JUNÇÃO DE DOCUMENTOS COM AS ALEGAÇÕES DE RECURSO
NULIDADE DA SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
EXPROPRIAÇÃO
NÃO ATRIBUIÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
Sumário


1- No âmbito do direito administrativo, contrariamente ao que acontece no direito civil, o mero decurso do tempo fixado para o exercício de um direito não determina automaticamente a extinção doeste por caducidade, mas exige-se que a Administração instaure um procedimento com vista a declarar a caducidade do direito, no âmbito do qual terá de observar o direito à audiência prévia do titular do direito em causa.
2- No âmbito desse procedimento a Administração poderá dispor de poderes de oportunidade que lhe permitam declarar ou não extinto o direito por caducidade, após a ponderação dos diversos interesses que no caso concreto se façam sentir, como poderá estar vinculada, em que por imposição legal e sem qualquer margem de discricionariedade terá de declarar extinto o direito por caducidade.
3- A licença provisória de exploração de pedreira concedida pela entidade licenciadora ao abrigo do art. 5º, n.º 10, do DL. n.º 340/2007, de 12/10, que permite ao explorador explorar a pedreira durante o prazo de um ano, não se extingue automaticamente por caducidade, decorrido o prazo de validade dessa licença e sem que o explorador tenha cumprido com as condicionantes estabelecidas pela entidade licenciadora para licenciar (em definitivo) a exploração da pedreira.
4- Para que a caducidade dessa licença provisória e precária ocorra, é necessário que, uma vez decorrido o prazo de validade da licença, sem que o explorador tenha cumprido as condições que a entidade licenciadora lhe impôs para licenciar (em definitivo) a exploração da pedreira, essa entidade inicie um procedimento tendente ao encerramento da pedreira, no âmbito do qual terá de assegurar o direito do explorador à audiência prévia e tomar a decisão de encerramento da pedreira, fixando (entre um mínimo de 6 e um máximo de 18 meses) o prazo para que o explorador encerre a pedreira e as condições de exploração e de recuperação da pedreira que o explorador terá de observar durante esse período de tempo para o encerramento (art. 5º, n.ºs 10, 11 e 12 do DL. n.º 340/2007, de 12/10).
5- O poder da entidade licenciadora quanto à instauração daquele procedimento e quanto à decisão de encerramento da pedreira é vinculado, pelo que, findo o prazo de validade da licença provisória sem que o explorador tenha cumprido com as condições que lhe impôs para licenciar (em definitivo) a exploração da pedreira, nada mais resta à entidade licenciadora se não instaurar o procedimento tendente ao encerramento da pedreira e determinar o encerramento desta. Já quanto ao prazo dentro do qual a pedreira terá de ser encerrada, dentro do prazo mínimo de 6 e máximo de 18 meses e quanto às condições de exploração e de recuperação da pedreira, a entidade licenciadora goza de poderes de oportunidade.
6- Nos casos em que a entidade licenciadora não instaurou o procedimento tendente ao encerramento da pedreira, apesar do prazo de validade da licença provisória e precária se encontrar esgotado e do explorador não ter cumprido as condições impostas pela entidade licenciadora para a emissão da licença (definitiva) de exploração da pedreira, essa licença provisória e precária não caducou.
7- Contudo, não assiste qualquer direito indemnizatório ao explorador de pedreira instalada em parcela de terreno expropriada, quando se verifique que, à data da publicação da DUP, com caráter de urgência, aquele explorava a pedreira ao abrigo de uma licença provisória e precária que lhe fora concedida pela entidade licenciadora no âmbito do processo previsto no art. 5º, n.º 10 do DL. n.º 340/2007, de 12/10, que o prazo de um ano de validade dessa licença provisória e precária há muito que se encontrava esgotado à data da publicação da DUP, sem que o explorador tivesse cumprido as condições que lhe foram impostas pela entidade licenciadora para a emissão da licença (definitiva) de exploração da pedreira e continuou a explorá-la perante a inércia da entidade licenciadora, que não instaurou o procedimento tendente ao encerramento da pedreira.

Texto Integral


Acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, no seguinte:

I- RELATÓRIO

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública necessária à realização do aproveitamento hidroelétrico denominado por Sistema Electroprodutor do Tâmega (SET) figuram como entidade expropriante X Generación, S.A.U., como expropriado o Conselho Diretivo de Baldios M. e R. e como interessada Y - Indústria e Granito, Lda.
Por despacho n.º 8082/2015 da Direção Geral do Território, de 14 de julho de 2015, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 142, de 23 de julho de 2015, foi declarada a utilidade pública, com caráter de urgência, da expropriação da parcela de terreno n.º D1427, com área de 53.803 m2, a destacar do prédio sito na freguesia de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ... e omisso na Conservatória do Registo Predial – cfr. fls. 6 verso a 13.
Por sentença proferida em 21/02/2017, transitada em julgado, deferiu-se a pretensão da interessada Y – Indústria de Granito, Lda., no sentido de ser avocado o processo de expropriação, passando o tribunal a exercer as funções que competiam à entidade expropriante X – cfr. fls. 154 a 161.
Realizou-se a vistoria ad perpetuam rei memoriam datada de 06 de dezembro de 2017, cujo relatório se encontra junto aos autos a fls. 487 a 518.
Notificada desse relatório a expropriante apresentou a reclamação de fls. 522 a 525, na sequência do que o perito apresentou o relatório complementar datado de 19 de janeiro de 2018, junto aos autos a fls. 531 a 535.
Na sequência desse relatório complementar, a entidade expropriante requereu, a título principal, a retificação das respostas apresentadas pelo senhor perito, de modo a que se expurgue daí as informações retiradas do pedido apresentado na DGEG pela Y em 20/07/2017, ou quaisquer conclusões de índole legal; subsidiariamente pediu que se aceitasse a reclamação que apresentou (cfr. fls. 549 a 553 dos autos).
Por despacho proferido em 07/02/2018, indeferiram-se ambos os pedidos (principal e subsidiário) apresentados pela entidade expropriante – fls. 555 a 557 dos autos.
Não tendo sido possível alcançar o acordo entre as partes quanto ao montante da indemnização a arbitrar pela expropriação da parcela de terreno supra identificada (cfr. fls. 605 a 609, 612 a 614, 617 a 621 e 636 a 641 dos autos), a 1ª Instância promoveu a constituição de arbitragem, tendo as partes apresentado quesitos.
A fls. 665 a 685 dos autos, os senhores peritos juntaram aos autos laudo de arbitragem, datado de novembro de 2018, em que concluíram dever ser fixada a quantia de 188.200,75 €, a título de indemnização pela expropriação da parcela de terreno a atribuir ao expropriado Conselho Diretivo de Baldios M. e R. e a quantia de 2.822.437,18 €, a título de indemnização a atribuir à interessada Y – Indústria e Granito, Lda., na qualidade de arrendatária e exploradora de pedreira instalada na parcela de terreno expropriada.
Notificada nos termos e para os efeitos previstos no artigo 51º, n.º 3 do Código das Expropriações (cfr. despacho de fls. 749 a 752), a entidade expropriante procedeu ao depósito da quantia de 3.013.382,93 € – cfr. fls. 758 a 760 dos autos.
Por despacho proferido em 11 de fevereiro de 2019, retificado por decisão de 12/03/2019, adjudicou-se ao Estado Português a propriedade e a posse da parcela expropriada n.º D1427, com a área de 53.803,00 m2, livre de quaisquer ónus ou encargos, e notificou-se o Ministério Público, a entidade expropriante, o expropriado e a interessada Y nos termos e para efeitos do disposto no n.º 5, do art. 51º do Código das Expropriações (doravante CE), nomeadamente, para a faculdade de interposição de recurso da decisão arbitral (cfr. fls. 761 a 762 e 868 dos autos).
A entidade expropriante, X Generación S.A.U. interpôs recurso do acórdão arbitral, a fls. 772 a 790 dos autos.
Invocou a nulidade do acórdão arbitral por falta de fundamentação e por omissão de pronúncia.
Impugnou os pressupostos em que os árbitros assentaram o cálculo das indemnizações, sustentando que esse cálculo lavra em erro nos seus pressupostos, uma vez que nele os árbitros atendem a factos não aprovados pelas entidades públicas relevantes (Direção Geral de Energia e Geologia - DGEG e a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte - CCDR-N), assentando todos os cálculos por eles efetuados em dados oferecidos pela interessada Y (plano de pedreira, plano de lavra e plano ambiental e de recuperação paisagística), sem qualquer validação independente, devendo o acórdão ter aprofundado a instrução dos autos, uma vez que os peritos não estavam, perante os dados oferecidos no processo, em condições de avaliar do valor económico do alegado direito da interessada Y a uma indemnização.
Sustentou que o acórdão arbitral, para além de assentar em dados que padecem de falta de fiabilidade, não tomou em devida conta um sem número de fatores que têm efeito direto no cálculo da indemnização a atribuir, v.g., produção média anual bruta, taxa de aproveitamento, produção total, produção com valor comercial, vida útil da massa mineral a explorar e encargos inerentes à exploração, baseando-se em dados elencados em documentos da lavra da própria interessada.
Em concreto, notou que a taxa de aproveitamento do granito se cifra, no máximo, entre 25% a 35% do material desmontado, ou seja, extraído das reservas previstas, afastando os valores indicados no acórdão arbitral proferido de 45%, entendendo que deveriam ter sido diferenciadas as diferentes qualidades de granito, os quais terão valores de mercados diferentes e capacidades de aproveitamento distintos, correspondendo o valor de 175,00 € m3 ao preço de venda de material de primeira qualidade, encontrando-se a vida útil estimada da pedreira manifestamente empolada e indicada a partir de valores de documentos técnicos da pedreira não aprovados.
Advogou que os custos de recuperação paisagística considerados pelos árbitros não foram validados pelas entidades competentes, não se encontrando aprovado o plano ambiental e de recuperação paisagística (PARP), pelo que não se deveria ter dado por adquirido o valor de 85.722,00 €.
Notou que à interessada Y não assiste qualquer direito a ser indemnizada, pois que a sua atividade de exploração da pedreira, instalada na parcela de terreno expropriada, não se encontrava titulada por licença à data da DUP; a interessada obteve um título de exploração da pedreira precário e sob condição, com eficácia de apenas um ano, sujeito à apresentação dos necessários documentos à instrução do processo de licenciamento, sendo que o estudo de impacto ambiental submetido foi considerado desconforme, terminando o subprocedimento de avaliação de impacto ambiental e com este o próprio licenciamento de exploração da pedreira, encontrando-se o sobredito título provisório caducado em momento prévio à prolação da declaração de utilidade pública.
Concluiu que o acórdão arbitral lavrou em erro ao atribuir uma indemnização à interessada Y, sendo que outra conclusão violaria os princípios constitucionais fundamentais da justa indemnização e da igualdade.
Juntou prova documental, arrolou testemunhas e requereu a realização de perícia, apresentando para o efeito quesitos.
Também o expropriado Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. interpôs recurso do acórdão arbitral (fls. 804 a 821 dos autos), advogando que a justa indemnização da totalidade da parcela deveria ter sido apurada de acordo (ainda que com algumas nuances) com o mesmo critério: o método de capitalização dos rendimentos, não devendo ter sido utilizado o método de capitalização das rendas para a área de 51.000 m2 e o método analítico de avaliação de propriedade rústica para os restantes 2.803 m2.
Em relação à parcela de 51.000 m2 advogou que seria expectável, atenta a legislação em vigor e a existência de recursos naturais da pedreira, assim como as relações existentes até agora, que o contrato de exploração da pedreira perdurasse, pelo menos, nos próximos 30 anos, com os benefícios inerentes para o expropriado, para quem essas rendas de, pelo menos, 12.500,00 € anuais líquidos continuariam a constituir uma das suas principais fontes de rendimento.
Mais sustentou não ser tributado a título de IRS, mas, quando muito, a título de IRC, pois que se trata de uma pessoa coletiva e não de uma pessoa singular, realçando, contudo, que beneficia de isenção desse imposto.
Conclui que, tendo em consideração o valor anual líquido da renda paga pelo arrendamento da parcela de terreno expropriada, no montante de 12.500,00 €, multiplicado por, pelo menos, 30, 34 ou 40 anos de vida útil da pedreira, e levando em consideração uma taxa de capitalização de 2%, o montante indemnizatório a ser-lhe arbitrado pela expropriação da parcela de terreno onde se encontra instalada a pedreira deverá ser fixado em 625.000,00 €.
Quanto à parcela expropriada remanescente de 2.803 m2, sustentou discordar do valor apurado por m2 pelos peritos, advogando que têm sido estipuladas e recebidas indemnizações, em casos análogos e por via extrajudicial, na ordem dos € 0,72 m2, pelo que considera que a indemnização deveria ser fixada na ordem do € 1,00 m2. Contudo, num futuro próximo, esse terreno adjacente à pedreira seria igualmente arrendado e passaria a fazer parte da exploração da pedreira, pois que essa parcela de terreno remanescente tem as mesmas caraterísticas, capacidade e aptidões da parcela de terreno expropriada onde se encontra a ser explorada a pedreira e que, por isso, a indemnização a ser arbitrada por essa parcela de terreno deverá ser avaliada nos mesmos termos e sob idênticos critérios da parcela de terreno expropriada em que se encontra instalada a pedreira.
Concluiu pedindo que se fixe a indemnização no valor global de 659.350,00 €, sendo 625.000,00 € e 34.350,00 €, respetivamente, pela expropriação das parcelas de 51.000 m2 e 2.803 m2.
Requereu a realização de perícia às duas parcelas de terreno, apresentando quesitos.
Também a interessada Y – Indústria de Granito, Lda. interpôs recurso do acórdão arbitral, a fls. 822 a 839.
Sustentou que a expropriação da parcela de terreno em que se encontrava instalada a pedreira implicou a cessação definitiva da exploração da pedreira.
Essa pedreira reunia todos os requisitos legalmente exigidos para ser licenciada, sendo que a atribuição de licença (peticionada ao abrigo do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro) apenas ficou dependente da apresentação do estudo de impacte ambiental pelo facto de a área a licenciar, somada com as áreas das outras pedreiras situadas no raio de 1 quilómetro, exceder os 50.000 m2.
Esse estudo foi elaborado e entregue em 18 de setembro de 2013, e a sua posterior desconformidade radicou na obra que justifica a expropriação designada por AHT (aproveitamento hidroelétrico do Tâmega), sendo também incompatível com a obra LMAT (linhas de muita alta tensão).
Salientou que, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, em novembro de 2013, desapareceu a necessidade de elaborar o estudo de impacte ambiental, pelo que, a partir de novembro de 2013, a pedreira passou a reunir todos os elementos factuais e legais para estar licenciada sem qualquer condição, sem prejuízo de considerar que o pedido de estudo de impacte ambiental foi deferido tacitamente pelo decurso do prazo que vigorava à data (Decreto-Lei n.º 69/2000, de 03 de maio), tendo sido considerada como tal pela entidade licenciadora, que, na nota interna 05/DSMP/16 de 2016/03/17, comunicou que a pedreira tem uma área licenciada de 48.151 m2, inexistindo qualquer prazo de caducidade.
Acresce que o legislador impunha que o encerramento da pedreira fosse precedido de notificação da entidade licenciadora e de audiência prévia do proprietário do estabelecimento industrial da pedreira, o que nunca ocorreu.
Notou que sempre foi obrigada a pagar as taxas devidas pelo funcionamento da pedreira.
Aduziu que sempre utilizou explosivos na laboração da pedreira e que essa utilização foi devidamente autorizada e, bem assim, que apresentou à Direção Geral de Energia e Geologia - DGEG as estatísticas anuais da exploração da pedreira e os respetivos relatórios ambientais -, tendo essa Direção garantido que a pedreira estava em condições para a empresa funcionar até à tomada de posse administrativa.
Mais advogou que, não obstante entender que se encontrava licenciada, recorreu ao programa de regularização, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 165/2014, de 05 de novembro, o qual, ope legis, se aplicava aos processos pendentes.
Quanto à avaliação da indemnização devida pela cessação da exploração da pedreira, sustentou que esse valor terá de ser calculado pela aplicação das fórmulas de Hoskold ou de Morkhill, as únicas que são cientificamente aceites.
Declarou concordar com a produção média bruta anual de granito de 42.188 m3, com um aproveitamento de 45% para fins ornamentais e 55% para escombros, mas discordando dos preços de venda adotados na decisão arbitral de 175,00 €, optando pelo preço médio de 190,00 €, pois que, o granito explorado na pedreira é um granito amarelo único, que só existe nesta zona e que é muito procurado pelas suas qualidades e tonalidade, que é extraído em blocos inteiros, sem partir e com uma cor e caraterísticas que apenas são encontradas neste concreto local, onde não existem áreas disponíveis para criar novas pedreiras atenta a raridade da pedra e as condicionantes existentes à implantação de pedreiras.
Salientou que, pese embora só 45% do valor do material extraído seja nobre, os restantes 55 % têm valor e são aproveitados para outros fins e, mesmo vendidos a um preço mais barato, aumenta o lucro da exploração.
Concluiu que, seguindo os critérios e as fórmulas seguidas na decisão arbitral, o valor da indemnização que lhe é devida pela cessação da exploração pedreira, em consequência da expropriação da parcela de terreno onde esta se encontrava instalada, deverá ser fixada em 3.382.130,00 €, ao qual se deverá deduzir o valor do plano de recuperação paisagístico, no montante de 85.722,00 €, pelo que lhe deverá ser fixada uma indemnização de 3.306.408,00 €, a que acresce o valor das benfeitorias apurado no acórdão arbitral, o que perfaz uma indemnização global de 3.309.953,00 €.
Por despacho de 12 de março de 2019, admitiram-se os recursos interpostos, atribuiu-se ao expropriado Baldio de M. e R. o montante da indemnização sobre o qual se verificava acordo, retendo-se o montante das custas prováveis no caso daquele decair no recurso que interpôs do acórdão arbitral, e notificaram-se os recorridos para responderem, querendo, aos recursos interpostos.
O expropriado Conselho Diretivo dos Baldios e R. respondeu ao recurso interposto pela entidade expropriante, pugnando pela improcedência das nulidades invocadas pela recorrente e reiterando o recurso que apresentara (cfr. fls. 884 a 886).
A interessada Y - Indústria de Granito, Lda. respondeu ao recurso interposto pela entidade expropriante, pugnando pela improcedência das nulidades por ela assacadas ao acórdão arbitral e concluindo pela total improcedência desse recurso (cfr. fls. 887 a 895 dos autos).
A expropriante respondeu aos recursos interpostos pela expropriada e pela interessada Y, pugnando pela improcedência destes (cfr. fls. 896 a 908 dos autos).
Por despacho proferido a fls. 913, admitiu-se a perícia requerida pelas partes.
Realizada essa perícia, os senhores peritos juntaram aos autos, a fls. 1001 a 1114, o respetivo relatório pericial e os documentos que o instruem.
O expropriado, a interessada Y e a expropriante apresentaram sucessivas reclamações a esse relatório e esclarecimentos (cfr. fls. 1118 a 1132), na sequência do que, se determinou que os peritos prestassem os esclarecimentos solicitados pelos reclamantes, tendo os senhores peritos prestado os esclarecimentos entrados em juízo em 10/02/2020,19/02/2021 e 11/08/2021.
Realizou-se a audiência de julgamento, em que se tomaram esclarecimentos aos senhores peritos e se inquiriram as testemunhas arroladas pelas partes.
Concluídas as diligências de prova, a expropriada Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R., a expropriante X Generación S.A.U., e a interessada Y – Indústria de Granitos, Lda., apresentaram as alegações escritas que se encontram juntas aos autos.
Em 02/05/2022, proferiu-se sentença em que se julgou procedente o recurso interposto pelo expropriado Conselho Diretivo de Baldios M. a R. e, em consequência, fixou-se o valor indemnizatório que lhe é devido em 210.575,73 euros, a ser atualizado de acordo com o índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo INE, desde a data da declaração de utilidade pública até 12/03/2019, e desde esta data, atualizada pela diferença entre a quantia entregue à expropriada cujo levantamento fora autorizado, e o valor fixado na sentença, até à decisão definitiva, e julgou-se improcedente o recurso interposto pela interessada Y – Indústria e Granitos, Lda. e procedente o interposto pela expropriante X Generación, S.A.U. e, em consequência, não se atribuiu a essa interessada qualquer indemnização, por não ser legalmente devida, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva:
“Nestes termos, decide-se:
a) Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo expropriado Conselho Diretivo de Baldios M. e R. e, em consequência, fixar em 210.575,73 € (duzentos e dez mil, quinhentos e setenta e cinco euros e setenta e três cêntimos) o valor da indemnização a conceder pela entidade expropriante X Generación, S.A.U. pela expropriação da parcela de terreno n.º D1427, com área de 53.803 m2, a destacar de prédio sito na freguesia de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ... e omisso na Conservatória do Registo Predial, indemnização esta atualizada, de acordo com o índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo INE, desde a data da declaração de utilidade pública até à data de 12 de março de 2019 (data em que se autorizou o levantamento de uma parcela da indemnização fixada), e desde esta data, atualizada pela diferença entre a quantia entregue à expropriada cujo levantamento foi autorizado, e o valor que se fixa na presente decisão, até à data da decisão definitiva.
b) Julgar improcedente o recurso interposto pela interessada Y – Indústria e Granito, Lda. e procedente o recurso interposto pela expropriante X Generación, S.A.U. e, consequentemente, decidir não atribuir à interessada uma indemnização decorrente do ato expropriativo.

*
Quanto ao recurso interposto pelo Conselho Diretivo de Baldios M. e R., as custas são da responsabilidade da expropriada e da expropriante, na proporção do respetivo decaimento que se fixa em 90 % para o recorrente e 10 % para a expropriante, recaindo as custas quanto aos recursos interpostos pela X Generación, S.A.U. e pela Y – Indústria e Granito, Lda. sobre a interessada em virtude do seu integral decaimento (artigo 527.º do Código de Processo Civil).
*
Nos termos e para os efeitos previstos no artigo 38.º, n.º 2, alínea b) do Código das Expropriações fixa-se à causa o valor global de 3.781.102,25, sendo 471.149,25 € correspondente à diferença entre o valor reclamado pelo expropriado (659.350,00 €) e o valor da indemnização pugnado pela entidade expropriante (188.200,75 €) e 3.309,953,00 € correspondente à diferença entre o valor reclamado pela interessada (3.309,953,00 €) e o valor da indemnização pugnada pela entidade expropriante (0,00 €)”.

Inconformada com o assim decidido, a interessada “Y – Indústria de Granitos, Lda.” interpôs o presente recurso de apelação em que formulou as seguintes conclusões:

1. À matéria de facto provada devem ser aditados os seguintes factos:
a) 8-A - Esta pedreira, denominada “das C. “, tinha uma área de 3,488 há meios de prova: informação da CM de Cabeceiras de Basto, fls. 47; da nota interna, nº 05/DSMP/16 de fls. 135 e da informação nº 455/DSMP/ DPN de 2017-05-18, a fls. 560, todas do PA.
b) 42-A - À data da publicação da DUP o procedimento de licenciamento ainda estava pendente.
Meio de prova: Informações de fls. 135, 236, 285 e 490 do PA
c) 47- A- As notificações não seguiram, pois que a Sra. Subdiretora-Geral ordenou a prévia elaboração de uma informação, pelos serviços jurídicos
Meios de prova:
1) Despachos da Subdiretora Geral, na informação de fls. 236; informação nº 1098/DPN, fls. 285 e na informação nº 180/DPN de fls. 490, todos do PA;
2) Depoimento da Sra. Subdiretora-Geral, Dra. M. L., gravado no dia 14-12-2021, com início às 16:53:30 e término às 17:47:48 e mais concretamente entre o minuto 12:55 e o minuto 18:56; e entre o minuto 41:33 e o minuto 44: 33
d) 61 – Não havia qualquer obstáculo para o licenciamento da pedreira para além da expropriação da parcela D.1427.

Meios de prova:
1) Laboração da pedreira até à tomada de posse administrativa; ofício da APA de 30/12/2014 dirigido ao Diretor Regional de Economia do Norte, fls. 210 do PA; Ofício da CCDRN de 25 de março de 2015. - fls. 250 do PA; Informação do Chefe de Divisão de Pedreira do Norte, fls. 237 do PA; Informação do Técnico Superior R. S. sem data, fls. 115 a 118, do PA.;
2) Depoimento do Sr. Eng. P. J., (depoimento gravado no dia 14 de dezembro de 2021, das 14:23:28 até 15:48:55); entre o minuto 30:23 e o minuto 31:38
e) 62- As entidades administrativas licenciadoras entendiam que os sucessivos regimes de regularização permitiam o funcionamento da pedreira.
Meios de prova:
1) Informação da DREN de 2013.10.29 prestada à equipa de elaboração do EIA das LMAT, fls. 251 do PA; informação da DREN de 2014.09.19, dirigida à APA, fls. 124 do PA; ofício da Diretora de Serviços de Energia Elétrica de 2015-02-15, dirigido à expropriante, fls. 161 do PA; ofício do Chefe da DPN de 2016.01.14 dirigido ao IAPMEI, fls. 109 do PA; nota Interna nº 05/DSMP/16 do Dr. J. P., de 17/03/2016, dirigida à DSEE, Eng. M. J., fls. 157 do PA; ofício dirigido pelo Diretor de Serviços da DSMP, Dr. J. P. de 2016.05.24 à X, fls. 213 do PA; despacho da Sra. Subdiretora-Geral de 29.12.2016 proferido na informação DPN 109/DPN, fls. 297 do PA; despacho da Sra. Subdiretora Geral de 22.02.2017, proferido na informação do diretor de serviços dr. J. P., fls. 294 do PA ; ofício da DGEG datado de 15 de julho 2020 de remessa do PA aos presentes autos.
2) Depoimento do Dr. J. C., Diretor de Serviços na DGEG, gravado no dia 14 de dezembro de 2021 (início da gravação 10:59:27 e término a 12:04:31) e mais concretamente entre o minuto 03:37 e o minuto 12:19; e entre o minuto 39:23 e o minuto 41:07; entre o minuto 46:44 e o minuto 48:59; entre o minuto 50:07 e o minuto 50:47; E entre o minuto 01:02:13 e o minuto 01:03:03;
3) Depoimento do Sr. Eng. P. J. (depoimento gravado no dia 14 de dezembro de 2021, das 12H01 até 13:01), entre o minuto 06:24 e o minuto 09:12; e entre o minuto 19:04 e o minuto 21:54; e entre o minuto 22:50 e o minuto 32:52; e ainda: depoimento gravado no mesmo dia 14 de dezembro de 2021, das 14:23:28 até 15:48:55, mais concretamente entre o minuto 10:28 e o minuto 15:40; entre o minuto 31:38 e o minuto 38:13
4) Depoimento da Sra. Subdiretora-Geral, da DGEG, Dra. M. L. (depoimento gravado no dia 14-12-2021, das 16:53:30 às 17:47:48), entre o minuto 32:22 e o minuto 35:54.
f) 63- A entidade licenciadora, primeiro a Direção Geral de Economia quer depois a Direção Geral de Energia e Geologia sempre entenderam que o prazo de um ano previsto no DL 340/2007 não era rígido, pelo que sempre consideraram que agiram dentro da legalidade na tramitação dos processos de legalização.
Meios de prova:
1) Email dirigido pelo Diretor de Serviços da Indústria e Recursos Geológicos, Dr. F. S. de 25 de maio de 2010, dirigido à ANIET (Associação Nacional de Indústrias Extrativas e Transformadoras) e do Boletim Informativo nº 47, de maio/2010 desta associação, documentos que constituem o Anexo 3 do relatório pericial junto aos autos a 10/02/2020.
2) Depoimento da testemunha Dr. J. C., cujo depoimento foi prestado a 14-12-2020 e está gravado com início da gravação 10:59:27 e término a 12:04:31, entre o minuto 35:51 e o minuto 37:05; entre o minuto 51:03 e o minuto 52:26
3) Depoimento da testemunha Eng. P. J., gravado no dia 14 dezembro de 2021, das 14:23:28 até 15:48:55; entre o minuto 10:28 e o minuto 15:40;
4) Depoimento da Eng. M. F., prestado no dia 16-12-2021, gravação com início a 11.34.21 e fim a 11.55.16, entre o minuto 04: 15 e o minuto 11:48.
g) 64- O contrato de arrendamento subscrito entre o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e a Y foi executado até à tomada de posse administrativa.
Meios de prova: vistoria ad perpetuam rei memoriam; facto provado nº 9; informação 180/DPN de 2017-02-01, fls. 294,295 e 296 do PA.
h) 65- Na área da pedreira expropriada e no raio de 1 km havia para além desta a P60- “Das C.”, com área total superior a 50.000m2.
Meios de prova: Documentos que constituem fls. 47 e 61 do PA.
i) 66- O estudo de impacto ambiental (EIA) foi a única condição imposta na autorização provisória e pelo facto da área a licenciar somada com a da pedreira P60 exceder 50.000m2.
Meios de prova: Documentos que constituem fls. 61 a 70 do PA
j) 67 - O estudo de impacto ambiental (EIA) deixou de ser exigível, a partir da publicação do DL. 151-B/2013.
Meio de Prova: Anexo II, nº 2, al. a), deste diploma
K) 68 - O Plano da pedreira (pano de lavra) tinha de ser apresentado na fase de licenciamento (artº 27, nº 1, c), do DL 270/2001) sendo que o junto pela apelante e que consta dos autos e do PA cumpre os parâmetros.
Meios de prova: prova pericial; factos provados 17 e 18 e depoimento do Eng. P. J. gravado no dia 14 dezembro de 2021, das 14:23:28 até 15:48:55, entre o minuto 38: 23 e o minuto 41:25
l) 69 - O encerramento das pedreiras teria sempre de ser precedido de aprovação pela CCDR-N, entidade responsável pela aprovação do PARP, nos termos do artigo 31º do DL 270/2001.
Meios de prova: Informação 1096/DPN de 13/12/2016. (fls. 254 do PA).
L) 70- Nenhuma outra pedreira, nas mesmas condições da Pedreira do CB. e da Pedreira das C., foi encerrada.
Meios de prova: Declarações do Sr. Eng. J. N. (prestado em 16- 12-2021, gravação com início às 14:21:05 até ao minuto 15:22:20), entre o minuto 07:25 e o minuto 13:06
M) 71 - A Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto só não emitiu uma declaração favorável de interesse público relativamente à pedreira do CB., por causa da expropriação.
Meios de prova: Informações constante a fls. 502 a 509 do PA e depoimento do Presidente da Câmara, F. L., no dia 16-12-2021 e gravado no sistema com início às 15:23:16 e término às 15:30:11, e mais concretamente entre o minuto 02:00 e o minuto 05:51.
2. Deve ser alterado o facto provado do ponto 58, devendo ter a seguinte redação: A interessada Y cessou definitivamente a exploração da pedreira no âmbito logo que foi tomada de posse administrativa pela X pelo que quando o Secretário de Estado da Energia indeferiu o seu recurso hierárquico já a pedreira estava encerrada definitivamente.
Meios de Prova: decisão definitiva de indeferimento do recurso hierárquico foi tomada em 29-03- 2019 – vide fls. 830 do PA. A tomada de posse administrativa ocorreu em 28-03-2019. Despacho judicial de 11.07.2018 que ordenou a arbitragem; depoimento de M. M. (gravação de 16-12-2021, gravado de das 11:56:18 às 12:12:13), entre o minuto 04:54 e o minuto 06.12; depoimento do Eng. J. N. (gravação do dia 16-12-2021, com início às 14:21:05 até ao minuto 15:22:20) entre o minuto entre o minuto 23:22 e o minuto 25:09
3. Quanto ao ponto 59 deve acrescentar-se a palavra sempre passando a ter a seguinte redação: A pedreira possuiu sempre enquanto laborou licença para a utilização de explosivos autorizada pela DGEG e emitidas pela PSP.
Meios de prova: A pedreira sempre trabalhou com recurso a explosivos, e resulta das informações de fls. 284 a 302, 496 e 497 do PA e dos depoimentos do Eng. J. N. (gravação do dia 16-12-2021, com início às 14:21:05 até ao minuto 15:22:20) entre o minuto 23:22 e o minuto 25:09 e de M. M. (gravação de 16-12-2021, gravado de das 11:56:18 às 12:12:13), entre o minuto 06:12 e o minuto 08:45,
4. Na parte decisória o Tribunal escreveu, na b) que julgava improcedente o recurso interposto pela interessada Y-Indústria de Granito, Lda., em contradição com a fundamentação, que concluiu pela nossa ilegitimidade e se absteve, por isso, de conhecer do mérito do nosso recurso.
5. É o que resulta da conclusão que imediatamente antecede, o item III Decisão – Por todo o exposto se conclui que não deverá ser atribuído à interessada Y-Indústria de Granito, Lda., uma indemnização, afastando-se a presunção ínsita no artigo 9º, nº 3 do Código das Expropriações, encontrando-se prejudicada a necessidade de apreciação e fixação do quantum indemnizatório.
6. Estamos perante uma decisão nula já que os fundamentos estão em contradição com a decisão.
7. Também é nula por excesso de pronúncia já que em sede de recurso da decisão arbitral a entidade expropriante, a multinacional X, não colocou a questão á apreciação do Tribunal.
8. Na petição de recurso da decisão arbitral é que se baliza o poder cognitivo do Tribunal.
9. Também é nula a decisão por constituir verdadeira decisão surpresa.
10. O argumento da falta da legitimidade da Y apenas alegado em sede das alegações do artigo 64º do Código das Expropriações para além de intempestivo, representa um manifesto venire contra factum proprium.
11. A concretização da DUP foi organizada pela X como resulta do texto publicado no Diário da República.
12. A DUP reconhece-nos como interessada na expropriação como consta do seu teor publicado no Diário da República e não consta que a DUP tenha sido retificada.
13. A entidade licenciadora das pedreiras, em sede da AIA, alertou a APA, autoridade de EIA, para a existência das massas minerais e, para a sua relevância económica.
14. A X comprometeu-se ali a compensar os proprietários, e teve um comportamento prático totalmente de sentido contrário.
15. A X incentivou-nos a continuar a exploração deixando caducar a declaração de utilidade pública.
16. A Y não foi considerada parte legítima por presunção, mas como decorrência da factualidade já que estava no terreno a trabalhar, pagando a renda fixada no contrato de exploração e com a autorização da entidade licenciadora.
17. O nº 3 do artigo 9º do Código das Expropriações estabelece que são tidos como interessados os que em títulos bastantes de prova figurem como titulares de direitos.
18. Por sua vez o nº1 do mesmo artigo 9º preceitua que são considerados interessados, entre outros, os arrendatários.
19. Foi ao abrigo desta norma que a Y foi considerada parte interessada e não por presunção.
20. A douta decisão recorrida fez tábua rasa do reconhecimento judicial da qualidade de interessada da Y já havido nos autos, por decisões transitadas em julgado, por exemplo quando decidiu que a fase administrativa desta expropriação, a nosso requerimento, passava a decorrer perante o Tribunal da comarca por a entidade expropriante (nº 2 do artigo 42º do C.E.) não ter procedido á tramitação a que estava obrigada.
21. A douta julgadora laborou em erro quando raciocinou com a cessação automática do contrato.
22. Da economia do diploma legal só se fala em licença de exploração (uma única licença de exploração, chamemos-lhe definitiva, pois que não era prevista qualquer outra.
23. E é relativamente a ela que o legislador raciocina, mesmo depois das alterações introduzidas pelo DL 340/2007 que não alterou a redação da alínea e)
24. O nº 10 do artigo 5º do DL 340/2007 é que veio introduzir a possibilidade de laboração provisória, referindo apenas que “é permitida a exploração da pedreira a título provisório até que seja emitida a licença de exploração” (referida no nº 8). Mas nunca se lhe referiu como categoria licença.
25. Esqueceu que a decisão arbitral nos considerou interessada.
26. Esqueceu que a decisão de adjudicação nos considerou interessada.
27. Esqueceu que, o nosso recurso da decisão arbitral foi admitido.
28. Além de ter conhecido de algo de que não podia conhecer, proferiu uma decisão surpresa sem o poder fazer. Também por esta razão é nula.
29. Na jurisprudência que conhecemos nunca vimos aos exploradores de pedreiras, não proprietários do solo, não ser reconhecida a qualidade de interessados em processo de expropriação.
30. Estamos perante um contrato sui generis, atenta a especificidade, de arrendamento, pelo qual o proprietário cede um determinado espaço contra o pagamento duma renda.
31. A especificidade relativamente aos arrendamentos tradicionais é que, aqui, o arrendatário pode explorar as massas minerais existentes.
32. E, as regras de renovação automática são diferentes, adequadas a esta realidade de negócio.
33. Como o investimento é grande as três primeiras renovações são automáticas para o senhorio.
34. Como a finalidade é a extração das massas naturalmente que o arrendatário a pode fazer.
35. Foi por nos considerar parte ilegítima que a douta Julgadora considerou prejudicada fixação dum quantum indemnizatório.
36. A douta julgadora entendeu que o contrato que celebramos com a proprietária cessou por força da aplicação das alíneas d) e e) do artigo 18º do DL 270/2001.
37. A lei não prevê licenças provisórias. O nº 10 do artigo 5º do DL 340/2007 apenas refere “é permitida a exploração da pedreira a título provisória até que seja emitida a licença de exploração” (referida no nº8).
38. É, pois, no âmbito da licença para exploração prevista no diploma – a definitiva - que o legislador estrutura o seu raciocínio.
39. Da economia do diploma legal resulta que só estão previstas duas, a licença de exploração e a licença de pesquisa, cfr artigo 10º.
40. A alínea d) prevê a hipótese de o pedido da licença não obter provimento. Refere-se, na aplicação ao caso concreto, à licença de exploração prevista no artigo 29º.
41. A douta julgadora não esclareceu se a cessação foi imediata ou se precisou de ser declarada.
42. Ora a licença de exploração não chegou a ser requerida já que o procedimento administrativo de regularização esteva pendente até á tomada de posse administrativa, como a Administração considerou.
43. Se na citada alínea d) a lei se referisse ao “licenciamento provisório” não haveria dúvidas de que obteve provimento.
44. Afastada que está a licença para pesquisa, quanto á licença (definitiva) a obtenção do provimento à data da DUP não se colocava por o procedimento de regularização estar pendente.
45. A Y deu início ao procedimento de regularização cumprindo o previsto no nº 1 do artigo 5º do DL 340/2007 de 12/10.
46. Foi-lhe atribuída a decisão favorável condicionada, condicionada à elaboração e aprovação dum EIA, porque no raio de 1 km existiam duas pedreiras, esta e outra, que tinham uma área de exploração superior a 5 hectares.
47. A alínea d) não é, pois, aplicável.
48. E a alínea e) também não é já que nunca houve licença nos termos da norma (a lei não prevê licenças provisórias, apenas refere exploração da pedreira a título provisório). 49. Aliás, a lei é clara quando define a cessação dos efeitos jurídicos (artigo 38º) e quando define a verificação da caducidade ou da revogação.
50. A caducidade da licença só ocorre por:
a) Extinção do contrato (que nunca ocorreu)
b) Abandono da pedreira (que nunca ocorreu)
c) Esgotamento dos recursos da pedreira (que nunca ocorreu)
d) Extinção da pessoa coletiva
51. E, para além da verificação de um destes eventos, a caducidade tem de ser declarada, e só pode sê-lo depois de cumprido o procedimento de desvinculação.
52. Também não estamos perante situação de revogação.
53. Também não acompanharmos a douta julgadora quando refere que a licença que nos foi concedida caducou automaticamente, sem necessidade de reconhecimento administrativo de tal realidade.
54. Desde logo porque não é esse o entendimento da entidade administrativa competente a que aderimos.
55. Esta transmitiu à ANIET – Associação Nacional das Indústrias Extrativas e Transformadoras, que por sua vez transmitiu aos seus associados, que a exploração de granitos podia continuar para além do termo do prazo, como está demonstrado nos autos.
56. Entendimento que manteve na sua prática permitindo que esta pedreira e todas as demais que estavam na mesma situação continuassem a poder utilizar explosivos.
57. Depois, antes da DUP nunca mandou encerrar o sítio. E tinha de o ter feito por imposição legal se entendesse que se justificava o encerramento.
58. Mesmo para as pedreiras que obtiveram decisão desfavorável a entidade licenciadora, só as podia mandar encerrar após proferir decisão fundamentada que atenda à dimensão da exploração e ao tipo de intervenções a efetuar para o seu encerramento, de definir um prazo para o encerramento do sítio, a fixar entre um mínimo de 6 e um máximo de 18 meses, e estabelecer as condições técnicas de exploração e recuperação que o proprietário da exploração tem de cumprir até ao termo do prazo fixado, devendo nesse período ser efetuado o acompanhamento que verifique o cumprimento do estabelecido.
59. A entidade licenciadora entendeu, que ocorria a compatibilização a que se refere o nº 8 do artigo 5º do DL 340/2007.
60. Acresce que o contrato de arrendamento, efetivamente, não cessou até á tomada de posse administrativa – o senhorio continuou receber a renda, a Y a pagar a renda e a explorar a pedreira e a entidade licenciadora continuou com a pedreira inscrita, em aberto, a receber as estatísticas e a conceder autorização para a aquisição de explosivos.
61. Aliás o legislador publicou um novo diploma, o DL 165/2014, de 05/09, que veio reconhecer que os prazos de regularização eram insuficientes e determinou a aplicação das suas regras aos procedimentos pendentes.
62. É o que resulta do artigo 20º do DL 165/2014, de 05/09, 1ª parte – “O presente decreto-lei é aplicável aos procedimentos de regularização de estabelecimentos ou explorações pendentes à data da entrada em vigor, ou seja 02/01/2015”.
63. Nesta data o nosso procedimento estava pendente.
64. E, ao nosso concreto procedimento, por força do artigo 16º deixou de ser necessário o EIA.
65. Enquanto o Decreto-Lei 151-B/2013 no que toca á aplicação das novas regras tinha uma norma de não aplicação aos processos pendentes, o Decreto-Lei 165/2014 tem uma norma de sentido contrário (o artigo 20º).
66. Deixou de se aplicar o DL 69/2000 de 03 de maio que exigia um EIA quando no raio de 1 km houvesse mais de 5 hectares de pedreiras.
67. E, se por ventura tivesse ocorrido caducidade, da autorização de funcionamento este diploma repristinou a situação.
68. Sabemos que o procedimento nunca teve uma decisão final (caiu porque a DUP permitiu à X a afetação definitiva do terreno a finalidade incompatível).
69. Sabemos que quando o EIA foi declarado desconforme tal desconformidade não tinha qualquer relevância ex vi do anexo II do DL 151-B/2013, conjugado com as normas dos artigos 20º, 1ª parte e 16º, nº 1 ambos do DL. 165/2014.
70. O novo regime de regularização operou ope legis, não carecendo de qualquer iniciativa da Y.
71. E, como era indubitável que a autorização de exploração, se estivesse caducada, o que não aceitamos, tinha renascido face á vontade do legislador expressa no DL 165/2014.
72. Quando a douta julgadora refere que o recurso ao RERAE foi tardio face à DUP raciocina simultaneamente bem e mal.
73. Bem, porque o recurso específico ao RERAE, em julho de 2017 ocorreu para prevenir a hipótese de a X não consumar a expropriação – já que era sua intenção deixar caducar a DUP, como sempre alegou.
74. Mal, porque antes, o RERAE já se aplicava automaticamente ao procedimento em curso iniciado ao abrigo do artigo 5º e só foi a expropriação que evitou o licenciamento.
75. O segundo recurso ao RERAE só surgiu perante a iminência de desaparecer a DUP, motivo que levou á impossibilidade da conclusão do 1º procedimento de regularização.
76. E a aplicação do novo regime aos procedimentos de regularização, como foi o caso, conferiu legitimidade á continuidade da exploração.
77. Daí ser perfeitamente adequada e correta a afirmação da entidade licenciadora quando remeteu o PA para Juízo e escreveu: a pedreira trabalhou ao abrigo dos sucessivos regimes de licenciamento.
78. O abuso do direito da expropriante multinacional espanhola X é flagrante quando se propõe deixar caducar a DUP e permitir e incentivar a continuidade da exploração por mais uns anos.
79. E, quando o Tribunal, por nossa intervenção não reconhece a caducidade e, tem que pagar uma indemnização já defende nos mesmos autos que não temos direito a explorar.
80. Só por causa da expropriação para o SET, também designado por Aproveitamento Hidroelétrico, é que a pedreira não permaneceu em laboração e devidamente licenciada.
81. Constitui abuso de direito comprometer-se em sede do AIA a expropriar as pedreiras que sabia terem licença provisória, por intervenção da entidade licenciadora no EIA, para compensar os proprietários e depois pleitear pela não atribuição da indemnização.
82. O recurso à atribuição das responsabilidades ao Estado para tentar não pagar a responsabilidade que a X tentou e para já com sucesso é inadmissível.
83. O Estado tem o direito e em nossa opinião o dever de regularizar as explorações viáveis e, por isso, legislou nesse sentido entre outros diplomas, nos Decretos-lei 340/2007 e depois no 165/2014.
84. Este último foi mandado aplicar aos procedimentos de regularização em curso, fazendo aplicar-lhes em termos ambientais o DL 151-B/2013, que dispensou, in casu, o EIA, e concedeu mais prazo para funcionamento – 2 anos, que valeriam até 2017 não fora a DUP.
85. Ficou claro quer no domínio do 1º regime de regularização quer no segundo que apenas e só a expropriação impediu o licenciamento.
86. Em ambos se demonstrou que não havia outros impedimentos ao licenciamento.
87. Entre 01/12/2013 (data da vigência do DL 151-B/2013 e janeiro de 2015 data da vigência do RERAE não havia qualquer impedimento a não ser a projetada expropriação com DIA de 2015/01/06 – 1997 do PA.
88. E depois do RERAE (quando este regime passou a aplicar-se) pelas mesmíssimas razões.
89. A pedreira reunia todas as condições para funcionar e, como tal continuaria, senão fosse a expropriação.
90. O conceito de interessado numa expropriação não é meramente formal.
91. O explorador duma pedreira, com contrato celebrado por escritura pública, com reconhecimento da entidade licenciadora, que lhe autoriza a obtenção da licença para aquisição e utilização dos necessários explosivos, não pode deixar de ser interessado no processo expropriativo.
92. Ainda por cima quando continua a explorar com o acordo do senhorio, paga a renda e com conhecimento das autoridades competentes.
93. As normas das alíneas d) e e) do artigo 18º nº1 do DL 270/2001 não abrangem a situação de facto dos autos.
94. O contrato não só se manteve de facto como de direito.
95. O procedimento de regularização extraordinário ao abrigo do artigo 5º do DL 370/2007 previa o encerramento das pedreiras que não se pudessem licenciar.
96. Apurou-se que além destas duas nenhuma encerrou.
97. O encerramento dependia da impossibilidade de compatibilização da localização da pedreira e dum ato administrativo da autoridade a determinar o encerramento.
98. Não havendo ordem de encerramento, por contraposição há permissão de funcionamento.
99. Foi este o entendimento da entidade licenciadora e é o entendimento que resulta do artigo 5º.100. O DL 165/2014, ao aplicar-se aos procedimentos pendentes, aplicou-se a este.
101. E, desde logo conferiu dois anos de autorização de funcionamento a contar do início de janeiro de 2015, início da sua vigência.
102. Este diploma mandou aplicar aos processos pendentes o DL 151- B/2013, que nos dispensou da elaboração do EIA.
103. A pedreira não tinha qualquer impedimento ao seu licenciamento a não ser a expropriação que a faz desaparecer.
104. O dano foi a perda da pedreira que encerrou depois da tomada de posse administrativa.
105. O recurso, de forma autónoma a novo licenciamento após a prolação da DUP também ao abrigo do DL 165/2014 só se deveu ao facto de a X informar que ia deixar caducar a DUP.
106. Sem DUP haveria que regularizar o procedimento, admitindo que o primeiro ficou condenado com a prolação da DUP.
107. Com a concretização da posse administrativa deixou de ter interesse este novo procedimento.
108. Até porque a falta de declaração de reconhecimento de interesse público municipal só não foi dada por haver incompatibilidade com o SET (com a expropriação). E sem DUP seria revertida como aliás o Presidente da Câmara depôs no julgamento.
109. Atento o prazo do contrato de exploração – dez anos – e a obrigatoriedade para o senhorio de renovação do contrato 3 vezes por igual prazo, a Y podia explorar a pedreira 40 anos.
110. O valor duma pedreira é determinado pela fórmula de HosKold ou de Morkhill. Os peritos do Tribunal são os que maiores garantes dão ao julgador.
111. O valor indemnizatório a que chegaram os árbitros e o valor a que chegaram os peritos do Tribunal são idênticos e respeitam a aplicação do critério de avaliação de pedreiras que aprenderam no CEJ, n preparação e seleção para a lista de peritos.
112. O dano da apelante foi a perda da pedreira.

