pois apenas quando se mostrarem decorridos dois anos sobre a efectivação da cassação é que o titular deste título de condução assim caducado pode obter novo título de condução e se para tanto obtiver aprovação em exame especial (artigos 130.º, n.º 2 e n.º 4, al. a), e 148.º, n.º 11, do Código da Estrada). III - Os titulares de título de condução definitivamente caducado – por cassação administrativa – consideram-se, para todos os efeitos legais, não habilitados a conduzir os veículos para os quais o título fora emitido e o agente passa a ser punido criminalmente nos termos do art. 3.º do DL n.º 2/98, ex vi art. 130.º, n.º 5, do Código da Estrada, na redacção do DL n.º 102-B/2020. IV - A existência de antecedentes criminais rodoviários não obsta, só por si, à formulação do juízo de prognose favorável e à consequente suspensão da execução da pena. V - Por outro lado, a mera integração familiar e profissional do agente não pode ser um salvo-conduto para a prática reiterada e impune de crimes rodoviários. VI - Quem infringe reiteradamente as normas básicas da condução rodoviária não está socialmente integrado. VII - A recaída sucessiva na prática de crimes rodoviários, bem como a total impermeabilidade às advertências solenes inerentes às penas de multa e à pena de substituição já sofridas, inculcam, definitivamente, a ideia de que já não é possível formular um prognóstico favorável de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Texto Integral
Acordam os juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães
I – RELATÓRIO 1. Decisão recorrida
No âmbito do processo abreviado n.º 87/21...., que corre os seus termos no Juízo Local Criminal ..., foi proferida sentença, datada de 06.04.2022, que condenou o arguido AA nos seguintes termos (transcrição):
“a) Condeno o arguido AA, pela prática, em autoria material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292.º n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, e pela prática de um crime de condução ilegal previsto e punido no artigo 3.º n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3-1, na pena de seis meses de prisão e, em, cúmulo jurídico na pena única de dez meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação (no espaço físico da residência e durante 24h/dia), nos termos do artigo 43.º/1 e 2 do Código Penal, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância nos termos regulamentados na Lei n.º 33/2010, de 2/9. b) Vai ainda o arguido condenado na pena acessória de um ano e seis meses de proibição de conduzir qualquer veículo motorizado na via pública – artigo 69.º, n.º 1, al. a) do Código Penal.”
2. Recursos 2.1. Inconformado parcialmente com esta decisão, o MINISTÉRIO PÚBLICO recorreu da mesma, tendo concluído a respectiva motivação nos seguintes termos (transcrição):
“(…) 1ª) Resultou provado, entre o mais, que no dia 09/03/2021, pelas 19H30m, na via pública, concretamente na Avenida ..., neste Concelho ... tripulou o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, de marca ..., modelo ..., de matrícula ..- DO-.., sem que possuísse carta de condução que legalmente o habilitasse a fazê-lo e sendo portador de uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,57 g/l; 2ª) Tendo a temática ora em apreço por subjacente, cumpre desde logo atender a que, conforme decorre do teor do citado print da base de dados do IMTT de fls. 8, 30 e das informações do IMTT de fls. 45, o arguido AA à data dos facto ora em apreço era titular, de uma carta de condução n.º ...04 que havia sido já objecto de cassação, em 19 de Novembro de 2019, nos termo e para o efeitos dos artigos 130º, n.º3, b) e 148º, n.º2 e 10, ambos do Código da Estrada, por decisão d Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (em sede dos autos de processo de cassação n.º 660/2019); 3ª) No que concerne ao regime jurídico a considerar no caso vertente, cumpre desde logo atender ao teor do artigo 121º do Código da Estrada (na versão decorrente das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 138/2012, de 5 de Julho), em cujos números 1 e 4 respectivamente se prevê que “só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito” e que, “o documento que titula a habilitação legal para conduzir ciclomotores, motociclos, triciclos, quadriciclos pesados e automóveis designa-se «carta de condução»”; 4ª) Bem como, ao artigo 3º do Decreto-Lei n.º 138/2012, de 5 de Julho (vulgo “Regulamento Legal de Habilitação a Conduzir”), que consigna e prevê as categorias de cartas de condução existentes, tipificando, entre o mais, no seu n.º 2, alínea e) e f) que “sem prejuízo do estabelecido nas disposições relativas à homologação de veículos, a carta de condução habilita a conduzir uma ou mais das seguintes categorias de veículos: e) B1 – quadriciclos cuja massas sem carga, excluída a massa das baterias no caso dos veículos eléctricos, não exceda 450kg ou 600kg, consoante se destine, respectivamente, ao transporte de passageiros ou mercadorias; f) B – veículos a motor com massa máxima autorizada não superior a 3 500 kg, concebidos e construídos para transportar um número de passageiros não superior a oito, excluindo o condutor, a que pode ser atrelado um reboque com massa máxima até 750 kg ou, sendo esta superior, desde que a massa máxima do conjunto formado não exceda 3 500 kg; 5ª) No caso ora em análise, conforme decorre dos factos dados como assentes na sentença recorrida (com os quais concordamos, diga-se), o arguido AA, veio a circular na condução de um veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-DO-.., sendo que, contudo, em tal ocasião, o seu titulo de condução n.º ...04, (emitida pelos serviços do IMTT em 12 de Fevereiro de 2016) de categoria B (veículos automóveis ligeiros) e B1 (triciclos ou quadriciclos) com correspectivo período de validade averbado até 8 de Maio de 2039, se encontrava caducado, por ter sido objecto de cassação, em 19 de Novembro de 2019, nos termo e para os efeitos dos artigos 130º, n.º3, b) e 148º, n.º2 e 10, ambos do Código da Estrada, por decisão da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (em sede dos autos de processo de cassação n.º 660/2019); 6ª) Contrariamente ao que veio a ser decidido pelo Tribunal “a quo”, consideramos que tal ausência de devida habilitação e legitimação, não se afigura subsumível ao tipo legal de crime de condução de veículo a motor sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, pelo qual o arguido AA veio a ser, entre o mais, condenado, mas apenas e tão só, a uma infracção de cariz contra- ordenacional, subsumível ao artigo 130º, n.º7, do Código da Estrada; 7ª) Isto porquanto, no que se reporta à validade dos títulos de condução e, desde logo, à perda da mesma, cumpre atender às circunstâncias consignadas no n.º 1 do referido artigo 130º do Código da Estrada, em cuja alínea d), entre o mais de prevê que “o título de condução caduca se…for cassado nos termos do artigo 148º do presente Código ou do artigo 101º do Código Penal”; 8ª) Na sequência das alterações introduzidas, entre o mais ao referido normativo do artigo 130º do Código da Estrada, pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9 de Dezembro, veio a cessar a distinção que, até então, se sucedia entre títulos de condução caducados e, títulos de condução cancelados (sendo que apenas neste último caso tal circunstância comportava e correspondia à ulterior inexistência de qualquer habilitação para conduzir, subsumível ao tipo legal de crime do artigo 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro); 9ª) Com a actual redacção legal, salvo melhor entendimento, apenas será de considerar como verificada uma situação de efectiva inexistência de título de condução para conduzir, por seu turno, susceptível de ser subsumida ao referido ipo legal de crime do artigo 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, nas situações taxativamente consigna as no n.º3, c) e d) do artigo 130º do Código da Estrada (ou seja, “quando o titular reprove, pela segunda vez, em qualquer das provas do exame especial de condução a que for submetido” e, quando “tenham decorrido mais de dez anos sobre a data em que deveria ter sido renovado”); 10ª) No que se reporta às consequências jurídicas de tal circunstância e inerente factualidade, tal comporta, apenas e tão só, a verificação da infracção contra-ordenacional prevista e punida no sobredito artigo 130º, n.º7, do Código da Estrada (o qual refere que “quem conduzir veículo com título caducado, nos termos previstos no n.º1, é sancionado com coima de €120,00 a €600,00”) e já não o referido tipo legal de crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro; 11ª) Tal sancionamento a título meramente contra-ordenacional constitui uma opção, por parte do legislador de manter a punição de situações – como a que se encontra ora em análise – de perda de validade/caducidade dos títulos de condução decorrente das situações consignadas no artigo 130º, n.º1 a) a d), do Código da Estrada, a título de ilícito de mera ordenação social e, reservar a punição de cariz penal (decorrente do artigo 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro) apenas e tão só para as já aludidas situações taxativamente consignadas no n.