OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO MEDIANTE EMBARGOS
PRAZO DILATÓRIO SEGUIDO DE PRAZO PEREMPTÓRIO
Sumário

I - Porque a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de exceção (para além de servir fins de impugnação), o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo.
II - A dilação e o prazo (perentório) contam-se de forma contínua como um só período temporal

Texto Integral


Relator: Fonte Ramos
Adjuntos: Alberto Ruço
Vítor Amaral

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:       

            I. Na execução (de sentença) para pagamento de quantia certa movida por A..., S. A., contra L..., Lda., com sede na Rua ..., ..., foi proferido, a 07.6.2022, o seguinte despacho:

            «Porque deduzidos tempestivamente (art.ºs 138º, n.º 1 e 2, 246º, n.º 1, 245º, n.º 1, alínea b) do CPC), estando comprovado o pagamento da multa devida pela prática do acto no primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo (art.º 139º, n.º 5, alínea a) do CPC) legalmente admissíveis e não serem manifestamente improcedentes, admito liminarmente os embargos deduzidos [cf. art.ºs 856º, n.º 1, 728º, n.º 1, 729º, 731º e 732º, n.º 1, do CPC, na redação dada pela Lei n.º 41/2013, de 26-6].

            Notifique, sendo que a Exequente o deverá ser para contestar dentro do prazo de 20 dias (cf. art.º 732º, n.º 2 do CPC aplicável ex vi artigo 551º, n.º 3 do CPC).»

Inconformada[1], a exequente apelou formulando as seguintes conclusões:

            1ª- A Embargante foi citada para deduzir oposição à execução e à penhora em 11.4.2022.

            2ª - O primeiro dia de prazo é o dia 19 de abril, em razão de até então os prazos estarem suspensos em razão de férias judiciais.

            3ª - É concedida ainda uma dilação de 5 dias à Recorrida nos termos da alínea b) do art.º 245º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC).

            4ª - Prazo este que se tem como um só, nos termos do art.º 148º do CPC.

            5ª - Em razão do que vai dito o último dia de prazo para apresentação da petição de embargos situa-se a 13 de maio, sexta-feira.

            6ª - Podendo o acto ser praticado até ao 3º dia útil após este prazo, portanto, até dia 18 de maio, quarta-feira.

            7ª - A petição de embargos dando entrada a 19 de maio tem de se ter por intempestiva.

            Remata dizendo que deve ser revogado o despacho recorrido, considerando intempestiva a petição de embargos apresentada a 19.5.2022.

            Não houve resposta.

            Visto o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir da admissibilidade dos embargos de executado, atentas as datas da sua apresentação e da citação para os termos da ação executiva (e saber como é contado o prazo dilatório a acrescer ao prazo perentório para deduzir os embargos).


*

            II. 1. Para a decisão do recurso releva o que consta do relatório que antecede e o seguinte:

            a) A execução principal, instaurada a 21.12.2018, baseia-se em transação homologada em 09.10.2018, nos termos da qual a Ré/executada, T..., S.L.U. (melhor identificada nos autos), foi condenada a pagar à A./exequente, A..., S. A., a quantia de € 57 433,36.

            b) A execução contra L..., Lda. (embargante/apelada) foi cumulada à execução principal, nos termos do disposto no art.º 777º, n.º 3 do CPC.

            c) A executada/embargante/apelada foi citada nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 856º do CPC e veio deduzir oposição à execução, nos termos do disposto nos art.ºs 728º, 729º, 731º e 773º, n.ºs 2 e 3, do CPC.

            d) A citação postal (pessoal) da executada, dirigida para a sua sede, ocorreu no dia 11.4.2022.

            e) A oposição à execução por embargos foi apresentada no dia 19.5.2022.

            2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

            O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes (art.º 138º, n.º 1 do CPC[2]).

            Quando um prazo perentório se seguir a um prazo dilatório, os dois prazos contam-se como um só (art.º 142º).

            A citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficialmente aprovado[3], dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade, em termos equiparados aos da litigância de má fé (art.º 228º, n.º 1). A carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de receção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando (n.º 2).

            A citação postal efetuada ao abrigo do artigo 228º considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário (art.º 230º, n.º 1).

            O prazo é dilatório ou perentório (art.º 239º, n.º 1). O prazo dilatório difere para certo momento a possibilidade de realização de um ato ou o início da contagem de um outro prazo (n.º 2). O decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato (n.º 3). O ato pode, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos regulados no artigo seguinte (n.º 4). Independentemente de justo impedimento, pode o ato ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa, fixada nos seguintes termos: a) Se o ato for praticado no 1º dia, a multa é fixada em 10 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 1/2 UC; b) Se o ato for praticado no 2º dia, a multa é fixada em 25 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 3 UC; c) Se o ato for praticado no 3º dia, a multa é fixada em 40 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 7 UC (n.º 5).

            Ao prazo de defesa do citando acresce uma dilação de cinco dias quando: a) A citação tenha sido realizada em pessoa diversa do réu, nos termos dos n.os 2 do artigo 228º e 2 e 4 do artigo 232º; b) O réu tenha sido citado fora da área da comarca sede do tribunal onde pende a ação, sem prejuízo do disposto no número seguinte (art.º 245º, n.º 1).

            Em tudo o que não estiver especialmente regulado na presente subsecção, à citação de pessoas coletivas aplica-se o disposto nas subsecções anteriores, com as necessárias adaptações (art.º 246º, n.º 1). A carta referida no n.º 1 do artigo 228º é endereçada para a sede da citanda inscrita no ficheiro central de pessoas coletivas do Registo Nacional de Pessoas Coletivas (n.º 2). Se for recusada a assinatura do aviso de receção ou o recebimento da carta por representante legal ou funcionário da citanda, o distribuidor postal lavra nota do incidente antes de a devolver e a citação considera-se efetuada face à certificação da ocorrência (n.º 3).

