CONTESTAÇÃO
DEFESA POR EXCEPÇÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REJEIÇÃO
PROPRIEDADE HORIZONTAL
PARTE COMUM
OBRA
Sumário


I – Tendo a Ré contestado motivadamente mas não apresentando factos que constituam defesa por exceção, não configura nulidade da sentença a não consideração do argumentário que a Recorrente pretende agora elevar a “questão” decidenda.
II – Tratando-se de ónus cumulativos aqueles que o legislador impõe ao Recorrente que impugna a matéria de facto, o incumprimento pela Recorrente dos ónus primários, e desde logo daquele que mais essencialmente delimita o âmbito do recurso, de obrigatoriamente especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, determina a imediata rejeição do recurso nessa parte.
III – Sendo ilegal a construção de uma parede, erigida pela Ré em cima do traço que separa o seu lugar de estacionamento exclusivo, do lugar de estacionamento exclusivo de outro condómino, no espaço comum destinado a estacionamento de veículos dum prédio em regime de propriedade horizontal, deve a Ré proceder à sua demolição.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral


Processo n.º 2593/18.7T8PTM.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]

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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. AA e mulher, BB, instauram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra a sociedade comercial Lida, Ld.ª, CC, e marido, DD, pedindo que os réus fossem solidariamente condenados:
«a) A demolir a construção/arrecadação que edificaram no lugar de estacionamento n.º 42 da sub-cave do prédio urbano identificado no artigo 1º desta petição, repondo-o no exacto estado em que se encontrava anteriormente;
b) A realizar essa obra no prazo máximo de 15 dias, devendo ser condenados a pagar a quantia de € 100,00 por cada dia de atraso na execução dos trabalhos, quantia essa que deverá ser fixada a título de sanção pecuniária compulsória, nos termos do disposto no artº 829º-A do C.C.;
c) A pagar aos AA. a título de indemnização pelos prejuízos não patrimoniais, a quantia de € 3 000,00, acrescido de juros legais a partir da citação;
d) A pagar aos AA. todas as despesas em que estes incorrerem por virtude da conduta dos RR., designadamente a título de custas judiciais e honorários de advogado, quantias a liquidar em execução de sentença.
Subsidiariamente, para o caso de improceder o pedido formulado em a), a demolir a parede que edificaram entre os lugares de estacionamento nºs 42 e 43 da sub-cave do prédio urbano identificado no artigo 1º desta petição», e a serem condenados nos demais pedidos formulados.
Em fundamento das deduzidas pretensões, alegaram, em síntese, que são donos e legítimos possuidores da fração autónoma designada pela letra “L”, correspondente ao apartamento C, do 1.º andar do prédio urbano que identificaram, sendo a ré sociedade, por sua vez, dona e legítima possuidora da fração autónoma designada pelas letras “AE”, correspondente ao apartamento “E” do 4.º andar do mesmo prédio, correspondendo à sua fração o uso exclusivo do lugar de estacionamento com o n.º 43 e à fração da 1.ª ré o uso dos lugares nºs 40, 41 e 42, todos situados no piso -2 (subcave), sendo os lugares n.ºs 43 e 42 contíguos e achando-se delimitados por uma linha traçada no piso.
Sucede que, entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, a 1.ª Ré transformou o lugar de estacionamento n.º 42 num espaço fechado, que é utilizado como arrumos, tendo para o efeito edificado duas paredes em alvenaria, uma das quais em cima da linha divisória que separa os lugares n.ºs 43 e 42, entre dois pilares existentes nas suas extremidades.
Mais invocaram que a referida edificação foi feita sem a aprovação dos condóminos e prejudica a utilização do estacionamento dos autores, o qual tem apenas 2,38 m de largura entre os espaços que os delimitam, pelo que, apenas a circunstância de tais espaços de estacionamento configurarem espaços abertos permite a abertura das portas do veículo estacionado, com a necessária ultrapassagem das linhas divisórias. Contudo, isso deixou de ser possível do lado em que o lugar n.º 43.º confina com o lugar n.º 42.
Alegaram ainda que tal construção impossibilita o condutor caso estacione de frente de entrar e sair e obriga todos os ocupantes a sair pelo lado direito do automóvel, e/ou pelo lado esquerdo, se o veículo for estacionado de marcha atrás e se estiver parqueado no n.º 44 um outro veículo que esteja um pouco mais junto à linha divisória, caso em que os ocupantes da viatura que seja estacionada no lugar n.º 43, terão de sair e entrar pelo porta-bagagens.
Finalmente, aduziram que desde o ano de 2017 a forma como podem utilizar o estacionamento está condicionada, e caso estacionem de marcha atrás têm que fazer manobras acrescidas para direcionar o veículo, sentindo-se vexados perante os vizinhos que assistem às inúmeras manobras que fazem para estacionar o veículo.

2. Regularmente citados, os réus contestaram, por exceção, invocando a ilegitimidade do réu, por não ser entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017 representante da ré sociedade, e também dos autores, uma vez que, por estar em causa partes comuns, deveria o condomínio ter-se coligado com estes; e, por impugnação motivada, aduzindo essencialmente que os AA., à custa de causarem transtorno aos RR., pretendem livrar-se do incómodo da exiguidade dos espaços de estacionamento, que não lhes causa mais transtorno e incómodo que a qualquer outro condómino, independentemente de haver ou não paredes construídas.

3. Os Autores exerceram o contraditório, pugnando pela improcedência das exceções deduzidas, e requerendo que, se assim não se entendesse, fossem convidados em sede de despacho pré-saneador a providenciarem pelo seu suprimento.

4. Em 22.10.2019 foi proferido despacho pré-saneador que fixou à causa o valor de 30.000,01€, e concluindo pela ilegitimidade processual (ativa ou passiva) em face da ausência da demanda do condomínio, convidou os autores a provocar a sua intervenção, sob pena de absolvição dos demandados da instância, convite esse ao qual aqueles acederam, requerendo a intervenção do Condomínio.

5. Por despacho datado de 04.02.2020, foi admitida a intervenção do Condomínio do referido prédio, o qual, após ter sido citado, declarou fazer seus os articulados dos autores, tendo no despacho saneador proferido em 14.07.2020, sido admitido “a assumir a qualidade de autor, com exclusão dos pedidos c) e g)”, ou seja, quanto às pretensões indemnizatórias referentes ao ressarcimento de danos morais que a julgadora considerou serem restritos aos autores iniciais.