º3, c) e d) do artigo 130º do Código da Estrada; 12ª) Na vigência do RHLC aprovado pelo DL 138/2012 de 5/7, competia ao IMT cancelar as cartas de condução caducadas verificados os requisitos legais. Quando a carta fosse cancelada e o respectivo titular conduzisse na via pública nessas condições incorria na prática de um crime de condução sem habilitação legal na previsão do artigo 3º do DL nº 2/98 de 03/01. Caso a carta não tivesse sido objecto de cancelamento, estando apenas caducada, o titular incorria apenas na prática de uma contra-ordenação sancionada como uma coima. 13ª) Posteriormente, com a publicação do DL n.º 102-B/2020, de 09/12, em vigor desde 09/01/2021, deixou de ser necessário o cancelamento da carta de condução, estando sujeita a revalidação e a renovação e a impossibilidade de tal renovação se tiverem decorrido mais de 10 anos sobre a data da renovação. A partir de então, afora as situações de não revalidação previstas no nº 1 do artigo 130º do CE, cuja verificação é sancionada apenas com coima, nas demais situações estamos perante a existência de “não habilitados a conduzir” do nº 5 citado preceito, o que faz cair a situação dos autos no âmbito da norma do artigo 121º do CE., e logo no âmbito da norma incriminadora do artigo 3º do DL nº 2/98 de 03/01; 14ª) Desde 9/1/2021 deixou de ser necessário o cancelamento da carta de condução, estando sujeita a revalidação e a renovação - e a impossibilidade de tal renovação se tiverem decorrido mais de 10 anos sobre a data da renovação -, manteve-se a redação do nº 5 e foi alterado o nº 7 que comina com coima o comportamento relativo apenas ao nº 1. 15ª) Assim sendo, consideramos que no caso vertente, o Tribunal “a quo” incorreu num manifesto e efectivo erro quanto à subsunção jurídica a efectuar quanto a parte da factualidade dada como assente na sentença recorrida; 16ª) Contrariamente ao que veio a ser decidido pelo Tribunal “a quo”, consideramos a ausência de devida habilitação e legitimação, por parte do arguido AA para circular na via pública na condução do sobredito veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-DO-.., quando, à data, o seu título de condução n.º ...04 que havia sido já objecto de cassação, em 19 de Novembro de 2019, tendo, por conseguinte, caducado e assim perdido a sua validade, não se afigura subsumível ao tipo legal de crime de condução de veículo a motor sem habilitação legal, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, pelo qual o arguido AA veio a ser, entre o mais, condenado, mas apenas e tão só, a uma infracção de cariz contraordenacional, subsumível ao artigo 130º, n.º7, do Código da Estrada; Nestes termos e noutros que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, revogando-se parcialmente a sentença recorrida e, nessa sequência, o arguido AA ser absolvido da prática do crime de condução de veículo a motor sem habilitação legal, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 3º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro e, ao invés, nos termos e para os efeitos das disposições conjugadas dos artigos 77º, n.º1, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (vulgo, Regime Geral das Contra-Ordenações) e 130º, n.º 7, do Código da Estrada, ser condenado pela prática da contra-ordenação prevista neste último preceito normativo, mantendo-se, no mais a sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA.
(…)”
2.2. Também inconformado com a referida decisão, o aludido ARGUIDO recorreu da mesma, tendo concluído a respectiva motivação nos seguintes termos (transcrição):
“(…)
I) Do crime de condução sem habilitação legal 1. O Recorrente não se conforme com a condenação no processo em referência por entender que os factos configuram a prática de uma contraordenação prevista no número 7, do artigo 130.º do Código da Estrada e não de um crime de condução sem habilitação legal p.e p. nos termos do artigo 3.º, números 1 e 2, do Decreto-Lei número 2/98 de 03 de Janeiro. 2. Com a introdução do Decreto-Lei número 102-B/2020, de 09 de Dezembro, foram “introduzidas alterações ao regime de caducidade dos títulos de condução, não só quanto às regras que permitem que condutores que deixaram caducar os seus títulos possam reavê-los, ainda que condicionados à realização de provas de exame ou à frequência de acção de formação, como também à previsão da caducidade definitiva dos títulos de condução nas situações tipificadas na lei.”. 3. Em consequência dessa alteração, o artigo 130.º do Código da Estrada deixou de prever expressamente no texto da Lei, o “cancelamento” dos títulos de condução, passando, apenas, a falar em “caducidade”. 4. Na redação anterior ao Decreto-Lei 102-B/2020, de 09/12, a decisão de cassação implicava o cancelamento do título de condução e, por sua vez, a condução com o título de condução cassado era cominada como crime de condução sem habilitação legal (Cfr. Artigo 130.º, números 3, alínea b), e número 5 do Código de Estrada). 5. Porém na redação atual, a redação de cassação nos termos do artigo 148.º do Código de Estrada, implica a caducidade do título de condução (artigo 130.º, número 1, alínea d) do Código de Estrada), prevendo-se expressamente no número 7 o artigo 130.º que “Quem conduzir veículo com título caducado, nos termos previstos no n.º 1, é sancionado com coima de (euro) 120 a (euro) 600.”. 6. Por sua vez, na atual redação, as situações em que é possível revalidar o título de condução caducado estão previstas nos números 2 e 4, do artigo 130.º do Código de Estrada, sendo que as situações em que o título de condução caducado não pode ser renovado estão previstas no número 3 do mesmo preceito legal. 7. Tendo em conta o preâmbulo do Decreto-Lei número 102-B/2020 e a redação do artigo 130.º do Código de Estrada, somos em crer que as situações de caducidade definitiva (equivalente ao anterior cancelamento) são apenas as que se encontram previstas no número 3. 8. Assim, atualmente, a cassação do título de condução constitui apenas um situação de caducidade, não havendo lugar ao seu cancelamento ou, na sua redação atual, à sua caducidade definitiva, podendo por isso o título de condução caducado ser revalidado, caso o seu titular, decorridos 2 (dois) anos da cassação, se submeta a exame especial (Cfr. número 4, do Artigo 130.º do Código de Estrada). 9. No regime atual, o agente só comete o crime de condução sem habilitação legal quando conduza com o título de condução, definitivamente caducado, ou seja, nas situações previstas no número 3, do artigo 130.º do Código de Estrada, caindo dessa forma na previsão típica contida no número 5 do mesmo preceito legal, com referência ao número 3, números 1 e 2 do Decreto-Lei número 2/98, de 3 de Janeiro. 10. Pelo que, nas restantes situações, a conduta do agente que conduz com título de condução caducado, apenas, integra a contraordenação prevista no número 7 do artigo 130.º do Código de Estrada. 11. Sendo certo que, na situação dos autos, entendemos que se encontram preenchidos os pressupostos para que seja considerado que o arguido praticou uma contraordenação prevista no artigo 130.º, n.º 7 do Código de Estrada e não um crime, devendo assim a douta sentença ser revogada e substituída por outra que o condene pela prática dessa contraordenação. Sem prescindir do supra exposto, e no caso de V.ªs Ex.ªs entenderem que a condenação pela condução sem habilitação legal configura a prática de um crime e não de uma contraordenação, o que não se concede, e apenas se equaciona por mero dever de patrocínio, sempre se dirá que a pena de seis meses de prisão aplicada deverá ser suspensa na sua execução, abordando-se de seguida no presente recurso a questão da suspensão da execução da pena de prisão aplicada a este crime, mas também ao de condução de veículo em estado de embriaguez, que, resultou em cumulo jurídico numa pena única de 10 meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação (no espaço físico da residência e durante 24h/dia), nos termos do artigo 43.º, número 1 e 2 do Código Penal, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância nos termos regulamentados na Lei n.º 33/2010, de 2/9. Senão vejamos,
II) Do crime de condução de veículo em estado de embriaguez 12. Conforme supra referido, o presente recurso tem por objecto a douta sentença proferida no âmbito dos presentes autos, na medida em que condenou o arguido pela prática, em autoria material, de um crime de condução ilegal previsto e punido no artigo 3.º, número 1 e número 2 do Decreto-Lei número 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de seis meses de prisão e, ainda pela pratica de um crime de condução de veiculo em estado e embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292º nº 1 e 69º nº1 a) do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, o que resultou em cumulo jurídico na pena única de 10 meses de prisão, a cumprir a cumprir em regime de permanência na habitação (no espaço físico da residência e durante 24h/dia), nos termos do artigo 43.º, número 1 e 2 do Código Penal, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância nos termos regulamentados na Lei n.º 33/2010, de 2/9 e especialmente, na medida em que decidiu não suspender a execução da suprarreferida pena. 13. Existem diversas razões, designadamente de direito, pelas quais o recorrente não pode conformar-se com a decisão adotada, na medida em que condenou o arguido numa pena de prisão efectiva, ainda que domiciliária, de 10 meses de pena única pela prática de um crime de condução sem habilitação legal e pela prática de um crime de condução sob o efeito do álcool e, especialmente, na medida em que decidiu não suspender a execução da suprarreferida pena. 14. O ora recorrente considera que o Tribunal a quo andou mal ao não aplicar a medida de suspensão da execução da pena de prisão, violando assim, o artigo 50º, nº1 do Código Penal. 