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LIBERDADE CONDICIONAL
INCIDENTE DE INCUMPRIMENTO
Sumário
Decretada a revogação da Liberdade Condicional só resta cumprir o remanescente da pena.
A liquidação do remanescente da pena não pode contabilizar duas realidades jurídicas, o resto da pena mais o prazo de liberdade condicional concedido.
Só pode contabilizar o resto da pena não cumprido à data da concessão da Liberdade condicional por necessária referência à pena inicialmente imposta deduzida do período da pena parcialmente cumprida.
E a este remanescente, conforme entende o legislador, pode ser aplicada uma nova liberdade condicional se para tanto se justificar tal aplicação e após um juízo de ponderação do TEP.
Texto Integral
Acórdão proferido, na 3.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa
SB, arguido nos presentes autos, não se conformando com a sentença proferida nos mesmos, que revogou a concessão de liberdade condicional, vem dela interpor recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, motivando o seu recurso com as seguintes conclusões: “1ª- A finalidade das penas, prevista no artigo 40º do Código Penal é a ressocialização do agente, sendo que esta deve ser atingida, tendo em conta as condições de prevenção geral e especial, com medidas que não sejam a ultima racio do sistema.
2ª - Ao Arguido, ora Recorrente foi concedida a liberdade condicional, pelo tempo que lhe faltava cumprir à ordem do processe nº 66/09.3JELSB, concretamente até 26 de Abril de 2014, com obrigações, entre as quais de não cometer outros crimes, tendo em atenção os princípios plasmados nos artigos 40º e 61º do Código Penal, porém no processo n.º 2013/152, do Tribunal Criminal Superior 14 Barkirkoy/Turquia, o Recorrente veio a ser condenado em 28 de Janeiro de 2014, por factos de 06 de Abril de 2013, na pena de 6 anos e 3 meses, pelo crime de trafico de estupefaciente
3ª - O Arguido, ora recorrente sabia da sua obrigação de não cometer crimes, no entanto não podemos afirmar, sem mais que revelou total desprezo pela decisão judicial de liberdade condicional, não pretendendo colocar em crise definitivamente a esperança gerada de que com a liberdade condicional se manteria afastado de criminalidade.
4ª -O Arguido, ora recorrente cometeu estes novos factos no estrangeiro, numa altura já distante e não se conhece que, desde aí, tenha praticado novos ilícitos criminais.
5ª - O Arguido tinha e tem uma família muito grande, companheira e mais 9 filhos, o mais velho de 18 anos e mais novo de apenas 2 anos e esta grande família dependia economicamente do Arguido, ora recorrente, quando este cometeu o ilícito na Turquia e que esteve na origem da presente decisão da revogação da liberdade condicional e ainda continua a depender presentemente.
6ª- O Arguido, ora recorrente envia para a sua família na Guiné, mensalmente a quantia de €200,00, encontrando-se a trabalhar presentemente, auferindo um vencimento mensal de €731,00.
7ª - Com este ordenado, o Arguido pode fazer face às mais elementares necessidades da sua extensa família a que atrás se fez referência e, se assim não for e prosseguir a decisão de revogação da liberdade condicional, esta imensa prole familiar irá passar por muitas dificuldades, senão mesmo fome.
8ª - Nestes termos, julgamos que ainda é possível, atendendo às finalidades das penas e da liberdade condicional, reverter a decisão da revogação da liberdade condicional, porém, se assim não for doutamente entendido, então que o remanescente da prisão que falta cumprir, o seja no regime de PDL-Prisão por dias livres. TermosemqueserequerqueoTribunalad Quem:
Revogue a decisão recorrida ou então quer o remanescente da pena seja cumprido no regime de PDL, assim se fazendo a sã e costumada JUSTIÇA “ **** O Ministério Público respondeu no sentido de ser negado provimento ao recurso interposto alegando para tanto em resposta: “A decisão recorrida revogou a liberdade condicional concedida para vigorar entre 16-10-2012 (data da libertação) e 26-04-2014 (data prevista para o termo da pena).