6. Com a concordância das partes, foi dispensada a realização de audiência prévia, tendo no referido despacho saneador sido fixado o objeto do litígio, e dispensada a indicação dos temas da prova, que na sentença vieram a ser elencados nos seguintes termos:
“a) se a ré realizou obra ilegal por, não ter sido autorizada pelos condóminos e que viola o direito dos demandados de usar o local de estacionamento que se encontra afeto à sua fração e se deve ser condenada a demolir tal obra que edificou;
b) se existe fundamento legal que autorize a fixação da a sanção pecuniária compulsória;
c) se os autores sofreram danos indemnizáveis e se a sociedade demandada deve ser condenada a ressarci-los.”.

7. Realizada a audiência final, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“1) declaro os réus CC e marido DD, parte ilegítima e, em consequência, absolvo-os da instância. (artigos 578.º, 576.º, nº 2 e 278.º, alínea d), todos do CPC);
2) julgo a ação parcialmente procedente, e, em face disso condeno a ré “Lida, limitada” a demolir integralmente, no prazo de 30 (trinta) dias, a garagem/ construção que edificou no lugar de estacionamento n.º 42, absolvendo a referida demandada do que demais foi peticionado pelos autores.
Condeno os autores e a ré sociedade no pagamento das custas do processo na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), fixando o decaimento dos primeiros em 15% e da sociedade ré em 85%.”.

8. Inconformada, a Ré apelou, formulando as seguintes conclusões:
«A) O lugar de estacionamento dos AA. é exíguo desde sempre;
B) A área do lugar de estacionamento dos AA. é exactamente a mesma que era, antes e depois da parede erigida pela R;
C) A “oneração” do lugar de estacionamento dos AA. ocorre pela própria construção do edifício, pelo que estes deveriam ter bem reflectido quando o adquiriram;
D) Bem sabendo que lá nunca conseguiriam estacionar um veículo de dimensão acima da média, por ex., tipo “SUV”;
E) O que deveria ter sido dado como provado, era que os AA. tentaram aproveitar a construção da parede pela R. para adquirirem mais espaço de estacionamento para si;
F) Para conseguirem estacionar com mais conforto;
G) E para disfarçarem a sua imperícia;
H) Não se importando de, para adquirirem essas vantagens, que fossem obtidas à custa do espaço de estacionamento da R.;
I) O que causa embaraço aos AA., não é o espaço de estacionamento da R. ser fechado, mas sim de o ser junto à linha divisória;
J) Fora a parede erigida mais para o interior do estacionamento da R., e já os AA. não se importariam porque o seu lugar fora aumentado à custa do lugar do vizinho…
K) Face à prova produzida, sobretudo a prova por inspecção judicial, procedendo-se à sua análise crítica e ponderação segundo as regras da experiência comum, devendo acrescentar-se ou modificar-se que a questão a dirimir é se é a parede erigida pela R. que restringe o uso pelos AA. do seu lugar de garagem ou se, outrossim, as dificuldades, a existirem, advêm da configuração do
L) espaço mormente pela existência do pilar à entrada do seu lugar de estacionamento e da própria configuração da garagem que obrigará a mais manobras para estacionar, independentemente de haver ou não parede erigida;
M) Sendo, pois, nula a douta sentença recorrida, por não se pronunciar quanto à existência das dificuldades de manobra com ou sem parede, sendo esse facto essencial para a boa decisão da causa, do qual, por isso se impunha o respectivo conhecimento;
N) Por mero dever de patrocínio, em caso de improcedência do presente recurso, deverão os AA. suportar as custas, visto terem todos os seus pedidos julgados improcedentes, à excepção do pedido de demolição da parede.
Nestes termos e nos demais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando a douta sentença que condenou a R. a demolir a parede construída e, em consequência, ser produzido acórdão, absolvendo a R. do pedido».

9. Os Autores apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

10. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II. O objeto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, vistos os autos, as questões colocadas pela sociedade Recorrente e que importa apreciar no presente recurso, atenta a sua ordem lógica, consistem em saber se: i) a sentença recorrida enferma de nulidade; ii) deve ser modificada a decisão proferida sobre a matéria de facto; iii) e, em consequência, se se encontram ou não verificados os fundamentos para a sua absolvição da demolição da parede que edificou; iv) finalmente, em caso de improcedência do recurso, se os Autores devem ser condenados a suportar as custas, por terem improcedido os pedidos por si formulados, com exceção da demolição da construção.
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III – Fundamentos
III.1. – De facto
Na sentença recorrida, foram considerados provados[4] os seguintes factos:
«1) Os autores são donos e legítimos possuidores da fração autónoma designada pela letra “L”, correspondente ao apartamento “C”, do 1.º andar do prédio urbano denominado Lote n.º ...4, sito na Rua ..., freguesia e concelho de Portimão, descrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão, sob o n.º ...35 da freguesia de Portimão e inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...93.
2) À fração autónoma referida em 1) corresponde o uso exclusivo do lugar de estacionamento com o n.º 43, localizado no piso -2 (subcave).
3) A ré, é, por sua vez, dona e legitima possuidora da fração autónoma designada pelas letras “AE”, correspondente ao apartamento “E” do 4.º andar do prédio urbano denominado Lote n.º ...4, sito na Rua ..., freguesia e concelho de Portimão, descrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão, sob o n.º ...35 da freguesia de Portimão e inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...93.
4) À fração mencionada em 3) corresponde o uso exclusivo dos lugares nº 40, 41 e 42, todos situados no piso -2 (subcave).
5) Os lugares n.º 43 e 42 são contíguos e acham-se delimitados por uma linha amarela traçada no piso.
6) A 1.ª Ré, entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, transformou o lugar de estacionamento n.º 42 num espaço fechado, sendo que para o efeito edificou duas paredes em alvenaria, uma das quais edificada em cima da linha divisória que separa os lugares n.º 43 e 42, entre dois pilares existentes nas suas extremidades.
7) A referida edificação foi feita sem a aprovação dos condóminos.
8) O lugar n.º 43 tem apenas 2,38 m de largura entre as linhas que o delimitam.
9) Apenas o facto de os lugares n.ºs 42, 43 e 44 configurarem espaços abertos permite a abertura das portas do veículo que seja estacionado no lugar n.º 43.
10) A abertura da porta do veículo que seja estacionado no lugar n.º 43, nomeadamente, com vista a entrada e saída de passageiros, implica a ultrapassagem das linhas divisórias que delimitam cada um dos lugares de estacionamento contíguos.
11) A abertura das portas do veículo, com a necessária amplitude à entrada e saída dos seus ocupantes deixou de ser possível do lado em que o lugar n.º 43.º confina com o lugar n.º 42.
12) Em face da existência da parede que foi edificada pela ré os autores passaram a ter que estacionar de marcha atrás, não podendo estacionar de frente, sob pena de, caso um deles seja o condutor, a sua saída do veículo ter que ser realizada pela porta do pendura.