Termos em que se conclui pela procedência da nossa apelação, pelo conhecimento das nulidades invocadas e pela fixação da indemnização atribuída pelos peritos do Tribunal á Y como interessada nestes autos.
Em anexo às suas alegações de recurso junta um documento, que consista numa notificação de que foi alvo, de um documento intitulado “Auto de Posse administrativa”.

A expropriada X Generación, S.A.U. contra-alegou pugnando pela improcedência da apelação e concluindo as suas contra-alegações nos termos que se seguem:

I. Têm as presentes contra-alegações por objeto o recurso interposto pela Y ora Recorrente, da douta sentença proferida em 02.05.2022 pelo Tribunal a quo, na parte em que julgou improcedente o recurso da decisão arbitral interposto pela Y, e, consequentemente, decidiu não atribuir qualquer montante indemnizatório à Recorrente decorrente do ato expropriativo da Parcela com o número D1427.
II. Tal recurso incide sobre a decisão do Tribunal a quo, quer no que tange à matéria de facto (pretendendo a Recorrente alterar a redação dos pontos 58 e 59 dos factos provados, bem como aditar ao elenco dos factos provados um conjunto de 14 novos factos), quer no que tange à matéria de Direito.
III. O Tribunal a quo julgou improcedente o recurso da decisão arbitral interposto pela Y, fundamentalmente porque entendeu ter ficado amplamente demonstrado nos autos que, à data da DUP a Recorrente não se encontrava munida do necessário título habilitante para a exploração da Pedreira “... e ...”, pelo que não tinha um direito constituído à data da DUP que justificasse a concessão de uma indemnização por parte da Recorrida.
IV. Por conseguinte, nos termos do disposto no artigo 18.º/1, alíneas d) e e), do Decreto-Lei n.º 270/2001, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, o contrato de exploração celebrado com o proprietário da Parcela D1427, tinha cessado;
V. E, assim, tinha sido afastado a presunção ínsita do artigo 9.º/3, do CE, não sendo devida a fixação do quantum indemnizatório por força do ato ablativo expropriatório.
VI. Face a tal entendimento, o Tribunal a quo julgou prejudicada a questão relativa à fixação do quantum indemnizatório que delimitavam a segunda parte do thema decidendum.
VII. O Tribunal a quo respaldou tal entendimento, fundamentalmente, no Processo Administrativo tramitado junto da DGEG e junto aos presentes autos pela mesma entidade em 16.07.2020, bem como pela prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento que contou, desde logo, com os vários funcionários da DGEG que tiveram intervenção no decurso do longo Processo Instrutor suprarreferido.
VIII. A douta sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece censura, quer quanto à decisão proferida sobre a matéria de facto, quer quanto à decisão proferida sobre a matéria de Direito, pelo que, deverá ser negado provimento ao recurso, in totum, tal como melhor se demonstrou supra.
IX. Em suma, a Recorrente interpõe recurso da douta sentença do tribunal a quo, considerando, as 3 (três) premissas que infra se descrevem:
(i) A sua atividade foi estando regularizada ao abrigo de sucessivos diplomas de legalização da laboração ilegal de pedreiras, encontrando-se, à data da DUP, devidamente titulada;
(ii) Considerando-se que estava devidamente titulada, então nunca se poderá concluir pela cessação do contrato de exploração celebrado com o proprietário da Parcela D1427, nos termos e para os devidos efeitos do disposto no artigo 18.º, do Decreto-Lei n.º 270/2001, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro;
(iii) E, assim, sempre se deverá concluir pela sua posição processual de “Interessada”, nos termos do artigo 9.º, do CE, sendo devida a fixação do quantum indemnizatório por força do ato ablativo expropriatório.
X. Ante o exposto, facilmente se perceberá que o thema decidendum crucial dos presentes autos reside em saber se a Y estava devidamente munida do necessário título para o exercício da sua atividade, à data da DUP; ou se foi laborando de forma ilegal e ilícita até (e para além) da data da DUP.
XI. Nesta primeira premissa das suas alegações, a Recorrente alega que esteve licenciada ao abrigo de sucessivos regimes de regularização da sua atividade, nos termos que infra se sumariam:
(i) Em primeiro lugar, a Recorrente alega que esteve inicialmente licenciada ao abrigo do regime previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, sendo que o prazo de um ano nele previsto não era um prazo de caducidade automática, mas antes um prazo dependente simultânea e cumulativamente duma necessária ordem expressa de encerramento da iniciativa da entidade licenciada; pelo que à data da DUP encontrava-se titulada;
(ii) Em segundo lugar, a Recorrente considera ainda que, a caducidade desta Licença Provisória também não operou porque alega que a única condição imposta deixou de ser exigida pela entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 5 de setembro;
(iii) Em terceiro lugar, entende ainda a Recorrente que, não operando a caducidade automática da sua licença de exploração provisória de pedreira (pelas razões supra), o seu processo encontrava-se em estado de “pendente” à data da entrada em vigor de um novo regime de regularização da sua atividade, o Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de novembro (primeiro regime RERAE); o qual lhe foi automaticamente aplicável, não necessitando de nenhum pedido por parte da Recorrente;
(iv) Por fim, em quarto e último lugar, entende ainda a Recorrente que a sua atividade se encontrava devidamente regularizada por em 14.07.2017 ter recorrido a um novo pedido de regularização da sua atividade, ao abrigo do RERAE, na prorrogação concedida pelo artigo 1.º da Lei n.º 21/2016, de 19 de julho (segundo regime RERAE).
XII. Todavia, andou bem o Tribunal a quo ao decidir como decidiu. Isto porque, resultou provado que:
(i) A Recorrente esteve sempre a laborar de forma irregular, exceto durante o período de um ano – entre 25.01.2011 a 25.01.2012 – no qual beneficiou de uma licença de exploração provisória de pedreira que deixou caducar por ter conscientemente incumprido as condições impostas no título por lei;
(ii) A sua licença de exploração provisória de pedreira caducou automaticamente a 25.01.2012, uma vez que não era necessária qualquer notificação por parte da entidade licenciadora, tal como decorria da respetiva licença provisória e da lei;
(iii) Por conseguinte, a atividade da Recorrente não se encontrava devidamente titulada à data da DUP (2015);
(iv) No caso sub judice, em nada releva a entrega do EIA em 2013.09.18, e nem tampouco se poderá concluir que a alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 5 de setembro, na sua redação à data, fez com que a Recorrente deixasse de estar obrigada à entrega do EIA, sob pena de violação do princípio tempus regit actum;
(v) O Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de novembro (primeiro regime RERAE) não foi automaticamente aplicável à situação de laboração ilícita e ilegal da Recorrente, não só o seu procedimento não se encontra em estado de “pendente” à data da sua entrada em vigor, como também sempre seria exigido o necessário impulso procedimental por parte da própria Requerente, ora Recorrente;
(vi) Assim, considerando-se que a Recorrente à data da DUP não estava devidamente titulada, então é mister concluir-se pela cessação do contrato de exploração celebrado com o proprietário da Parcela D1427, nos termos e para os devidos efeitos do disposto no artigo 18.º, do Decreto-Lei n.º 270/2001, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro;
(vii) Ante o exposto, sempre se deverá concluir que a presunção processual de “Interessada” que a Recorrente tinha nos presentes autos expropriativos, ao abrigo do princípio da legitimidade aparente, consagrado no artigo 9.º/3, do CE, foi ilidida negativamente, uma vez que não se provou ser titular de um crédito indemnizatório;
(viii) Pelo que, à Recorrente não lhe é devida a fixação do quantum indemnizatório por força do ato ablativo expropriatório da parcela D1427, por não ser titular de um direito legalmente protegido.
XIII. É neste contexto que, numa derradeira última tentativa de fazer crer que é titular de um direito indemnizatório por força da expropriação da Parcela D1427, que a Recorrente vem interpor recurso da decisão proferida pelo tribunal a quo, impugnando quer a decisão proferida sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, quer a decisão proferida sobre a matéria de Direito.
XIV. A Recorrente pretende apresentar um novo quadro fáctico, em sede de recurso, apresentando incongruências nas redações dos factos que pretende ver aditar, uma vez que a redação dos novos factos provados.
42-A a 67 nas suas conclusões de Recurso, não corresponde à redação que consta no corpo das suas alegações;
XV. Como é sabido, atento o disposto nos artigos 635.º e 639.º, ambos do CPC, são as conclusões que fixam o objeto do recurso, pelo que, o Tribunal ad quem, na apreciação do recurso da matéria de facto, deverá considerar a redação proposta pela Recorrente nas suas Conclusões de Recurso.
XVI. Sem prejuízo do exposto, por mera cautela de patrocínio, a Recorrida, nas suas contra-alegações, na parte atinente à impugnação da decisão da matéria de facto, procurou sempre ter também em linha de conta a redação dos factos a aditar que constam do corpo das alegações da Recorrente.
XVII. Aliás, independente da redação proposta pela Recorrente dos alegados novos factos n.ºs 42-A ao 67, os mesmos nunca poderão ser dados por provados, quer pela prova documental oferecida aos autos, quer pela prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tal como se demonstrou supra.
XVIII. A Recorrente, nas suas alegações, tenta demonstrar como provados, factos que, manifestamente, não resultaram provados, nem da prova documental junta aos autos nem da produção de prova testemunhal.
XIX. A Recorrente baseia-se, fundamentalmente, nos depoimentos prestados pelas testemunhas, por si arroladas e fazendo, praticamente, tábua-rasa da contra instância feita pela ora Recorrida, mais olvidando o depoimento de testemunhas cruciais apresentadas pela Recorrida;
XX. Mais, relativamente ao processo administrativo referente à Pedreira ... e ..., a Recorrente procura toldar o raciocínio deste tribunal ad quem invocando apenas algumas partes do PA que suportariam a sua tese e raciocínio, olvidando a análise global desse mesmo PA que o Tribunal a quo fez.
XXI. Mas mais: a Recorrente pretende que tais conclusões permitam que este Tribunal ad quem conclua pelo seu direito indemnizatório, quando, na verdade, da análise dos factos que se pretendem aditar, bem como dos factos que se pretendem alterar, nunca poderá resultar qualquer outro entendimento que não o julgado pela douta sentença do tribunal a quo.
XXII. Da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento e da prova documental oferecida aos autos, nomeadamente, o PA da Pedreira sub judice tramitado junto da DGEG, nunca poderão resultar como provados os factos que a Recorrente pretende aditar e alterar.
XXIII. Eis as alterações que a Recorrente pretende ver introduzidas nos pontos 58 e 59 do elenco dos factos provados da douta Sentença recorrenda:
(i)Ponto 58 dos factos provados segundo o qual “[a] interessada Y apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento liminar, tendo o mesmo sido rejeitado pelo Secretário de Estado da Energia, Dr. J. G., com notificação disso mesmo à interessada Y, o que determinou o encerramento definitivo da pedreira de ... e .... (fls. 711 e ss, 825, 830 a 842 do proc. adm.)” deverá passar a constar a seguinte redação “[a] interessada Y cessou definitivamente a exploração da pedreira logo que foi tomada de posse administrativa pela X pelo que quando o Secretário de Estado da Energia indeferiu o seu recurso hierárquico já a pedreira estava encerrada definitivamente”;
(ii) Ponto 59 dos factos provados segundo o qual “[a] pedreira possuía licenças para utilização de explosivos, emitidas pela DGEG e PSP”, deverá passar a constar a seguinte redação “[a] pedreira possuiu sempre enquanto laborou licença para a utilização de explosivos autorizadas pele DGEG e emitidas pela PSP”.
XXIV. Todavia, as alterações que a Recorrente pretende ver introduzidas nos pontos 58 e 59 do elenco dos factos provados da douta Sentença recorrenda, não podem proceder, uma vez que:
(i) No que concerne ao ponto 58 dos factos provados, a alteração pretendida em nada releva para os presentes autos, uma vez que bem sabia a Recorrente que este pedido de regularização realizado ao abrigo do segundo regime RERAE, feito já numa altura em que a Recorrente tinha sido validamente notificada da DUP (10.08.2015, cfr. facto provado n.º 3), já não seria possível conseguir licenciar a sua exploração; pelo que, não foi o dia da tomada de posse administrativa que culminou no encerramento da exploração da Pedreira sub judice, mas sim, o facto de já não ser legalmente admissível iniciar um novo pedido de regularização ao abrigo de um segundo regime RERAE após a notificação da DUP à Recorrente.
Tal decorre do depoimento da Testemunha B. S., funcionário da DSAR, na sessão da Audiência de Discussão e Julgamento realizada em 14.12.2021, no minuto 00:53:26 a 00:54:18 (horas, minutos, segundos) e que se encontra gravado através do sistema digital de 09:57:18 a 10:55:24), bem como da Informação n.º 167/DSAR/AM, de 2018.11.29, fls. 830 a 842, do PA;
(ii) No que concerne ao ponto 59 dos factos provados, cabe desde logo observar que a Recorrente nunca concretiza em que medida é que resulta da referida prova documental a alteração pretendida, porquanto, tal factualidade não resulta do teor dos documentos do PA indicados, contrariamente ao que pretende fazer crer a Recorrente, desde logo porque (i) nunca foi feita qualquer prova sobre tais autorizações e licenças entre a celebração do contrato de arrendamento, denominado por contrato de concessão de exploração, a 08.05.2009 e o pedido regularização deferido provisoriamente em 20.01.2011 e bem assim, (ii) além dessa falta de prova necessariamente documental, as únicas testemunhas que mencionam a existência dessas autorizações e licenças (ambas numa relação de dependência da Recorrente) não se debruçam especificamente sobre esse período de tempo; antes apenas respondem que essas autorizações e licenças cessaram aquando da posse administrativa da Parcela D1427.
XXV. Adicionalmente, pretende ainda a Recorrente aditar 14 novos factos ao elenco dos factos provados da douta sentença recorrenda:
(i) Novo Ponto 8-A: “[e]sta pedreira, denominada “dos C.”, tinha uma área de 3,488 ha.”;
(ii) Novo Ponto 42-A: “[à] data da publicação da DUP o procedimento de licenciamento ainda estava pendente”;
(iii) Novo Ponto 47-A: “[a]s notificações não seguiram, pois que a Sra. Subdiretora-Geral ordenou a prévia elaboração de uma informação pelos serviços jurídicos”;
(iv) Novo Ponto 61: “[n]ão havia qualquer obstáculo para o licenciamento da pedreira para além da expropriação da parcela D.1427”;
(v) Novo Ponto 62: “[a]s entidades administrativas licenciadoras entendiam que os sucessivos regimes de regularização permitiam o funcionamento da pedreira”;
(vi) Novo Ponto 63: “[a] entidade licenciadora, primeiro a Direção Regional de Economia do Norte, depois a Direção Geral de Energia e Geologia sempre entenderam que o prazo de um ano previsto no DL 340/2007 não era rígido, pelo que sempre agiram dentro da legalidade na tramitação dos processos de legalização”;
(vii) Novo Ponto 64: “[o] contrato de arrendamento subscrito entre o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e a Y foi executado até à tomada de posse administrativa”;
(viii) Novo Ponto 65: “[n]a área da pedreira expropriada e no raio de 1 km havia para além desta a P60- “Dos C.”, com área total superior a 50.000m2”;
(ix) Novo Ponto 66: “[o] estudo de impacto ambiental (EIA) foi a única condição imposta na autorização provisória e pelo facto da área a licenciar somada com a da pedreira P60 exceder 50.000m2”;
(x) Novo Ponto 67: “[o] estudo de impacto ambiental (EIA) deixou de ser exigível, a partir da publicação do DL. 151-B/2013”;
(xi) Novo Ponto 68: “[o] Plano da pedreira (pano de lavra) tinha de ser apresentado na fase de licenciamento (art.º 27, nº 1, c) do DL 270/2001) sendo que o junto pela apelante e que consta dos autos e do PA cumpre os parâmetros”;
(xii) Novo Ponto 69: “[o] encerramento das pedreiras teria sempre de ser precedido de aprovação pela CCDR-N, entidade responsável pela aprovação do PARP, nos termos do artigo 31.º do DL 270/2001”;
(xiii) Novo Ponto 70: “[n]enhuma outra pedreira, nas mesmas condições da Pedreira do CB. e da Pedreira das C., foi encerrada”;
(xiv) Novo Ponto 71: “[a] Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto só não emitiu uma declaração favorável de interesse público relativamente à pedreira do CB., por causa da expropriação”.
XXVI. Os novos factos que a Recorrente pretende ver aditados, não podem proceder, uma vez que:
(i) No que concerne ao novo ponto 8-A, em nada releva para os presentes autos, uma vez que o objeto do presente litígio não diz respeito à denominada “Pedreira das C.”, cujo processo expropriativo corre os seus termos neste mesmo Tribunal, com o n.º de processo 179/19.8T8CBC, nada mais sendo do que uma manobra dilatória para tentar fazer crer (erradamente) este Tribunal ad quem que a Pedreira ... e ... encontrava-se licenciada à data da DUP, o que não tem respaldo nas folhas do PA, nomeadamente, fls. 133, 180, 183, 208 e 560;
(ii) Relativamente ao novo facto n.º 42-A, o mesmo não se trata de um verdadeiro facto mas sim de um juízo conclusivo pelo que nunca poderá o mesmo aditado à matéria de facto provada. Tal novo facto é insuscetível de ser extraído da prova documental invocada pela Recorrente, uma vez que da análise das várias informações oferecidas aos autos através do PA tramitado junto da DGEG, nomeadamente, (i) a Informação n.º 772/DPN, de 2016.08.25, de fls. 236 a 239,
(ii) a Informação n.º 1096/DPN, de 2016.12.13, e anexos, fls. 244 a 280 e fls. 285, bem como (iii) a Informação n.º 51/BS/DSAR/2018, de 2018.03.21, e respetivos Despachos exarados, de fls. 517 a 526, (iv) e ainda o Informação n.º 167/DSAR/AM, de 2018.11.29, fls. 830 a 842, resulta precisamente o oposto do facto que a Recorrente pretende aditar;
(iii) Quanto ao aditamento do novo facto n.º 47-A, o mesmo não tem qualquer amparo na prova produzida e nas motivações elencadas pela Recorrente. Em concreto, de acordo com as fls. 231 e seguintes e 517 a 526 do PA, bem como do depoimento da testemunha C. P., prestado na sessão da audiência de discussão e julgamento realizada em 14.12.2021, entre o minuto 00:15:22 e 00:17:17 (horas, minutos, segundos) e que se encontra gravado através do sistema digital de 10:59:27 a 12:04:31, não resulta que as notificações não seguiram, porque a Sra. Subdiretora-Geral as considerou intempestivas, ou porque ordenou a prévia elaboração de uma informação pelos serviços jurídicos; mas antes o oposto, uma vez que em audiência nenhuma das testemunhas inquiridas conseguiu explicar qual o motivo que levou a que as notificações para encerramento da Pedreira ... e ... não tenham seguido.
(iv) No que tange ao aditamento do novo facto n.º 61, a sua apreciação fica desde logo prejudicada por ser um verdadeiro juízo conclusivo e ilegítimo à luz da Lei.
Adicionalmente, o meio de prova que motiva a Recorrente a aditar este novo facto reside na circunstância da testemunha P. J. ter referido que “num cenário em que não teria existido DUP a pedreira tinha condições para se ter licenciado”; todavia, tal como bem decidiu o Tribunal a quo, “(…) as considerações (jurídicas) tecidas pelos sobreditos funcionários (sem prejuízo do seu eventual mérito) em nada influem quanto à seleção e ao juízo firmado quanto à factualidade assente”, sendo que da leitura dos concretos trechos desse depoimento não resulta a factualidade que se pretende aditar.
Ademais, tal alegado novo facto também não se extrai da prova documental invocada, desde logo, porque como resulta, nomeadamente, das fls. 367, 508 e 621 do PA, o PDM da Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto encontrava-se suspenso desde 2014, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2014, de 27 de junho32, nunca se tendo demonstrado que tal circunstância não seria um obstáculo ao licenciamento da Pedreira sub judice.
Por fim, ficou ainda demonstrado que não é matéria controvertida nos presentes autos que a publicação da DUP do SET tornou impossível que a Recorrente continuasse as suas tentativas de legalização da exploração da Pedreira sub judice (cfr. ata da audiência de discussão e julgamento, sessão de 16.12.2021, com início ao minuto 11:12:07 e fim ao minuto 11:17:17), sendo a prova testemunhal produzida pela testemunha P. J. referente a esta mesma realidade; o problema da Recorrente reside noutro momento: é que à data da DUP, respeitante à expropriação da Parcela D1427, a Pedreira sub judice não se encontrava devidamente licenciada, tal como ficou demonstrado nomeadamente através da análise das seguintes informações do PA: (i) a informação n.º 1096/DPN, de 2016.12.13, e anexos, fls. 244 a 280 e fls. 285, bem como (ii) a informação n.º 51/BS/DSAR/2018, de 2018.03.21, e respetivos despachos exarados, de fls. 517 a 526, (iii) fls. 700 e ainda a (iv) informação n.º 167/DSAR/AM, de 2018.11.29, fls. 830 a 842.
Por fim, tal aditamento assenta num mero juízo de prognose impossível de fazer ao momento, uma vez que se desconhece se existiam, ou não, outros obstáculos à regularização da Pedreira sub judice, desde logo porque, tal como supra se evidenciou, (i) já em dezembro de 2013 a CCDR-N proponha a desconformidade 32 publicada no Diário da República n.º 122/2014, Série I de 27.06.2014. do EIA sem nunca referir a construção do SET e bem assim (ii) mesmo na tentativa de regularização ao abrigo do segundo regime RERAE de 2017, nunca se chegou a analisar se existia ou não uma possibilidade de regularização, tal como decorre do depoimento prestado pela testemunha B. S., na sessão da audiência de discussão e julgamento realizada em 14.12.2021, entre o minuto 00:15:22 e 00:17:17 (horas, minutos, segundos) e que se encontra gravado através do sistema digital de 09:57:18 a 10:55:24).
(v) Relativamente ao aditamento dos novos factos n.ºs 62 e 63, a Recorrente quer ver aditados dois novos factos conclusivos, pretendendo que sejam fixados como novos factos entendimentos da entidade competente (a DGEG) atinentes ao licenciamento definitivo da pedreira; o que, além de ser profundamente irrelevante para a boa decisão da causa, resulta inclusivamente da prova produzida e carreada para os autos que esses mesmos entendimentos foram posteriormente contrariados pelos próprios juristas da DGEG (nomeadamente, da DSAR) assim que o processo de regularização da pedreira sub judice chegou àquela divisão.
Em concreto, relativamente, tal realidade resulta desde logo das fls. 517 a 529, 700 e 830 a 842, todos do PA, bem como do depoimento prestado pela testemunha B. S., na sessão da audiência de discussão e julgamento realizada em 14.12.2021, entre o minuto 00:07:37 e 00:14:14 (horas, minutos, segundos) e que se encontra gravado através do sistema digital de 09:57:18 a 10:55:24).
Adicionalmente, a própria testemunha J. C. no minuto 00:06:45 ao minuto 00:17:18, da sessão da audiência de discussão e julgamento de 14.12.2021, e que se encontra gravado através do sistema digital de 10:59:27 a 12:04:31 afirmou não ter conhecimento dos pormenores do processo; do mesmo modo, também a testemunha P. J., da sessão da audiência de discussão e julgamento de 14.12.2021e que se encontra gravado através do sistema digital de 14:23:28 a 15:48:55, não soube explicar a este tribunal a total inação da DGEG, que sempre foi conivente com a manutenção da laboração da extração de granito.
(vi) Quanto ao aditamento do novo facto n.º 64, o mesmo não foi objeto de prova nos presentes autos, nomeadamente, no que concerne à execução e cumprimento pelas partes; adicionalmente, da análise da prova documental invocada pela Recorrente (facto provado n.º 9 e a vistoria ad perpetuam rei memoriam) não resulta a factualidade que se pretende aditar, uma vez que apenas é mencionada a ocupação da propriedade (facto provado n.º 9) e que a Recorrente se encontrava a laborar no local (vistoria ad perpetuam rei memoriam), nunca se referindo em concreto à execução ou cumprimento do contrato entre as partes; por fim, cabe ainda realçar que a confusão que a Recorrente pretende criar com a invocação da alegada autorização de utilização de explosivos dada pela DPN (Informação 180/DPN, de 2017.02.01, fls. 294, 295 e 296 do PA), além de tais fls. do PA não corroborarem a factualidade que a Recorrente pretende aditar, as mesmas são posteriormente contrariadas pela análise das fls. 532, 587, 589 e 590, do PA, nas quais se explica que tais autorizações decorrerem de um crasso erro de análise dos pressupostos de facto e de direito em que a DGEG incorreu e que assim que se apercebeu, rapidamente mandou cancelar.
(vii) No que tange ao aditamento dos novos factos n.ºs 65, 66 e 67, não se compreende a relevância do aditamento destes três novos factos para a análise de direito levada a cabo pela Tribunal a quo, uma vez que nenhuma destas circunstâncias relevou para a boa decisão da causa, nem tampouco foi objeto de prova ao longo do processo, apenas servindo à Recorrente para criar as condições perfeitas para alegar que se encontrava licenciada à data da DUP.
Ademais, além de configurarem verdadeiros juízos conclusivos de Direito, os concretos meios probatórios invocados pela Recorrente não são aptos a provar a factualidade que esta pretende aditar. Em concreto, o novo facto n.º 65 é contrariado pelas fls. 47, 61 e 62, do PA; o novo facto n.º 66 é contrariado pelas fls. 63, 64, 66 e 69, do PA e pelo facto provado n.º 29; e o novo facto n.º 67 (além de ser um verdadeiro juízo conclusivo proibido) é contrariado pelas fls. 236 a 239 e 517 a 586, do PA.
(viii) No que concerne ao novo facto n.º 68, sempre se dirá que, além de configurar um puro juízo de direito, apenas ficou demonstrado nos autos que o plano de lavra foi apresentado (cfr. fls. 416 a 479, do PA), mas nunca se demonstrou que tal plano foi analisado nem tampouco aprovado, sendo o próprio depoimento prestado pela testemunha P. J., na sessão da audiência de discussão e julgamento realizada em 14.12.2021, no minuto 00:38:23 e seguintes (horas, minutos, segundos) e que se encontra gravado através do sistema digital de 14:23:28 a 15:48:55), demonstrativo de tal falta de analise e aprovação, nada mais dizendo ao Tribunal do que considerações próprias, profundamente subjetivas e infundadas. Por fim, também os factos provados n.º 17 e 18 não conseguem provar a factualidade que a Recorrente pretende aditar.
(ix) Quanto ao novo facto n.º 69, estamos perante um verdadeiro juízo de Direito e não de facto; ademais tal raciocínio é ainda contrariado pela fl. 69 do PA e pelo facto provado n.º 29, o qual não foi posto em causa pela Recorrente, uma vez que aquilo que a Recorrente pretende ao aditar este novo facto nada mais é do que criar as condições para adiante alegar que a sua licença provisória não se encontrava caducada por falta de notificação da DGEG para o encerramento da pedreira.
(x) No que concerne ao novo facto n.º 70, sempre se concluirá que o aditamento deste novo facto mostra-se inviabilizado, não só porque tal novo facto nunca foi objeto de prova nos presentes autos, mas também porque nada mais é do que um verdadeiro juízo conclusivo, sem qualquer amparo no PA.
(xi) Por fim, relativamente ao novo facto n.º 71, decorre das fls. 367, 508 e 621 do PA que, não foi devido à expropriação da Parcela D1427 (que teve início com a publicação da DUP em julho de 2015) que o Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto não deu início ao processo de reconhecimento de interesse público municipal da pedreira em crise nos presentes autos, mas antes pelo facto do seu Plano Direto Municipal em vigor se encontrar parcialmente suspenso por Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2014, de 27 de junho; ademais, a própria testemunha F. L., Presidente da Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto (depoimento gravado no dia 16.12.2021, nomeadamente entre o minuto 02:00 e o minuto 05:51, gravado com início ao minuto 15:23:16 a 15:30:11) afirmou que o pedido de reconhecimento de interesse público municipal da pedreira em crise nos presentes autos era datado de 2014, mais concretamente, datado de 26.09.2014, i.e., muito tempo antes da DUP publicada em julho de 2015.
XXVII. Ante o exposto, entende a Recorrida que a douta sentença proferida pelo tribunal a quo não merece censura, devendo toda a decisão proferida sobre a matéria de facto, ser integralmente mantida e, por conseguinte, ser negado provimento ao recurso da Recorrente in totum.
XXVIII. A Recorrente imputa à sentença do tribunal a quo erro de julgamento por violação de lei substantiva.
XXIX. Todavia, como se demonstrou supra, a argumentação da Recorrente padece de gravíssimos equívocos e revela-se por isso incapaz de infirmar minimamente o discurso fundamentador, claro e convincente, do Mmo. Juiz.
XXX. A argumentação da Recorrente padece de gravíssimos erros e equívocos, revelando-se por isso incapaz de infirmar minimamente o discurso fundamentador, claro convincente, do Mmo. Juiz do Tribunal a quo.
XXXI. O processo expropriatório tem por finalidade responder a duas questões sequenciais essenciais: (i) Os Expropriados e aparentes Interessados no processo tinham direitos constituídos à data da declaração de utilidade pública DUP?; e (apenas se a resposta for afirmativa), (ii) Qual o valor desses direitos?
XXXII. Ora, naturalmente, se a resposta à primeira questão for negativa, não existe indemnização a atribuir, pelo que não se passa à análise da segunda questão.
XXXIII. De modo a responder a cada uma das sobreditas questões é necessário ter presente duas ideias fundamentais, e que se afiguram como os critérios constitucional e legalmente previstos para o efeito:
(i) A data relevante para apreciação da factualidade é a da notificação da DUP a cada um dos Expropriados/aparentes Interessados, pois só aí produz efeitos quanto a estes, e
(ii) O valor normativo de mercado que os direitos expropriados tivessem à data relevante atrás referida que, assim balizado, corresponderá à justa indemnização.
XXXIV. Após análise de toda a prova documental, nomeadamente, a análise cronológica dos acontecimento supra sumariada e bem assim, da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, não resta outra conclusão se não a de reconhecer que a aparente Interessada Y, ora Recorrente, não conseguiu demonstrar que tivesse qualquer tipo de direito à data da DUP afetado pela expropriação, muito menos que tal pretenso direito fosse indemnizável em consequência da expropriação;
XXXV. Não tendo conseguido ilidir positivamente a presunção do artigo 9.º/3, do CE, que consagra o princípio da legitimidade aparente no processo expropriatório, e que lhe foi aplicável ao longo de todo o procedimento de expropriação.
XXXVI. Por conseguinte, é imperativo concluir que não lhe assiste qualquer direito indemnizatório por força da Expropriação da Parcela D1427, tal como doutamente julgou o Tribunal a quo.
XXXVII. Alega a Recorrente que a sentença enferma de nulidade porque, “[d]esde logo porque constitui verdadeira decisão surpresa”, na medida em que entende que “[f]omos considerados parte legítima nos autos ao abrigo do nº 1 do artigo 9.º do Código das Expropriações e, não pela presunção do n.º 3”.
XXXVIII. E neste contexto, alega ainda que “[a] sentença, na parte decisória, é contraditória com a fundamentação, pois omite a ilegitimidade e, limita-se a julgar improcedente, sem mais, o nosso recurso, não se referindo á [sic] ilegitimidade” e “[a]inda em contradição com a fundamentação, na decisão refere-se a nós como interessados quando nos considera não interessada por ausência de contrato na estrutura fundamentadora”.
XXXIX. Tais alegações são manifestamente improcedentes, uma vez que a sentença não enferme de nulidades, não só porque não constitui uma “decisão surpresa”, como também a sua fundamentação não se encontra em contradição com a sua decisão, tal como se passará a explicar.
XL. Em primeiro lugar, a Recorrente se limita a tecer considerações aleatórias sobre alegadas nulidades de que enfermaria a douta sentença do Tribunal a quo, se nunca mencionar as especificas normas legais alegadamente violadas pela douta sentença;
XLI. I.e., a Recorrente, alega apenas que terá sido confrontada com uma “decisão-surpresa” e que a mesma decisão se encontra em contradição com a respetiva fundamentação, mas nunca cumpre o ónus que sobre si impende de mencionar as concretas normas jurídico-processuais que, supostamente, ter sido violadas, nem tão-pouco refere a disposição legal para a invocada nulidade.
XLII. Em segundo lugar, no processo expropriativo, podendo existir mais titulares de um crédito indemnizatório além dos Expropriados, os aparentes Interessados (como é o caso da Y, ora Recorrente) podem sempre intervir no processo expropriatório ao abrigo do princípio da legitimidade aparente consagrado no artigo 9.º/3, do CE.
XLIII. É através deste princípio que podem intervir no processo expropriativo todos aqueles que não sendo expropriados possam ter a possibilidade processual de demonstrar perante o Tribunal (Arbitral e/ou Judicial) que são titulares de um crédito indemnizatório, através da sua intervenção na qualidade de aparentes Interessados.
XLIV. Segundo os ensinamentos de JOSÉ OSVALDO GOMES, ao vigorar no processo administrativo o princípio da legitimidade aparente “não é exigível uma averiguação exaustiva dos titulares dos imóveis expropriados, sob pena de se tornar impossível a concretização em certos casos das expropriações”.
Pelo que “a Expropriante pode dirigir-se às entidades constantes das respetivas inscrições prediais e fiscais (v. artigos 9.º, n.º 3, 36.º, n.º 4 e 40.º, do CE 91), mesmo que estas não sejam as verdadeiras e atuais titulares dos direitos que incidem sobre o imóvel a expropriar”.
XLV. Ou seja, são chamados ao processo expropriativo todos aqueles que aparentam possuir direitos sobre o bem expropriado, mas tal é diferente de se fazer prima facie definitivamente um juízo sobre a titularidade de créditos indemnizatórios.
XLVI. Tal como nos ensina SALVADOR DA COSTA, “[e]ste normativo consagra o princípio In Expropriações por Utilidade Pública, Texto Editora, Lisboa 1997, 1.ª edição, p. 319.34 Idem, p. 371.
chamado da legitimidade substantiva aparente, porque atribui legitimidade para intervirem no processo de expropriação às pessoas em relação às quais não há a garantia absoluta de que, face aos factos disponíveis e ao direito, sejam os verdadeiros titulares dos bens e direitos em curso de expropriação”.
XLVII. É, aliás, por esse motivo que, nos termos do artigo 9.º/3, do CE, a Y, ora Recorrente, foi notificada da DUP, e demais desenvolvimentos do processo expropriativo referente à Parcela D1427;
XLVIII. Como nos ensinam ANA ISABEL PACHECO e LUÍS ALVAREZ BARBOSA, “[n]devem confundir-se “interessados” com “titulares do crédito indemnizatório”. Interessados são todos aqueles que “aparentem” possuir direitos sobre o bem expropriado; titulares do crédito indemnizatório são todos os “interessados” que efetivamente demonstrem possuir tais direitos perante a Expropriante ou perante o Tribunal, consoante o caso”36 (destacados originais).
XLIX. “Daí que possa suceder – como muitas vezes sucede – que determinada pessoa (singular ou coletiva) inicialmente dada como “interessada”, afinal não o seja”37.
L. Ante o exposto, a ilação negativa de Interessada da Recorrente, nos termos do princípio da legitimidade substantiva aparente (artigo 9.º, CE) nada tem que ver com a retirada de legitimidade processual da Recorrente (artigo 40.º, CE).
LI. É que, se não há dúvidas quanto à legitimidade processual da Recorrente para intervir nos presentes autos, o mesmo já não se poderá dizer quanto à questão de saber se a mesma é titular de um direito constituído à data da emissão da DUP e, consequentemente, titular de um direito indemnizatório para efeitos do disposto no - In Código das Expropriações e Estatutos dos Peritos Avaliadores, Anotados e Comentados, Almedina,2010, p. 65. 36 In Código das Expropriações, Anotado e Comentado, Almedina, 2013, pp. 52 e 53. 37 Idem. artigo 9.º, do CE.
LII. Ora, “[d]e acordo com as regras do ónus da prova, quem invoca um direito cabe o ónus da prova dos seus factos constitutivos (artigo 342.º/1, do CC), pelo que, salvo em caso de presunção derivada do registo, incumbe ao interessado alegar e provar os factos que permitam concluir pela existência e titularidade dos direitos que invoca”38.
LIII. Acontece que a Recorrente, contrariamente ao por si alegado, não conseguiu demonstrar nos presente autos ser titular direitos constituídos à data da DUP e, assim, ilidir positivamente perante o Tribunal a quo a presunção de aparente Interessada.
LIV. Com efeito, a circunstância de a Recorrente assumir nos autos a qualidade de “Interessada” – quer ao longo do processo, quer na própria sentença a quo –, tal estatuto tem de ser sempre interpretado à luz do princípio geral de direito das expropriações, que estabelece o princípio da legitimidade aparente (artigo 9.º/3 do Código das Expropriações), meramente prima facie e que de modo algum se pode substituir à decisão final a tomar pelo Juiz responsável pelo processo no âmbito no mesmo.
LV. Ora, o Tribunal a quo concluiu e bem, no final da sua fundamentação, que “[p]or todo o exposto, se conclui que não deverá ser atribuída à interessada Y – Indústria e Granito, Lda. uma indemnização, afastando-se a presunção ínsita no artigo 9.º, n.º 3 do Código das Expropriações, encontrando-se prejudicada a necessidade apreciação e fixação do quantum indemnizatório que lhe deveria ser atribuído”;
LVI. Ora, salvo melhor opinião, não merece qualquer censura a douta Sentença 38 Idem.
LVII. Com efeito, a sentença é o momento processualmente próprio para decidir se a Recorrente deveria ou não ser considerada uma “Interessada” para efeitos de determinação dos seus direitos legalmente protegidos à data da DUP.
LVIII. Ora, o Tribunal a quo apenas poderia decidir sobre o estatuto de “Interessada” da Recorrente, para efeitos de posterior fixação do quantum indemnizatório, após toda a produção de prova no âmbito do processo e se daí tivesse resultado que Recorrente era, efetivamente, titular de um direito indemnizatório, para efeitos do disposto no artigo 9.º/3, do CE.
LIX. A Recorrente confunde o conceito de legitimidade processual, com o conceito de Interessada do referido artigo 9.º do CE.
LX. Todavia, a circunstância de o Tribunal a quo denominar a Y de Interessada não faz com que, nas palavras da Recorrente, tal qualificação processual esteja em contradição com a fundamentação e decisão recorrida, nem que daí resulte a apontada nulidade da sentença.
LXI. Ora, o raciocínio do Tribunal a quo foi claro, tendo assentado em 3 (três) premissas que infra se descrevem:
(i) A atividade desenvolvida pela Y não estava devidamente licenciada à data da DUP;
(ii) Assim, o contrato de exploração celebrado com o proprietário da Parcela D1427 já tinha cessado, nos termos e para os devidos efeitos do disposto no artigo 18.º, do Decreto-Lei 270/2001, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro;
(iii) Pelo que, nunca se poderia concluir pela sua posição processual de “Interessada”, por não se subsumir à norma prevista no artigo 9.º/1, do CE, segundo o qual “[p]ara os fins deste Código, consideram-se interessados, além do expropriado, os titulares de qualquer direito real ou ónus sobre o bem a expropriar e os arrendatários de prédios rústicos ou urbanos”.
LXII. Assim, não sendo a Recorrente juridicamente titular de um direito sobre o bem a expropriar, não era também, juridicamente, uma Interessada, para os efeitos do disposto no artigo 9.º/1, do CE.
LXIII. Dizendo de outra forma: ainda que, aparentemente, à data da DUP, a Recorrente aparentasse possuir um direito sobre a Parcela D1427 (por estar a explorar a Pedreira ... e ...), no final do processo expropriativo o Tribunal a quo decidiu (e bem) que a Recorrente não tinha um efetivo direito sobre essa Parcela (porque estava a explorar a Pedreira sem o necessário Título Habilitante à data da DUP); assim, não era uma Interessada para efeitos do artigo 9.º, do CE.
LXIV. Ante o exposto, dúvidas não restam quanto à inexistência de qualquer contradição entre a fundamentação da sentença e a respetiva decisão.
LXV. Em terceiro lugar, é descabida e falsa a alegação da Recorrente quando afirma que esta questão da ilegitimidade surgiu como uma “decisão-surpresa”, pelo facto de não ter tido oportunidade de se pronunciar sobre a mesma ao longo do processo.
LXVI. Desde logo, a Recorrente teve a oportunidade processual de pronunciar-se sobre esta posição processual nos presentes autos de expropriação em sede de resposta ao recurso da decisão arbitral da entidade expropriante.
LXVII. Com efeito, em sede de recurso da decisão arbitral interposto pela ora Recorrida, esta referiu que “[d]eve ser dada a presunção do artigo 9.º, n.º 3, do CE como ilidida, não se reconhecendo à Y direito a indemnização” – cfr. § 123 do Recurso da Decisão Arbitral da Entidade Expropriante.
LXVIII. Ademais, ao longo de todo o processo foram vários os momentos processuais em que esta questão foi discutida, sendo esta aliás uma questão cerne e fundamental do processo, bem como uma das questões aí a decidir, conforme é expressamente referido e assinalado na sentença recorrida.