O incidente de revogação foi instaurado com base na sentença proferida no processo n.º 2013/152, pelo Tribunal Criminal Superior 14 de Bakirköy – Turquia, em 28/01/2014 que condenou o ora recorrente na pena efetiva de 6 anos e 3 meses de prisão pela prática, em 06-04-2013, de crime de tráfico de estupefaciente.
A liberdade condicional traduz um voto de confiança que se concede ao condenado/recluso no sentido de assumir futuramente uma vida de acordo com os parâmetros social e legalmente estabelecidos, servindo a própria ameaça do cumprimento do remanescente da pena como aval a esse voto. Face à existência de outra condenação por factos ocorridos após a libertação reveladores da retoma de padrão de comportamento inadequado e pro-criminal, deve-se concluir, atentas as circunstâncias envolventes do cometimento do novo crime no período da liberdade condicional e a ele subsequente, que o libertado não se revelou merecedor do voto de confiança que antes lhe fora dado.
Pelo contrário, revelou desprezo pelo cumprimento da decisão judicial concessiva de liberdade condicional, não se coibindo de praticar outro crime na sua pendência, reincidindo no tráfico de estupefacientes, pelo que colocou em causa a esperança gerada de que, em liberdade, se manteria afastado da criminalidade e se comportaria normativamente, esgotando as possibilidades de se alcançar a sua socialização em liberdade.
A alternativa pretendida pelo recorrente para cumprimento do remanescente da pena não tem cabimento legal, face à revisão do Código Penal e do Código de Processo Penal, operada pela Lei n.º 94/2017, de 24 de agosto, que procedeu à abolição da prisão por dias livres.
A decisão recorrida está devidamente fundamenta, não violou qualquer disposição legal, pelo que deve ser mantida nos seus precisos termos.
Contudo V. Exas., decidindo, farão, como sempre Justiça “
*** Neste Tribunal, o Exmo Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto pugnando pela posição tomada pelo MP na primeira instância. *** O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr., entre outros, os Acs. do STJ de 16.11.95, de 31.01.96 e de 24.03.99, respectivamente, nos BMJ 451° - 279 e 453° - 338, e na Col (Acs. do STJ), Ano VII, Tomo 1, pág. 247, e cfr. ainda, art.ºs 403° e 412°, n° 1, do CPP).
*** O despacho recorrido contém no seu essencial o seguinte: “Incidente de Incumprimento (Lei 115/2009)
Por ter sofrido nova condenação em processo penal, por factos integrantes da prática dos elementos típicos de crime, praticado na temporalidade do período da execução de pena a que correspondia a concedida liberdade condicional, foi instaurado incidente de incumprimento da mesma, com vista a eventual revogação, contra SB NASCIDO A 28/03/1968, TITULAR DO BI 30-----, COM OS DEMAIS SINAIS DE IDENTIFICAÇÃO NOS AUTOS.
O tribunal é o competente – artigos 137.º, n.º 3 e 138.º, n.º 4, al. b), ambos do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
Procedeu-se à instrução dos autos, com junção das pertinentes certidões.
Cumpriram-se as legais comunicações e ao condenado foi dado o direito ao legal exercício do direito de audição.
Alegou o Ministério Público, emitindo parecer e pronunciando-se pela revogação da liberdade condicional.
O processo é o próprio, sendo que se mantém a validade e regularidade da instância, não ocorrem quaisquer nulidades, excepções, questões prévias ou incidentes de que cumpra de momento apreciar, pelo que nada obsta ao conhecimento do mérito presente da causa – apreciaçãodoincidente de incumprimento de liberdadecondicionalenecessidade/viabilidade/possibilidadederevogaçãodamesma.