13) Estacionando de marcha atrás veem[5] os autores condicionada a abertura do porta bagagens da sua viatura.
14) A referida construção obriga o condutor a fazer manobras acrescidas e a ter cuidados redobrados para não embater na parede que foi edificada pela ré e não ocupar o lugar n.º 44, tendo o autor que deixar a sua viatura atual aparcada a cerca de 5 cm de tal edificação.
15) Tal construção impõe que todos os passageiros saiam do veículo pelo lado direito do automóvel se este for estacionado de frente e ou pelo lado esquerdo se for estacionado de marcha atrás.
16) Se estiver parqueado no n.º 44 um outro veículo, um pouco mais junto à linha divisória, os ocupantes da viatura que seja estacionada no lugar n.º 43 terão de sair e entrar do veículo antes do mesmo ser imobilizado no parqueamento ou apos o mesmo ser retirado.
17) Se estiver parqueado no lugar n.º 44 um outro veículo, em cima linha divisória que o separa do lugar n.º 44 os autores ficam simplesmente privados de usar o seu lugar de estacionamento.
18) A presente situação causa embaraço e incomodo nos autores.
19) A construção realizada pela autora encontra-se licenciada, desde 14.07.2020, pelo Município de Portimão.
20) O fecho dos lugares de aparcamentos encontra-se previsto no regulamento do condomínio nos seguintes termos:
“7. ARRECADAÇÃO NAS GARAGENS:
As arrecadações das garagens poderão ser fechadas com uma estrutura metálica composta por partes laterais e superiores fixas, e portas de abrir centrais, conforme indicado no esquema seguinte. A estrutura será construída por cantoneira e rede tremida, devidamente metalizadas e pintadas a branco, à semelhança da porta da casa “grupo hidropessor”.
Será este o único esquema permitido.
Qualquer outro tipo de estrutura, terá de obter aprovação em reunião de condomínio, por maioria. (…[6])”».
Ao abrigo do disposto nos artigos 662.º, n.º 2 e 607.º n.º 4, do CPC, aditam-se os seguintes factos, que se mostram documentalmente provados:
21) Os condóminos da fração AE têm direito ao uso exclusivo de 3 lugares de estacionamento com os n.ºs 40, 41, e 42 (concretiza-se o ponto 4, de acordo com a certidão da Conservatória do Registo Predial, junta a fls. 10 e v.º).
22) Na planta da cave 2 que integra a propriedade horizontal do edifício, a divisória entre os espaços destinados a estacionamento de uso exclusivo das frações, (tal como discriminados a fls. 10 e v.º da certidão da Conservatória do Registo Predial), mostra-se assinalada com tracejado, sendo visíveis apenas os pilares. No canto que constitui o espaço 37, (oposto ao espaço 42 aqui em causa), encontra-se uma parede, que se encontra erigida para lá do tracejado que demarca esse estacionamento do assinalado com o n.º 36, parede que nessa planta não se mostra assinalada na divisão entre os espaços identificados com os n.ºs 42 e 43 (cfr. doc. Fls. 11).
23) Por despacho proferido em 14.07.2020, foi deferido o licenciamento requerido em 12.12.2019, pela Ré, da “obra de Edificação/legalização de Compartimentação Parcial de Estacionamento em Garagem”, conforme certidão junta a fls. 202 e ss. dos autos.
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III.2. – O mérito do recurso
III.2.1. – Da nulidade da sentença
Veio a Recorrente arguir a nulidade da sentença recorrida, “por não se pronunciar quanto à existência das dificuldades de manobra com ou sem parede, sendo esse facto essencial para a boa decisão da causa, do qual, por isso se impunha o respectivo conhecimento”, com fundamento no disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
No corpo das alegações (concretamente nos artigos 20 a 22), invocou que “não poderia a douta sentença recorrida deixar de constatar que é o facto de estar um veículo estacionado no lugar 44 que limita a facilidade dos AA. estacionarem, e não a parede erigida pela R.; E que, com ou sem parede erigida, estando um veículo de dimensões médias estacionado no lugar n.º 42, propriedade da R., os AA. teriam sempre dificuldade em abrirem as portas do seu veículo; não podendo também a douta sentença recorrida deixar de avaliar a exiguidade do lugar do estacionamento dos AA., de dimensão reduzida, como muitos outros naquela garagem”.
Vejamos.
A respeito do vício da nulidade da sentença por omissão ou excesso de pronúncia rege atualmente o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, na redação introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o qual tem integral correspondência com a previsão anteriormente constante no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), mantendo-se consequentemente válidas todas as considerações que já se encontravam sedimentadas a respeito da respetiva interpretação[7].
Dispõe o referido preceito legal, que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Esta causa de nulidade da sentença consiste, portanto, na omissão de pronúncia, sobre as questões que o tribunal devia conhecer; ou na pronúncia indevida, quanto a questões de que não podia tomar conhecimento, sendo aquele primeiro segmento do preceito o único que ora importa considerar.
É entendimento pacífico que esta nulidade é a consequência que decorre da violação do atualmente preceituado no artigo 608.º, n.º 2, do CPC, que impõe ao juiz a resolução de todas as questões que as partes submeteram à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras, não podendo, porém ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes (salvo as de conhecimento oficioso).
Igualmente não sofre dúvidas o entendimento já firmado na anterior redação do preceito, de que o dever imposto no referido normativo (e antes no artigo 660.º, n.º 2 do CPC) “diz respeito ao conhecimento, na sentença, de todas as questões de fundo ou de mérito que a apreciação do pedido e causa de pedir apresentadas pelo autor (ou, eventualmente, pelo réu reconvinte) suscitam, quanto à procedência ou improcedência do pedido formulado. E para que este dever seja cumprido, é preciso que haja identidade entre a causa petendi e a causa judicandi, entre a questão posta pelas partes (sujeitos), e identificada pelos sujeitos, pedido e causa de pedir, e a questão resolvida pelo juiz, identificada por estes mesmos elementos. Só estas questões é que são essenciais à solução do pleito. E é por isto mesmo, que já não o são os argumentos, razões, juízos de valor ou interpretação e aplicação da lei aos factos”[8].
Como notam LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE[9] «[d]evendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções que oficiosamente lhe cabe conhecer (art. 608-2), o não conhecimento do pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado».