LXIX. Pelo que, (i) tendo a Recorrente tido várias oportunidades processuais para se pronunciar sobre esta posição processual de presumível Interessada nos termos do artigo 9.º/3, do CE; e (ii) tendo deliberada e conscientemente decidido nunca se pronunciar sobre essa matéria, então não pode agora vir invocar a aludida nulidade.
LXX. Mais cabe referir, por ser manifestamente falso, que o douto Tribunal a quo se tenha abstido de conhecer do mérito dos recursos da decisão arbitral.
LXXI. Conforme se poderá constatar da leitura da sentença recorrida, o Tribunal a quo, na parte da fundamentação de direito, conheceu não só da dita indemnização a atribuir ao expropriado Conselho Diretivo de M. e R., como também do direito indemnizatório da ora Recorrente.
LXXII. Em suma, deverá ser julgado improcedente tudo o que foi alegado pela Recorrente, no que tange às supostas nulidades apontadas à douta sentença recorrida.
LXXIII. Entende a Recorrente que a sua atividade foi estando regularizada ao abrigo de sucessivos diplomas de legalização da laboração ilegal de pedreiras, encontrando-se à data da DUP devidamente titulada;
LXXIV. Todavia, à data da DUP a Recorrente não detinha o necessário título habilitante, que lhe permitia exercer a atividade de exploração de pedreiras, designadamente uma licença de exploração definitiva de pedreira ou uma licença provisória não caducada.
LXXV. Com efeito, desde 2012, data em que o referido título provisório caducou, que a Recorrente exerceu a sua atividade de forma irregular e não titulada, sendo totalmente improcedente e desprovida de suporte a alegação de que a dita atividade estaria a ser desenvolvida a coberto de sucessivos regimes de regularização.
LXXVI. Quanto à primeira tentativa de regularização da Recorrente concluiu-se que operou a caducidade automática da sua licença de exploração provisória da pedreira em 25.01.2012.
LXXVII. Bem andou o Tribunal a quo, ao julgar que “decorrido o prazo fixado, a Y, ora Recorrente, não procedeu ao cumprimento das condições impostas pela Administração Pública aquando da atribuição da licença provisória, (…) cumpre apreciar as repercussões de tal circunstancialismo, atento o regime legal instituído”.
LXXVIII. Dispunha o artigo 5.º/1 do Decreto-Lei n.º 340/2007 que “[n]o prazo de seis meses a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei, os exploradores de pedreiras não tituladas por licença devem solicitar à entidade licenciadora a adaptação das respetivas explorações às exigências do presente diploma”.
LXXIX. Em 14.04.2008, de modo a que a sua situação ilícita e ilegal fosse regularizada, a Y iniciou um procedimento administrativo de regularização da pedreira ao abrigo do artigo 5.º/1, do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, na redação à data – cfr. fl. 246 do PA, bem como facto 24 dos factos provados da sentença do tribunal a quo.
LXXX. Em 20.01.2011, após decisão favorável condicionada do seu pedido de regularização, através do despacho do Senhor Direto Regional, a Y obteve a sua primeira e única licença provisória, a qual seria válida somente pelo período de um ano, e mais consignando que deveriam ser cumpridas as condições propostas pelo grupo de trabalho nomeadamente a apresentação de um EIA sob pena de a situação nela titulada não se tornar definitiva; tudo nos termos do disposto nos n.ºs 8 e 10, 11 e 12, do artigo 5.º, do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, na redação à data.
LXXXI. Assim, e se de facto pretendia obter uma situação jus-administrativa definitiva, com esta licença provisória a Recorrente estava obrigada a cumprir, no prazo de um ano (i.e., 25.01.2012), as condições definidas pelo grupo de trabalho, nomeadamente, a apresentação do EIA.
LXXXII. Expressamente, o § 5 da Licença Provisória dispunha que: “[c]aso o proprietário da exploração não cumpra o proposto pelo grupo de trabalho dentro dos prazos concedidos deverá proceder ao encerramento do sítio de acordo com as condições previstas nos n.ºs. 11 e 12 do artigo 5.º do D.L. 340/2007 de 12 de outubro” (destacados nossos).
LXXXIII. Dispunha o artigo 5.º, do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, nos seus n.ºs 10, 11 e 12, o seguinte:
(i) N.º 10: “Até que seja emitida a licença prevista no n.º 8, é permitida a exploração da pedreira a título provisório, pelo prazo de um ano a contar da notificação da decisão favorável condicionada, findo o qual, não se verificando a compatibilização referida no número anterior, a entidade licenciadora notifica o proprietário da exploração para o encerramento do sítio nos termos dos números seguintes”;
(ii) N.º 11: “Se o grupo de trabalho emitir uma decisão desfavorável ao pedido de regularização da pedreira, a entidade licenciadora, mediante decisão fundamentada que atenda à dimensão da exploração e ao tipo de intervenções a efetuar para o seu encerramento e recuperação, define um prazo para o encerramento do sítio, a fixar entre um mínimo de 6 e um máximo de 18 meses, e estabelece as condições técnicas de exploração e recuperação que o proprietário da exploração tem de cumprir até ao termo do prazo fixado, devendo nesse período ser efetuado acompanhamento que verifique o cumprimento do estabelecido”.
(iii) N.º 12: “O não cumprimento das condições referidas no número anterior finalização dos trabalhos de recuperação e fecho do sítio”.
LXXXIV. O regime dos n.ºs 10, 11 e 12, artigo 5.º, do Decreto-Lei n.º 340/2007, na sua redação à data, transposto para a licença provisória, pode ser resumido em duas partes:
(i) Uma primeira parte segundo a qual as Pedreiras que pedissem a regularização ao abrigo deste regime poderiam laborar a título provisório, pelo prazo de um ano a contar da notificação da decisão favorável condicionada, perdendo automaticamente a permissão da laboração a partir dessa data, caso não cumprissem as condições constantes da licença favorável condicionada (i.e., da licença provisória) (1.ª parte do artigo 5.º/10); e
(ii) Uma segunda parte segundo a qual, verificando-se essa caducidade automática da licença provisória, então a DGEG teria de comunicar ao proprietário da exploração o prazo para o encerramento do sítio e estabelecer as condições técnicas de exploração e recuperação que o proprietário da exploração teria de cumprir para concretizar o encerramento determinado no título (2.ª parte do artigo 5.º/10, e n.ºs 11 e 12).
LXXXV. Ora, este regime, que se divide em duas partes, foi transposto para a licença provisória de forma clara: “[c]aso o proprietário da exploração não cumpra o proposto pelo grupo de trabalho dentro dos prazos concedidos deverá proceder ao encerramento do sítio de acordo com as condições previstas nos n.ºs. 11 e 12 do artigo 5.º do D.L. 340/2007 de 12 de outubro” (destacados nossos) – cfr. fl. 69 do PA e facto provado n.º 29 da sentença do tribunal a quo.
LXXXVI. Tal como bem concluiu o tribunal a quo, “cotejada a matéria de facto assente e conciliando a mesma com o regime legal vindo de expor, constata-se que a interessada apenas beneficiou de uma licença provisória que lhe foi atribuída em conformidade com o disposto no artigo 5.º, n.º 10 do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, pois que mereceu a decisão favorável do grupo de trabalho ainda que condicionada e, consequentemente, precária, dispondo a exploradora de um ano, após a notificação da licença emitida, para cumprir as condições que lhe foram impostas, nomeadamente a apresentação de estudo de impacte ambiental” (destacados nossos).
LXXXVII. Ora, acontece que, no caso sub judice:
(i) Em 25.01.2012, decorrido um ano após a notificação da decisão favorável condicionada do pedido de regularização da pedreira sub judice, a Y não tinha cumprido as condições impostas na licença provisória, nomeadamente, mas sem restringir, a apresentação do EIA;
(ii) O qual só foi entregue, de forma intempestiva, em 2013.09.18, isto é, muito para além do prazo de um ano supra referido, bem como da janela de regularização de seis meses prevista no diploma;
(iii) Tendo a CCDR-N em 15.01.2015, declarado em definitivo a desconformidade do EIA, decisão que foi validamente notificada à ora Recorrente em 19.01.2015;
LXXXVIII. O prazo de um ano previsto no título terminou e a Recorrente não logrou, nesse prazo, dar cumprimento às condições previstas na licença provisória e no relatório do grupo de trabalho que emitiu a licença provisória, nem deu cumprimento à determinação de encerramento contida, ab initio, no respetivo título precário, num cenário de incumprimento ou cumprimento extemporâneo dessas determinações.
LXXXIX. De facto, a circunstância da DGEG não ter notificado atempadamente a Recorrente para proceder ao encerramento da pedreira, não afasta a consequência jurídica prevista na 1.ª parte do artigo 5.º/10; tal seja, a verificação da caducidade automática, por decurso do tempo, da licença provisória concedida à ora Recorrente para regularizar a sua atividade.
XC. Com efeito, a notificação de encerramento por parte da DGEG não é mais do que um ato complementar das determinações expressamente decorrentes da Lei e do próprio título, não conferindo tal facto o direito da Recorrente continuar a laborar com um título caducado!
XCI. Por outras palavras, pode até a Recorrente entender que não sabia como proceder ao encerramento da sua atividade por falta de notificação, mas o que não pode afirmar é que, transcorrida a caducidade determinada pelo n.º 10 do artigo 5.º, tinha o direito de prosseguir com a exploração após a caducidade do título.
XCII. Passe a expressão e fique a ideia: a Pedreira não passou a laborar com título habilitante, pelo simples facto de não lhe terem sido comunicadas as especificas condições em que deveria ser concretizado encerramento;
XCIII. Que, refira-se, nunca foram cumpridas, pois a Recorrente abandonou o local sem nunca ter procedido ao encerramento da exploração, nomeadamente à sua recuperação paisagística, situação que resultou agravada pelo facto de não existirem quaisquer garantias a favor do Estado, para garantir o cumprimento das obrigações derivadas de uma licença de exploração definitiva.
XCIV. Só o Título confere o direito que a recorrente se arroga ter sem título! Também só o título consolida o elenco de direitos e obrigações a que está adstrito o explorador, nomeadamente a prestação de garantias a favor do Estado, a aprovação de um plano de lavra e de recuperação paisagística. Nada disto existia, sendo que ora Recorrente retirou, ilegitimamente, durante todos estes anos em que laborou sem título habilitante, vantagens patrimoniais decorrentes da exploração da pedreira, se arcar com as obrigações inerentes ao exercício dessa atividade, quando devidamente licenciada.
XCV. O domínio típico do instituto da caducidade é precisamente o dos direitos ou faculdades que necessitam de exercício perentório, dentro de determinado prazo, de tal modo que passado esse prazo, o direito ou ação extinguem-se, i.e., quando o particular deixa terminar o prazo perentório de que dispunha para exercer um determinado direito, essa caducidade opera automaticamente (ope legis).
XCVI. No direito administrativo, tal como no direito civil, a regra é a caducidade operar de forma automática e direta “por haver decorrido o tempo previsto para a produção dos seus [do ato administrativo] efeitos (caducidade)”.
XCVII. A lei ao determinar a caducidade por decurso do tempo pretende assegurar que, por razões de certeza, o direito ou a faculdade não podem ser exercidos para além do prazo fixado, sob pena de se operar a caducidade automática do ato administrativo.
XCVIII. Ora, no caso sub judice, a Recorrente deixou passar, de forma deliberada e consciente, o prazo perentório de um ano para cumprimento das condições apostas no título.
XCIX. Conforme é bom de ver, a factualidade que determina a caducidade é objetiva e qualquer pronúncia administrativa sobre ela em nada poderia influir: o EIA foi apresentando pela Recorrente de forma manifestamente intempestiva, i.e., bem depois do prazo limite de 25.01.2022 que a Licença Provisória concedia.
C. É que parece por demais claro que, quer do regime do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, quer do corpo da Licença Provisória, não estarmos perante uma sanção por incumprimento, a qual daria lugar a apreciações valorativas da Administração e ao uso do seu poder discricionário para verdadeiramente decidir se seria ou não oportuno extinguir o ato.
39 MARCELLO CAETANO, In Manual de Direito Administrativo, I, 10.ª ed., Coimbra, Almedina, 1980, p. 530. No mesmo sentido, MARIA FERNANDA MAÇÃS, “A caducidade no direito administrativo: breves considerações”, in AAVV, Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, II, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 163.
CI. É que da análise do regime aplicável, bem como da Licença Provisória, não resulta que o Legislador tenha deixado na discricionariedade da DGEG decidir ou não decidir sobre caducidade da Licença Provisória, após uma análise casuística;
CII. Como bem refere o Tribunal ao quo na fundamentação de direito da douta sentença recorrida, o prazo de caducidade imposto no caso sub judice não carecia de um ato administrativo que aferisse de tal realidade.
CIII. Com efeito, do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, na redação à data, bem como no respetivo título provisório, resulta claro que a Licença Provisória apenas tinha a duração de um ano, findo o qual, não se verificando o cumprimento das condições impostas no título, deveria a ora Recorrente ter procedido ao encerramento da Pedreira ou, pelo menos, abster-se de prosseguir a atividade aí desenvolvida.
CIV. Aliás, como bem salienta a douta sentença recorrida, quando o legislador pretendeu sujeitar os efeitos dessa caducidade a um ulterior por parte da Administração, determinou-o expressamente.
CV. Como bem se refere na douta sentença recorrida, “[n]o prazo de caducidade imposto pelo artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 270/2001, de 6 de outubro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, no qual o Legislador pretendeu contemplar, expressamente, uma declaração de caducidade que tem subjacente a necessária aferição do circunstancialismo subsumível a qualquer uma das hipóteses elencadas no seu n.º 1.”
CVI. Com efeito, a circunstância do título remeter as condições de encerramento da exploração para o procedimento dos n.º s 11 e 12 do artigo 5.º do D.L. n.º 340/2007, de 12 de outubro, na redação à data, em nada influí nos efeitos da caducidade operada ope legis a 25.01.2012.
CVII. Assim, à data da DUP a Recorrente não se encontrava munida do necessário Título Habilitante para a exploração da Pedreira sub judice; pelo que não tinha um direito constituído à data da DUP, uma vez que se encontrava a laborar ilegal e ilicitamente, contrariamente ao alegado pela Recorrente nos §62 ao §71.
CVIII. Ainda que se entenda que a caducidade não operou de forma automática em 25.01.2012 – o que não se concede e apenas por mero dever de patrocínio se equaciona – sempre caberá recordar que a ora Recorrente apresentou um EIA em 18.09.2013, que foi declarado desconforme em 15.01.2015 pela CCDR-N, tendo a ora Recorrente sido notificada desta decisão em 19.01.2015, não tendo atempadamente reagido contra este ato, pelo que a dita decisão se consolidou na ordem jurídica.
CIX. Mais se assinale que essa mesma CCDR-N solicitou informação à DRE-N, em 14.11.2013, sobre a necessidade de submeter o licenciamento da pedreira a procedimento de AIA, tendo esta última informado a CCDR-N, que atendendo ao facto de o pedido de regularização ter sido apresentado em data anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei. n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, bem como ter sido emitida a licença provisória em data anterior à entrada em vigor do referido diploma, então, segundo o princípio tempus regit actum, teria de se aplicar ao procedimento a lei vigente à data da apresentação do pedido.
CX. Certo é que a ora Recorrente conformou-se com a decisão da CCDR-N, quanto à necessidade de entrega do EIA, pelo que não pode agora vir invocar a aplicação retroativa do Decreto-lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro.
CXI. Assim sendo, definitivamente se conclui que, (i) a Recorrente deveria ter procedido ao encerramento da Pedreira logo em 25.01.2012, e que (ii) à data da DUP (publicada em Diário da República através do Despacho n.º 8082/2015, de 23 de julho, a 23.07.2015 e validamente notificada à ora Recorrente em 10.08.2015), a Recorrente não tinha qualquer direito constituído e, consequentemente, não é titular de qualquer direito indemnizatório derivado da expropriação.
CXII. No seu recurso veio a Recorrente alegar que com aprovação do Decreto-Lei n.º 151- B/2013, que veio estabelecer o novo regime jurídico de Avaliação de Impacte Ambiental, operou-se (digamos) uma “retroatividade in melius” à sua situação concreta e que, assim sendo, já não estaria obrigada a proceder à entrega do EIA; pelo que, este novo diploma teria “removido ope legis” o único obstáculo que impedia a Y de conseguir a convolação da sua licença provisória, numa licença definitiva.
CXIII. E assim conclui que não se operou qualquer caducidade da licença provisória que detinha.
CXIV. Tal como bem julgou o Tribunal a quo “a circunstância do estudo de impacte ambiental ser ou não mais necessário à luz do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, não poderá, salvo melhor entendimento, acarretar o renascimento de um prazo que já se encontrava extinto”.
CXV. Isto porque, segundo o princípio geral tempus regit actum, o qual constitui a regra geral de aplicação das leis no tempo, a lei nova é de aplicação imediata aos novos acontecimento do mundo social e tem ínsito o princípio da não retroatividade, sendo certo que a “[a]plicação imediata não significa aplicação retroativa”, sob pena de claramente se violarem os valores e princípios da proteção da confiança, da boa-fé e da segurança jurídica que devem nortear e pautar um Estado de Direito democrático.
CXVI. Pelo que, tendo a dita Licença Provisória sido notificada à Recorrente em 25.01.2011 e sendo exigido, nessa data, a apresentação de um EIA, então a aferição da legalidade da atuação administrativa terá de ser necessariamente aferida à luz das leis aplicáveis à data em que o respetivo ato foi praticado e não leis posteriores à prática do mesmo ato.
CXVII. Note-se ainda que o Decreto-Lei n.º 151-B/2013 não tem, nem poderia ter, qualquer disposição transitória que determinasse a sua aplicação a atos anterior à sua vigência, por força do princípio da não retroatividade das leis.
CXVIII. Ademais, sendo pacífico que o regime extraordinário de regularização do Decreto Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, apenas era possível “[n]o prazo de seis meses a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei” (cfr. artigo 5.º/1), então à data da alteração legislativa do RJAIA (31.10.2013) já não era possível à Recorrente requerer novamente a regularização da sua Pedreira, porque a janela de regularização já se havia “fechado”.
CXIX. Em suma, à data da DUP (publicada em Diário da República através do Despacho n.º 8082/2015, de 23 de julho, a 23.07.2015 e validamente notificada à ora Recorrente em 10.08.2015), a Recorrente não tinha qualquer direito constituído e, consequentemente, não é titular de qualquer direito indemnizatório derivado da expropriação.
CXX. Não bastando já a Recorrente ter deixado caducar a licença provisória, por falta de cumprimento das condições aí estabelecidas, por exclusiva incúria e negligência sua, veio ainda tentar socorrer-se de um procedimento de regularização no âmbito d qual não teve qualquer impulso ou iniciativa, isto é, onde nada fez ou requereu.
CXXI. Nas suas alegações, a Recorrente alega que o Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de novembro (primeiro regime RERAE) se aplicaria automaticamente sem necessidade de qualquer impulso procedimental por parte da Recorrente, uma vez que o seu procedimento de licenciamento ainda se encontraria em estado de “pendente” à data da sua entrada em vigor (02.01.2015); pelo que à data da DUP encontrava-se licenciada.
CXXII. Ou seja, de acordo com a tese da Recorrente, esta teria uma janela de regularização que nunca se fechava, que lhe permitia perpetuar a laboração sem título habilitante ad eternum, sem obrigações e sem escrutínio.
CXXIII. Contrariamente ao que a Recorrente pretende fazer crer, esta não tinha qualquer procedimento pendente à data da entrada em vigor do dito diploma.
CXXIV. Com efeito, o processo de regularização desta Pedreira não é uma fénix, que nasce e renasce vezes sem conta, nem se prolonga indefinidamente.
CXXV. Contrariamente ao alegado pela ora Recorrente, nenhum procedimento estava pendente a essa data, uma vez que a licença provisória por si detida entre 2011 e 2012, já há muito que havia caducado, i.e. há cerca de 3 anos.
CXXVI. Não existindo qualquer procedimento pendente à data da entrada em vigor deste diploma, o referido artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de novembro (primeiro regime RERAE), não é aplicável ao caso sub judice.
CXXVII. O artigo 3.º/1, do referido diploma estabelece-se que: “[o]s pedidos de regularização, alteração ou ampliação previstos no artigo 1.º devem ser apresentados no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei” (destacados nossos).
CXXVIII. Ou seja, não se diz aí, contrariamente ao alegado pela Recorrente, que haja uma aplicação ope legis automática deste regime de regularização a todas as explorações a operar em situação irregular, uma vez que era exigido um pedido formal por parte dos potenciais interessados, numa janela específica temporal após a entrada em vigor do diploma (i.e. 02.01.2015), para que se iniciasse um procedimento de regularização da atividade.
CXXIX. Em face do exposto, é de concluir que a tese da Recorrente, segundo a qual o regime de regularização RERAE, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de novembro (primeiro regime RERAE), lhe seria de aplicação automática, é manifestamente improcedente pelas razões de direito apontadas.
CXXX. Não fossem, por si só, caricatos todos os acontecimentos anteriores, vem a Recorrente em julho de 2017, dois anos após de lhe ter sido notificada a DUP, requerer a regularização da sua atividade, com apresentação de novo pedido de Regularização ao abrigo da prorrogação concedida pelo artigo 1.º da Lei n.º 21/2016, de 19 de julho (segundo regime RERAE) em manifesto abuso de direito, quando estava perfeitamente ciente da impossibilidade de concretizar a dita regularização.
CXXXI. Ou seja, desta vez a Recorrente considerou pertinente e necessário apresentar um pedido de regularização, contrariamente ao que fez e advogou no anterior regime de regularização.
CXXXII. Conforme já foi amplamente afirmado, desde 25.01.2012 que a Recorrente laborava sem título habilitante.
CXXXIII. A partir do momento em que os prédios foram abrangidos pela DUP (2015), ficou definitivamente comprometida, por força de Lei, a possibilidade de ser exercida no local qualquer atividade incompatível com o motivo que determinou a emissão dessa DUP e a expropriação da parcela D1427, in casu, o Sistema Eletroprodutor do Tâmega.
CXXXIV. Com a publicação e notificação da DUP, o direito de disposição dos prédios cessa para o seu proprietário, neste caso o baldio de M.-R. (os Expropriados) ficando estes apenas com a posse jurídica/formal dos prédios abrangidos pela DUP, independentemente da posse administrativa estar ou não efetivada.
CXXXV. O único destino da parcela em questão seria assim, exclusivamente, a construção do projeto hidroelétrico que determinou a emissão da DUP.
CXXXVI. Ora, estando já sobejamente demonstrada que a Recorrente não era titular de quaisquer direitos, para efeitos expropriatórios, à data da DUP, não deixa de ser inexplicável e incompreensível como é que se permitiu que em 14.07.2017, esta viesse pedir a regularização da pedreira, ao abrigo do artigo 20.º do Decreto-Lei n.v 165/2014, de 5 de novembro, na versão que lhe foi conferida pelo artigo 1.º da Lei n.º 21/2016, de 19 de julho (segundo regime RERAE), poucos dias antes do término da janela de regularização prevista no diploma.
CXXXVII. Estabelece o artigo 62.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, que quem seja Expropriado tem direito a justa indemnização, sendo que coube ao CE definir os critérios para apurar do que seja justa indemnização, nomeadamente, nos termos e para os devidos efeitos do disposto no artigo 23.º.
CXXXVIII. A justa indemnização não pode:
(i) Afetar os princípios da igualdade e da proporcionalidade, no sentido em que não pode deixar o expropriado em melhor ou pior situação do que aquela que detinha à data da DUP; a intervenção do Estado na prossecução do interesse público não deve afetar a propriedade de ninguém, convertendo- se o direito real ou pessoal de gozo em valor pecuniário (justa indemnização), mas também não deve enriquecê-lo face aos seus pares;
(ii) Ter em conta alterações da situação jurídica do direito expropriado ocorridas em data posterior à DUP, especialmente aquelas que se dão contra a boa-fé (n.º 3);
(iii) Ser especulativa, no sentido em que a justa indemnização deve corresponder ao valor que um agente de mercado médio estaria disposto a pagar, à data da DUP, pela aquisição de tal direito (n.º 1).
CXXXIX. Da reunião destes fatores resulta o que a jurisprudência constitucional tem referido como o critério de atribuição da justa indemnização: o chamado valor de mercado normativo (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 408/2008, de 31.07.2008).
CXL. O chamado valor de mercado normativo nada mais é do que o valor real de mercado corrigido pelo Direito.
CXLI. Para o que neste caso importa, nos termos do artigo 23.º, n.ºs 1, 2, al. d) e 3, do CE, a justa indemnização sempre terá que corresponder:
(i) Ao “valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”,
(ii) Não se podendo tomar em consideração as mais-valias resultantes de “licenças ou autorizações administrativas requeridas ulteriormente à notificação a que se refere o n.º 5 do artigo 10.º”,
(iii) Nem “quaisquer fatores, circunstâncias ou situações criadas com o propósito de aumentar o valor da indemnização”.
CXLII. Assim, no que toca à aferição do real valor de mercado, a data relevante é a da publicação da DUP (23.07.2015), no que toca às proibições de valorização ulterior, a data relevante é a da receção da comunicação da DUP efetuada pela X à Expropriada (10.08.2015).
CXLIII. É facto assente que, à data da DUP a Recorrente não tinha título de exploração (uma vez que a sua Licença Provisória estava caducada desde 25.01.2012), devendo ter encerrado a pedreira logo àquela data, torna-se claro que qualquer título posterior que lhe viesse a ser notificado, desde logo em sede de RERAE, não poderia surtir qualquer tipo de efeitos a nível indemnizatório, sob pena de violação do artigo 23.º, n.º 2, al. d) do CE.
CXLIV. Assim, quando em 14.07.2017, a Recorrente deu entrada de um pedido de regularização da atividade que vem desenvolvendo na pedreira de “... e ...”, ao abrigo do segundo regime REARE,
CXLV. É feito em manifesta violação do artigo 23.º, n.º 2, al. d) do CE e do artigo 62, n.º 2, da CRP, cujo único propósito foi tentando juridificar a posteriori o que bem sabia ser ilegal e ilícito, apenas para tentar confundir o interprete e aplicador do Direito, numa última tentativa de encontrar um “papelinho” que lhe permitisse dizer que tinha um direito constituído na sua esfera jurídica à data da DUP para assim arrancar uma indemnização que não lhe era legalmente devida.
CXLVI. Pelo que, tal pedido em altura tão avançada no tempo, tendo em conta que a DUP havia já limitado inelutavelmente o jus abutendi que tinha da pedreira arrendada cerca de 2 anos antes, não pode ser considerado mais do que abuso do direito, uma vez que, afinal, bem sabia a Y que a incompatibilização da atividade que vinha desenvolvendo com a DUP de 2015 a impedia de ter legitimidade procedimental para aqueles efeitos.
CXLVII. Ora, em face de toda este circunstancialismo, não havia outa opção juridicamente correta que não fosse o indeferimento definitivo daquele pedido, tal como aconteceu definitivamente em 29.03.2019, uma vez que que tal regularização não tinha qualquer viabilidade.
CXLVIII. Pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao julgar que:
(i) “É verdade que a entidade exploradora teve a oportunidade de requerer a regularização da sua atividade ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 165/2014, de 05 de novembro (RERAE), contudo verifica-se que apenas o fez em julho de 2017, i.e., decorridos quase dois anos da prolação da declaração de utilidade pública e a sua notificação da mesma, importando, consequentemente, chamar à colação o disposto no artigo 23.º, n.º 2, al. d) do Código de Expropriações, onde se lê que, na determinação do valor dos bens expropriados não se pode considerar a mais-valia que resultar de licenças requeridas após a notificação do n.º 5 do artigo 10.º, acrescentando o n.º 3 do enunciado artigo 23.º que na fixação da justa indemnização são considerados quaisquer fatores, circunstâncias ou situações criadas com o propósito de aumentar o valor da indemnização”.
CXLIX. Ante o exposto, resulta manifestamente claro que à data da DUP, que é o que aqui importa, não havia direito algum a ser convertido em indemnização por parte da Recorrente uma vez que aquela explorava uma Pedreira numa situação ilegal e ilícita que não merece, por isso, a tutela do Direito, desde logo a nível compensatório por expropriação.
CL. Pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao julgar improcedente o recurso interposto pela Y e procedente o recurso interposto pela Entidade Expropriante e, consequentemente, não atribuir à qualquer indemnização decorrente do ato expropriativo da Parcela D1427.
CLI. Admitir que, perante tudo o exposto, a Y teria direito a indemnização pela expropriação da formação geológica de “... e ...”, seria o mesmo que premiar (coisa que é contrária ao instituto da indemnização, que visa compensar e não premiar) atividades ilícitas,
CLII. Seria até atentatório ao princípio da igualdade, já que é admitir que recebe indemnização por expropriação tanto aquele que efetivamente tem um direito na sua titularidade, como aquele que não o tem.
CLIII. Tal como decidiu o Tribunal Constitucional, o critério para atribuição da justa indemnização é a efetiva titularidade e medida desse direito; i.e., a existência do direito à data da DUP é pressuposto para podermos falar em expropriação, sendo, por sua vez, pressuposto da indemnização uma efetiva expropriação.
CLIV. Reitera-se, assim, a questão que indigna a Recorrida desde a notificação do Laudo Arbitral: o que indemnizar, quando a Recorrente não tinha qualquer direito constituído à data da DUP relativamente a esta formação geológica?
CLV. I.e., à data da DUP – 2015 – a Recorrente não tinha um título de exploração da pedreira, elemento essencial à definição do montante indemnizatório, uma vez que trata-se de aferir qual o bem juridicamente tutelado que a DUP veio restringir ou eliminar; essa é a pedra de toque de qualquer procedimento expropriativo e que a Recorrente sempre tentou esquecer.
CLVI. Isto porque fora das condições de licenciamento, o que existe é uma mera extração de pedra ilícita e ilegal porque não munida do respetivo título.
CLVII. Mas como se toda esta situação não fosse por si só grave, mais grave foi a “anuência que as Entidade competentes conferiam à laboração ilegal e ilícita da Pedreira sub judice (e muitas outras no nosso país).
CLVIII. Prova disso mesmo são as declarações dos cargos dirigentes da área da geologia que depuseram em Audiência de Discussão e Julgamento, quando várias vezes se falou num “chapéu” que fazia as vezes da licença legalmente devida.
CLIX. Porém, este “chapéu” não abrangia tudo (tal como reconheceu a mesma Testemunha) uma vez que cada regime de regularização tinha um prazo certo para ser acessível e um prazo certo para que fosse dado cumprimento às condições apostas nas licenças provisórias deles resultantes; prazos esses que eram perentórios, de verdadeira caducidade do título habilitante, tanto os de acesso, como os de cumprimento das licenças.
CLX. Pelo que, na verdade não havia “chapéu” nenhum. O que havia era um acesso temporalmente limitado para atividades que laboravam em contraordenação pudessem sair desse estado de precariedade, de contrariedade ao direito, mas que a Recorrente nunca conseguiu obter, única e exclusivamente por sua culpa.
CLXI. Por conseguinte, a perspetiva da Recorrida mantém-se: nos presentes autos, relativamente à Recorrente não há o que indemnizar uma vez que não foi beliscada em nenhum dos seus direitos pela expropriação aqui em causa, uma vez que esta não estava munida da necessária Licença de Exploração Definitiva da Pedreira.
CLXII. Ante o exposto, a Recorrida mantém, neste ponto, a sua posição:
(i) A Recorrente não é proprietária da pedreira, não tendo uma atividade titulada e regularizada;
(ii) A Recorrente vem explorando a pedreira ilicitamente, daí obtendo proveitos que o Direito não permite: falta-lhe título adequado agora, faltava-lhe título adequado à data da DUP e faltava-lhe título adequado desde o início da exploração;
(iii) Pelo que, o único titular do direito de indemnização sempre foi somente o proprietário da pedreira em causa: o Baldio de M.-R., tal como doutamente julgou o Tribunal a quo.
CLXIII. Concluindo, à data da DUP a Recorrente não se encontrava munida do necessário Título Habilitante para a exploração da Pedreira “... e ...”, pelo que não tinha um direito constituído à data da DUP que justifique a concessão de uma indemnização por parte da Recorrida, uma vez que se encontrava a laborar, desde 25.01.2012, de forma ilegal e ilícita.
CLXIV. Assim, bem andou o tribunal a quo, ao decidir como decidiu, devendo a douta sentença ser integralmente mantida.
CLXV. Recorrente entende ainda que “[a] decisão de julgar cessado o contrato de arrendamento, além de errada quanto á [sic] aplicabilidade das normas em que se fundamentou (alíneas d) e e) do artigo 18.º do DL n.º 270/2001), não teve em conta o facto de o contrato ter continuado em normal exploração”; isto porque, alega a Recorrente “[n]ão teve em atenção que a empresa estava em laboração com a autorização da entidade licenciadora que lhe garantia as condições para trabalhar, nomeadamente para poder obter as imprescindíveis licenças para utilização de explosivos imprescindíveis á sua atividade”.
CLXVI. Ou seja, de uma forma incompreensível e seguindo um raciocínio tortuoso, a Recorrente parece tentar passar a ideia que no dito diploma apenas se faz referência a licenças definitivas, não estando abrangidas nesse conceito a licença provisória.
CLXVII. Mais pretende retirar daqui um conjunto de consequências e efeitos que não se conseguem alcançar ou enquadrar na ratio do dito diploma.
CLXVIII. Neste sentido, conclui que nunca se poderia interpretar o artigo 18.º, alínea d) e e), do Decreto-Lei n.º 270/2001, no sentido de que, ao ter caducado a sua licença provisória – que a Recorrente pretende denominar de “permissão a título provisório”– o contrato cessaria efeitos.
CLXIX. Pretendendo com isto concluir que a caducidade de uma licença provisória não teria a suscetibilidade de cessar os efeitos do contrato de exploração, uma vez que tal cessação só decorreria da caducidade de uma licença definitiva.
CLXX. Como se reconhecerá, é difícil acompanhar e entender este raciocínio ou daqui retirar os efeitos jurídicos pretendidos pela Recorrente.
CLXXI. Sem prejuízo, o princípio da boa-fé, na dimensão da primazia da materialidade subjacente, consagrado no artigo 266.º/2 da CRP e no artigo 10.º do CPA, sempre imporia, que neste exercício se desse prevalência à substância sobre a forma, impondo ao intérprete e aplicador do direito a desconsideração da forma ou formalidade e a consequente análise do conteúdo do ato40
CLXXII. Com efeito, dispõe o artigo 18.º/1, do Decreto-Lei n.º 270/2001, de 16 de março, na sua versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, nas suas alíneas d) e e) determina que, sempre que o pedido de atribuição de qualquer das licenças de pesquisa ou de exploração das matéria minerais não obtiver provimento, ou quando se verifique cessação dos efeitos jurídicos da licença, seja a licença de pesquisa, seja a de exploração, então o contrato cessará os seus efeitos.
CLXXIII. Pelo que tendo a Recorrente deixado caducar a licença provisória ou logrado obter a licença de exploração definitiva da pedreira, os efeitos do seu contrato de exploração cessaram.
CLXXIV. Ante o exposto, resulta manifesto da análise do artigo 18.º/1, do Decreto-Lei n.º 270/2001, de 16 de março, na sua versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, que não tendo conseguido obter a sua licença de exploração (definitiva), então o seu contrato de exploração cessou os seus efeitos, tal como bem julgou o tribunal a quo.
CLXXV. Bem julgou a douta sentença do tribunal a quo que “a interessada não desenvolvia a sua atividade ao abrigo da licença provisória que, em tempos, lhe havia sido concedida, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 18.º, al. d) e e), do Decreto-Lei n.º 270/2001, de 6 de outubro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, o contrato de cessão de exploração celebrado cessou”.
CLXXVI. Por fim, no que respeita à alegada atuação em abuso de direito por parte da Recorrida, sempre se dirá que a mesma o faz de má-fé, porquanto bem sabe a Recorrente que o Requerimento para que esta remete nas suas alegações foi apresentado no âmbito do incidente judicial de avocação judicial do processo expropriatório, que foi por si promovido e que demonstra bem o interesse desta na expropriação,
40 Neste sentido, veja-se, entre outros, MARCELO REBELO DE SOUSA E ANDRÉ SALGADO DE MATOS, In Direito Administrativo Geral, Tomo I, 1.ª ed. pp. 214 a 216.
CLXXVII. E que o que se afirma no dito requerimento é que a Recorrida não deu impulso aos subsequentes atos de expropriação após a notificação da DUP, pelo facto de a afetação da parcela não ter lugar naquele momento, por razões associadas ao planeamento do projeto que determinou a expropriação, mas antes sim numa fase mais avançada daquele.
CLXXVIII. Em momento algum a Recorrida afirmou que iria deixar caducar a DUP, antes sim disse que era com alguma perplexidade que perante o transmitido, a Recorrida tivesse requerido a avocação judicial do processo expropriatório ao invés de ter requerido a caducidade da concretização da 1.ª fase da DUP, que lhe teria, eventualmente, permitido tentar regularizar a situação da sua exploração.
CLXXIX. Assim, o que resulta manifesto desta atuação é que a Recorrente estava verdadeiramente interessada na expropriação e não em prosseguir com a exploração, pois sabia dos avultados custos em que teria de incorrer para regularizar a sua atividade e, mais uma vez, tudo querendo e sem nada fazer, almejava ser indemnizada com uma avultada quantia de dinheiro, bem sabendo que não tinha direito à mesma.
CLXXX. Ante o exposto, é falso e rejeita-se veementemente que a Recorrida tenha indicado à Recorrida que a parcela D1427 não iria ser expropriada, pois tal não resulta do teor documento carreado nos autos, nem tão pouco incentivado a continuidade da exploração por mais uns anos.
CLXXXI. Por seu turno, no que concerne à alegação de que a Recorrida se teria comprometido em sede do AIA a expropriar as pedreiras, e que sabia terem licença provisória, apenas referir que tal alegação é totalmente descabida e elucidativa do desnorte da Recorrente.
CLXXXII. Conforme resulta de toda a prova produzida nos autos, não se pode retirar do teor da declaração de impacte ambiental (“DIA”) das linhas de muito alta tensão do SET, nenhum dever de indemnizar qualquer entidade, designadamente a Recorrente.
CLXXXIII. A DIA é um documento de natureza ambiental, no âmbito do qual são identificadas as respetivas afetações decorrentes da execução de determinado projeto, não competindo à Autoridade de AIA, em sede de DIA, pronunciar-se sobre matérias de índole expropriatório, cuja competência, em última instância, está legalmente acometida aos Tribunais.
CLXXXIV. Neste contexto, em sede de AIA foram identificadas as ditas explorações e a sua afetação do ponto de vista de avaliação ambiental e a necessidade de proceder à sua expropriação, mas em momento se reconheceu nessa sede que a Recorrente seria titular de um direito indemnizatório por decorrência dessa expropriação, nem tal decorre do documento do PA indicado pela Recorrente no ponto 204 do corpo das suas alegações de recurso.
CLXXXV. Essa aferição só poderia ser feita no âmbito do competente processo expropriatório.
CLXXXVI. Referir ainda que quando a Recorrida elaborou o EIA do projeto, não sabia, nem podia saber, qual a situação jurídica em que se encontravam a laborar as pedreiras, sendo consequentemente falsa a alegação da Recorrente.
Nestes termos, e nos melhores de Direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas. Venerandos Juízes Desembargadores, deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional de apelação e, em consequência, manter-se a douta decisão recorrida, nos precisos termos em que foi proferida, como é de Justiça!”.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo esta Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