Cumpre decidir. 2–Fundamentação: 1. Quando se encontrava em cumprimento de pena de prisão no Estabelecimento Prisional de Sintra, na execução da pena única de 4 anos e 6 meses (Proc. 466/09.3JELSB – 3.ª Vara Criminal de Lisboa) [crime de tráfico de estupefacientes], SB viu ser-lhe concedida, por decisão de 16 de Outubro de 2012, liberdade condicional. 2. O período de liberdade condicional opera de 16/10/2012 até 26/04/2014. 3. Por sentença de 28/01/2014 proferida no Proc. 2013/152
(Tribunal Criminal Superior 14 de Bakirköy – Turquia), por factos cometidos em 06/04/2013, foi SB condenado na pena de 6 anos e 3 meses de prisão, pela autoria de factos integrantes dos elementos típicos de um crime de tráfico de estupefacientes. 4. Cumpriu a referida pena, encontrando-se presentemente em liberdade. Factos Não provados:
Inexistem.
Tudo o que em contrário com o dado como com relevo para a decisão a proferir se assuma, ou se trate de matéria de direito, instrumental ou conclusiva e, como tal, insusceptível de ser chamada à colação nesta sede.
2.3–Motivaçãodosfactoscomrelevoparaadecisãoaproferir:
O dever constitucional de fundamentação dos despachos judiciais basta-se com a exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito em que assenta a decisão, bem como o exame crítico das provas que serviram para fundar a decisão, exigindo, pois, a indicação dos meios de prova que serviram para formar tal convicção, como, também, os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção se forme em determinado sentido ou se valorem de determinada forma os diversos meios de prova apresentados nos autos.
Assim, o Tribunal formou a sua convicção com base nos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas constantes do quanto é o somatório factual inerente aos relatórios juntos aos autos, tudo em função das razões de ciência, das contradições, hesitações, inflexões, parcialidade, coincidências e mais inverosimilhanças que, porventura, transpareçam dos mesmos.
Valorou-se, em particular:
A) certidão da(s) decisão(ões) condenatória(s); B) certidão da(s) liquidação(ões) de pena(s); C) certidão do(s) relatório(s) da DGRS;
D) print do SIP do condenado;
E) declarações do condenado em sede de audição, em que o mesmo referiu que praticou os factos face a recaída na toxicodependência;
F) informação de situação jurídico-penal do condenado;
G) CRC do condenado;
H) parecer do Ministério Público;
I) posição do condenado, em contraditório legal, em que se quedou inerte.
4–ODireitoaplicável:
Da decisão que determinou a colocação do recluso sob a égide de liberdade condicional resulta a sujeição do mesmo, por elementar, à obrigação de nãopraticarcrimes, comando efectivo que mais não é do que o cumprimento da imposição legal resultante do artigo 64.º, n.º 1 do Código Penal, por reporte ao artigo 56.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma.
O postulado de política criminal subjacente à liberdade condicional sempre contendeu com a asserção de que, de forma consolidada, seja de esperar, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável e sem cometer crimes, tendo-se para tanto em atenção as circunstâncias do caso, a sua vida anterior, a respectiva personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão (que constituem índices de ressocialização a apurar no caso concreto) e a compatibilidade da libertação com a defesa da ordem e da paz social (se se estiver em fase de reporte a 1/2 de pena).
Se assim é, facilmente se atesta que a prática, em momento posterior à determinação da liberdade condicional, de uma circunstância com maior aptidão para questionar o prognóstico favorável que esteve na génese da aplicação desse instituto.
Com efeito, o cometimento de demais factos criminosos afigura-se-nos como mais do que indiciador da falta de preparação do libertado condicional para adoptar uma postura de conformidade com o Direito e, no fundo, denota o seu desmerecimento com relação à oportunidade que, em tempo, lhe foi concedida pelo Tribunal, precisamente por crer que no caso concreto seriam adequadas e suficientes à protecção dos bens jurídicos e à reintegração do agente na sociedade.