15. O mecanismo da suspensão da execução da pena de prisão encontra-se plasmado no artigo 50º do Código Penal. Trata-se de um poder-dever do julgador – como se pode retirar pelo uso da expressão “O tribunal suspende[…]” no nº1 e pela ausência de expressões que revelem mera prerrogativa, como “pode” – que deve ser sempre fundamentado, quer seja aplicado ou não, de acordo com o nº4 deste. 16. A suspensão da pena de prisão está dependente de dois requisitos, um formal e outro material, sendo que quanto ao requisito material, é importante aqui referir que o julgador não tem de ter a certeza de que a suspensão da pena de prisão impedirá o arguido de delinquir no futuro; o próprio instituto da suspensão baseia-se na esperança do tribunal, depositada no arguido, de que a ameaça de prisão e a censura do facto cumpram devidamente os fins da pena – nas palavras de Simas Santos e Leal-Henriques, “O tribunal deverá correr um risco prudente – esperança não é seguramente certeza […]“, Manuel Santos Simas e Manuel Leal-Henriques, Noções de Direito Penal, pág.210, 5ª edição, Reis dos Livros (2016). 17. Ou seja, no fundo, pretende-se saber se, tendo em conta todo o circunstancialismo do processo, de uma forma contextualizada, se pode chegar à conclusão que a suspensão da pena de prisão se afigura suficiente para impedir que o arguido volte a cometer novos crimes, ou se apenas a efetiva prisão deste é suficiente para acautelar tal interesse. 18. Ora, o tribunal a quo nega aplicação do regime da suspensão da pena de prisão, com base na fundamentação já transcrita no corpo das alegações e que, naturalmente, consta da própria sentença. 19. O requisito formal encontra-se preenchido in casu. O ponto de contenção é o requisito material, que o tribunal a quo não considera encontrar-se preenchido – ou seja, que não é possível operar um juízo de prognose favorável, considerando-se a suspensão da pena de prisão como suficiente para cumprir os desígnios da pena. 20. Cumpre, assim, analisar toda a factualidade do caso. 21. O arguido tem um registo criminal no qual já consta a prática deste tipo de crimes. 22. Contudo, depõe a seu favor o facto de se encontrar social e profissionalmente inserido, sendo descrito como um individuo educado e trabalhador, tendo também manifestado disponibilidade de fazer um tratamento ao alcoolismo. 23. E, como já ficou demonstrado, o arguido é uma pessoa humilde, com o sexto ano de escolaridade. 24. Veja-se ainda que, no caso em concreto, o arguido assumiu plenamente os factos e procurou esclarecer o Tribunal quanto aos motivos que o levaram a praticá-los. 25. Na verdade, a condenação do arguido numa prisão efetiva, mesmo que cumprida em regime de permanência na habitação vai impedi-lo de trabalhar e de ajudar no sustento do seu agregado familiar, sendo que a aplicação de penas de prisão efectivas devem reservar-se para situações verdadeiramente mais gravosas. 26. Para além disto, os factos concretamente em discussão não são, de per si, graves ao ponto de justificar a aplicação de uma pena de prisão efetiva. 27. O arguido não colocou em perigo concreto qualquer pessoa, bem ou animal; 28. Assim, o Tribunal a quo foi excessivamente rígido ao não aplicar o mecanismo da suspensão da execução da pena de prisão, previsto no artigo 50º do Código Penal. 29. Assim, por tudo o exposto no presente capítulo, afigura-se-nos óbvio que mal andou o Tribunal a quo ao não aplicar a medida de suspensão da pena de prisão neste caso em concreto, pois que todas as circunstâncias legalmente previstas apontam para a formação de um juízo de prognose favorável. 30. O legislador deixou bem claro, na redação do artigo 50º do Código Penal, que a suspensão da execução da pena de prisão é preferível, em todos os casos em que se afigure possível, à efetivação da pena de prisão. 31. Aliás, os artigos seguintes (51º a 54º) vêm densificar o instituto em causa, consignando deveres, regras de conduta e até regime de prova para os casos em que a mera suspensão da pena de prisão não baste. 32. Assim, verifica-se que o tribunal a quo, para além de não cumprir devidamente o disposto no artigo 50º, nº1, também não cumpriu devidamente o disposto no artigo 50º, nº2. 33. Destarte, deve a decisão recorrida ser revogada, na parte em que nega a suspensão da execução da pena de prisão de 10 meses aplicada ao arguido e substituída por outra que aplique a suspensão da execução daquela pena de prisão, sujeita ou não às condições legalmente previstas que Vªs Exªs considerem necessárias.
(…)”
3. Respostas ao recurso 3.1. Após a admissão dos referidos recursos, o arguido não respondeu ao recurso interposto pelo Ministério Público.
3.2. Por seu turno,o Ministério Público junto do tribunal a quo respondeu ao recurso interposto pelo arguido BB, concluindo (transcrição):
(…) a) Atendendo aos factos apurados e ponderando, quer a moldura abstracta fixada no artigo no artigo 292º n.º 1 do Código Penal, para a pena de multa e de prisão, quer as exigências de prevenção geral e especial que no caso concreto se fazem sentir e impõem, quer o grau de ilicitude e de culpa manifestados e decorrentes da factualidade imputada ao arguido, cremos não assistir qualquer razão ao recorrente quando este considera que a pena principal de prisão que, em concreto lhe veio a ser aplicada, se revela demasiado severa. b) A sentença recorrida, no nosso entender, obedeceu estritamente aos pressupostos e critérios legais do artigo 70º e 71º do Código Penal (tendo em conta os factos apurados e dados como provados em sede de audiência de julgamento, designadamente, e com particular enfoque, os vastos antecedentes criminais que o arguido possui decorrentes da prática de factos da mesma natureza aos dos presente autos) e, a pena aplicada indubitavelmente, é a única que assegura de forma adequada as necessidades de prevenção geral e especial que, no presente caso, se fazem sentir. c) Nos termos do artigo 50º do Código Penal, “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”. d) O pressuposto formal da suspensão de execução da mesma é apenas que a medida concreta da pena aplicada ao arguido não seja superior a 5 anos, sendo que, por seu turno, o pressuposto material de tal pena implica que o tribunal, atendendo à personalidade do arguido e às circunstâncias que rodearam a prática da infracção, conclua que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (a protecção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade – artigo 40º n.º 1 do Código Penal). e) Protecção essa que implica, por um lado, a utilização da pena como instrumento de prevenção geral (dissuasão da prática de novos crimes, através da intimidação das outras pessoas face ao sofrimento que com a pena se inflige ao delinquente -prevenção geral negativa ou de intimidação -, quer para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas o Estado na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal - prevenção geral positiva ou de integração- ). f) Sendo que, “tendo o arguido, pela sua conduta, revelado não merecer um anterior juízo de prognose favorável, nada nos autos justifica a aplicação ao arguido de uma pena não detentiva. É que limitar a reacção penal a uma substituição da pena de prisão por multa (artigo 43º nº 1 do Código Penal) ou a uma nova suspensão de execução da pena, ainda que subordinada a deveres ou com regime de prova (artigos 50º a 54º do Código Penal), ou a prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58.º do Código Penal) seria manifestação de falência do sistema penal para protecção dos bens jurídicos e autêntico “convite” a reincidência”. g) No caso ora em apreço, as exigências de prevenção geral fazem-se sentir em grau muito elevado. A este respeito cumpre desde logo salientar que o crime de condução em estado de embriaguez corresponde a um dos tipos legais de crime mais praticados em Portugal, estando conexionado com grande parte das situações de sinistralidade rodoviária que têm lugar, diariamente, nas nossas estradas. h) O arguido e ora recorrente denota, já averbadas, no seu registo criminal, 4 prévias condenações pela prática do mesmo tipo legal de crime de condução em estado de embriaguez (a saber, nos autos de processo especial sumário n.º 548/17.8GCBRG, nos autos de processo especial abreviado n.º 110/18.8GTBRG, nos autos de processo especial sumário n.º 326/19.0GBVVD e, nos autos de processo especial abreviado n.º 27/21.9PFBRG); i) Sendo ainda de realçar a circunstância de nas últimas duas de tais condenações (sendo certo que a última das mesmas corresponde a factos ocorridos em momento temporal posterior aos que se encontram em apreço nos presentes autos, o mesmo se sucedendo com a respectiva sentença condenatória e o seu subsequente trânsito em julgado) que se reportam, diga-se, à prática do mesmo ilícito criminal que se encontra em apreço nestes autos se terem vindo já a optar e aplicar (sem aparente sucesso em termos de compreensão, por parte do arguido, da advertência à mesma ínsita, diga-se) penas de prisão suspensas na sua execução; j) Factos claramente denotadores, a nosso ver, de que tais condenações prévias e respectivas penas aplicadas, não se revelaram, minimamente suficientes, para demover o arguido e ora recorrente da prática dos mesmos tipos legais de crime, diga-se, que se encontraram subjacentes a tais prévias condenações e que, a multiplicidade de condutas que lhe foram censuradas, inelutavelmente, põe a descoberto uma considerável propensão do arguido e ora recorrente para a prática de crimes estradais ao mesmo passo que vai demonstrando insensibilidade, relativamente, às penas que lhe têm vindo a ser aplicadas, denotando ainda a existência de um risco elevado de que o mesmo volte a praticar factos ilícitos típicos como os ora em apreço. k) Não sendo, ademais, à semelhança da sentença recorrida, despiciendo mencionar a circunstância de o arguido e ora recorrente, se encontrar já acusado pela prática em 21 de Fevereiro de 2022, de um novo crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, n.