Posto este enquadramento geral que releva na apreciação da invocada nulidade, não há qualquer dúvida que no caso em apreço não se verifica o arguido vício da sentença recorrida, que não omitiu pronúncia sobre as questões colocadas para apreciação, entendidas nos sobreditos termos, e que, aliás, a julgadora bem elencou na decisão. Efetivamente, ao invés do que a Apelante parece considerar, a questão mor que importa decidir é precisamente a de saber se a obra erigida é ou não uma obra ilegal, com as inerentes consequências. Como é bom de ver, o argumentário que a Recorrente pretende elevar a “questão” decidenda, não foi invocado a título de defesa por exceção (que obviamente não configura), bastando para o efeito verificar que na contestação apresentada, na parte intitulada “Defesa por excepção”, a ré invocou a ilegitimidade passiva e ativa, e no segmento respeitante à “Defesa por impugnação”, contesta motivadamente os factos alegados pelos AA., discorrendo sobre o que é normal fazer quando os espaços são exíguos, designadamente a respeito da entrada/saída dos passageiros e bagagem, e imputando-lhes, no fundo, aproveitarem a construção da parede pelos RR. para tentarem obter uma vantagem no seu espaço. Estamos, pois, perante alegação que constitui mera contraprova do invocado pelos AA.. Por outras palavras, são argumentos, razões e juízos de valor sobre normalidade, tendentes a contrariar o que em contrário foi alegado pelos AA. enquanto fundamento do seu invocado direito, e que, a serem assim consideradas validamente pelo tribunal, mais não determinariam do que a declaração como não provados dos factos por aqueles alegados.
Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, improcede a arguida nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.
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III.2.2. – Da impugnação da matéria de facto
Começa a Recorrente por invocar a este respeito que “no julgamento da matéria de facto, cremos terem sido julgados como provados factos que o não deveriam ter sido, ou que deveriam tê-lo sido diferentemente. Como se procurará infra demonstrar”, prosseguindo com considerações sobre a inspeção ao local, convocando as fotos 1 a 3, referindo-se à existência dos pilares e sua repercussão nas dimensões do espaço de estacionamento, à forma de aparcamento do veículo do lugar 44 e até à dimensão dos veículos a estacionar nos locais respetivos, depois reproduz o que consta nos factos provados sob os números 12 a 17, para seguidamente concluir que “tais contingências a existirem, são atribuíveis a estar, ou não, estacionado algum veículo (e à dimensão deste) no lugar 44 e à exiguidade dos lugar dos R”, que a própria sentença admite, rematando o seu raciocínio com a afirmação de que “descontentes com a exiguidade do seu lugar de estacionamento pretendem, com a presente ação, mitigar a sua dificuldade em estacionar, à custa da R.”. Seguidamente, avança com as alegações já acima referidas aquando da decisão da arguida nulidade, depois respiga segmentos dos depoimentos de parte do Autor e das declarações da testemunha, seu filho, para afirmar que deviam ter sido tidos como tendenciosos pelo Tribunal.
Portanto, depreende-se das respetivas alegações, que a Apelante discorda quer da credibilidade atribuída pela julgadora aos indicados meios de prova, quer da decisão da matéria de facto vertida na sentença recorrida, e que entende que matéria existe que devia ter sido considerada e não foi, já que, conforme ali anuncia, pretende que este Tribunal efetue a alteração da matéria de facto que considera deficientemente apreciada.
Conforme é consabido, quando impugna a matéria de facto, o recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição, conforme preceituado no artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), e n.º 2, alínea a), do CPC.
De tal preceito decorre que a lei exige o cumprimento pelo Recorrente dos seguintes requisitos cumulativos:
i) a indicação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
ii) a indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados;
iii) a indicação da decisão que, no seu entender, deve ser proferida quanto aos indicados pontos da matéria de facto;
iv) a indicação, com exatidão, das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, isto quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, sem prejuízo da faculdade que a lei concede ao Recorrente de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Na verdade, conforme consta exemplarmente sintetizado no Acórdão de 29.10.2015[10], frequentemente citado pelos tribunais superiores, nestes requisitos cumulativos, a jurisprudência do nosso mais Alto Tribunal tem vindo a distinguir dois tipos de ónus, a saber: i) “um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes”; e ii) “um ónus secundário – tendente, não tanto a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida – que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas – indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização das passagens da gravação relevantes”.
Conforme mais recentemente se sumariou no Acórdão STJ de 02.02.2022[11], citando no mesmo sentido vários arestos que após aquele têm vindo a sedimentar esta que se considera ser a melhor interpretação do preceito, estribada também nos ensinamentos da mais recente doutrina:
“I. Os ónus primários previstos nas alíneas a), b) e c) do art.º 640.º do CPC são indispensáveis à reapreciação pela Relação da impugnação da decisão da matéria de facto.
II. O incumprimento de qualquer um desses ónus implica a imediata rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões”.
Sublinha ABRANTES GERALDES[12], que a verificação do cumprimento destas exigências deve ser feita à “luz de um critério de rigor”, porquanto “trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”, enfatizando que tais exigências devem ser o “contraponto dos esforços de todos quantos, durante décadas, reclamaram a atenuação do princípio da oralidade pura e a atribuição à Relação de efetivos poderes de sindicância da decisão da matéria de facto como instrumento de realização de justiça”.
Na verdade, e conforme mais desenvolvidamente se explica na fundamentação do citado aresto, “o ónus primário refere-se à exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, conforme previsto nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do citado artigo 640.º, visa fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto e tem por função delimitar o objeto do recurso. (…)
Relativamente ao ónus primário, nem sequer é possível recorrer às alegações para suprir deficiências das conclusões, uma vez que são estas que enumeram as questões a decidir e delimitam o objecto do recurso, devendo, quanto à impugnação da decisão de facto, identificar os concretos pontos de facto impugnados e a decisão pretendida sobre os mesmos, bem como os concretos meios de prova que imponham tal decisão.
Daí que, quando falte a especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, deva ser rejeitado o recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, o mesmo sucedendo quanto aos restantes dois requisitos, nomeadamente a falta de indicação da decisão pretendida sobre esses mesmos factos”.
O critério de rigor que deve ser seguido na apreciação da verificação dos requisitos formais previstos nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 640.º, acima indicados nos pontos i) a iii), é facilmente compreensível se tivermos presente que estes requisitos impostos pelo preceito para a admissibilidade da impugnação da decisão de facto, têm em vista, no essencial, garantir uma adequada delimitação do objeto do recurso, não apenas para circunscrever o âmbito do poder de cognição do tribunal de recurso, mas também para que a outra parte tenha a possibilidade de exercer o contraditório com o âmbito previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 640.º, designadamente indicando os meios de prova que, a seu ver, infirmem as conclusões do recorrente.
Por isso que não possam deixar de subscrever-se as conclusões exaradas no mais recente aresto citado, quanto ao não cumprimento dos aludidos ónus primários, no sentido de que esse incumprimento “acarreta a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, de acordo com o estatuído no citado art.º 640.º, nºs 1 e 2, não havendo, nestes casos, lugar a qualquer convite ao aperfeiçoamento.