Assim, no que ora releva, face a um dado e apurado comportamento do libertado condicionalmente há que extrair as legais consequências, o mesmo é dizer, há que verificar em que grau tal comportamento é susceptível de configurar uma causa de revogação da liberdade condicional, posto que cotejados os termos da condenação posteriormente infligida se terá que confirmar se as finalidades que, num primeiro momento, presidiram à operação do instituto da liberdade condicional se mostram frustradas, dado inexistir – no caso presente, como em qualquer outro – qualquer automaticidade na revogação pela condenação face à prática de novo crime.
Concluindo, pressuposto material da aplicação da liberdade condicional em concreto é, desta forma, a conclusão de um prognóstico favorável com respeito ao ulterior comportamento do libertado condicionalmente, ou seja, o convencimento, por parte do Tribunal, de que, com a liberdade condicional operará a finalidade de prevenção especial positiva ou de socialização. Defraudada tal expectativa, resulta para o libertado condicional a revogação desse estatuto, com a consequência de cumprimento de pena.
A questão prende-se, assim, com a suficiência de tanto – nova pena aplicada por factos praticados na pendência da liberdade condicional - para efeitos de revogação dessa mesma liberdade condicional.
Vejamos, pois, o caso concreto.
Como resulta dos apurados factos com relevo para a decisão a proferir, tidos como provados, o período de liberdade condicional decorria entre 16/10/2012 (data da libertação do recluso) e 26/04/2014 (data prevista para o termo da execução da pena em cumprimento).
Ora, sucede que menos de um ano depois de ser libertado, em 6 de Abril de 2013, o libertado condicionalmente praticou factos integrantes da autoria dos elementos típicos de um crime de tráfico de estupefacientes), pelo que por decisão de 28/01/2014, proferido no Proc. 2013/152 (Tribunal Criminal Superior 14 de Bakirköy – Turquia, foi condenado numa pena de na pena de 6 anos e 3 meses de prisão efetiva. Logo, cometendo crime no período de vigência da referida liberdade condicional violou o libertado condicionalmente uma das obrigações impostas na decisão de concessão da mesma.
Dir-se-á, também, que, sem margem para dúvidas, essa violação é grave, denotando uma atitude de leviandade e desrespeito pelo instituto concedido ao nível dos fins subjacentes.
É que não pode o tribunal esquecer a elevada gravidade dos factos praticados no Proc. 2013/152, porquanto revela que o libertado condicional não se mostrou a compreender as finalidades do quanto lhe foi concedido. Mas mais: reincide precisamente no mesmo tipo de ilícito penal – tráfico de estupefacientes.
Como tal, tem-se como demonstrado que com este comportamento as finalidades de prevenção, sobretudo especial, que estiveram na base da concessão da liberdade condicional se não realizaram junto do libertado condicionalmente, ou seja, e concluindo, não obstante, ter beneficiado de liberdade condicional, não se mostra o libertado condicionalmente capaz de, em liberdade, prosseguir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes.
Por todo o exposto, face à prática de novos factos integrantes de tipo penal, no período da execução da liberdade condicional, factos esses que deram azo a condenação, bem claro se mostra, mesmo após período de reclusão, que tal não foi suficiente para demover o libertado condicional para, de novo e nesse período de liberdade sempre limitada, porque condicional, delinquir, assumindo comportamento semelhante ao que justificou a sua condenação e subsequente reclusão. Defraudou, assim, o juízo de prognose favorável formulado aquando da concessão da liberdade condicional, não aproveitando a oportunidade que então lhe foi concedida de demonstrar ser capaz de, fora de reclusão, pautar o seu comportamento em conformidade com o dever ser penalmente relevante. Impõe-se, pois, a revogação da liberdade condicional concedida, já que reclamada pela finalidade última da execução da pena de prisão, ou seja, adefesadasociedade eaprevençãodapráticadecrimes (artigos 40.º e 56.º, este exvi artigo 64.º, todos do Código Penal).