º1, do Código Penal, em sede dos autos de processo especial sumário n.º 117/22.0GBVVD l) O passado criminal do arguido e ora recorrente, pelo sobredito número das condenações, revela uma personalidade mal formada, firmemente avessa ao direito, completamente indiferente aos valores tutelados pelas normas penais violadas e à ameaça das respectivas sanções, de resto, evidenciada pelo seu completo alheamento do processo e consequente ausência de qualquer conduta demonstrativa de ter interiorizado a sua culpa e necessidade de censura penal m) Não se encontram assim preenchidos, “in casu”, no nosso entendimento, os pressupostos para uma suspensão da execução da pena de prisão aplicada, já que se tornou evidente que a simples censura do facto e ameaça da pena não são suficientes para satisfazer as necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir quanto ao arguido, ora recorrente e, muito menos, diga-se, para que se possa considerar como adequada a aplicação, a título de pena principal, de uma pena de multa. n) A decisão tomada pelo tribunal “a quo” respeitou claramente os critérios atinentes à escolha da pena a aplicar, estatuídos no artigo 70º do Código Penal, ao concluir (correctamente no nosso entendimento) que, face aos antecedentes criminais do arguido, apenas a pena de prisão (não suspensa na sua execução), tutela e salvaguarda, adequadamente, as elevadas necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir. o) A pena de prisão, em concreto, aplicada, afigura-se claramente adequada e proporcional às exigências de prevenção geral e especial que, no caso vertente, se fazem sentir.
(…)”.
4. Tramitação subsequente
Recebidos os autos nesta Relação, o processo foi com vista ao Digníssimo Procurador-Geral Adjunto, o qual emitiu parecer e pugnando a final pela improcedência total dos recursos interposto pelo Ministério Público e pelo arguido.
Este parecer foi notificado para efeito de eventual contraditório e não foi apresentada qualquer resposta.
Efectuado o exame preliminar, foi determinado que o recurso fosse julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
*
II – FUNDAMENTAÇÃO
A) Objecto do recurso
Em conformidade com o disposto no art.º 412.º do CPP e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro de 1995, o objecto do recurso define-se pelas conclusões que a recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Assim sendo, importa apreciar as seguintes questões:
Recurso do Ministério Público
· Responsabilidade contra-ordenacional do arguido pela condução de veículo com título de condução cassado pela ANSR
Recurso do arguido
· Responsabilidade contra-ordenacional do arguido pela condução de veículo com título de condução cassado pela ANSR
· Suspensão da execução da pena
B) Apreciação dos recursos do Ministério Público e do arguido Responsabilidade contra-ordenacional do arguido pela condução de veículo com título de condução cassado pela ANSR 1. Conforme referido, o arguido foi condenado como autor material de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3-1.
Os recorrentes insurgem-se contra esta condenação, pois entendem que os factos provados na parte relativa à condução de veículo com título de condução cassado acarretam-lhe tão-só a responsabilidade contra-ordenacional prevista e cominada no art. 130.º, n.º 7, do Código da Estrada.
2. Vejamos, antes do mais, os factos dados como provados relativamente ao arguido e o que se exarou na decisão recorrida a respeito da subsunção jurídica dos factos provados nesta parte (transcrição):
«(…) II. Fundamentação Matéria de facto provada 1.º No dia 09/03/2021, pelas 19H30m, o arguido AA, conduziu o veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-DO-.., na Avenida ..., neste Concelho ..., com uma T.A.S. igual a 1,57 g/l e, sem que, contudo, estivesse devidamente habilitado para o efeito com a necessária, válida, carta de condução; 2.º O arguido AA sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas, num café, em quantidades suscetíveis de ultrapassar o limite legal de teor de álcool e ainda assim quis conduzir o veículo automóvel ligeiro de mercadorias em causa, na via pública, com a mencionada taxa de álcool no sangue, apesar de saber que tal facto era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis atuar da forma descrita, e conduzir o mesmo nas condições em que o fez. 3.º De igual modo, o arguido AA sabia que, não podia conduzir o referido veículo automóvel ligeiro de mercadorias na via pública sem a respetiva e imprescindível habilitação legal, bem como, que este seu comportamento era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis atuar da forma descrita, e conduzir o mesmo nas condições em que o fez. 4.º O arguido AA agiu sempre livre, voluntária e conscientemente. 5.º O arguido tem os seguintes antecedentes criminais: - Por sentença datada de 11-09-2017, foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 26-08-2017, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 6€ e na pena acessória de 4 meses e 15 dias de proibição de conduzir, no processo sumário n.º 548/17.8GCBRG, do Tribunal da Comarca ..., Juízo Local Criminal, Juiz .... - Por sentença datada de 01-02-2019, foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 20-10-2018, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de 6€ e na pena acessória de 6 meses de proibição de conduzir, no processo abreviado n.º 110/18.8GTBRG, do Tribunal da Comarca ..., Juízo Local Criminal, Juiz .... - Por sentença datada de 26-06-2019, foi condenado pela prática de um crime de violação de imposições em 13-03-2019, na pena de 7 meses de prisão suspensa por 1 ano, no processo sumário n.º 326/19.0GBVVD, do Juízo Local Criminal ..., Comarca .... - Por sentença datada de 28-09-2021, foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 21-03-2021, na pena de 5 meses de prisão suspensa por 1 ano e 6 meses e na pena acessória de 7 meses de proibição de conduzir veículos motorizados, no processo abreviado n.º 27/21.9PFBRG, do Tribunal da Comarca ..., Juízo Local Criminal, Juiz .... 6.º A carta de condução titulada pelo arguido foi cassada em 19-11-2019 nos termos do disposto nos artigos 130.º n.º 3 b) e 148.º n.º 2 e 10 do Código da Estrada. 7.º No processo sumário n.º 117/22.0GBVVD deste Juízo Local Criminal foi deduzida acusação contra o arguido pela prática de um crime de condução sem habilitação em 21-2-2022, na condução do veículo de matrícula ..-DO-... 8.º No NUIPC n.º 121/22.9GBVVD consta um auto de notícia que relata ter sido o arguido fiscalizado a conduzir o veículo de matrícula ..-DO-.., no dia 22-2-2022, estando a sua carta de condução cancelada, tendo sido elaborado auto de contraordenação por condução de veículo automóvel com uma TAS de, pelo menos, 0,902 g/l, correspondente à TAS de 0,98 g/l registada. Este expediente foi objeto de despacho de arquivamento, ordenando-se a extração de certidão para procedimento contraordenacional. 9.º O veículo que conduzia é de 2007, adquiriu-o em 2020 por € 6 000,00. A sua companheira conduz um veículo de marca ..., modelo ... de 2004 e aufere mensalmente cerca de € 850,00. Tem um funcionário. Tem o 6.º ano de escolaridade. 10.º Resulta do relatório social elaborado pela DGRSP o seguinte: O processo de socialização de AA decorreu integrado no agregado de origem, pais e duas irmãs, de condição socioeconómica e cultural modesta. Profissionalmente o pai é auxiliar educativo e a mãe auxiliar num Lar de Idosos. A trajetória escolar do arguido decorreu até à frequência do 9.