É o que resulta do disposto naquele preceito e no art.º 652.º, n.º 1, al. a), do CPC, que limita os poderes do relator ao despacho de aperfeiçoamento “das conclusões das alegações, nos termos do n.º 3 do artigo 639.º”, o qual não contempla a inobservância dos mencionados ónus”.
Para além do mais recente aresto que vimos seguindo, este entendimento foi cristalinamente sumariado no Acórdão STJ de de 24-05-2018[13], no qual se realçou que «a interpretação da expressão “sob pena de rejeição” consagrada no art. 640.º, n.º 1, do CPC, relacionada com a circunstância de o recorrente beneficiar já de um prazo suplementar de 10 dias, acrescido ao prazo normal do recurso de 30 dias, no caso de impugnar a decisão da matéria de facto com base na prova gravada (art. 638.º, n.ºs 1 e 7, do CPC), inculca a ideia que o desrespeito do cumprimento do respectivo ónus é sancionado com imediata rejeição do recurso, não havendo, neste particular, espaço para qualquer convite intercalar ao aperfeiçoamento».
De facto, para modificar a decisão da 1.ª instância, por enfermar de erro de julgamento, necessário se torna, sob pena de rejeição, que se indiquem os concretos pontos de facto que se consideram incorretamente julgados e a decisão que se entende deveria ter sido proferida, e, bem assim, se especifiquem os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem decisão diversa, alegando o porquê da discordância, explicando em que é que os depoimentos contrariam a conclusão factual do tribunal recorrido, designadamente afastando os demais meios de prova em que o julgador firmou a sua convicção, ou seja, necessário se torna que o Recorrente delimite efetivamente o objeto do recurso, e fundamente as razões da respetiva discordância. Reitera-se que esta exigência legal não visa apenas que o Tribunal de recurso avalie concretamente o pretendido pelo recorrente, sendo também imposta pelo princípio do contraditório que enforma todo o processo civil, ou seja, pela necessidade que a parte contrária tem de conhecer os argumentos concretos e devidamente delimitados do impugnante, designadamente para os poder contrariar, salientando outros meios de prova em sentido diverso do indicado que infirmem as conclusões do recorrente, tudo como previsto no n.º 2, alínea b), do citado artigo.
Na verdade, com o disposto no supra citado preceito legal, o que se visa é circunscrever a reapreciação do julgamento efetuado a pontos concretos da matéria controvertida, isto porque, os poderes da Relação quanto à reapreciação da matéria de facto, não visam a realização de um segundo julgamento de toda a matéria de facto, nem a reapreciação de todos os meios de prova anteriormente produzidos, devendo consequentemente recusar-se a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto[14].
Revertendo o que vimos de referir ao caso em presença, e analisadas as conclusões das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, verificamos que não existe um suficiente cumprimento pela mesma dos ónus previstos no n.º 1 alíneas a) e c) do preceito, desde logo e designadamente do ónus de se reportar aos concretos pontos de facto que entende terem sido incorretamente julgados e da decisão que, a seu ver, deveria ter sido proferida, nos termos definidos nessa parte do referido artigo 640.º.
Assim, tratando-se de ónus cumulativos, devemos concluir que, em face do incumprimento pela Recorrente dos indicados ónus primários, e desde logo daquele que mais essencialmente delimita o âmbito do recurso, de obrigatoriamente especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, impõe-se a imediata rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto, não sendo consequentemente de apreciar as alusões que efetuou no corpo das alegações à inspeção ao local e aos excertos da prova testemunhal que, no seu entender, consubstanciam o invocado erro de julgamento.
Acresce que, o preceito em referência, ao contrário do n.º 3 do artigo 639.º do CPC, não prevê a possibilidade de o relator convidar o recorrente a aperfeiçoar as alegações de recurso quanto ao cumprimento dos ónus impostos a quem impugne a decisão relativa à matéria de facto[15], só constituindo o relator na obrigação de emitir despacho de convite ao aperfeiçoamento quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o n.º 2 do mesmo preceito[16].
Pelo exposto, atento o incumprimento pela Recorrente desde logo do ónus primário a que alude o artigo 640.º, n.º 1, alínea a) do CPC, rejeitamos o recurso na parte relativa à impugnação da matéria de facto.
Finalmente, dir-se-á ainda, que apesar de a Recorrente dizer e repetir que “não é a parede erigida pela R. que interfere com o direito que os AA. têm a fazer do seu espaço de garagem”, imputando as dificuldades por estes invocadas à conformação inicial do espaço e ao modo de estacionamento no lugar 44, a verdade é que, pelas razões já acima referidas aquando da apreciação da invocada nulidade da sentença, quanto à qualificação dos factos a este respeito invocados pela Ré, mas também porque, pelas razões abaixo melhor explicitadas os mesmos nunca teriam a virtualidade de obstar ao direito dos AA., sempre seria inútil que oficiosamente se determinasse a ampliação da matéria de facto tida em consideração na decisão recorrida, por deficiência da base factual, nos termos prevenidos na alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º, do CPC, que obviamente pressupõe que essa ampliação seja necessária à justa-composição do litígio.
Nestes termos, rejeitado o recurso na parte relativa à impugnação da matéria de facto, e não sendo caso de modificação oficiosa da mesma nos termos previstos no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, é de manter nos seus precisos termos a matéria de facto considerada provada em primeira instância, com os aditamentos acima efetuados com fundamento na prova documental produzida, para mais precisamente justificar o infundado da pretensão da Recorrente.
*****
III.2.3. – Do enquadramento jurídico
Os Autores deduziram a pretensão formulada a título principal, de demolição da construção/arrecadação que os RR. edificaram no lugar de estacionamento n.º 42 da sub-cave do prédio urbano identificado no artigo 1.º da petição, para além do mais, com o fundamento aduzido no artigo 6.º da petição inicial de que a primeira Ré, através dos seus sócios e legais representantes – os segundos RR. – transformou o “seu” lugar n.º 42 num espaço fechado que estes utilizam como arrumos/arrecadação, para o que ergueram duas paredes de alvenaria em tijolo, uma das quais foi edificada em cima da linha divisória que separa os lugares de estacionamento referidos no artigo anterior (n.ºs 42 e 43), entre dois pilares existentes nas suas extremidades.
No facto dado como provado sob o n.º 6 consta que “A 1.ª Ré, entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, transformou o lugar de estacionamento n.º 42 num espaço fechado, sendo que para o efeito edificou duas paredes em alvenaria, uma das quais edificada em cima da linha divisória que separa os lugares n.ºs 43 e 42, entre dois pilares existentes nas suas extremidades”, tendo o tribunal considerado que a demais matéria alegada nos articulados e que não foi considerada nem na factualidade apurada, nem na não provada é ou manifestamente conclusiva e/ou de direito ou não reveste relevância para a decisão dos autos.