DECISÃO
Pelo exposto, tudo visto e ponderado, atentas as disposições legais citadas e as considerações expendidas, decidimos: A– Revogar a liberdade condicional concedida em 16/10/2012 a SB (apenso A deste PUR) e, consequentemente, determinamos a execução da pena de prisão ainda não cumprida imposta no âmbito do Proc. 466/09.3JELSB – Juízo Central Criminal de Lisboa – J8. B - Condenar SB no pagamento da taxa de justiça pelo máximo legal – artigos 153.º e 154.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, artigos 513.º, 514.º e 524º do Código de Processo Penal e Tabela III de reporte ao artigo 8.º, n.º 5 do Regulamento das Custas Processuais (Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro) – (processo especial, com ou sem oposição, consoante o caso), acrescida dos encargos previstos no artigo 16.º do Regulamento das Custas Processuais e custos processuais referidos no anexo I ao artigo 15.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril. C - Notifique o Ministério Público, o defensor oficioso/mandatário de SB e este via Estabelecimento Prisional (artigo146.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade e artigo 114.º do Código de Processo Penal, este exvi artigo 154.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade). D - Comunique, remetendo, após trânsito em julgado, boletim ao registo criminal – artigo 7.º, n.º 1 da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio e 12.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 171/2015, de 25 de Agosto. E - Após trânsito remeta certidão desta decisão ao Proc. 466/09.3JELSB – Juízo Central Criminal de Lisboa – J8. F - Após trânsito comunique à Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e demais entidades que tinham intervenção na revogada liberdade condicional. “ *** Cumpre decidir: A decisão de que recorre o arguido foi proferida a 4 Janeiro de 2022 A liberdade condicional foi concedida em 16/10/2012 A liberdade Condicional foi concedidaaté 26/04/2014 A data prevista para o termo da execução da pena em cumprimento era 26.04.2014 O arguido cometeu os factos em causa na Turquia durante o período de Liberdade Condicional em 6 de Abril de 2013 Em 28/01/2014, foi condenado na Turquia na pena de 6 anos e 3 meses de prisão efetiva. Cumpriu a referida pena O incidente de incumprimento da liberdade condicional foi autuado em 5.5.2021 Foi marcada audição do arguido para 13.05.2021 Não o tendo o tribunal localizado foram feitas diligências nesse sentido e a 30.11 2021 pelo seu próprio punho, o arguido informa o tribunal de que continua a residir “na mesma morada dos autos”. O arguido é então ouvido a 14.12.2021. Promove-se a revogação da Liberdade Condicional e em 4 Janeiro de 2022 é proferida a decisão sob recurso. Vejamos: De acordo com o disposto no art.º 61º CP (...) 2 - O tribunal coloca o condenado a prisão em liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena e no mínimo seis meses se: a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social. 3 - O tribunal coloca o condenado a prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo seis meses, desde que se revele preenchido o requisito constante da alínea a) do número anterior. 4 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o condenado a pena de prisão superior a seis anos é colocado em liberdade condicional logo que houver cumprido cinco sextos da pena. 5 - Em qualquer das modalidades a liberdade condicional tem uma duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, até ao máximo de cinco anos, considerando-se então extinto o excedente da pena. De acordo com o disposto no art.º 64º CP 1 - É correspondentemente aplicável à liberdade condicional o disposto no artigo 52.º, nos n.ºs 1 e 2 do artigo 53.º, no artigo 54.º, nas alíneas a) a c) do artigo 55.º, no n.º 1 do artigo 56.º e no artigo 57.º 2-A revogação da liberdade condicional determina a execução da pena de prisão aindanão cumprida. 3 -Relativamente à pena de prisão que vier a ser cumprida pode ter lugar a concessão de nova liberdade condicional nos termos do artigo 61.º Como resulta das actas da Comissão de Revisão do Código Penal a propósito da redação do art.º 64.º, n.º 2 do Projeto, que veio dar lugar ao art.64.º, n.º 3, do Código Penal na Revisão de 1995, o Prof. Figueiredo Dias, que presidiu a Comissão de Revisão do Código Penal de 1982, afirmou que o n.