º ano, com registos de duas retenções. Em termos profissionais, iniciou-se como trabalhador da construção civil, na atividade de colocação de tetos falsos, durante a adolescência. Decorridos alguns anos, na procura de melhores condições socioprofissionais, foi trabalhar para França e, posteriormente, para Inglaterra, mantendo-se profissionalmente ativo fora do país durante cerca de sete anos. Em abril de 2017, regressou definitivamente ao Concelho ..., de onde é natural, e estabeleceu-se com uma empresa de construção civil, em nome individual, vocacionada para aplicação de pladur, área profissional em que se mantem ativo de forma regular e contínua. AA contraiu matrimónio em 2016, na constância do qual nasceu um filho. O matrimónio passou por períodos conturbados, com separações temporárias, de curta duração, mas, durante uma delas, o casal divorciou-se, não obstante, posterior reconciliação. O agastamento da conjugalidade é justificado pelos ocasionais comportamentos recreativos em ambiente noturno de AA, com consumos de bebidas alcoólicas de forma abusiva, períodos esses em que deixava o lar e acolhia-se em casa dos pais. Tendo por referência o período a que se reportam os factos, AA encontrava-se temporariamente separado de facto, na sequência do agastamento da dinâmica relacional, no que concerne aos seus comportamentos recreativos, com consumos excessivos de bebidas, o que fazia sob o mote de obsequiar alguns clientes da empresa, aquando de fechar um contrato de obra, ou no convívio com outros subempreiteiros com quem trabalha. Presentemente, AA integra o agregado constituído, companheira (ex-mulher) e filhos, residente em casa própria, com boas condições de habitabilidade, comprada com recurso a empréstimo bancário. O agregado beneficia de uma situação socioeconómica razoável, dependente dos rendimentos auferidos pelo arguido, em função do trabalho que executa no setor da construção civil, no montante médio mensal de 2.000€, e do vencimento do cônjuge, empregada num hipermercado. Apresenta como despesas fixas mensais do agregado, as respeitantes à amortização do empréstimo bancária para aquisição do apartamento, no valor da ordem dos 600€, e despesas com os serviços de abastecimento domésticos e telecomunicações, no valor médio mensal de 200€. AA afirma a desnecessidade de se sujeitar a qualquer tipo de processo terapêutico, afirmando não ser alcoólico, em virtude de quotidianamente não consumir bebidas etílicas em excesso. O arguido sofreu de uma tuberculose, cujo tratamento terminou em janeiro de 2020, no âmbito da qual foi proibido de ingerir bebidas alcoólicas. O arguido mantém um relacionamento familiar afetuoso e de entreajuda, sendo caracterizado pela companheira e, pela família alargada, como uma pessoa dedicada à família e trabalhador. No meio comunitário de residência, e no profissional, o arguido é referenciado como um indivíduo educado, trabalhador, de bom trato interpessoal, e de conduta normativa e socialmente integrada. (…)
Enquadramento jurídico-penal: (…) O arguido vem também acusado da prática de um crime de condução sem habilitação legal. De acordo com o disposto no artigo 121.º n.º 1 do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio: Só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito. Por seu turno, dispõe o artigo 121.º n.º 4 do mesmo diploma legal que: O documento que titula a habilitação para conduzir ciclomotores, motociclos, triciclos, quadriciclos pesados e automóveis designa-se «carta de condução». Quem conduzir veículo automóvel na via pública ou equiparada sem para tal se encontrar habilitado viola as citadas disposições legais, sendo punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias – artigo 3.º n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. Da conjugação dos normativos mencionados com a factualidade dada como provada, resulta que o arguido, com a sua conduta, preencheu os elementos objetivos do tipo de crime em apreço: no dia 9-3-2021 pelas 19.30 horas o arguido, sem estar habilitado com licença de condução ou documento equivalente, conduziu o veículo automóvel ..-DO-.. na Rua ..., ..., em .... Do mesmo modo, mostra-se preenchido o elemento subjetivo do tipo de ilícito em causa: o arguido quis conduzir o veículo na via pública, sabendo não estar habilitado com licença de condução e ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei, encontrando-se assim, consciente da ilicitude da mesma. Pelo exposto, praticou o arguido um crime de condução de veículo a motor na via pública sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, por referência ao artigo 121.º n.º 1 e n.º 4 do Código da Estrada. Foi remetida aos autos, por ordem e iniciativa da Digna Procuradora do Ministério Público titular do respetivo processo, uma certidão de um despacho proferido no processo sumário n.º 121/22.9GBVVD. Não obstante nada tenha sido requerido a tal respeito, ou sequer qualquer ilação retirada desse documento, por uma questão de lealdade processual, o Tribunal irá pronunciar-se sobre o entendimento jurídico vertido nesse documento. Relativamente à alteração do artigo 130.º do Código da Estrada, produzida pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9-12 entende-se que continua a constituir crime de condução inabilitada a conduta do arguido que tem a sua carta de condução cassada. O disposto no artigo 130.º n.º 7 do Código da Estrada aplica-se ao caso previsto na alínea a) do n.º 1, conforme foi já defendido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13-10-2021, consultado no endereço eletrónico da dgsi. Para além da argumentação do referido Acórdão constante, julgamos pertinente ponderar, desde logo, que nos parece irrazoável considerar que cometem uma contraordenação pessoas colocadas em situações muito diferentes. Ao aceitar a interpretação de que o disposto no artigo 130.º n.º 7 se refere a todas as situações do n.º 1, estamos a penalizar do mesmo modo uma pessoa que deixou passar o prazo para revalidar a sua carta de condução porque, por exemplo, atingiu a idade limite de 60 anos e uma pessoa que viu a sua carta de condução ser cassada por condenação em processo crime nos termos do artigo 101.º do Código Penal. Note-se a redação deste artigo 101.º: 1 - Em caso de condenação por crime praticado na condução de veículo com motor ou com ela relacionado, ou com grosseira violação dos deveres que a um condutor incumbem, ou de absolvição só por falta de imputabilidade, o tribunal decreta a cassação do título de condução quando, em face do facto praticado e da personalidade do agente: a) Houver fundado receio de que possa vir a praticar outros factos da mesma espécie; ou b) Dever ser considerado inapto para a condução de veículo com motor. 2 - É suscetível de revelar a inaptidão referida na alínea b) do número anterior a prática, de entre outros, de factos que integrem os crimes de: a) Omissão de auxílio, nos termos do artigo 200.º, se for previsível que dele pudessem resultar graves danos para a vida, o corpo ou a saúde de alguma pessoa; b) Condução perigosa de veículo rodoviário, nos termos do artigo 291.º; c) Condução de veículo em estado de embriaguez ou sob influência de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo, nos termos do artigo 292.º; ou c) Facto ilícito típico cometido em estado de embriaguez, nos termos do artigo 295.º, se o facto praticado for um dos referidos nas alíneas anteriores. 3 - Quando decretar a cassação do título, o tribunal determina que ao agente não pode ser concedido novo título de condução de veículos com motor, de qualquer categoria, durante o período de duração da cassação. É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 3, 4, 5 e 6 do artigo 69.º. 4 - Se o agente relativamente ao qual se verificarem os pressupostos dos n.os 1 e 2 não for titular de título de condução, o tribunal limita-se a decretar a interdição de concessão de título, nos termos do número anterior, sendo a sentença comunicada à Direcção-Geral de Viação. É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 6 do artigo 69.º. 5 - É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 100.º 6 - Se contra o agente tiver sido já decretada interdição de concessão de título nos cinco anos anteriores à prática do facto, o prazo mínimo de interdição é de dois anos. 7 - Quando seja decretada cassação de título de condução, a obtenção de novo título, quando possível, depende sempre de exame especial. Ou seja, comete a contraordenação prevista no artigo 130.º n.º 7 do Código da Estrada a pessoa que foi declarada inapta para o exercido da condução. Ora, se é inapto, como é que se pode considerar que não comete um crime de condução ilegal? Veja-se a diferença entre ambas as situações referidas, é que o primeiro tem que apresentar um atestado médico para obter a renovação do seu título de condução, o segundo, para obter um novo título, tem que se submeter a um exame especial. A mesma perplexidade se verifica se atendermos a que cometeria igualmente a contraordenação prevista no artigo 130.º n.º 7 quem não se submeter ou reprovar na avaliação médica ou psicológica, no exame de condução ou em qualquer das suas provas nos termos dos números 1 e 5 do artigo 129.º do Código da Estrada. Ora, o artigo 129.º n.º 1 prevê a necessidade de o condutor se submeter a avaliação médica, avaliação psicológica ou a novo exame de condução, quando surjam fundadas dúvidas sobre a aptidão física ou psicológica ou sobre a capacidade de um condutor para conduzir com segurança. Veja-se a gravidade desta situação, desde logo por comparação com a situação do condutor que não revalidou o título ao fazer 60 anos de idade. Assim, um condutor sobre o qual surjam fundadas dúvidas sobre a sua capacidade para conduzir com segurança, comete a contraordenação prevista no artigo 130.º n.º 7 do Código da Estrada. Pode ainda trazer-se à colação o disposto no artigo 20.º do Regime Geral das Contraordenações, nos termos do qual: «Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, será o agente sempre punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contraordenação.» Resulta da nova redação do artigo 130º do Código da Estrada, dada pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9-12, que o mesmo facto constitui simultaneamente crime e contraordenação, conforme se verifica pela análise do disposto nos ns. 5 e 7 deste normativo. O mesmo facto, condução com título de condução caducado, é punido como crime no n.º 5 do artigo 130.º e como contraordenação no n.º 7 do mesmo artigo. Assim, por aplicação do artigo 20.º do Regime Geral das Contraordenações, deveria prevalecer a punição como crime prevista nos artigos 130.º n.º 5 do Código da Estrada e 3.º n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3-1.