No caso concreto, em face da demais factualidade dada como provada e do enquadramento jurídico convocado na decisão recorrida, o fim dado ao espaço fechado pela Ré, acaba por não assumir relevância na economia do recurso. Porém, não podemos deixar de lembrar que a mudança de fim de um espaço comum não seria, em abstrato, irrelevante, atento o que consta nos documentos autênticos que constituem o “bilhete de identidade” do prédio em questão, e que aditámos nos pontos 21 e 22.
Efetivamente, do título constitutivo da propriedade horizontal, há-de constar a respeito do uso exclusivo dos espaços pelos condóminos das frações que têm esse direito, o fim a que os mesmos se destina, tal como veio a ser vertido no registo predial, onde se certifica que os espaços de uso exclusivo dos condóminos das frações ali identificadas, e concretamente, das frações autónomas aqui em causa, se destinam a estacionamento.
Ora, preceitua o artigo 1419.º, n.º 1, do Código Civil[17] que «(…) o título constitutivo da propriedade horizontal pode ser modificado por escritura pública ou por documento particular autenticado, havendo acordo de todos os condóminos», donde resultaria que, não tendo havido modificação do título constitutivo da propriedade horizontal, não é lícita a transformação e utilização dos espaços em causa para outros fins.
De facto, conforme refere HENRIQUE MESQUITA[18] “o título constitutivo é um acto modelador do estatuto da propriedade horizontal e as suas determinações têm natureza real e, portanto, eficácia erga omnes. Trata-se de um dos poucos casos em que a autonomia da vontade pode intervir na fixação do conteúdo dos direitos reais, o qual, nesta medida, deixa de ser um conteúdo típico. Estas regras embora resultantes de uma declaração negocial, adquirem força normativa ou reguladora vinculando, desde que registadas, os futuros adquirentes das fracções, independentemente do seu assentimento” (sublinhado nosso).
Assim, «a liberdade de modelação do regime da propriedade horizontal está fortemente condicionada não apenas pelo facto de se tratar de um direito real, subordinado ao princípio da tipicidade, mas também por razões de interesse público, designadamente decorrentes dos direitos de edificação e do ambiente, sem esquecer a necessária salvaguarda da solidariedade exigida a todos os que integram a micro comunidade interdependente, resultante da habitação plúrima num mesmo edifício ou conjunto de edifícios.
Como no âmbito do condomínio, pela sua natureza e função, o valor privilegiado é o da estabilidade, compreende-se que a lei, no já citado art. 1419º, nº 1, confira ao título constitutivo da propriedade horizontal um carácter de imutabilidade, permitindo a sua alteração apenas quando ocorra acordo expresso de todos os condóminos, devidamente corporizado em escritura pública ou documento particular autenticado.
Pretende-se assim evitar que a posição relativa de cada condómino seja alterada por via negocial sem o seu consentimento»[19].
Sendo certo o que vimos de afirmar, no caso em apreço, conforme sublinhado anterior, as determinações do título respeitantes ao tipo de uso dos espaços comuns de uso exclusivo dos condóminos mostram-se registadas e, por tal, na esfera de proteção respetiva, pois que é através da publicidade decorrente do registo que se dá eficácia erga omnes ao estatuto real do imóvel decorrente do título constitutivo da propriedade horizontal[20].
Ora, no caso em apreço, na constituição da propriedade horizontal consta a delimitação e numeração dos espaços de uso exclusivo de cada uma das frações para estacionamento. Portanto, a modulação dos direitos imutáveis que atribui impõem-se nestes termos: nem mais nem menos, abrangendo essa modulação a planta da cave 2, tal como existente no processo de licenciamento camarário, ou seja, desde que não seja desrespeitado o fim ou destino indicado no projeto (estacionamento). Por isso que se afirmou, não ser legalmente indiferente o uso a que o espaço de utilização exclusiva em questão passe a ser afetado. Acresce que, o facto de o licenciamento/legalização da construção erigida (conforme ponto 23 acima aditado), ao contrário do que parece entender a Recorrente, também não significa que ateste a respetiva legalidade à luz das normas da propriedade horizontal. Na verdade, «tais exigências têm uma motivação de natureza estritamente técnica, relacionada com as condições de segurança exigidas na construção dos edifícios, condições essas que variam em função do tipo de utilização prevista»[21].
Não obstante o que vimos de referir, no caso dos autos, não é realmente necessário apurar qual o fim a que se destinou o encerramento do espaço de uso exclusivo correspondente ao n.º 43, porque efetivamente, conforme se concluiu na sentença recorrida, atenta a factualidade demonstrada nos autos verifica-se a ilegalidade do fecho daquele local de estacionamento, por via da violação de outras normas que regulam a propriedade horizontal.
Efetivamente, de acordo com o artigo 1420.º, n.º 1, do CC, cada condómino é proprietário exclusivo da fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício, e nos termos do disposto no artigo 1421.º, n.º 2, alínea d), e 3, do CC, muito embora o título constitutivo da propriedade horizontal possa afetar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas zonas das partes comuns – como no caso acontece –, presumem-se comuns as garagens e outros lugares de estacionamento, ainda que afetas àquele uso exclusivo.
Ora, conforme estatui o artigo 1422.º, n.º 1, do CC, os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às frações que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.
Em anotação a este preceito, RUI PINTO DUARTE[22] refere que “o art. 1422 tem um lugar de relevo no conjunto dos preceitos sobre a propriedade horizontal, porque precisa vários aspetos do direito do condomínio nas relações internas. (…) O n.º 1 fixa regras-base, determinando que, nas relações entre si, os condóminos estão sujeitos, quanto às frações autónomas, às limitações impostas aos proprietários de coisas imóveis, e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos comproprietários de imóveis. (…)
Exemplo principal e amplo das limitações impostas pela segunda regra-base do n.º 1 (a de que, nas relações entre si, os condóminos estão sujeitos, quanto às partes comuns, às limitações impostas aos comproprietários de imóveis) é o constante da segunda parte do n.º 1 do art. 1406, que estabelece como limites ao uso das coisas comuns a sua não utilização para fim diferente daquele a que se destinem e a não privação dos outros consortes do uso a que igualmente têm direito”.