º 2 nunca pode ter como pressuposto o cumprimento da pena inicial, mas sim o resto. Segundo o n.º 9 do Preâmbulo do D.L. n.º 400/82, de 23 de Setembro, a liberdade condicional tem como objetivo «criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão». Este instituto tem, pois, uma «finalidade específica de prevenção especial positiva ou de socialização». Já quanto à natureza jurídica da mesma, parece resultar hoje pacífico que a sua concessão não implica uma modificação da pena na sua substancialidade mas sim, uma «medida penitenciária», uma «circunstância relativa à execução da pena», um incidente de execução da pena. Segundo o artigo 61º do C. Penal, são pressupostos (formais) da sua concessão: 1) Que o recluso tenha cumprido ½ ou, no mínimo, 6 (seis) meses de prisão; 2) Que aceite ser libertado condicionalmente; São, por outro lado, requisitos (substanciais) indispensáveis: A) que, fundadamente, seja de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vidaanterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável e sem cometer novos crimes; B) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social; (excetuado o disposto no n.º 3 do preceito em causa)
Na altura em que lhe foi concedida a liberdade condicional, estavam, pois, reunidos os pressupostos que levaram o TEP a conceder ao arguido a mesma. Mas, como a Mmª Juíza escreve na sua decisão com o cometimento do crime na Turquia, a pouco mais de 1 ano de lhe ter sido concedida, o arguido provou não estar preparado para prosseguir a sua vida em Liberdade cometendo um crime da mesma espécie, sendo condenado e acabando por cumprir tal pena. A liberdade condicional tem objetivos. Não é algo que se conceda como um perdão ou uma saída precária é quase um direito, uma graça a deixar correr a pena em Liberdade, provando nesse tempo que continua merecedor dessa confiança. Independentemente das correntes interpretativas da natureza da liberdade condicional, a certa altura do cumprimento da pena, a sua execução pode fazer-se em liberdade ainda que sujeita a determinadas exigências, desde que o arguido já se mostre preparado, ou a parte da pena já cumprida, lhe tenha sido suficientemente pesada e exigente, de tal forma que está demonstrado que interiorizou o desvalor da sua conduta. Analisadas que foram 1) as circunstâncias do caso. 2) a vida anterior do agente. 3) a sua personalidade. 4) a evolução desta durante a execução da pena de prisão o tribunal concedeu-lhe a tão almejada liberdade para seguir a sua vida em liberdade ainda durante o período de duração da pena. Apreciamos agora o seu comportamento durante o período de Liberdade Condicional chegamos á conclusão de que não foi merecedor do que lhe foi concedido. O que nos pode desde logo causar estranheza é o facto de o recorrente ter como términus da sua pena a data de 26/04/2014, ter cumprido a pena que lhe foi imposta na Turquia pelo crime cometido e só em Janeiro de 2022 lhe ser revogada a liberdade condicional. Condenado na Turquia em 28/01/2014 (a 3 meses do termo da pena em Portugal), por factos cometidos em 6 de Abril de 2013 (quase 6 meses depois de lhe ser concedida a 16.10.12. ), cumpriu a pena de 6 anos e 3 meses, pelo que em 2020 passou a ficar sob a supervisão do TEP que em 5.5.2021 dá seguimento ao incidente de incumprimento aqui sob análise. Ouvido em 14.12.2021 e decretada em Janeiro a revogação da Liberdade Condicional só lhe resta cumprir o remanescente da pena como já supra referimos. A liquidação do remanescente da pena não pode contabilizar duas realidades jurídicas, o resto da pena mais o prazo de liberdade condicional concedido. Só pode contabilizar o resto da pena não cumprido à data da concessão da Liberdade Condicional por necessária referência à pena inicialmente imposta deduzida do período da pena parcialmente cumprida. E a este remanescente, conforme entende o legislador, pode ser aplicada uma nova liberdade condicional se para tanto se justificar tal aplicação e após um juízo de ponderação do TEP: Assim, todos os factos alegados no recurso para impedir a revogação da liberdade condicional, poderão ser tidos em conta a seu tempo, se o Juiz do tempo entender ser de ponderar uma nova condicional No entanto, tal análise não cabe a este Tribunal de recurso que apenas deve decidir da revogação objecto de recurso.