Na sequência do que se acaba de dizer, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem são as seguintes:
a- da admissibilidade legal da junção aos autos pela apelante, em anexo às suas alegações de recurso, de documento de notificação daquela, em 02 de abril de 2019, do intitulado “Auto de Posse Administrativa”, datado de 28 de março de 2019”;
b- se a sentença recorrida é nula por:
b.1- a decisão nela proferida estar em oposição com os respetivos fundamentos;
b.2- excesso de pronúncia;
b.3- a decisão de mérito nela proferida, que não arbitrou qualquer indemnização à apelante por via da expropriação da parcela de terreno em que aquela explorava uma pedreira, constituir uma decisão surpresa;
c- se essa sentença padece de erro de julgamento da matéria de facto, na vertente de deficiência e se, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se impõe aditar ao elenco dos factos nela julgados provados o seguinte:
“8-A- Este pedreira, denominada “das C.” tinha uma área de 3,488 hectares”;
“42-A- À data da publicação da DUP o procedimento de licenciamento ainda estava pendente”;
“47-A – As notificações não seguiram, pois que a Srª. Subdiretora Geral ordenou a prévia elaboração de uma informação pelos serviços jurídicos”;
“61- Não havia qualquer obstáculo para o licenciamento da pedreira para além da expropriação da parcela D.1427”;
“62- As entidades administrativas licenciadoras entendiam que os sucessivos regimes de regularização permitiam o funcionamento da pedreira”;
“63- A entidade licenciadora, primeiro a Direção Geral de Economia quer depois a Direção Geral de Energia e Geologia, sempre entenderam que o prazo de um ano previsto no DL 340/2007, não era rígido, pelo que sempre consideraram que agiram dentro da legalidade na tramitação dos processos de legalização”;
“64- O contrato de arrendamento subscrito entre o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e a Y foi executado até à tomada da posse administrativa”;
“65- Na área da pedreira expropriada e no raio de um quilómetro havia além desta a P60 – “Das C.”, com área total superior a 50.000 m2”;
“66- O estudo de impacto ambiental (EIA) foi a única condição imposta na autorização provisória e pelo facto da área a licenciar somada com a da pedreira P60 exceder os 50.000 m2”;
“67- O estudo de impacto ambiental (EIA) deixou de ser exigível a partir da publicação do DL. n.º 151-B/2013”;
“68- O plano da pedreira (pano de lavra) tinha de ser apresentado na fase de licenciamento (art. 27º, n.º 1, al. c), do DL. n.º 270/2001), sendo que o junto pela apelante e que consta dos autos e do PA cumpre os parâmetros”;
“69- O encerramento das pedreiras teria sempre de ser precedida de aprovação pela CCDR-N, entidade responsável pela aprovação do PAR, nos termos do art. 31º do DL. n.º 270/2001”;
“70- Nenhuma outra pedreira, nas mesmas condições da Pedreira de CB. e da Pedreira das C. foi encerrada”;
“71- A Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto só não emitiu uma declaração favorável de interesse público relativamente à pedreira de CB. por causa da expropriação”;
d- se essa sentença padece de erro de julgamento da matéria de facto quanto à facticidade nela julgada provada nos pontos 58º e 59º e se, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se impõe alterar essa facticidade e julgar provado o seguinte:
“58- A interessada Y cessou definitivamente a exploração da pedreira logo que foi tomada a posse administrativa pela X pelo que, quando o Secretário de Estado da Energia indeferiu o seu recurso hierárquico já a pedreira estava encerrada definitivamente”;
“59- A pedreira possui sempre enquanto laborou licença para a utilização de explosivos autorizadas pela DGEG e emitidas pela PSP”;
e- se a decisão de mérito proferida na sentença, ao não reconhecer qualquer direito indemnizatório à apelante “Y”, por via da expropriação da parcela de terreno onde aquela explorava uma pedreira, padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe revogar essa decisão e substituí-la por outra em que se fixe uma “justa indemnização” à apelante.
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A 1ª Instância julgou provada a seguinte facticidade com relevo para a decisão da causa:
1- Por despacho n.º 8082/2015 da Direção Geral do Território, de 14 de julho de 2015, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 142, de 23 de julho de 2015, foi consignado que:
«Com vista à construção da 1.ª fase do Sistema Eletroprodutor do Tâmega (SET), que integra os aproveitamentos hidroelétricos do Alto Tâmega à cota 315, de ... à cota de 228 e de ... à cota de 885, a realizar nos concelhos de Cabeceiras de Basto, Ribeira de Pena e Vila Pouca de Aguiar veio a X Generación S. A. U., na qualidade de concessionária da utilização privativa dos recursos hídricos relativa a este sistema, apresentar proposta de concretização dos bens imóveis a abranger pela declaração de utilidade pública a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei 301/2009, de 21 de outubro, ao abrigo do n.º 2 do artigo 13.º do Código das Expropriações.
Considerando que a declaração de utilidade pública, com caráter de urgência, da expropriação dos bens imóveis e direitos inerentes necessários à realização do aproveitamento hidroelétrico denominado por Sistema Eletroprodutor do Tâmega (SET), está prevista nos n.ºs 1 e 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 301/2009, de 21 de outubro;
Considerando que, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do referido diploma legal, os bens imóveis abrangidos pela declaração de utilidade pública devem ser determinados, sob proposta da entidade responsável pela implementação do aproveitamento hidroelétrico, mediante despacho do ministro responsável pela área do ordenamento do território;
Considerando que o projeto dos aproveitamentos hidroelétricos que integram o Sistema Eletroprodutor do Tâmega (SET), foi objeto de declaração de impacte ambiental (DIA) favorável condicionada e de parecer favorável da Comissão de Avaliação sobre o documento relativo ao cumprimento das condicionantes impostas no Relatório de Conformidade Ambiental com o projeto de execução (RECAPE).
Assim, nos termos do disposto n.º 1 do artigo 3.º Decreto-Lei 301/2009, de 21 de outubro e no exercício das competências que me foram subdelegadas pelo Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza, através do Despacho 10105/2014, de 28 de julho, publicado no Diário da República, 2.ª Série n.º 150, de 6 de agosto de 2014, com os fundamentos constantes da informação n.º 49/GJ/2015 de 10-07-2015, desta Direção-Geral do Território, determino o seguinte:
1 - É aprovada a planta contendo a identificação e a localização dos bens imóveis a expropriar abrangidos pela declaração de utilidade pública, com caráter de urgência, a que se referem os nºs 1 e 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 301/2009, de 21 de outubro, a qual é acompanhada do mapa de parcelas, tendo em vista a construção da 1.ª fase do Sistema Eletroprodutor do Tâmega (SET), que integra os aproveitamentos hidroelétricos do Alto Tâmega, de ... e de ..., a realizar nos concelhos de Cabeceiras de Basto, Ribeira de Pena e Vila Pouca de Aguiar.
2 - A planta de localização e os demais elementos do processo podem ser consultados nas câmaras municipais abrangidas: Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto, Praça da …, Cabeceiras de Basto; Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar, R. Dr. … Vila Pouca de Aguiar e Câmara Municipal de Ribeira de Pena, Praça … - Ribeira de Pena, bem como nas instalações da Direção-Geral do Território, sitas na Rua …, Lisboa.
3 - Os encargos com as expropriações resultantes deste despacho são da responsabilidade da X Generación S. A. U., devendo ser efetuado o depósito a que se refere o artigo 20.º do Código das Expropriações, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei 301/2009, de 21 de outubro».
2- No relatório de parcelas e proprietários, em concretização da sobredita Declaração e Utilidade Pública, foi identificada a parcela de terreno n.º D1427, com área de 53.803 m2, a destacar de prédio sito na freguesia de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ... e omisso na Conservatória do Registo Predial, indicando-se como interessados Conselho Diretivo de Baldios M. e R. e Y – Indústria e Granito, Lda.
3- Em 10 de agosto de 2015, a Y – Indústria e Granito, Lda. foi notificada da declaração de utilidade pública.
4- O Conselho Diretivo de Baldios M. e R. consta como o titular inscrito na matriz predial do sobredito imóvel.
5- O prédio tem a área total de 7.060.000 m2 (706 hectares), confrontando a norte com a extrema da freguesia de ... e numa extensão de algumas centenas de metros com a estrada municipal n.º …, a sul com Manuel … (areeiro), a nascente com a extrema da freguesia de …, e a poente com a extrema da freguesia de ... (…).
6- O Plano Diretor Municipal de Cabeceiras de Basto, em vigor à data da Declaração da Utilidade Pública, republicado no Diário da República n.º 97, 2.ª Série, de 21 de maio de 2013, classificou a parcela como espaço florestal sujeito ao regime florestal parcial e ao regime de reserva ecológica nacional.
7- A parcela integra-se numa vasta área de terrenos florestais.
8- A parcela destacada, localizada na margem direita do Rio Tâmega, confronta a norte, sul e poente com o prédio de onde é destacada e a nascente com a pedreira vizinha.
9- À data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, o terreno da parcela encontrava-se praticamente todo ocupado pela exploração da pedreira n.º …, para extração de granito, designada «... e ...», pela Y - Indústria e Granito, Lda., a qual estava em plena laboração, encontrando-se a parte sobrante coberta por vegetação espontânea, constituída por matos e outras espécies arbustivas sem valor comercial, tratando-se de um terreno florestal íngreme, com pendente acentuada para sul, não existindo nesta parte qualquer benfeitoria.
10- A parcela apresenta uma configuração aproximadamente triangular, não ostentando qualquer infraestrutura urbanística com exceção do acesso em terra batida.
11- Após a extração, parte do recurso mineral é transformado em instalações próprias do arrendatário situadas, aproximadamente, a sete quilómetros ou vendidas para outras unidades, sendo que o granito extraído em bruto sem as dimensões e qualidades exigidas é aproveitado para execução de perpianho, alvenaria, de guias e cubos de calçada, sendo estes trabalhos executado na própria pedreira.
12- Os resíduos são depositados nas escombreiras para posterior aproveitamento para inertes ou recuperação paisagística da pedreira.
13- À data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela apresentava no item «benfeitorias» as seguintes indicações:
(i) Um telheiro com a superfície coberta, de 7 m x 22 m, constituído por pilares em madeira e cobertura em chapa zincada;
(ii) Dois contentores com a superfície coberta, de 13 m x 2,5 m2 e 7 m x 2,5 m2, utilizados para diversos fins, como sejam sala de convívio, arrumos, ferramentas, geradores e compressores e;
(iii) Uma edificação com 6,5 m x 3,5 m, com paredes em perpianho e cobertura constituída por uma lage de betão pré esforçado utilizada para abrigo de um gerador elétrico e dois compressores.
14- As construções existentes no interior da parcela foram realizadas pelo explorador.
15- Trabalhavam no local 22 trabalhadores.
16- Foi identificado, no local, o seguinte equipamento:
(i) 4 retroescavadoras;
(ii) 3 dumpers;
(iii) 5 pás carregadoras;
(iv) 2 máquinas de fio diamantado;
(v) 1 ROC para perfuração (um outro estava para reparação);
(vi) 1 branqueador;
(vii) 5 camiões.
17- A produção média de madeira de pinho é de 16,00 ton/ha/ano, com várias mondas e um corte final aos 40 anos, ascendendo o preço médio da tonelada de lenho a 30,00 €.
18- A produção média anual bruta de matéria mineral (granito ornamental amarelo) é de 42.188 ton/ano, ou seja, 15.625 m3, aproveitando-se deste volume 45% para fins ornamentais, considerando-se os restantes 55% de rocha ornamental (para inertes) que podem ser aproveitados dependendo da qualidade do granito e de outros aproveitamentos, designadamente na construção de muros e de agregados para a construção civil e obras públicas ou armazenamento temporário em escombreiras na pedreira.
19- O preço médio de venda da matéria mineral é de 175,00 €/m3, pois que os produtos de grandes dimensões apresentam o preço médio de 225 €/m3 e representam 20% a 25% de produto comercial e os produtos de menores dimensões, com volumetria de 1 a 2 m3, apresentam o preço médio de 160 €/m3 e representam 70% a 75% de produto comercial.
20- A pedreira apresentava uma vida útil de 40 anos, sendo explorada desde 2009.
21- O custo do plano de recuperação paisagístico ascende a 85.722,00 € (oitenta e cinco mil, setecentos e vinte e dois euros), inexistindo, contudo, plano de ambiental e de recuperação paisagística aprovado.
22- A pedreira respeita a faixa de 50 metros face às linhas de água permanentes existentes na parcela.
23- Com a expropriação, a pedreira não consegue manter a sua exploração, ocorrendo a perda total das massas minerais ainda por explorar.
24- Por escrito datado de 10 de abril de 2008, a Y – Indústria de Granito, Lda. apresentou junto do Ministério da Economia requerimento da adaptação da pedreira, ao abrigo do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro. (fls. 5 do proc. adm.)
25- Por escritura outorgada no dia 08.05.2009, no Cartório Notarial de L. C., sito em Cabeceiras de Basto, o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R., na qualidade de primeira outorgante, e Y – Indústria de Granito, Lda., na qualidade de segunda outorgante, fizeram constar, nomeadamente, que:
«Celebram entre si o seguinte contrato de exploração de pedreira, o qual se rege pelas seguintes cláusulas:

A representada dos primeiros outorgantes CEDE à representada do segundo o direito de exploração de rochas graníticas e outras ocorrências mineiras, bem como a feitura de todas as instalações necessárias para o efeito, no lugar denominado de …, freguesia de ..., deste concelho, um espaço integrado em terreno baldio.

A área de exploração é de cinquenta e um mil metros quadrados e encontra-se delimitada, de comum acordo com os outorgantes, em local referenciado em planta anexa a esta escritura e que dela faz parte integrante.

A referida exploração já teve início no ano de dois mil e oito no mês de outubro, e por um período de dez anos, renovando-se por iguais períodos, enquanto não for denunciado por qualquer uma das partes, com cento e oitenta dias de antecedência, através de carta registada com aviso de receção.

A representada do segundo outorgante pagará à representada dos primeiros a renda anual de doze mil e quinhentos euros, numa prestação única a liquidar até trinta de junho.

No final da exploração, a representada dos segundos outorgantes compromete-se e obriga-se a deixar o local explorado em condições que não violem a legislação vigente sobre o ambiente.
(…)

O contrato aqui realizado considera-se rescindido, no caso de a representada do segundo outorgante transmitir a sua posição contratual e o transmissário não requerer no prazo de três meses, à entidade competente, a transmissão da licença de estabelecimento, ou esta lhe for negada.».
26- Por escrito datado de 25 de agosto de 2009, o Município de Cabeceiras de Basto informou a Direção de Serviços da Indústria e dos Recursos Geológicos da conformidade da área afeta à Pedreira de Parada com o PDM vigente. (fls. 42 e 43 do proc. adm.)
27- O grupo de trabalho que apreciou o pedido de licenciamento da pedreira propôs que fosse emitida decisão favorável ao licenciamento da pedreira condicionada, considerando que «Existe conformidade da área afeta à Pedreira nº P 86 – ... e ... com o atual PDM, pois no ponto n.º 2 do artigo 41.º do Regulamento do PDM é referido que sem prejuízo do disposto na legislação específica em vigor, a atividade de exploração de recursos geológicos é compatível com o uso dos espaços florestais», desde que fossem cumpridas determinadas condições, nomeadamente a apresentação de estudo de Impacte ambiental; apresentação no âmbito da avaliação de impacte ambiental de medidas de compensação ambiental a executar na fase de exploração e pós exploração, ficando a autorização da exploração de pedreira sujeita a parecer relativo ao plano de pedreira; apresentação de documentos comprovativos da posse dos terrenos ou do contrato de arrendamento dos mesmos sob a forma de escritura pública. (fls. 61 a 64 do proc. adm.)
28- Por despacho de 20 de janeiro de 2011, o Diretor Regional da Economia do Norte concedeu licença de exploração a título provisório à pedreira denominada «... e ...», consignando que deveriam ser cumpridas as condições propostas pelo grupo de trabalho, nomeadamente a apresentação de estudo de impacte ambiental, o que foi comunicado à Y por comunicação datada de 25-01-2011. (fls. 65 e 71 do proc. adm.)
29- Por escrito intitulado «Licença de Exploração de Pedreira a título provisório», foi feito constar, pelo Diretor Regional da Direção Regional da Economia do Norte MN., que «(…) foi concedida a licença de exploração provisória a esta pedreira, ao abrigo do disposto no n.º 10 do artº. 5º do Decreto-Lei n.º 340/2007 de 12 de outubro, pelo prazo de um ano, a contar da presente notificação ao explorador Y (…). 3. A exploração da pedreira fica sujeita ao cumprimento da proposta do grupo de trabalho (…) que se anexa à presente licença. (…). Caso o proprietário não cumpra o proposto pelo grupo de trabalho dentro dos prazos concedidos deverá proceder ao encerramento do sítio de acordo com as condições previstas nos n.ºs 11 e 12 do artº. 5º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro. (…)». (fls. 68 a 70 do proc. adm.)
30- Por escrito datado de 25 de janeiro de 2011, a Y – Indústria de Granito, Lda. é informada da atribuição provisória de licença de exploração provisória. (fls. 71 do proc. adm.)
31- Por escrito datado de 30 de janeiro de 2012, a Y – Indústria de Granito, Lda. solicita o Ministério da Economia do Norte o envio de segunda via de um documento. (fls. 81 do proc. adm.)
32- Por escrito datado de 18 de outubro de 2012, a Y – Indústria de Granito, Lda. informa o Ministério da Economia que foi contratada uma empresa para a correta instrução do processo de licenciamento. (fls. 83 do proc. adm.)
33- Em 18 de setembro de 2013, a Y – Indústria de Granito, Lda. apresentou o estudo de impacte ambiental, tendo o mesmo sido declarado desconforme, em 15 de janeiro de 2015, pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte. (fls. 246 a 249 do proc. adm.)
34- Em 07 de outubro de 2013, a DREN foi contactada pela equipa de elaboração do EIA das LMAT e Postos de Corte da X na região do Alto Tâmega, para disponibilização de informação relativa à existência de recursos geológicos na área em estudo. (fls. 251 do proc. adm.)
35- Em 20 de dezembro de 2013, a interessada Y requereu prorrogação de prazo para apresentação de audiência prévia de interessados por várias vezes, tendo ocorrido sucessivos deferimentos. (fls. 247 e 248 do proc. adm.)
36) Em 26 de setembro de 2014, a interessada Y endereça ao Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente um escrito, no qual fez constar, nomeadamente, que: «No âmbito da consulta pública do projeto em epígrafe constatamos que o mesmo vai afetar a continuidade do funcionamento da nossa Pedreira n.º … denominada ... e .... (…) Na página 183 do relatório síntese do referido EIA é referido:Pedreiras – regista-se a presença de 2 pedreiras de granito facultadas pela DGEG, localizadas no concelho de Cabeceiras de Basto. De acordo com a informação disponibilizada pela Direção Regional de Economia do Norte, existem duas pedreiras de exploração de granitos na área de estudo, ambas com uma licença do abrigo do art.º 5.º do Decreto-lei n.º 340/2007, de 12 de outubro [.] Pedreira n.º ... denominada ... e ... [.] Pedreira n.º ... denominada de Pedreira das C.. Salienta-se que no âmbito da construção do SET, a X irá proceder à expropriação destas pedreiras, pelo que não haverá afetação das mesmas” (…) Em face do exposto, pergunta-se: - Como se pode tirar uma conclusão destas: não haverá afetação das pedreiras? (…) [-] Onde está o garante da idoneidade da proposta de expropriação? [-] Estas dúvidas e questões levantadas, serão vertidas na DIA como condicionantes? (…) Solicitamos a V. Ex.ª, na qualidade de interessados, que nos informem da proposta de DIA, de forma em fase de Audiência Prévia e nos termos do artigo 100º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo, podermos acautelar os nossos interesses e se for caso disso manifestarmos a nossa opinião. Desde já notificamos V. Ex.ª que, no caso de não sermos ouvido antes da tomada final da v/ decisão sobre o EIA em análise, consideraremos a mesma nula (….)». (fls. 90 e 91 do proc. adm.)
37- Em 29 de janeiro de 2015, a Y solicitou ao Ministério da Economia que, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, a pedreira se considerasse dispensada de apresentação de estudo de impacte ambiental, tendo solicitado o prazo de 120 dias para proceder ao licenciamento da pedreira. (fls. 94 do proc. adm.)
38- Por escrito datado de 15-02-2015, a Direção Geral de Energia e Geologia informou a entidade expropriante que a pedreira tinha, à data, uma área licenciada de 48.151 m2. (fls. 161 do proc. adm.)
39- Em 25 de março de 2015, a CCDR-N comunicou à DREN que «considera-se que não existem condições para o licenciamento deste projeto [pedreira de ... e ...], já que, e como é do conhecimento de V. Exa., ocorre sobreposição com: o projeto do Aproveitamento Hidroelétrico de ..., Alto Tâmega e ..., já em execução, interferindo a área desta pedreira com a faixa de proteção da albufeira. E com o projeto da Linha de Muito Alta Tensão (LMAT) e Postos de Corte da X na Região do Alto Tâmega, com Declaração de Impacte Ambiental (DIA) já emitida em 06 de janeiro de 2015. Perante o exposto, é entendimento desta CCDR que deverá V. Exa., na qualidade de Entidade Licenciadora desta pedreira, informar o Proponente destes factos que inviabilizam qualquer pretensão», o que foi notificado ao explorador por escrito datado de 02 de abril de 2015. (fls. 99 do proc. adm.).
40- Em 13 de abril de 2015, o Presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente responde à missiva da interessada de Y, de 26 de setembro de 2014, através do escrito com o assunto «Procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) nº 2769 | Projeto: Linhas de Muito Alta Tensão (LMAT) e Postos de Corte da X na Região do Alto Tâmega (reformulação dos projetos iniciais) – Projeto de Execução | Reclamação da Declaração de Impacte Ambiental (DIA)», onde faz constar que: «Em resposta à comunicação de V. Ex.ª, acima referenciada, cumpre informar que os termos e condições relativos aos processos de expropriação e de indemnização se encontram estabelecidos na Lei n.º 51/2006, de 4 de setembro, que procede à quarta alteração ao Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de setembro, com a redação que lhe foi conferida pelas Leis n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, n.º 4-A/2003, de 19 de fevereiro, e n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro. Nestas circunstâncias, não se entende adequado determinar uma condicionante na Declaração de Impacte Ambiental (DIA) relativa a uma matéria que se encontra sujeita a um regime normativo específico, devidamente consignado na lei». (fls. 102 do proc. adm.)
41- Em 15 de fevereiro de 2016, a expropriante endereça à Direção Geral de Energia e Geologia um escrito onde faz, nomeadamente, constar que: «a concretização da 1.ª fase da DUP foi efetuada a coberto do Despacho n.º 8082/2015 – Diário da República n.º 142/2015, Série II de 2015-07-2369861789, encontrando-se presentemente em processo de concretização, junto da Direção Geral do Território, a 2.ª fase. No âmbito deste procedimento, em cumprimento da legislação aplicável, o promotor do projeto tem encetado contactos com todos os proprietários, bem como com todos os titulares de direitos passíveis de gerar petições indemnizatórias, nomeadamente com as empresas Y – INDÚSTRIA DE GRANITOS, LDA e MÁRMORES E GRANITOS de …, LDA, que exploram Pedreiras em zonas afetadas pelo projeto abrangido pela DUP (cfr. docs. n.º 1 e 2 anexos). Com efeito, nas referidas comunicações o promotor do projeto não só informou que os terrenos em causa estão abrangidos pela DUP, como solicitou que lhe fosse disponibilizada informação que permita proceder com rigor ao cálculo da justa indemnização pela cessação ou suspensão da atividade desenvolvida. Certo é que, até à presente data, não foi enviada ou disponibilizada ao promotor pelas referidas empresas qualquer documentação que permita concretizar tal cálculo, nem tão pouco avaliar a legalidade e legitimidade da atividade exercida por aquelas, nomeadamente cópias do concreto de cessão de exploração do baldio, licenças que habilitam o exercício da atividade industrial e respetivos dados contabilísticos. Efetivamente, sem esta informação não é possível avaliar se estas empresas têm direito ao pagamento de uma qualquer indemnização pela cessação do concreto de cessão de exploração ou pela cessação da atividade industrial desenvolvida nas parcelas a expropriar. De igual modo, a confirmar-se a existência desse direito, a omissão dessa informação não permite que o promotor proceda ao cálculo da justa indemnização a pagar. Em face do exposto muito agrademos que essa DGEG informe os signatários sobre se a atividade desenvolvida por estas empresas se encontra licenciada, respetivas áreas abrangidas e demais informações que considerem relevante. Na eventualidade dessa DGEG ou das empresas visadas não disponibilizarem a informação solicitada o promotor ver-se-á obrigado a avançar com a posse administrativa imediata das parcelas em questão, por forma a não comprometer o cumprimento dos prazos de execução do projeto acordados no Contrato de Concessão que assinou com o Estado Português, sendo posteriormente esta questão discutida em sede de processo de expropriação litigiosa». (fls. 113 a 114 do proc. adm.)
42- O Engenheiro R. S., técnico superior da Divisão de Pedreiras do Norte, enviou a Informação n.º 303/DPN/2016, onde fez, nomeadamente, constar que: «No que respeita à pedreira n.º ... – ... e ... – Explorador-Y – Industria de Granitos, Lda., NIF.-………, a mesma teve um processo de licenciamento, ao abrigo do art.º 5 do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12 de outubro, sendo, em 2011.01.20, emitida licença de exploração provisória de pedreira, para uma área de 48.151m2». (fls. 116 a 118 do proc. adm.)
43- A informação n.º 303/DPN/2016, de 10.03.2016, foi a despacho do Eng.º P. P., Chefe de Divisão de Pedreiras do Norte, que concordou com a mesma e a remeteu ao Dr. J. P., Diretor de Serviços de Minas e Pedreiras. (fls. 116 do proc. adm.)
44- Numa nota interna datada de 17 de março de 2016, o Diretor de Serviços da Direção Geral de Geologia e Energia informou que a pedreira tinha, à data, uma área licenciada de 48.151 m2. (fls. 135 do proc. adm.)
45- Na informação com o n.º 772/DPN, datada de 25.08.2016, intitulada «Propostas de envio de notificações para apresentação de plano de encerramento de pedreiras afetadas pelo sistema Eletroprodutor do Tâmega», foi feito, nomeadamente, constar que: «Na sequência de reunião realizada na sede da DGEG, no passado dia 27 de julho de 2016 com a presença dos Srs. Diretores de Serviços da DSMP [Dr. J. P.] e da DSEE e dos representantes legais da empresa X Generación, S.A., foi determinado a realização de uma proposta de ofícios, durante o corrente mês de agosto, a enviar às empresas exploradoras das pedreiras, n.º ... – Pedreira das C. e n.º ... – ... e ..., que presentemente se encontram afetadas pela concretização do sistema Eletroprodutor do Tâmega. (…) Deste modo, cumprindo determinação superior, enviam se em anexo propostas de notificações das empresas exploradoras das pedreiras, tendo em vista a apresentação de um plano de encerramento das mesmas, no prazo de 60 dias». (fls. 231 e 232 do proc. adm.).
46- Em 31 de outubro de 2016, a Dr.ª C. L., Subdiretora da DGEG manuscreveu um despacho sobre a Informação n.º 772/DPN referida no facto 39) com o seguinte teor «Proceda-se à elaboração de informação com fundamento expresso das razões que obstam à regularização, bem como às notificações propostas, atento o informado». (fls. 231 a 232 do proc. adm.)
47- As propostas de notificação para encerramento da pedreira de ... e ... e da pedreira de C. foram riscadas de alto a baixo no processo administrativo, ignorando-se quem o terá feito. (fls. 238 e 239 do proc. adm.)
48- Em 07 de dezembro de 2016, o Engenheiro P. P., chefe da Divisão de Pedreiras do Norte, recebe e-mail da chefe de Divisão dos Recursos Hídricos Interiores da Administração da Região Hidrográfica do Norte, organismo que pertence à APA, cujo teor se transcreve: «a X, entidade promotora do empreendimento, e a Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto informaram que se encontram a funcionar numa situação irregular duas pedreiras (…) designadas como “Pedreira de C.” e “Pedreira de ...”. Nesse sentido, uma vez que a atividade destas duas empresas tem causado danos ambientais com impactos nos recursos hídricos, solicita-se a V. Exa. a melhor colaboração no sentido de coordenar, com a maior urgência possível, a realização e uma vistoria às instalações das referidas empresas». (fls. 280 do proc. adm.)
49- Foi elaborada a Informação n.º 1096/DPN, de 13 de dezembro de 2016, intitulada «Cronologia dos processos de licenciamento e proposta de envio de notificações para apresentação de plano de encerramento de pedreiras afetadas pelo sistema Eletroprodutor do Tâmega», que termina com o seguinte: «face à situação legal destas pedreiras, solicita-se orientações superiores no que respeita à questão da autorização de utilização de pólvora e explosivos na sua exploração». (fls. 245 do proc. adm.)
50) Em 13 de dezembro de 2016, a Dr.ª C. L. escreve em manuscrito o seguinte despacho: «À consideração do Senhor Diretor-Geral com proposta de obtenção de parecer jurídico (DSAR) sobre a situação dos processos instrutórios de licenciamento das pedreiras “Pedreira das C.” e “... e ...”” atentos os constrangimentos decorrentes do sistema Eletroprodutor do Tâmega, designadamente sobre a viabilidade de coexistência das atividades ou, em caso desfavorável, sobre a extinção do procedimento de licenciamento com apresentação às empresas da notificação para apresentação do Plano de Encerramento e prazo razoável para o efeito. Enquanto estiver a decorrer atividade de exploração, embora em fase de regularização, deverá a DPN garantir que seja adotados os necessários procedimentos de segurança, designadamente em sede de utilização de explosivos». (fls. 285 do proc. adm.)
51- Em 22 de fevereiro de 2017, a Dr.ª C. L. dá a seguinte instrução ao Dr. J. P.: «A situação das pedreiras “... e ...” e “Pedreira das C.” encontra-se para parecer jurídico, sendo que, independentemente da decisão que vier a ser tomada em sede de licenciamento, haverá que acompanhar a atividade, designadamente no âmbito da emissão de parecer para a utilização de pólvora e explosivos de acordo com os direitos emergentes fundados em procedimento de regularização ou outro, e com os horizonte temporais adequados às situações em concreto, ou seja, o facto desta matéria das pedreiras terem os constrangimentos decorrentes do SET, as respetivas atividades em curso não estão impedidas que a Administração (no caso DSMP/DPN) proceda à emissão de pareceres e à avaliação das demais matérias de acompanhamento das atividades tuteladas pela DGEG». (fls. 294 do proc. adm.)
52- Em 14 de julho de 2017, a interessada Y dá entrada de um requerimento para regularização da pedreira, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 05 de novembro («RERAE»), em particular da prorrogação concedida pela Lei n.º 21/2016, de 19 de julho.
53- Por parecer elaborado pelo Dr. B. S., sendo que não entregou elemento instrutório essencial (declaração de interesse municipal passada pelo Município de Cabeceiras de Basto, uma vez que estava declara a incompatibilidade definitiva da exploração da pedreira com o Sistema Eletroprodutor do Tâmega) e tal motivo determinou o indeferimento liminar do pedido de regularização ao abrigo do RERAE. (fls. 353 do proc. adm.)
54- Em 23 de março 2018, o Diretor-Geral de Energia e Geologia, Dr. M. G., despacha favoravelmente ao teor do Parecer Jurídico da DSAR, elaborado pelo Dr. B. S., onde foi feito constar, nomeadamente, que «os pedidos deveriam ter sido instruídos com o elemento previsto na al. a) do n.º 4 do art. 5º, ou seja, “Deliberação fundamentada de reconhecimento do interesse público municipal na regularização do estabelecimento ou instalação, emitida pela assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal”. O que não aconteceu (…) face ao enquadramento legal agora exposto, os pedidos de regularização deverão ser indeferidos por falta de elemento essencial instrutório, assim como deverão ser encerradas as Pedreiras em questão. Ainda que assim não fosse, a publicação do Despacho n.º 8082/2015 tornou inviável o licenciamento das pedreiras em causa». (fls. 517 a 526 do proc. adm.)
55- Por escrito datado de 10 de outubro de 2017, o Município de Cabeceiras de Basto informa a Direção Geral de Energia e Geologia que «Sendo a empresa Mármores e Granitos de …, Lda., um importante agente económico, gerador de postos de trabalho e de valor acrescentado local, merece o apoio incondicional por parte da edilidade de Cabeceiras de Basto. Todavia, e dado que na área em apreço, o Plano Diretor Municipal em vigor se encontra suspenso por resolução do Conselho de Ministros, e estando também essa mesma área abrangida pela DUP (Declaração de Utilidade Pública), como medida preventiva, acautelando a necessidade de execução da infraestrutura de reconhecido interesse nacional, o Sistema Eletroprodutor do Tâmega, que compreende os aproveitamentos hidroelétricos de ..., Alto Tâmega e ..., não é de todo possível dar início ao processo de reconhecido interesse público municipal da referida pedreira de granito C.». (fls. 527 do proc. adm.)
56- Em 24 de abril de 2018, iniciam-se as diligências de notificação daquela decisão de indeferimento liminar. (fls. 627, 587 e 591 do proc. adm.)
57- Em 13 de agosto de 2018, o Diretor-Geral de Energia e Geologia, Dr. M. G., após exercício de audiência prévia por parte da interessada Y, decide manter a decisão de indeferimento liminar, tendo-se disso notificado a interessada Y em 14.09.2018, bem como várias outras entidades (incluindo a PSP, ASAE e IGAMAOT). (fls. 701 a 710 do proc. adm.)
58- A interessada Y apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento liminar, tendo o mesmo sido rejeitado pelo Secretário de Estado da Energia, Dr. J. G., com notificação disso mesmo à interessada Y, o que determinou o encerramento definitivo da pedreira de ... e .... (fls. 711 e ss, 825, 830 a 842 do proc. adm.)
59- A pedreira possuía licenças para utilização de explosivos, emitidas pela DGEG e PSP.
60- A Y – Indústria de Granito, Lda. apresentava estatísticas às autoridades competentes em virtude da atividade de exploração que desenvolvia na parcela.
*
E julgou não provados o seguinte facto:
Com relevo para a boa decisão da causa não resultou provado que a Y - Indústria de Granito, Lda. procedesse à liquidação das taxas e impostos associados ao desenvolvimento da atividade exploratória de minerais.
*
IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