(…)» Resulta do Certificado de Registo Criminal que as decisões condenatórias referidas nos factos provados transitaram em julgado nas seguintes datas:
- Processo n.º 548/17.8GCBRG: 11.10.2017;
- Processo n.º 110/18.8GTBRG: 04.03.2019;
- Processo n.º 326/19.0GBVVD: 09.09.2019;
- Processo n.º 27/21.9PFBRG: 07.12.2021.
3. Com relevância para o caso dos autos, a acção típica do crime de condução sem habilitação legal imputado ao arguido traduz-se na condução de veículo automóvel na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado (art. 2.º, n.ºs 1 e 2, do DL 2/98, de 3 de Janeiro).
Tal incriminação pressupõe a exigência da habilitação legal para conduzir, pois só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver plenamente habilitado para o efeito (art. 121.º, n.º 1, do Código da Estrada).
No caso dos veículos automóveis, o documento que titula tal habilitação legal designa-se carta de condução (art. 121.º, n.º 4).
No caso concreto, o arguido já tinha obtido a pertinente carta de condução que o habilitava a conduzir o veículo automóvel ligeiro de mercadorias dos autos, mas conduziu tal veículo automóvel quando a sua carta de condução estava cassada pela ANSR desde Novembro de 2019, mediante decisão adoptada nos termos do art. 148.º, n.º 4, al. c), e 10, do Código da Estrada, na redacção da Lei n.º 116/2015 Resulta do Registo Individual do Condutor que a decisão da cassação é datada de 13.09.2019 e que esta cassação se efectivou em 5 de Novembro de 2019..
Em Novembro de 2019, a cassação da carta naqueles termos – fundada na perda total de pontos – determinava o cancelamento do título de condução e o respectivo titular era considerado, para todos os efeitos legais, não habilitado a conduzir os veículos para os quais o título fora emitido (art. 130.º, n.º 3, al. b), e n.º 5, do Código da Estrada, na redacção do DL n.º 40/2016).
Em coerência com esta solução, a lei impedia que fosse concedido novo título de condução de veículos a motor de qualquer categoria a quem tivesse sido cassado o título de condução naqueles termos antes de decorridos dois anos sobre a efectivação da cassação (art. 148.º, n.º 11, do Código da Estrada, na redacção da Lei n.º 116/2015).
Contudo, tal cancelamento não operava ope legis em virtude da decisão de cassação da ANSR e ficava ainda dependente de uma tomada de decisão para o efeito pelo IMT (art. 2.º, n.º 1, do RHLC, aprovado pelo DL 138/2012, na redacção do DL 151/2017) Vide Ac. TRE 17.10.2017 p. 316/14.9GTABF; Ac. TRC 16.10.2019 p.27/19.9GABBR; Ac. TRP 25.11.2020 p. 20/19.1GALSD; Ac. TRL 07.12.2021 p. 340/19.5PTLRS, todos disponíveis em www.dgsi.pt. .
A lei distinguia então de forma muito clara a responsabilidade do agente que conduzisse um veículo com uma carta de condução cassada daquela de quem, por exemplo, conduzisse um veículo com uma carta não revalidada nos termos fixados no RHLC.
A falta de revalidação da carta de condução gerava a mera caducidade do título de condução.
Por seu turno, a cassação da carta de condução gerava o cancelamento do título de condução.
Ora, quem conduzisse então com título de condução (meramente) caducado incorria na prática da contra-ordenação prevista no art. 130.º, n.º 7, do Código da Estrada, na redacção do DL 40/2016.
Diversamente, quem conduzisse então com título de condução cancelado incorria na prática do crime de condução sem habilitação legal previsto no art. 3.º do DL 2/98.
Entretanto, este regime legal veio a ser alterado antes da prática dos factos dados como provados.
A partir de 8 de Janeiro de 2021, a cassação da carta fundada na perda total de pontos passou a determinar também a caducidade do título de condução (art. 130.º, n.º 1, al. d), do Código da Estrada, na redaçcão do DL n.º 102.º-B/2020).
Nesta intervenção, o legislador eliminou totalmente a solução do cancelamento do título de condução, incluindo o cancelamento fundado na cassação administrativa.
No preâmbulo do referido DL n.º 102.º-B/2020, o legislador explicou o alcance e sentido das alterações introduzidas nesta matéria, deixando expressamente consignado que “são introduzidas alterações ao regime de caducidade dos títulos de condução, não só quanto às regras que permitem que condutores que deixaram caducar os seus títulos possam reavê-los, ainda que condicionados à realização de provas de exame ou à frequência de ação de formação, como também à previsão da caducidade definitiva dos títulos de condução nas situações tipificadas na lei”.
Esta diferença entre caducidade definitiva e caducidade temporária resulta do novo texto legal.
Por exemplo, a caducidade do título de condução fundada na falta de revalidação nos termos fixados no RHLC começa por ser temporária, pois o titular do título de condução caducado pode revalidá-lo se vier a ser aprovado em exame especial de condução, desde que esta aprovação tenha lugar no período de 10 anos decorridos sobre a data em que deveria ter sido renovado (art. 130.º, n.º 1, al. a), n.º 2, al. a), e n.º 3, al. d), do Código da Estrada).
Decorrido este período de 10 anos sem aprovação no exame especial de condução, o título de condução caducado já não pode ser renovado e a caducidade do título de condução fundada na falta de revalidação passa a ser definitiva.
Se o titular do título de condução assim caducado conduzir veículo neste período é responsável pela contra-ordenação prevista no art. 130.º, n.º 7, do Código da Estrada.
Se esta condução tiver lugar depois deste período, o agente passa a ser punido criminalmente nos termos do art. 3.º do DL n.º 2/98, ex vi art. 130.º, n.º 5, do Código da Estrada, na redacção do DL n.º 102-B/2020 Vide Ac. TRL 22.03.2022 p. 533/21.5PCLRS, disponível em www.dgsi.pt. .
É diferente o regime da caducidade do título de condução fundada na cassação por perda total de pontos, isto é, na prática de uma pluralidade de infracções rodoviárias.
Neste caso, o título de condução caducado em si mesmo não pode ser revalidado.
Esta caducidade é definitiva, pois apenas quando se mostrarem decorridos dois anos sobre a efectivação da cassação é que o titular deste título de condução assim caducado pode obter novo título de condução e se para tanto obtiver aprovação em exame especial (artigos 130.º, n.º 2 e n.º 4, al. a), e 148.º, n.º 11, do Código da Estrada)
Os titulares de título de condução definitivamente caducado – por cassação administrativa – consideram-se, para todos os efeitos legais, não habilitados a conduzir os veículos para os quais o título fora emitido e o agente passa a ser punido criminalmente nos termos do art. 3.º do DL n.º 2/98, ex vi art. 130.º, n.º 5, do Código da Estrada, na redacção do DL n.º 102-B/2020 Vide Ac. TRL 13.09.2022 p. 20/22.4GDPTM, disponível em www.dgsi.pt..
Tendo em consideração estes parâmetros legais e jurisprudenciais, analisemos a pretensão recursória.
4. No caso concreto, ficou provado que a carta de condução do arguido estava cassada desde Novembro de 2019 e que o arguido conduziu intencionalmente o veículo automóvel dos autos no dia 9 de Março de 2021.
Nesta data, o título de condução do arguido estava definitivamente caducado e não podia ser revalidado.
Aliás, o arguido ainda não tinha sequer recuperado o direito de obter um novo título de condução e, consequentemente, não estava habilitado a conduzir os veículos para os quais o título de condução caducado fora emitido.