O condenado, uma vez em liberdade, não conduziu a sua vida de modo socialmente responsável, vindo a cometer novo crime de tráfico não se tendo revelado a libertação compatível com a defesa da ordem e da paz social. Confrontado com uma responsabilização pela sua liberdade passados cerca de 6 meses volta a delinquir e a cumprir pena. É ao Juiz de execução de penas, que competirá decidir o futuro do cumprimento do remanescente da pena. Não podemos acolher o cometimento de novo ilícito com uma indiferença cúmplice como lhe chamaria Maurice Cusson professor de criminologia, in” Criminologia página 203. A tão apregoada prevenção geral exige ao cumprimento de penas, que as garantias da mesma, se façam sentir, o que não implica que facto de um criminoso dever ser censurado e punido significa ser estigmatizado. A porta da reintegração deve manter-se aberta. Lembrando mais uma vez Maurice Cusson - professor de criminologia na obra já supracitada “não se pune para causar sofrimento, mas, para tranquilizar as consciências perturbadas pela falta e, levadas a crer que a lei, se foi violada, já não é válida”. A pena quando é fixada é para ser cumprida e só não será cumprida na sua totalidade se, durante o seu cumprimento, ficar demonstrado que, durante o período total da mesma, pode ser concedida liberdade ao recluso, ainda que condicional ou foram atingidos os 5/6 em penas superiores a 6 anos. O recorrente tem de interiorizar que a sua saída em liberdade implica o respeito pelo ordenamento jurídico, e a interiorização do desvalor da sua conduta, a necessidade de se afastar de comportamentos semelhantes. Concluiu-se facilmente que ignorou completamente os condicionalismos da decisão que lhe concedeu a Liberdade Condicional e esperança gerada de que se manteria afastado de criminalidade. Desde os factos pelos quais cumpriu pena não cometeu outros factos por se encontrar privado de liberdade. É verdade que comunicou ao tribunal a sua residência e é verdade que invoca a sua situação familiar, juntando um contrato de trabalho com data de Maio de 2022. O remanescente da pena que não iria cumprir em reclusão não pode ser cumprido em prisão por dias livres já que esta decisão não sendo a que inicialmente o condenou, é a decisão de um tribunal que aprecia a execução da sua pena e só para isso é competente, para o cumprimento da pena em que foi condenado. Acresce que a modalidade de prisão por dias livres já nem sequer se mostra contemplada no Código Penal. A decisão que decretou a medida da pena já se encontra transitada, o TEP apenas se pronuncia sobre a forma de a executar e , no caso em análise este Tribunal de recurso apenas se pronuncia quanto ao provimento ou não do recurso apresentado.
Como já dissemos, todas as razões aqui avançadas poderão ser apresentadas ao Juiz de execução de penas a fim de apreciar uma eventual concessão de nova LC ou não, matéria que já não é da competência deste tribunal apreciar aqui no âmbito deste recurso. Assim, nada havendo a censurar à decisão recorrida que se limitou a aplicar as normas legais, normas essas cujas implicações eram do conhecimento do recorrente que não podia desconhecer as condições em que lhe fora concedida a Liberdade Condicional Nega-se provimento recurso apresentado mantendo-se a decisão recorrida. Custas, pelo recorrente fixando a taxa de justiça em 3 Ucs. Decisão elaborada e revista pelas desembargadoras relatora e adjuntas. Lisboa, 26-10-2022
Adelina Barradas de Oliveira
Maria Margarida Almeida
Leonor Botelho