1- Da admissibilidade legal da junção aos autos pela apelante, em anexo às alegações de recurso, de um documento destinado a comprovar que aquela foi notificada em 02 de abril de 2019, do intitulado “Auto de Posse Administrativa”, este datado de 28 de março de 2019.
A apelante impugna o julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância quanto à facticidade julgada provada no ponto 58º da sentença recorrida, pretendendo que a prova produzida não permitia que o tribunal a quo tivesse julgado como provado que: “A interessada Y apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento liminar, tendo o mesmo sido rejeitado pelo Secretário da Energia, Dr. J. G., com a notificação disso mesmo à interessada Y, o que determinou o encerramento definitivo da pedreira do ... e ...”, pretendendo que, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se altere a facticidade assim julgada provada para o seguinte: “A interessada Y cessou definitivamente a exploração da pedreira logo que foi tomada a posse administrativa pela X, pelo que quando o Secretário de Estado da Energia indeferiu o seu recurso hierárquico já a pedreira estava encerrada definitivamente”.
Para tanto, entre outros argumentos, a apelante sustenta discordar da redação do ponto 58º, porquanto: “(…), a decisão de indeferimento do recurso hierárquico foi tomada em 29-03-2019 – vide fls. 830 do PA e notificado à recorrente dias depois. E a expropriante tomou posse administrativa efetiva da parcela em 28.03.2019 – conforme documento que por comodidade agora se junta –, pelo que, quando o recurso hierárquico foi indeferido já estava esvaziado do objeto por inutilidade superveniente ocorrida pela tomada de posse”.
Estabelece o n.º 1, do art. 651º do CPC que: “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o art. 425º ou no caso de a junção se ter tornando necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância”, e o identificado art. 425º que: “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos suja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”.
Deste modo, urge apreciar da admissibilidade legal da junção aos autos do documento pela apelante em anexo às suas alegações de recurso.
Como é sabido, nos termos do n.º 1 do art. 423º do CPC, os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes, ou seja, no que concerne ao processo expropriativo, com as alegações de recurso da decisão arbitral ou com a resposta ao recurso em que o recorrente ou respondente alegue os factos que visa provar mediante a junção aos autos do documento.
A prova documental pode ainda ser junta aos autos até ao 20º dia anterior àdata em que se realize a audiência final, mas, nesse caso, o apresentante ficará sujeito a multa, exceto se provar que não pôde oferecer o documento em causa com o articulado (n.º 2 do art. 423º do CPC).
Posteriormente ao vigésimo dia que antecede a data da realização efetiva da audiência final, ainda podem ser juntos aos autos documentos até ao encerramento da discussão em 1ª Instância (1), desde que se verifique alguma das seguintes circunstâncias: a) se a apresentação do documento não foi possível até àquela data-limite do 20º dia que antecede o início da realização efetiva da audiência final, ou b) se a junção se tiver tornado necessária em consequência de ocorrência posterior (n.º 3 do art. 423º).
Quanto à primeira das enunciadas exceções, essa impossibilidade pode ser objetiva ou subjetiva.
Ocorre impossibilidade objetiva quando se verifique uma impossibilidade prática, concreta ou real, porque ontológica, do apresentante em juntar aos autos o documento em causa até à data limite do vigésimo dia que antecede o início da realização efetiva da audiência final, por o documento respeitar a factos ocorridos historicamente após essa data limite ou, respeitando a factos anteriores, o documento apenas foi produzido, e podia ser produzido, após o decurso dessa data limite.
Já na impossibilidade subjetiva o documento respeita a factos ocorridos historicamente antes do decurso da data limite do vigésimo dia que antecede o início da efetiva realização da audiência final, mas o apresentante, por razões que não lhe são imputáveis, nomeadamente, a título de negligência, desconhecia a existência do documento em causa ou o respetivo teor, acabando apenas por tomar conhecimento do documento e/ou do respetivo teor após o decurso dessa data limite.
Como é bom de ver, enquanto na impossibilidade objetiva a impossibilidade resulta do próprio teor do documento, pelo que o apresentante não terá de alegar e provar factos dos quais resultem ser justificada a junção do documento após o vigésimo dia que antecede o início da audiência final, na impossibilidade subjetiva não é assim, pelo que o apresentante terá de alegar e provar factos dos quais decorra que a junção do documento em causa após aquela data limite não lhe é imputável a título de culpa, nomeadamente negligência (2).
Acresce que quer na impossibilidade objetiva, quer na subjetiva, a parte tem de requerer a junção aos autos do documento logo que isso se lhe torne possível, sem aguardar qualquer dilação (3).
Em relação à outra situação excecional em que é admitida a junção aos autos de documento após o decurso daquele prazo limite do vigésimo dia que antecede o efetivo início da realização da audiência final e até ao encerramento da discussão em 1ª Instância - a junção se ter tornado necessária em virtude de ocorrência posterior –, o elemento legitimador dessa junção tardia assenta na “ocorrência posterior” ao decurso desse prazo limite, isto é, o documento tem de se destinar à prova ou contraprova de factos ocorridos após o termo desse prazo limite (4).
Após o encerramento da discussão em 1ª Instância, não é admitida a junção aos autos de documentos, exceto em caso de recurso e nos termos limitados previstos nos arts. 425º e 651º, n.º 1 do CPC, os quais consentem que sejam juntos aos autos, com as alegações de recurso, documentos em duas situações excecionais, a saber: a) a junção do documento não ter “sido possível até àquele momento”, isto é, até ao encerramento da discussão em 1ª Instância, por impossibilidade objetiva ou subjetiva do apresentante (5), com o sentido e o alcance já supra enunciados; ou b) a junção do documento se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido pela 1ª Instância.
A junção de documento em fase de recurso com fundamento em a junção se ter revelada necessária em virtude do julgamento da 1ª instância pressupõe que esse julgamento seja de todo surpreendente para as partes relativamente ao que seria expectável em face dos elementos do processo, ou seja, é necessário que a decisão da 1ª Instância se tenha baseado em meio de prova não esperado, designadamente, em meio probatório inesperadamente junto aos autos oficiosamente pelo tribunal ou em preceito jurídico ou em interpretação de preceito jurídico com cuja invocação/interpretação as partes não tivessem justificadamente contado (6).
Dito por outras palavras, para que a junção do documento seja permitida na fase de recurso com fundamento no julgamento realizado pela 1ª Instância, não basta que essa junção seja necessária em face desse julgamento, sendo antes essencial que a junção apenas se tenha tornado necessária em virtude do mesmo, isto é, que a decisão proferida pela 1ª Instância se tenha ancorado num elemento de cariz “inovatório” para as partes.
Deste modo, se a junção do documento era necessária para fundamentar a ação ou a defesa antes de ser proferida a decisão da 1ª Instância, e se essa decisão se baseou em meios de prova com que as partes podiam razoavelmente contar, como sejam depoimentos de parte ou de testemunhas, declarações de parte, prova documental, pericial ou por inspeção judicial, respetivamente, arrolados e requeridos pelas partes ou oficiosamente determinadas pelo juiz, mas, neste último caso, em momento processual em que ainda era possível às partes carrearem para os autos o documento que se propõem juntar em sede de alegações de recurso, com vista a contrariar essa prova produzida por determinação oficiosa do tribunal, ou seja, até ao encerramento da discussão em 1ª Instância, então a junção aos autos do documento com as alegações de recurso não ocorre em virtude do julgamento realizado pela 1ª Instância, posto que as partes tiveram oportunidade de controlar a prova produzida em que assentou a decisão da 1ª instância, e tiveram, inclusivamente, oportunidade de juntar aos autos, na 1ª Instância, o documento que se propõem juntar na fase de recurso. Já se a decisão da 1ª Instância se baseou em meio probatório não oferecido pelas partes, mas antes junto aos autos por iniciativa oficiosa do tribunal, em momento processual em que já não lhes era possível apresentar o documento que agora se propõem juntar aos autos em anexo às suas alegações de recurso, tendo em vista contrariar esse meio de prova, ou quando essa decisão tenha assentado em regra de direito ou interpretação com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não podiam contar, em obediência ao princípio do contraditório, na sua dimensão positiva de proibição de prolação de decisões surpresa (art. 3º, n.º 3 do CPC), impõe-se admitir a junção aos autos do documento na fase das alegações de recurso, uma vez que, nesses casos, e exclusivamente neles, se pode, com propriedade afirmar que essa junção se tornou necessária em virtude do julgamento realizado na 1ª Instância, dado o seu cariz inovador (7).
No caso dos autos, o documento junto aos autos pela apelante em anexo às alegações de recurso, reporta-se à notificação, datada de 02/04/2019, de que esta foi objeto do auto de posse administrativa da parcela de terreno onde a mesma tinha instalada a pedreira que explorava na parcela de terreno expropriada, onde se vê que a entidade expropriante X tomou a posse efetiva dessa parcela de terreno em 28 de março de 2019.
A expropriante X interpôs recurso da decisão arbitral em 11/03/2019 (cfr. fls. 767 a 821), onde, além do mais, sustentava que à interessada (ora apelante) Y não era devida qualquer indemnização pela cessação da exploração da pedreira que se encontrava instalada na parcela de terreno expropriada, uma vez que essa pedreira não se encontrava licenciada à data da DUP e que, por isso, a atividade que esta aí explorava era ilegal, não lhe conferindo qualquer direito indemnizatório e, bem assim que, a partir da DUP, a posse que a Y vinha exercendo sobre essa pedreira era não titulada e de má fé (cfr. conclusões 3 a 25 de fls. 788 a 789 dos autos).
Por sua vez, a apelante Y interpôs recurso dessa mesma decisão arbitral em 11/03/2018 (cfr. fls. 822 a 868), em que para além de se mostrar irresignada quanto ao valor da indemnização que lhe foi atribuída pelos árbitros, refuta que não lhe seja devida qualquer indemnização, alegando que, na data da DUP, em agosto de 2015, a pedreira estava devidamente licenciada ao abrigo do DL. n.º 340/07, e também do DL. 165/2014 (cfr. conclusões III a XIX de fls. 837 a 838), argumentos que reafirmou na resposta que apresentou em 08 de abril de 2019 (cfr. 887 a 895), ao recurso interposto pela expropriante.
Destarte, destinando-se o documento junto aos autos pela apelante em anexo às alegações de recurso, a fazer prova de que a exploração da pedreira pela apelante se encontrava licenciada à data da DUP, se é certo que existia uma impossibilidade objetiva da apelante juntá-lo aos autos com o recurso que interpôs da decisão arbitral, em 11/03/2019, onde toda essa problemática foi suscitada pela própria, porquanto, apenas foi notificada em 02/04/2019 do documento em causa, não existia qualquer impossibilidade daquela em o juntar aos autos com a resposta apresentada em 08/04/2019, ao recurso interposto pela entidade expropriante X (em que esta alega a ilegalidade da exploração da pedreira levada a cabo pela apelante Y, dada a falta de licenciamento da pedreira à data da publicação da DUP, pugnando pela ausência de qualquer direito da Y a ser indemnizada pela cessação da exploração da pedreira por via da expropriação da parcela de terreno em que essa pedreira se encontrava instalada), e onde, na resposta a esse recurso, alega factos destinados a contrariar essa alegação da recorrente expropriante. Daí que se impunha que a apelante tivesse junto aos autos o documento que ora junta, em anexo às alegações de recurso, com a resposta ao recurso interposto pela expropriante.
De resto, analisada a sentença recorrida, verifica-se que a mesma não contém qualquer cariz inovatório em face dos fundamentos de facto e de direito que as recorrentes da decisão arbitral suscitaram nas suas alegações de recurso e nas respostas que apresentaram a esses recursos.
Em face dos fundamentos que se acabam de explanar, impõe-se concluir não estarem preenchidos os pressupostos legais enunciados no art. 651º, n.º 1 ex vi art. 425º do CPC, pelo que não se admite a junção aos autos do documento junto pela apelante Y - Indústria de Granito, Lda. em anexo às suas alegações de recurso, determinando-se que, após trânsito do presente acórdão, se proceda ao respetivo desentranhamento dos autos e à sua devolução ao apresentante, condenando-se a apresentante nas custas do incidente que assim gerou, fixando-se a taxa de justiça em uma UC.

2- Da nulidade da sentença.
2.1- Nulidade da sentença por os fundamentos estarem em oposição com a decisão.

A apelante Y – Indústria de Granito, Lda. imputa à sentença recorrida, que julgou improcedente o recurso da decisão arbitral que interpôs e procedente o recurso interposto pela expropriante X e, em consequência, decidiu não ser devida àquela qualquer indemnização pela expropriação da parcela de terreno onde explorava uma pedreira, o vício da nulidade por os fundamentos aduzidos na sentença para suportarem a decisão expressa na respetiva parte dispositiva estarem em oposição com essa decisão.
Compulsadas as alegações de recurso e analisados os fundamentos que são invocados pela apelante para sustentar a pretensa nulidade da sentença recorrida por alegada contradição entre os fundamentos nela aduzidos para suportarem a decisão de mérito nela proferida e essa mesma decisão de mérito, dir-se-á que, salvo o devido respeito e melhor opinião, aquela incorre na recorrente confusão de conceitos sobre o que sejam causas determinativas de nulidade da sentença e erros de julgamento.
Com efeito, como temos reiteradamente escrito nos acórdãos que vimos relatando, as decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem ser viciadas por duas causas distintas, obstando qualquer delas à sua eficácia ou validade: a) por se ter errado no julgamento dos factos e/ou do direito, sendo então a respetiva consequência a sua revogação; e b) como atos jurisdicionais que são, por se terem violado as regras próprias da sua elaboração e/ou estruturação, ou as que balizam o conteúdo e/ou os limites do poder à sombra do qual são decretadas, sendo então passíveis de nulidade, nos termos do art. 615.º do CPC (8).
As causas determinativas de nulidade das decisões judiciais encontram-se taxativamente elencadas no n.º 1 do art. 615º do CPC e, conforme decorre das diversas alíneas desse n.º 1, reportam-se a vícios formais da sentença (n.º 1, do art. 615º), acórdão (n.º 1, do art. 666º) ou despacho (n.º 3, do art. 613º) em si mesmos considerados, decorrentes de na sua elaboração e/ou estruturação o tribunal não ter respeitado as normas processuais que regulam essa elaboração e/ou estruturação e/ou as que balizam os limites da decisão neles proferida (o campo de cognição do tribunal fixado pelas partes e de que era lícito ao tribunal conhecer oficiosamente não foi respeitado, ficando a decisão aquém ou indo além desse campo de cognição, em termos de fundamentos – causa de pedir (o que se reconduz à nulidade por omissão e excesso de pronúncia, respetivamente) - e/ou de pretensão – pedido (o que se traduz na nulidade por condenação ultra petitum)), tratando-se, por isso, de defeitos de atividade ou de construção da própria sentença, acórdão ou despacho em si mesmos considerados, ou seja, reafirma-se, vícios formais que afetam essas decisões de per se e/ou os limites à sombra dos quais são proferidas (9).
Diferentes desses vícios são os erros de julgamento (error in judicando), os quais contendem com vícios em que incorre o tribunal em sede de julgamento da matéria de facto e/ou em sede de julgamento da matéria de direito, decorrentes de, respetivamente, o juiz ter incorrido numa distorção da realidade factual que julgou como provada e/ou não provada, em virtude da prova produzida impor julgamento de facto diverso do que realizou (error facti) e/ou ter incorrido em erro na identificação das normas aplicáveis ao caso, na interpretação que fez dessas mesmas normas, e/ou na aplicação que delas fez à facticidade que se quedou como provada e não provada no caso concreto (error juris).
Nos erros de julgamento assiste-se, assim, ou a uma deficiente análise crítica da prova produzida e/ou a uma deficiente enunciação, interpretação e/ou aplicação das normas jurídicas aplicáveis aos factos provados e não provados, sendo que esses erros, por já não respeitarem a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença, acórdão ou despacho em si mesmos considerados (vícios formais) ou aos limites à sombra dos quais são proferidos, não os inquinam de invalidade, mas sim de error in judicando (10).
Precise-se que uma das causas determinativas de nulidade da sentença, acórdão ou despacho que se encontram taxativamente enunciadas no n.º 1 do art. 615º consiste na circunstância de os fundamentos (de facto e/ou de direito) neles invocados pelo julgador para suportar a decisão proferida estarem em oposição com essa decisão (al. c), do n.º 1, do art. 615º).
Verifica-se o vício da nulidade da decisão por oposição entre os fundamentos e a decisão, quando se verifica uma construção viciosa da sentença (despacho ou acórdão), decorrente de existir uma contradição lógica interna entre a decisão nela proferida e os fundamentos de facto e/ou de direito que nela foram aportados pelo tribunal para fundamentar essa decisão, ou seja, o julgador, seguiu determinada linha de raciocínio fáctico-jurídico argumentativo, que aponta logicamente para determinada conclusão, mas em vez de tirar essa conclusão, decide noutro sentido, oposto ou divergente.
Dito por outras palavras, ocorre o vício da nulidade da sentença por os fundamentos estarem em oposição com a decisão quando nela o julgador incorra num vício de raciocínio, que consiste na circunstância de a fundamentação de facto e/ou de direito por ele seguida na sentença para chegar à conclusão (a decisão proferida em sede de parte dispositiva) apontar logicamente para uma determinada decisão e este, em vez de tirar essa decisão, extrai uma decisão diferente.
Trata-se de nulidade que se relaciona, por um lado, com a obrigação imposta pelos arts. 154.º e 607.º, n.ºs 3 e 4 do CPC e 205º, nº 1 da C.R.P., do juiz ter de fundamentar as suas decisões e, por outro, com a circunstância de se exigir que a decisão judicial constitua um silogismo lógico-jurídico, em que o seu decisório final deverá ser a consequência ou conclusão lógica da conjugação da norma legal - premissa maior - com os factos - premissa menor.
Ou seja, “os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão funcionam, na estrutura expositiva e argumentativa em que se traduz a sentença, como premissas lógicas necessárias para a formação do silogismo judiciário”, de modo que “constituirá violação das regras necessárias à construção lógica da sentença que os fundamentos da mesma conduzam logicamente a conclusão diferente da que na mesma resulta enunciada” (11).
Essa oposição não se confunde, porém, com o erro de julgamento na vertente de “error facti” e/ou “error iuris”, isto é, respetivamente, com o erro de julgamento da matéria de facto, por a prova produzida impor julgamento de facto distinto do realizado pelo tribunal a quo ou, com “o erro na subsunção dos factos à norma jurídica, ou muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já se o raciocínio expresso na fundamentação apontar para determinada consequência jurídica e na conclusão for tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir” (12).
Revertendo ao caso dos autos, tal como se extrai, nomeadamente dos pontos 84º e seguintes da motivação do recurso, ao pretender que a sentença recorrida é nula por a respetiva “parte decisória” ser “contraditória com a fundamentação, pois omite a ilegitimidade e, limita-se a julgar improcedente, sem mais, o nosso recurso, não se referindo à ilegitimidade” e, bem assim, quando “na decisão refere-se a nós como interessada quando nos considera não interessada por ausência de contrato na estrutura fundamentadora. E quando julga procedente o recurso da X Generacion, S.T, volta a referir-se como interessada”, a apelante confunde indiscutivelmente o conceito de “interessados” para efeitos de processo de expropriação, constante do art. 9º do Cód. Exp., o qual se prende com o pressuposto da legitimidade ativa ou passiva no âmbito da ação de expropriação, em que, para esses efeitos, o interesse direto em demandar ou em contradizer (art. 30º do CC), nos termos do preceito contido no art. 9º, pertence a todos aqueles que aparentam possuir direitos sobre o bem expropriado, sejam titulares de um qualquer direito real ou ónus sobre o bem a expropriar, arrendatários ou titulares de um qualquer direito obrigacional sobre o bem a expropriar, com a legitimidade substantiva, isto é, os titulares do crédito indemnizatório, que são apenas os interessados que efetivamente demonstrem possuir tais direitos sobre o bem expropriado, em virtude de, em consequência do ato expropriativo, terem visto eliminados ou restringidos esses seus direitos reais ou obrigacionais sobre o bem expropriado, sofrendo prejuízos, os quais carecem de ser indemnizados nos termos da lei (13).
Dito por outras palavras e em suma, a apelante confunde “interessados” para efeitos do disposto no art. 9º do CE, em que se adota o princípio da legitimidade aparente, o que contende com o pressuposto processual da legitimidade, com titulares do crédito indemnizatório, o que já contende com mérito e, portanto, com erro de julgamento da matéria de facto e/ou de direito.
No caso dos autos, a apelante “Y” instaurou a presente ação contra a entidade expropriante “X”, pedindo que fosse avocado o processo expropriativo, passando este a correr termos perante o tribunal, alegando explorar, na parcela de terreno expropriada, uma pedreira e que, volvidos onze meses sobre a DUP, a expropriante ainda não deu andamento ao processo expropriativo, para além de a ter notificada da declaração de utilidade pública.
Em face da relação jurídica material controvertida que vem alegada pela apelante em sede de petição inicial, que é aquela que, o n.º 3 do art. 30º do CPC, manda que se atenda para efeitos de aferição do pressuposto da legitimidade, seja ativa ou passiva, e, bem assim, do preceituado no art. 9º do CE, onde se adota o princípio da legitimidade aparente, segundo o qual dispõem de legitimidade ativa ou passiva, no âmbito do processo de expropriação, todos aqueles que aparentam possuir direitos sobre o bem expropriado, é indiscutível que a apelante dispunha de legitimidade ativa para instaurar aquela ação (a qual configura um incidente do processo de expropriação), por ser um dos sujeitos que, em face do alegado na petição inicial e daquele art. 9º, aparentava possuir direitos sobre a parcela de terreno expropriada, que poderão ter sido eliminados ou restringidos por via do ato expropriativo, o que, portanto, lhe poderia conferir um direito indemnizatório por via da expropriação.
Aliás, essa legitimidade ativa da apelante foi-lhe reconhecida, tendo esta, inclusivamente, visto aquela sua pretensão a ser deferida, por sentença proferida em 21/02/2017, transitada em julgado, em que se julgou procedente “o requerido pela expropriada Y – Indústria de Granito, Lda.” e, em consequência”, avocou-se “o processo de expropriação em que figura como entidade expropriante a X Generación, S.A.U., passando o tribunal a exercer as funções que a esta entidade expropriante competiam.
Acresce que, perante essa alegação da apelante vertida na já identificada petição inicial, e tendo o processo expropriativo passado a correr termos perante o tribunal, realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam, o perito constatou que a parcela de terreno expropriada tinha como proprietário o “Conselho Diretivo de Baldios M. e R. e tinha como “arrendatária industrial” a requerente Y – Indústria de Granito, Lda.”, localizando-se nesta “a pedreira n.º 680, denominada “... e ...”, em que “a concessão da sua exploração resulta da celebração de um contrato de arrendamento de 08 de maio de 2009 entre o Conselho Diretivo de Baldios M. e R. e a firma Y – Indústria e Granito, Lda., para a exploração de rochas graníticas no lugar de ... e ..., freguesia de ...” e que, inclusivamente, “no dia em que se procedeu a esta vistoria à pedreira”, esta “encontrava-se em plena laboração, em zona de flanco de encosta” (cfr. fls.488 a 492), o que tudo corrobora que a apelante é efetivamente “interessada” para efeitos do presente processo expropriativo, nos termos do já enunciado art. 9º do CE.
Daí que se tenha reconhecido legitimidade à apelante para apresentar os requerimentos que bem entendeu e que a lei processual lhe permitia apresentar no âmbito do presente processo expropriativo e para, no exercício do seu direito ao contraditório, na dimensão positiva deste (art. 3º, n.º 3 do CPC), se pronunciar sobre os requerimentos apresentados pela apelada e expropriante “X” e pelo expropriado Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e, bem assim, para interpor recurso da decisão arbitral e para responder ao recurso dessa decisão arbitral que foi interposto pela expropriante e pelo expropriado.
Acontece que, porque uma coisa são os “interessados” para efeitos do processo expropriativo (pressuposto processual) previstos no art. 9º do CE, e outra diversa são os “titulares do crédito indemnizatório”, que, como antedito, são tão-somente aqueles interessados que efetivamente demonstrem possuir um qualquer direito real ou obrigacional sobre o bem expropriado que tenha sido eliminado ou restringido por via do ato expropriativo (14), de molde a que a lei confere ao respetivo titular um direito subjetivo a receber uma indemnização em consequência da ablação ou restrição desse direito sobre a coisa expropriada em consequência do ato expropriativo, o que já não contende com o pressuposto processual da legitimidade – exceção dilatória -, mas com a legitimidade substantiva da apelante em receber uma “justa indemnização” em consequência do ato expropriativo, que a privou de poder continuar a explorar a pedreira instalada na parcela de terreno expropriada, isto é, com o mérito da causa, é indiscutível que na sentença recorrida não ocorre qualquer nulidade por pretensa oposição entre fundamentos e a decisão nela proferida, mas o que acontece é ter a apelante confundido pressuposto processual da legitimidade (a que se reporta o art. 9º do CE) com mérito (erro de julgamento da matéria de facto e/ou de direito) e causas determinativas de nulidade da sentença com erros de julgamento.
Com efeito, compulsada a sentença sob sindicância, verifica-se que nela, apesar da 1ª Instância ter reconhecido que a apelante é “interessada”, nos termos do art. 9º do CE e que, portanto, dispunha de legitimidade ativa para interpor recurso da decisão arbitral e, bem assim, para contra-alegar quanto aos recursos interpostos pelos demais recorrentes daquela decisão (expropriante e expropriado), acabou por julgar improcedente o recurso por ela interposto e procedente o recurso interposto pela entidade expropriante e, em consequência, decidiu não ser devida qualquer indemnização à apelante pela cessação da exploração da pedreira em virtude da expropriação da parcela de terreno onde aquela se encontrava instalada.
Os fundamentos em que o tribunal a quo assentou essa decisão de mérito residem na circunstância de, na sua perspetiva (certa ou errada – o que já contende com erro de julgamento), a exploração da dita pedreira pela apelante ser ilegal à data da declaração de utilidade pública (DUP), por a exploração dessa pedreira não estar então licenciada.
Logo, as razões que presidiram ao decidido na parte dispositiva da sentença são razões de mérito, porquanto, perante o quadro legal que a 1ª Instância identificou nessa sentença, a interpretação que nela fez desse quadro legal e a aplicação que do mesmo aí realizou aos factos que julgou como provados e não provados, concluiu que: “a interessada apenas beneficiou de uma licença provisória que lhe foi atribuída em conformidade com o disposto no art. 5º, n.º 10 do Decreto-Lei n.º 370/2007, de 12 de outubro, pois que mereceu a decisão favorável do grupo de trabalho ainda que condicionada e, consequentemente, precária, dispondo a exploradora de um ano, após a notificação da licença emitida, para cumprir as condições que lhe foram impostas (…)”; “decorrido o prazo fixado, a Y não procedeu ao cumprimento das condições impostas pela Administração Pública aquando da atribuição da licença provisória”, pelo que, essa licença caducou “de forma automática, sem necessidade de qualquer reconhecimento administrativo de tal realidade, sendo que, a circunstância do estudo de impacte ambiental ser ou não mais necessária à luz do Decreto-Lei n.º 151-B/2003, de 31/10, não poderá (…) acarretar o renascimento de um prazo que já se encontrava extinto”. E se é verdade que a apelante “teve a oportunidade de requerer a regularização da sua atividade ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 165/2014, de 05/11”, verifica-se que apenas “o fez em julho de 2017, isto é, decorridos quase dois anos da prolação da declaração de utilidade pública e a sua notificação da mesma”.
E ancorada nestes fundamentos fáctico-jurídicos, concluiu a 1ª Instância que, por força do disposto nos arts. 23º, n.º 2, al. d) e 23º, n.º 3 do CE, a apelante não tem direito a ser-lhe atribuída qualquer indemnização, “afastando-se a presunção ínsita no art. 9º, n.º 1 do CE, encontrando-se prejudicada a necessidade de apreciação e fixação do quantum indemnizatório que lhe deveria ser atribuída”.
Ora, conforme resulta do que se acaba de expender, apesar da na sentença recorrida a 1ª Instância ter reconhecido a qualidade da apelante de “interessada” para efeitos do presente processo expropriativo e para efeitos de interposição de recurso da decisão arbitral, o que, reafirma-se, contende com o pressuposto da legitimidade daquela para efeitos de demandar, ou melhor dizendo, para recorrer da decisão arbitral nela proferida, concluiu que a apelante não é titular de qualquer direito indemnizatório por via da expropriação da parcela de terreno expropriada, onde aquela explorava a pedreira à data da DUP por, na perspetiva do tribunal, em face do quadro legal que avocou, interpretou e aplicou à facticidade que se quedou provada e não provada nos autos, essa exploração da pedreira ser ilegal e, consequentemente, não lhe conferir qualquer direito indemnizatório resultante da cessão dessa exploração (ilegal) da pedreira por via do ato expropriativo da parcela de terreno em que aquela se encontrava instalada, ou seja, em suma, por razões de mérito.
Destarte, salvo o devido respeito, ao assim decidir, a 1ª Instância não incorreu em qualquer contradição lógica interna entre os fundamentos de facto e de direito que avocou na sentença para ancorar a decisão de mérito que nela proferiu e a decisão que se encontrava explanada na parte dispositiva dessa mesma sentença, mas antes esses fundamentos de facto e de direito que nela aduziu estão em perfeita sintonia lógico-jurídica com o seu decisório final.
Termos em que, sem mais, por desnecessárias, considerações, julga-se improcedente o fundamento de recurso acabado de apreciar, não padecendo a sentença recorrida do vício da nulidade, nomeadamente, por os respetivos fundamentos estarem em oposição com a decisão de mérito nela proferida.

2.2- Nulidade da sentença por excesso de pronúncia.
A apelante imputa o vício da nulidade da sentença por excesso de pronúncia, na parte em que a 1ª Instância nela conheceu do direito substantivo daquela a ser indemnizada pela cessação da exploração da pedreira por via do ato expropriativo da parcela de terreno em que essa pedreira se encontrava instalada, advogando que, “em sede de recurso da decisão arbitral a entidade expropriante, a multinacional X, não colocou a questão à apreciação do tribunal”, quando é “a petição de recurso da decisão arbitral” que baliza o poder cognitivo do tribunal”, pretendendo que, “o argumento da falta da legitimidade da Y apenas é alegado em sede das alegações do art. 64º do CE”, o que, “para além de intempestivo”, consubstancia “um manifesto venire contra factum proprium” por parte da expropriante X.
A propósito deste fundamento de recurso, cumpre dizer que sobre a nulidade da sentença por omissão ou excesso de pronúncia rege a al. d), do n.º 1, do art. 615º, onde se estatui que: “É nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Trata-se de nulidades que se relacionam com o preceituado no art. 608º, n.º 2 do CPC, que impõe ao juiz a obrigação de resolver na sentença todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e que lhe veda a possibilidade de conhecer questões não suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Na verdade, devendo o tribunal conhecer todas as questões que lhe são submetidas, isto é, todos os pedidos deduzidos pelas partes, com fundamento em todas as causas de pedir por elas invocadas para ancorar esses pedidos e todas as exceções invocadas por aquelas com vista a impedir, modificar ou extinguir o direito invocado pela sua contraparte e, bem assim, todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção (desde que suscitadas/arguidas pelas partes, pelo que não integra nulidade da sentença, a omissão de pronúncia quanto a exceção de conhecimento oficioso do tribunal, mas não arguida pelas partes e de que aquele não conheceu, mas sim erro de julgamento) cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, constitui nulidade por omissão de pronúncia, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica diferentes na sentença, que as partes hajam invocado, uma vez que o juiz não se encontra sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5º, n.º 3 do CPC) (15).
Inversamente o conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção não arguidos pelas partes e que não era lícito ao tribunal conhecer oficiosamente configura nulidade por excesso de pronúncia.
Note-se que a nulidade da sentença por omissão ou excesso de pronúncia é uma decorrência do princípio do dispositivo, segundo o qual, na sua dimensão tradicional, “o processo é coisa ou negócio das partes”, é “uma luta, um duelo entre as partes, que apenas tem de decorrer segundo certas normas”, cumprindo ao juiz arbitrar “a pugna, controlando a observância dessas normas e assinalando e proclamando o resultado”, princípio esse de que, entre outras consequências, decorre que cabe ao autor instaurar a ação e através dos elementos subjetivos (partes) e objetivos (pedido e causa de pedir) da relação jurídica material controvertida que submete à apreciação e à decisão do tribunal, e que terá de narrar na petição inicial, circunscrever o thema decidendum (16) a que fica adstrito o tribunal, o qual apenas será complementado pelas exceções que o réu venha eventualmente a invocar na contestação e pela reconvenção e, bem assim, pelas contra exceções que o autor venha a opor às exceções invocadas pelo réu na contestação, mas é também decorrência do princípio do contraditório, o qual, na sua atual dimensão positiva, proíbe a prolação de decisões surpresa (art. 3º, n.º 3 do CPC), ao postergar a indefesa e, consequentemente, ao reconhecer-se às partes o direito de conduzirem ativamente o processo e de influírem para a decisão a ser nele proferida.
Acresce precisar que, como já alertava Alberto dos Reis (17), impõe-se distinguir entre “questões” e “razões ou argumentos”. “(…) uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção (…). São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar as suas pretensões”.
Apenas a não pronúncia pelo tribunal quanto a questões que lhe são submetidas pelas partes determina a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, mas já não a falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (18).
Do mesmo modo, apenas o conhecimento pelo tribunal de questões não suscitadas pelas partes nos seus articulados e de que aquele não possa conhecer oficiosamente determina a invalidade da sentença por excesso de pronúncia.
“Questões”, reafirma-se, não se confundem com os “argumentos” que as partes invocam em defesa dos seus pontos de vista ou para afastar o ponto de vista da parte contrária.
Na esteira da doutrina e da jurisprudência, dir-se-á que “questões” são os núcleo fáctico-jurídico essenciais, centrais, nucleares, relevantes ou importantes submetidos pelas partes ao escrutínio do tribunal para dirimir a controvérsia entre elas existentes e cuja resolução lhe submetem, atentos os sujeitos, pedidos, causas de pedir e exceções por elas deduzidos ou que sejam do conhecimento oficioso do tribunal, e não os simples argumentos, opiniões, motivos, razões, pareceres ou doutrinas expendidos no esgrimir das teses em confronto (19).
Posto isto, tal se expende no Ac. do STJ de 26/11/2009, “A decisão arbitral deve qualificar-se como decisão judicial, proveniente de um verdadeiro tribunal arbitral necessário. Os acórdãos arbitrais não são, assim, simples arbitramentos, constituindo antes efetivos julgamentos das questões cujo conhecimento lhes é submetido. Consequentemente, à decisão arbitral é aplicável, em matéria de recursos, o regime contido no CPC. Daí que o poder de cognição do juiz se delimite pelas conclusões das alegações do recorrente e pelo decidido no acórdão arbitral, transitando para este em tudo o quanto seja desfavorável para a parte não recorrente e envolvendo a falta de recurso concordância com o decidido pelos árbitros” (20).
Ora, sendo assim, conforme é, encontrando-se o campo de cognição da 1ª Instância, em termos de sentença a proferir, no âmbito do processo de expropriação, na sequência de recurso nele interposto da decisão arbitral, delimitado pelas questões colocadas pelos recorrentes (entidade expropriante X, expropriado Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R., e interessada e apelante Y – Indústria de Granito, Lda.) nas conclusões de recurso que apresentaram e nas respostas a esses recursos, não podendo o tribunal, na sentença, conhecer de outras questões, a não ser que se trate de questões de conhecimento oficioso (arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.ºs 1 e 2 do CPC), sob pena de incorrer em nulidade por excesso de pronúncia, urge verificar se os fundamentos invocados pela 1ª Instância na sentença e que a levaram a julgar improcedente o recurso da decisão arbitral interposto pela apelante “Y” e a julgar procedente o recurso da decisão arbitral interposto pela apelada “X”, foram ou não por estas alegados, nas conclusões dos recursos que interpuseram da decisão arbitral e/ou nas respostas a esses recursos.
Basta a mera leitura das conclusões de recurso apresentadas pela apelada X em relação à decisão arbitral para se constatar que todas as questões apreciadas pela 1ª Instância na sentença recorrida e com fundamento nas quais julgou improcedente o recurso interposto pela apelante da decisão arbitral e julgou procedente o recurso interposto pela apelada (expropriante) X dessa mesma decisão e, em consequência, não reconheceu qualquer direito indemnizatório à apelante por via da cessação da exploração da pedreira que se encontrava instalada na parcela de terreno expropriada à data da DUP, foram alegadas pela expropriante, pelo que é manifesto não ter a 1ª Instância incorrido em nulidade de sentença por pretenso excesso de pronúncia.
Com efeito, nas conclusões do recurso que interpôs da decisão arbitral, a apelada (expropriante) X alegou: “6. O Acórdão, por ter incorrido em omissão de pronúncia, descurou a análise da existência do alegado direito indemnizatório da Y; 7. À data da DUP a Y não explorava a pedreira n.º ... com o necessário título administrativo, cometendo contraordenação, pelo que não tinha àquela data qualquer direito a indemnizar, até porque ninguém se pode prevalecer do ilícito (cfr. v.g., o art. 21.º-A, n.º 1 do Regime Geral das Contraordenações, que ordena a perda a favor do Estado dos benefícios ilegítimos retirados da prática de contraordenação); 8. A Y iniciou a exploração da pedreira ancorada no contrato junto como Documento n.º 1, em 2009, sem qualquer permissão administrativa, como exigido; 9. Em 2010 dá entrada com um pedido nos termos do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, tendo obtido um título de exploração precário sob condição, com eficácia por um ano (isto é, até 2011), sujeito à apresentação dos necessários documentos à instrução do licenciamento; 10. Tendo submetido o Estudo de Impacte Ambiental, o mesmo foi considerado desconforme, terminando ali mesmo o subprocedimento de Avaliação de Impacte Ambiental, e com este o próprio licenciamento da exploração; 11. A partir de 2011, fica claro que o único título que teve para a exploração – que era precário – caducou, tendo a Y a partir dessa data laborado em constante contraordenação (cfr. art. 59.º, n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 270/2001, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 340/2007), i.e., sem direito algum e contra a Lei; 12. Em 2015, a pedreira n.º ... foi alvo de Declaração de Utilidade Pública (cfr. Despacho n.º 8082/2015), tendo a mesmo sido notificada à Y por via da comunicação junta como Documento n.º 5, em 10 de agosto de 2015; 13. À data de 10 de agosto de 2015, data em que sem dúvida a DUP se torna efetiva em relação à Y, esta apenas tinha em sua posse, não titulada e de má fé, a pedreira n.º ... que explorava contra a Lei, mais dela tirando benefícios ilegítimos; 14. Tendo em conta que a DUP converte o direito dos particulares em crédito indemnizatório, há que questionar: que direito tinha a Y à data de 10 de agosto de 2015? Nenhum; 15. Pelo que não tem direito a indemnização de qualquer espécie no âmbito dos presentes autos, tendo o Acórdão lavrado em erro ao ter-lhe atribuído uma indemnização no valor de mais de 2,8 milhões de euros; 16. Idêntica opinião tem a DGEG, entidade competente para o licenciamento aqui em causa, conforme se alcança do Documento n.º 2, junto; 17. Assim que teve conhecimento da DUP, e tendo até a DGEG iniciado esforços para encerrar a pedreira n.º ..., como era de Lei, numa tentativa de enriquecimento ilegítimo, a Y deu entrada em julho de 2017 de um pedido de regularização ao abrigo do RERAE (Decreto-Lei n.º 165/2014); 18. Ora, mesmo que tal pedido fosse satisfeito – que o não foi, como se alcança do Documento n.º 4, junto – nunca poderia surtir efeitos a nível indemnizatório, i.e., para o reconhecimento da existência do alegado crédito a que a Y teria direito (cfr. art. 23.º, n.º 2, al. d) do CE). 19. Pelo que é forçoso concluir que a Y nunca teve qualquer direito a indemnizar, a não ser no curto período de 2010 a 2011, bem sabendo, já à data da DUP – que é o relevante –, que havia perdido esse direito há 4 anos por sua própria culpa; 20. Assim, está claramente demonstrada a falta de direito da Y e que, portanto, nenhum crédito indemnizatório lhe é devido no âmbito dos presentes autos, tendo o Acórdão lavrado em erro quando lhe atribuiu mais de 2,8 milhões de euros; 21. Outra conclusão não é possível sob pena de se violarem dois princípios constitucionais fundamentais: o da justa indemnização e o da igualdade; 22. O princípio da justa indemnização por expropriação exige que se atenda ao valor normativo de mercado, i.e., ao valor que um comprador está disposto a pagar em normais condições de mercado (e por normais, entenda-se como pressuposto um mercado lícito, ao contrário do que aqui ocorre, por tudo o exposto); 23. O princípio da igualdade exige que a indemnização não coloque o expropriado em posição de vantagem ou de desvantagem face aos não expropriados, pelo que oferecer uma indemnização a quem atua ilicitamente é claramente atentatório do princípio da igualdade; 24. Por outro lado, estes princípios conjugados exigem também que não se permita que receba indemnização tanto aquele que tem um direito na sua titularidade como aquele que não o tem, como é o caso da Y; 25. Numa palavra, oferecer indemnização, seja qual for o seu valor à Y – como o faz o Acórdão impugnado – é o mesmo que premiar o ilícito, o que não é, obviamente, juridicamente admissível”.
Destarte, a questão de se saber se a apelante Y, à data da declaração da utilidade pública do ato expropriativo da parcela de terreno que tinha tomado de arrendamento ao expropriado Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R., para explorar uma pedreira, explorava essa pedreira ilegalmente, por não dispor do licenciamento necessária a essa exploração, o que, na perspetiva da apelada “X” não conferia a essa interessada qualquer direito indemnizatório decorrente da cessação (na sua perspetiva, ilegal) da exploração da parcela de terreno onde essa pedreira era explorada – posição jurídica essa que foi a que veio a ser a adotada na sentença recorrida – é questão (fáctica e jurídica – mérito) que foi colocada pela apelada nas suas conclusões de recurso, pelo que a 1ª Instância ao dela conhecer, diversamente do pretendido pela apelante, não incorreu em qualquer nulidade por excesso de pronúncia.
Pelo contrário, caso não tivesse conhecido dessa questão apesar de se tratar de um dos fundamentos do recurso (aliás, um dos principiais fundamentos, se não o principal) suscitado pela recorrente X, nas conclusões de recurso que interpôs da decisão arbitral e, portanto, de questão que teria a 1ª Instância de conhecer na sentença recorrida, é que teria incorrido em nulidade por omissão de pronúncia.
Termos em que se julga improcedente a nulidade da sentença por pretenso excesso de pronúncia suscitada pela apelante.