            O executado pode opor-se à execução por embargos no prazo de 20 dias a contar da citação (art.º 728º, n.º 1).

            Os embargos, que devem ser autuados por apenso, são liminarmente indeferidos quando: a) Tiverem sido deduzidos fora do prazo; b) O fundamento não se ajustar ao disposto nos art.ºs 729º a 731º; c) Forem manifestamente improcedentes (art.º 732º, n.º 1). A procedência dos embargos extingue a execução, no todo ou em parte (n.º 4).

            3. Prazo judicial é o período de tempo fixado para se produzir um determinado efeito processual, a sua função consiste em regular a distância entre os atos do processo, pressupondo necessariamente que já está proposta a ação, que já existe um determinado processo, e destina-se ou a marcar o período de tempo dentro do qual há de praticar-se um determinado ato processual (prazo perentório), ou a fixar a duração duma certa pausa, duma certa dilação que o processo tem de sofrer (prazo dilatório).[4]

            4. A oposição à execução por meio de embargos - verdadeira ação declarativa que corre por apenso ao processo de execução - visa a extinção da execução (impedir que a ação executiva tenha seguimento), mediante o reconhecimento da atual inexistência do direito exequendo ou da falta dum pressuposto, específico ou geral, da ação executiva (que pode ser o próprio título executivo); apresenta-se como uma contra ação tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e/ou da ação que nele se baseia; é o meio processual pelo qual o executado exerce o seu direito de defesa perante o pedido do exequente.

Porque a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de exceção (para além de servir fins de impugnação), o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que sucede no processo declarativo.[5]

            5. A citação postal (pessoal) da executada ocorreu no dia 11.4.2022 [cf. II. 1. d), supra, a informação reproduzida a fls. 7 e a cópia do aviso de receção de fls. 8, bem como o disposto nos art.ºs 228º, n.ºs 1 e 2, 230º, n.º 1 e 246º, n.º 1].

            O prazo para a apresentação dos embargos de executado é de 20 dias a contar da citação (cf. art.º 728º, n.º 1).

            A embargante/recorrida foi citada em comarca diferente de onde correm os autos, beneficiando da dilação de 5 dias [art.º 245º, n.º 1, alínea b)] e então decorriam as férias judiciais (art.º 28º da Lei n.º 62/2013, de 26.8 / Lei da Organização do Sistema Judiciário).

            A oposição à execução por embargos foi apresentada no dia 19.5.2022.  

            O primeiro dia de prazo foi 19.4.2022, primeiro dia após as férias judiciais da Páscoa.

            E o último dia do prazo foi 13.5.2022, sendo que a dilação e o prazo contam-se de forma contínua como um só período temporal (cf. art.ºs 138º, n.º 1, 142º e 728º, n.º 1)[6], podendo o ato ainda ser praticado com multa até ao dia 18.5.2022 (ou seja, com o alongamento até três dias úteis previsto no art.º 239º, n.ºs 4 e 5).
            6. Completando-se o prazo perentório ao fim de semana, o termo do prazo transfere-se para o dia útil seguinte, regime esse que não se aplica ao prazo dilatório.
            Daí, na situação em análise, é evidente que o prazo dilatório decorreu até 23.4.2022 (sábado), seguindo-se o prazo perentório da oposição por embargos de 24.4.2022 a 13.5.2022 (sexta feira).

            7. Conclui-se, ainda, que o ato em causa também não foi praticado nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, pelo que não se aplica o disposto no n.º 5 do art.º 139º.

            8. Assim, a petição de embargos é intempestiva.

            Transcorrido o prazo (perentório) de apresentação da oposição por embargos (limite temporal traçado pelo art.º 728º), extinguiu-se o direito de praticar o ato [art.ºs 239º, n.º 3 e 732º, n.º 1, alínea a)].

            9. Procedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


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III. Pelo exposto, julga-se procedente o recurso de apelação e, em consequência, revoga-se o despacho de 07.6.2022, com as consequências indicadas em II. 8., supra.

            Custas pela executada/embargante.


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09.11.2022





[1] E sendo que a exequente já manifestara a sua posição (quanto à intempestividade dos embargos) por requerimento de 23.5.2022.
[2] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.
[3] Cf. Portaria n.º 275/2013, de 21.8.

[4] Vide Alberto dos Reis, Comentário ao CPC, Vol. 2º, Coimbra Editora, 1945, págs. 53 e 56 e seguinte.

[5] Vide J. Lebre de Freitas, A Ação Executiva, 6ª edição, Coimbra Editora, 2014, págs. 193, 212 e seguintes e 228; Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL Editora, Lisboa/2018, págs. 365 e seguintes e J. Alberto dos Reis, Processo de Execução, Vol. 2º, reimpressão, Coimbra Editora, 1985, págs. 12 e seguintes.

[6] Cf. ainda, de entre vários, os acórdãos da RP de 09.11.2004-processo n.º 0423231 [assim sumariado: «A contagem do prazo peremptório de defesa e a dilação que a antecede, faz-se como se tratasse de um único prazo, sendo por isso irrelevante que, por exemplo, o termo do prazo dilatório seja dia de encerramento do tribunal.»] e de 17.6.2021-processo 1621/20.0T8VLG-A.P1 [com o sumário: «Tendo natureza diferente, o prazo de dilação e o prazo perentório para deduzir os embargos de executado contam-se como se de um só prazo se tratasse, designadamente para efeitos de interrupção.»] e da RC de 28.9.2022-processo 741/21.9T8CNT-A.C1,  publicados no “site” da dgsi.