Já vimos que a matéria de facto provada não nos elucida quanto ao uso dado pela Ré ao lugar destinado a estacionamento com o n.º 42, mas é bastante para concluirmos que a construção da parede em cima do traço separador de ambos os espaços, causa uma acentuada limitação ao uso do espaço n.º 43 para estacionamento. Acresce que, se bem pensarmos, sendo os espaços destinados a estacionamento partes comuns de uso exclusivo, delimitados por esse traço pintado no solo, então, por analogia com o que decorre do artigo 1373.º, n.º 1, do CC quando as propriedades são separadas por parede ou muro comum, sempre se teria de considerar que, a ser possível à Ré erigir uma parede no local, a mesma nunca poderia ultrapassar o meio desse traço.
Portanto, logo por este motivo, a construção erigida também seria ilegal.
Não obstante, a ilegalidade da mesma decorre ainda dos fundamentos aduzidos na sentença recorrida, quando ponderou que “o artº 1425º do Cod. Civ. regula aquilo que classifica como “inovações”, estipulando, no seu nº 1, que “as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio”; e, no seu nº7, que “nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte dos condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns”.
Nos termos do art.º 1421.º, n. º2. al. d) do CC presumem-se comuns as garagens e outros lugares de estacionamento, muito embora o título constitutivo da propriedade horizontal possa afetar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas zonas das partes comuns (cfr. n.º3 do citado normativo).
Sendo que a eventual tapagem do espaço de garagem deverá respeitar rigorosamente os direitos dos demais condóminos.
Sendo certo, que dúvidas não existem que tal obra, quer seja edificada em alvenaria ou mesmo com recurso a divisórias amovíveis, consubstancia, em todo o caso, uma inovação.
Por inovações entende-se as “obras que tenham em vista uma alteração do prédio, como originariamente foi concebido, com o fim de proporcionar a um, a vários, ou à totalidade dos condóminos, maiores vantagens ou melhores benefícios, ainda que só de natureza económica”. Cfr - Rui Vieira Miller, A Propriedade Horizontal no Código Civil, 1998, pg. 214.
As inovações em partes comuns devem visar um melhoramento ou um uso mais cómodo ou maior rendimento de tais partes, não se destinando a privilegiar ou a beneficiar o proprietário da fração, mas sim a coisa comum.
E a tapagem do local de garagem, convertendo-o num espaço fechado, altera de modo relevante a forma ou formato da garagem, representando um desvio ao projeto inicial de arquitetura, mas representa também uma alteração em substância e também funcional de tal espaço, que se quer amplo de molde a facilitar a circulação e aparcamento de viaturas e as inerentes ações de entrada e saída de passageiros e ou de transporte de mercadorias.
Sendo certo, que tal inovação não visa qualquer melhoramento do espaço em causa, prosseguindo interesses meramente egoísticos do proprietário condómino que a edifica e com a agravante de condicionar de forma inadmissível o direito de uso por parte dos autores
In casu, não se demonstrou que a ré tivesse obtido a necessária aprovação de dois terços dos condóminos para “fechar” com paredes o lugar de garagem
Nem que tivesse dispensada de obter tal aprovação, nomeadamente, por via do ponto 7) do regulamento do condomínio que prevê simplesmente que as construções de arrecadações no espaço de garagem deverão ser feitas em estrutura metálica.
Ora, uma garagem em alvenaria não se confunde com uma arrecadação, que será uma realidade menor.
Pelo que a ré não edificou qualquer arrecadação.
Edificou uma espécie garagem privativa dentro do espaço físico que constitui a garagem comum, sendo certo, que tal obra, como suprarreferimos, constitui uma inovação, não aprovada pelo condomínio.
Pelo que é manifesta, à luz do disposto no artº 1425º do Cod. Civ., a ilicitude da construção, ainda que tenha sido objeto de aprovação camarária, a qual não vincula em todo o caso o tribunal.
Ao que acresce, que tal obra não se afiguraria, como o defendem igualmente a ré, passível de qualquer aprovação, na medida em que interfere de forma inadmissível com o uso que o autores têm direito a fazer do seu espaço de garagem.
Pelo que tal aprovação é assim inviável a luz do disposto no n.º 7 do artº 1425º do Cod. Civ.
A existência de uma parede construída sobre a linha divisória de um lugar de estacionamento não é equiparável ao estacionamento de uma viatura nesse mesmo local., nem causa os mesmos incómodos, desde logo, porque a viatura não irá estar sempre mal-estacionada, ou seja, em cima da linha divisória».
Para além do que acima referimos, subscrevemos integralmente o raciocínio expresso a respeito da ilegalidade da construção decorrente também do facto de ter sido efetuada uma inovação que contraria o regulamento do condomínio e não foi autorizada pela assembleia de condóminos, sublinhando esta ideia final vertida na decisão impugnada de que a existência de uma parede construída sobre a linha divisória de um lugar de estacionamento não é equiparável ao estacionamento de uma viatura nesse mesmo local, uma vez que a Apelante repisa na ideia de que o problema está na exígua dimensão do lugar de uso exclusivo dos Apelados por contraponto à dimensão do seu veículo, e, bem assim, pela forma de estacionamento no lugar n.º 44.
Aceitando-se que o lugar destinado aos AA. é objetivamente mais limitado do que outros existentes na garagem pela existência do pilar no seu início, e nem sequer entrando nas questões de poderem ou não abrir as portas dos dois lados ou o porta-bagagens no espaço original, a verdade é que, não se compara a forma como podem manobrar o veículo para ali entrar sem parede e com esta. Efetivamente, mesmo que estejam veículos estacionados nos lugares 42 e 44, se se contiverem dentro do espaço que lhes compete, os AA podem manobrar o veículo usando aquele espaço aberto por cima das linhas divisórias do espaço, e aparcando dentro do lugar que lhes está reservado. Qualquer condutor que já tenha estacionado em espaços exíguos de estacionamento, como é frequente em equipamentos de uso coletivo, manobra o veículo usando o espaço livre de que dispõe entre os que ali estejam, não raramente inclinando o veículo por exemplo, para não embater num pilar e endireitando-o depois dessa manobra. Inversamente, com a parede construída, até ao limite do seu espaço interior, os AA. não dispõem daquele lado de qualquer espaço de manobra por cima da linha de separação de espaços, o que dificulta intoleravelmente o uso do espaço de estacionamento a que têm direito exclusivo.
Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, improcedem ou mostram-se deslocadas as conclusões do recurso a este respeito.
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III.2.4. – Das custas
A Apelante refere na conclusão N), que “deverão os AA. suportar as custas, visto terem todos os seus pedidos julgados improcedentes, à excepção do pedido de demolição da parede”.
Por seu turno, nos artigos 37 a 39 das suas alegações, invoca “que em momento algum dos autos, mormente no despacho saneador, foi fixado o valor da acção”, mas “ainda assim, AA. e R. são condenados nas custas na proporção do respectivo decaimento (15% dos AA. e 85 % da R.)”, concluindo que “não tendo sido fixado o valor da acção, não é possível quantificar o decaimento das partes”.