2.3- Nulidade da sentença por consubstanciar uma decisão surpresa.
Pretende a apelante que a sentença recorrida, ao conhecer das questões de mérito que apreciou e decidiu e ao julgar improcedente o recurso da decisão arbitral que interpôs e procedente o recurso dessa mesma decisão arbitral que foi interposto pela apelada X e, em consequência, ao decidir que àquela não assistia qualquer direito indemnizatório decorrente da expropriação da parcela de terreno onde explorava a pedreira, por considerar que essa exploração, à data da DUP, era ilegal, consubstancia uma verdadeira decisão surpresa, o que, na sua perspetiva, determina, nos termos do n.º 3, do art. 3º do CPC, a nulidades dessa sentença, por violação do princípio do contraditório, uma vez que não teria tido oportunidade de se defender quanto a esses fundamentos.
Acontece que, conforme resulta do que se acaba de dizer a propósito da pretensa nulidade da sentença por alegado excesso de pronúncia, todos os fundamentos de facto e de direito em que a 1ª Instância alicerçou a sua decisão, julgando improcedente a pretensão indemnizatória deduzida nos autos pela apelante, foram alegados pela apelada X nas conclusões de recurso (e nas antecedentes motivações) que interpôs da decisão arbitral.
Daí que o direito de defesa da apelante tivesse sido cabalmente salvaguardado.
De resto, não só a apelante teve efetiva oportunidade de se defender contra esses fundamentos fácticos e jurídicos, como inclusivamente deles se defendeu – vide pontos 44º a 83º da resposta apresentada pela apelante “Y” ao recurso interposto pela apelada “X” da decisão arbitral, resposta essa que, inclusivamente, tem por epígrafe: “D- Da inexistência do direito indemnizatório da Y”, onde a apelante alega basicamente os mesmos argumentos que agora aduz e com fundamento nos quais imputa erro de direito à decisão de mérito constante da sentença sob sindicância.
Termos em que, sem mais, por desnecessárias, considerações, improcede este fundamento de recurso.

3- Do erro de julgamento da matéria de facto.
3.1- Do vício da deficiência do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância.
Advoga a apelante que a sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto na vertente de deficiência (21), pretendendo que, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se adite ao elenco dos factos nela julgados provados o seguinte:
“8-A- Esta pedreira, denominada “das C.”, tinha uma área de 3,488 hectares”;
“42-A- À data da publicação da DUP o procedimento de licenciamento ainda estava pendente”;
“47-A – As notificações não seguiram, pois que a Srª. Subdiretora Geral ordenou a prévia elaboração de uma informação pelos serviços jurídicos”;
“61- Não havia qualquer obstáculo para o licenciamento da pedreira para além da expropriação da parcela D.1427”;
“62- As entidades administrativas licenciadoras entendiam que os sucessivos regimes de regularização permitiam o funcionamento da pedreira”;
“63- As entidades licenciadoras, primeiro a Direção Geral de Economia quer depois a Direção Geral de Energia e Geologia, sempre entenderam que o prazo de um ano previsto no DL 340/2007, não era rígido, pelo que sempre consideraram que agiram dentro da legalidade na tramitação dos processos de legalização”;
“64- O contrato de arrendamento subscrito entre o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e a Y foi executado até à tomada da posse administrativa”;
“65- Na área da pedreira expropriada e no raio de um quilómetro havia além desta a P60 – “Das C.”, com área total superior a 50.000 m2”;
“66- O estudo de impacto ambiental (EIA) foi a única condição imposta na autorização provisória e pelo facto da área a licenciar somada com a da pedreira P60 exceder os 50.000 m2”;
“67- O estudo de impacto ambiental (EIA) deixou de ser exigível a partir da publicação do DL. n.º 151-B/2013”;
“68- O plano da pedreira (pano de lavra) tinha de ser apresentado na fase de licenciamento (art. 27º, n.º 1, al. c), do DL. n.º 270/2001), sendo que o junto pela apelante e que consta dos autos e do PA cumpre os parâmetros”;
“69- O encerramento das pedreiras teria sempre de ser precedida de aprovação pela CCDR-N, entidade responsável pela aprovação do PAR, nos termos do art. 31º do DL. n.º 270/2001”;
“70- Nenhuma outra pedreira, nas mesmas condições da Pedreira de CB. e da Pedreira das C. foi encerrada”;
“71- A Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto só não emitiu uma declaração favorável de interesse público relativamente à pedreira de CB. por causa da expropriação”.
Acontece que, salvo o devido respeito e melhor opinião, a pretensa facticidade que a apelante pretende ver aditada à facticidade julgada provada na sentença e que consta do seguinte teor: “42-A- À data da publicação da DUP o procedimento de licenciamento ainda estava pendente”, não encerra quaisquer factos, mas antes matéria eminentemente conclusiva.
Na verdade, saber se à data da publicação da DUP o procedimento de licenciamento da pedreira ainda estava ou não pendente é uma conclusão, a extrair dos concretos requerimentos que a apelante tinha eventualmente apresentado no processo de licenciamento da pedreira e que eventualmente permanecessem por apreciar à data da publicação da DUP, isto naturalmente caso esse procedimento de licenciamento, aquando da apresentação desses eventuais requerimentos, ainda se encontrasse pendente, e não extinto, designadamente, por caducidade.
Daí que cumprisse à apelante alegar quais os concretos requerimentos que apresentou no âmbito do procedimento de licenciamento da pedreira, data da apresentação desses requerimentos, razão ou razões pelos quais os apresentou, e que permanecessem por decidir à data da publicação da DUP, e era essa facticidade que, caso provada, podia ser levada ao elenco dos factos provados, para que depois, uma vez subsumida ao quadro legal que lhe fosse aplicável, poder-se, em sede de subsunção jurídica, extrair (ou não) a conclusão ou a ilação jurídica de que, à data da publicação da DUP, o procedimento de licenciamento da pedreira ainda estava pendente.
Também a pretensa facticidade apontada pela apelante no ponto 61º - “61- Não havia qualquer obstáculo para o licenciamento da pedreira para além da expropriação da parcel D.1427” –, e que esta pretende ver aditada ao elenco dos factos julgados provados na sentença recorrida tem natureza eminentemente conclusiva e de direito, constituindo essa matéria a solução jurídica da questão de direito que foi tratada na sentença e com cuja solução de mérito a apelante não se conforma.
Aliás, saber se existia ou não qualquer obstáculo (legal) para o licenciamento da pedreira para além da expropriação da parcela de terreno onde aquela se encontrava instalada, é o cerne da questão decidenda nos presentes autos.
A resposta a essa questão (eminentemente de facto e jurídica), conforme é bom de ver, dependerá dos factos concretos que se quedarem como provados e não provados nos autos e da respetiva subsunção jurídica ao quadro legal aplicável.
Por sua vez, a pretensa facticidade apontada pela apelante no ponto 64º - “64- O contrato de arrendamento subscrito entre o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e a Y foi executado até à tomada da posse administrativa” – e que a mesma pretende ver aditada ao elenco dos factos julgados provados na sentença, tem natureza obscura.
Na verdade, dizer-se que o contrato de arrendamento “foi executado” até à posse administrativa, a expressão “foi executado” comporta um caráter polissémico, na medida que essa expressão tanto poderá significar que a apelante continuou a pagar as rendas acordadas ao Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. até à tomada da posse administrativa pela entidade expropriante da parcela de terreno onde se encontrava instalada a pedreira, como poderá significar que o senhorio continuou a facultar à apelante o uso, fruição e exploração da pedreira até à posse administrativa desta, mas sem que a apelante explorasse efetivamente a pedreira, dela extraindo granito, como poderá significar que a apelante extraía efetivamente granito da pedreira até à tomada da posse administrativa, mas contra a vontade do senhorio, pagando-lhe ou não as rendas acordadas, como poderá significar que a apelante continuou a pagar as rendas acordadas ao senhorio, que continuou a facultar à apelante o uso, fruição e exploração da pedreira, que continuou dela a extrair granito, apesar da pedreira estar (ou não) licenciada para o fim para que foi dada em exploração à apelante, por facto imputável (ou não) à apelante e de, com a DUP, ter deixado de ser possível o licenciamento da exploração da pedreira, ainda assim, a apelante ter continuado ilegalmente a explorá-la até à tomada da posse administrativa efetiva da parcela de terreno expropriada onde aquela se encontrava instalada, com a conivência do senhorio, que foi recebendo as rendas contratualizadas e eventualmente das autoridades administrativas, que não determinaram o encerramento da pedreira e foram emitindo licenças para a deflagração de explosivos.
Ora, esse carácter polissémico da expressão “execução” do contrato de arrendamento, impede que se possa levar a dita facticidade ao elenco dos factos apurados.
Por sua vez, a pretensa facticidade indicada supra pela apelante nos pontos 67º, 68º e 69º -“67- O estudo de impacto ambiental (EIA) deixou de ser exigível a partir da publicação do DL. n.º 151-B/2013”;“68- O plano da pedreira (pano de lavra) tinha de ser apresentado na fase de licenciamento (art. 27º, n.º 1, al. c), do DL. n.º 270/2001), sendo que o junto pela apelante e que consta dos autos e do PA cumpre os parâmetros”;“69- O encerramento das pedreiras teria sempre de ser precedida de aprovação pela CCDR-N, entidade responsável pela aprovação do PAR, nos termos do art. 31º do DL. n.º 270/2001” – não encerra quaisquer factos, mas sim matéria exclusivamente de direito.
Ora, nos termos do art. 5º, n.º 3 do CPC, é ao julgador que cabe interpretar as normas jurídicas à facticidade que se quedar como provada e não provada e, consequentemente, concluir (ou não) se o estudo de impacte ambiental deixou de ser exigível a partir da publicação do DL. n.º 151-B/2013; se o plano da pedreira tinha (ou não) de ser apresentado na fase de licenciamento, nos termos do art. 27º, n.º 1, al. c) do DL n.º 207/2001; se o plano da pedreira, junto pela apelante aos autos e que consta do processo administrativo, cumpre (ou não) os requisitos legais; ou se o encerramento de pedreiras teria (ou não), nos termos do art. 31º do DL. n.º 270/2001, de ser precedido de aprovação pela CCDR-N.
Também a pretensa facticidade do ponto 70º -“70- Nenhuma outra pedreira, nas mesmas condições da Pedreira de CB. e da Pedreira das C. foi encerrada” -, que a apelante pretende ver aditada ao elenco dos factos julgados na sentença, não encerra qualquer facto, mas matéria puramente conclusiva.
Na verdade, apenas mediante a alegação e prova das concretas condições em que se encontravam a laborar/a serem exploradas a “Pedreira de CB. e a Pedreira das C.” a que se reporta a apelante quando sustenta terem sido encerradas e, bem assim, da identificação daquelas outras pedreiras a que se reporta a mesma apelante e que não terão sido encerradas aquando do encerramento daquelas outras e da alegação e prova das condições em que cada uma dessas pedreiras se encontravam a laborar quando as primeiras foram encerradas, se pode (ou não) concluir que estas, apesar de se encontrarem a laborar nas mesmas condições da Pedreira do CB. e da Pedreira das C. quando foram encerradas, contrariamente a estas, não foram encerradas.
Ora, como já expendia Alberto dos Reis, “é questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior” (22) e já defendia que a atividade do juiz se circunscreve ao apuramento dos factos materiais, devendo evitar que no questionário entrem noções, fórmulas, categorias ou conceitos jurídicos, inserindo apenas, nos quesitos e na matéria de facto assente, factos materiais e concretos” (23).
Na linha de que ao elenco dos factos apurados e não apurados na sentença o juiz apenas deve levar factos materiais, aqui se incluindo as ocorrências concretas da vida real e o estado, a qualidade ou situação real das pessoas e das coisas; neles se compreendendo não só os acontecimentos do mundo exterior diretamente captáveis pelas perceções (pelos sentidos) do homem, mas também os eventos do foro interno, da vida psíquica, sensorial ou emocional do indivíduo (24), se tem pronunciado a jurisprudência maioritária nacional, inclusivamente, após a entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, de 26/06, que reviu o CPC, na sequência do que a sentença passou a incluir o julgamento da matéria de facto e da matéria de direito e que não contém um dispositivo legal equivalente ao disposto no anterior art. 646º, n.º 4 do CPC.
Na verdade, tem-se continuado maioritariamente a considerar como não escritas as respostas do julgador sobre matéria qualificada como de direito e a equiparar às conclusões de direito, por analogia, as conclusões de facto, isto é, os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados, sem prejuízo de se equiparar a factos as expressões verbais, com um sentido técnico-jurídico determinado, que são utilizadas comummente pelas pessoas sem qualquer preparação jurídica, na sua linguagem do dia a dia, falada ou escrita, com um sentido idêntico, contanto que tais expressões não integrem o próprio objeto do processo, ou seja, que não invadam o domínio de uma questão de direito essencial, traduzindo uma resposta antecipada à questão de direito decidenda (25).
Destarte, perante o caráter conclusivo, de direito e a obscuridade supra apontados em relação aos concretos pontos da pretensa facticidade que a apelante pretende ver aditada à facticidade julgada provada na sentença e que se acabaram de analisar, improcede este fundamento de recurso.
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Avançando…
Ao elenco dos factos provados e não provados na sentença o juiz deve levar apenas os factos essenciais que tenham sido alegados pelas recorrentes nas alegações de recurso que interpuseram da decisão arbitral e que integrem a causa de pedir, isto é, os fundamentos pelos quais recorrem e, bem assim, os factos essenciais alegados pelos recorridos nas respostas a esses recursos e que sejam constitutivos das exceções nelas invocadas a esses fundamentos de recurso (art. 5º, n.º 1 do CPC), bem como os factos complementares ou concretizadores dos essenciais, independentemente de terem sido alegados, contanto que resultem da instrução da causa e tenha sido observado quanto aos mesmos o princípio do contraditório (art. 5º, n.º 2, al. b) do CPC).
Quanto aos factos instrumentais, independentemente de terem ou não sido alegados pelas partes, o julgador deve considerá-los provados, contanto que a sua prova resulte da instrução da causa (art. 5º, n.º 2, al. a) do CPC).
Contudo, dado que os factos instrumentais desempenham no processo uma função secundária, ao indiciarem a prova dos factos essenciais e/ou dos complementares, estes não devem, em princípio, ser levados ao elenco dos factos provados na sentença, mas sim à fundamentação/motivação do julgamento da matéria de facto quanto aos factos essenciais – alegados – julgados provados e não provados ou quanto aos factos complementares – independentemente de terem ou não sido alegados – que se julgaram como provados (art. 607º, n.º 4 do CPC) (26).
Note-se que quanto aos factos essenciais (nucleares), contanto que alegados pelas partes, o juiz deve julgá-los como provados ou não provados na sentença, de forma a cobrir todas as soluções plausíveis da questão ou questões de direito a apreciar e a decidir, por forma a evitar incorrer no vício de deficiência do julgamento da matéria de facto, com a eventual anulação da sentença.
Inversamente, impõe-se ao juiz que se abstenha de julgar como provados ou não provados na sentença factos que, ainda que tenham sido alegados pelas partes, se mostrem totalmente irrelevantes para a questão ou questões de direito a decidir no processo, de acordo com as várias posições de direito suscetíveis de lhes serem aplicadas.
Assentes nas premissas que se acabam de enunciar, salvo o devido respeito por opinião contrária, a matéria que a apelante pretende ver aditada ao elenco dos factos julgados provados na sentença e supra identificada no ponto 8-A – “8-A- Esta pedreira, denominada “das C.”, tinha uma área de 3,488 ha.” –, para além de não ter sido alegada pelas recorrentes nas alegações de recurso que interpuseram da decisão arbitral, nem nas respostas que apresentaram a esses recursos, mostra-se totalmente irrelevante para a questão decidenda no presente processo expropriativo.
Na verdade, a denominada Pedreira das C. não se encontrava instalada na parcela de terreno expropriada sobre que versam os presentes autos.
Essa pedreira nem sequer era explorada pela aqui apelante, mas sim pela sociedade Mármores e Granitos O., Lda. (cfr. fls. 725 a 727 dos autos), que nem sequer é interessada no presente processo expropriativo.
Assim, porque analisámos todos os documentos juntos aos autos, apesar de não ignorarmos que a Pedreira das C. confrontava com a Pedreira do ... e ... (pedreira que a apelante explorava e que se encontrava instalada na parcela de terreno que foi expropriada), e de não ignoramos que a Pedreira das C., à semelhança da pedreira explorada pela apelante, também beneficiou de uma licença de exploração provisória de pedreira, emitida em 20/11/2011, com uma validade de um ano, condicionada à apresentação de Estudo de Impacte Ambiental e cuja sociedade exploradora também requereu a regularização dessa mesma pedreira ao abrigo do RERAE, constante de DL. n.º 165/2017, de 05/01 (cfr. fls. 316 e 740), não descortinamos qual a relevância jurídica que a apelante pretende extrair (nem esta o explica) do eventual aditamento dessa facticidade ao elenco dos factos provados na sentença recorrida para efeitos de apreciação das questões decidendas.
Também não se alcança a relevância para o objeto dos presentes autos da facticidade supra identificada pela apelante no ponto 47º-A – “47-A – As notificações não seguiram, pois que a Sr.ª Subdiretora Geral ordenou a prévia elaboração de uma informação, pelos serviços jurídicos – que esta pretende ver aditada ao elenco dos factos julgados provados na sentença, nem a apelante explica qual a utilidade da mesma.
De resto, mais uma vez, essa facticidade não foi alegada pelas recorrentes nas alegações de recurso que interpuseram da decisão arbitral, nem nas respostas a essas alegações de recurso da decisão arbitral.
Acresce dizer que, perante os factos que a apelante alega nas alegações de recurso da decisão arbitral e na resposta às alegações de recurso apresentadas pela expropriante X, o que releva para o objeto decidendum na presente ação de expropriação será eventualmente o facto de a entidade administrativa não ter notificado a apelante para que procedesse ao encerramento da pedreira que explorava na parcela de terreno expropriada.
Ora, quanto a essa não notificação da apelante pela entidade administrativa para que encerrasse a pedreira, esse facto já resulta extraído dos factos julgados provados nos pontos 46º e 47º na sentença, irrelevando absolutamente as razões pelas quais essa entidade administrativa não procedeu a essa notificação.

De igual modo, salvo o devido respeito e melhor opinião, a facticidade que a apelante pretende ver aditada ao elenco dos factos provados na sentença e que consta do seguinte teor: ““62- As entidades administrativas licenciadoras entendiam que os sucessivos regimes de regularização permitiam o funcionamento da pedreira”; “63- As entidades licenciadoras, primeiro a Direção Geral de Economia quer depois a Direção Geral de Energia e Geologia, sempre entenderam que o prazo de um ano previsto no DL 340/2007, não era rígido, pelo que sempre consideraram que agiram dentro da legalidade na tramitação dos processos de legalização” -, mostra-se totalmente irrelevante para a decisão a proferir no âmbito dos presente autos, porquanto, é ao julgador que cumpre, em sede de subsunção jurídica da facticidade que se quedar como provada e não provado nos autos, avocar as normas jurídicas que entende serem aplicáveis ao objeto do presente litígio, fazer a interpretação dessas mesmas normas jurídicas e, finalmente, proceder à respetiva aplicação aos factos provados e não provados (arts. 5º, n.º 3 e 607º, n.º 3 do CPC).
Logo, a interpretação que as entidades administrativas fizeram (ou possam continuar a fazer) do quadro legal aplicável à relação jurídica controvertida nos presentes autos não só não vincula o tribunal, como estando essas entidades submetidas ao princípio da legalidade, não é por via destas fazerem uma determinada interpretação jurídica dessas normas que confere (ou deixa de conferir) quaisquer direitos subjetivos às aqui partes, nomeadamente, à apelante, caso essa interpretação jurídica não seja a correta.
De resto, mais uma vez, trata-se de facticidade não alegada nas alegações dos recursos interpostos da decisão arbitral e que também não foi alegada nas respostas a essas alegações de recurso, pelo que, caso a apelante pretenda dela extrair qualquer consequência jurídica, nomeadamente, para efeitos de exceção de abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium que imputa à apelada e expropriante X, essa facticidade nunca poderia ser aditada ao elenco dos factos provados na sentença, sob pena de violação do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, por postergação do princípio do contraditório.
Quanto à facticidade que a apelante pretende seja aditada ao elenco dos factos julgados provados na sentença recorrida e supra identifica sob o ponto 65 – “65- Na área da pedreira expropriada e no raio de 1 Km. havia para além desta a P69 – “Das C.”, com área total superior a 50.000 m2”-, conforme acima já se explanou, a Pedreira das C. não se encontrava instalada na parcela de terreno expropriada sobre que versam os presentes autos e nem sequer era explorada pela aqui apelante, mas sim por uma outra sociedade, que nem sequer figura como interessada no presente processo expropriativo.
Destarte, não se descortina qual a relevância da matéria em apreço para o objeto do presente processo expropriativo, nem a apelante o explica.
Precise-se que não se ignora que, no ponto 29º das alegações de recurso que interpôs da decisão arbitral, a apelante alegou que a não concessão da licença de exploração de pedreira e a exigência do estudo de impacte ambiental “foi determinada (…) pelas razões constantes do mesmo despacho, “atendendo ao facto da área a licenciar, somada com as áreas de outras pedreiras situadas num raio de 1 Kms. exceder 50.000 m2, deverá ser previamente sujeito a Avaliação de Impacte Ambiental””.
Também não se ignora que, no parecer junto aos presentes autos a fls. 261 a 264, lê-se que: “Atendendo ao facto da área a licenciar somada com as áreas de outras pedreiras situadas no raio de 1 Km. exceder 50.000 m2, deverá o processo ser previamente sujeito a avaliação de impacto ambiental” (cfr. fls. 262).
Acontece que, uma vez notificado do despacho da entidade administrativa, que lhe concedeu uma licença provisória de exploração da pedreira pelo prazo de um ano e que condicionou a concessão da licença definitiva de exploração da pedreira ao cumprimento pela apelante das exigências constantes daquele parecer, a apelante conformou-se com esse ato administrativo, não o impugnando e daí que este se tenha consolidado na ordem jurídica, não se descortinando, portanto, qual a relevância jurídica da matéria em referência, que a apelante pretende ver aditada ao elenco dos factos provados na sentença recorrida.
Finalmente, pretende a apelante que se adite ao elenco dos factos julgados provados na sentença o seguinte: “71- A Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto só não emitiu uma declaração favorável de interesse público relativamente à pedreira do CB., por causa da expropriação”.
Acontece que essa facticidade não foi alegada pelas recorrentes no recurso que interpuseram da decisão arbitral, nem nas respostas que apresentaram a esses recursos.
Acresce que a Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto não era a entidade administrativa competente para deferir ou não o pedido de licenciamento de exploração da pedreira e, conforme antedito, a apelante conformou-se com o ato administrativo praticado por essa entidade, que licenciou provisoriamente a exploração da pedreira pelo prazo de um ano e que condicionou a concessão de licença definitiva ao cumprimento por parte daquela das condições que se encontravam explanadas no parecer que está subjacente a essa decisão (ato administrativo).
Destarte, não se vislumbra qual o interesse do eventual aditamento da facticidade em referência aos factos provados na sentença recorrida.
Nesta conformidade, perante os fundamentos acabados de enunciar, ao não julgar como provada, nem como não provada na sentença recorrida a facticidade supra identificada, a 1ª Instância não incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, na vertente de deficiência, improcedendo este fundamento de recurso.

3.1.2- Vício da deficiência do julgamento da matéria de facto – ponto 66º
A apelante imputa à sentença recorrida o vício da deficiência, pretendendo que se adite ao elenco dos factos provados na sentença a seguinte facticidade – “66 – O estudo de impacte ambiental (EIA) foi a única condição imposta na autorização provisória e pelo facto da área a licenciar somada com a área da pedreira P-60 exceder 50.000 m2” – e pretende que a respetiva prova é imposta pelo teor dos documentos que constituem fls. 61 a 70 do PA.
Salvaguardando a possibilidade da prova ou não prova da facticidade em apreço assumir relevância para qualquer das soluções jurídicas suscetíveis de serem aplicáveis às questões jurídicas decidendas nos presentes autos, dentro do critério supra enunciado segundo o qual juiz, na seleção dos factos que julga provados e não provados, deve procurar cobrir todas as soluções plausíveis das questões de direito a decidir, pondo-nos a coberto do risco de incorrermos no vício da deficiência do julgamento da matéria de facto, admitimos como certo que, ao não ter julgado como provada nem como não provada a facticidade em apreço na sentença recorrida, a 1ª Instância incorreu em erro de julgamento da matéria de facto na vertente de deficiência, pelo que se impõe verificar se a prova produzida impõe – que não apenas permita, possibilite ou consinta - (n.º 1, do art. 662º do CPC) -, que se conclua pela prova da facticidade em referência.
A esse propósito diremos que o estudo de impacte ambiental foi imposto pela entidade administrativa competente para licenciar (em termos definitivos) a exploração da pedreira pela apelante sobre que versam os processos autos expropriativos devido à circunstância de, no raio de 1 Km. dessa pedreira, existirem outras pedreiras, cuja área somada à pedreira explorada pela apelante excedia os 50.000 m2, é um facto incontroverso e incontrovertível, dado que o mesmo é cabalmente comprovado pelo teor do documento de fls. 261 a 264, em que se lê, a fls. 262: “Atendendo ao facto da área a licenciar somada com as áreas de outras pedreiras situadas no raio de 1 kms. exceder 50.000 m2, deverá o processo ser previamente sujeito a avaliação de impacte ambiental”, e resulta demonstrado por toda a prova documental junta aos presentes autos.
Que a apresentação pela apelante desse estudo de impacte ambiental foi a principal condição que foi imposta pela entidade administrativa para licenciar, em termos definitivos, a pedreira é igualmente demonstrado pelo teor daquele parecer de fls. 261 a 264, 265 e 269 a 270 e resulta também provado da facticidade que consta dos pontos 27º, 28º, 29º e 37º da facticidade julgada provada na sentença.
No entanto, contrariamente ao pretendido pela apelante, se a apresentação pela última do estudo de impacte ambiental foi a principal condição que a entidade administrativa lhe impôs para lhe licenciar a exploração da pedreira em termos definitivos, não foi a única condição que essa entidade lhe impôs para proceder ao licenciamento definitivo da pedreira.
Com efeito, no parecer técnico do grupo de trabalho de fls. 261 a 267, a cujas condições o Senhor Diretor Regional da Economia do Norte subordinou a concessão à apelante de licença definitiva de exploração de pedreira, lê-se, a fls. 263, que a concessão dessa licença fica condicionada ao cumprimento das seguintes condições: “1- Apresentação de Estudo de Impacte Ambiental da pedreira (…); 2- no âmbito da avaliação de impacte ambiental deverão ser apresentadas medidas de compensação ambiental a executar na fase de exploração e pós-exploração de pedreira sujeita a parecer relativo ao plano de pedreira (…); 3- O pedido de atribuição de licença deve ser instruído nos termos do art. 27º do DL 270/2011 de 6 de outubro, alterado e republicado pelo D.L 340/2007 de 12 de outubro, cujo procedimento ficará suspensão até à data da entidade licenciador ter conhecimento da Declaração de Impacte Ambiental (DIA); (…)”.
Acresce que, na licença de exploração da pedreira, a título provisório, junta aos autos a fls. 268 a 270, lê-se, mais concretamente a fls. 269, que, para além do cumprimento daquelas condicionantes, a concessão de licença definitiva de exploração da pedreira à apelante fica também condicionada: “(…) ao cumprimento das seguintes normas de caráter geral: 4.1. – Nas vias de circulação e no perímetro da exploração, terá que ser implementado um sistema de aspersão e/ou de pulverização por água, de forma a minimizar a formação e a propagação de poeiras provenientes da circulação de viaturas e trabalhos de exploração e transformação da matéria-prima; 4.2. – Por questões de segurança de terceiros, terá que ser implantada uma vedação em redor da área da pedreira e colocada sinalização de segurança adequada; (…)”.
Logo se a principal condicionante imposta pela entidade administrativa competente para emitir a licença definitiva de exploração da pedreira imposta à apelante foi a apresentação pela última do estudo de impacte ambiental, essa condição não foi a única que essa entidade impôs à apelante para que lhe deferisse esse licenciamento definitivo da pedreira.
Por conseguinte, longe da prova produzida impor que se conclua que: “O estudo de impacte ambiental (EIA) foi a única condição imposta na autorização provisória e pelo facto de área a licenciar somada com a da pedreira P60 exceder 50.000 m2”, essa prova impõe que se conclua pela não prova dessa facticidade.
Nesta conformidade, na procedência parcial (quanto ao vício da deficiência do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância) deste fundamento de recurso, ordena-se que se adite ao elenco dos factos julgados não provados na sentença a seguinte facticidade:
“O estudo de impacte ambiental (EIA) tivesse sido a única condição imposta pela autoridade administrativa, na autorização provisória e pelo facto da área a licenciar somada com a da pedreira P60 exceder 50.000 m2, para licenciar, em termos definitivos, a exploração da pedreira”.

3.2- Do erro de julgamento – ponto 58º dos factos apurados.
A apelante imputa erro de julgamento à facticidade julgada provada no ponto 58º, em que a 1ª Instância julgou provado que: “58- A interessada Y apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento liminar, tendo o mesmo sido rejeitado pelo Secretário de Estado de Energia, Dr. J. G., com notificação disso mesmo à interessada Y, o que determinou o encerramento definitivo da pedreira de ... e ...”, pretendendo que, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se altere essa facticidade, se julgue como provado o seguinte: “58- A interessada Y cessou definitivamente a exploração da pedreira logo que foi tomada a posse administrativa pela X, pelo que quando o Secretário de Estado da Energia indeferiu o seu recurso hierárquico já a pedreira estava encerrada definitivamente”.
A apelante funda a enunciada impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pelo tribunal a quo na circunstância da decisão de indeferimento do recurso hierárquico ter sido tomada em 28/03/2019 (conforme documento de fls. 830 do PA), de a expropriante apenas ter tomado posse administrativa efetiva da parcela de terreno onde laborava a pedreira em 28/03/2019 (conforme documento que juntou em anexo às suas alegações de recurso, mas cuja junção aos autos não foi admitida pelos fundamentos acima explanados), no facto de ser suposto que o despacho que ordena a arbitragem ser posterior à tomada de posse da parcela de terreno expropriada pela entidade expropriante, e desse despacho que ordenou a arbitragem ter sido proferido em 11/07/2019, bem como nos depoimentos das testemunhas M. M. e J. N., que confirmaram que a pedreira esteve sempre a ser explorada.
A este propósito, cumpre referir que a DUP, com caráter de urgência, da parcela de terreno explorada, foi declarada por despacho proferido em 14/07/2015, publicado no Diário da República de 23/07/2015 e notificado à apelante em 10/09/2015 (cfr. pontos 1º, 2º e 3º da facticidade julgada provada na sentença, não impugnados).
Também é facto incontroverso e incontrovertível nos autos que mesmo após a publicação da DUP e de ter sido notificada desta, a apelante continuou a exploração da pedreira instalada na parcela de terreno expropriada, estando a explorá-la aquando da realização em 09/11/2017, da vistoria ad perpetuam rei memoriam (cfr. ponto 9º da facticidade julgada provada na sentença, não impugnado, e teor do auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam, junto aos autos a fls. 487 a 517).
E também é facto incontroverso e incontrovertível nos autos que a apelante Y continuou a explorar essa mesma pedreira mesmo após a realização, em 09/11/2017, daquela vistoria, fazendo-o inclusivamente quando se realizou a arbitragem a que se reporta o laudo de arbitragem de fls. 663 a 685, porquanto, esse facto não só é comprovado pelo teor desse laudo de arbitragem, como pelas testemunhas supra identificadas pela apelante M. M. e J. N..
Também é um facto incontroverso e incontrovertível nos autos que a decisão de indeferimento liminar do recurso hierárquico que a apelante interpôs da decisão do Diretor Geral da Direção Geral de Energia e Geologia que indeferiu, em 27/03/2018, o pedido daquela de regularização da pedreira ao abrigo do Regime Extraordinário de Regularização da Atividade Económica (cfr. fls. 703 a 711 dos autos), foi proferido pelo Senhor Secretário de Estado da Energia (cfr. fls. 947 a 950 dos autos).
Acontece que, nos termos do n.º 2 do art. 15º do CE, a atribuição de caráter urgente à expropriação deve ser sempre fundamentada e confere de imediato à entidade expropriante a posse administrativa dos bens expropriados, nos termos previstos nos arts. 20º e seguintes, na parte aplicável.
Decorre do exposto que, nos casos em que seja atribuído caráter urgente à expropriação, como é o caso dos autos, em que, no despacho de 14/07/2015, foi declarada a utilidade pública, com caráter de urgência, da parcela de terreno expropriada, em que a apelante explorava a pedreira, publicado no DR. de 23/07/2015 e de que foi notificada em 10/08/2015 (cfr. pontos 1º, 2º e 3º da facticidade apurada), nos termos do n.º 2 do art. 15º do CE, a expropriante X, entrou ope legis na posse administrativa daquela parcela de terreno.
O caráter urgente da expropriação visa possibilitar a entrada dos bens a expropriar na disponibilidade imediata da expropriante em ordem ao cumprimento dos prazos previstos no programa de trabalhos, a fim de não atrasar a execução de obras de utilidade pública. O caráter urgente da expropriação está intimamente relacionado com o programa de trabalhos elaborado pela entidade expropriante. Daí que com a DUP, com caráter urgente, a entidade administrativa entre imediata e automaticamente, ope legis, na posse administrativa da parcela de terreno expropriada, independentemente de qualquer ato expresso ou tácito nesse sentido por parte das autoridades administrativas, judiciais ou da entidade expropriante (27).
Tal significa que, no caso dos autos, com a publicação no Diário da República, de 23/07/2015, da DUP, com caráter de urgência, da expropriação da parcela de terreno onde a apelante explorava a pedreira, automática e imediatamente a expropriante X, por mera decorrência da lei, independentemente de qualquer ato seu sobre a parcela de terreno expropriada ou junto da apelante ou do expropriado, ou de qualquer ato, expresso ou tácito, das entidades administrativas e/ou judiciais, e independentemente da apelante ter continuado a explorar a pedreira, conforme continuou, entrou na posse imediata dessa parcela de terreno.
Daí que, como bem diz a apelada e expropriante X, a posse que a apelante continuou a exercer sobre essa parcela de terreno expropriada, ao continuar nela a explorar a pedreira, é não titulada e de má fé.
Note-se que a circunstância da expropriante X não ter, de imediato, com a publicação da DUP, com caráter de urgência, entrado na posse efetiva da parcela de terreno expropriada, não tem como consequência jurídica que esta não seja a possuidora efetiva dessa parcela de terreno a partir da publicação da DUP, uma vez que a posse da X sobre essa parcela de terreno é uma decorrência automática da lei, a qual decorre de ter sido publicada a DUP, com caráter urgente.
Acresce que essa não entrada imediata da expropriante X na posse da parcela de terreno expropriada não determina a caducidade da atribuição do caráter urgente da DUP, posto que, para além da caducidade não ser de conhecimento oficioso, do facto da expropriante não ter entrado no terreno dentro dos prazos previstos não significa, só por si, que não há urgência na expropriação (28).
Destarte, decorrendo do que se vem dizendo que a expropriante X entrou na posse administrativa da parcela de terreno expropriada, onde a apelante explorava a pedreira, por decorrência da lei, em 23/07/2015, data da publicação da DUP, com caráter de urgência, em D.R., tendo a apelante Y, após essa data, conforme reconhece, continuado a explorar a pedreira instalada na parcela de terreno expropriada, exploração essa que, reafirma-se, a partir daquela data de 23/07/2015, passou a ser abusiva e de má fé, naturalmente que jamais se poderia concluir que a apelante Y cessou definitivamente a exploração da pedreira logo que foi tomada a posse administrativa pela X da parcela de terreno expropriada, porquanto confessadamente assim não aconteceu.
Termos em que improcede este fundamento de recurso, mantendo-se inalterada a facticidade julgada provada no ponto 58º da sentença.

3.3- Do erro de julgamento – ponto 59º dos factos apurados.
No ponto 59º dos factos julgados provados, a 1ª Instância julgou provada a facticidade que se segue: “A pedreira possuía licenças para utilização de explosivos, emitidos pela DGEG e PSP”.
Imputa a apelante erro de julgamento ao assim decidido, pretendendo que se adite a essa facticidade a expressão “sempre”, passando aquele ponto a constar da seguinte redação: “A pedreira possuiu sempre enquanto laborou licença para a utilização de explosivos autorizadas pela DGWG e emitidas pela PSP”.
Acontece que, salvo o devido respeito e melhor opinião, a concretização que a apelante pretende que se opere ao nível dos factos julgados provados pelo tribunal a quo é uma inutilidade, que nada acrescenta à facticidade julgada provada no aludido ponto 59º, tratando-se apenas uma outra forma de dizer/referir a mesma realidade.
Na verdade, ao julgar-se como provado que “a pedreira possuía licenças para utilização de explosivos, emitidos pela DGEG e PSP”, sem que se tenha estabelecido qualquer limite temporal a essa facticidade, a única interpretação possível de se extrair da mesma é no sentido de que a pedreira, enquanto laborou, sempre possuiu as identificadas licenças.
Termos em que, sem mais, por desnecessárias, considerações, improcede este fundamento de recurso e, em consequência, mantém-se inalterada a redação do ponto 59º dos factos julgados provados na sentença sob sindicância.