Assim sendo, a conduta do arguido dada como provada preenche integralmente os elementos objectivos e subjectivos do tipo de crime de condução sem habilitação legal previsto no art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, ex vi art. 130.º, n.º 5, do Código da Estrada, na redacção do DL n.º 102-B/2020.
Acresce que não foram provados quaisquer factos que excluam a ilicitude dos factos e a culpa do agente.
O tribunal recorrido chegara igualmente a esta conclusão que ora releva – ainda que trilhando outra via argumentativa – e não merece qualquer censura nesta parte.
Por conseguinte, está afastada a responsabilização alternativa do arguido no plano contra-ordenacional conforme pugnado pelos recorrentes e permanece intocada a condenação do arguido na pena única de 10 meses de prisão pela prática, em concurso verdadeiro, de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez
5. Assim sendo, não se justifica qualquer alteração ao decidido em matéria de subsunção dos factos provados à norma incriminadora prevista no art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, pelo que os recursos do Ministério Público e do arguido improcedem nesta parte.
C) Apreciação do recurso do arguido
Suspensão da execução da pena de prisão 1. Segundo o recorrente AA, ainda que sejadecidido manter a medida concreta da pena de prisão aplicada na decisão recorrida, a mesma deve ser suspensa na sua execução nos termos do art. 50.º do Código Penal, em virtude de ser possível formular um juízo de prognose favorável quanto ao comportamento futuro do arguido.
Para tanto, o recorrente alegou que, não obstante as condenações criminais já sofridas, assumiu plenamente os factos, está social e profissionalmente inserido, manifestou disponibilidade para fazer o tratamento do seu alcoolismo e, finalmente, os factos praticados não são graves, desde logo porque não colocou concretamente em perigo qualquer pessoa, bem ou animal.
Cumpre, pois, analisar se a pena imposta é suscetível de ser suspensa na sua execução.
2. A este propósito, escreveu-se na decisão recorrida (transcrição):
«(…)
Inexiste no caso concreto qualquer possibilidade de aplicação dos mecanismos dos artigos 50.º ou 58.º do Código Penal. Face à postura do arguido, substituir ou suspender a pena de prisão representaria para ele a absoluta confirmação de que o crime compensa atendendo às condenações transitadas em julgado e à sua conduta atual. O arguido pratica o mesmo tipo de crimes de forma inveterada, antes dos factos aqui em apreço o arguido havia sido condenado por crimes de condução em estado de embriaguez e violação de proibições, sendo uma das penas aplicadas uma pena de prisão suspensa na sua execução, cujo termo da suspensão havia ocorrido escassos seis meses antes de voltar a delinquir. Mas igualmente grave e revelador da sua personalidade avessa ao direito, é o facto de passados doze dias sobre a sua detenção, pela prática dos factos aqui em apreço, o arguido ter voltado a cometer um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, conforme resulta da análise do seu certificado de registo criminal, a folhas 109. Inexiste, em concreto, qualquer facto que possa fundamentar a opção pela suspensão da execução da pena de prisão, pois a aparente inserção social do arguido é feita à custa de uma reiterada conduta criminosa e irresponsável. Com efeito, esta opção legal não pode ser aplicada só porque interessa esvaziar as prisões, tem que ser sustentada em factos concretos que permitem concluir que a mesma satisfará as necessidades cautelares do caso. Com efeito, a personalidade do agente revela-se indiferente pela lei e pelas regras sociais. As penas anteriormente aplicadas não surtiram o efeito desejado que é afastar o delinquente da prática do crime, não por períodos de tempo, mas para sempre. Torna-se claro, no caso concreto, que não é a simples ameaça da pena de prisão ou a sua substituição por outra pena, que irá demover o arguido da continuação da atividade criminosa. Foram sendo concedidas várias oportunidades ao arguido que, como se vê, se mostra relutante em seguir o trilho do cumprimento da Lei. Aliás, durante a audiência de julgamento deste processo o arguido foi detido por mais duas vezes a conduzir exatamente a mesma carrinha, sendo que numa dessas vezes, no dia 22-2-2022 apresentava também uma taxa de alcoolemia superior ao legalmente permitido. Não obstante a personalidade pouco permeável ao dever ser normativo do arguido, o Tribunal entende que poderá ainda o mesmo beneficiar do regime de permanência na habitação, de modo a evitar o contacto com o sistema prisional. Efetivamente, a substituição do cumprimento da pena de prisão nestes termos, poderá ainda acautelar as finalidades subjacentes à punição, fazendo com que o arguido, caso consiga mudar a sua atitude, interiorize os malefícios da sua reiterada conduta. Assim, em face do consentimento do arguido e uma vez que se verificam as condições necessárias à colocação de meios técnicos de controlo à distância, decide-se que a pena de prisão será executada nos termos previstos no artigo 43.º n.º 1 do Código Penal, na Rua ..., ..., ..., .... Do próprio teor literal da redação do artigo 43.º do Código Penal – que regula o regime de permanência na habitação – resulta claramente que esta pena pressupõe uma obrigação de o condenado permanecer na habitação, não prescindindo o legislador da fiscalização dessa permanência ao impor a vigilância eletrónica. Acresce que o grau de irresponsabilidade demonstrado pelo arguido é tal, que se afigura contraproducente conceder permissão para saídas para trabalhar, uma vez que é exatamente com tal «desculpa» que o arguido cometeu os factos aqui em discussão. Conforme se consignou no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-03-2014, consultado no endereço eletrónico da dgsi, «o Regime de permanência na habitação não pode ser objecto de um regime de flexibilização que o descaracterize de tal forma que o mesmo passe a ser confundido com o regime de semidetenção, com a particularidade de em momento algum o condenado ter contacto com o Estabelecimento prisional, dando, assim, origem a um tertium genus, que não encontra arrimo nas penas de substituição.». O arguido propôs-se fazer um tratamento ao alcoolismo, contudo sem qualquer sinceridade nesse seu comprometimento, conforme resulta do teor do relatório social onde referiu não ter necessidade de se sujeitar a qualquer processo terapêutico. Neste quadro, afigura-se-nos que permitir que o arguido fizesse a sua vida laboral normal, permitindo-se a sua saída entre as 7h30 e as 18h30, todos os dias da semana laboral, não asseguraria de forma suficiente as finalidades de prevenção especial, que se verificam. Com efeito, os antecedentes criminais do arguido e a sua atual conduta, refletem uma personalidade com propensão para a prática deste tipo de ilícito, incompatível com uma pena de pouca dureza e quase sem caráter detentivo. Prevê ainda a lei uma pena acessória de proibição da faculdade de conduzir veículos motorizados por um período fixado entre três meses e três anos (art.º 69.º nº 1 al. a) do Código Penal) - redação da Lei 77/01, de 13 de julho.
(…)»
3. Nos termos do n.º 1 do artigo 50.º do Código Penal, “O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Esta norma penal atribui, deste modo, ao tribunal o poder-dever de suspender a execução da pena de prisão não superior a cinco anos, sempre que, reportando-se ao momento da decisão, o julgador possa fazer um juízo e prognose favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido (cfr. Figueiredo Dias, “Velhas e novas questões sobre a pena de suspensão da execução da pena”, Rev. de Leg. e Jur. ano 124º, pág. 68, e Direito Penal Português -As Consequências Jurídicas do Crime, Lisboa, 1993, §518, págs.342-343)
Como justamente se salientou no Ac. do S.T.J. de 8-5-1997 (Proc.º n.º 1293/96) “factor essencial à filosofia do instituto da suspensão da execução da pena é a capacidade da medida para apontar ao próprio arguido o rumo certo no domínio da valoração do seu comportamento de acordo com as exigências do direito penal, impondo-se-lhe como factor pedagógico de contestação e auto-responsabilização pelo comportamento posterior; para a sua concessão é necessária a capacidade do arguido de sentir essa ameaça, a exercer sobre si o efeito contentor, em caso de situação parecida, e a capacidade de vencer a vontade de delinquir”.
Conforme resulta do artigo 50.º, n.º 1 do Código Penal, a pena de substituição em causa deve ser aplicada, na sugestiva formulação dos Acs. do STJ de 23-4-2008, proc.º n.º 08P912 e de 28-5-2008, proc.º n.º 08P1129, ambos in www. dgsi.pt):
«a) Sempre que o julgador se convença, face à personalidade do condenado, suas condições de vida, comportamento global, natureza do crime e sua adequação a essa personalidade, que o facto cometido não está de acordo com essa personalidade e foi simples acidente de percurso esporádico, e que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro evitará a repetição de comportamentos delituosos (prevenção especial) e; «b) Desde que não coloque irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, ou seja o sentimento de reprovação social do crime ou sentimento jurídico da comunidade (prevenção geral)».