Salvo o devido respeito, só por evidente desatenção a Apelante pode colocar semelhante questão!
Efetivamente, no início do despacho pré-saneador proferido em 22.10.2019, em que se pronunciou com vista à regularização das invocadas exceções de ilegitimidade, consta:
«I – DO VALOR DA CAUSA
Fixa-se à causa o valor de 30.000,01€ (trinta mil euros e um cêntimo), nos termos do art.º296, 297º, 299º nº4 e 306º do C.P.C.
Notifique».
Portanto, tendo sido fixado o valor à ação, conforme a expressa previsão do artigo 306.º, n.º 2, do CPC, e não tendo o mesmo sido impugnado, é aquele o valor da causa.
Consequentemente, é obviamente possível fixar a sucumbência, o que o tribunal a quo fez em obediência ao disposto no artigo 307.º, n.º 6, do CPC, indicando a proporção da respetiva responsabilidade.
Pese embora a Apelante na referida conclusão entenda que os AA deverão suportar as custas porque a Ré foi absolvida dos demais pedidos, a verdade é que, no corpo das alegações nada disse que afaste o princípio da causalidade vertido no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, de acordo com o qual não temos dúvidas em afirmar que foi a Ré, com a construção ilegal em espaço comum, quem deu causa à ação e tendo sido condenada a demoli-la, é seguramente parte vencida em proporção muito superior ao decaimento dos Autores, cujo principal desígnio com a instauração da presente ação era precisamente o de ver demolida aquela construção, tanto assim que não recorreram da absolvição da Ré quanto ao demais peticionado.
Assim, tendo a decisão recorrida fixado a proporção do decaimento em 85% para a Ré e 15% para os Autores, não vemos que tal mereça a censura que lhe é dirigida, nem, aliás, algo foi validamente aduzido pela Apelante que concretamente coloque em causa tal proporção, quanto à repartição da responsabilidade pelas custas da ação.
Pelo exposto, improcede também esta última questão recursória.
Finalmente, cabe determinar as custas do recurso.
Na improcedência total da sua pretensão, a Recorrente é a única parte vencida, suportando integralmente as custas do recurso, que no caso são apenas as custas de parte, de harmonia com o princípio da causalidade e em face do preceituado nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, 529.º n.ºs 1 e 4, e 533.º, todos do CPC.
*****
IV - Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a presente apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
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Évora, 27 de outubro de 2022
Albertina Pedroso [23]
Francisco Xavier
Maria João Sousa e Faro

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[1] Juízo Local Cível de Portimão, Juiz 1.
[2] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: Francisco Xavier; 2.ª Adjunta: Maria João Sousa e Faro.
[3] Doravante abreviadamente designado CPC.
[4] Foi ainda consignado que «Com relevo para a tomada de decisão não se apuraram quaisquer outros factos para além daqueles que supra foram elencados, inexistindo factualidade relevante dada como não provada, sendo que a matéria alegada nos articulados e que não considerada nem na factualidade apurada, nem na não provada é ou manifestamente conclusiva e/ou de direito ou não reveste relevância para a decisão dos autos».
[5] Corrige-se o lapso de escrita.
[6] Segue-se estipulação sobre a forma de contagem dos pontos de luz e esquema da estrutura metálica autorizada para fecho pelo regulamento do condomínio.
[7] Cfr. ALBERTO DOS REIS, in Código de Processo Civil, Anotado, vol. V, págs. 142 e ss; e, exemplificativamente, Ac. STJ de 19-04-2012, processo n.º 9870/05.5TBBRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[8] Ac. STJ de 24-04-2012, processo n.º 497/07.8TBODM-A.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[9] In Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, 3.ª edição, Almedina, pág. 737.
[10] Proferido no processo n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[11] Proferido no processo n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[12] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª edição, Almedina, 2018, pág. 169.
[13] Proferido no processo n.º 4386/07.8TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[14] Cfr. neste sentido ABRANTES GERALDES, ob. e loc. cit., pág. 309, e Ac. STJ de 09-02-2012, proferido no processo n.º 1858/06.5TBMFR.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[15] Cfr. neste sentido o Ac. STJ de 12-01-2012, proferido na revista n.º 11/1999.L1.S1, (in Sumários de Acórdãos, disponíveis em www.stj.pt), relatado pelo Cons. João Bernardo que inclusivamente considera ser a redação introduzida no preceito interpretativa, em face das divergências jurisprudenciais anteriores, interpretação que mantém atualidade no novo regime, e que, como vimos, tem vindo a ser acolhida.
[16] Cfr. Ac. STJ de 08-09-2021, proferido na revista n.º 51/17.6T8PVZ.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[17] Doravante abreviadamente designado CC, nesta parte não alterado pela recente Lei n.º 8/2022, de 10 de janeiro.
[18] In A propriedade horizontal, pág. 94, citado por Sandra Passinhas, in A Assembleia de Condóminos e o Administrador da Propriedade Horizontal, 2.ª edição, pág. 62.
[19] Cfr. Ac. TRP de 13-09-2016, proferido no processo n.º 2144/10.1TBPVZ.P1, disponível em www.dgsi.pt, e jurisprudência, designadamente do STJ no mesmo citada, fundamentos mercê dos quais concluiu, como se tem maioritariamente considerado, que a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal apenas pode ser efectuada em conformidade com o preceituado no artigo 1419.º, n.º 1, do CC, e nunca através de decisão judicial, que se funde, designadamente, na aquisição por usucapião. Note-se, aliás, que apesar da introdução pela Lei n.º 8/2022, da possibilidade ínsita no n.º 2 do artigo 1419.º de alteração do título constitutivo das partes comuns por via do suprimento judicial da falta de acordo de 100% dos condóminos, existem apertados requisitos para que esse suprimento possa ocorrer, salientando-se o segmento final onde se refere ser necessário que a “alteração não modifique as condições de uso, o valor relativo ou o fim a que as suas frações se destinam”.
[20] Para mais desenvolvimentos a este respeito, pode ver-se a Deliberação do Conselho Técnico do Instituto dos Registos e do Notariado disponível em http://www.irn.mj.pt/sections/irn/doutrina/pareceres/predial/2007/p-r-p-274-2007-dsj-ct/downloadFile/file/prp274-2007. pdf?nocache=1316530183.31
[21] Cfr. ABÍLIO NETO, Direitos e Deveres dos Condóminos da Propriedade Horizontal, págs. 17 e 18.
[22] In Código Civil Anotado, vol. II, ANA PRATA (Coor.), 2.ª edição, Almedina, 2019, págs. 251 e 252.
[23] Texto elaborado e revisto pela Relatora, e assinado eletronicamente pelos três desembargadores desta conferência.