4- Do direito
A 1ª Instância julgou improcedente o recurso interposto pela apelante Y da decisão arbitral e julgou procedente o recurso dessa decisão interposto pela entidade expropriante X, em que esta pugnava no sentido de que à primeira não assistia qualquer direito indemnizatório, por via da cessação da exploração da pedreira que levava a cabo na parcela de terreno expropriada, porquanto, à data da publicação da DUP, com caráter de urgência, essa exploração não se encontrava licenciada e, por isso, era ilegal.
Esse foi o entendimento que acabou por ser sufragado pela 1ª Instância, não arbitrando qualquer indemnização à apelante por via da cessação da exploração da pedreira instalada na parcela de terreno expropriada com os seguintes argumentos: “O Conselho Diretivo dos Baldios e a Y – Indústria e Granito, Lda. outorgaram um contrato de exploração de pedreira que teve por objeto, ainda que parcialmente, a parcela de terreno que, entretanto, foi objeto de expropriação. (…). Cotejada a matéria assente e conciliando a mesma com o regime legal vindo de expor, constata-se que a interessada apenas beneficiou de uma licença provisória que lhe foi atribuída em conformidade com o disposto no art. 5º, n.º 10 do DL n.º 340/2007, de 12/10, (…) e, consequentemente, precária, dispondo a exploradora de um ano, após a notificação da licença emitida, para cumprir as condições que lhe foram impostas, nomeadamente a apresentação de estudo de impacte ambiental. Ora, decorrido o prazo fixado, a Y não procedeu ao cumprimento das condições impostas pela administração pública aquando da atribuição da licença provisória, (…)”, e daí que essa licença provisória tenha caducado, “de forma automática, sem necessidade de qualquer reconhecimento administrativo de tal realidade, sendo que a circunstância do estudo de impacte ambiental ser ou não mais necessário à luz do DL. n.º 151-B/2003, de 31/10, não poderá (...) acarretar o renascimento de um prazo que já se encontrava extinto”.
Mais expendeu que a apelante “teve oportunidade de requerer a regularização da sua atividade ao abrigo do disposto no D.L. n.º 165/2014, de 05/11”, mas apenas “o fez em julho de 2017, isto é, decorridos quase dois anos da prolação da DUP e a sua notificação à mesma”, pelo que, nos termos do disposto nos arts. 23º, n.ºs 2, al. d) e 3 do CE, não lhe assiste qualquer direito indemnizatório pela cessação da exploração da pedreira.
Dissente a apelante do assim decidido, sustentando que era entendimento da entidade licenciadora que o termo da autorização de exploração não estava dependente do decurso do prazo de um ano, facto esse que lhe transmitiu por diversas vezes e que deixou expresso em vários pareceres e documentos que lhe remeteu e que constam dos autos.
Essa entidade permitiu que a apelante continuasse a explorar a pedreira e forneceu-lhe as licenças necessárias para que adquirisse os explosivos necessários à exploração da pedreira.
Acresce que a própria entidade expropriante X pretendeu deixar caducar a DUP e propôs à apelante que continuasse a explorar a pedreira e tinha perfeito conhecimento que esta continuou essa exploração.
Entende, assim, a apelante, em suma, que, diversamente do entendimento sufragado pela 1ª Instância, a licença provisória de exploração da pedreira, pelo período de um ano, não caducou automaticamente decorrido esse prazo; esse é o entendimento que é sufragado pela própria entidade licenciadora da pedreira e é o entendimento que é adotado pelo próprio legislador, que reconheceu que o prazo de um ano era insuficiente para a conversão das licenças provisórias em definitivas, tanto assim que, nos termos do art. 5º, n.º 10, do DL. 340/2007, condicionou a caducidade da licença de exploração da pedreira à notificação pela entidade licenciadora do proprietário para o encerramento do sítio, notificação essa que não lhe foi remetida, e nos diplomas que, entretanto, foi publicando, em que sucessivamente foi alargando o prazo para que se procedesse à conversão das licenças provisórias de exploração de pedreiras em licenças definitivas.
Mais expende que, contrariamente ao decidido, a licença de exploração da pedreira não caducou ao abrigo da vigência do DL. n.º 340/2007, nem sequer do DL n.º 165/2014, o qual, em relação aos procedimentos pendentes, como era o caso do procedimento da apelante relativo ao licenciamento da pedreira, a autorizou a manter a pedreira em funcionamento, pelo menos, durante mais dois anos, e daí que, na sua perspetiva, à data da DUP, a pedreira estava devidamente licenciada, tanto mais que o único impedimento que existia a esse licenciamento era a ausência do estudo de impacte ambiental, cuja exigência foi eliminada pela entrada em vigor do DL. n.º 151-B/2013.
Finalmente, aduz que a expropriante sempre teve conhecimento das concretas condições em que funcionava a pedreira, nomeadamente, que a apelante estava a regularizar o seu funcionamento, que dispunha de autorização de funcionamento da pedreira e sempre teve perfeito conhecimento que a expropriação da parcela de terreno implicaria a impossibilidade de se dar continuidade à exploração da pedreira e ao procedimento de regularização do licenciamento e, apesar disso, aceitou o compromisso de compensar a apelante pelos prejuízos sofridos por via do ato expropriativo, pelo que, ao assumir agora a pretensão de que não lhe assiste qualquer direito indemnizatório, a expropriante age em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.
Vejamos se assiste razão à apelante nas críticas que assaca à sentença recorrida.
O art. 62º da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP) consagra o direito de propriedade privada, que se manifesta num poder-ter, num poder-utilizar e num poder- dispor, bem como num direito de não ser privado arbitrariamente dos direitos patrimoniais de que seja titular, como tendo natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, beneficiando, em consequência, o direito à propriedade privada do regime específico dos direitos fundamentais e daí que o direito em causa seja diretamente aplicável na ordem jurídica e seja vinculativo para todas as entidades públicas, apenas podendo ser restringido nos casos previstos na Constituição e sempre com reserva da inviolabilidade do seu conteúdo essencial (art. 18º da CRP).
A Constituição garante, assim, que as pessoas singulares ou coletivas gozam do direito de ter bens em propriedade e, em geral, o direito de todos de se tornarem titulares de quaisquer direitos de valor pecuniário, por atos inter vivos ou mortis causa, não podendo os direitos patrimoniais ficar reservados ao Estado ou ao setor cooperativo e social.
Acresce que a Constituição impõe ao Estado a assunção do compromisso de criar condições para que todas as pessoas, num espaço de cidadania, disponham de efetivas possibilidades de se tornarem proprietários. (29)
Note-se que, apesar do art. 62º da CRP não estabelecer quaisquer limitações ou restrições explícitas ao direito à propriedade privada, dele não resulta, nem pode resultar, que o direito à propriedade privada não possa sofrer restrições, uma vez que não existem direitos fundamentais absolutos, mas todos eles, quando conflituantes, carecem de sofrer as necessárias e proporcionais compressões para que todos possam ter a máxima aplicação prática. Aliás, o art. 62º da CRP não estabelece que a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, mas antes que essa garantia constitucional é concedida «nos termos da Constituição», o que significa que a garantia constitucional ao direito à propriedade privada é apenas conferida no âmbito da Constituição e em sintonia com os princípios, valores e critérios que a enformam.
Daí que seja pacífico o entendimento de que não é “incompatível com a tutela constitucional da propriedade a compressão desse direito, desde que seja identificável uma justificação assente em princípios e valores também eles com dignidade constitucional” e desde “que tais limitações ou restrições se afiguram necessárias à prossecução dos outros valores prosseguidos e na medida em que essas limitações se mostrem proporcionais em relação aos valores salvaguardados” (30).
Um dos fundamentos legítimos à restrição ao direito fundamental à propriedade privada que vem reconhecido pela ordem axiológica constitucional é a necessidade de se afetar um bem objeto de propriedade privada à satisfação de um fim de interesse ou utilidade pública. É, aliás, frequente que a propriedade privada tenha que ser harmonizada com a prossecução de fins de interesse público, que justificam a afetação de bens privados à satisfação de necessidades coletivas, através da expropriação.
Quando tal aconteça, a Constituição dá primazia à satisfação do interesse público, mas estabelece expressamente no n.º 2 do art. 62º que: “a requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efetuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização”.
Deste modo, as únicas condições que a Constituição impõe à ablação ou restrição ao direito de propriedade privada por via expropriativa ou por requisição é que estas tenham base legal, que o bem expropriado ou requisitado se destine à realização de um interesse público que prevaleça sobre o interesse particular do proprietário e, bem assim, que ao proprietário seja assegurado o direito a receber uma “justa indemnização”.
Sempre que se imponha o sacrifício legítimo do direito de propriedade privada em prol da necessidade de afetar o bem ou bens expropriados a uma função socialmente mais elevada, a garantia individual da propriedade prevista no n.º 1 do art. 62º, é assim transformada numa garantia do valor da propriedade, que é também ela “uma garantia jusfundamental autónoma como direito fundamental de natureza análoga” à dos direitos, liberdade e garantias, do que, entre outras consequências jurídicas, decorre que, conferindo a Constituição “uma primazia à função primária de defesa – ou à garantia de permanência – sobre a função secundária de compensação – ou garantia de valor”, o proprietário apenas “tem de suportar a conversão de valores patrimoniais e assistir à transformação do seu direito de propriedade num direito ao pagamento de uma justa indemnização quando está em causa uma agressão justificada pela necessidade de afetação dos bens a uma função socialmente mais elevada” (31) e, por outro, que a indemnização a pagar-lhe não possa ser uma indemnização qualquer, devendo antes consistir numa “justa indemnização”.
Conforme se expende no Ac. TC n.º 173/95, “a justa indemnização vem precisamente realizar a «descompressão» da esfera jurídico-patrimonial do particular onerado, transmutando o resultado lesivo numa situação equivalente à que corresponderia a uma ausência da interferência estadual”.
Precise-se que o conceito constitucional e infraconstitucional de “justa indemnização” é multipolar, refletindo a ponderação de diferentes princípios, dentre os quais se destaca fundamentalmente o princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos.
Daí que, em princípio, a indemnização só é tida como justa se corresponder ao valor económico do bem no mercado, numa situação normal (art. 23º, n.ºs 1 e 5 do CE) (32), ou, melhor dizendo, embora a indemnização a pagar ao expropriado deva ser calculada de acordo com os critérios referenciais enunciados nos arts. 25º e seguintes do CE, essa indemnização, para ser justa, deve tendencialmente coincidir com o valor que um “comprador médio, sem razões especiais para a aquisição do bem, tendo em consideração as condições de facto e as circunstâncias existentes à data da declaração da utilidade pública, estaria disposto a pagar pelo bem, para efetuar o seu aproveitamento económico normal, permitido pela lei e regulamentos em vigor” (33).
Dito por outras palavras, no cálculo da “justa indemnização”, o que releva é a situação em que o expropriado se encontraria se não tivesse havido expropriação, recorrendo para o efeito à utilização normal do bem (n.º 1, do art. 23º do CE) e à situação normal de mercado (n.º 5 do art. 23º) e excluindo-se desse cálculo todos os valores especulativos, precisamente porque estes não correspondem ao valor de mercado do bem e de todas as mais valias que sejam realizadas neste após a declaração da utilidade pública sem qualquer justificação ou utilidade imediata ou, independentemente dessa justificação ou utilidade, que tenham sido nele realizadas após a posse administrativa do bem expropriado (34).
Note-se que é com a publicação da declaração de utilidade pública (DUP) que nasce a relação jurídica de expropriação por utilidade pública, a qual tem como sujeitos ativos a entidade expropriante e como sujeitos passivos o expropriado, os titulares de qualquer direito real ou ónus sobre o bem a expropriar, os arrendatários, ou seja, todos aqueles que aparentam possuir direitos, reais ou obrigacionais sobre o bem a expropriar (art. 9º do CE), os quais, com a publicação da DUP ficam imediatamente cerceados nos direitos que possuam sobre o bem a ser expropriado.
Na verdade, a DUP é o ato basilar com que se inicia o procedimento expropriativo, tendente à expropriação propriamente dita, a qual se traduz na ablação do direito de propriedade do expropriado e de todos os direitos reais menores de gozo (v.g. usufruto, uso e habitação, etc.) ou de garantia (v.g. hipoteca) ou obrigacionais (v.g. arrendamento, comodato, etc.) de que sejam titulares os “interessados” sobre o bem a expropriar, perdendo todos, com a publicação da DUP, o direito de intervenção sobre o bem que esses direitos lhes conferiam, pouco mais lhes restando que não seja receber a justa indemnização que lhes é devida pela ablação ou restrição desses seus direitos.
Precise-se, porém, que no caso de DUP com caráter de urgência, como acontece no caso dos autos, com a publicação desta, o expropriado perde automaticamente a posse sobre o bem a expropriar, ficando a entidade expropriante imediatamente, por mera decorrência da lei, investida na posse administrativa sobre esse bem (arts. 11º, n.º 1 e 15º, n.º 2 do CE).
Atentos os efeitos severos que a publicação da DUP tem na esfera jurídica do expropriado e dos demais interessados, não admira que o art. 23º, 1 do CE determine que o cálculo da justa indemnização é feito por referência à data da publicação da DUP, uma vez que, sendo com a publicação desta que nasce a relação jurídica de expropriação por utilidade pública, ficando imediatamente o expropriado e os demais interessados cerceados nos seus direitos, reais ou obrigacionais, sobre o bem a expropriar, compreende-se que seja por referência a essa publicação que se tenha de determinar quais os concretos direitos que assistem ao expropriado e aos interessados sobre o bem a expropriar e que lhes serão subtraídos ou restringidos por via da expropriação e, bem assim, que seja também por referência a esse momento que se tenha de calcular o valor da justa indemnização que lhes é devida.
Decorre do exposto que, tal como ponderou a 1ª Instância, é por referência à publicação da DUP, com caráter de urgência, que teve por objeto a parcela de terreno a expropriar que se terá de aquilatar se a apelante detinha um qualquer direito real ou obrigacional que tenha sofrido uma ablação ou restrição por via da expropriação da parcela de terreno e que se imponha ser indemnizado.
A parcela de terreno expropriada foi objeto de DUP, com caráter de urgência, a qual foi publicada no D.R. de 23/07/2015, e nela foi identificado como expropriado o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e como interessada a apelante Y – Indústria e Granito, Lda. (cfr. pontos 1º e 2º dos factos apurados).
Por escritura pública outorgada em 08/05/2008, o expropriado Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. cedeu à apelante Y, parte da parcela de terreno expropriada, mais concretamente, uma área de 51.000 m2, para que esta nela explorasse uma pedreira, pelo prazo de dez anos, renovável por iguais períodos de tempo, enquanto o contrato não fosse denunciado por qualquer uma das partes, com início em outubro de 2008, mediante uma renda anual de 12.500,00 euros (cfr. ponto 25º dos factos apurados).
Note-se que a qualificação do contrato de exploração de pedreira não tem merecido uma resposta unânime na doutrina, havendo quem entenda que mediante a celebração desse contrato o explorador adquire sobre a parcela de terreno em que se situa a pedreira um direito real de aquisição, enquanto outros defendem que o explorador adquire sobre a parcela de terreno um direito real de gozo (35), questão essa que nos abstemos de analisar por irrelevante para o objeto do presente recurso.
À data da celebração do contrato de exploração de pedreira entre o expropriado Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R. e a apelante encontrava-se em vigor o Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12/10, que procedeu à alteração do Decreto-Lei n.º 270/2001, de 06/10, e à sua republicação, diploma este que aprovou o regime de pesquisa e licenciamento de massas minerais (pedreiras), procurando introduzir no procedimento de licenciamento e fiscalização de pedreiras normas que garantissem os interesses económicos e sociais inerentes a essa atividade extrativa e os interesses ambientais.
Conforme se lê no Preâmbulo do D.L. n.º 340/2007, de 12/10, embora mediante a publicação do DL. n.º 270/2001, de 06/10, o legislador tivesse procurado operar a necessária ponderação entre os interesses económicos que exigiam o licenciamento da exploração das pedreiras, com a salvaguarda dos valores ambientais, “este diploma veio a revelar-se, na prática, demasiado exigente ao pretender regular através de um regime único um universo tão vasto e diferenciado como é o do aproveitamento das massas minerais das diversas classes de pedreira”, procurando-se agora, com as alterações introduzidas através deste diploma, “adequar o DL. n.º 270/2001, de 06/10, à realidade do setor, o que permitirá que sejam cumpridos os fins a que inicialmente se propôs, tornando possível o necessário equilíbrio entre os interesses públicos do desenvolvimento económico, por um lado, e da proteção do ambiente, por outro”.
Imbuído de tais objetivos, o legislador, no Decreto-Lei n.º 340/2007, instituiu alterações profundas ao regime jurídico de pesquisa e licenciamento de pedreiras que se encontrava fixado no DL. n.º 270/2001, de 06/10, e instituiu, no seu art. 4º, um regime excecional para as pedreiras que já se encontrassem em exploração e licenciadas ao abrigo do DL. n.º 270/2001, mas que não cumprissem as novas exigências impostas pelo DL. n.º 340/2007.
E no seu art. 5º instituiu um regime excecional para o licenciamento de pedreiras que já se encontrassem em exploração à data da sua entrada em vigor, mas que não se encontrassem licenciadas.
Quanto ao novo regime de pesquisa e licenciamento de pedreiras instituído pelo DL. n.º 340/2007, o DL. n.º 270/2001, de 06/10, na redação introduzida por aquele diploma, condicionou a pesquisa e a exploração de massas minerais à detenção de, respetivamente, licença de pesquisa ou de exploração, ao estatuir no seu art. 10º, n.º 1 que: “A pesquisa e a exploração de massas minerais só podem ser conduzidas ao abrigo de licença de pesquisa ou de exploração, conforme for o caso, carecendo a sua atribuição de pedido do interessado que seja proprietário do prédio ou tenha com este celebrado contrato, nos termos do presente diploma”.
Por sua vez, lê-se no art. 2º que: “Para efeitos deste diploma, entende-se por: «licença de exploração» o título que legitime o seu titular a explorar uma determinada pedreira nos termos do presente diploma e das condições de licença” (al. l)); e por “«licença de pesquisa» o título que legitime o seu titular a proceder à atividade de pesquisa nos termos do presente diploma e nas condições da licença”.
Nos arts. 12º a 18º estabelece-se o regime do contrato de exploração de pedreira, em que se dispõe que esse contrato pode prever a pesquisa e a exploração, caso em que legitima o seu titular a requerer a atribuição de ambas as licenças, isto é, a licença de pesquisa e a licença de exploração, ou só a exploração, caso em que legitima o seu titular a requerer apenas esta última licença (n.º 1 do art. 12º), sujeitando, contudo, em qualquer dos casos o contrato de pesquisa e/ou exploração de pedreira celebrado entre o proprietário do prédio e um terceiro obrigatoriamente a escritura pública (n.º 2 do art. 12º).
Com relevo para os presentes autos, o art. 18º, n.º 1 daquele diploma estabelece que o contrato de pesquisa e/ou de exploração de pedreira cessa, entre outros casos, quando a licença de exploração não seja requerida pelo titular da licença de pesquisa no prazo de um ano após o termo de vigência desta (al. c), do n.º 1, do art. 18º), ou quando se verifique cessação dos efeitos jurídicos da licença (al. e), do n.º 1, do art. 18º).
Pondo de lado o processo de concessão da licença de pesquisa, por irrelevante para o caso decidendum nos autos, e centrando-nos no processo de atribuição da licença de exploração de pedreira, esse processo encontra-se regulado no Capítulo VI, que tem por epígrafe: “Da atribuição da licença de exploração”.
No art. 28º, n.º 1, lê-se que: “O requerente de uma licença de exploração deve apresentar à entidade licenciadora, em duplicado e igualmente em suporte digital, os seguintes documentos: (…)”.
Por sua vez, estabelece o art. 28º que a entidade licenciadora deve emitir o recibo de recebimento e devolvê-lo ao requerente (n.º 1) e que a data do recibo representará, para todos os efeitos legais, a data de início do procedimento para obter uma licença de exploração (n.º 2), devendo a decisão sobre o pedido de licenciamento de exploração ser proferida no prazo de 80 dias, contados da data da apresentação do requerimento (n.º 3).
Se o requerimento inicial não satisfizer o disposto no artigo anterior, a entidade licenciadora solicita ao requerente, no prazo de 10 dias, os elementos em falta, suspendendo-se os prazos do procedimento até à apresentação destes (n.º 4, do art. 28º).
O requerimento inicial em que o requerente solicita a emissão de licença de exploração de pedreira pode ser liminarmente indeferido, nos termos do art. 30º, n.º 7, após audição do requerente pela entidade licenciadora (n.º 5, do art. 28º).
E, no caso de pedido de licença de exploração de pedreira sujeito a avaliação de impacte ambiental, o procedimento regulado neste artigo suspende-se até à data em que a entidade licenciadora tiver conhecimento da declaração de impacte ambiental (DIA) – n.º 9, do art. 28º.
Em suma, a partir de 13/10/2007, data da entrada em vigor do D.L. n.º 340/2007, de 12/10, que reviu o D.L. n.º 270/2001, de 06/10 (art. 7º do D.L. n.º 340/2007), a pesquisa e a exploração de massas minerais (pedreiras) passou a estar condicionada a, respetivamente, licença de pesquisa e/ou licença de exploração, conforme os casos, tendo essa licença de ser requerida à entidade licenciadora pelo proprietário da parcela de terreno onde se irá efetuar a pesquisa ou a exploração da pedreira ou pelo terceiro com quem esse proprietário celebrou, respetivamente, o contrato de pesquisa ou o contrato de pesquisa e de exploração ou apenas o contrato de exploração de pedreira.
Condição para que seja atribuída a licença de exploração de pedreira a terceiro não proprietário do terreno em que a pedreira a explorar se encontre instalada, como é o caso sobre que versam os autos, é que esse terceiro tenha celebrado com o proprietário do terreno onde a pedreira se encontra instalada um contrato de exploração de pedreira, o qual terá de ser obrigatoriamente celebrado através de escritura pública.
O terceiro que pretenda a emissão de licença de exploração da pedreira (sem a qual não a poderá explorar), terá de requerer à entidade licenciadora competente a emissão dessa licença, apresentando-lhe para o efeito o requerimento previsto no n.º 1 do art. 24º, instruído com a documentação aí elencada, sendo a entrada desse requerimento junto da entidade licenciadora que dá início ao processo de licenciamento.
A entidade licenciadora terá um prazo de 80 dias, a contar da data de entrada desse requerimento, para proferir decisão de diferimento ou indeferimento de emissão da licença de exploração de pedreira.
O requerimento de emissão da licença de exploração de pedreira pode ser liminarmente indeferido, nos casos previstos no art. 30º, n.º 7, após audição do requerente pela entidade licenciadora (n.º 6, do art. 28º).
Não havendo fundamento para o indeferimento liminar do pedido de emissão de licença de exploração, mas caso o requerimento não venha instruído com os documentos previstos no n.º 1, do art. 28º, a entidade licenciadora notifica o requerente para que apresente os documentos em falta, ficando “os prazos do procedimento” suspensos até à apresentação dos elementos em falta (n.º 4, do art. 28º), isto é, o prazo de 80 dias fixado legalmente à entidade licenciadora para que profira decisão final de deferimento ou indeferimento de emissão da licença fica suspenso enquanto os elementos em falta não forem apresentados pelo requerente da licença, assim se obstando ao deferimento tácito desse pedido de concessão de licença de exploração de pedreira, o mesmo acontecendo nos casos em que o pedido de licença de exploração de pedreira esteja sujeito a avaliação de impacte ambiental, caso em que o prazo de 80 dias para a entidade licenciadora proferir decisão final fica igualmente suspenso até à data em que essa entidade tiver conhecimento do estudo de avaliação de impacte ambiental (n.º 9, do art. 28º).
Passando ao regime excecional fixado no art. 5º do DL n.º 340/2007, que rege para as pedreiras que se encontravam em exploração em 13/10/2007, data da entrada em vigor deste diploma, mas que não dispunham de qualquer licença de exploração de pedreira, o n.º 1 desse art. 5º impôs que os exploradores de pedreiras que se encontrassem nas condições acabadas de enunciar (pedreiras em exploração mas não licenciadas), solicitassem à entidade licenciadora, no prazo de seis meses a contar da data da entrada em vigor do DL. n.º 340/2007, a adaptação das respetivas explorações às exigências impostas por este diploma.
Recebido esse pedido, a entidade licenciadora promove um grupo de trabalho, coordenado pela própria entidade licenciadora e composto por um representante da DRE, um representante da Câmara Municipal e um representante da CCDR territorialmente competente ou do ICNB, I.P., se a exploração se situar em área classificada (n.º 2, do art. 5º do DL. n.º 340/2007).
Uma vez constituído esse grupo de trabalho, deverá reunir no prazo de 15 dias úteis para definir e calendarizar as ações a desenvolver com vista à apreciação do pedido de regularização da pedreira (n.º 5, do art. 5º).
Esse grupo de trabalho dispõe de um prazo de seis meses para fazer as visitas ao local das pedreiras e um prazo de doze meses para emitir uma decisão sobre o pedido de regularização da exploração, a qual deve ser adotada por maioria, podendo assumir uma das seguintes formas: (i) decisão favorável; (ii) decisão favorável condicionada; ou (iii) decisão desfavorável (n.º 7 do art. 5º).
Quando o grupo de trabalho emita uma decisão favorável condicionada e esse condicionamento resultar da necessidade de compatibilização da exploração com os planos de ordenamento do território vigentes, com restrições de utilidade pública ou com áreas abrangidas pela Rede …, a decisão do grupo de trabalho exige os votos favoráveis dos representantes da Câmara Municipal e da CCDR ou do ICNB,I.P., só podendo a licença de exploração ser emitida após a referida compatibilização ter lugar (n.º 8, do art. 5º).
Se o grupo de trabalho emitir uma decisão favorável ou uma decisão favorável condicionada, a entidade licenciadora notifica o requerente da decisão e fixa um prazo compreendido entre seis meses a um ano para que este apresente à entidade licenciadora o pedido de atribuição de licença (n.º 9, do art. 5º).
Por sua vez, até que seja emitida a licença prevista no n.º 8, é permitida a exploração da pedreira a título provisório, pelo prazo de um ano a contar da notificação da decisão favorável condicionada, findo o qual, não se verificando a compatibilização referida no número anterior, a entidade licenciadora notifica o proprietário da exploração da pedreira para o encerramento do sítio nos termos dos números seguintes (n.º 10, do art. 5º).
Se o grupo de trabalho emitir uma decisão desfavorável ao pedido de regularização da pedreira, a entidade licenciadora, mediante decisão fundamentada que atenda à dimensão da exploração e ao tipo de intervenções a efetuar para o seu encerramento e recuperação, define um prazo para o encerramento do sítio, a fixar entre um mínimo de 6 e um máximo de 18 meses, e estabelece as condições técnicas de exploração e recuperação que o proprietário da exploração tem de cumprir até ao termo do prazo fixado, devendo nesse período ser efetuado acompanhamento que verifique o cumprimento do estabelecido (n.º 11, do art. 5º).
E, finalmente, o não cumprimento das condições referidas no número anterior implica o encerramento da exploração após um período para a finalização dos trabalhos de recuperação e fecho do sítio (n.º 12, do art. 5º).
Analisado o regime legal que se acaba de transcrever, contrariamente ao que parece ser a posição da apelante, o mencionado regime especial não permite ao explorador de pedreira que se encontrasse em laboração à data da entrada em vigor do DL. n.º 340/2007, de 12/10, mas sem licenciamento, a obtenção da licença de exploração de pedreira, mas permite-lhe apenas recorrer a um processualismo célere e desburocratizado tendente a obter uma decisão favorável ou uma decisão favorável condicionada a esse licenciamento, que lhe permitirá colocar em marcha o regime de licenciamento previsto no DL. n.º 210/2001, de 06/10, na redação introduzida pelo DL n.º 340/2007, de 12/10, conforme resulta do disposto no n.º 9 do art. 5º deste último diploma, onde expressamente se estabelece que a emissão de “uma decisão favorável ou uma decisão desfavorável” dá lugar à notificação do requerente para, num “prazo compreendido entre seis meses a um ano apresente à entidade licenciadora o pedido de atribuição da licença de exploração instruído nos termos do art. 27º do DL. n.º 270/2001”. E é a data de entrada desse requerimento junto da entidade licenciadora que, nos termos do n.º 3, do art. 28º do DL. n.º 270/2001, na redação introduzida pelo DL. n.º 340/2007, que representa, “para todos efeitos legais, a data de início do procedimento para obter uma licença de exploração”.
Posto isto, revertendo ao caso dos autos, cotejada a facticidade apurada, verifica-se que a apelante, por requerimento datado de 10 de abril de 2008, apresentou junto do Ministério da Economia requerimento de adaptação da pedreira, ao abrigo do disposto no art. 5º do citado DL. n.º 340/2007, de 12/10, pedreira essa que se encontrava já explorar, mas sem o necessário título, uma vez que o contrato de exploração da pedreira que aquela celebrou com o Conselho Diretivo dos Baldios de M. e R., mediante o qual este lhe cedeu o direito à exploração da pedreira apenas veio a ser celebrado por escritura pública outorgada em 08/05/2009 (cfr. pontos 24º e 25º dos factos apurados).
Mais se provou que, por despacho proferido em 20/01/2011, notificado à apelante em 25/01/2011, o Diretor Regional da Economia do Norte concedeu licença de exploração, a título provisório, da pedreira, pelo prazo de um ano, a contar da notificação desse despacho à apelante, consignando que deveriam ser cumpridas as condições propostas no grupo de trabalho, nomeadamente a apresentação de estudo de impacte ambiental e que, caso não cumprisse com essas condições dentro do prazo de um ano concedido, deveria proceder ao encerramento da pedreira, nos termos dos n.ºs 11 e 12º do DL n.º 340/2007, de 12/10 (cfr. pontos 28º, 29º e 30º dos factos apurados).
Finalmente, provou-se que, por escrito datado de 30/01/2012, a apelante solicitou ao Ministério da Economia o envio de uma segunda via de um documento e, em 18/10/2012, informou-o que foi contratada uma empresa para a correta instrução do processo de licenciamento, vindo a apelante a apresentar o estudo de impacte ambiental em 18/09/2013, mas este foi declarado desconforme (cfr. pontos 31º, 32º e 33º dos factos apurados).
Resulta do exposto que, não beneficiando a pedreira explorada pela apelante de licença de exploração de pedreira, esta, em 10/04/2008, recorreu ao mecanismo excecional previsto no art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 12/10, vindo a entidade licenciadora, Ministério da Economia, por decisão de 20/01/2011, notificada à apelante em 25/01/2011, a emitir uma decisão favorável condicionada à exploração da pedreira, pelo prazo de um ano, a contar da notificação à apelante dessa decisão, nos termos do n.º 10, do art. 5º daquele Decreto-Lei, e notificando a última para que cumprisse as condições constantes da proposta do grupo de trabalho, nomeadamente apresentando um estudo de impacte ambiental, sob pena de dever proceder ao encerramento da pedreira decorrido o prazo de um ano de licenciamento provisória da exploração da pedreira, nos termos dos n.ºs 11 e 12 daquele art. 5º.
Como bem decidiu a 1ª Instância, o título provisório assim concedido pela entidade licenciadora, nos termos do n.º 10, do art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 12/10, permitia à apelante continuar a exploração da pedreira por um prazo de um ano, a contar de 25/01/2011, data em que essa decisão favorável condicionada à exploração da pedreira foi notificada pela entidade licenciadora à apelante.
Logo, dentro do prazo de um ano em que a entidade licenciadora licenciou provisória e condicionalmente a pedreira, isto é, até 25/01/2012, a apelante, nos termos do disposto no n.º 9 do art. 5º do DL. 340/2007, tinha de apresentar à entidade licenciadora pedido de atribuição de licença de exploração instruído nos termos do art. 27º, do DL. n.º 270/2001, de 06/10, na redação introduzida pelo DL. n.º 340/2007, de 12/10, juntamente com o estudo de impacte ambiental e o comprovativo do cumprimento das demais condicionantes que lhe foram impostas pelo grupo de trabalho.
O prazo de um ano que a entidade licenciadora fixou como prazo de validade da licença provisória e para a apelante cumprir as condições acabadas de enunciar para licenciar a exploração da pedreira em termos definitivos é um prazo de caducidade, posto que, à semelhança do que acontece no direito civil, em que o art. 298º, n.º 2 do CC, dispõe que “quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deve ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”, também no âmbito do direito administrativo a regra é a caducidade (36).
Daí que não se dispondo expressamente no art. 5º, n.º 10 do DL. n.º 340/2007, que o prazo de um ano que prevê seja um prazo prescricional, tem de se entender estarmos na presença de um prazo de caducidade.
No âmbito do direito civil, em sentido técnico rigoroso, a caducidade “é o instituto pelo qual os direitos que, por força da lei ou da convenção, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo não exercício durante esse prazo”. O fundamento do instituto é a necessidade de certeza jurídica, que exige, por considerações de interesse público, a fixação de certo prazo para o exercício de alguns direitos, decorrido o qual o direito extingue-se (37). Daí que a caducidade leve à extinção automática do direito por mero decurso do prazo.
Entendeu a 1ª Instância que, no âmbito do direito administrativo, a caducidade também opera automaticamente a extinção do direito pelo mero decurso do tempo, o que não se subscreve.
Na verdade, sobre a figura da caducidade em sede de direito administrativo debruçou-se o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, expendendo que: “a caducidade em direito administrativo tem sempre por fundamento um interesse público específico, pelo que o regime da caducidade há-de sempre depender da finalidade concreta que dita o prazo para o exercício de cada direito. (…). Sobretudo quando a caducidade assume a natureza de uma verdadeira sanção por incumprimento, os autores são unânimes no sentido de que o efeito extintivo depende de uma declaração administrativa no âmbito de um procedimento prévio. O procedimento é o instrumento privilegiado que permitirá à Administração verificar e apreciar as causas de caducidade, examinar a conduta do particular para averiguar em que medida o incumprimento é imputável ao titular do direito, se existem ou não causas de força maior ou circunstâncias alheias à vontade do particular, avaliar se deve haver ou não lugar à reabilitação do direito em causa por razões de interesse público, etc. Por sua vez, o particular terá oportunidade, em sede de audiência prévia, de invocar argumentos tendentes a demonstrar a não procedência das causas de caducidade, se for caso disso, ou a reabilitação do direito, etc. Podemos dizer que o caráter não automático que a caducidade assume em geral no direito administrativo advém, (…), da presença da Administração e da sua vinculação à prossecução do interesse público, de modo a evitar o sacrifício de interesses, bem como soluções injustas e absurdas. (…), o automatismo resolutivo é gerador de insegurança jurídica, pois deixa sem que se saiba se o ato administrativo se extinguiu ou não. Além disso, não é compaginável com qualquer juízo de ponderação, com vista a averiguar se o efeito extintivo é adequado e exigível (princípio da proporcionalidade) no confronto com o interesse público e outros bens jurídicos em jogo no caso concreto” (38).
Note-se que a declaração da caducidade, como ato final de um procedimento no âmbito do qual tem de ser garantido ao interessado o direito de audiência prévia, se impõe mesmo naqueles casos em que a administração não dispõe de qualquer margem de discricionariedade perante a lei que não seja a de declarar a caducidade do direito, posto que a declaração de caducidade tem efeitos constitutivos sendo que, como refere Fernanda Maças, “a administração é chamada a valorar as causas do incumprimento, com vista a formular um juízo prévio quanto à sua repercussão na manutenção da relação jurídica em causa” (39).
Revertendo ao caso dos autos, resulta do que se vem dizendo que, apesar da entidade administrativa competente para emitir a licença de exploração da pedreira, no âmbito do procedimento extraordinário previsto no art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 12/10, ter emitido decisão favorável condicionada à emissão dessa licença, no âmbito do que, nos termos do n.º 10 desse art. 5º, concedeu à apelante licença de exploração da pedreira, a título provisório, pelo prazo de um ano, a contar de 25/01/2011 (data da notificação desse ato administrativo à apelante), condicionando a emissão da licença definitiva ao cumprimento pela última das condições constantes do parecer emanado pelo grupo de trabalho, nomeadamente a apresentação de estudo de impacte ambiental e a apresentação de requerimento junto daquela nos termos do disposto no art. 27º, n.º 1, do DL. n.º 270/2001, de 06/10, na redação introduzida pelo DL. n.º 340/2007, de 12/10, e apesar da apelante não te cumprido nenhuma dessas condições, diversamente do decidido pela 1ª Instância, essa licença de exploração provisória e precária da pedreira não caducou pelo mero decurso do prazo de um ano sem que a apelante tivesse cumprido com nenhuma das condições que a entidade licenciadora lhe impôs à emissão da licença definitiva de exploração da pedreira.
Na verdade, para que a caducidade da licença provisória e precária tivesse caducado seria necessário que, uma vez decorrido o prazo de validade de um ano dessa licença, a entidade licenciadora tivesse instaurado um procedimento administrativo destinado ao encerramento da pedreira, no âmbito do qual teria de observar o direito de audiência prévia que assiste à apelante, conforme o determina os n.ºs 10 e 11 do art. 5º do DL. n.º 340/2007, e é entendimento unanime doutrinal e jurisprudência no âmbito do direito administrativo.
Ao que se acaba de concluir não obsta o facto da entidade administrativa ter notificado a apelante que, caso não cumprisse com as condições que lhe impôs deveria “proceder ao encerramento do sítio de acordo com as condições previstos nos n.ºs 11 e 12, do D.L. n.º 340/2007, de 12/10”, na medida em que, conforme resulta do antedito, e é expressamente estabelecido no nº 10, do art. 5º do DL n.º 340/2007, a decisão de encerramento da pedreira e a notificação da apelante para essa decisão teria de ser proferida pela entidade licenciadora no âmbito de um procedimento administrativo, no qual teria de ser assegurado o direito da apelante à audiência prévia, procedimento esse que teria de ser instaurado mal se mostrasse decorrido o prazo de validade de um ano da licença provisória e precária, sem que a apelante tivesse cumprido as condições que a entidade licenciadora lhe impôs, ou seja, a partir de 25/01/2012.
E a essa não caducidade da licença provisória e precária de exploração da pedreira não obsta igualmente o facto de, nos termos dos n.ºs 10 e 11 do art. 5º, a entidade licenciadora, uma vez decorrido o prazo de um ano de validade dessa licença, sem que a apelante tivesse cumprido as condições que lhe impôs para emitir a licença definitiva não dispor de qualquer grau de discricionariedade quanto à instauração ou não do procedimento e à decisão de encerramento da pedreira nele a proferir, limitando-se a exercer um poder vinculado, legalmente estabelecido, e que lhe é imposto pelos identificados preceitos, resumindo-se o seu campo de oportunidade na fixação do prazo em que a apelante teria de encerrar a pedreira em causa, prazo esse que, em função da dimensão da pedreira e do tipo de intervenções a efetuar para o seu encerramento e recuperação, podia ser fixado entre um mínimo de seis meses e um máximo de 18 meses, e ao estabelecimento das condições técnicas de exploração e recuperação que a apelante teria de cumprir até ao termo do prazo fixado para o encerramento da pedreira, sob pena de ser determinado o imediato encerramento desta (n.º 12, do art. 5º).
Na verdade, conforme antedito, a necessidade da entidade licenciadora ter de instaurar o procedimento administrativo de encerramento da pedreira, no âmbito do qual teria de salvaguardar o direito da apelante à audiência prévia, decorrido o prazo de validade de um ano da licença provisória e precária que lhe concedeu, sem que a apelante tivesse cumprido com as condições impostas para a emissão da licença definitiva, não só é uma exigência legal imposta pelo n.º 10, do art. 5º do DL n.º 340/2007, de 12/10, como é uma exigência tida por necessária e essencial pela doutrina e jurisprudência administrativas para que a caducidade da licença provisória e precária opere.
Não tendo a entidade licenciadora instaurado esse procedimento administrativo de encerramento da pedreira após o decurso do prazo de validade da licença provisória e precária de exploração desta, sem que a apelante tivesse cumprido as condições que essa entidade lhe impôs para a emissão da licença definitiva (cfr. pontos 46º e 47º da facticidade apurada), a licença provisória e precária de exploração da pedreira, apesar de apenas ter um prazo de validade de um ano, não caducou, continuando, consequentemente, a apelante a explorar validamente a pedreira ao abrigo dessa licença provisória e precária, apesar de, à data da publicação da DUP, com caráter de urgência, há muito a entidade licenciadora dever ter declarada a caducidade dessa licença e dever tido encerrado a pedreira, conforme, sem qualquer margem de discricionariedade, lhe era imposto pelo n.º 10, do art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 12/10.
Resulta do exposto que, neste conspecto, procede o fundamento de recurso aduzido pela apelante, o que não quer dizer que lhe assista o direito a ser indemnizada pela cessação da exploração da pedreira por via da expropriação da parcela de terreno em que esta se encontrava implantada.
Advoga a apelante que a pedreira estava licenciada à data da DUP, dado que o único impedimento que existia a esse licenciamento era a ausência do estudo de impacte ambiental, cuja exigência pretende ter sido, entretanto, eliminada com a entrada em vigor do DL. n.º 151-B/2013, mas antecipe-se desde já, sem fundamento jurídico.
Com efeito, a apelante apresentou o estudo de impacte ambiental da pedreira junto da entidade licenciadora em 18 de setembro de 2013, mas esse estudo foi declarado desconforme em 15 de janeiro de 2016, pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (cfr. ponto 33 da facticidade apurada).
Acresce que, contrariamente ao pretendido pela apelante, o estudo de impacte ambiental não foi a única condição que a entidade licenciadora lhe impôs para emitir a licença definitiva de exploração da pedreira (cfr. pontos 28º e 29º da facticidade apurada).
Ademais, contrariamente ao propugnado pela apelante, do regime jurídico aprovado pelo DL n.º 151-B/2002, de 31/10, nada permite concluir que o estudo de impacte ambiental deixasse de ser legalmente exigível.
Com efeito, nos termos do art. 1º, n.º 3, al. b), do DL. n.º 151-B/2003, de 31/10, encontram-se sujeitos a estudo de impacto ambiental os projetos tipificados no anexo II que: i) estejam abrangidos pelos limiares fixados; ou ii) se localizem, parcial ou totalmente, em área sensível e sejam considerados, por decisão da AIA, como suscetíveis de provocar impacte significativo no ambiente em função da sua localização, dimensão ou natureza, de acordo com os critérios fixados no anexo II; ou iii) não estando abrangidos pelos limiares fixados, nem se localizando em área sensível, sejam considerados, por decisão da entidade licenciadora ou competente para autorização do projeto e ouvida obrigatoriamente a autoridade de AIA, nos termos do art. 3º, como suscetíveis de provocar impacte significativo no ambiente em função da sua localização, dimensão ou natureza, de acordo com os critérios estabelecidos no anexo III.
E no Anexo II, 2- Industria extrativa - al. a) estabelece-se que as “pedreiras, minas a céu aberto e extração de trufa, não incluídas no Anexo I, em áreas isoladas ou contínuas, no caso geral, o AIA é obrigatório quanto a pedreiras, minas com área igual ou superior a 15 ha, ou com extração de pedra igual ou superior a 200.000 toneladas ano, ou se, em conjunto com outras unidades similares, num raio de 1 Km, ultrapassarem os valores referidos. Em áreas sensíveis, o AIA é obrigatório: limiares previstos para o caso em geral. Análise caso a caso: todas que não se encontrarem abrangidas pelos limiares definidos para o caso geral”.
Acresce dizer que, ainda que o licenciamento definitivo da exploração da pedreira estivesse dispensado do estudo de impacto ambiental, o que, reafirma-se, nada nos autos permite concluir que assim fosse - quando é sobre a apelante que impende o ónus de alegação e prova dos factos tendentes a demonstrar a inexigibilidade desse estudo (arts. 5º, n.º 1 e 342º, n.º 1 do CC), facticidade essa que a mesma não alegou e, por isso, não provou -, a emissão da licença definitiva de exploração da pedreira estava dependente da apresentação pela apelante junto da entidade licenciadora do requerimento a que alude o art. 27º, n.º 1, do DL. n.º 210/2007, de 12/10, na redação introduzida pelo DL. n.º 270/2001, de 06/01, instruído com a documentação comprovativa em como cumpriu as restantes condições que lhe foram impostas pelo grupo de trabalho, na licença de exploração provisória emitida, como condição para a emissão de decisão favorável, que não se cingia apenas ao estudo de impacte ambiental.
Na verdade, como antedito, contrariamente ao que parece ser o entendimento da apelante, o regime previsto no art. 5º do DL. n.º 340/2007, apenas lhe permitia obter uma decisão favorável à emissão da licença de exploração da pedreira, mas não lhe concedia essa licença definitiva, tendo aquela para o efeito de apresentar junto da entidade licenciadora o requerimento a que alude o art. 27º, n.º 1, do DL. n.º 210/2007, de 12/10, na redação introduzida pelo DL. n.º 270/2001, de 06/01, instruindo-o com o estudo de impacte ambiental (ou com a menção de que, na sua perspetiva, esse estudo deixou de ser legalmente exigível na sequência da entrada em vigor do DL n.º 151-B/2003, de 31/10, conforme pretende acontecer, mas está por demonstrar nos autos) e dos documentos comprovativos em como cumpriu as demais condições que lhe foram impostas pelo grupo de trabalho, conforme resulta do disposto no n.º 9 do art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 06/10, e lhe foi notificado pela entidade licenciadora em 25/10/2011, porquanto é a data de entrada desse requerimento junto da entidade licenciadora que, nos termos dos n.ºs 2 e 3 desse art. 5º, representa, “para todos os efeitos legais, a data de início do procedimento para obter uma licença de exploração”.
Ora, não tendo a apelante feito prova, conforme era seu ónus fazer (art. 342º, n.º 1 do CC), em como tivesse dado entrada de tal requerimento junto da entidade licenciadora, e não estando assim comprovado nos autos, sequer em como se tivesse iniciado o procedimento para obtenção da licença de exploração da pedreira, naturalmente que de nada lhe aproveita pretender ter ocorrido licenciamento tácito da licença de exploração da pedreira.
Tendo a publicação da DUP, com natureza urgente, ocorrido em 23/07/2015, data em que a entidade expropriante X, entrou na posse administrativa, ope legis, da parcela de terreno expropriada, e sendo por referência a essa data que, conforme antedito, se impõe averiguar se a apelante dispunha de um qualquer direito real ou obrigacional sobre a parcela de terreno a expropriar que tivesse sofrido uma ablação ou restrição por via da expropriação, que tenha de ser indemnizado, nos termos do art. 62º, n.º 1 do CRP e do disposto nos art. 23º do CE, verifica-se que diversamente do decidido pela 1ª Instância, em 23/07/2015, a apelante mantinha-se na exploração da pedreira situada na parcela de terreno expropriada, procedendo a essa exploração ao abrigo da licença de exploração provisória e precária, com o prazo de vigência de um ano, a contar de 25/01/2011, data em que essa licença lhe foi notificada pela entidade licenciadora, a qual emitiu essa licença ao abrigo do regime jurídico do art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 12/10, e condicionou a emissão da licença de exploração definitiva da pedreira às condições já supra enunciadas.
Apesar da apelante não ter cumprido com essas condições que lhe foram impostas pela entidade licenciadora e do prazo de validade da licença provisória e precária se ter esgotado em 25/01/2012, isto é, há mais de três anos por referência à data da publicação da DUP, com caráter de urgência, respeitante à expropriação da parcela de terreno em que essa pedreira era explorada pela apelante, porque a caducidade dessa licença provisória e precária não operou automaticamente e a entidade licenciadora não diligenciou pelo procedimento administrativo necessário para que essa licença provisória fosse declarada caduca e a pedreira fosse encerrada, conforme lhe era legalmente e sem qualquer margem de discricionariedade imposto pelo n.º 10 do art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 29/10, era ao abrigo dessa licença provisória e precária cujo prazo de validade há muito já tinha decorrido, que a apelante continuava a explorar a pedreira e que a entidade licenciadora lhe emitia as licenças de explosivos necessários a essa exploração e que continuou a explorá-la mesma após a publicação da DUP com caráter de urgência.
Neste contexto fáctico jurídico, a questão que se suscita nos autos é a de saber se assiste à apelante o direito de ser indemnizada pela cessação da exploração da pedreira, em consequência da expropriação da parcela de terreno onde esta se situava e era explorada, questão essa que, salvo melhor entendimento, merece resposta negativa.
Com efeito, apesar de à data da publicação da DUP, com caráter de urgência, a apelante se manter na exploração da pedreira, fazia-o ao abrigo de uma licença de exploração provisória e precária, cujo prazo de validade se encontrava decorrido há mais de três anos.
A entidade licenciadora submeteu a concessão à apelante da licença definitiva de exploração da pedreira a uma série de condições.
A apelante não cumpriu com nenhuma dessas condições até à data da publicação da DUP.
Decorrido o prazo de um ano de vigência da licença provisória e precária, sem que a apelante tivesse cumprido as condições que lhe foram impostas para que fosse emitida a licença definitiva, a entidade licenciadora não dispunha de qualquer margem de discricionariedade para deixar de instaurar o procedimento que lhe era imposto pelos n.ºs 10 e 11 do art. 5º do DL 340/2007, de 12/10, com vista ao encerramento da pedreira, pelo que, a partir de 25/01/2012 (data do termo de vigência da licença provisória) essa entidade, por imposição legal, tinha de dar início ao procedimento destinado ao encerramento da pedreira.
A única margem discricionariedade de que gozava a entidade licenciadora era-lhe conferido pelo n.º 11, do art. 5º do DL n.º 340/2007, que lhe permitia, uma vez instaurado o procedimento administrativo para o encerramento da pedreira (em relação ao qual, reafirma-se, não gozava de nenhuma margem de discricionariedade, estando a sua atuação vinculada por determinação legal), cumprido o direito de audiência prévia que assistia à apelante, “mediante decisão fundamentada”, atendendo à dimensão e ao tipo de intervenção a efetuar para o encerramento da pedreira e recuperação do local, fixar o prazo de encerramento da pedreira entre um mínimo de 6 e um máximo de 18 meses, e estabelecer as condições técnicas de exploração e recuperação que a apelante tinha de cumprir durante esse período e que a entidade licenciadora tinha de acompanhar.
Logo, não fora a conduta omissiva da entidade licenciadora, que certamente imbuída pelos interesses económicos e sociais que tentou preservar, ao permitir que a apelante continuasse a explorar a pedreira, mas com a postergação dos interesses ambientais que o n.º 10, do art. 5º priorizou ao determinar que findo o prazo de um ano a contar da notificação da apelante da decisão favorável condicionada, sem que se verificasse as condicionantes a que a entidade licenciadora subordinou a emissão da licença de exploração definitiva, esta tinha de notificar aquela para proceder ao encerramento da pedreira, conforme antedito, a única margem de oportunidade de que a entidade licenciadora beneficiava respeitava ao prazo de encerramento da pedreira, o qual, contudo, nunca poderia exceder os dezoito meses.
Ora, caso a entidade licenciadora tivesse cumprido com a imposição legal do n.º 10, do art. 5º do DL. n.º 340/2007, de 12/10, conforme lhe era imposto sem qualquer margem de discricionariedade que fizesse, ainda que a mesma tivesse dado à apelante o prazo máximo legalmente permitido de 18 meses para que a apelante procedesse ao encerramento da pedreira, à data da publicação da DUP, há muito que essa pedreira estaria encerrada.
Destarte, não foi o ato expropriativo da parcela de terreno onde a apelante explorava a pedreira que determinou o encerramento desta, mas esse encerramento foi antes determinado pelo facto da apelante ter procedido à exploração dessa pedreira sem cuidar de licenciar a exploração desta em termos definitivos, mantendo-se na exploração da pedreira mesmo depois do prazo de um ano de validade da licença provisória e precária que lhe foi concedida pela entidade licenciadora se ter esgotado, não cumprindo com as condições que esta lhe impôs para a emissão da licença de exploração definitiva da pedreira e aproveitando-se da inércia dessa entidade licenciadora que, sem que lhe assistisse qualquer margem de oportunidade, não diligenciou pela instauração do procedimento necessário ao encerramento da pedreira.
Neste contexto fáctico jurídico, bem conhecido pela apelante, é indiscutível que àquela não assiste qualquer direito indemnizatório por via do ato expropriativo, o qual, ao determinar o encerramento da pedreira apenas pôs termo a uma situação de ilegalidade.
De resto, a conduta omissiva da entidade licenciadora perante o comportamento da apelante, que esta não ignorava, nem sequer podia ignorar, em nada prejudicou a apelante. Pelo contrário, beneficiou-a, ao permitir-lhe obter uma situação de vantagem ou de privilégio em relação aos exploradores de pedreiras que, encontrando-se na mesma situação em que se encontra a pedreira da apelante, isto é, com o prazo de vigência da licença provisória e precária há muito decorrido e sem que tivesse cumprido com as condições que lhe foram impostas pela entidade licenciadora para que fosse emitida a licença de exploração definitiva da pedreira, viram a entidade licenciadora, conforme lhe era legalmente imposto pelo n.ºs 10 e 11 do DL. n.º 340/2007, a instaurar o processo tendente ao encerramento das respetivas pedreiras e viram estas encerradas há muito quando foi publicada a DUP.
Ora, porque a apelante não pode beneficiar da omissão em que incorreu a entidade licenciadora perante o comportamento daquela, quando na base dessa omissão está o próprio comportamento ilegal da apelante, que explorava a pedreira sem a ter licenciada em definitivo e sem cumprir as condições que lhe foram impostas para o efeito, nem pode pretender ser privilegiada em relação aos demais exploradores de pedreiras com quem a administração não adotou esse comportamento omissivo e porque a apelante não podia ter qualquer expectativa antes da publicação da DUP, a vir a continuar a exploração da pedreira, uma vez que, a qualquer momento a entidade licenciadora poderia pôr termo a essa sua inércia e instaurar o procedimento administrativo tendente ao encerramento da pedreira, conforme lhe era legalmente imposto que há muito tivesse feito, obsta que se reconheça àquela o direito a receber qualquer indemnização pela expropriação da parcela de terreno em que continuava a explorar a pedreira à data da publicação da DUP e mesmo após a publicação desta (40).
Ao que se acaba de concluir não obsta a circunstância de, entretanto, em 06/01/2015, ter entrado em vigor o DL. n.º 165/2014, de 05/11, que aprovou, com caráter extraordinário, o regime de regularização e de alteração e/ou ampliação de estabelecimentos e explorações de atividades industriais, pecuárias, de operações de gestão de resíduos com instrumentos de gestão territorial e ou condicionantes do uso do solo, em que o legislador, tendo em consideração que “a criação de um contexto favorável ao investimento é uma prioridade, (…), uma vez que dele depende o crescimento económico sustentável, incluindo a dinamização do investimento privado e do emprego”, (…) considerou essencial “avaliar a possibilidade de regularização de um conjunto significativo de unidades produtivas que não dispõem de título de exploração ou de exercício válido face às condições atuais da atividade, designadamente por motivo de desconformidade com os planos de ordenamento do território vigentes ou com servidões administrativas e restrições de utilidade pública” (41), criou um mecanismo excecional de regularização, entre outros, das pedreiras.
No âmbito desse mecanismo excecional, o legislador permitiu que os estabelecimentos e explorações que, à data da entrada em vigor desse diploma, não dispusessem de título válido de instalação ou de título de exploração ou de exercício de atividade, incluindo as situações de desconformidade com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares ou com servidões administrativas e restrições de utilidade pública, que tivessem comprovadamente exercido atividade por um período mínimo de dois anos e se encontrassem, à data da entrada em vigor desse diploma, em atividade ou cuja atividade tivesse sido suspensa há menos de um ano ou cuja laboração se encontrasse suspensa por autorização da entidade licenciadora, por um período máximo de três anos, pudessem submeter-se ao pedido de regularização excecional que institui (arts. 1º e 2º do DL. n.º 165/2014, de 05/11).
Para tanto, no prazo de um ano a contar da entrada em vigor do referido DL. 165/2014, de 05/11 (prazo esse que, entretanto, foi prorrogado por mais um ano, pelo art. 1º da Lei n.º 21/2016, de 19/07, com efeitos a 02/01/2016), essas entidades tinham de apresentar os enunciados pedidos de regularização das suas atividades.
Com efeito, a apelante apenas apresentou esse pedido de regularização excecional e extraordinário de laboração da pedreira em 14/07/2017, ou seja, já após a publicação, em 23/07/2015, da DUP, com caráter de urgência (cfr. pontos 1º e 52º dos factos provados) e, consequentemente, numa altura em que já era inviável o licenciamento dessa pedreira.
De resto, a dar-se qualquer relevância à possibilidade da apelante puder obter a regularização da exploração da pedreira, no âmbito desse regime extraordinário e excecional, aprovado pelo DL. n.º 165/2014, de 05/11, e a considerar-se, conforme pretende a apelante acontecer, que essa regularização apenas foi inviabilizada pela DUP, estaríamos não só a esquecer que foi a inércia da apelante em licenciar a pedreira e em não cumprir as condicionantes que lhe foram impostas pela entidade licenciadora para aprovar, em definitivo, a exploração da pedreira que determinou o encerramento da pedreira e, bem assim, que esta já tinha em muito beneficiado com a inércia da entidade licenciadora ao não promover o encerramento da pedreira e estariamos a conceder-lhe novo privilégio ao permitir-se que, aproveitando-se dessa inércia da entidade licenciadora ao não encerrar a pedreira, se manteve na exploração desta e a arbitrar-lhe uma indemnização por via da entrada em vigor desse novo regime excecional que lhe permitia regularizar essa expropriação, quando a mesma recorreu a esse regime apenas após a publicação da DUP, violando-se o disposto na al. d), do n.º 2. do art. 23º do CE, e quando os restantes exploradores de pedreiras que se encontravam nas mesmas condições fáctico-jurídicas em que se encontrava a apelante, mas em relação aos quais a entidade licenciadora atuou, conforme lhe era imposto legalmente, ordenando o encerramento de tais pedreiras antes da publicação da DUP não assistiria qualquer direito indemnizatório, situação de desigualdade essa que naturalmente não tem, nem pode ter, qualquer amparo na lei.
Sustenta a apelante que a expropriante X sempre teve conhecimento das concretas condições em que funcionava a pedreira, nomeadamente, que a apelante estava a regularizar o seu funcionamento, que dispunha de autorização de funcionamento da pedreira e sempre teve perfeito conhecimento que a expropriação da parcela de terreno implicaria a impossibilidade de se dar continuidade à exploração da pedreira e ao procedimento de regularização do licenciamento e, apesar disso, aceitou o compromisso de compensar aquela pelos prejuízos sofridos por via do ato expropriativo, pelo que, ao assumir agora a pretensão de que não lhe assiste qualquer direito indemnizatório age em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.
Como é sabido, o instituto do abuso de direito encontra-se regulado no art. 334º do CC e tem por escopo obtemperar a situações em que a concreta aplicação de um preceito legal que confere um direito subjetivo a uma determinada pessoa, na normalidade das situações seria ajustado, mas na concreta relação jurídica estabelecida entre credor e devedor, o exercício do direito pelo modo como é operado pelo seu titular, se revela injusto e fere o sentimento de justiça dominante na sociedade.
Trata-se, pois, de uma válvula de segurança, uma das cláusulas gerais com que o legislador visa obtemperar a injustiça chocante e reprovável para o sentimento jurídico prevalecente na comunidade social.
No abuso de direito não está em causa a violação de um direito de outrem, nem sequer a ofensa de uma norma tuteladora de um interesse alheio, mas o exercício anormal de um direito por parte do seu titular, que o exercita em termos considerados reprováveis pela ordem jurídica, posto que, apesar de respeitar a estrutura formal do direito que a lei lhe reconhece, atentas as particularidades do caso concreto e o modo como o exercita, viola a afetação substancial, funcional ou teleológica do direito em causa.
Um dos limites que o art. 334º impõe ao exercício do direito é a boa-fé. Atuar de boa fé é fundamentalmente a consideração razoável e equilibrada dos interesses dos outros, a honestidade e a lealdade dos comportamentos e, designadamente, na celebração e execução dos negócios jurídicos. Trata-se de uma cláusula geral de direito privado que cabe às partes observar tanto na conclusão do contrato, como nos seus preliminares, na formação deste (art. 227º do CC), assim como na respetiva execução (art.762º do CC). A boa-fé configura um conceito indeterminado que cabe ao intérprete preencher casuisticamente, de acordo com as circunstâncias específicas do caso e as convicções dominantes na sociedade em cada momento histórico. Agir de boa de fé significa atuar com diligência, zelo e lealdade, correspondente aos legítimos interesses da contraparte; é ter uma conduta honesta e conscienciosa, uma linha de correção e probidade, a fim de não prejudicar os legítimos interesses da contraparte, e não proceder de modo a alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável poderia tolerar.
Acresce que o titular do direito encontra-se obrigado, no exercício deste, a respeitar os bons costumes, ou seja, as regras morais e de conduta social generalizadamente reconhecidas, em dado momento, numa determinada sociedade histórica. Trata-se do conjunto de regras de comportamento social, familiar e deontológico que, não estando codificadas, são consensuais, pelo menos, nos casos limite, numa determinada sociedade e num dado momento histórico e que, por isso, são acolhidas pelo direito.
Finalmente, o titular do direito encontra-se obrigado a respeitar, no exercício do seu próprio direito, o fim social ou económico deste, isto é, a respeitar a configuração real do direito, a apurar através de interpretação. Se um direito é atribuído a um determinado sujeito com uma determinada finalidade, já não existirá direito quando o seu titular desrespeita a norma constitutiva do direito que lhe é reconhecido por lei, isto é, o fim visado pela norma que lhe atribui e reconhece o direito.
Note-se, contudo, que reconhecendo a ordem jurídica o direito a um determinado sujeito, não é qualquer exercício anormal desse direito pelo seu titular que acarreta um exercício abusivo e impõe que se neutralize esse exercício mediante recurso ao instituto do abuso do direito. Para que essa neutralização seja consentida exige-se que o abuso no exercício do direito seja “manifesto”, isto é, que o direito seja exercitado pelo seu titular em termos objetivos de modo clamorosamente ofensivos da justiça ou do sentimento jurídico socialmente dominante.
Uma das modalidades do abuso de direito é o “venire contra factum proprium”.
Nessa tipologia existirá abuso de direito, de um modo geral, quando o titular de um direito, mediante o seu exercício visa “extinguir certa relação subjetiva, recorrendo ao direito de anular, resolver, revogar ou denunciar o negócio que lhe serviu de fonte, depois de fazer ver à parte contrária (…) que não exerceria esses direitos” (42).
O venire contra factum proprium traduz, assim, por parte do titular do direito, uma traição à confiança depositada por aquele contra quem o direito é exercido, decorrente de uma conduta anterior do titular daquela, geradora da confiança legítima na contraparte de que esse direito jamais seria exercido pelo seu titular.
A mencionada modalidade de abuso de direito baseia-se, assim, na tutela da confiança e exprime a reprovação social e moral que recai sobre aquele (o titular do direito) que assume comportamentos contraditórios, resumindo-se à ideia de que a ninguém é permitido agir contra o seu próprio ato/comportamento, assentando, por isso, o abuso numa estrutura que pressupõe duas condutas da parte do titular do direito, ambas lícitas, ainda que assumidas em momentos temporais distintos, em que a primeira conduta (factum proprium) é contrariada pela segunda (venire contra) (43).
Na linha do que se vem dizendo, Menezes Cordeiro, in “Revista da Ordem dos Advogados”, ano 58, julho de 1998, pág. 964, escreve que são quatro os pressupostos da proteção da confiança ao abrigo da figura do “venire contra factum proprium”: 1º- uma situação de confiança, traduzida na boa-fé própria da pessoa que acredite numa conduta alheia (no factum proprium); 2º- uma justificação para essa confiança, ou seja, que essa confiança na estabilidade do factum proprium seja plausível e, portanto, sem desacerto dos deveres de indagação razoáveis; 3º- um investimento de confiança, traduzido no facto de ter havido por parte do confiante o desenvolvimento de uma atividade na base do factum proprium, de tal modo que a destruição dessa atividade (pelo venire) e o regresso à situação anterior se traduzam num injustiça clara; 4º- uma imputação da confiança à pessoa atingida pela proteção dada ao confiante, ou seja, que essa confiança (no factum proprium) lhe seja de algum modo recondutível”.
Ainda Batista Machado, para quem são pressupostos do abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium: a- a verificação de uma situação objetiva de confiança: a conduta de alguém que possa ser entendida como vinculante em relação a uma situação futura; b- o investimento na confiança e irreversibilidade desse investimento: a outra parte, com base na situação criada, organiza planos de vida de que surgirão danos se a sua confiança legítima lhe vier a ser frustrada; e a c- boa fé da contraparte que confiou: nos casos de divergência entre a intenção aparente do responsável pela confiança e a sua intenção real, a contraparte só é merecedora de proteção jurídica se estiver de boa fé (por desconhecer aquela divergência) e tenha agido com cuidado e precaução usuais ao tráfico jurídico” (44).
Assentes nas premissas acabadas de enunciar, é certo que a expropriante não entrou na posse material efetiva da parcela de terreno mal a DUP, com caráter de urgência, foi publicada e comunicou à apelante que iria deixar caducar a DUP, situação que permitiria à ultima continuar a exploração da pedreira (cfr. factos alegados e confessados pela própria X, nos pontos 22º a 27º da contestação apresentou a fls. 29 a 44 dos autos), numa altura em que já tinha conhecimento que a apelante não dispunha de licença de exploração da pedreira, e que a única licença de que dispunha era a licença provisória e precária acima já identificada, cujo prazo de validade há muito se encontrava esgotado (cfr. factos alegados e confessados nos pontos 45º daquela contestação).
Também é um facto que a apelada X se dispôs, na fase da negociação, a satisfazer uma indemnização (limitada) à apelante – cfr. doc. de fls. 45.
No entanto, salvo o devido respeito e melhor opinião, o descrito comportamento anterior da apelada X assumido para com a apelante não encerra qualquer abuso de direito, por ser gerador de legítimas expectativas desta em receber daquela uma indemnização, nos termos prescritos no CE, por via da cessação da exploração da pedreira, que esta agora tivesse visto frustrada.
Com efeito, é do conhecimento geral que, numa fase prévia, são múltiplas as razões que levam as partes, numa fase negocial, pré-processual ou já na própria pendência do processo, mas extraprocessualmente, a fazerem propostas de resolução do conflito à sua contraparte, com vista a evitar que o conflito que as contrapõe se plasme em processo judicial ou que este perdure, com os inerentes custos pessoais e económicos, sem que daí a parte que recebe essa proposta possa extrair o que quer que seja quando ao reconhecimento ou não reconhecimento pelo proponente dos direitos a que a contraparte (destinatária da proposta) se arroga titular.
E quanto ao facto da apelada ter pretendido fazer caducar a DUP e ter expendido que a apelante poderia continuar a explorar a pedreira, as razões dessa sua posição encontram-se cabalmente explicitadas na contestação de fls. 29 a 44 – aquela apenas previa ir intervir na parcela de terreno onde a pedreira se encontrava instalada na 5ª fase do projeto, pelo que não estando essa intervenção para breve, naturalmente que lhe era indiferente, por ora, que a apelante continuasse a explorar a pedreira, sem que esta possa daí extrair o que quer que seja quanto aos direitos que a expropriante lhe reconhecia sobre a pedreira.
De resto, nessa mesma contestação, no ponto 45º (cfr. fls. 38 dos autos) a expropriante questiona a legalidade da atividade exercida pela apelante na parcela de terreno, afirmando expressamente que essa questão será apreciada “oportunamente, em sede própria, já que esta exploração é titulada por uma licença de exploração, pelo prazo de um ano, emitida ao abrigo do art. 5º do DL. n.º 270/2011, de 06 de outubro, com a redação dada pelo DL. n.º 340/2007, de 12 de outubro, que já se encontra largamente ultrapassada”.
Ou seja, desde uma fase muito inicial da fase administrativa do presente processo expropriativo, a expropriante X questionou a legalidade da exploração levada a cabo pela apelante da pedreira e colocou em crise o direito desta a receber qualquer indemnização pela cessação da exploração da pedreira, posição essa que manteve ao longo dos autos.
Neste contexto, naturalmente que não se descortina qualquer conduta da expropriante em que a apelante pudesse alicerçar legitimamente qualquer legítima expectativa em ser por ela indemnizada pela cessação da exploração da pedreira. Pelo contrário, a conduta que a expropriante foi exteriorizando ao longo do processo, desde praticamente o seu início, foi a de que esse direito indemnizatório não assistia àquela.
Termos em que, sem mais, por desnecessárias, considerações, improcede a exceção perentória de abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium que a apelante imputa à conduta da expropriante X.
Resulta do exposto que, embora por razões diversas das constantes da sentença recorrida, na improcedência de todos os fundamentos de recurso aduzidos pela apelante, impõe-se julgar improcedente a presente apelação e, em consequência, sem prejuízo da facticidade supra identificada que se aditou ao elenco dos factos não provados na sentença, confirmar a decisão de mérito nela proferida.
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Decisão:

Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sem prejuízo do aditamento da facticidade supra identificada que se aditou ao elenco dos factos não provados na sentença, em julgar a presente apelação improcedente e, em consequência:
- confirmam a decisão de mérito constante da sentença recorrida.
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Mais acordam em não admitir a junção aos autos do documento junto pela apelante Y - Indústria de Granito, Lda. em anexo às suas alegações de recurso e determinam que, após trânsito do presente acórdão, se desentranhe dos autos esse documento e se proceda à sua devolução ao apresentante, condenando-se a apresentante Y – Indústria de Granito, Lda., nas custas do incidente que gerou, fixando-se a taxa de justiça em uma UC.
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Custas da apelação pela apelante (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 17 de novembro de 2022
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:

José Alberto Moreira Dias - relator
Alexandra Maria Viana Parente Lopes - 1ª Adjunta
Rosália Cunha - 2ª Adjunta


1. Paula Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2013, Almedina, págs. 340 e 341. No mesmo sentido de que o encerramento da discussão em 1ª Instância é o limite máximo até ao qual o art. 423º, n.º 3 do CPC, consente a junção aos autos de documentos, verificados que estejam os requisitos legais que enuncia, vide Paulo Pimenta, “Processo Civil Declarativo”, 2014, Almedina, pág. 352, nota 829. Ainda Pais de Amaral, “Direito Processual Civil”, 2106, 12ª ed., pág. 320.
2. Acs. STJ. de 13/02/2007, Proc. 06A4496 e RC. de 20/01/2015, Proc. 2996/12.0TBFIG-G1, in base de dados da DGSI, onde constam todos os arestos que se venham a citar sem menção em contrário.
3. Abílio Neto, “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro de 2014, Ediforum, pág. 515.
4. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. cit., pág. 341.
5. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, pág. 229.
6. Acs. STJ., de 18/01/2005, Rec. N.º 3689/04-4ª, Sumários, jan./2005; 18/04/2006, Proc. 06A844
7. Acs. STJ. de 26/09/2012, Proc. 174/08.TTVFX.L1.S1; RG.de 19/06/2014, Proc. 36/12.9TBEPS-A.G1; RC. de 18/11/2014, Proc. 628/13.9TBGRD.C1.
8. Ac. STA. de 09/07/2014, Proc.00858/14, in base de dados da DGSI, em que constam todos os arestos infra indicados, sem menção em contrário.
9. Abílio Neto, in “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro/2014, pág. 734.
10. Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277.
11. Ac. da RG, de 14.05.2015, Processo nº 414/13.6TBVVD.G.; e RC, de 11.01.1994, BMJ nº 433, pág. 633, onde se lê: que “entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica pelo que se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decide em sentido divergente, ocorre tal oposição”. Ainda, Ac. do STJ, de 13.02.1997, BMJ nº 464, pág. 524, e Ac. do STJ, de 22.06.1999, CJ, 1999, tomo II, pág. 160.
12. José Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, pág. 670; Ac. STJ. de 20/01/2004, Proc. 03S1697.
13. Ana Isabel Pacheco e Luís Alvarez Barbosa, “Código das Expropriações Anotado e Comentado”, 2013, Almedina, pág. 52.
14. Ac. RP. de 03/02/2009, Proc. 0826968: “O conceito de interessado consagrado no art. 9º do CE, deve ser entendido não num sentido restrito, ou seja, nele sendo abarcadas apenas as situações que consagram verdadeiros direitos reais, mas outrossim no sentido de que também abarca aquelas que estão indissociavelmente ligadas ou conexionadas com o imóvel, de tal ligação emergindo direitos, designadamente de índole obrigacional ou creditícia, a exercer quer autonomamente, quer por reporte à indemnização a atribuir ao proprietário expropriado”.
15. Neste sentido Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado, 5º vol., págs. 142 e 143, onde pondera: “Esta nulidade está em correspondência direta com o 1º período da 2ª alínea do art. 660º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras” e onde aponta como exemplo de nulidade por omissão de pronúncia, o seguinte caso retirado da prática judiciária: “Deduzidos embargos a posse judicial com o fundamente de posse baseada em usufruto, se o embargado alegar que este não podia produzir efeitos em relação a ele por não estar registado à data em que adquiriu o prédio e a sentença ou acórdão deixar de conhecer desta questão, verifica-se a nulidade (…). O embargado baseara a sua defesa na falta de registo do usufruto; pusera, portanto, ao tribunal esta questão de direito: se a falta de registo do usufruto tinha como consequência a ineficácia, quanto a ele, da posse do usufrutuário, o tribunal estava obrigado, pelo art. 660º, a apreciar e decidir esta questão; desde que a não decidiu, a sentença era nula”. Ac. RC. de 22/07/2010, Proc. 202/08.1TBACN-B.C1: “…O juiz deve, antes de tudo, tomar em consideração as conclusões expressas nos articulados, já que a função específica destes é a de fornecer a delimitação nítida da controvérsia. Mas não só; é necessário atender, também aos fundamentos em que essas conclusões assentam, ou, dito de outro modo, às razões e causas de pedir invocadas (…). Em última análise, questão será, pois, tudo o que respeite ao litígio existente entre as partes, no quadro, tanto do pedido e da causa de pedir, como no da defesa por exceção”.
16. Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, págs. 373 e 374.
17. Alberto dos Reis, in ob. cit., 5º vol., págs. 55 e 143.
18. No mesmo sentido Ferreira de Almeida, “Direito de Processo Civil”, vol. II, Almedina, 2015, pág. 371, em que reafirma que “questões” são todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas, integrando “esta causa de nulidade a omissão do conhecimento (total ou parcial) do pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão (não a fundamentação jurídica adrede invocada por qualquer das partes). Não confundir, porém, questões com razões, argumentos ou motivos invocados pelas partes para sustentarem e fazerem vigar as suas posições (jurídico processuais); só a omissão da abordagem de uma qualquer questão temática central integra vício invalidante da sentença, que não a falta de consideração de qualquer elemento de retórica argumentativa produzida pelas partes”.
19. Acs. STJ. 30/10/2003, Proc. 03B3024; 04/03/2004, Proc. 04B522; 31/05/2005, Proc. 05B1730; 11/10/2005, Proc. 05B2666; 15/12/2005, Proc. 05B3974.
20. Ac. STJ. de 26/11/2009, Proc. 2416/04.4TJVNF.S1.
21. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. IV, Coimbra Editora, 1987, pág. 553, para quem a expressão “resposta deficiente”, abrange “tanto o caso de falta absoluta de decisão, como o caso de decisão incompleta, insuficiente ou ilegal”. Antes da revisão ao CPC operada pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., Coimbra Editora, 1985, pág. 656, debruçando-se sobre os vícios que podiam afetar o julgamento da matéria de facto, expendiam que estes podiam ser de quatro natureza: “a) deficiência, se a resposta não abranger todo o facto quesitado; b) obscuridade, se a resposta for equívoca, ininteligível ou imprecisa; c) contraditoriedade, se a resposta a um dos quesitos colidir (…) com a resposta emitida a propósito doutro quesito; d) falta de fundamentação, quando a resposta não contiver a menção dos meios concretos de prova em que os juízes fundamentaram a sua convicção ou quando, tendo havido meios contraditórios de prova, sobre o facto tido como provado, se não indicarem as razões da opção feita pelo coletivo”. Tendo em consideração que, na sequência da revisão ao CPC operada pela Lei 41/2013, de 26/06, sobre as partes apenas passou a impender o ónus alegatório quanto aos factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas (arts. 5º, n.º 1, 552º, n.º 1, al. d) e 572º, al. c) do CPC), a partir de 01 de setembro de 2013, data da entrada em vigor daquela Lei, ocorre o vício de deficiência do julgamento da matéria de facto quando o julgador, na sentença, se abstenha de julgar como provados e como não provados factos essenciais constitutivos da causa de pedir que tenha alegado na petição inicial (no caso de recurso da decisão arbitral proferida em processo de expropriação, que tenham sido alegados pelos recorrentes da decisão arbitral nas suas alegações de recurso e que constituem factos essenciais integrativos dos fundamentos de recurso que invoca), ou quando se verifique essa omissão de pronúncia (no sentido de não os julgar como provados nem como não provados) em relação a factos essenciais integrativos de exceções que tenham sido alegados pelo réu na contestação (no caso de recurso de decisão arbitral, que tenham sido alegados pelo recorrida na resposta ao recurso interposto pelo recorrente da decisão arbitral e que constituam factos essenciais integrativos das exceções invocadas pelo recorrido nessa resposta em relação aos fundamentos de recurso alegados pelo recorrente nas alegações de recurso que apresentou). Note-se que os vícios da deficiência, obscuridade, contraditoriedade ou ininteligibilidade do julgamento da matéria de facto são do conhecimento oficioso do tribunal da Relação, pelo que sempre que esta se aperceba que o julgamento da 1ª Instância padece de um de tais vícios, independentemente destes virem invocados pelo recorrente, impõe-se que a Relação deles conheça oficiosamente e os supra, desde que constem do processo ou da gravação os elementos necessários para que aquela exerça o seu poder de substituição, nos termos do n.º 1 do art. 662º do CPC; de contrário, deverá exercer os seus poderes de cassação e, nos termos da al. c), do n.º 2 do art. 662º do mesmo Código, anular as respostas que repute de deficientes, obscura ou contraditórias, e a sentença, e ordenar a baixa do processo à 1ª Instância para que realize novo julgamento exclusivamente quanto às respostas anuladas ou quanto à facticidade em relação à qual se verifique total omissão de pronúncia (no sentido de não ter sido julgada provada, nem como não provada) e profira nova sentença – neste sentido, Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, págs. 293 a 295; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, pág. 826, nota 14; Acs. STJ. de 12/05/2016, Proc. 2325/12.3TVLSB.L1.S1; de 07/11/2019, Proc. 2929/17.8T8ALM.L1.S1
22. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. III, 4ª ed., Coimbra Editora, págs. 206 e 207.
23. Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 212.
24. Ac. STJ. de 09/03/2003, Proc. 03B1816.
25. Acs. STJ. de 01/10/2019, Proc. 109/17.1T8ACB.C1.S1; de 07/05/2014, Proc. 39/12.3T4AGD.C1.S1; 11/07/2012, Proc. 3360/14.0TTLSB.L1.S1; 02/05/2007; 14/11/2006, Proc. 06A2992.
26. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, ob. cit., pág. 744, notas 12 e 14, em que expendem: “Quanto aos factos instrumentais, para além de não carecerem de alegação (aliás, o ónus de alegação respeita somente aos factos essenciais, isto é, àqueles de cuja prova depende a procedência ou improcedência da ação ou da defesa), podem ser livremente discutidos e apreciados na audiência final (…). Consequentemente, atenta a função secundária que desempenham no processo, tendente a justificar simplesmente a prova dos factos essenciais, para além de, em regra, não integrarem os temas da prova, nem sequer deverão ser objeto de um juízo probatório específico. (…). Portanto, relativamente aos factos que apenas sirvam de suporte à afirmação de outros factos por via de presunções judiciais, bastará que sejam revelados ou expostos na motivação da decisão, no segmento em que o juiz, analisando criticamente as provas produzidas, exterioriza o percurso lógico que o conduziu à formulação do juízo probatório sobre os factos essenciais”.
27. Acs. TCAN, de 16/06/2005, Proc. 00870/04.3BEBRG e STA de 12/07/2206, Proc. 03/02. Ana Isabel Pacheco e Luís Alvarez Barbosa, “Código das Expropriações Anotado e Comentado”, 2013, Almedina, págs. 75 e 76,.
28. Ana Isabel Pacheco e Luís Alvarez Barbosa, ob. cit., pág. 75.
29. Jorge Miranda e Rui Medeiros, “Constituição Portuguesa Anotada”, tomo I, 2ª ed., Wolters Kluwer e Coimbra Editora, págs. 1242 a 1252.
30. Jorge Miranda e Rui Medeiros, ob. cit., pág. 1256.
31. Jorge Miranda e Rui Medeiros, ob. cit., pág. 1261.
32. José Vieira Fonseca, “Direito do Urbanismo e do Ordenamento do Território – Estudos”, vol. II, coord. Fernanda Paula Oliveira, 2012, Almedina, pág. 494.
33. Ac. R.P. de 22/01/2009, Proc. 0837444.
34. José Vieira Fonseca, ob. cit., págs. 501 e 502.
35. Ac. RC. de 23/03/2021, Proc. 3915/18.8T8LRA.C1, onde esta questão se encontra desenvolvida.
36. Marcello Caetano, “Manuel de Direito Administrativo”, I, 10ª ed., Coimbra Editora, 1980, pág. 1980.
37. Carvalho Fernandes, “Caducidade”, in Polis, Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, pág. 666.
38. Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República n.º 40/94, DR., II Série, de 14/01/2003; Ac. STA de 06/09/2011 Proc. n.º 0787/10.
39. Fernanda Maçãs, Cadernos de Justiça administrativa, n.º 48, pág. 19.
40. Ac. STA de 11/01/2011, Proc. 0715/10, em que se expende: “Não procede a ação de indemnização por integração de determinado prédio no perímetro Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios de Ourém/Torres Novas, do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros quando a causa de pedir é a impossibilidade de continuação de exploração de pedreira, pois a exploração de pedreiras já era condicionada e, no caso concreto, a exploração estava a ser realizada sem qualquer dos títulos que já antes dessa integração se exigiam. Ac. RP. de 19/05/2010, Proc. 275/09.0TBVPA-A.P1: “A falta de título que legitime a intervenção como expropriado, obsta ao reconhecimento, ainda que a título provisório, do direito à indemnização, por efeito de expropriação”.
41. Preâmbulo do DL. n.º 165/2014, de 05/11.
42. Antunes Varela, “Centros Comerciais “, pág. 90.
43. Ac. STJ. de 05/06/2018, Proc. 1085/15.9TCBR-A.C1.S1, in base de dados da DGSI.
44. Batista Machado, “Obra Dispersa”, vol. I, págs. 416 e segs.