Como sublinha o Prof. Figueiredo Dias, “Apesar da conclusão do tribunal por um prognóstico favorável - à luz consequentemente, de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização - a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem “as necessidades de reprovação e prevenção do crime”. Já determinámos que estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita sempre – o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto ora em análise” (Direito penal Português -As Consequências Jurídicas do Crime, Lisboa, 1993, pág. 344)».
“Na base da suspensão da execução da pena deverá estar uma prognose social favorável ao arguido ou seja, a esperança de que o arguido sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime. O tribunal deve correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza” (Simas Santos e Leal Henriques, Código Penal Anotado, vol I, 4ªed., Lisboa, 2014, págs. 711-712)
Na verdade, “o juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido, subjacente à decisão de suspender a execução da pena, pode assentar numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequente ressocialização em liberdade do arguido” - Ac. STJ 1-3-2007, proc.º n.º 254/07-5, in www.dgsi.pt
Essencial é que se estabeleça uma relação de confiança entre o tribunal e o arguido condenado - Ac. do STJ de 8-5-2002, in CJ/STJ, ano X, tomo 5, pág. 192.
Será que no caso em apreço será possível estabelecer essa relação de confiança?
4. Importa não perder de vista que as necessidades de prevenção geral são elevadíssimas relativamente aos crimes rodoviários dos autos.
No passado ano de 2021, foram registadas 15 390 participações relativas à condução de veículo com TAS igual ou superior a 1,2 g/l, tendo havido um impressivo aumento 12,4% nestas participações relativamente ao ano de 2020 (Relatório Anual de Segurança Interna – 2021, M.A.I.).
Com igual relevância, importa referir que no passado ano de 2021, foram registadas 14 511 participações relativas à condução de veículo sem habilitação legal, tendo havido um aumento igualmente impressivo de 12,5% nestas participações relativamente ao ano de 2020 (Relatório Anual de Segurança Interna – 2021, M.A.I.).
A circunstância de o arguido não ter “colocado em perigo concreto qualquer pessoa, bem ou animal” não atenua a responsabilidade criminal do arguido nem deve ter reflexos ao nível da apreciação da pena de substituição da prisão.
Como bem se assinala no Ac. desta Relação de Guimarães de 19-11-2007, proc.º n.º 2031/07-1, in www.dgsi.pt, “É irrelevante não se ter provado que da conduta em causa tivesse concretamente resultado perigo para a circulação rodoviária de pessoas e bens, pois a condução em estado de embriaguez é um crime de perigo comum abstracto, pois que as condutas puníveis por esta norma não lesam de forma directa e imediata qualquer bem jurídico, apenas implicando a probabilidade de um dano contra um objecto indeterminado, dano esse que a verificar-se será não raras vezes gravíssimo, tratando-se, assim, de uma infracção de mera actividade, em que o que se pune simplesmente o facto de o agente se ter disposto a conduzir na via pública sob o efeito do álcool.”
A confiança dos cidadãos na salvaguarda dos plúrimos bens jurídicos tutelados por estas incriminações de perigo abstracto – vida, integridade física e património – exige, pois, uma pena suficientemente dissuasora de nova violação das normas infringidas.
Centremos agora a nossa atenção nas necessidades de prevenção especial.
As necessidades de prevenção especial – necessidade de induzir o arguido a evitar a prática de futuros crimes e a adoptar um comportamento correcto – também são elevadas considerando a conduta do arguido anterior ao facto e posterior a este.
A existência de anteriores condenações criminais do arguido contribui para denegar qualquer relação de confiança.
A Lei de 6-7-1893 determinava que a pena suspensa só se aplicava a arguidos primários.
Mas há muito que entre nós se assinala que a restrição do benefício da suspensão aos delinquentes primários não tem fundamento (cfr. Eduardo Correia, Direito Criminal vol. II, págs. 396-405).
Como mais modernamente acentua o Prof. Figueiredo Dias, embora se compreenda que nestes casos o prognóstico favorável se torne mais difícil e questionável e se exija para a sua concessão uma particular fundamentação “(…) a existência de condenação ou condenações anteriores não é impeditiva a priori da concessão da suspensão” (Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, cit., §519, pág. 344).
O mesmo entendimento foi revelado nos acórdãos do STJ de 17 de Fevereiro de 2000 (proc.º n.º 1162/99-5ª, SASTJ, n.º38,82) e de 12 de Dezembro de 2002 (proc.º n.º 4196/02-5, SASTJ, n.º66,64), tendo ambos sublinhado que “A circunstância de um arguido ser reincidente não obsta decisivamente à possibilidade de se lhe suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos, se se tiver como justificado formular a conclusão de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Tudo isto para salientar que a circunstância de o recorrente não ser um delinquente primário não obsta, só por si, à formulação do juízo de prognose favorável e à consequente suspensão da execução da pena.
Dito isto, importa aferir o alcance da conduta criminosa pretérita do arguido.
O arguido cometeu um crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 26.08.2017 e foi então condenado numa pena de multa e na pena acessória de proibição de conduzir veículos automóveis.
O arguido cometeu novo crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 20.10.2018 e foi então condenado noutra pena de multa enoutra pena acessória de proibição de conduzir veículos automóveis.
Estando proibido de conduzir veículos automóveis, o arguido veio a cometer um crime de violação de imposições em 13.03.2019 e foi condenado na pena de 7 meses de prisão suspensa na execução pelo período 1 ano, o qual vigorou entre 09.09.2019 e 09.09.2020.
O arguido viu a sua carta de condução ser cassada pela ANSR entre Novembro de 2019 e Novembro de 2021.
Estando com a carta cassada, o arguido cometeu os dois crimes dos autos – condução sem habilitação legal e condução em estado de embriaguez – em 09.03.2021.
Diversamente do alegado em sede de recurso, a confissão do arguido relativamente aos factos ora sob julgamento reveste pouca relevância uma vez que o arguido foi interceptado em flagrante delito.
Acresce que ficou provado – mais uma vez diversamente do alegado em sede de recurso – que o arguido não reconhece qualquer problema de alcoolismo e que o mesmo não reputa necessária a sua sujeição a qualquer tipo de processo terapêutico.
Importa igualmente conhecer a conduta do arguido posterior aos factos dos autos.
Na pendência dos presentes autos e continuando com a carta de condução cassada, o arguido cometeu novo crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 21.03.2021 – quando ainda só tinham decorrido 12 dias sobre os crimes ora sob apreciação – e foi então condenado pena de 5 meses de prisão suspensa na execução pelo período de 1 ano e 6 meses e na pena acessória de proibição de conduzir veículos automóveis.
Não assumem aqui qualquer relevância as menções indevidamente feitas – nos factos dados como provados – às condutas típicas criminais e contra-ordenacionais do recorrente que estavam a ser escrutinadas nos processos n.º 117/22.0GBVVD e n.º 121/22.9GBVVD, pois só podem relevar em desfavor do arguido as decisões judiciais ou administrativas condenatórias transitadas em julgado ou com carácter definitivo e era então completamente ignorado o desfecho decisório dos procedimentos em apreço.
É certo que ficou provado que o arguido está actualmente familiar e profissionalmente integrado, mas tal não é suficiente para continuar a confiar no arguido.
A mera integração familiar e profissional do arguido não pode ser um salvo-conduto para a prática reiterada e impune de crimes rodoviários sob a alegação falaciosa de que nenhuma pessoa veio a ser atropelada ou de que nenhum veículo veio a ser abalroado pelo veículo conduzido pelo arguido nas várias ocasiões já sujeitas a julgamento.
Quem infringe reiteradamente as normas básicas da condução rodoviária não está socialmente integrado.
Esta recaída sucessiva do recorrente na prática de crimes rodoviários, bem como a sua total impermeabilidade às advertências solenes inerentes às penas de multa e à pena de substituição já sofridas, inculcam, definitivamente, a ideia de que já não é possível formular um prognóstico favorável de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
5. Assim sendo, não se justifica igualmente qualquer alteração ao decidido em matéria de aplicação de penas de substituição, pelo que o recurso do arguido improcede também nesta parte.
III – DECISÃO
Em função do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar os recursos totalmente improcedentes e, em consequência, mantêm a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente AA, com taxa de justiça fixada em 3 UC (art. 513.º, do CPP, e art. 8.º do RCP e tabela III anexa).
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Guimarães, 5 de Dezembro de 2022
(Texto elaborado em computador pelo relator e integralmente revisto pelos subscritores)